UNIDADE 2
Fernão Lopes, Crónica de D. João I
Painéis de São Vicente de Fora (c. 1470-1480), pintura a óleo atribuída a Nuno Gonçalves,Museu Nacional de Arte Antiga.
1. Vida e obra de Fernão Lopes
Pormenor dos Painéis de São Vicente de Fora representando Fernão Lopes.
• C. 1385-1459.
• Primeiro cronista oficial do reino.
• Guardador-mor da Torre do Tombo de 1418 a 1454.
• Origem: provavelmente popular ou mesteiral.
• Educação: provavelmente numa escola conventual;
autodidata; domínio do latim e do castelhano.
• Funções na corte: escrivão de livros de D. João I
e de D. Duarte; escrivão da puridade do infante
D. Fernando.
• Nomeações: guarda das escrituras do Tombo
(em 1418); cronista-mor do reino (1434/1454).
D. João I (1357-1433).
• Pedido de D. Duarte: escrever a história da primeira dinastia e do reinado
de seu pai, D. João I.
• Ativo durante três reinados.
• D. Afonso V substitui Fernão Lopes por Gomes Eanes de Zurara em 1454.
D. Duarte (1391-1438). D. Afonso V (1438-1481).
D. João I (1357-1433).
• O seu trabalho historiográfico terá começado com os primeiros reinados
portugueses.
• Fernão Lopes concluiu as Crónicas de D. Pedro I, de D. Fernando e de
D. João I (c. 1450).
D. Fernando (1367-1383).D. Pedro I (1320-1367).
Página iluminada da Crónica de D. João I, com uma vista de Lisboa do século XV (Arquivo Nacional da Torre do Tombo).
Mosteiros de Lorvão e Santo Tirso Cortes senhoriais e régias
Textos de diferentes proveniências:
• textos eclesiásticos latinos;
• novelas de cavalaria;
• registos genealógicos;
• lendas.
Cronicões:
notas sobre factos históricos, genealogias dos reis e da nobreza.
2. Historiografia portuguesa anterior a Fernão Lopes
Crónicas: narrativas do passado histórico português.¾ Crónica da Conquista do Algarve; Crónicas Breves de Santa Cruz;
Crónica Geral de Espanha de 1344.
Livros de linhagens: narrativas do passado
histórico português.
Genealogias da nobreza
+
Lendas da tradição europeia
¾ Quatro livros de linhagens; terceiro e quarto
livros de linhagens organizados pelo conde
D. Pedro.
Iluminura do anterrosto do Livro de Linhagens do Conde Dom Pedro, século XVII.
Objetivos dos livros de linhagens:
¾ Traçar a linhagem das casas nobres;¾ Identificar as famílias nobres;
¾ Definir o parentesco entre as famílias nobres.
Finalidades:
¾ Determinar direitos patrimoniais;¾ Evitar casamentos consanguíneos;
¾ Estimular a solidariedade entre os nobres peninsulares.
Pretendentes ao trono português
D. Constança
D. Dinis
D. Leonor Teles
D. João, Mestre de Avis
3. A crise dinástica de 1383-1385
D. Teresa LourençoD. Fernando
D. Pedro I
D. João
D. Inês
D. Beatriz
Etapas:
• 2 de abril de 1383: Tratado de Salvaterra de Magos
(acordo do casamento entre D. Beatriz e D. João I
de Castela).
• 22 de outubro de 1383: morte de D. Fernando;
D. Leonor assume a regência; o rei de Castela
ambiciona o trono de Portugal.
• 6 de dezembro de 1383: o Mestre de Avis mata o conde
Andeiro.
• De maio a setembro de 1384: guerra com Castela cerco castelhano à cidade de Lisboa.
• 6 de abril de 1385: cortes de Coimbra o Mestre de Avis
é aclamado rei de Portugal.
• 14 de agosto de 1385: Batalha de Aljubarrota.
Jean Wavrin, A Batalha de Aljubarrota, iluminura da Crónica de Grã-Bretanha (c. 1445).
• Crónica do Condestabre de Portugal (sobre D. Nuno Álvares Pereira).
• Tratado dos Feitos de D. João, Mestre de Avis, de Christophorus
(eclesiástico ou doutor em leis).
• Crónica dos Reis de Castela, de Pero López de Ayala.
• Crónica dos Feitos de D. Fernando, de Martim Afonso de Melo.
Objetivos:
¾ Fundamentar a verdade histórica em documentos escritos;¾ Confrontar os documentos para aferir a verdade dos factos.
4. As fontes de Fernão Lopes
• Ligação do cronista à nova dinastia.
• Investimento na construção de uma historiografia nacional.
• Legitimação da nova dinastia de Avis.
• Defesa da sua subida ao trono (pela fundamentação da versão
dos acontecimentos narrados).
• Exaltação dos feitos do fundador da dinastia.
Cronística régia
(promovida pela casa real)
5. A Crónica de D. João I uma apologia
1.ª Parte da Crónica de D. João I
• Ação concentrada em cerca de dezasseis meses vários acontecimentos
simultâneos;
• Da morte do conde Andeiro (dezembro de 1383) à aclamação do Mestre
de Avis como rei de Portugal nas cortes de Coimbra (abril de 1385).
Interregno de 1383-1385
António José de Sousa Azevedo (1830-1864), Morte do Conde Andeiro, Museu Nacional
de Soares dos Reis (c. 1860).
2.ª Parte da Crónica de D. João I
• Decorre entre abril de 1385 até outubro de 1411.
• Narra o conflito bélico entre Portugal e Castela.
• A narração inicia-se com o final das cortes de Coimbra e termina com
a assinatura do tratado de paz.
Reinado de D. João I
Objetivo da crónica:
demonstrar a legitimidade da eleição régia determinada
pela vontade da população do reino.
Prólogo da Crónica de D. João I
• Importância da verdade.
• Distinção dos cronistas que o precederam.
Exposição sobre o método do historiador:
consulta de numerosos testemunhos escritos;
análise das fontes, verificando quais são as mais verdadeiras
pelo confronto de manuscritos e de documentação variada.
«mundanall afeiçom»«naturall inclinaçom»
Geram falsidade nos relatos.
Prólogo do manuscrito da Crónica de D. João I da Biblioteca Nacional de Espanha (século XVI).
Personagens complexas:
protagonizam cenas dramáticas;
confrontam-se e dialogam (diálogo).
Personagens
• Personagens individuais
Protagonistas:
D. Leonor Teles (a vilã);
D. João, Mestre de Avis (o retrato de um homem espontâneo);
D. Nuno Álvares Pereira (o herói guerreiro e hagiográfico).
A força e a vontade da coletividade:
«todos animados»; «a cidade soube»
(Descrição e visualismo.)
• Personagens coletivas
Movimentos de massas:
Multidão;
Povos do reinos;
Habitantes de vários locais;
«Opinião pública».
Personagens complexas:
protagonizam cenas dramáticas;
confrontam-se e dialogam (diálogo).
A força e a vontade da coletividade:
«todos animados»; «a cidade soube»
(Descrição e visualismo.)
Dramatismo/dinamismo
• Personagens individuais e coletivas
• O povo de Lisboa e os grupos profissionais
manifestam-se contra D. Leonor Teles;
• O povo de Lisboa manifesta-se contra a influência castelhana;
• O povo de Lisboa suporta as duras condições do cerco;
• O exército português combate na Batalha dos Atoleiros
e na Batalha de Aljubarrota em defesa de Portugal.
Ameaça para o reinoInvasão castelhana.
Perda de independência.
Fortalecimento da noção de comunidade nacional:
Apelo ao patriotismo da «arraia-miúda».
O povo age, mobiliza-se,
participa.
Afirmação da consciência coletiva
Pormenor do Castelo de São Jorge e das muralhas de Lisboa durante o cerco castelhano de 1384, ilustração da Crónica de D. Afonso Henriques, de Duarte Galvão (1505).
O estilo de Fernão Lopes
• Vivacidade
Capítulos organizados em sequências narrativas que evoluem
de forma gradual até ao clímax do episódio (planos cenográficos).
Caracterização das personagens a partir das suas atitudes.
Utilização de narração, descrição e diálogo de forma alternada.
Utilização de verbos de ação e do gerúndio.
• Linguagem coloquial/oralizante
Utilização do registo corrente/popular;
Convocação frequente do narratário;
Recurso a apóstrofes, interrogações retóricas, exclamações
e interjeições.
• Apelo visual
Utilização de campos lexicais relacionados com os sentidos (visão,
audição).
Recurso a enumerações, comparações, personificações e dupla
adjetivação.