UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS NA GESTÃO ASSOCIADA DE
SERVIÇOS POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS
Por: Cristina Blum Miranda
Orientador
Prof. Jorge Vieira
Rio de Janeiro
2010
2
FOLHA DE ROSTO
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS NA GESTÃO ASSOCIADA DE
SERVIÇOS POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS
Monografia apresentada ao Instituto A Vez do Mestre -
Universidade Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Gestão Pública.
Por: Cristina Blum Miranda
3
AGRADECIMENTOS
À Secretaria de Estado de Planejamento e
Gestão, do Governo do Rio de Janeiro, pelo
incentivo à capacitação, e ao corpo docente
do curso de pós-graduação em gestão
pública, do Instituto A Vez do Mestre, em
especial, ao professor Jorge Vieira,
orientador desta monografia, pela
materialização do projeto em lições de valor
inestimável.
4
RESUMO
O estudo tem por objetivo apresentar as Parcerias Público-Privadas e o seu
potencial para viabilizar investimentos no âmbito da gestão associada de serviços por
Consórcios Públicos. Para tanto, preliminarmente faz-se uma breve contextualização
histórica, evidenciando o esgotamento da capacidade de financiamento do Estado,
cenário propício para a introdução das Parcerias Público-Privadas no Brasil. Em
seguida, apresenta-se a lógica subjacente deste modelo de concessão em parceria e suas
principais características, de acordo com a Lei 11.079/2004, caminhando ao encontro da
ideologia do federalismo cooperativo e da necessidade da gestão associada de serviços
por uma de suas formas, os Consórcios Públicos, conforme a Lei 11.107/2005. No
último passo, verte-se o cruzamento entre Parcerias Público-Privadas e Consórcios
Públicos, de sorte a refletir a sinergia dos referidos institutos. Constata-se, por
conclusão, pela potencialidade do arranjo institucional vis-à-vis as fragilidades
existentes e as dificuldades de implementação, a esperarem o devido enfrentamento,
como desafio ao exercício da governança em rede.
5
METODOLOGIA
O método de abordagem utilizado no presente trabalho apoiou-se na
investigação teórica, que, conforme definição de Ayres e Larosa (2008, p.31), “são
idéias e conceitos, científicos ou não, que serão fundamentados a partir de documentos,
livros ou outras pesquisas”. Com base nos referidos autores, a pesquisa pode ser
classificada como explorativa permitindo a compreensão dos assuntos, através da
pesquisa bibliográfica. Para tanto, utilizou-se a literatura nacional, como fonte de coleta
de dados, e ainda materiais publicados em revistas acadêmicas, artigos assinados por
renomados autores em Administração Pública e internet, sendo esta última destinada
especialmente à tentativa de localizar modelagens de Parcerias Público-Privadas e
Consórcios Públicos. Partindo disto, a pesquisa aproximou-se do paradigma explicativo,
na tentativa de aclarar o universo delimitado e solucionar o problema-chave do trabalho
de conclusão de curso, sendo finalizada na zona de confluência dos referidos institutos,
onde se constatou a escassez e a primariedade do tratamento conjunto dos assuntos nas
fontes de consulta antes mencionadas. Por conseguinte, para não restar prejudicada a
pesquisa, utilizou-se a observação para integrar os institutos circunscritos no tema e
concluir pela perfeita simbiose, demonstrando, porém, fragilidades e riscos existentes, a
esperarem o devido enfrentamento, para materialização do arranjo institucional em tela.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7 CAPÍTULO I PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 9 CAPÍTULO II GESTÃO ASSOCIADA DE SERVIÇOS POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS 42 CAPÍTULO III PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS NA GESTÃO ASSOCIADA DE SERVIÇOS POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS 73 CONCLUSÃO 83 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 87 ÍNDICE 91 FOLHA DE AVALIAÇÃO 93
7
INTRODUÇÃO
No atual contexto de modernização do papel do Estado na Administração,
observa-se uma atuação cada vez mais colaborativa entre os agentes públicos e privados.
Em uma realidade complexa e dinâmica, a tutela do interesse público alia-se ao
dinamismo e criatividade dos particulares em nome da solução de problemas que
acabam por atingir a toda a sociedade. Desta forma, a atuação em conjunto entre Estado
e particular não apenas é útil como também necessária em muitos casos.
O debate sobre a descentralização e o valor do gasto público torna-se cada vez
mais atual, apresentando-se sob diferentes enfoques. Destes, extrai-se o objetivo do
presente trabalho acadêmico: expor as parcerias público-privadas e o seu potencial para
viabilizar investimentos no âmbito da gestão associada de serviços públicos através dos
consórcios públicos, de sorte a demonstrar a perfeita simbiose do arranjo institucional e
indagar os riscos incidentes por constatar a subutilização do mesmo.
O Poder Público, por atribuição constitucional, tem o dever da prestação de
serviços públicos, podendo fazê-lo de forma centralizada ou descentralizada. Entretanto,
um dos gargalos da gestão centralizada passa pela carência de recursos públicos, que
não autoriza a inércia da Administração Pública, forçando a busca pelo capital privado
através das diferentes formas de descentralização. O setor privado, por sua vez, nem
sempre julga os projetos de interesse público, atrativos ou seguros o suficiente para
motivar o aporte de capitais.
As parcerias público-privadas foram criadas como modalidades de concessão
especial, pela Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, tornando-se uma
alternativa para a colaboração entre o setor público e a iniciativa privada, visando atrair
fortes investimentos privados, para projetos públicos não autossustentáveis, com fluxo
de caixa insuficiente ou inexistente, mas que apresentam grandes externalidades
positivas.
8
Nesse modelo de concessão especial em parceria, o privado financia o público,
ao assumir a implantação e a operação do serviço concedido, estando os aportes de
verbas públicas condicionados ao efetivo início da prestação do serviço e variável por
vinculação ao atendimento de metas de desempenho, contudo, assegurados por um
sistema de garantias contra a inadimplência do Poder Público.
Ao lado das parcerias público-privadas, surgem as parcerias público-públicas,
com os Consórcios Públicos personificados, instituídos pela Lei Federal nº 11.107, de
06 de abril de 2005. Nessa nova concepção, um ente da Federação pode cooperar com
outros entes políticos para o exercício das atividades de planejamento, regulação ou
fiscalização de serviços públicos, acompanhadas ou não da prestação de serviços
públicos ou da transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens
essenciais à comunidade. É a batuta da gestão associada de serviços públicos, na
maestria do Consórcio Público.
A aplicabilidade das parcerias público-privadas, no âmbito da gestão associada
de serviços públicos através dos consórcios públicos, decorre de uma conjunção de
fatores que estabelece um cenário favorável para o surgimento e fortalecimento de
novas relações de cooperação federativa, num ambiente de concerto e associação,
potencializando o alcance de objetivos comuns na prestação de serviços públicos de
forma regionalizada.
Não obstante tal perspectiva e a despeito de constitucional e legalmente
inexistirem impedimentos, a subutilização de um arranjo institucional envolvendo os
dois institutos denota a existência de dificuldades e fragilidades para concretizá-lo,
pontos ainda obscuros, que o presente trabalho acadêmico busca enfrentar, como desafio
lançado ao exercício da boa governança pública em rede.
9
CAPÍTULO I
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS
1.1. Precedentes Históricos: Parcerias em Sentido Amplo
As parcerias público-privadas, numa acepção generalista, não são um
fenômeno novo. A evolução histórica demonstra a alternância de ações de capitais
público e privado no provimento das necessidades do Estado e da sociedade em geral,
conforme o sistema econômico e a situação político-social vigente.
Não há como negar a existência de exemplos marcantes de associações de
investimentos realizados no Brasil, tais como, o caso do Convênio de Taubaté, em que o
Estado intervinha diretamente no mercado e no processo de formação de preços para
controlar o excedente da produção cafeeira por meio de financiamento internacional.
Há que se recordar, ainda, na ilustração de Caio Tácito (1997, p.754):
[...] a criação e expansão da rede de estradas de ferro, de portos, de energia elétrica, de serviços de transporte coletivo se realizaram satisfatoriamente mediante a concessão destes serviços. Nossa história econômica está pontilhada de nomes ilustres que se ocuparam destas atividades, mobilizando recursos em empreendimentos desta natureza. Mauá, no setor das ferrovias, foi um criador e coordenador de empresas concessionárias de serviço públicos. Um homem como Teófilo Ottoni, sonhou abrir um caminho marítimo para Minas Gerais, através do Vale do Mucuri, no Espírito Santo, numa realização que não teve êxito e que fora planejada através do esquema de uma empresa concessionária. O grande desenvolvimento da região Sul, especialmente de São Paulo, foi em grande parte possibilitado pela existência de suficiente potencial elétrico fornecido por empresa concessionária.
Assim considerada em sentido amplo, conforme observa Carlos Ary Sundfeld
(2005), a imprecisão da terminologia Parceria Público-Privada permite comportar as
múltiplas relações negociais estabelecidas entre a Administração Pública e os
particulares, para viabilizar, sob a responsabilidade destes, o desenvolvimento de
atividades de interesse geral, juridicamente relevantes e prolongadas no tempo.
10
Por certo, o contexto que as define e as necessidades que provocam a sua
utilização são efetivamente distintos, mas, no conjunto, representam uma reflexão sobre
os limites da atuação estatal e as alterações na forma de conceber o Estado, afastando o
dogma dos interesses opostos e introduzindo na gestão pública a colaboração privada.
O fato é que a idéia de parcerias entre o setor público e o setor privado tem se
desenvolvido cada vez mais desde os últimos anos do século passado. A partir da
derrocada do modelo intervencionista, iniciou-se o movimento pela descentralização do
Estado. O Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, que, sofrendo transformações ao
longo deste tempo, ainda vige, veio a ser o marco inicial para a reforma administrativa,
estabelecendo suas diretrizes e dispondo sobre a organização da Administração Pública
Federal.
Segundo Fernando Luiz Abrucio (2001), quatro fatores estiveram diretamente
relacionados com esgotamento do modelo estatizante. O primeiro foi a grande crise
econômica mundial, iniciada na década de 1970, intensificada após a crise do petróleo, e
agravada durante os anos de 1980. A economia mundial enfrentava grande período
recessivo e as políticas keynesianas mostravam-se incapazes de controlar tal situação.
Por consequência, houve um processo de aceleração inflacionária, altas taxas de
desemprego e reduzidos índices de crescimento econômico. O desenvolvimento
econômico brasileiro, que até então havia se dado à custa de um endividamento,
sobretudo externo, fez com que o Estado se visse incapaz de sustentar a máquina estatal
hipertrofiada pelos anos de intervencionismo. Após décadas de expansão, o Estado
mergulhou em uma crise fiscal sem precedentes - o segundo fator dessa bancarrota. Os
estados não conseguiam mais financiar seus elevados déficits e despesas, obras foram
paralisadas, equipamentos sem manutenção se depreciaram, e já não era possível atender
todos os serviços demandados pela sociedade. Associada a tais fatores, embora em
menor grau, há a globalização e a emergência de novas tecnologias que transformaram a
lógica do setor produtivo, afetando o Estado e resultando em perda de parcela de seu
poder de ditar políticas macroeconômicas.
11
Com efeito, ao passo que a crise fiscal veio a agravar a ausência da capacidade
de investimentos do Estado, desencadeando o famoso gargalo de infraestrutura, houve
uma crescente pressão social por transformações na prestação dos serviços públicos,
culminando no movimento reformista do Estado dos anos 1990.
De acordo com Flávio da Cunha Rezende (2004), a onda das reformas
administrativas dos anos 1990 se diferencia das anteriores por estarem voltadas para
aspectos mais amplos, como a alteração do papel do Estado, a redução dos gastos
públicos e a implementação de um desenho institucional que permitisse alterar os
incentivos internos de seu funcionamento. Segundo o autor, o que se pretendia, em
última instância, era a mudança de um modelo burocrático intervencionista para um
modelo orientado pela performance. Kettl (1999, citado por REZENDE, 2004)
argumenta que nesse ponto reside o diferencial dessas reformas e o motivo de sua
impressionante proliferação, pois os governos passaram a se preocupar em como fazer
para funcionar melhor, com menor custo.
Para Christopher Hood (1990, citado por SEABRA, 2001), esse conjunto de
idéias que dominou a agenda política da maioria dos países e visava fundamentalmente
a transformação das burocracias do setor público, era conhecido como nova
administração pública (new public management).
No Brasil, o modelo que efetivamente tomaria a forma da nova administração
pública, cunhada Reforma do Estado, encontra-se expresso no Plano Diretor da Reforma
do Aparelho do Estado (BRASIL, 1995), formulado pelo extinto Ministério da
Administração Federal e Reforma do Estado (Mare), que previa mudanças nos arranjos
inter e intraorganizacionais das instituições do aparelho estatal brasileiro, constituindo
as bases da reforma administrativa de 1995 (SEABRA, 2001).
O diagnóstico mostra que para uma reforma consistente do aparelho do Estado necessita-se, hoje, mais que um mero rearranjo de estruturas. A superação das formas tradicionais de ação estatal implica descentralizar e redesenhar estruturas, dotando-as de inteligência e flexibilidade, e sobretudo desenvolver modelos gerenciais para o setor público capazes de gerar resultados (BRASIL, 1995, p. 40).
12
A estrutura central de direção da Administração Pública engrenou no
movimento de descentralização de atividades que não se configurassem como típicas de
Estado, deixando as funções operacionais e executoras para a iniciativa privada.
Concentrando-se nas atividades de planejamento, supervisão, coordenação, o Estado
passou a buscar uma atuação reguladora, voltada para o controle de resultados e para o
equilíbrio entre receitas e despesas públicas, com vistas à eficiência. Surge, portanto, o
modelo do Estado regulador e a ambiência de cooperação, abrindo espaço para o
mercado retomar investimentos e explorar diretamente as atividades de relevante
interesse social próprias do setor de infraestrutura.
Sob essa influência de cunho desestatizante, foram revigorados os regimes de
concessão, permissão e autorização, que ganharam nova dimensão, de acordo com as
necessidades econômico-sociais então vigentes. Emergiram novas entidades, como as
agências executivas, agências reguladoras, organizações sociais, organizações da
sociedade civil de interesse público, além de novas figuras contratuais, como os termos
de parceria, os contratos de gestão, as parcerias público-privadas (propriamente ditas),
todos considerados formas de gestão associada de serviços públicos, em sentido lato. E,
por fim, os consórcios públicos, modelo imposto para a gestão associada de serviços
públicos, em sentido estrito.
1.2 As Parcerias Público-Privadas em Sentido Estrito
1.2.1 Contextualização do novo marco legal
Foi justamente no contexto da Reforma do Estado que a idéia de uma
legislação específica de parcerias público-privadas (PPPs) desenvolveu-se no Brasil. A
provisão de serviços de infraestrutura, traduzida geralmente em projetos estratégicos de
grande porte e longos períodos de maturação, foi diretamente afetada por reestruturações
patrimoniais e restrições fiscais. Na medida em que o processo de privatização, em seu
modelo puro, demonstrou-se problemático em setores de utilidade pública, com forte
predominância de monopólios naturais, inovações no âmbito da estruturação dos
13
empreendimentos foram sendo introduzidas, ao lado de aprimoramentos no aparato
regulatório. (BRITO; SILVEIRA, 2005). A intenção do governo brasileiro, quando
iniciou o processo de discussão do que posteriormente veio a se definir como PPP, era
identificar, na parceria com o setor privado, uma alternativa para viabilizar projetos de
infraestrutura e de provisão de serviços públicos, num cenário de escassez de recursos
orçamentários e de elevado déficit de projetos estruturantes (SOUTO, 2004).
Em vista disso, vislumbrou-se o êxito da experiência internacional de parcerias
entre os setores público e privado, mais especificamente a advinda do Reino Unido, que,
na década de 1990, lançou as bases do programa inglês de partnerships, com lastro em
projetos desenvolvidos sob um instrumento denominado “Iniciativa para o Investimento
Privado”, em inglês, Private Finance Initiative - PFI (COUTINHO, 2005, p. 47).
O PFI é parte do programa inglês de public-private partnerships, o qual
envolve um amplo espectro de parcerias entre a Administração Pública e a iniciativa
privada, com o objetivo original de mover para fora do balanço do ente público
investimentos em infraestrutura, de forma a não impactar o seu nível de endividamento.
Posteriormente, já entre meados e final dos anos 1990, o foco do PFI deslocou-se da
questão fiscal para a busca da eficiência econômica na contratação (PRADO; RIBEIRO,
2007).
Do ponto de vista do marco legal brasileiro, conforme lição de Prado e Ribeiro
(2007, p.31), dois objetivos principais precisavam ser atingidos. Em primeiro lugar,
viabilizar a implementação de projetos com alto retorno econômico e social, mas
incapazes de, por si sós, alcançarem a autossustentabilidade financeira, condição sine
qua non para motivar a participação do parceiro privado, o que implica em “[...] taxas
de retorno, sobre o capital próprio e de terceiros investido, compatíveis com o padrão de
mercado para projetos de semelhante risco”. Em segundo lugar, pretendia-se viabilizar a
amortização de investimentos de montante elevado por meio da exploração do próprio
serviço, o que requer prazos mais longos que o permitido para os contratos comuns de
prestação de serviço.
14
Quanto às restrições orçamentárias, ainda segundo os referidos autores,
também se justificava a criação das PPPs. Pretendia-se viabilizar investimentos em
infraestrutura sem aumentar o endividamento público e com impacto reduzido na meta
de resultado primário.
Por conseqüência da alta relação dívida pública/PIB e das metas de resultado primário – metas de caixa as quais, por isso, requerem o contingenciamento de recursos públicos – , o investimento público direto em infra-estrutura tem minguado nos últimos anos, ou pelo menos, tem sido insuficiente para dar conta das ingentes e crescentes demandas de infra-estrutura. (PRADO; RIBEIRO, 2007, p.32).
A conjuntura exigia, portanto, a complementação da legislação brasileira,
agregando um novo viés, para viabilizar contratos específicos de grandes externalidades
positivas (que se verificam sempre que a produção ou consumo de bem gere benefícios
que são subvalorizados pelo mercado), em uma estrutura contratual que criasse
incentivos à eficiência e alocação de riscos entre as partes.
1.2.2 A inadequação dos modelos existentes
Na lição de Hely Lopes Meirelles (2005), a prestação do serviço público pode
ser centralizada, descentralizada e desconcentrada, e sua execução, direta e indireta.
O serviço centralizado é o que o Poder Público presta por seus próprios órgãos
em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade. Em tais casos o Estado é, ao mesmo
tempo, titular e prestador do serviço, que permanece integrado na Administração Direta.
O serviço descentralizado é aquele em que o Poder Público transfere sua
titularidade ou, simplesmente, sua execução, por outorga ou delegação, a autarquias,
fundações, empresas estatais, empresas privadas e mais recentemente, aos consórcios
públicos (Lei 11.107/2005).
Há outorga quando o Estado cria uma entidade e a ela transfere, por lei,
determinado serviço público e somente por lei pode retirar ou modificar tal
competência. Há delegação quando o Estado transfere, por contrato (concessão, em
15
quaisquer das suas modalidades, ou consórcio público) ou ato unilateral (permissão ou
autorização), unicamente a execução do serviço, para que o delegado o preste ao público
em seu nome, nas condições regulamentares e sob controle estatal. Mas em ambas as
hipóteses o serviço continua sendo público, apenas descentralizado, contudo sempre
sujeito aos requisitos originários e sob regulamentação e controle do Poder Público que
os descentralizou.
O serviço desconcentrado é aquele que a administração executa
centralizadamente, mas o distribui entre vários órgãos da mesma entidade, para facilitar
sua realização e obtenção pelos usuários. A desconcentração é uma técnica
administrativa de simplificação e aceleração do serviço dentro da mesma entidade,
diversamente da descentralização, que é uma técnica de especialização, consistente na
retirada do serviço de uma entidade e transferência a outra para que o execute com mais
perfeição e autonomia.
A execução direta do serviço é a realizada pelos próprios meios da pessoa
responsável pela sua prestação ao público, seja pessoalmente ou por seus órgãos, ou por
seus prepostos (não por terceiros contratados). A execução indireta dos serviços é a que
o responsável pela sua prestação comete a terceiros para realizá-lo nas condições
regulamentares. Serviço próprio ou delegado feito por outrem, é execução indireta.
Constitucionalmente, a concessão e a permissão de serviços públicos são as
formas consagradas de descentralização por colaboração, delegando-se, sempre por
meio de licitação, a execução de serviços públicos a particulares, em obediência ao
preconizado pelo artigo 175 da Constituição Federal. Assim, “Incumbe ao Poder
Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Tal dispositivo veio a ser
regulamentado pela Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.
Entretanto, para o modelo imaginado de parcerias público-privadas, com
contratos de longo prazo e de grandes investimentos, o regime de permissão,
caracterizado especialmente por sua precariedade, não se ajustava. Por outro lado, o
regime da concessão de serviços públicos, que já era tratado como parceria em sentido
16
amplo, viria mesmo a servir como base para a legislação de PPP em sentido estrito.
Precedidas ou não de obras, as concessões envolvem delegações contratuais de longo
prazo, que exigem forte investimento por parte do concessionário privado para
exploração de um serviço público de natureza econômica, sendo calcada no sistema
tarifário de remuneração pela exploração dos serviços e obras públicas. Aqui há um
ambiente de autossustentabilidade, onde os riscos são deixados, em regra, para o
concessionário.
O problema é que nem sempre a tarifa é suficiente para remunerar as
concessões comuns, e a Lei 8.987/1995 não disciplina o sistema de pagamentos públicos
adicionais à tarifa ou mesmo um sistema de garantias, que protegesse o concessionário
contra o inadimplemento (SOUTO, 2005; SUNDFELD, 2005). Além disso, era preciso
criar condições jurídicas para permitir a aplicação da lógica econômico-contratual da
concessão tradicional a outros objetos que não a exploração de serviços públicos
econômicos.
Nessa esteira, há o regime das terceirizações da Lei de Licitações e Contratos
Administrativos, Lei 8.666, de 21 de junho de 1993. Destina-se aos tradicionais
contratos administrativos de obras públicas e de prestação de serviços, com duração, em
regra, adstrita à vigência dos créditos orçamentários, em respeito ao princípio da
anualidade do orçamento. Nos serviços contínuos, embora o prazo seja prorrogável até o
limite de 60 (sessenta) meses, isto nem sempre é suficiente para amortizar o
investimento realizado pelo particular contratado, terminando por concentrar valores
mais elevados nas contraprestações desembolsadas pela Administração contratante.
Neste regime exige-se, como dentre os requisitos prévios à licitação, a definição precisa
do serviço que será prestado, desdobrando todos os seus elementos característicos,
dentre os quais se destacam os projetos para os serviços de engenharia ou termos de
referência para os serviços que não se enquadrem nesta categoria, e, sempre, o
orçamento detalhado em planilhas, contendo todos os custos unitários necessários para a
execução do objeto da contratação, de sorte a comprovar a economicidade da proposta
selecionada. Frise-se, por oportuno, que tais exigências, na prática, não se revertem
necessariamente em segurança e eficiência. Aqui a gestão da atividade permanece
17
pública e os riscos são todos da Administração, o que vem a ser agravado pelo controle
ex post, meramente formalista, adotado pela Lei 8.666/93, no ato de liquidação da
despesa, não sendo avaliado o desempenho do contratado ou o resultado efetivamente
alcançado. Ademais disso, exige-se disponibilidade imediata de recursos financeiros do
Poder Público, vez que o pagamento se dá em função de uma medição de curto prazo,
conforme o cronograma de desembolso inicialmente previsto pela Administração, sendo
vedado o financiamento do projeto pelo próprio particular contratado (PRADO;
RIBEIRO, 2007; SOUTO, 2005; SUNDFELD, 2005).
Em resposta à inadequação dos modelos, até então existentes, para atender a
exigência de investimentos de grande monta pelo parceiro privado em infraestrutura
para a prestação de um dado serviço público, não autossustentável; para a necessidade
de amortização e remuneração desse investimento por meio da exploração do próprio
serviço pelo parceiro privado em contratos com prazos longos, atrelado, a um sistema de
garantias, e, ainda, para a mudança da lógica de fiscalização e controle de resultados dos
contratos pelo Poder Público, além de outras questões anteriormente pinceladas,
surgem, então, as Parcerias Público-Privadas, com a Lei 11.079, de 30 de dezembro de
2004, qualificadas como uma concessão especial, na linha evolutiva dos contratos de
concessão comum da Lei 8.987/1995.
1.2.3 A lógica subjacente da PPP
“Os contratos de PPP, assim como os de concessão comum, promovem
alteração relevante na lógica econômica subjacente aos contratos de prestação de
serviços comuns.” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p. 34).
Em primeiro lugar, a transferência para o parceiro privado, em conjunto, da
responsabilidade por realizar o investimento em infraestrutura e mantê-la por diversos
anos, tende a gerar uma maior eficiência e qualidade na prestação dos serviços,
especialmente quando se está sob regulação econômica adequada, capaz de criar
condições de concorrência no mercado. Essa eficiência retornaria, então, ao usuário e ao
18
Poder Público, sob forma de melhores serviços e maior modicidade no pagamento de
tarifas ou economicidade nas contraprestações públicas.
Segundo Prado e Ribeiro (2007, p.35), sendo do parceiro privado o encargo de
manter a infraestrutura por anos, ele sopesará, por exemplo, se é melhor investir mais na
construção para reduzir o custo de manutenção, ou o inverso. E, ninguém de maior
expertise do que ele para imprimir uma lógica de longo prazo no gerenciamento dos
bens públicos necessários à prestação dos serviços que ele explora, e evitar “o
subinvestimento na qualidade das obras, o que gera, muitas vezes, custos de manutenção
superiores a eventuais economias realizadas na construção do empreendimento.”
Justo por isso, a Administração Pública tem, nos modelos de concessão
patrocinada, bem como nos de concessão comum, a faculdade legal de fornecer apenas
os elementos do projeto básico à época da licitação, permitindo a transferência ao
parceiro privado, em conjunto, a responsabilidade por elaborar os projetos (básico e
executivo), financiar, construir, operar e manter o serviço.
Com efeito, é preciso especial cuidado na configuração dos contratos de PPP
que envolvam serviços de provimento de infraestrutura para a prestação de um serviço
público, ante a indelegabilidade da função de regulação do Estado. Os contratos devem
ser feitos de modo a que o parceiro privado encarregado da operação da infraestrutura
não termine por indiretamente regular a prestação do serviço. Sua atividade deve ser
executória das regras estabelecidas pela Administração – o que não significa dizer que
se possa deixar ao parceiro privado margem para exercer julgamento e tomar decisões
com base nas normas técnicas aplicáveis à situação, sob pena de se por em risco
inclusive a segurança da prestação do próprio serviço (PRADO; RIBEIRO, 2007).
Aqui o foco da fiscalização do Poder Público, embora tenha o monitoramento e
supervisão permanentes, desloca-se principalmente para os resultados finais, nos níveis
de serviço disponibilizados ou prestados em acorde com as diretrizes e indicadores de
performance pré-estabelecidos na contratação, vinculados a uma sistemática de
pagamentos que permita a penalização por não alcançar os índices correspondentes,
19
deixando ao parceiro privado a escolha dos melhores meios, modos e tecnologia a serem
utilizados para prestar o serviço e a responsabilidade de gestão.
1.2.4 A solução encontrada
Pela justificativa que acompanhou o projeto de lei ao Congresso Nacional,
verifica-se que os objetivos das parcerias público-privadas (PPPs) são o de suprir a falta
de disponibilidade de recursos financeiros do setor público, aproveitar a eficiência do
setor privado e obter investimentos que supram as demandas desde as áreas de
segurança pública, saneamento básico até as de infra-estrutura viária ou elétrica.
A parceria público-privada (PPP) foi instituída pela Lei Federal 11.079, de 30
de dezembro de 2004, como norma de caráter geral, dada a competência constitucional
privativa da União, prevista no inciso XXVII do art. 22, para legislar sobre licitação e
contratação, em todas as modalidades.
Como norma geral, aplica-se, portanto, obrigatoriamente à Administração
Direta e Indireta de todos os entes federativos, muito embora estes permaneçam com a
opção de editar de suas próprias leis, adequando o procedimento às peculiaridades de
cada região, sem conflitar com o comando geral da Lei federal. Assim o fez, dentre
tantos outros, o Estado do Rio de Janeiro, publicando sua Lei nº 5.068, de 10 de julho de
2007, que institui o Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas.
Nesse ponto, importante lição é extraída de Gasparini (2006, p.33),
considerando que nem todos os entes federativos possuem lei de parcerias para
fundamentar suas licitações:
Essa ausência legislativa, ainda que dificulte, não proíbe a celebração de parcerias público-privadas pelos entes federados, pois se valerão da Lei federal das PPPs, tal como hoje ocorre em termos de licitação, inclusive com a modalidade pregão (GASPARINI, 2006, p.33)
A Lei de PPP buscou, tanto quanto possível, preservar e aproveitar o arcabouço
legal e institucional montado ao longo dos anos 90 para realização dos processos de
20
desestatização, incorporando inovações e aperfeiçoamentos. (PRADO; RIBEIRO,
2007).
Por oportuno, vale observar que desestatização não é sinônimo de privatização.
A relação é de gênero (desestatização) e espécie (privatização). Outras espécies de
desestatização são: a concessão, permissão, terceirização e gestão associada de funções
públicas. O que vale dizer que “PPP não é privatização” (MOTTA, 2005, p.1008),
aproximando-se apenas de uma desestatização lato sensu.
O padrão PPP não envolve e não se envolve com a figura da privatização. Embora transfira para o setor privado a feitura de obra pública, acompanhada da execução de serviço ou tão somente esse, mediante um adequado mecanismo remuneratório (tarifário ou não), não há o repasse da responsabilidade final. Essa continua na esfera estatal, pois a obra e o serviço continuam na área de competência do poder público (CAGGIANO; LEMBO apud MOTTA, 2005, p.1008).
[...] cumpre salientar que as parcerias público-privadas não constituem uma forma de privatização. A uma, porque os bens construídos ou produzidos pelos parceiros privados serão, após o término do prazo de vigência dos respectivos contratos, revertidos para o Estado. A duas, porque, embora transfira para o domínio privado a prestação de um serviço público, não haverá o repasse da competência atribuída ao Poder Público (ZYMLER, 2005, p.9)
Conveniências de natureza econômica e jurídica levaram à definição de PPPs
como espécies de concessão (PRADO; RIBEIRO, 2007; SOUTO, 2005). Optou-se por
adotar variantes do formato-base já previsto constitucionalmente, criando-se a
concessão patrocinada e a concessão administrativa, como se depreende do conceito da
Lei 11.107/2004, a seguir:
Art. 2º [...] § 1º Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. §2º Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. §3º Não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro-privado.
21
Pela definição legal, verifica-se a obrigatoriedade da presença de
contraprestação pública nos contratos de PPP. Na concessão patrocinada a remuneração
do parceiro privado é composta pela associação de recursos públicos e receitas próprias
(tarifária), enquanto que na concessão administrativa toda a remuneração advém do
parceiro público. Em ambas as modalidades, há a vantagem do início efetivo do
pagamento das contraprestações públicas só ocorrer quando o serviço ou parcela fruível
deste estiver disponível, mesmo que para isso seja precedido de obras pelo parceiro
privado.
A concessão patrocinada é, juntamente com a concessão comum, espécie do
gênero concessão de serviço público. Por isso, a ela se aplica o regime da legislação
geral desse gênero de contratos (a Lei de Concessões e outras correlatas, como a Lei
federal 9.074/1995), em complemento às normas da Lei das PPPs. Destinam-se a
serviços públicos de interesse econômico, remunerados por tarifa. O que peculiariza a
concessão patrocinada, nesse aspecto, é seu regime remuneratório, que deve incluir
obrigatoriamente tanto tarifa cobrada dos usuários como contraprestação pecuniária do
poder concedente por não ser autossustentável.
Em verdade, essa modelagem já era possível anteriormente, mas em regime
jurídico diferente e apenas por exceção. As concessões comuns podem incluir o
adicional de tarifa, mas como receita alternativa ou complementar prevista no edital de
licitação, desde que não envolva pagamento de natureza pecuniária do poder
concedente. Ainda nas concessões comuns, o cabimento de vantagens ou subsídios não
é de todo vedado, havendo justificativa cabal devem ser autorizados por lei especifica.
(art. 17, da Lei 8.987/95 e art. 35 da Lei 9.074/95). Já na PPP o subsídio é aceito
contratualmente, afinal já foi regulado na própria norma geral, logo, não depende de lei
específica. A exceção disso somente se dá quando mais de 70% (setenta por cento) da
remuneração do parceiro privado na concessão patrocinada for paga pela Administração
Pública, devendo então ser precedidas de autorização legislativa específica.
22
A questão antes aposta poderia levar a se pensar na seguinte hipótese: no curso
de uma concessão comum, o aparecimento da Lei de PPPs poderia permitir a sua
conversão em concessões patrocinadas? A reflexão é válida, em face da possibilidade de
que existam concessões comuns nas quais seja conveniente o estabelecimento de
contraprestação pública como instrumento para reequilibrar o contrato.
A resposta é encontrada nos ensinamentos de Prado e Ribeiro (2007) que
concluem por não haver cabimento de tal hipótese. A natureza jurídica, a diversidade
dos procedimentos e a justificativa econômica dos institutos impedem a transformação.
Se, na concessão comum, há necessidade de complementação das tarifas por
contraprestação pública significa que este instrumento teria a finalidade de reequilibrar o
contrato. Tradicionalmente o reequilibrio econômico financeiro de concessões comuns
dá-se pela modificação das tarifas, dos investimentos exigidos do concessionário ou do
prazo do contrato. A obtenção de pagamento pela Administração Pública em face de
desequilíbrio econômico-financeiro do contrato só é possível sob a forma de
indenização. Nas PPPs, o pagamento da contraprestação, a rigor, não é mecanismo
indenizatório, e sim pagamento por um serviço, o que torna seu regime bastante diverso
do regime das indenizações.
Corroboram tal assertiva os mecanismos de controle do impacto da
contraprestação pública nas metas de resultado fiscal e na dívida pública, previstos na
Lei de PPPs (art. 6º, parágrafo único, art. 7º e art.10). Ademais, o regime das concessões
patrocinadas vincula o pagamento da contraprestação ao cumprimento pelo
concessionário de índices de performance, o que, por óbvio, não faria sentido considerar
nos pagamentos de indenização, vez que estaria vinculado a um prejuízo causado e não
a um serviço prestado. Ressalte-se ainda que, não há espaço para argumentar que a
indenização poderia ser entendida como um pagamento por serviços prestados, na
medida em que o concessionário tenha mantido a prestação de serviços enquanto o
contrato corria desequilibrado. Seria como estabelecer uma recompensa pelo serviço
prestado, o que não se coaduna com o princípio da continuidade da prestação dos
serviços públicos, apanágio por excelência do regime das concessões, dado a sua
essencialidade para a sociedade. Além do que, a previsão desse mecanismo de
23
reequilíbrio desde a origem no contrato só é possível na PPP (PRADO; RIBEIRO,
2007)
Se não bastasse, pode-se ressaltar que o mecanismo de pagamento de
contraprestações públicas constitui aspecto importante de diferenciação do marco legal
das PPPs com relação ao das concessões comuns, no qual, conforme dito, apenas por
exceção e por autorização legislativa específica poderia ocorrer. Não seria razoável
supor que o Legislador, ao elaborar a Lei de PPP, tivesse pretendido retirar a eficácia, ao
menos parcialmente, dos citados artigos 17 e 35, permitindo que um simples aditivo
contratual tivesse o condão de transformar um contrato de concessão comum em PPP,
elidindo o requisito de lei específica para pagamento de subsidio à prestação de um
serviço. Se assim fosse, melhor seria tê-los revogado, o que não ocorreu. Logo,
respeitado os princípios de hierarquia das normas e paralelismo das formas, contratos
não derrogam o disposto em lei. Donde se conclui “não nos parecer cabível a
transformação, no âmbito administrativo, de concessão comum em patrocinada”
(PRADO; RIBEIRO, 2007, p. 86).
Os cuidados de responsabilidade fiscal na adoção de compromissos também já
existiam em dispositivos da Lei 4.320/1964 e da Lei Complementar 101/2000, o que a
Lei de PPP fez, foi reafirmar essas exigências dentro de seu texto e criar limites
específicos para as despesas com contratos de PPP, em reforço à responsabilidade fiscal
(SUNDFELD, 2005).
Já a concessão administrativa não existia. A Lei de PPP introduziu “dois tipos
de concessão administrativa: a de serviços públicos e a de serviços ao Estado”.
(SUNDFELD, 2005, p.29). Observe-se que tais expressões não são utilizadas pela Lei
de PPP, respeitando-se aqui a didática do referido autor.
A “concessão administrativa de serviços públicos” (SUNDFELD, 2005, p.29) é
aquela em que, tendo por objeto os serviços públicos a que se refere o art. 175 da CF,
estes sejam prestados diretamente aos administrados sem a cobrança de qualquer tarifa,
remunerando-se o concessionário por contraprestação pecuniária do concedente, em
conjunto, ou não, com outras receitas alternativas. Nesse caso, embora os administrados
24
sejam os beneficiários imediatos das prestações, a Administração Pública será havida
como usuária indireta, cabendo a ela os direitos e responsabilidades econômicas que, de
outro modo, recairiam sobre eles.
A “concessão administrativa de serviços ao Estado” (SUNDFELD, 2005, p.30)
é a que tem por objeto os mesmos serviços a que se refere o art. 6º da Lei nº 8.666/1993,
isto é, o oferecimento de utilidades à própria Administração, que será havida como
usuária direta dos serviços e versará a correspondente remuneração. É certo que as
características ímpares dos contratos de serviços da PPP, mesmo por sua indispensável
complexidade, vão diferenciar esta modalidade concessória dos simples contratos
administrativos de serviços da Lei de Licitações, cujo objeto se restringe ao
fornecimento. Há de se lembrar, por exemplo, da vedação legal de que os contratos de
PPP tenham por objeto único uma obra, um fornecimento de bens ou de mão de obra, ou
seja, assim, sempre haverá a realização de investimentos pelo concessionário, para
criação, ampliação ou recuperação de infraestrutura, que depois passará à sua operação e
gestão de serviço, sendo amortizados no prazo do contrato, em montante de, ao menos,
R$ 20 milhões. Contrata-se sempre um “pacote de serviços” (SOUTO, 2005, p. 29).
Note, obrigatório é ter o serviço, o restante é que não poderá estar desvinculado dele.
Cabe notar, portanto, que a concessão administrativa é reservada para os casos
de serviços públicos instrumentais, em que a própria Administração é usuária; ou para
serviços sociais, que não comportam exploração econômica pelo Estado, como saúde e
educação. Há mesmo os casos em que é possível a transferência parcial do serviço, que
não envolva a delegação de autoridade, admitindo-se o “fracionamento do serviço
público, como, por exemplo, o tratamento final de resíduos sólidos, que é parte do
serviço de limpeza urbana em que não há contato direto do prestador com o usuário”
(SOUTO, 2005, p.34). Na linha de possibilidade de delegação parcial, a Lei de PPP
acolhe entendimento, no sentido de vedação da atribuição ao setor privado de funções
de regulação, de jurisdição e de poder de polícia.
Importante disso é que não impede que alguns aspectos instrumentais do
exercício de funções típicas do Estado possam ser transferidos para particulares. Embora
os papeis e responsabilidades, dos setores público e privado, possam variar em cada
25
projeto, o papel formal e as responsabilidades específicas do governo não mudam. “Não
se trata de uma substituição de decisões governamentais, já que a Administração Pública
jamais renuncia ao seu poder de decisão” (MOTTA, 2005, p.1004). Cite-se, como
exemplo, a delegação da construção e operação de um presídio, mas sem transferir as
funções que exijam o uso de autoridade, como ocorreu em Minas Gerais. Nessa mesma
linha, é possível contratar a gestão de escolas, sem renunciar à definição do projeto
acadêmico; contratar o uso de scanners para cargas e câmaras fotográficas e de
filmagem privados em rodovias, cabendo a definição dos parâmetros técnicos de
operação do equipamento e a lavratura do auto ao Poder Público (SOUTO, 2005).
A novidade da PPP em relação às concessões, permissões, terceirizações, convênios, termos de parceria e contratos de gestão estaria em celebrar contratos em que o Estado transfira para o particular a obrigação de realizar investimentos a serem posteriormente recuperados pelo resultado da atividade fornecida – por exemplo, a vaga na escola e a vaga no presídio e não a construção da escola ou do presídio, pois isso estaria ligado à idéia de investimento. O que se quer é o serviço, tratado como custeio. (SUNDFELD, apud SOUTO, 2004, p. 433)
1.2.5 Características gerais dos contratos de PPP
Pelo sobredito, algumas características essenciais aos contratos de PPP podem
ser extraídas, bem como outras podem ser acrescentadas pela leitura da própria Lei nº
11.079/2004.
Projetos com as seguintes características contratuais são elegíveis para PPP:
• prestação de serviços associada a investimentos de grande monta, podendo
incluir obras, mão-de-obra e fornecimento de material/insumos;
• contratos não autossustentáveis financeiramente, mas com significativas
externalidades positivas, requerendo contraprestações públicas;
• valor do contrato superior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais);
26
• prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos
investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e
cinco) anos, incluindo eventual prorrogação;
• remuneração pelo parceiro público ao parceiro privado somente após a
disponibilização do serviço;
• remuneração variável pelo parceiro público ao parceiro privado vinculada ao
seu desempenho;
• repartição objetiva de risco entre o parceiro público e o parceiro privado;
• adimplência das obrigações financeiras do parceiro público relativamente ao
parceiro privado assegurada através de um sistema de garantias.
A presença destas características nem sempre significa que a PPP é uma opção
viável ou que possa contemplar todo tipo de contrato administrativo, na medida em que
esse regime implica em compromissos vultosos e de maior prazo, que, se assumidos
indiscriminadamente, podem prejudicar seriamente a disciplina fiscal. Mas, quando elas
estão presentes, a possibilidade do projeto ser implementado na modalidade PPP deve
ser devidamente considerada.
Por conseguinte, decidido que um determinado projeto é prioritário para o ente
público, o que deve ser ponderado com base nas consequências positivas para a
sociedade e na análise econômica preliminar, comparativa aos demais projetos do
governo; o passo seguinte deve ser verificar a conveniência e oportunidade de sua
realização na forma de PPP. Não é recomendável a delegação de um serviço se seu
escopo, metas, resultados, não podem ser especificados adequadamente em contrato. A
verificação disso deve ser feita tanto quantitativamente como qualitativamente, vez que
algumas vantagens da contratação das PPPs dificilmente podem ser reduzidas a
números, senão por meio de levantamentos intrincados ou, mesmo, impossíveis de se
fazer. Na experiência internacional, especialmente a inglesa, esse tipo de análise é
conhecido por value for money. Verifica-se, então a disponibilidade de recursos para o
27
Poder Público para contratação de PPP e o limite disponível para aumento do
endividamento (PRADO; RIBEIRO, 2007).
A Lei de PPP estabelece a obrigatoriedade da realização de estudos técnicos
relacionados ao projeto eleito e estudos sobre o impacto fiscal, fundamentando a decisão
pelo modelo concessório. Nesse iter, alguns estudos tornam-se necessários, tais como o
estudo de demanda pelo serviço; definição dos elementos do projeto básico
(patrocinadas) ou mesmo o projeto básico (administrativas); estudos ambientais (quando
aplicável); e, estudo da viabilidade econômico-financeira, que levará em conta os
estudos retrocitados. E, mais ainda, deverá integrar a modelagem econômico-financeira
a matriz de riscos do projeto e estudos jurídicos validando seu cabimento e abordando,
dentre outros aspectos, os relativos às formas de mitigação de riscos do projeto.
Na consolidação desses estudos técnicos deverão constar elementos que
permitam verificar os seguintes pontos, a teor do que dispõe a Lei de PPP do Estado do
Rio de Janeiro (Lei nº 5.068/2007), em consonância com os ditames da Lei Federal:
• atendimento ao efetivo interesse público, considerando a natureza, relevância
e valor de seu objeto, a conveniência e a oportunidade da contratação, bem
como o caráter prioritário da respectiva execução, observadas as diretrizes
governamentais;
• obtenção de vantagem socioeconômica e operacional com a proposta e de
melhoria da eficiência no emprego dos recursos públicos, comparativamente
a outras possibilidades de execução direta ou indireta, em especial, às
concessões regidas pela Lei nº 8.987/95;
• indicação das metas e resultados a serem atingidos, bem como dos critérios
de avaliação ou desempenho a serem utilizados;
• efetividade dos indicadores de resultado a serem adotados, em função de sua
capacidade de aferir, de modo permanente e objetivo, o desempenho do ente
privado em termos qualitativos e/ou quantitativos, bem como de parâmetros
que vinculem o montante da remuneração aos resultados atingidos;
28
• viabilidade econômico-financeira, compreendendo, no mínimo, o estudo de
demanda, matriz de riscos, forma e prazos de execução e de amortização do
capital a ser investido pelo contratado, explicitando o fluxo de caixa
projetado e a taxa interna de retorno do projeto (incluindo recursos públicos
e privados);
• estudos fiscais e orçamentários previstos na Lei Complementar nº 101/2000
(Lei de Responsabilidade Fiscal), na forma do requerido pelo art. 10, I,
alíneas ‘b’ e ‘c’, da Lei Federal n.º 11.079/04;
• estudos jurídicos relativos aos principais riscos do projeto e formas de
mitigá-los, pareceres e opiniões legais sobre aspectos específicos de acordo
com a complexidade do projeto; minutas do edital e do contrato;
Verifica-se no exposto, a complexidade e importância da realização dos
Estudos Técnicos e Fiscais para a gestão pública responsiva e eficiente, comprometida
com a eficácia do resultado, no enfrentamento do longo tempo necessário para a
maturação de um projeto de PPP e na articulação dos diversos atores que devem ser
envolvidos para o êxito do processo.
A eficiência é a principal razão para a contratação das PPPs, sendo mesmo
abordada como a primeira diretriz da contratação pela norma geral. Assim, a PPP só se
justifica quando os ganhos globais de eficiência esperados a partir dessa formatação
contratual superem os custos a serem incorridos na sua estruturação e no
acompanhamento, fiscalização e regulação do contrato (PRADO; RIBEIRO, 2007).
1.2.6 Características diferenciais dos contratos de PPP
A extensão do assunto vis-à-vis a delimitação do ambiente em que se coloca o
presente trabalho força ao destaque de algumas das muitas características diferenciais
dos contratos de PPPs, elegendo-se para tanto, a contraprestação pública, a partilha de
riscos, o sistema de garantias e a arbitragem.
29
1.2.6.1 As contraprestações públicas
A contraprestação pública, presente nos contratos de PPP, foi assim
denominada por caracterizar os pagamentos da Administração Pública como
contrapartida à aquisição de serviços. Nesse sentido, o regime de PPPs exige que os
pagamentos públicos estejam vinculados à disponibilização de serviços ou à sua efetiva
prestação (PRADO; RIBEIRO, 2007; SOUTO, 2005).
Conforme enumera o Art. 6º da Lei 11.079/2004, as contraprestações da
Administração Pública nos contratos de PPP podem ser feitas por:
I - ordem bancária; II - cessão de créditos não tributários; III - outorga de direitos em face da Administração Pública; IV - outorga de direitos sobre bens públicos dominicais; V - outros meios admitidos em lei.
Atente-se que, especificamente em relação às concessões patrocinadas, por
representarem desafios especiais de ordem financeira, a definição legal impõe a
presença de contraprestação pecuniária (Art. 2º, §1º, da Lei de PPPs), mesmo que
complementadas pelas não-pecuniárias. Nesse sentido, adicionalmente à tarifa, as
contraprestações pecuniárias do parceiro público ao privado limitam-se às formas
previstas nos incisos I e II do referido art. 6º, quais sejam: ordem bancária e cessão de
créditos não-tributários. As demais formas contidas nos incisos III e IV são entendidas
como não-pecuniárias, podendo somar-se às pecuniárias. É o que adverte Sundfeld
(2005, p. 28):
Essas receitas, em princípio, enquadram-se no conceito de receitas alternativas, a que alude o art. 112 da Lei de Concessões. O mero fato de um concessionário recebê-las não faz de seu contrato uma concessão patrocinada, pois esta só se configura quando a Administração versa uma “contraprestação pecuniária”; do contrário será “comum”. De outra parte, estando presentes a cobrança de tarifas aos usuários e a contraprestação pecuniária do concedente, estar-se-á diante de uma concessão patrocinada, ainda que o concessionário também receba contraprestação não-pecuniária da Administração (a dos incisos III e IV do art. 6º da Lei de PPPs) e outras receitas alternativas.
30
O mesmo não ocorre em relação às concessões administrativas. Para estas, a lei
não exige que as contraprestações da Administração sejam em pecúnia, podendo adotar
quaisquer das formas contidas no art. 6º, de forma isolada ou combinada entre seus
incisos. “A única forma de remuneração que descaracterizaria a concessão
administrativa é o recebimento pelo concessionário de tarifa dos administrados
especificamente para remunerar seus serviços” (SUNDFELD, 2005, p.33).
É preciso assinalar que qualquer que seja a forma eleita para a realização da
contraprestação, ela deve ser construída sob critérios técnicos por influenciarem
diretamente na modelagem do contrato e na definição da modalidade concessória, como
deve estar prevista, de forma mais detalhada possível, no edital de licitação por afetar
sensivelmente a proposta financeira do parceiro privado. Lembrando ainda, que a
remuneração é variável, sofrendo a incidência de indicadores de performance, sendo
estes um conjunto de parâmetros, medidores da qualidade dos serviços prestados, que
contribuem para determinar o valor da contraprestação efetivamente devida pelo poder
público e que auxiliam no controle de resultados, conforme o exigido na Lei de PPP e o
determinado no contrato.
“A forma da contraprestação constitui um dos elementos fundamentais para
definição do perfil do projeto e do exato esquema de distribuição de riscos entre as
partes” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p. 185).
1.2.6.2 A repartição de riscos
Em relação à partilha de riscos, são dois os dispositivos da Lei 11.079/2004
que tratam expressamente da repartição de riscos.
Art. 4º. Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes: [...] VI – repartição objetiva de riscos entre as partes. Art. 5º. As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: [...] III – a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária.
Bem se vê que, embora a Lei determine a fixação dos riscos, não impõe
critérios para tal divisão entre o parceiro público e o privado. Considerando inexistir
31
uma divisão natural de riscos, esta dependerá dos estudos de viabilidade econômica e
fiscal, bem como da equação formada pelos encargos e remuneração do concessionário.
Assim, a distribuição de riscos é a principal função de qualquer contrato.
“Trata-se de antecipar e atribuir a cada uma das partes a obrigação de assumir as
conseqüências futuras” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p.117). Ao fazê-lo, gera-se incentivo
para as partes adotarem, por um lado, providências para evitar ocorrências ou
consequências que lhes sejam gravosas; e, por outro, estímulo a agirem com o objetivo
de realizar situações que lhes são benéficas. Cite-se como exemplo, no caso da
concessionária, a melhoria da qualidade do serviço visando ao aumento da demanda, e,
portanto, das suas receitas operacionais (SOUTO, 2005; SUNDFELD, 2005).
“Vale notar que o custo de uma PPP será tanto maior para os destinatários do
serviço e para a Administração quanto maior for a percepção de risco pelos parceiros
privados” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p.95). Quanto mais confusa a divisão dos riscos,
mais elevado o preço que o parceiro privado cobrará para a implementação do projeto,
porque a dúvida sobre a quem é atribuído um dado risco leva o parceiro privado a
considerá-lo como dele, em sua proposta, num cenário pessimista que não
necessariamente venha a ocorrer (PRADO; RIBEIRO, 2007).
Pesquisa realizada na Inglaterra demonstra que 60% dos ganhos obtidos com a contratação de PPPs em comparação às formas tradicionais de implantação dos empreendimentos provêm da adequada repartição de riscos (cf. Value for Money Drivers in the Private Finance Iniciative – A Report by Arthur Andersen and Enterprise LSE, Commissioned by The Treasury Taskforce, 17.1.2000) (PRADO;RIBEIRO, 2007, p. 103)
A repartição objetiva dos riscos apresenta inegável impacto econômico
(SOUTO, 2005), tanto por sua relevância para a adequada composição das propostas
técnica e econômica pelo parceiro privado, quanto para a higidez fiscal do Poder
Público, tendo em vista que, a depender do sistema de distribuição de riscos adotado no
contrato, podem restar com o Poder Público passivos contingentes, e isso deverá estar
adequadamente refletido na contabilidade pública, de modo que o passivo, embora
contingente, não reste oculto (PRADO; RIBEIRO, 2007).
32
Ainda do ponto de vista do Poder Público, a minimização da existência de
riscos ou a sua distribuição através de mecanismos implícitos no contrato podem
resultar em efeito contrário ao inicialmente pretendido. Riscos são eventos da realidade,
não se pode simplesmente eliminar sua existência, pois, em ocorrendo, alguma das
partes, nesta incluída a sociedade, terá que arcar com as consequências gravosas do
evento. Essa preocupação deve incidir especialmente sobre a definição dos critérios para
o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, pois, a depender da forma como eles
forem configurados, riscos que foram transferidos, implícita ou explicitamente, no corpo
do contrato para os parceiros privados podem retornar para a Administração Pública. O
sistema de distribuição de riscos e o mecanismo de recomposição do equilíbrio
econômico-contratual, embora distintos, devem ser pensados de forma conjunta, como
instrumentos que se destinam a maximizar a eficiência da contratação. (PRADO;
RIBEIRO, 2007).
Ressalte-se que a parte final do art. 5º, III, menciona que todos os riscos de uma
PPP podem ser repartidos entre as partes, inclusive os “referentes a caso fortuito, força
maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária”. Isso significa que a
Administração tem a opção de transferir até mesmo riscos que fogem ao controle do
parceiro privado, como força maior, o que de fato não ocorre no regime da Lei nº
8.666/1993.
É inconteste que identificar a alocação de riscos mais eficiente não é uma tarefa
fácil, exigindo uma série de informações técnicas, nem sempre disponíveis. Além disso,
a repartição de riscos não é a mesma em todos os projetos, podendo variar a cada caso, a
depender do tipo de serviço contratado. Tanto assim, Marcos Barbosa Pinto (2006, p.
168), com base na teoria econômica do direito sobre a minimização de custos de
acidentes e na experiência internacional, sugere algumas diretrizes básicas como ponto
de partida para balizar as decisões na alocação de riscos, a seguir:
[...] A primeira diretriz é bastante intuitiva: os riscos de uma PPP devem ser alocados para a parte que puder, a um custo mais baixo, reduzir as chances de que o prejuízo venha a se materializar ou, não sendo isso possível, mitigar os prejuízos resultantes. Normalmente, essa parte é aquela que tem maior controle sobre os riscos em questão ou sobre suas conseqüências. [...]
33
A segunda diretriz nos aconselha a não atribuir riscos para agentes econômicos que podem externalizar suas perdas. Com efeito, o incentivo que se pretende criar atribuindo riscos a uma das partes não funciona quando se pode transferir os prejuízos para terceiros. Essa regra indica claramente que, na maior parte dos casos, o Estado não é um bom absorvedor de riscos, já que ele pode transferir todos os seus custos para os contribuintes. Logo, as perdas sofridas pelo Erário não induzem a uma administração mais eficiente de custos. A terceira diretriz é mais controversa. Em tese, se uma das partes pode obter seguro contra determinados riscos a um custo mais baixo, deveríamos atribuir a ela esses riscos. Todavia, a comparação de prêmios de seguro é difícil nas PPPs, pois o Estado raramente contrata seguro, dado o tamanho de seu patrimônio e a diversidade de suas atividades. [...]. É impossível confirmar essa proposição sem dispor de dados empíricos precisos. [...], no entanto, podemos formular a seguinte diretriz intermediária: o custo de seguros não deve influenciar a alocação de riscos em uma PPP, exceto nos casos em que os riscos correspondentes não encontrem cobertura no mercado, ou cujos prêmios sejam proibitivos. Nesses casos, é mais eficiente que o Estado assuma o risco em questão [...]. A quarta diretriz é uma regra prudencial. Sempre que não for claro qual é a alocação de riscos mais eficiente, devemos alocar os custos para a parte sobre a qual eles recaem naturalmente. [...] Desta forma, evitam-se os custos indiretos relacionados a compensações econômicas, [...] e o custo de eventuais compensações indevidas resultantes de comportamento oportunista.
Há, de fato, alguns riscos típicos da PPP. Exemplificativamente, podem ser
citados, como gerenciáveis pelo particular: riscos da variação de custos, da construção,
operação, rendimento, tecnologia e competição; e, que devam ser suportados pelo
Estado: riscos políticos, de interpretação judicial, de disponibilidade financeira, de
relações internacionais (SOUTO, 2005). Já em relação aos riscos de demanda, a
alocação varia conforme o tipo de serviço contratado. “Sempre que as ações de uma das
partes puderem levar a um aumento ou diminuição da procura pelo serviço, o risco de
demanda deve recair sobre ela.” (PINTO, 2006, p.171) E, ainda, com relação ao risco de
caso fortuito ou força maior, a solução mais indicada, seguindo as diretrizes de Marcos
Barbosa Pinto (2006) é a alocação para o setor privado sempre que houver cobertura
securitária.
1.2.6.3 A sociedade de propósito específico
Ainda no âmbito da segregação de riscos, ora entre o negócio concedido e a
pessoa do contratado, vale mencionar a obrigatoriedade da constituição de sociedade de
34
propósito específico (SPE), como condição prévia para assinatura do contrato, pelo
concessionário responsável em implementar e gerir uma PPP. Esta pode assumir forma
de capital aberto, e deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar
contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, definidas em regulamento.
Entretanto, é proibido à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante,
exceto se por instituição financeira controlada pelo Poder Público, em caso de
inadimplemento de contratos de financiamento. A SPE é encarregada de gerir,
separadamente, as receitas e despesas do projeto de PPP, de modo que o investidor não
precisa temer outras atividades ou a vida pregressa do contratado. Trata-se de medida já
empregada nos contratos de concessão, só que de forma facultativa, que viabiliza ao
investidor ser proprietário da receita alienada ou de ações da companhia contratada, ou
ainda, de títulos garantidos pela renda do negócio. A transferência do controle da SPE
estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública (SOUTO, 2005).
1.2.6.4 O sistema de garantias
Outra característica relevante das PPPs é a maior segurança oferecida tanto ao
executor do projeto quanto aos seus financiadores, através de um sistema de garantias,
que deverá se desenvolver com observância de critérios estabelecidos na Lei
Complementar, nº. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) e de forma
compatível com as obrigações assumidas.
Como nos contratos de PPPs existe uma vinculação de recursos orçamentários
no longo prazo, mas inexiste uma cultura consolidada por todos os governantes, no
sentido de honrar as obrigações assumidas, torna-se necessário resguardar o contratado
quanto ao risco de não pagamento das contraprestações pela Administração Pública.
Além disso, conforme salientado, a contraprestação pública somente terá início quando
o serviço objeto do contrato estiver em funcionamento. Por conseguinte, o parceiro
privado, dependerá, em regra, de financiamento obtido junto a terceiros.
Para viabilizar tal iniciativa a Lei de PPP prevê diversas formas de constituição
de garantia de cumprimento das obrigações pecuniárias assumidas pelo parceiro público
perante o parceiro privado, bem como possibilita a contragarantia prestada pelo parceiro
35
público à entidade financiadora do projeto. Por óbvio que também haverá a garantia de
execução do contrato, prestada pelo parceiro privado ao parceiro público (DI PIETRO,
2008).
Assim, para assegurar o fluxo de pagamentos do concessionário e, por
consequência, a continuidade dos serviços contratados, a garantia prestada pelo parceiro
público ao parceiro privado, poderá abranger as seguintes modalidades previstas no art.
8º da Lei 11.079/2004, além de outros mecanismos admitidos em lei:
(i) Vinculação de Receitas Públicas; valendo lembrar que tal vinculação não
poderá ter por objeto a receita de impostos, com as ressalvas contidas no art. 167, IV,
CF, ou seja, a contrario sensu do dispositivo constitucional, todas as demais receitas,
em tese, poderão ser oferecidas em garantia, exceto as que tenham uma destinação legal
específica, como é o caso de taxas, que devem ter suas receitas naturalmente vinculadas
à execução de determinadas despesas, para cobrir custos necessários à prestação de
serviços públicos ou ao exercício do poder de polícia; e da mesma forma as
contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, que, em regra, têm suas
receitas vinculadas a uma determinada destinação.
Entretanto, segundo observam Prado e Ribeiro (2007, p. 221), “[...] na garantia
por meio de vinculação de receitas, inevitavelmente, sujeitar-se-á o parceiro privado ao
pagamento por meio de precatório, se tiver que executar seu crédito”. Dessa assertiva,
verifica-se que a vinculação não é uma forma de garantia, segundo o significado
ordinariamente associado a esse termo. Como bem afirmam, seria apenas a indicação de
uma fonte específica de receitas que vinculadas garantem a destinação específica, ou
seja, uma garantia orçamentária. Assim, “se o pagamento não ocorrer, não há garantia
de ser acionada, eis que embora a garantia vincule a receita, não obriga a realização da
despesa” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p. 221). Contudo, a vinculação de receitas, reforça
a inclusão na Lei Orçamentária Anual das previsões orçamentárias para pagamento das
contraprestações públicas, isso porque não seria possível dar outra destinação a essa
receita sem revogar a norma que estabeleceu sua vinculação, o que de certa forma
funciona como incentivo para utilizar a receita na destinação prevista, evitando a disputa
política sobre sua destinação na passagem pelo Legislativo (PRADO; RIBEIRO, 2007).
36
(ii) Instituição ou utilização de Fundos Especiais previstos em lei,
submetendo-se às mesmas vedações do artigo 167, IV da CF e as mesmas observações
dos autores supracitados: por se tratar de garantia orçamentária, submete-se ao regime
de precatórios.
O fundo especial, seja de natureza contábil ou financeira, constitui uma forma
de segregação de recursos orçamentários, dentro do próprio orçamento público, para
destinação específica. Por constituir patrimônio do próprio ente que o instituiu, e não ter
personalidade jurídica própria, as garantias prestadas por fundo especial serão
consideradas como prestadas pelo ente instituidor, pessoa com a qual juridicamente se
contrata a garantia, logo, será uma garantia pessoal. Implica dizer que “a prestação de
garantia por fundo especial apenas faz sentido quando o parceiro público não for o
próprio ente criador do fundo, eis que, nessa hipótese, seria como dar garantia de si
mesmo” (PRADO; RIBEIRO, 2007, p.228). Trata-se, sobretudo, de uma “forma de
planejamento e de execução orçamentária, por meio de vinculação de receitas a
determinadas finalidades”, ou seja, a vinculação de receita daquele determinado fundo
destina-se a um único contrato, com a característica adicional de permitir que, ao final
do ano, o saldo não utilizado permaneça na conta do fundo e não retorne ao caixa único
do Tesouro, o que pode vir a resvalar em mecanismo de burla às restrições
orçamentárias, necessitando, portanto, da instituição de mecanismos de controle pela
própria lei que o constituir (PRADO; RIBEIRO, 2007, p.227).
(iii) Contratação de Seguro-Garantia com companhias seguradoras que não
sejam controladas pelo Poder Público, valendo observar que, se de um lado, a outorga
de seguro-garantia é bem visto pelos parceiros privados, por permitirem uma fácil e
rápida execução da garantia, bastando, por vezes, o seu mero acionamento; de outro,
para o Poder Público pode não ser o mais conveniente, considerando a dificuldade no
mercado de existir seguradoras dispostas a assumir o risco de não-pagamento de
contraprestações públicas, ainda mais quando contratadas pelo próprio ente público
contra o seu risco de inadimplência em contratos longos; e, de certo, em havendo,
exigiriam um prêmio de risco excessivamente elevado (PRADO; RIBEIRO, 2007).
Outra desvantagem é que “exige o desembolso no momento da contratação” (SOUTO,
37
2005, p.47). O seguro-garantia não é uma inovação das PPPs, sendo um instrumento
jurídico largamente utilizado nos contratos de empreitada regidos pela Lei nº
8.999/1993. Há que se considerar, ainda, que a possibilidade de inclusão dos
financiadores do projeto como beneficiários do seguro pode configurar importante
instrumento de garantia nos financiamentos a serem contratados, podendo, até mesmo,
reduzir os custos da operação a ser contratada. Cabe, portanto, ponderar a escolha por
essa modalidade com base na relação custo/benefício.
(iv) Garantia prestada por Organismos Internacionais ou Instituições
Financeiras que não sejam controladas pelo Poder Público, valendo observar que tem
sido comum o desenvolvimento por organismos multilaterais, nos moldes do Banco
Mundial ou do Banco Interamericano de Desenvolvimento, de produtos nessa linha de
garantias, recebendo como contragarantia dos entes públicos, o aval soberano. Há de
fato, preferência pelos parceiros privados por essa estruturação de garantia, entretanto,
isso imputa para o poder público um custo adicional na implementação de cada projeto,
pois há de ser pago ao organismo multilateral alguma taxa para assumir a diferença
entre o risco soberano e o seu risco de crédito, que é usado como garantia. Observa-se,
mais uma vez, a relação custo/benefício: se a redução na contraprestação superar o custo
da garantia emitida pelo organismo multilateral, será vantajoso contratá-la (PRADO;
RIBEIRO, 2007). Os organismos internacionais de fomento, em alguns casos, também
financiam recursos para a criação de unidades de PPP, para sustentar fundos ou projetos
específicos (SOUTO, 2005).
(v) Garantias prestadas por Fundo Garantidor ou Empresa Estatal criada
para essa finalidade; valendo observar que, diferentemente dos fundos especiais,
mencionados no item (ii) retro, o fundo garantidor tem natureza sui generis, que mais se
aproxima de um fundo de investimento, composto de patrimônio próprio, e não
simplesmente reservas contábeis. E, quanto à garantida prestada por entidade da
Administração Indireta, é uma das mais amplas formas previstas na Lei de PPP, visto
que poderá a garantia concedida tomar quaisquer das formas dentre as legalmente
admitidas, mas que será constituída através de uma empresa estatal, sob a édige do
direito privado, portanto, com maior flexibilidade em sua atuação e na gestão de seus
38
bens, o que em tese a leva a optar pela forma de constituição de garantia melhor aceita
pelos padrões de mercado vigentes, quando da contratação da PPP e em função do
objeto do contrato. Acrescente-se, ainda, que em razão da personalidade jurídica de
natureza privada, o patrimônio torna-se alienável e penhorável, podendo ser também
oferecido em garantia.
Ademais, por serem entidades de Direito privado, as empresas estatais ou
fundos garantidores não se sujeitam ao regime de precatórios consagrado no art. 100 da
CF, recaindo a execução diretamente contra seus respectivos patrimônios. Esse
expediente facilita consideravelmente a aceitabilidade do sistema de garantias
constituído por empresas ou fundo garantidor, na medida em que aumentam a certeza de
recebimento dos recursos. Em quaisquer dos dois casos, a instituição depende de
autorização legislativa específica, por força constitucional.
Exemplo disso, optando por constituir Fundo Garantidor: o Governo Federal,
que aproveitou a própria lei de PPP para instituí-lo em nível federal; e Minas Gerais. E,
optando pela criação de Empresa Estatal: São Paulo com a sua CPP – Cia Paulista de
Parcerias. Em Minas, embora não conste da lei estadual que criou a CODEMIG – Cia de
Desenvolvimento Econômico um objeto específico nesse sentido, Prado e Ribeiro
(2007, p.233) entendem que isso não representa um “obstáculo intransponível” para que
possa prestar garantias.
No que tange às contragarantias prestadas pelo Parceiro Público aos
financiadores, essa também pode assumir diferentes modalidades previstas no art. 5º,
§2º, da Lei nº 11.079/2004, a saber: (i) transferência para os financiadores do controle
da sociedade de propósito específico, constituída pelo parceiro-privado; (ii)
possibilidade de emissão de empenho em nome dos financiadores do projeto em relação
às obrigações pecuniárias da Administração Pública, desde que previsto no edital e
contrato; (iii) legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por
extinção antecipada do contrato, desde que previsto no edital e contrato; (iv)
possibilidade de recebimento, pelo financiador, de pagamentos efetuados pelos fundos e
empresas estatais garantidores de PPPs.
39
1.2.6.5 A arbitragem
Considerando que as PPPs são contratos de longa duração, a ocorrência de
controvérsias ou divergências ao longo de sua execução é algo que pode ser pressentido,
mesmo porque, o Poder Público continua a ser titular de direitos que o colocam numa
posição de supremacia sobre o particular, supremacia esta que só deverá ser utilizada na
defesa do interesse público. A Lei de PPP prevê a possibilidade do uso da arbitragem ou
de outros mecanismos privados de resolução de disputas, a exemplo da conciliação ou
da mediação, o que vem a contribuir como forma de mitigação de riscos.
A interpretação doutrinária preleciona a arbitragem como método privado de
solução amigável de conflitos, não se aplicando a ela o conceito de exigência de exame
jurisdicional, pois não há renúncia. Nesse sentido, observam que o Código de Processo
Civil permite preestabelecer um critério para a solução de conflitos emergentes, e a Lei
de Concessões tem também previsão de solução amigável de conflitos, sempre buscando
o acordo que melhor atenda ao interesse público (SOUTO, 2005; PRADO; RIBEIRO,
2007).
O recurso exclusivo ao Poder Judiciário aumentaria a noção de risco, dada a
realidade dos prazos envolvidos e as obrigações assumidas pelas partes, tal
exclusividade é deixada para a seara dos direitos indisponíveis. A arbitragem, na medida
em que confere celeridade à solução, e permite que a controvérsia seja dirimida por
especialistas, vem ao encontro do desejo de todos os envolvidos, resolvida na técnica e
imparcialidade.
1.3. PPP administrativa em destaque: gestão de hospitais
Várias iniciativas de Parcerias Público-Privadas estão em processo de
modelagem e estudo técnico, outras tantas sendo licitadas ou em execução para
finalidades diversas.
Cite-se, como exemplo de contratos em vigor, na modalidade patrocinada: a
Linha 4 do Metrô de SP; a Ponte do Paiva, em Pernambuco; a rodovia MG050, em
40
Minas Gerais; e, na modalidade administrativa, o Presídio e a Unidade de Atendimento
Integrado, ambas em Minas Gerais; o emissário submarino de Jaguaribe (BA); o
esgotamento sanitário dos Municípios de Rio Claro (SP) e de Rio das Ostras (RJ).
Destaque-se, por muito oportuno, a demonstrar a credibilidade das PPPs e as
vantagens do modelo se sobrepondo aos custos e a complexidade da modelagem, alguns
aspectos da recente PPP realizada pelo Estado da Bahia para concessão administrativa
da gestão e operação do Hospital do Subúrbio, em Salvador, no contrato licitado no
início de 2010, através do Edital 008/20091 publicado no Diário Oficial do Estado da
Bahia, em 05 de dezembro de 2009, para a concorrência no modelo de pregão,
modalidade introduzida na Lei nº. 11.079/2004.
O Estado da Bahia utilizou do mecanismo da vinculação de receitas não apenas
para garantir o adimplemento, mas para o próprio pagamento das contraprestações
públicas, através da segregação de determinada parcela das receitas futuras do Fundo de
Participação do Estado – FPE (transferência obrigatória da União para os Estados, por
força do art. 159 da CF), conforme autorizado na Lei Estadual nº. 11.477, de 02 de julho
de 2009, por todo o prazo da concessão (10 anos, prorrogáveis), em nome da Agência de
Fomento do Estado da Bahia – Desenbahia (empresa estatal constituída na forma de
sociedade anônima). A sistemática de pagamento é prevista no “Contrato de Nomeação
de Agente de Pagamento e Administração de Contas”, anexo do Edital, firmado entre
Estado da Bahia, a Desenbahia e o Banco do Brasil, com a interveniência-anuência da
Secretaria da Fazenda do Estado, no qual a citada instituição financeira é constituída
gestora da conta apartada do FPE e agente pagadora das contraprestações públicas.
Na hipótese de surgimento de controvérsias, determinou-se no contrato a
utilização da arbitragem pela Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio
Internacional – CCI, a ser realizada no Estado da Bahia e utilizando-se da língua
nacional, como exige a Lei de PPP, para as questões que não puderem ser solucionadas
na esfera da Comissão Técnica (composta por membros indicados pelo Estado da Bahia,
1 Edital de Licitação nº 008/2009, da Concessão Administrativa da gestão e operação de Unidade Hospitalar do Estado da Bahia, publicado no Diário Oficial do Estado da Bahia. Disponível em: http://www.saude.ba.gov.br/hospitaldosuburbio/docs.html; acesso em 18/07/2010.
41
pela Concessionária e um membro de comum acordo entre as partes, com expertise
comprovada na matéria objeto de divergência). Há também a figura do Verificador
Independente do Contrato (já utilizada em outras modelagens, como nas PPPs de Minas
Gerais) para auditagem e apuração de indicadores de desempenho e cálculo da variação
da contraprestação mensal efetiva, além da avaliação do equilíbrio econômico-
financeiro do contrato e revisão do fluxo de caixa.
Vale dizer que o êxito da licitação muito se deve ao comprometimento dos
diversos atores envolvidos em todo o processo, tanto do setor público como do setor
privado, desde o planejamento, modelagem dos estudos técnicos, incluindo as minutas
de edital e contrato, contando com a participação ativa de consultores especializados da
Corporação Financeira Internacional (IFC – International Finance Corporation), braço
do grupo Banco Mundial, cujo trabalho restou pago pelo vencedor da licitação, através
do mecanismo de ressarcimento permitido pelo art. 21 da Lei nº 8.987/1995, também
aplicável às PPPs, por força do disposto no art.3º da Lei nº 11.079/2004. Ressalte-se que
o IFC consignou Carta de Intenções para financiamento junto ao concessionário, ao lado
de outras instituições financeiras nacionais, como o Banco Nacional de
Desenvolvimento do Estado – BNDES e do Banco do Nordeste – BNB (anexos do
Edital), ante a credibilidade do projeto.
42
CAPÍTULO II
GESTÃO ASSOCIADA DE SERVIÇOS PÚBLICOS POR
CONSÓRCIOS PÚBLICOS
2.1. Ambiência do Federalismo Cooperativo
O Estado brasileiro, no processo histórico-administrativo, encontra sua pedra
fundamental no regime federativo, a partir da instituição da República em 1889, assim
preservando-o, a despeito das transformações que vem sofrendo desde então. O
federalismo é mesmo um processo.
Segundo José Afonso da Silva (1999) a federação consiste na união de
coletividades regionais autônomas, que a doutrina chama de Estados federados,
caracterizados principalmente pela descentralização política e administrativa, o que
significa que, além do poder central e soberano, os entes integrantes são igualmente
dotados de capacidade e representação políticas, tendo sua autonomia federativa
delimitada pelo sistema de partilha de competências estabelecido na Constituição
Federal de 1988.
Se por um lado, a descentralização de competências, antes detida pelo Governo
Federal, trouxe a municipalização de serviços e deu maior autonomia às instâncias
locais favorecendo um ciclo de inovação na elaboração e implementação de políticas
públicas; por outro, acentuaram desigualdades, disputas e distorções. Forçando a
restrição de enumeração dos pretensos motivos, pode-se dizer, com apoio em Camargo
(1999), que esse descompasso deu-se, primeiro, porque não houve o proporcional
acompanhamento de receitas para suportar as novas competências; segundo, porque não
houve o concomitante acompanhamento de políticas sustentáveis de desenvolvimento
regional; terceiro, porque houve a (bem-vinda) contenção de gastos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal. Some-se ainda, a superposição de iniciativas em uma mesma
área de atuação, por parte de diferentes esferas de governo ou, a revés, a omissão em
tantas outras que não foram definidas constitucionalmente.
43
Vários doutrinadores atribuem a fragilidade institucional do federalismo
brasileiro à falta de mecanismos efetivos de articulação e cooperação na execução de
políticas públicas por parte de cada esfera de governo, e, ainda, à falta de
regulamentação de dispositivos constitucionais específicos para a distribuição de
competências, donde advém uma compartimentalização artificial das atribuições entre
essas esferas públicas (ABRUCIO, 2001).
A par disso, há a preocupação pela descentralização dos recursos entre os entes
da Federação, de forma a que Estados e Municípios tenham verba suficiente para
execução de suas competências. Aqui reside o debate do federalismo fiscal.
De nada adianta a grita pela autonomia se há a extrema dependência financeira
do repasse de recursos da União, a vinculação de receitas por expressa determinação
constitucional e a descontinuidade de pagamentos de parcelas de convênios, levando à
paralisação de obras já iniciadas. Se não bastasse, é inconteste os desvios de verbas ou
mau uso do dinheiro público, a problemática do custeio da máquina pública e a
descontinuidade de programas ao longo de sucessivos governos. Acrescente-se, que
mesmo nas administrações públicas bem intencionadas e corretas no emprego de
recursos públicos, há a carência de quadro técnico-jurídico preparado para o
enfrentamento de exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal ou mesmo para o
planejamento, modelagem, licitação e consecução de grandes projetos.
Por tudo dito, a única forma de evolução política e social é aquela através da
qual as pessoas federativas se associam para um fim comum: a evolução do próprio
Estado e o bem-estar da sociedade. A realidade do regime federativo, portanto, mesmo
precisando de amadurecimento, não pode abdicar do regime de cooperação e parceria
entre seus componentes.
Nesse sentido diferentes experiências de consorciamento foram levadas a cabo
por municípios no país, principalmente nas áreas de Saúde e Meio Ambiente.
Entretanto, a inexistência de uma legislação específica, as limitações institucionais e
inseguranças jurídicas dos desenhos utilizados pelos municípios, criando os consórcios
como um acordo de vontades sem personalidade jurídica, entre entes do mesmo nível,
44
vieram a contribuir para a inserção do debate em sede constitucional, inflamado
especialmente por uma questão-chave, o saneamento (CAMPOS; MONTENEGRO,
2009; SOUTO, 2008).
Relevou-se, então, no bojo da reforma administrativa do Estado, o mandamento
constitucional da gestão associada de serviços públicos por meio de consórcios públicos
e convênios de cooperação entre os entes federados, representando uma nova faceta do
regime de parceria pública, ampliando o leque das opções existentes.
2.2. Gestão Associada de Serviços Públicos: velhas e novas facetas
A Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, introduziu
significativas mudanças na Lei Maior do país, dentre elas, a nova redação dada ao art.
241 da Constituição Federal, para fomentar o regime cooperativo e viabilizar a
associação entre entes federados para o desenvolvimento de competências próprias ou
para a transferência de competências elegendo, para tanto, os consórcios públicos e os
convênios de cooperação entre os entes federados.
Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.
Por oportuno, a referida Emenda alterou também a redação do art. 22, XXVII
da Constituição Federal, determinando a competência privativa da União para legislar
sobre “normas gerais de contratação em todas as modalidades”.
Afinal, anos depois, em face do preceito constitucional e “na esteira de um
projeto de saneamento centralizado na União” (SOUTO, 2005, p.204), verificou-se a
necessidade de editar lei nacional contendo diretrizes comuns para a formalização da
gestão associada de serviços públicos.
45
Veio a lume, o Projeto de Lei nº 3.884/2004, que resultou na Lei nº 11.107, de
06 de abril de 2005, para tratar dos consórcios públicos, e, no passo seguinte, sua
regulamentação pelo Decreto 6.017, de 17 de janeiro de 2007.
Entretanto, conforme esclareceu Wladimir Ribeiro (2004 apud SOUTO, 2005,
p. 200), consultor especial, da Subsecretaria de Assuntos Federativos da Presidência da
República, na elaboração da Lei dos Consórcios e do respectivo Decreto
regulamentador, que a proposta do Governo Federal seria a de dispor, em sede de
normas gerais, de um contrato de constituição de consórcios públicos, respaldado nas
evidências e fragilidades apontadas pela doutrina até então, para criar “mais uma forma
jurídica, sem impedir o uso das formas atuais”.
No período anterior à vigência da Lei 11.107/2005, os consórcios e convênios
eram criados como um acordo de vontades com os mesmos objetivos, diferenciando-se,
segundo lição clássica de Hely Lopes Meirelles (2004 apud CARVALHO FILHO,
2009), pela qualidade dos participantes: quando celebrados entre entidades estatais,
autárquicas, fundacionais ou paraestatais, sempre da mesma espécie, denominavam-se
consórcios administrativos; quando firmados por entidades administrativas de diferentes
espécies, ou entre estas e organizações particulares sem fins lucrativos, convênios
administrativos. Contudo, dada a ausência de regramento legal específico, ambos se
submetiam ao mesmo regime jurídico, sendo tratados da mesma maneira pelo
ordenamento.
Até o advento da Lei 11.107/2005, competia, precipuamente, à doutrina e à
jurisprudência nacionais estabelecerem o perfil dos consórcios e dos convênios. Não
havia regra legal no direito brasileiro que obrigasse a personalização dos consórcios ou
autorizasse a considerá-lo como pessoa jurídica, para que eles pudessem responder
objetivamente por direitos e obrigações. Havia apenas a opção, por sugestão doutrinária,
de criação de uma pessoa jurídica com o objetivo específico de executar o serviço de
interesse comum (DI PIETRO, 2008).
No mesmo sentido era a lição de Diógenes Gasparini (1995, apud Di Pietro,
2008, p.236), tanto em relação ao convênio, como ao consórcio. Para o referido autor,
46
“o convênio, dada a sua índole, não adquire personalidade jurídica.” Não lhe cabendo
comprar ou vender, contratar, ter inscrição estadual ou conta bancária, por não ser titular
de direitos e obrigações, poderes próprios de pessoas físicas ou jurídicas. Além disso,
não se pode pretender que o convênio tenha estrutura organizacional e administração
empresarial, por incompatibilidade com sua natureza e instabilidade institucional. “A
execução do convênio, por todas essas razões, fica sob responsabilidade dos partícipes
ou uma comissão executiva, que atuará nos termos e condições do convênio, mas
sempre em nome dos partícipes” (GASPARINI, 1995; apud DI PIETRO, 2008, p.236).
Assim, a maioria desses consórcios, anteriores à Lei 11.107/2005, foi
constituída como uma associação civil regida pelo direito privado. A soma de pessoas
jurídicas de direito público gerava, contraditoriamente, uma pessoa jurídica de direito
privado que, a princípio, não precisava obedecer a regras de direito público, por
exemplo: a admissão por concurso público ou a licitação para as compras públicas
(CAMPOS; MONTENEGRO, 2009). E, para haver transferência de recursos do ente
federativo para tais pessoas, imprescindível estar previsto na lei orçamentária ou
autorização legislativa específica.
Esse é outro problema que a nova lei tenta solucionar, o da transferência de
recursos públicos para o consórcio, prevendo para o caso um contrato de rateio, que se
submete à Lei de Responsabilidade Fiscal, ao dever de prestar contas e a uma finalidade
específica.
Ainda segundo Wladimir Ribeiro (2004 apud SOUTO, 2005), os já
consagrados institutos das concessões e permissões não seriam adequados porque “a
gestão associada não é nem direta e nem se contrata o capital privado”; é uma espécie de
“parceria público-pública” (SOUTO, 2005, p.200), influenciada por relações políticas.
Nesse sentido, por via do consórcio público ou do convênio de cooperação, os entes
estabeleceriam um programa de trabalho, por meio de um contrato de programa.
A gestão associada, tal como prevista no art. 241 da Constituição Federal
representa uma das facetas do regime de parceria pública, segundo Carvalho Filho
(2009, p.6), “[...] significando o conjunto de ações e estratégias que envolvem todos os
47
entes da federação interessados na execução de serviços públicos comuns”, qualificada
pelo fato dos pactuantes serem exclusivamente pessoas jurídicas de direito público
interno. A chancela para a sua formação, como reza a Lei de consórcios públicos, é
somente a dos Chefes do Poder Executivo.
Um dos referenciais da Lei de consórcios públicos é o princípio da
subsidiariedade, assim entedido, (RIBEIRO, 2007) “as instâncias federativas mais
amplas não devem realizar aquilo que pode ser exercido pelas instâncias federativas
menores”, ou seja, não deve o Estado fazer o que pode ser resolvido pelo Município,
assim como não cabe à União avocar-se do que deva ser executado pelos Estados e
Distrito Federal. Inobstante isso, as desigualdades regionais, inclusive de capacidade
econômica e de gestão, não podem ser simplesmente abstraídas. Por isso, ao lado do
princípio da subsidiariedade merece destaque o princípio da cooperação. Pelo princípio
da subsidiariedade a primazia da ação é do município, em reforço da instância local,
mais próximo do cidadão. Porém, se este não possuir isoladamente condições técnicas
ou econômicas para agir, entra em voga o princípio da cooperação, que pode ser
horizontal (entre entes do mesmo nível) ou vertical (envolvendo Estado-Município ou
União-Estado-Município), em reforço da instância regional.
Nessa nova concepção de consórcios públicos, um ente da Federação pode
cooperar com outros entes para o exercício das atividades de planejamento, regulação ou
fiscalização de serviços públicos, acompanhadas ou não da prestação de serviços
públicos ou da transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens
essenciais à comunidade. A gestão associada é assim conceituada, do ponto de vista
interno, pelo Decreto 6.017/2007, art.2º, IX, diferenciando-a de outras formas de
prestação de serviço público.
A partir desta, torna-se possível integrar entes de níveis federativos distintos.
Destaque-se, como outra diferença, que, tanto os consórcios públicos como os
convênios de cooperação são celebrados somente entre entes federativos, sendo assinado
exclusivamente pelos Chefes do Executivo, de forma voluntária, não permitindo
entidades da administração indireta e pessoas do setor privado no polo contratual. A
participação destas decorrerá do que for previamente acordado no contrato de consórcio
48
ou no convênio de cooperação, ou seja, é preciso que fique consignada tal autorização
específica já no Protocolo de Intenções, que é o primeiro documento necessário para
formalizar os consórcios e os convênios.
São dois novos institutos que servem ao mesmo objetivo geral, a gestão
associada de serviços públicos, mas por meios diferentes. A principal diferença entre
ambos está na atribuição de personalidade jurídica aos consórcios públicos, enquanto os
convênios de cooperação entre entes federados tendem mais para o caráter de acordos
temporários, muito embora possam ser firmados por tempo indeterminado, qualificados
por lei de cada ente participante, para atuação conjunta.
No convênio de cooperação, as relações jurídicas com terceiros são efetivadas
em nome de um dos entes signatários, e não em nome do próprio convênio, uma vez que
este não pode ser sujeito de direitos e obrigações ante a ausência de personalidade
jurídica. Logo, apenas o signatário que contratou em nome próprio poderia ser
responsabilizado. Já o consórcio público responde por si, pois adquire personalidade
jurídica, e, portanto, se obriga em nome próprio, por conta própria, e, subsidiariamente,
implica responsabilidade dos consorciados (NAVARRO, 2005).
Pode-se afirmar que o convênio não se presta à delegação de serviço público ao
particular, porque essa delegação é incompatível com a própria natureza do convênio.
Na delegação ocorre a transferência de atividade de uma pessoa para outra que não a
possui; no convênio, pressupõe-se que as duas pessoas têm competências institucionais
comuns e vão prestar mútua colaboração para atingir seus objetivos.
Destarte, por pertinência aos objetivos do trabalho acadêmico, a abordagem
passa a concentrar-se especialmente dos consórcios públicos, vertendo sobre os
principais pontos do regime de parceria público-pública que demonstram sincronia com
o regime de parceria público-privada para a gestão associada de serviços públicos.
49
2.3 Consórcios Públicos: inovações da Lei nº 11.079/2005
2.3.1 Quadro Jurídico
O consórcio público é um instrumento de cooperação federativa no qual entes
políticos contratam, de forma voluntária, obrigações entre si para atuação conjunta ou
integrada na realização de objetivos de interesse comum.
A Lei Federal nº 11.107, de 06 de abril de 2005, que “Dispõe sobre normas
gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências”, veio a
estabelecer o novo regime jurídico dos consórcios públicos entre os entes federados,
sendo regulamentada pelo Decreto 6.017, de 17 de janeiro de 2007.
Enquanto a competência legislativa é privativa da União, a competência para a
sua formação é comum a todos os entes federados, orientados pelos ditames da norma
geral. Vale dizer, por oportuno, que a Lei geral, em seu art. 18, veda a celebração de
contrato ou outro instrumento congênere que tenha por objeto a prestação de serviços
públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades nela previstas, sob
pena de caracterizar ato de improbidade administrativa, alterando, nesse sentido, a
redação do inciso XIV, art. 10, da Lei 8.429/1992.
A constituição de um consórcio público tem como ponto de partida a
manifestação soberana de cada ente federativo da intenção de consorciar-se com outros
entes. Por esta razão, a Lei Federal nº 11.107/2005, em seu artigo 3º, estabelece que “o
consórcio público será constituído por contrato cuja celebração dependerá da prévia
subscrição de protocolo de intenções”. Esta subscrição é realizada pelos chefes do Poder
Executivo, representantes legais de cada um dos entes federativos consorciados.
O Protocolo de Intenções é o principal instrumento de constituição de um
consórcio e estabelece, em conformidade com a Lei nº 11.107/2005, aspectos jurídicos e
institucionais do novo modelo de gestão dos serviços para o qual está sendo implantado,
tais como: natureza jurídica, objetivos, direitos dos usuários dos serviços, estrutura
50
organizacional, competências, atribuições, procedimentos para o funcionamento dos
órgãos do consócio e para as relações entre o consórcio e os entes consorciados.
O Protocolo de Intenções transforma-se juridicamente em contrato de
constituição do consórcio público “com a ratificação, mediante lei” (artigo 5º) pelo
Legislativo de cada um dos entes consorciados. No art. 4º da Lei são fixadas as
cláusulas que o protocolo de intenções obrigatoriamente deve conter, dentre elas o
número mínimo de ratificações necessário para a constituição do consórcio.
É extenso o rol das cláusulas consideradas como mínimas necessárias para o
protocolo de intenções, sob pena de nulidade do ato. Constam dos incisos do art. 4º da
Lei 11.107/2005 e do art. 5º do Decreto 6.017/2007. Além da definição pela natureza
jurídica de direito público ou de direito privado, devem constar cláusulas como a
denominação eleita para identificar o Consórcio, a(s) finalidade(s), o prazo de vigência,
(ressalte-se a inovação trazida pela Lei de Consórcios permitindo estabelecer o ajuste
por prazo indeterminado), a identificação dos entes da federação, cláusulas referentes ao
regime de pessoal, e, à autorização para gestão associada de serviço público,
explicitando, dentre outros itens, a autorização para licitar e contratar concessão de
serviços públicos.
Se a opção para a constituição foi por regime de direito público, a vigência do
número mínimo previsto de leis de ratificação dará início à personalidade jurídica. O
Protocolo de Intenções convertido em Contrato de Consórcio. Se a opção foi por regime
de direito privado, além da vigência das leis, necessária a inscrição do ato constitutivo
no respectivo registro, para o nascimento da pessoa de direito privado associada.
Além das normas legais e regulamentares, os consórcios públicos deverão
possuir estatuto próprio, nele disciplinados a organização e o funcionamento de seus
órgãos componentes.
As relações entre o consórcio e cada município consorciado serão reguladas por
meio de contratos de programa e contratos de rateio, importantes ferramentas de
articulação trazidas pela Lei 11.107/2005. Tais contratos são “negócios jurídicos
51
autônomos, dotados de objetivos próprios, ainda que possam estar interligados ou que
um deles possa ser pressuposto do outro” (CARVALHO FILHO, 2009, p.23).
Enquanto o protocolo de intenções tem as diretrizes e condições gerais da
gestão associada de serviços públicos, o contrato de programa, previsto no art. 13, é o
instrumento competente pelo qual devem ser constituídas e reguladas obrigações
específicas que um ente da Federação, inclusive sua administração indireta, tenha para
com outro ente da Federação, ou para com consórcio público, no âmbito da prestação de
serviços públicos por meio de cooperação federativa e estabelecerem as penalizações e
indenizações pelo inadimplemento destas.
A gestão associada pressupõe que o consórcio se constitua para prestar o
serviço, ou, como mais comumente, que detenha os poderes de planejamento, regulação
e fiscalização e delegue a prestação do serviço para outra pessoa. Se tal delegação para
executar o serviço for feita a um dos entes consorciados, ou envolver a administração
indireta destes o meio correto será através de contrato de programa, celebrados mediante
dispensa de licitação; se a delegação for para pessoa privada, será através de contrato de
concessão, celebrados mediante licitação. Seja qual for a opção pela forma de prestar o
serviço, a gestão associada deve estar autorizada e devidamente caracterizada no
protocolo de intenções.
O contrato de rateio, com previsão no art. 8º, tem por objetivo regular as
obrigações financeiras entre o Consórcio e os entes consorciados, obedecidas as normas
de direito financeiro aplicáveis às entidades públicas, inclusive fiscalização pelo
Tribunal de Contas competente. Consoante o referido dispositivo legal, somente por este
instrumento poderão ser repassados os recursos dos entes ao consórcio, tendo como
contrapartida os benefícios a serem fruídos e gastos de forma específica. Os sujeitos dos
contratos de rateio são, de um lado, o ente consorciado e, de outro, o consórcio público.
Vale dizer, cada consorciado firmará seu próprio contrato de rateio com o respectivo
consórcio, que em respeito ao princípio da anualidade orçamentária, contido na Lei
4.320/1964, terá, em regra, duração correspondente ao exercício financeiro.
52
Por conseguinte, a cada ano deverá ser firmado novo contrato de rateio, com
suporte na lei orçamentária relativa àquela execução financeira. Há, entretanto, duas
exceções. A primeira é aquela em que o contrato tenha por alvo projetos contemplado
em plano plurianual, visto que este deva estabelecer diretrizes, objetivos e metas para as
despesas dos programas de duração continuada. Para tanto, os consórcios devem estar
previstos no plano plurianual dos entes políticos, encontrando a mesma correspondência
na elaboração orçamentária do próprio consórcio, como pessoa. A segunda exceção
consiste na hipótese de gestão associada de serviços públicos mantidos por preços
públicos, inclusive tarifas, por considerar que tais recursos são suficientes para dar
suporte à execução do serviço, não havendo como regra, motivo para a alocação de
recursos financeiros por parte do ente consorciado.
Quanto ao regime orçamentário, financeiro e contábil, a execução das receitas e
despesas do consórcio público deve obedecer às normas de direito financeiro aplicáveis
às entidades públicas. As normas de direito financeiro encontram-se dispersas em vários
diplomas legais e dispositivos constitucionais. O diploma básico, em nível
infraconstitucional, é a Lei 4.320/1964, que estabelece normas gerais de direito
financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços das pessoas
federativas. A Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) tem forte
presença, ao estabelecer normas de finanças públicas direcionadas para a
responsabilidade na gestão fiscal, exigindo o cumprimento de metas de resultados entre
receitas e despesas, bem como a observância de certos limites e condições para os gastos
com pessoal, renúncia de receita, operações de crédito, dívidas consolidadas e outras.
Além dos referidos diplomas, que incidem permanentemente sobre a matéria, há os
diplomas específicos, como as Leis dos orçamentos anuais, diretrizes orçamentárias e
planos plurianuais nos quais devem estar previstos a destinação de recursos aos
consórcios públicos (CARVALHO FILHO, 2009)
Vale notar que, para a compatibilização da gestão financeira e orçamentária dos
consórcios públicos com as normas de responsabilidade fiscal, previu o Decreto
6.017/2007 a regulamentação a cargo da Secretaria de Tesouro Nacional (STN), do
Ministério da Fazenda. Recentemente o STN publicou o Manual de Contabilidade
53
Pública, cujos volumes estão contidos na Portaria Conjunta com a Secretaria de
Orçamento Federal SOF/STN nº2, de 06 de agosto de 2009, na Portaria STN nº 467, de
06 de agosto de 2009 e na Portaria STN nº 749, de 15 de dezembro de 2009, visando
padronizar procedimentos para a consolidação das contas públicas nos três níveis de
governo.
Nesse sentido, os registros na execução da receita e da despesa do consórcio
serão efetuados de acordo com a classificação constante da Portaria Interministerial
SOF/STN nº 163, de 04 de maio de 2001, e demais normas aplicáveis aos entes da
Federação. O consórcio deverá elaborar seu orçamento próprio com os programas,
projetos ou atividades dos consorciados. A classificação da receita e da despesa pública
do consórcio deverá manter correspondência com as dos entes consorciados. O
consórcio público, segundo o referido Manual do STN, caracteriza-se como entidade
multigovernamental, não devendo, dessa maneira, constar do orçamento do ente. Por
esse motivo, já havia sido editada a Portaria STN nº 860, de 12 de dezembro de 2005,
que determina que os consórcios públicos sujeitam-se à legislação contábil aplicável às
entidades da administração pública dos entes consorciados e às regras descritas na
referida Portaria. Assim, os recursos entregues pelo ente consorciado ao consórcio
público, em função de sua participação no mesmo, deverão ser registrados na
modalidade de aplicação “71 – Transferências a Consórcios Públicos” e nos elementos
de despesas correspondentes aos respectivos objetos de gastos. Já no consórcio público,
deverão ser classificados como receita orçamentária de transferência correspondente ao
ente transferidor, segundo o discriminado no Manual.
Por fim, o Consórcio Público estará sujeito “à fiscalização contábil,
operacional e patrimonial do Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do
Chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio [...]”, devendo também
prestar todas as informações financeiras necessárias aos entes consorciados para que
estes consolidem corretamente em suas contas todas as receitas e despesas realizadas. É
o comando do Parágrafo único, do art. 9º da Lei, que aparentemente tenta resolver um
hipotético conflito, ao evitar a repetição de controles das contas do Consórcio, por
Tribunais de Contas diferentes. Contudo, isso não tem e não pode ter o condão de
54
afastar o controle efetuado pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas
dos demais entes federativos partícipes do consórcio, sob pena de infringência às
normas constitucionais sobre fiscalização pelo Poder Legislativo, com o auxílio do
Tribunal de Contas. O Decreto 6.017/2009, também não elucidou tal questão, limitando-
se a repetir no art. 12, o entabulado pela Lei que regulamenta (CARVALHO FILHO,
2009; DI PIETRO, 2008).
2.3.2 A personificação dos consórcios
A Lei 11.107/2005 veio a mudar a natureza jurídica do consórcio,
compreendendo dois momentos distintos, o da sua constituição e o posterior a este ato.
Marçal Justen Filho (2005, p.26) precisa que a natureza jurídica do ato de
constituição dos consórcios públicos é de “contrato plurilateral”. Plurilateral,
complementa Carvalho Filho (2009, p.25), porque “comporta tantos pólos quantas
sejam as pessoas consorciadas”. Esse aspecto provoca o efeito de cada consorciado
vincular-se juridicamente a todos os pactuantes, com o que se entrelaçam as relações
jurídicas constituídas entre eles.
Partindo disto, o ajuste consorcial vai resultar na criação de pessoa jurídica,
incorporando a opção aposta no protocolo de intenções para constituir-se com
personalidade jurídica de direito público ou de direito privado. A importância de
personificar o consórcio público está no fato de propiciar o surgimento de sujeitos, a
quem serão investidas a execução de tarefas próprias dos entes federados, praticando
atos e responsabilizando-se em nome próprio, titularizando um patrimônio específico e
participando diretamente de relações jurídicas.
2.3.2.1. A personalidade jurídica de direito público
A atribuição de personalidade jurídica de direito público visa dotar a entidade
criada de competência, funções e regime próprios dos entes estatais. Equivale afirmar
que tal entidade, embora com personalidade autônoma, é um instrumento para
realização de funções propriamente públicas, o que importa em afastar a aplicação dos
princípios inerentes à organização privada (JUSTEN FILHO, 2005).
55
Por assim dizer, é que Marçal Justen Filho (2005), em parecer jurídico
encomendado pelo Ministério das Cidades sobre a proposta legislativa de criação de
consórcios públicos, antevia que a sua constituição com personalidade jurídica de
direito público tornava-o uma da figura muito mais próxima à autarquia do que as
demais entidades integrantes da Administração Indireta, podendo mesmo configurar
uma “autarquia interfederativa” pela vinculação instrumental a diversos entes federados
(JUSTEN FILHO, 2005, p.19). A autarquia clássica, no direito brasileiro, consiste numa
descentralização administrativa de um ente federado, assumindo encargos que estão na
titularidade do ente que a criou.
A natureza jurídica dos consórcios constituídos com personalidade jurídica de
direito público é mesmo de autarquia, que, por força de sua peculiaridade específica,
qual seja, a de resultar do ajuste cooperativo entre pessoas públicas, foi caracterizada
como associação pública.
A associação pública, segundo expressa previsão legal (art. 6,§1º) integra a
Administração Indireta de todos os entes consorciados, ou seja, a pessoa de direito
público criada vai integrar, ao mesmo tempo, a Administração Indireta de diversos entes
políticos consorciados.
Por conseguinte, Carvalho Filho (2009, p.29) assevera que “tais pessoas
consorciais têm a natureza jurídica de autarquias associativas, criadas sob a forma de
associações públicas”.
A corroborar o exposto, vale notar que a Lei de Consórcios Públicos alterou a
redação do art. 41, do Código Civil Brasileiro, o qual relaciona as pessoas jurídicas de
direito público interno, e, em seu inciso IV, onde constava a figura “as autarquias”,
passou a constar “as autarquias, inclusive as associações públicas”.
O início da personalidade jurídica na pessoa jurídica de direito público é
condicionado à vigência das leis de sua criação, que, no caso, são as leis de ratificação
do Protocolo de Intenções por cada ente associado. Significa dizer que enquanto o
Protocolo de Intenções não for ratificado por lei, não estará criado o consórcio público.
56
Nesse ponto reside uma dificuldade: a determinação do momento exato de
criação da associação pública. As Casas Legislativas dos entes federativos que
pretendem se consorciar devem ratificar, por meio de lei, o protocolo de intenções. O
protocolo de intenções é uma espécie de minuta do contrato de consórcio, que após a
vigência das leis de ratificação converte-se no contrato de consórcio. A Lei 11.107/2005
tenta responder tal questão, em seu art. 5º, parágrafo primeiro: “O contrato de consórcio
público, caso assim preveja cláusula, pode ser celebrado por apenas uma parcela dos
entes da Federação que subscreveram o protocolo de intenções” Apesar de não haver
aparente problema, quando se vai à realidade da separação dos poderes, legislativo e
executivo municipais, bem se encontra certa preocupação do executivo em aprovar
determinados pleitos no legislativo, necessitando mesmo de costuras políticas, o que
pode vir a atrasar ou mesmo sobrestar o processo de formação dos consórcios. Em que
pese tal ocorrência, mesmo meritória, não há aqui espaço para o aprofundamento da
questão, restando, por outro lado mais objetivo, as posições doutrinárias divergentes no
assunto.
Di Pietro (2008, p.242) advoga o entendimento de que devam ser
“promulgadas tantas leis quantas forem necessárias para o funcionamento adequado do
consórcio”, mas devendo-se entender que “a personalidade jurídica surge em momentos
diferentes para cada qual”, o que ela mesma retrata como um evidente “absurdo, mas é o
que decorre da lei”. Já Odete Medauar e Gustavo de Oliveira (2006, apud Carvalho
Filho, 2009, p.30) sustentam que “a personalidade se adquire mediante a vigência de
parcela das leis de ratificação, exigindo-se número suficiente de forma a caracterizar um
consórcio”.
Carvalho Filho (2009, p.31) diverge de ambos os entendimentos: do primeiro
pela subjetividade; do segundo por entender uma ofensa ao princípio da unidade da
pessoa jurídica, pelo qual a pessoa á uma e só pode haver um momento para o início de
sua personalidade. Precisa o autor que “o início da personalidade jurídica do ente
consorcial só ocorrerá com a vigência da última lei de ratificação do protocolo de
intenções” (grifos do autor). Explica que, isto ocorrerá tanto para o caso de participação
integral de todos os entes que firmaram o protocolo, quanto para o caso de o consórcio
57
ser celebrado por apenas uma parcela dos subscritores do protocolo, quando incidirá a
cláusula de início de vigência, preestabelecida nos termos do citado parágrafo primeiro,
art. 5º, da Lei 11.107/2005. Sendo assim, a personalidade jurídica terá existência legal a
partir da vigência da última lei de ratificação promulgada pelo ente federativo que
integrar a parcela dos consorciados.
A prática consorcial tem ditado constar cláusula no protocolo de intenções,
estabelecendo um quantitativo mínimo de leis vigentes como marco inicial do
Consórcio Público. De fato, se isto não põe um termo final à questão, pode facilitar o
poder de diálogo entre os municípios, considerando, na proporção, o peso de cada
Executivo municipal dentro de suas respectivas Casas Legislativas.
Nesse sentido, tome-se como exemplo, o Consórcio Público para Tratamento e
Destinação Final Adequada de Resíduos Sólidos da Região Norte do Estado do Espírito
Santo – Conorte, no qual, além dos municípios, também o Estado participa diretamente
do polo consorcial. O Espírito Santo tem na sua carteira de projetos prioritários de
governo, o “Espírito Santo sem Lixão”, visando à destinação final adequada dos
resíduos sólidos urbanos. Por todas as respectivas leis de ratificação dos entes
signatários do referido consórcio, cite-se a Lei 8.869, de 15 de maio de 2008, daquele
Estado.
2.3.2.2 A personalidade jurídica de direito privado
Ao lado da possibilidade de constituição de uma associação pública, a Lei de
Consórcios autoriza a criação de uma pessoa jurídica de direito privado. Entretanto,
nesta hipótese, nem a referida Lei e tampouco o seu Decreto regulamentador
especificaram a categoria de pessoa jurídica em que este deva enquadrar-se, limitando-
se à previsão de uma “pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos” (art. 4º,
inciso IV, Lei 11.107/2005).
No Direito Civil, a destinação da entidade a fins econômicos é o ponto
primário de distinção entre as sociedades e as associações, aquelas direcionadas, e estas
não, à atividade e objetivos econômicos. Todavia, não apenas as associações estão
afastadas de fins econômicos; as fundações também estão. Assim, o fato de o legislador
58
ter-se referido à expressão “sem fins econômicos” não induziria, de plano, à idéia sobre
qual a categoria de pessoa privada em que seria enquadrado o consórcio.
Diógenes Gasparini (2006, apud CARVALHO FILHO, 2009, p.33) entende
que pode ser instituída “fundação, se a aglutinação de pessoas consorciadas se inclinar
para a personalidade jurídica de direito privado.” Carvalho Filho (2009) discorda,
considerando que fosse uma fundação, teria que ser uma fundação privada, regida pelo
Direito Civil, o que demanda a figura do instituidor, que é quem define o objetivo a que
a entidade se destina (art. 62, Código Civil), tornando-se incompatível com a pessoa
consorcial. Ademais, a fundação teria que se vincular aos entes federativos consorciados
e essa circunstância afastaria a função do Ministério Público de velar pelas entidades
fundacionais, função inafastável quando se trata de funções eminentemente privadas,
conforme art. 66, Código Civil (CARVALHO FILHO, 2009).
Em que pese tais considerações, firmam-se Carvalho Filho (2009) e Di Pietro
(2008), acompanhados por ampla doutrina, pelo caráter associativo do negócio jurídico
formador do consórcio neste regime, aproximando-se do previsto no art. 15 da Lei
11.107/2005, qual seja, “no que não contrariar esta Lei, a organização e funcionamento
dos consórcios públicos serão disciplinados pela legislação que rege as associações
civis.”, para dizer que a única natureza jurídica possível quando pessoa jurídica de
direito privado, já que a lei abriu tal opção, é de associação civil.
Mas, muito antes de tal controvérsia, a matéria relativa à formação de
consórcios públicos, com personalidade jurídica de direito privado, encontra fortes
oposições quanto ao seu próprio cabimento. A doutrina majoritária desabafa que isto
mais parece uma aberração legislativa, frisando, inclusive, que o Projeto de Lei nº
3.884/2004, que deu origem à Lei do Consórcio Público, somente previa a criação de
pessoa jurídica de direito público.
De um lado, sustenta-se pela inadequação da utilização de pessoa de natureza
privada para gerir consórcio entre pessoas políticas, notadamente quando algumas
competências conferidas aos consórcios reclamem o regime de direito público, diferente
de outras situações em relação às quais é cabível e adequada a atuação do Estado por
59
pessoas de natureza privada. Nesse sentido: Alice Gonzales Borges, Floriano de
Azevedo Marques Neto, José dos Santos Carvalho Filho, Odete Medauar e Gustavo
Justino de Oliveira, e outros tantos.
De outro lado, mas não muito distante, Wladimir Ribeiro (2007) entende ser
possível tal modelagem de direito privado, podendo adotar o formato de associação civil
ou de fundação, mas recomenda a adoção do formato jurídico de direito público.
Observa, que a personificação de direito privado não a retira por completo do regime de
direito público, visto que deva guardar obediência às normas de direito público no que
se refere, por exemplo, à admissão de pessoal, contratações, estruturação do orçamento,
execução de receitas e despesas, prestação de contas do Tribunal de Contas. Ademais,
reforça que os consórcios públicos de direito privado têm um campo de atuação mais
limitado que o de direito público, exemplificando que não podem, a rigor, exercer atos
de autoridade sobre direitos de particulares, o que não ocorre com as associações
autárquicas, que por sua natureza, podem ter o poder de polícia.
Há outra controvérsia que se soma a tal celeuma. Ao contrário do que ocorre
com as associações públicas, a Lei nº 11.107/2005, silencia sobre o fato dos consórcios
públicos firmados como pessoas jurídicas de direito privado integrarem (ou não) a
esfera da administração pública indireta dos entes criadores.
Um primeiro exame conduz à conclusão de que, se no tratamento aos
consórcios públicos de direito público a lei expressamente integrou-o à administração
pública indireta, a contrario sensu, os consórcios públicos constituídos como pessoas
jurídicas de direito privado não estariam incluídos na administração indireta dos seus
componentes. Excluídos da Administração Indireta, estaria justificado o enquadramento
da pessoa jurídica de direito privado como associação civil, prevista no art. 44, I, do
Código Civil. É a lógica de Odete Medauar e Gustavo Justino de Oliveira (2006), e
também Souto (2005) faz distinção.
Em linha oposta de enfrentamento, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2008) e
Carvalho Filho (2009), entendem que qualquer que seja a personalidade jurídica eleita, o
Consórcio integrará a Administração Indireta dos entes associados, pois executa
60
atividades descentralizadas da competência destes entes que se consorciaram. Wladimir
Ribeiro (2007) também considera que os consórcios públicos de direito privado fazem
parte da Administração Indireta dos entes pactuantes.
Hely Lopes Meirelles (2005) não se posiciona, mas faz uma ressalva a respeito,
adotando uma linha preventiva. Entende que o fato da Lei não o inserir na
Administração Indireta dos entes criadores deve ser levado em conta na fixação das
competências a serem transferidas para o consórcio.
Com efeito, o que importa saber nesse aspecto, é que, qualquer que seja a
forma de constituição de um consórcio público, este será regido pelas normas de direito
público, vez que é constituído por pessoas públicas. Entretanto, quando sua constituição
se der sob a forma de pessoa jurídica de direito privado, este se submeterá a um regime
híbrido e se regerá pelas normas de direito civil em tudo aquilo que não for
expressamente derrogado por normas de direito público (CARVALHO FILHO, 2009;
DI PIETRO, 2008). É o que admite a própria Lei nº. 11.107/2005, sujeitando os
consórcios públicos criados como pessoas de direito privado às leis de direito público,
quando dispõe, em seu art. 6º, inciso II, §2º, que, o consórcio público revestido de
personalidade jurídica de direito privado observará as normas de direito público no que
concerne à realização de licitação, celebração de contratos, prestação de contas e
admissão de pessoal, que será regido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.
Aceita a constituição do consórcio público com natureza jurídica de direito
privado, sem fins econômicos, o início de sua personalidade decorrerá, não apenas da
necessária vigência das leis de ratificação do Protocolo de Intenções. Após superar essa
etapa, segundo o art. 7º, do Decreto 6.017/2007, o consórcio público deverá cumprir
uma exigência adicional, que é o atendimento aos requisitos estabelecidos na legislação
civil para sua constituição. Aplica-se aqui o art. 45 do Código Civil. Assim, o início de
sua personalidade jurídica será a data de inscrição do ato constitutivo em cartório. Desse
modo, deverá ser levado à registro o estatuto da associação em que se formalizar o
consórcio público.
61
2.3.3 Privilégios dos consórcios públicos
A primeira vantagem de constituir um consórcio público para gestão associada
de serviços públicos é a formação de uma pessoa jurídica, que responderá em nome
próprio por direitos e obrigações, tornando a relação mais sólida e imparcial ao
favorecer o conjunto de entes federativos abrigados na relação, sempre por decisão de
uma Assembléia Geral.
A Lei nº. 11.107/2005 conferiu alguns privilégios aos consórcios públicos,
independentemente de adquirirem natureza pública ou privada:
a) limites mais elevados para fins de escolha da modalidade de licitação (parágrafo
oitavo do art. 23 da Lei nº. 8.666/1993, acrescentado pela Lei nº. 11.107/2005);
b) valores mais elevados para a dispensa de licitação em razão do valor, prevista no
art. 24, incisos I e II, da Lei nº. 8.666/1993, conforme alteração introduzida no
parágrafo único do art. 24 pela Lei nº. 11.107/2005.
c) possibilidade de ser contratado pela administração direta ou indireta dos entes da
Federação consorciados, com dispensa de licitação (art. 2º, parágrafo primeiro,
inciso III);
d) poder de dispensar a licitação na celebração de contrato de programa com ente da
Federação ou com entidade de sua administração indireta para a prestação de
serviços públicos de forma associada, nos termos do autorizado em contrato de
consórcio público ou em convênio de cooperação (art. 24, XXVI, da Lei nº.
8.666/1993, acrescentado pela Lei nº. 11.107/2005);
e) confere prioridade ao ente federativo que realize ações por consórcio público nas
transferências voluntárias da União (art. 37, do Decreto nº 6.017/2007);
f) possibilidade de o consórcio público executar programas federais de caráter local,
mediante delegação da União por convênio administrativo (art. 38, do Decreto nº
6.017/2007);
62
g) possibilidade de estados e municípios executarem, por meio de consórcio público,
ações ou programas a que sejam beneficiados por meio de transferências voluntárias
da União (parágrafo único do art. 38, do Decreto nº 6.017/2007).
Em que pese a opção dada pela Lei federal, os consórcios públicos constituídos
sob regime de direito público guardam vantagens em relação aos consórcios
constituídos sob regime de direito privado.
Mesmo conferindo, no art. 37 do Decreto nº 6.017/2007, a preferência de
transferências voluntárias2 para entes federativos que participem de consórcios públicos,
o Governo Federal, de forma contraditória, discrimina os consórcios em razão da
natureza de sua personalidade jurídica, ao decretar, no art. 39, que, “A partir de 1º de
janeiro de 2008 a União somente celebrará convênios com consórcios públicos
constituídos sob a forma de associação pública ou que para essa forma tenham se
convertido”. Em outras palavras, embora a lei faculte a instituição do ente consorcial
como pessoa de direito público ou de direito privado, a União, ao ditar para si mesma
que só realizaria convênio com consórcio público na forma de associação pública,
sabendo-se que tais convênios prestam-se justamente à transferência de recursos
financeiros, termina por afastar a opção pela forma de direito privado na constituição
dos consórcios, vez que todos os entes federativos são dependentes e disputam recursos
da União.
Observe-se, apenas pela literalidade dos dispositivos que, tanto o art. 37 como
o art. 39 tratam de transferência de recursos financeiros da União, sendo que no
primeiro, a preferência na transferência voluntária é para valorizar entes federativos que
prestigiem o instituto do consórcio público na realização de suas ações; no segundo a
transferência de recursos é para o próprio consórcio público de direito público, por meio
de um convênio administrativo. Em ambos os casos, é condição indispensável a
inexistência de débitos dos entes federativos com a União para que tais repasses sejam
efetivados.
2 Para efeito da Lei complementar nº 101/2000, art. 25, “entende-se por transferência voluntária, a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde."
63
A discriminação entre os regimes também foi feita pela Lei nº 11.445, de 05 de
janeiro de 2007, norma geral de Saneamento Básico, que permite apenas aos consórcios
públicos de direito público o exercício das atividades de regulação e fiscalização na
prestação regionalizada de serviços públicos de saneamento básico.
As associações públicas, como espécies de autarquia, submetem-se ao regime
jurídico de direito público, daí advindo todas as prerrogativas próprias dessa categoria
de pessoas, como imunidade tributária (art. 150, parágrafo segundo, CF);
impenhorabilidade de seus bens e pagamento pelo sistema de precatórios (art. 100, CF);
imprescritibilidade de seus bens, não sujeitos estes à aquisição por usucapião (art. 102,
Código Civil); preservação patrimonial, só podendo ser alienados seus bens na forma
que a lei determinar (art. 17, incisos I e II, Lei 8.666/93); prescrição quinquenal de
dívidas e direitos em favor de terceiros (Decreto 20.910, de 06 de janeiro de 1932);
prerrogativas processuais (arts. 188 e 475, incisos I e II, Código de Processo Civil), tais
como, processo especial de execução, juízo privativo, prazos dilatados em juízo, duplo
grau de jurisdição, dentre outras (DI PIETRO, 2008).
O consórcio público de direito público adquire ainda o poder de promover
desapropriações e instituir servidões nos termos de declaração de utilidade ou
necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo Poder Público (art. 2º, parágrafo
primeiro, inciso II da Lei 11.107/05). Aqui, parte da doutrina, capitaneada por Souto
(2005), entende ser atributo próprio dos consórcios públicos de direito público. De outro
lado, Carvalho Filho (2009) e Di Pietro (2008) defendem o cabimento para ambas as
formas de constituição dos consórcios. Em que pese o mérito das opiniões, o art. 10, III,
do Decreto 6.017/07, destina tal poder expressamente às associações públicas.
2.3.4. Aspectos existenciais dos consórcios públicos
A constituição dos consórcios públicos tem como primeiro ato formal a
subscrição do Protocolo de Intenções pelos Chefes do Executivo, como manifestação de
interesse em celebrar um acordo de vontades para a consecução de objetivos
determinados. Entretanto, tal intenção não se traduz em compromisso de celebrar o
64
consórcio, nem implica na assunção de direitos e obrigações. No protocolo apenas se
definem as cláusulas e condições que serão observadas, caso o consórcio venha a ser
efetivado. Os entes que subscrevem o protocolo não são obrigados a ratificá-lo, não há
penalizações para isso; ou até mesmo podem ratificá-lo com reservas (ato pelo qual ente
da federação não ratifica, ou condiciona a ratificação, de determinados objetivos ou
cláusulas do protocolo de intenções), que, aceitas, implicarão em consorciamento
parcial ou condicional. Os consórcios têm a característica da voluntariedade, em
respeito à autonomia do ente federativo.
O paradoxo ou tensionamento da voluntariedade no consorciamento, podendo
o ente se retirar a qualquer tempo, desde que cumpridos determinados requisitos
previamente estabelecidos, aparece na imposição de sua utilização quando se pretende
prestar serviços públicos em regime de gestão associada. Há vedação expressa na Lei
11.107/2005, art. 18, para a celebração de contrato ou outro instrumento congênere que
tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem
observar as formalidades previstas em lei, sob pena de caracterizar ato de improbidade
administrativa, alterando, nesse sentido, a redação do inciso XIV, art. 10, da Lei
8.429/1992. O art. 30, §2º do Decreto 6.017/2007, por sua vez, dispõe que, a partir de 07
de abril de 2005, quando foi publicada a Lei 11.107, constitui ato de improbidade
administrativa a celebração de contrato ou outro negócio jurídico “que tenha por objeto
a prestação de serviços públicos por meio de cooperação federativa sem a celebração de
contrato de programa, ou sem que sejam observadas outras formalidades previstas em
lei.
Importante observar que o contrato de programa tanto pode estar vinculado a
um consórcio, como pode ser dele destacado, permanecendo autônomo, mas em ambos
os casos haverá gestão associada. Embora existam outras considerações neste ponto, o
que mais se destaca na autonomia dos contratos de programa é sua ultratividade fixada
por lei. Assim, tanto nos casos de o consórcio vir a ser extinto, como nos casos do ente
federativo se retirar do consórcio, o contrato de programa permanecerá vigente e eficaz
regulando as obrigações específicas que foram contraídas, e que não se confundem com
as advindas do instrumento anterior de autorização. A extinção de um contrato de
65
programa depende do prévio pagamento das indenizações previstas. Significa assim, que
nenhuma das partes pode eximir-se de cumprir tais obrigações sob alegação de que foi
extinto o consórcio ou o contrato de programa.
Tanto para entrar, como para dele se retirar, há a presença da voluntariedade,
em respeito à autonomia federativa. É vedado, conforme expressa o art. 24 do Dec.
6.017/2007, obrigar o ente federativo a se consorciar e a permanecer no Consórcio. A
retirada voluntária resulta de decisão do próprio ente consorciado, devendo ocorrer por
ato formal de seu representante na assembleia geral, na forma que previamente ficou
determinada na lei de sua criação, ou seja, deverá estar previsto, já no protocolo de
intenções que será ratificado por lei, cláusula discriminando tal formalidade e seu
procedimento, bem como a possível hipótese de um retorno ao consórcio. Já os casos de
extinção ou alteração dos contratos de consórcio dependem da apresentação de
instrumento aprovado pela assembleia geral, cabendo à lei de todos os participantes
proceder à sua ratificação. A exceção à exigência de lei para ratificar a alteração dos
contratos de consórcio dá-se, segundo Carvalho Filho, 2009, p.123, quando “Somente
alterações de fundo devem reclamar o mencionado procedimento, e por alterações de
fundo podem ser consideradas aquelas relacionadas às cláusulas necessárias do
protocolo de intenções.” Se a pessoa nasce de uma lei, por uma lei ela se altera, por uma
lei ela termina sua existência.
É de extrema importância que na elaboração do protocolo de intenções
questões peculiares sejam levantas e discutidas, inclusive as decorrentes da retirada de
um ente e da extinção do consórcio, como por exemplo, o consórcio público que
pretenda contratar PPP para prestar um serviço público essencial, o que significa dizer
que não pode sofrer descontinuidade - na hipótese de extinção do consórcio, quem
assume o polo concedente e como fica a prestação do serviço nos demais municípios?
Como assegurar a solidez do consórcio sem determinado ente? Como garantir o
concessionário ou reequilibrar o contrato? Enfim, diferentes questões práticas podem de
fato ocorrer, sendo necessário constar tais apontamentos na lei de ratificação, e
posteriormente especificar no contrato de programa e/ou no contrato de concessão,
66
todos os aspectos e consequências, em nome da regulação do serviço e governança da
Administração.
Em relação ao regime de pessoal dos consórcios, a controvérsia existente se dá
quanto à possibilidade das associações públicas adotarem o regime celetista,
considerando que a sua natureza jurídica de autarquia, carreia o regime estatutário. E
isto geraria a problemática do servidor estatutário, concursado por uma pessoa
interfederativa, na extinção do consórcio público não pertencer a nenhum dos
municípios antes consorciados.
A Lei 11.107/2005, em seu art. 6º, §2º, dispõe que no caso de se revestir de
personalidade jurídica de direito privado, o consórcio público observará as normas de
direito público no que concerne à admissão de pessoal, “que será regido pela
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT”. Por outro lado, sem precisar o regime de
pessoal dos consórcios públicos de direito público, o art. 4º, IX, do referido diploma
legal, considera cláusula necessária a que indique o número, as formas de provimento e
a remuneração dos “empregados públicos”. A interpretação literal dos referidos
dispositivos é a de que “o pessoal dos consórcios se submeterá ao regime trabalhista
(ou regime de emprego público) seja qual for a forma pela qual se constitua” (JUSTEN
FILHO, 2009, p.38).
Entretanto, Marcos Paulo Marques Araújo (2008), sem contestar um quadro
próprio do consórcio, e mesmo entendendo que a disciplina viável é o regime celetista,
por conferir maior flexibilidade e uniformidade, adverte, seguido por Oliveira (2009),
para a existência da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2135/2000, originária do
Distrito Federal, na qual o Partido dos Trabalhadores requer a declaração de
inconstitucionalidade da alteração produzida pela EC 19/98 no art. 39 da Constituição
Federal, por eliminar o regime jurídico único da Administração Direta, autárquica e
fundacional, que, em regra, era considerado o estatutário e passaria a misto.
67
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, em sede de liminar3,
a eficácia do art. 39, caput, em sua nova redação, restabelecendo a adoção do regime
jurídico único. A partir de tal deferimento cautelar, não é mais possível a contratação de
empregados públicos, ainda que a legislação infraconstitucional traga tal previsão, ao
menos até que sobrevenha a decisão final do STF.
Então, para dar efetividade a essa decisão do STF, diante do caráter
interfederativo do Consórcio Público, considerando, ainda, que o regime estatutário é
definido por lei de cada ente federativo, e não sendo possível um ente fixar regras de
pessoal para outro ente ou mesmo renunciar desta competência no protocolo de
intenções, a solução apontada pela doutrina e utilizada na prática é a cessão de
servidores públicos pelos entes consorciados ao consórcio, o que é reconhecido pela Lei
11.107/2005, art. 4º, §4º, e art. 23 do Decreto 6017/2007. Nesse caso, os servidores
permanecem submetidos ao regime de pessoal originário. E, se a cessão for com ônus
para a origem, os pagamentos podem ser contabilizados como créditos hábeis para
operar compensação no contrato de rateio. Quando extinto o consórcio, tais servidores
retornam para suas respectivas Administrações de origem (OLIVEIRA, 2009; SOUTO,
2005).
Dito isto, vale lembrar que não há criação de cargo público sem lei, portanto,
independente do regime a ser adotado, é cláusula necessária no protocolo de intenções a
previsão do quadro de pessoal (empregados públicos do consórcio) e a respectiva
remuneração, já que passará por ratificação no legislativo.
Em relação a autorização para gestão associada de serviço público que deva
constar no protocolo de intenções, esta deve ser acompanhada das seguintes definições:
a) as competências cujo exercício se transferiu ao consórcio; b) os serviços públicos
objeto da gestão associada e a área em que serão prestados; c) a autorização para licitar
ou outorgar concessão; d) as condições a que deve obedecer o contrato de programa, no
caso de a gestão associada envolver também a prestação de serviços por órgão ou
entidade de um dos entes da Federação consorciados; e) os critérios técnicos para
3 STF, ADI Nº 2135 MC/DF, Pleno, Rel. p/ acórdão Min. Ellen Gracie, julgamento 02/08/07 (Informativo nº 474 do STF)
68
cálculo do valor das tarifas e de outros preços públicos, bem como para seu reajuste ou
revisão.
Há aqui uma bifurcação, na decisão pela forma de prestação do serviço:
contrato de programa ou contrato de concessão. Muito embora o contrato de programa
seja uma ferramenta de manobra importante, por obediência ao tema do presente
trabalho, o foco da análise restringe-se no segundo contrato, no qual se verifica a
possibilidade do consórcio público de direito público tomar a posição de poder
concedente, licitar e delegar a prestação do serviço, centralizando nele o planejamento, a
regulação e a fiscalização dos serviços.
2.4. Prestação de Serviços Públicos na Gestão Associada
Serviço público, conforme ensinamento de Meirelles (2005), é todo aquele
prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais,
para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples
conveniências do Estado.
Não são todos os serviços públicos que comportam administração conjunta.
Muitos deles, no entanto, não somente aconselham, como na verdade, reclamam,
exigem o auxilio mútuo entre seus titulares, para que, em última instância, beneficiem
realmente seus destinatários últimos, os indivíduos da coletividade.
A gestão associada de serviços públicos, conforme definição do Decreto
6.017/2007, art. 2º, inciso IX, compreende o exercício conjunto das atividades de
planejamento, regulação ou fiscalização de serviços públicos, que podem ou não ser
acompanhados da prestação destes serviços delegada ao Consórcio.
Importa observar que a Lei de Consórcios veda a transferência dos poderes
básicos e inerentes ao serviço sob consórcio – planejar, regular e fiscalizar – ao outro
pactuante quando este for o prestador do serviço. Tais funções espelham poderes de
direção, que não comportam renúncia pelo ente titular do serviço, mesmo que o
69
contratado possa auxiliar o contratante titular naquelas tarefas. “O que não se pode é ser
o titular excluído de participar do processo de planejar, regular e fiscalizar. Se assim
fosse, não teria sentido falar-se em gestão associada” (CARVALHO FILHO, 2009,
p.153).
O referido Decreto conceitua, no art. 2º, inciso XIII, o que vem a ser a
prestação de serviço público em regime de gestão associada:
execução, por meio de cooperação federativa, de toda e qualquer atividade ou obra com o objetivo de permitir aos usuários o acesso a um serviço público com características e padrões de qualidade determinados pela regulação ou pelo contrato de programa, inclusive quando operada por transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos (grifos nossos)
Em sentido amplo, a gestão associada e a transferência de serviços são
consideradas como objetivos gerais dos Consórcios, sendo que estas podem se
desenvolver sobre qualquer serviço público de interesse comum dos gestores. O Decreto
6.017/2007, em seu art. 3º, relacionou, em caráter meramente exemplificativo, diversos
objetivos específicos para os consórcios, sendo lícito que os entes consorciados possam
proceder ao ajuste em relação a todos ou somente a parte deles.
Em sentido estrito, o Decreto 6.017/2007, no inciso XIV, do art. 2º, definiu que
a gestão associada se refere a serviços públicos que possam ser remunerados por taxa ou
preço público, inclusive tarifa. Aqui a norma delimitou o foco da gestão associada nos
serviços públicos de natureza econômica, quando então entra em voga a utilização dos
contratos de programa ou dos contratos de concessão.
Um exemplo no caminho inverso, é o consórcio de saúde, por cuidar de
atividades que não podem ser remuneradas por taxa ou tarifa, é um consórcio que não
possui por finalidade a gestão associada de serviços públicos em sentido estrito. Neste
caso o que ocorre é a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens
essenciais à continuidade dos serviços transferidos, que passam a ser executados pelo
consórcio (CAMPOS; MONTENEGRO, 2009).
70
A hipótese de prestação de serviços públicos em regime de gestão associada,
em que se afasta a figura dos contratos de programa, é quando ele cede lugar aos
contratos de concessão. Ambos os instrumentos contratuais espelham a delegação total
ou parcial da execução de um serviço público sob gestão associada, diferenciando-se por
sua execução. Na concessão o executor é empresa da iniciativa privada, ao passo que no
contrato de programa, o executor é entidade administrativa. Em quaisquer dos casos,
deverá haver previsão expressa no contrato de consórcio, de acordo com os objetivos
que levaram à sua formação.
Destarte, a Lei 11.079/2004, ao alinhar as parcerias público-privadas ao modelo
de concessão, deixa a abertura para sua utilização na contratação da prestação de
serviços públicos em regime de gestão associada por Consórcios Públicos.
Verifica-se, até aqui, de um lado a prestação do serviço via PPP, de outro o
consórcio, com a regulação e a fiscalização. O planejamento é do titular de serviço
público, ou seja, do ente da Federação a quem compete provê-lo. A teor do art. 174 da
Constituição Federal, como agente normativo e regulador da atividade econômica, o
Estado exercerá as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Cada titular de
serviço público deverá fazer valer de sua autonomia para identificar, qualificar e
quantificar todas as ações por meio das quais um serviço público deva ser prestado, no
âmbito local, elaborando as respectivas políticas públicas e editando planos diretores
para prestação do serviço.
Essa segregação de funções ficou mais evidente a partir da Lei nº 11.445, de 05
de janeiro de 2007 (LSB), marco regulatório dos serviços de saneamento básico, que,
conforme observam os autores consultados, por todos Souto (2005), é o mote dos
consórcios públicos. O titular de um serviço é o ente da Federação a quem compete
prover o serviço, conforme competência constitucionalmente definida. A Lei de
Saneamento Básico (LSB), ao tratar do exercício da titularidade destes serviços,
explicita em seu art. 8º que os titulares “poderão delegar a organização, a regulação, a
fiscalização e a prestação desses serviços, nos termos do art. 241 da Constituição
71
Federal e da Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005”, omitindo a possibilidade de
delegação do planejamento.
Contudo, a LSB, apertando o cerco, introduz, no cenário da gestão de serviços
públicos de saneamento básico, o conceito de prestação regionalizada de serviços
públicos, conforme art. 14 da referida Lei, caracterizando-a pela existência de um único
prestador para vários municípios; pela uniformidade de fiscalização e regulação dos
serviços, inclusive de sua remuneração; e, pela compatibilidade de planejamento.
Para tanto, em seu art. 15, discrimina a possibilidade do exercício das
atividades de regulação e fiscalização, especificamente por consórcio público de direito
público ou por convênio de cooperação tratado no art. 241 da CF, deixando que o titular
dos serviços, no caso, municípios, recebam a cooperação técnica do Estado em que
estão inseridos para a atividade de planejamento (Parágrafo único, art. 15 da LSB).
Inobstante o que parecia ser o entendimento, de que mesmo nos casos de
prestação regionalizada de serviços cada titular deveria elaborar seu próprio plano de
saneamento básico, o recente Decreto 7.217, de 21 de junho de 2010, regulamentando a
LSB, esclareceu a mens legis. Pela LSB, em seu art. 17, o serviço regionalizado “poderá
obedecer a plano de saneamento elaborado para o conjunto de municípios atendidos”
(grifos nossos); pelo Decreto, em seu art. 43, “o serviço regionalizado de saneamento
básico poderá obedecer a plano de saneamento básico elaborado pelo conjunto de
municípios atendidos” (grifos nossos). Infere-se disso, que, preenchidas as
condicionantes da prestação regionalizada de serviço, o consórcio pode também agregar
o que antes estava obscuro na LSB.
Desta feita, pode-se vislumbrar um arranjo institucional em que o Consórcio
Público de direito público licita a contratação das parcerias público-privadas para a
concessão dos serviços, ficando com a competência de regulação, para disciplinar ou
organizar a sua prestação, bem como a correspondente fiscalização, por atividades de
acompanhamento, monitoramento, controle ou avaliação. E, se também for assim
designado, poderá elaborar o plano de saneamento do conjunto dos municípios, no
sentido de garantir a utilização, efetiva ou potencial, do serviço público.
72
Observe-se, aqui, ao contrário do que pareça, órgão regulador não é sinônimo
de agência reguladora, mas esta última poderá ser empregada dependendo do porte do
Município. Trata-se de designar um órgão ou uma entidade dentro da Administração
Pública, que deverá desempenhar as funções regulatória/fiscalizatória, mas não seja
prestador dos serviços.
Nesse sentido, a figura dos consórcios públicos, ao somar as forças dos entes
federativos, titulares de serviço público, surge como uma das vias para implementação
do processo de regionalização, podendo ser designados, inclusive, como verdadeiras
entidades reguladoras regionais, possibilitando a implantação de uma gestão adequada
de serviços.
Inobstante isso, se por um lado, a instituição dos consórcios públicos pode
representar uma via segura para a implantação da gestão associada, por outro deve ser
levado em consideração a sustentabilidade na prestação do serviço. Fixa-se, nesse ponto,
o encontro da PPP, como concessão especial, para viabilizar a prestação de serviços
públicos objeto de gestão associada. É o que pretende se enfrentar no Capítulo 3, a
seguir.
73
CAPÍTULO III
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS NA GESTÃO ASSOCIADA POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS
3.1. A Sinergia das Parcerias Público-Privadas e dos Consórcios Públicos
No exame das possibilidades para a solução racional e coordenada de
problemas dos Municípios, em nível de cooperação associada, destaca-se a utilização
das parcerias público-privadas por consórcios públicos.
A ampla maioria dos autores nacionais vem igualmente acenando para o
amadurecendo de tal possibilidade, inclusive o próprio co-autor do anteprojeto da Lei
11.075/2005, Wladimir Ribeiro, conforme menciona Alice Gonzalez Borges (2006).
Não há nenhum impedimento constitucional ou legal para a formulação de um
arranjo institucional vertendo os institutos do Consórcio Público e da PPP para a
execução indireta de serviços públicos em gestão associada por concessão em parceria
público-privada.
Em Exposição de Motivos ao projeto de lei sobre as diretrizes aplicáveis aos
resíduos sólidos, datada de 4 de julho de 20074, a então Ministra de Estado do Meio
Ambiente já enfatizava a necessidade de integração das Leis de Consórcios Públicos e
de Parcerias Público-Privadas – PPP´s para viabilizar novos arranjos visando ao ganho
de eficiência na gestão e à redução de custos.
Os serviços públicos de saneamento básico, prestados de forma regionalizada,
são emblemáticos para a formação de consórcios públicos de direito público, como
requer a Lei de Saneamento Básico (LSB). Exemplos práticos no setor de saneamento
74
podem resolver graves questões, enfrentadas em nível nacional, tais como, o
esgotamento sanitário e os lixões.
A despeito do silêncio da LSB - Lei 11.445/2007, não se pode reputar que o
saneamento básico seja área infensa à adoção de PPPs. Bem ao contrário. O art. 28, §2º
prevê que podem ser adotados subsídios tarifários e não tarifários (ou fiscais) para os
usuários e localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala econômica
suficiente para cobrir o custo integral dos serviços. Esta é exatamente a lógica das
concessões patrocinadas ou administrativas: possibilitar a adoção de um regime de
concessão em atividades ou serviços economicamente insustentáveis por si sós.
A despeito disso, há, de fato, obstáculos difíceis de serem superados
isoladamente por Municípios, um deles está no valor mínimo de contratação de PPP em
R$ 20.000.000,00 (vinte milhões) de reais, tornando-a distante da realidade financeira
da ampla maioria. Os poucos Municípios que se utilizam das parcerias público-privadas
são os detentores de maior poder econômico.
Nesse sentido, reunidos em consórcio, projetos que envolvam infraestrutura
destinada à prestação de serviços comuns vão superar, certamente, o valor mínimo de
contrato das PPPs, e, conformando-se aos prazos de contratação entre o mínimo de 5
(cinco) e o máximo de 35 (trinta e cinco) anos, previsto na Lei 11.079/2004.
Mais um ponto favorável à formação de Consórcios, é que, mesmo com o
prazo contratual estabelecido, entre o mínimo de 5 (cinco) e o máximo de 35 (trinta e
cinco) anos, para a amortização dos investimentos do parceiro privado, há a limitação da
capacidade de endividamento do ente federativo, em 3% (três por cento) da receita
corrente líquida para a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto
de parcerias contratadas. Tal limite deve ser respeitado por responsabilidade fiscal e por
ser condição para o recebimento de transferências voluntárias da União, conforme o
disposto no art. 28, caput, da Lei 11.079/2004, com redação alterada pela Lei
4 Exposição de Motivos nº. 58/MMA/2007 ao Projeto de Lei 1.997/2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/projetos/EXPMOTIV/MMA/2007/58.htm. Acesso em 21/04/2009.
75
12.024/2009. Assim, com o Consórcio contratando a PPP isso restaria diluído
proporcionalmente à participação dos municípios.
Há que se lembrar ainda, que as PPPs são contratos que reclamam uma
complexa formatação nos aspectos técnico, econômico, financeiro e na própria
elaboração do edital de licitação, o que as coloca, mais uma vez, distante da realidade
dos municípios, agora por questões de corpo técnico. Os consórcios podem contratar tal
modelagem, nos termos do autorizado pelo protocolo de intenções, elaborando a
adequada partilha de riscos e sistema de garantias para mitigá-los.
Por todo o exposto, sem a pretensão de esgotar o assunto, mostra-se mais
vantajoso que municípios se reúnam em consórcios e concedam, via, PPPs, serviços
com fortes investimentos em infraestrutura e grandes externalidades positivas, visando
ao interesse de toda a coletividade.
3.2. Consórcios Públicos na Contratação de Parcerias Público-Privadas: um Arranjo Institucional
Nesse contexto, torna-se relevante integrar as duas vias de parcerias, a público-
pública e a público-privada, em um mesmo arranjo organizacional, elegendo como pano
de fundo uma situação hipotética: um Consórcio Público de direito público formado
para o desempenho das atividades de planejamento, regulação e fiscalização, que
contrata a prestação de serviços públicos de saneamento básico, via parceria público-
privada, podendo-se imaginar como objeto específico tanto a disposição final de
resíduos sólidos como serviços de esgotamento sanitário, em rápidas linhas.
3.2.1 Pressupostos necessários relacionados ao serviço
A contratação de serviços públicos de saneamento básico tem como
pressuposto de validade a obrigatória observância das condicionantes contidas na Lei
11.445/2007, sob pena de nulidade da contratação.
76
Estas condicionantes estão relacionadas com a necessidade de elaboração de
uma política pública municipal e, ainda, um plano local, ambos voltados para o setor de
saneamento.
A política pública municipal de saneamento básico será composta pelas
seguintes atividades a serem desempenhadas pelo Município (art. 9º, incs. I a VII, da
LSB): (i) elaboração de plano de saneamento básico; (ii) definição da modelagem da
prestação do serviço, isto é, opção pela forma que o serviço será prestado, indicando
quem será o órgão responsável pela regulação/fiscalização dos serviços de saneamento,
e sua forma de atuação; (iii) Adoção de parâmetros para a garantia do atendimento à
saúde pública, inclusive quanto ao volume mínimo per capita de água para
abastecimento público, observadas as normas nacionais relativas à potabilidade da água;
(iv) fixação dos direitos e os deveres dos usuários, razão pela qual este poderá demandar
ou ser demandado; (v) criação de mecanismos de controle social, implementando,
assim, a gestão administrativa participativa, isto é, permitir que a sociedade participe
dos processos de formulação de políticas, de planejamento e de avaliação relacionados
aos serviços de saneamento básico; (vi) instituição de sistema de informações sobre os
serviços de saneamento, o qual deverá ser articulado com o Sistema Nacional de
Informações em Saneamento, permitindo um amplo compartilhamento de dados e
estudos entre os entes federativos; e, (vii) realização de plano de intervenção e de
retomada dos serviços de saneamento concedidos e permitidos mediante indicação do
órgão regulador, segundos os casos e as condições previstas em lei e nos contratos
correspondentes.
Sem prejuízo de o próprio Município promover, diretamente, a intervenção e a
retomada quando as suas condicionantes estiverem presentes, o órgão regulador, no
exercício de sua função regulatória/fiscalizatória, também poderá indicar as hipóteses
em que ocorrerão.
Quanto ao plano de saneamento básico deverá ser estruturado com a
observância das seguintes regras mínimas (art. 19, inc. I a V, da LSB): (i) realização de
diagnóstico completo do setor, isto é, levantamento dos problemas e necessidades dos
serviços de saneamento com a identificação das suas possíveis causas, com respaldo em
77
indicadores sanitários, epidemiológicos, ambientais e socioeconômicos; (ii)
estabelecimento de objetivos e metas de curto, médio e longo prazos para que os
serviços possam ser prestados para toda a população, admitindo-se, para tanto, soluções
graduais e progressivas, as quais devem ser compatíveis com os planos específicos para
cada um dos serviços; (iii) indicação dos programas, projetos e ações necessárias para
atingir os objetivos e metas previstos, de modo compatível com o plano plurianual -
PPA, e outros planos governamentais correlatos, identificando possíveis formas de
financiamento; (iv) ações para emergências e contingências, as quais deverão ser
adotadas caso os serviços de saneamento passem por um estado de excepcional
racionamento, por exemplo; e, (v) mecanismos e procedimentos para a avaliação
sistemática da eficiência e eficácia das ações programadas, ou seja, o plano deverá
estabelecer um procedimento de controle sobre as ações destinadas à universalização,
visando a manutenção da sua eficiência e eficácia.
O Município poderá estabelecer planos específicos para cada um dos serviços
que compõem o saneamento básico, quando, então, será indispensável consolidá-los, a
fim de manter a integralidade de todo o sistema (art. 19, caput, e seu §2º, da LSB). De
toda a feita, tanto o plano único para todos os serviços quanto o setorial para cada um
deles, deverão ser compatíveis com o planejamento das bacias hidrográficas que estejam
inseridos, vez que, por exemplo, a matéria-prima do serviço de abastecimento de água
potável é a água bruta captada, diretamente, de uma bacia hidrográfica (art. 19, §3º, da
LSB). Daí, a importância dessas compatibilizações.
O plano de saneamento deverá ser revisto periodicamente, pelo menos, antes da
elaboração do PPA, porque, como visto anteriormente, as ações contidas no plano para o
aperfeiçoamento dos serviços deverão ser compatíveis com essa lei orçamentária (art.
19, §4º, da LSB). Antes mesmo da sua elaboração, deverá ser submetido a um regime de
transparência, ou seja, deverá ser discutido com a população, a qual poderá exercer o
seu controle social sobre o planejamento do sistema (art. 19, §5º, da LSB). Trata-se,
uma vez mais, da implementação da gestão administrativa participativa, em que a
população poderá influir nas diretrizes dos serviços que lhe serão ofertados.
78
O prestador dos serviços de saneamento que for criado ou contratado no
decorrer da implementação do plano, estará obrigado a observá-lo, cabendo ao órgão
regulador fiscalizar se aquele e os atuais prestadores estão cumprindo as normas do
planejamento, nos termos legais, regulamentares e contratuais, conforme o caso (art. 19,
§6º, da LSB).
Assim, por exemplo, se o Município promove a concessão de qualquer serviço
de saneamento básico no decorrer da implementação do seu plano, o concessionário,
que acaba de ser contratado, deverá observá-lo, sendo indispensável que o órgão
regulador municipal fiscalize se há o cumprimento das normas do planejamento pelo
novo prestador. Sem contar que se houver impacto no equilíbrio econômico-financeiro
desse contrato, o Município ou, se houver delegação da função de Poder Concedente, o
órgão regulador deverá revê-lo justamente para assegurar o direito constitucional
subjetivo do concessionário a esse equilíbrio (art. 37, inc. XXI , da CRFB/88).
Conforme anotado, o plano de saneamento básico na prestação regionalizada
desses serviços poderá ser elaborado pelo conjunto dos municípios atendidos (art. 43,
Decreto 7.217/2010).
Assim, a despeito de tantos outros desdobramentos e requisitos específicos
previstos na lei, o que se quer demonstrar neste antepasso, é a complexidade do
caminho que os municípios devem obrigatoriamente percorrer para a adequada
prestação de serviços públicos na área de saneamento básico, não apenas por sua
essencialidade ao adequado serviço, como também por requisito prévio de validade para
contratações, sob pena de nulidade absoluta do contrato e configuração de improbidade
administrativa.
3.2.2 Delineamento do arranjo institucional
A União, os Estados e os Municípios podem promover, em ambiente de
cooperação federativa, o planejamento, a regulação, a fiscalização e a prestação de
serviços públicos de saneamento básico, incluindo atividades correlatas a esses serviços
79
Essa forma de cooperação, batizada de gestão associada para viabilizar a
regionalização propugnada e desempenhar as funções de regulação e fiscalização, tem
como via eleita, por tudo exposto no presente trabalho, os consórcios públicos de direito
público, associação pública detentora de natureza jurídica de autarquia interfederativa,
gozando de prerrogativas inerentes às pessoas de direito público, habilitadas ao
exercício de funções decorrentes do poder de polícia.
Conforme tudo já anotado no presente trabalho, a formalização desse consórcio
público, ora entre municípios, podendo contar com a participação do Estado, passa pela
consolidação de um protocolo de intenções, que, após ratificação por lei autorizativa de
cada ente federativo, transforma-se em contrato de consórcio, sendo a base para a
elaboração e registro do estatuto. O estatuto deverá dispor sobre a estrutura,
organização, órgãos, enfim, esmiuçar a competência do consórcio e formas de atuação.
Para efetivar as finalidades previstas do consórcio, o protocolo deverá conter a
cláusula que autorize a gestão associada e que, especificamente, confira poderes ao
consórcio para licitar e contratar concessões, incluindo a PPP, quando então o consórcio
assumirá a posição de Poder Concedente.
O consórcio público torna-se o responsável pela gestão associada dos serviços
públicos, cuja prestação será concedida via PPP. Os Municípios consorciados, mediante
contrato de rateio, comprometem-se a fornecer os recursos financeiros necessários para
suportar as despesas do Consórcio, incluindo as despesas de caráter obrigatório com a
contraprestação dos serviços a serem prestados pela concessão em parceria.
A par disso, duas possibilidades se abrem. Na primeira hipótese, o Consórcio
pode firmar contratos, convênios ou instrumentos congêneres, incluindo-se, por
preferência legal aos consórcios públicos de direito público, a possibilidade de captar de
recursos via financiamento do Fundo Nacional de Saúde - Funasa ou do Ministério das
Cidades, inclusive com a interveniência do Estado, observando-se os critérios de
elegibilidade aplicáveis ao caso concreto, especificamente para implantação ou melhoria
de sistemas de tratamento e destinação final de resíduos sólidos ou mesmo de estações
de tratamento de esgoto. Tais recursos federais não se prestam ao financiamento da
80
iniciativa privada, portanto, o Consórcio, num primeiro momento, poderá contratar por
terceirização de serviços a construção do Aterro Sanitário ou da Estação de Tratamento
de Esgoto, e proceder à modelagem necessária para licitar a concessão dos serviços, via
PPP, desempenhando as funções de regulação e/ou fiscalização. Na segunda
possibilidade, o Consórcio, de plano, licita a concessão, via PPP, do modelo completo:
construir, operar e manter.
As funções de regulação e fiscalização permitem que o órgão regulador
desempenhe atribuições como edição de normas técnicas sobre o setor regulado; resolva
conflitos em sede administrativa entre os prestadores, usuários e o próprio titular dos
serviços; e, ainda, fiscalize o cumprimento de suas regras aplicando as sanções cabíveis,
como por exemplo, multas pela inobservância das normas técnicas exigidas.
Para tanto, o consórcio terá a autonomia e independência especialmente
conferidas pelos municípios consorciados, vale dizer que seu dirigente somente poderá
ser afastado pela Assembléia Geral, que é o órgão máximo do consórcio, nas hipóteses
previstas no protocolo de intenções. As decisões técnicas do consórcio não poderão ser
revistas pelos municípios consorciados. Por fim, o consórcio público, que já possui
autonomia financeira própria decorrente do repasse de recursos públicos pelo contrato
de rateio, deverá ser beneficiado por taxa de regulação pelo desempenho de sua
atividade regulatória, nos termos do contrato de consórcio.
De fato, para a efetivação de uma PPP, muitos outros aspectos além de sua
própria autorização devem ser considerados na elaboração do Protocolo de Intenções,
ainda mais quando enfrenta a característica da voluntariedade das associações. Assim,
uma cláusula de maior relevo deverá apontar o sistema de garantias da contraprestação
pública, prevendo, por exemplo, a constituição de um fundo garantidor das parcerias
público-privadas para assegurar as obrigações assumidas pelo consórcio, perante o
parceiro privado. Nesse sentido, deverá estar prevista a autorização para o consórcio
público participar do Fundo na qualidade de cotista e também a previsão de que os
municípios consorciados passarão por meio de contrato de rateio os recursos necessários
para o Consórcio fazer o aporte ao fundo garantidor, bem como os valores referentes à
sistemática de ressarcimento ao Fundo nos casos de inadimplemento.
81
É possível sempre, mas não obrigatório, um arranjo em que o Estado participe
como interveniente ou como ente consorcial, fortalecendo a articulação entre municípios
e/ou repassando recursos para fomentar determinadas atividades. Tal opção também
poderá ser utilizada, caso os municípios queiram delegar a regulação e/ou fiscalização a
Agência Reguladora Estadual, embora tais funções possam ser exercidas por órgão do
próprio consórcio especialmente instituído para esse fim, como um Conselho de
Regulação.
O Estado poderia até viabilizar o Fundo Garantidor da PPP, com a segregação
de recursos de fundos específicos, desde que assegurada a sistemática para
recomposição. O Fundo Garantidor é acionado apenas nos casos de inadimplemento do
Consórcio no pagamento das contraprestações ao parceiro privado. E dada a previsão
legal de que os entes consorciados, isolados ou em conjunto, bem como o consórcio
público, são partes legítimas para exigir o cumprimento das obrigações previstas no
contrato de rateio, restaria caracterizada a inadimplência do Município com o próprio
Estado.
O procedimento de licitação de PPP também obedece a regras próprias,
previstas na Lei 11.079/2004. Cabe notar, por oportuno, que a lei de PPPs prevê apenas
a obrigatoriedade de consulta pública, mas que em se tratando de serviços de
saneamento básico, deve-se atentar para peculiaridades da LSB, no que se inclui
também realização de audiência pública.
A Concessionária licitada para a prestação do serviço, constituída na forma de
sociedade de propósito específico, será remunerada por tarifas cobradas dos usuários e,
obrigatoriamente, por contraprestações do poder público de sorte a caracterizar-se a
PPP, no caso, patrocinada.
Havendo potencial demanda de serviços por determinados clientes privados,
pode-se acrescentar um contrato de take-or-pay, e a cessão de recebíveis como parte da
remuneração. Em contratos de longo prazo, que importam em grandes investimentos,
tais cláusulas têm a finalidade de proteger a transação, coibindo a retirada da demanda
do contrato.
82
Quanto aos municípios, conforme dito, não se pode obrigá-los a permanecer no
consórcio, por outro lado, mecanismos compensatórios ou indenizatórios previstos no
protocolo de intenções poderiam servir para coibir retiradas de entes consorciados, e
evitar a quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, considerando que o
longo prazo desses contratos ultrapassa o de governos. Imagina-se que este seja mesmo
um dos pontos fracos desse elo institucional.
Aqui, independente da natureza econômica do serviço e de ser passível a
cobrança de tarifa, será a sistemática de remuneração que determinará a modalidade da
concessão em patrocinada ou administrativa.
83
CONCLUSÃO
A aplicabilidade de parcerias público-privadas na gestão associada de serviços
decorre de uma conjunção de fatores que estabelecem um cenário favorável para
implementação de soluções sustentáveis, calcadas no investimento privado, com
benefícios sociais, ambientais, econômicos e políticos em projetos vultosos, mas sem
sustentabilidade financeira.
Uma das motivações para a escolha do modelo de concessão especial, trazido
pela Lei 11.079/2004, decorre da necessidade de desonerar o Poder Público dos
investimentos com a implementação, operação e constante atualização requerida para a
adequada concessão de serviços públicos, no que se incluem obras de ampliação e
melhorias de infraestrutura e serviços, obrigações estas que são transferidas para o
parceiro privado sob planejamento, regulação e fiscalização do Poder Concedente.
Tal Poder Concedente pode ser não apenas um ente federativo, mas vários
reunidos para consolidar um consórcio público de direito público, na forma de
associação pública de natureza autárquica, desempenhando funções típicas de seus entes
federativos, titulares do serviço comum.
Para a sociedade, as parcerias público-privadas representam uma oportunidade
de se desfrutar de serviços públicos bem mais estruturados e coordenados, dentro de
uma política de subsídios, sobretudo pelo fato de que indicadores de desempenho
monitoram todo o processo concessional, vinculados a uma sistemática de pagamento
que possibilita a remuneração variável do parceiro privado, após a disponibilização dos
serviços contratados. Na PPP contrata-se o serviço, uma despesa corrente obrigatória.
O prognóstico do contrato de parceria público-privada é atraente para empresas
do setor privado frente a um modelo de negócios mais consistente, assegurado por um
sistema de garantias, tornando possível a realização de investimentos com prazo de
retorno alongado e com a vantagem de permitir a repartição objetiva de riscos e o
84
compartilhamento de ganhos econômicos efetivos com o público, decorrentes da
redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado.
A Lei 11.107/2005 ao prever a contratação de concessão como alternativa para
a prestação do serviço público objeto de gestão associada, convida à integração entre
consórcios públicos e parcerias público-privadas, criadas pela Lei 11.079/2004, de
forma alinhada ao exigido pelo art. 175 da Constituição Federal, como modalidades de
concessão.
O emprego dos diferentes tipos de concessão vai depender, dentre outros
fatores, da natureza jurídica do serviço a ser concedido, da possibilidade de
identificação (ou não) de quem seja usuário e como ele pode vir a ser beneficiado, assim
como da própria sustentabilidade (ou não) financeira desse serviço. Trata-se, assim, de
consolidação do princípio da subsidiariedade, segundo o qual se não for cabível a
concessão comum, passa-se para a PPP patrocinada e, se pelas mesmas razões não for
cabível, deve-se empregar a PPP administrada. A definição de um projeto de PPP é
singular e somente pode ter seu contorno delineado a partir de cada situação concreta.
Não é a toa que a Lei 11.079/2004 estabeleceu no art. 10, inciso I, a necessidade da
contratação de parceria ser precedida de estudo-técnico e de justificativa que demonstre
as razões do modelo eleito.
As concessões patrocinadas são limitadas aos serviços de natureza econômica,
como requer a gestão associada em sentido estrito, havendo em complementação das
tarifas as contraprestações pecuniárias do poder público. As concessões administrativas,
embora guardem caráter residual, têm um leque maior de aplicação sendo de extrema
importância para os municípios, inclusive na gestão associada lato sensu, seja porque
nesta modalidade a cobrança de tarifas é inviável econômica ou socialmente, de acordo
com a decisão política a ser discricionária e fundamentadamente tomada pelo Poder
Público, seja porque é vedada juridicamente, como no caso da educação e saúde, ou
ainda porque o usuário é a própria Administração Pública. O fato é que contemplam
atividades diversas, inclusive fora do próprio conceito restrito de serviço público.
85
Exemplos disso são incontáveis, a depender da modelagem do contrato e
decisão do poder concedente, atentando para a subsidiariedade das formas. Há casos em
que o serviço tem natureza econômica, mas o Poder Público decide subsidiar o
investimento na região, sem cobrar tarifa, para estimular o desenvolvimento (ex.
construção de rodovia em uma região muito pobre); outros pela vedação à cobrança de
tarifas, por não ser possível individualizar o usuário, como é o caso da limpeza pública
urbana e da coleta. Há ainda situações em que não basta um município realizar
determinada atividade, por estar intrinsecamente ligada a do vizinho, como a realização
de programas de preservação ambiental e de combate à poluição atmosférica ou águas,
atingindo comunidades tão próximas que ações isoladas se revelariam ineficazes; ou a
realização de programas comuns de irrigação de municípios ribeirinhos, com
aproveitamento mais racional de recursos hídricos provenientes das mesmas bacias.
Na utilização dos consórcios públicos como poder concedente para a
contratação de parcerias, obstáculos instransponíveis por um município isoladamente
são vencidos, tais como o valor mínimo de contrato necessário para celebração e a
limitação da capacidade de endividamento em 3% (três por cento) da receita corrente
líquida para a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto de
parcerias contratadas, de sorte a permitir o recebimento de transferências voluntárias da
União conforme o disposto no art. 28, caput, da Lei 11.079/2004, com redação alterada
pela Lei 12.024/2009. Com os consórcios públicos tais despesas.
A Lei de Consórcios Públicos enseja a utilização adequada de instrumentos que
possam reunir municípios carentes de recursos, impossibilitados de enfrentar
isoladamente empreendimentos de infra-estrutura altamente necessários para suas
populações, porém muito vultosos. Poderão, assim, congregar-se associadamente para
combinar os recursos materiais, financeiros e humanos de cada um, no sentido de
realizarem ações conjuntas que, se fossem desempenhadas por cada ente público,
isoladamente, nem ofereceriam a suficiente viabilidade financeira, nem alcançariam os
mesmos resultados positivos com a desejável eficiência. Decerto, porque o
compartilhamento de recursos isoladamente escassos, de máquinas e equipamentos, de
pessoal, especializado ou não, propicia condições que atinjam resultados que não seriam
86
possíveis a nenhuma unidade isoladamente, na realização de políticas públicas de
grande interesse coletivo. Nas possibilidades abertas à constituição de consórcios
intermunicipais para licitações e contratações de obras e serviços de interesse comum,
há que atentar ainda para aspectos especiais de economicidade e eficiência, ligados à
proximidade de certos municípios.
Além disso, a congregação de vários municípios em torno de uma realização
comum irá, sem dúvida, representar um maior atrativo para a catalisação de
investimentos privados e de financiamentos de certo porte, ampliando
significativamente seu poder de negociação junto aos governos estaduais e federais.
Por todo o exposto, embora outras tantas considerações ainda possam ser
levantadas, pode ser visto que se mostra mais lógico, prático e eficiente que municípios
se reúnam em consórcios para tais contratações tão vultosas e complexas que se prestam
mesmo a prestação de serviços com fortes investimentos em infraestrutura e grandes
externalidades positivas, utilizando-se, para tanto, das parcerias público-privadas. Os
consórcios podem inclusive contratar tal modelagem, nos termos do autorizado pelo
protocolo de intenções, elaborando a adequada partilha de riscos e um sistema de
garantias para mitigá-los.
Os obstáculos que existem, decorrem de certas peculiaridades dos institutos
criados pelas Leis nos 11.079/2004 e 11.107/2005, os quais muitas vezes não se
compatibilizam facilmente, necessitando de engenharias institucionais complexas, mas
não impossíveis de formulação, donde se pode concluir pela viabilidade do arranjo a
esperar o devido enfrentamento e vontades políticas para concretização.
87
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ABRUCIO, Fernando Luiz. Os avanços e os dilemas do modelo pós-burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência internacional recente. In: BRESSER-PEREIRA, Luiz C.; SPINK, Peter (Orgs.). Reforma do Estado e administração pública gerencial. 4. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2001. ABRUCIO, Luis Fernando; SOARES, M. M. Redes federativas no Brasil: Cooperação intermunicipal no Grande ABC. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, Série Pesquisas, n. 24, 2001. ARAÚJO, Marcos Paulo Marques. Serviço de Limpeza Urbana à luz da Lei de Saneamento Básico. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008. BORGES, Gonzalez Alice. Consórcios Públicos e Estatuto da Cidade. Jus Navigandi, 2006. Disponível em http://jus2.com.br. Acesso em: 27 mar. 2010. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. BRASIL. Decreto 6017, de 17 de janeiro de 2007. Regulamenta a Lei 11.107, de 6 de abril de 2005, que dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília DF, 18 jan. 2007. BRASIL. Decreto nº 7.217, de 21 de junho de 2010. Regulamenta a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília DF, 22 jun 2010. BRASIL. Lei 8.987 de 13 de Fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília DF, 14 fev. 1995. BRASIL. Lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004. Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília DF, 31 dez. 2004.
BRASIL. Lei 11.107, de 06 de abril de 2005. Dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília DF, 07 abr. 2005.
88
BRASIL. Presidência da República. Ministério da Administração e Reforma do Estado. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília: Imprensa Oficial, 1995. BRASIL. Presidência da República. Secretaria do Tesouro Nacional. Portaria Conjunta SOF/STN nº2, de 06 de agosto de 2009, na Portaria STN nº 467, de 06 de agosto de 2009 e na Portaria STN nº 749, de 15 de dezembro de 2009. Disponível em http://www.tesouro.fazenda.gov.br/legislacao/leg_contabilidade.asp. Acesso em 04.08.2010. BRITO, Bárbara Moreira Barbosa de; SILVEIRA, Antonio Henrique Pinheiro. Parceria público-privada: compreendendo o modelo brasileiro. Revista do Serviço Público, v. 56, n. 1, jan./mar. 2005. CAMARGO, Aspásia. A reforma-mater, os riscos (e os custos) do federalismo incompleto. Parcerias Estratégicas, número 6, março 1999. CAMPOS, Heliana Kátia Tavares; MONTENEGRO, Marcos Helano Fernandes. Regionalização e Gestão Associada de Serviços Públicos de Manejo de Resíduos Sólidos e sua articulação com a gestão dos demais serviços públicos de saneamento básico. Abril de 2009. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 18ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2007. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Consórcios Públicos. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009. COUTINHO, Diogo Rosenthal. Parcerias Público-Privadas: relatos de algumas experiências internacionais. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Org.). Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 47. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. São Paulo: Editora Atlas, 2008. ESPÍRITO SANTO. Lei Nº 8.869 de 15 de maio de 2008. Ratifica o Protocolo de Intenções para a criação da Associação Pública denominada Consórcio Público para o Tratamento e Destinação Final Adequada de Resíduos Sólidos da Região Norte do Estado do Espírito Santo - CONORTE e dá outras providências. Diário Oficial do Espírito Santo ES, 16 mai. 2008. GASPARINI, Diógenes. Visão Geral das Parcerias Público-Privadas. In: ANDRADE, Rogério Emílio de; PAVANI, Sérgio Augusto Zampol (coordenadores). Parcerias Público-Privadas. São Paulo: MP Editora, 2006 GIAMBIAGI, Fabio; ALÉM, Ana Claudia. Finanças públicas: teoria e prática no Brasil. 2. ed. rev. e atualizada. São Paulo: Campus, 2005.
89
JUSTEN FILHO, Marçal. Parecer elaborado sobre a proposta legislativa de criação de consórcios públicos. Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº3, julho/agosto/setembro, 2005. Disponível em http://www.direitodoestado.com.br. Acesso em 25 de julho de 2010. KETTL, Donald F. A revolução global: reforma da administração do setor público. In: BRESSER-PEREIRA, Luiz C.; SPINK, Peter (Orgs.). Reforma do Estado e administração pública gerencial. 4. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2001. MEDAUAR, Odete; OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Consórcios Públicos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006. MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas Licitações e Contratos. 10. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.
NETO, Floriano de Azevedo Marques. Os Consórcios Públicos. In: Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 3, jul./ago./set., 2005. Disponível em http://www.direitodoestado.com.br. Acesso em 25/07/2010. PETRÓPOLIS (RJ). Lei nº 6.717, de 23 de dezembro de 2009. Autoriza o Município de Petrópolis/RJ a integrar o “consórcio público de gestão associada e integrada de manejo de resíduos sólidos, da região serrana II” e dá outras providências. Diário Oficial do Município de Petrópolis RJ, 24 dez 2009. PINTO, Marcos Barbosa. Repartição de riscos nas parcerias público-privadas. Revista do BNDES. Vol.13, n.25, p.155-182. Rio de Janeiro, Junho/2006. Disponível em http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Publicacoes/Consulta_Expressa/Setor/Sistema_Financeiro/200606_10.html Acesso em 12/07/2010. PRADO, Lucas Navarro. Aspectos selecionados da Lei de Consórcios Públicos. Sociedade Brasileira de Direito Público. Maio/2005. Disponível em http://www.sbdp.org.br. Acesso em 05/07/2010. PRADO, Lucas Navarro e RIBEIRO, Maurício Portugal. Comentários à Lei de PPP – Parceria Público Privada: Fundamentos Econômico-Jurídicos. São Paulo: Sociedade Brasileira de Direito Público, 2007. REZENDE, Flávio da Cunha. Por que falham as reformas administrativas? Rio de Janeiro: FGV, 2004. RIBEIRO, Wladimir Antônio. Cooperação Federativa e a Lei dos Consórcios Públicos. Brasília/DF: CNM, 2007. Disponível em http://portal.cnm.org.br Acesso em 30/07/2010. SEABRA, Sérgio Nogueira. A nova administração pública e mudanças organizacionais. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 4, p. 19-43, jul./ago. 2001.
90
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Ed. Malheiros, 1999. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo das Parcerias. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2005 SUNDFELD, Carlos Ari. Guia Jurídico das Parcerias Público-Privadas. In _______, (Org.). Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. TÁCITO, Caio. Reformas do estatuto de concessões de serviços públicos. In: ______. (Org.). Temas de Direito Público. v. 1. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. ZYMLER, Benjamin. As Licitações no âmbito das Parcerias Público-Privadas. Editora Forum, 2005 Disponível em http://www.editoraforum.com.br/produtos. Acesso em 16/07/2010
91
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO ................................................................................................................................... 2
AGRADECIMENTOS ................................................................................................................................ 3
RESUMO ................................................................................................................................................ 4
METODOLOGIA ...................................................................................................................................... 5
SUMÁRIO .............................................................................................................................................. 6
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 7
CAPÍTULO I ............................................................................................................................................ 9
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS ............................................................................................................. 9
1.1. Precedentes Históricos: Parcerias em Sentido Amplo ...................................................................... 9
1.2 As Parcerias Público-Privadas em Sentido Estrito ........................................................................... 12 1.2.1 Contextualização do novo marco legal .................................................................................... 12 1.2.2 A inadequação dos modelos existentes .................................................................................. 14 1.2.3 A lógica subjacente da PPP ...................................................................................................... 17 1.2.4 A solução encontrada .............................................................................................................. 19 1.2.5 Características gerais dos contratos de PPP ............................................................................ 25 1.2.6 Características diferenciais dos contratos de PPP ................................................................... 28
1.2.6.2 A repartição de riscos ...................................................................................................... 30 1.2.6.3 A sociedade de propósito específico ................................................................................ 33 1.2.6.4 O sistema de garantias .................................................................................................... 34 1.2.6.5 A arbitragem .................................................................................................................... 39
1.3. PPP administrativa em destaque: gestão de hospitais .............................................................. 39
CAPÍTULO II ......................................................................................................................................... 42
GESTÃO ASSOCIADA DE SERVIÇOS PÚBLICOS POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS ......................................... 42
2.1. Ambiência do Federalismo Cooperativo ......................................................................................... 42
2.2. Gestão Associada de Serviços Públicos: velhas e novas facetas .................................................... 44
2.3 Consórcios Públicos: inovações da Lei nº 11.079/2005 ................................................................... 49 2.3.1 Quadro Jurídico ....................................................................................................................... 49 2.3.2 A personificação dos consórcios .............................................................................................. 54
2.3.2.1. A personalidade jurídica de direito público .................................................................... 54 2.3.2.2 A personalidade jurídica de direito privado ..................................................................... 57
2.3.3 Privilégios dos consórcios públicos .......................................................................................... 61 2.3.4. Aspectos existenciais dos consórcios públicos ....................................................................... 63
2.4. Prestação de Serviços Públicos na Gestão Associada .................................................................... 68
92
CAPÍTULO III ........................................................................................................................................ 73
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS NA GESTÃO ASSOCIADA POR CONSÓRCIOS PÚBLICOS ....................... 73
3.1. A Sinergia das Parcerias Público-Privadas e dos Consórcios Públicos ............................................ 73
3.2. Consórcios Públicos na Contratação de Parcerias Público-Privadas: um Arranjo Institucional ..... 75 3.2.1 Pressupostos necessários relacionados ao serviço .................................................................. 75 3.2.2 Delineamento do arranjo institucional .................................................................................... 78
CONCLUSÃO ........................................................................................................................................ 83
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ............................................................................................................... 87
ÍNDICE ................................................................................................................................................. 91
FOLHA DE AVALIAÇÃO ......................................................................................................................... 93
93
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição:
Título da Monografia:
Autor:
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito: