UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
O PROCESSO DE MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO EM PETRÓPOLIS A PARTIR
DA IMPLANTAÇÃO DO PROMURJ
CARLOS ALFREDO PEREIRA BAUMANN
PETRÓPOLIS
2008
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2
CARLOS ALFREDO PEREIRA BAUMANN
O PROCESSO DE MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO EM PETRÓPOLIS A PARTIR
DA IMPLANTAÇÃO DO PROMURJ
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em
Educação da Universidade Católica de Petrópolis,
como requisito parcial da obtenção do título de
Mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Celi Chaves
Vasconcelos.
PETRÓPOLIS
2008
3
Bibliotecária Responsável : Antonieta Chinelli Souto.
B347p Baumann, Carlos Alfredo Pereira.
O processo de municipalização do ensino à partir da implantação do
PROMURJ. / Carlos Alfredo Pereira Baumann.
Petrópolis : Universidade Católica de Petrópolis, Faculdade de Educação, 2008. 165p. Orientador : Maria Celi Chaves Vasconcelos. Trabalho de Conclusão de Curso - Universidade Católica de Petrópolis. Mestrado em Educação, 2008.
1. Educação - descentralização. 2. Delegação de competências. 3.
Municipalização do ensino. 4. Eficiência. I. Vasconcelos, Maria Celi Chaves. II.
O processo de municipalização do ensino à partir da implantação do
4
Aluno: Carlos Alfredo Pereira Baumann
O processo de municipalização do ensino em Petrópolis a partir da implantação do
PROMURJ.
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Educação da Universidade Católica
de Petrópolis, como requisito parcial da obtenção do título de Mestre.
AVALIAÇÃO
1. CONTEÚDO
Grau: _______
2. FORMA
Grau: _______
3. GRAU FINAL: ____________
AVALIADO POR
Prof. Dr. Antônio Maurício Castanheira das Neves _________________
Prof.a Dr.a Lia Ciomar Macedo de Faria _________________
Prof.a Dr.a Maria Celi Chaves Vasconcelos _________________
Petrópolis, 07 de abril de 2008.
5
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a meus pais, Carlos Henrique e Dalva, e a minha irmã Glória pelo incentivo e participação que tiveram ao longo de toda a minha vida, fazendo com que acreditasse no trabalho e valorizasse o saber, como forma de crescimento pessoal e na contribuição para um mundo melhor.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço especialmente a minha orientadora Maria Celi Chaves Vasconcelos, pela
dedicação e paciência que demonstrou durante todo o período de elaboração deste estudo,
sempre me incentivando e me fazendo acreditar que eu poderia superar os obstáculos que
surgiam, não permitindo jamais que eu esmorecesse.
Agradeço, também, aos amigos Ricardo Fernandes e Márcia Alvarenga pela
colaboração e pelo crédito que depositaram em mim, antes e depois do ingresso nesta etapa
importante de minha vida que foi o Curso de Mestrado.
Quero ainda expressar minha gratidão aos colegas de trabalho, da Secretaria Municipal
de Educação de Petrópolis, da Secretaria de Estado de Educação do Estado do Rio de Janeiro
e dos órgãos a ela ligados, que contribuíram com material e informação, sem os quais não
seria possível a realização da pesquisa.
Um agradecimento em particular à Professora Madalena Pessoa, da Coordenadoria
Especial de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, pela sua incansável presteza nos
encontros e entrevistas que concedeu.
Agradeço a Deus por todas as graças e oportunidades que me concedeu, como esta de
cursar e concluir mais uma etapa de minha vida profissional.
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RESUMO
O estudo aqui apresentado tem como temática principal a descentralização da
educação pública, colocada em prática no Brasil, nas últimas décadas. Na gestão das redes
públicas de educação básica do país, este processo foi denominado de “municipalização da
educação”. O objeto central deste estudo é analisar a implantação deste modelo
descentralizador, por meio do Programa de Municipalização do Ensino de 1º Grau do Estado
do Rio de Janeiro – PROMURJ, no Município de Petrópolis. A pesquisa faz uma abordagem
inicial sobre a descentralização da educação no Brasil, suas possíveis concepções e
influências. De forma breve, são relacionados os dispositivos legais que determinaram a
municipalização da educação, através da repartição de competências entre os entes da
federação: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, localizando-se em cada instância
administrativa as incumbências na gestão dos diferentes níveis da educação. Ao longo do
estudo são apresentadas as discussões que envolvem a municipalização, nas quais são
descritos os problemas de ordem técnica e política para a sua implantação. Tomou-se como
fontes para as análises realizadas, estatísticas oficiais sobre o ensino fundamental, bem como
documentos que tratam da trajetória das políticas de municipalização. As considerações entre
o que foi feito e o que está por fazer, estão baseadas nas propostas contidas no PROMURJ,
que é ainda o programa oficial que norteia este processo. São abordados ainda os obstáculos
que interferem no processo de municipalização e as transformações verificadas na legislação
voltada para o tema.Trata-se, portanto, de uma pesquisa qualitativa, que utiliza dados
quantitativos analisando-os como reveladores das questões que envolvem os processos de
municipalização no Estado do Rio de Janeiro.
Palavras-chaves: descentralização, municipalização, regime de colaboração, sistema de
ensino em Petrópolis.
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ABSTRACT
The main subject of the presented work is the proposal of the public administration
decentralization, established in Brazil in the last decades. In the administration of the public
basic education in this country, this process was called “municipalization of education” . The
core of this study is the implementation of this decentralization model, through the
PROMURJ – Ist Grade Education Municipalization Program of Rio de Janeiro State in
Petropolis City. The research also approaches the origin of the decentralization proposals in
Brazil and its possible conception and origin, as well as the influence from abroad. Is short it
was intended to relate the proposals and their changes into legal provisions, which
estabilished that the authorities proceed the municipalization of the education, through the
partition of jurisdiction among the federation entities, the Union, States, Federal District and
Municipalities, where each one of the administrative branches is responsible for the
management of the different levels of education. During the essay are presented the
arguments pros and cons of the of the municipalization, where the technical problem and the
politics for its accomplishment are described. The considerations made in the presented work
are based in basic education statistics date along with the municipalization politics course.
The considerations related to what was done and what is needed to be done, are based on
proposals within the Municipazations Program of Rio de Janeiro State, which is the official
document that guides this process. Besides in an analysis issue the political practices which
interfere in the municipalization process and the changes occurred in the legislation related to
this subject.
Key words: descentralization – The county responsabilization, The education in Petrópolis.
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ÍNDICE DE GRÁFICOS
GRÁFICO 01 – Evolução das unidades escolares municipalizadas no Estado do Rio de Janeiro no período compreendido entre os anos de 1988 e 2007..................................... 53
GRÁFICO 02 – Divisão do total de matrículas da educação básica no Estado Rio
de Janeiro ............................................................................................................................. 67
GRÁFICO 03 – Distribuição das matrículas na educação básica de Petrópolis por
setores público e privado. ................................................................................................... 80
GRÁFICO 04 – Distribuição das matrículas na educação infantil de Petrópolis
por setores público e privado............................................................................................... 81
GRÁFICO 05 – Distribuição das matrículas no ensino fundamental de Petrópolis
por setores público e privado............................................................................................... 82
GRÁFICO 06 – Distribuição das matrículas no ensino médio de Petrópolis
por setores público e privado. ............................................................................................. 83
GRÁFICO 07 – Evolução do número de matrículas na rede municipal de
Petrópolis no período 1996 – 2007...................................................................................... 99
GRÁFICO 08 – Distribuição das matrículas na rede pública municipal de
Petrópolis. ........................................................................................................................... 100
GRÁFICO 09 – A evolução da municipalização do ensino fundamental regular
no Estado do Rio de Janeiro. ............................................................................................ 108
10
ÍNDICE DE QUADROS QUADRO 01 – Organização do ensino de acordo com as leis de diretrizes e bases da educação nacional: 4024/61, 5692/71 e 9394/96. .......................................................... 54 QUADRO 02 – Distribuição dos docentes na educação básica no Estado do Rio de Janeiro, por esfera administrativa, em número de profissionais e seus respectivos percentuais por esfera administrativa e por nível de ensino. ............................................... 64 QUADRO 03 – Distribuição das matrículas na educação básica no Estado do Rio de Janeiro, por esfera administrativa, em número de matrículas e seus respectivos percentuais por esfera administrativa e por nível de ensino ................................................ 65 QUADRO 04 – Distribuição das matrículas entre os níveis de ensino e por unidades escolares administradas pela SEEDUC-E em Petrópolis. ................................................... 85 QUADRO 05 – Distribuição das matrículas na UEs estaduais de Petrópolis: etapa/modalidade.................................................................................................................. 86 QUADRO 06 – Distribuição das matrículas do ensino fundamental por modalidade de ensino nas escolas estaduais da SEEDUC-E no município de Petrópolis. ...................... 91 QUADRO 07 – Distribuição das matrículas do ensino médio por modalidade e administração nas escolas estaduais no município de Petrópolis. ........................................ 94 QUADRO 08 – Participação dos convênios na rede pública municipal de Petrópolis....... 97 QUADRO 09 – Total de matrículas por nível segmento/modalidade na rede municipal de Petrópolis, ano -2007......................................................................................................... 99 QUADRO 10 – Unidades Escolares Municipalizadas em Petrópolis................................. 103 QUADRO 11 – Evolução comparativa das matrículas do ensino fundamental regular presencial, entre as redes estadual e municipais para todo o Estado do Rio de Janeiro no período 1999 a 2006. ............................................................................................................ 106 QUADRO 12 – Evolução comparativa do ensino fundamental não regular (EJA/ supletivo/ presencial/ não presencial) entre as redes municipais e estadual, no Estado do Rio de Janeiro no período 1999 – 2006.............................................................. 109 QUADRO 13 – Distribuição percentual das unidades escolares no ensino fundamental entre as redes públicas e a rede privada em alguns municípios do Estado do Rio de Janeiro....... 116 QUADRO 14 – Distribuição percentual das matrículas no ensino fundamental entre as redes públicas e a rede privada em alguns municípios do Estado do Rio de Janeiro ................... 116 QUADRO 15 – Dados comparativos entre o total de UEs municipalizadas por coordenadoria regional com a renda per capita e a população dos municípios.................. 119
11
ÍNDICE DE SIGLAS
ABE – Associação Brasileira de Educação
ALERJ – Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento CAP-UERJ – Colégio de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro CEFET – Centro Federal de Educação Tecnológica CES - Centro de Estudos Supletivos CR11RSIII – Coordenadoria Regional 11 da Região Serrana III CIEP - Centro Integrado de Educação Pública E. E. – Escola Estadual EJA – Educação de Jovens e Adultos FAETEC - Fundação de Apoio à Escola Técnica FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos
Profissionais da Educação
FUNDEF – Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério GP - Ginásios Públicos GSN - Governo Subnacional IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INEP - Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Anísio Teixeira LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC – Ministério da Educação PROMUNICÍPIO Programa de Coordenação e Assistência Técnica do Ensino Municipal PMP – Prefeitura Municipal de Petrópolis PROMURJ – Programa de Municipalização do Ensino de 1º Grau do Estado do Rio de
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Janeiro SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica SEEDUC-E Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro SEE-RJ Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro SESI – Serviço Social da Indústria SUS - Sistema Único de Saúde UE – Unidade Escolar UNDIME – União Nacinal dos Dirigentes Municipais de Educação URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
13
ÍNDICE DE ANEXOS
ANEXO A – Resolução nº 1411, de 03 de dezembro de 1988, que deu origem ao Programa
de Municipalização do Ensino de 1º Grau do Estado do Rio de Janeiro.
ANEXO B – Tabela com as Unidades Escolares – UEs municipalizadas no período
compreendido entre 1988 e 2007.
ANEXO C – Unidades Escolares – UEs da Coordenadoria Regional 11 da Região Serrana
III - CR11 RSIII – Modalidades e nº de alunos em 2007.
ANEXO D – UEs municipalizadas em Petrópolis.
ANEXO E – Total de matrículas na FAETEC, em Petrópolis, em julho de 2007, nas
modalidades de cursos técnicos.
ANEXO F – Cópia do demonstrativo do número de alunos na rede municipal de Petrópolis
por etapas e modalidades.
ANEXO G – Projeto de Lei 483/2007
ANEXO H – Cópia dos artigos 61 e 62, da Lei nº 4528, de março de 2005, que foram vetados
pela governadora e cujo veto foi derrubado pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de
Janeiro - ALERJ.
ANEXO I – Dados do IBGE referentes a Petrópolis.
ANEXO J – Declaração da Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E
14
SUMÁRIO
1 – INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 15
1.1. METODOLOGIA E ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO .......................................... 20
2 – A DESCENTRALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E A MUNICIPALIZAÇÃO
COMO ALTERNATIVAS DE GESTÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO
BRASIL ........................................................................................................................... 31
2.1 REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A MUNICIPALIZAÇÃO ................................. 39
3 – AS POLÍTICAS DE MUNICIPALIZAÇÃO NO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO ......................................................................................................................... 47
4 – A MUNICIPALIZAÇÃO EM PETRÓPOLIS: AS NEGOCIAÇÕES
POLÍTICAS E A TRAJETÓRIA DO PROCESSO DE DESCENTRALIZAÇÃO.. 75
4.1. DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS ENTRE AS REDES DE ENSINO
PÚBLICO E PRIVADO EM PETRÓPOLIS .......................................................79
4.1.1 - Estrutura da rede estadual de ensino no município de Petrópolis ..... 85
4.1.2 - Estrutura da rede municipal de ensino no município de Petrópolis ..... 95
5 – AVANÇOS E RECUOS NO PROCESSO DE MUNICIPALIZAÇÃO ................... 105
6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 122
7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 128
ANEXOS ............................................................................................................................. 133
15
1 - INTRODUÇÃO
A municipalização do ensino é proposta antiga e controversa, seja dentro da área
educacional, seja nas esferas políticas que defendem uma maior descentralização da
administração pública e, conseqüentemente, uma maior autonomia para os municípios, não
apenas na área educacional, mas também em outras instâncias administrativas. Já, no
Império, a Lei de 1º de outubro de 18281 atribuía competências educacionais às câmaras
municipais, demonstrando preocupação com a centralização excessiva na administração
pública. Durante todo o período republicano, a municipalização foi aventada e discutida,
dividindo as opiniões entre os municipalistas e os centralistas. Tais divergências encontradas,
tinham diferentes embasamentos de ordem político-filósofica. A descentralização defendida
pelos municipalistas como proposta política remonta suas raízes ao ideário liberal e aos
discursos positivistas2. Já os centralistas traziam seus fundamentos de ordem absolutista que
imperou na formação dos antigos estados nacionais e cuja perspectiva dava-se em torno das
idéias dos filósofos que prescreviam a existência de uma administração única que tornasse os
poderes do soberano hegemônicos e absolutos.
Atualmente, persiste a idéia de uma educação centralizada e contrária à delegação de
maiores poderes e competências aos municípios, a partir do argumento que nas regiões
dotadas de poucos recursos, em áreas remotas do território nacional, o processo de
descentralização acarretaria perda na qualidade da educação.
O que se verifica nas legislações para a educação, especialmente, nas Leis de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4024/61 e, posteriormente, a Lei nº
9394/96, baseada na Constituição Federal de 1988, são diversas lacunas e imprecisões a
1 Para o artigo na integra ver SUCUPIRA, Newton. In Fávero. A Educação nas Constituintes Brasileiras. 3 ed. Campinas: Autores Associados, 2005. 2 Sobre esse tema ver CURY, Carlos Roberto Jamil. In Fávero. A Educação nas Constituintes Brasileiras. 3 ed. Campinas: Autores Associados, 2005.
16
respeito da descentralização da educação, sendo consideradas por alguns estudiosos da área
como normas vacilantes e indefinidas. Para Savianni (1997), um quadro impreciso e cheio de
lacunas é encontrado no texto legal, tanto no que tange à origem dos recursos que irão
financiar a educação básica, quanto à competência de cada um dos entes federados, União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, nas diferentes etapas da educação.
O aspecto a ser destacados nas propostas do processo de descentralização do ensino
como um todo, e, de interesse particular deste estudo, no município de Petrópolis, são os
aspectos político-administrativos, observados nas relações entre as diferentes instâncias do
poder público e nas relações dentro do município entre o poder público e a comunidade
escolar.
Como professor de geografia de turmas de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental da rede
estadual de educação do Rio de Janeiro e da rede municipal de educação de Petrópolis, tive a
oportunidade de testemunhar, nas escolas em que atuei, as diferenças existentes entre os
modelos de gestão administrativa destas duas redes públicas, bem como as dificuldades e os
obstáculos para a implantação do processo de municipalização do ensino.
Nesse sentido, a escolha do tema de pesquisa na área de políticas educacionais, com
ênfase nos aspectos de centralização/descentralização da educação, resultou também da
proximidade com a realidade investigada e do interesse em contribuir com um estudo
científico para a tomada de decisões, que se fazem urgentes, em relação à continuidade do
processo de municipalização no Estado do Rio de Janeiro e, especialmente, em Petrópolis.
Dessa forma, o presente estudo tem como objeto de pesquisa o processo de
municipalização ocorrido no município de Petrópolis, desde a implantação de programas
oficiais de descentralização da gestão da educação pública no Estado do Rio de Janeiro,
iniciados na década de 70, até as recentes transferências de Unidades Escolares do Estado
17
para o Município, ratificadas com a vigência da Lei do Sistema de Ensino do Estado do Rio
de Janeiro, Lei Estadual nº 4.528/2005
Nessa perspectiva, o recorte temporal utilizado abrange os primeiros movimentos
oficiais de municipalização que perpassaram as décadas de 70 e 80 e tem como foco a década
de 90 e o início dos anos 2000.
A investigação a que se propõe este estudo parte da análise do processo de
municipalização da educação que ocorreu no Brasil nas últimas décadas do século XX, para
desvelar esse movimento em Petrópolis, procurando apontar os avanços e recuos dos aspectos
políticos, administrativos e pedagógicos presentes nas medidas de descentralização que foram
adotadas entre as redes públicas de ensino do Estado do Rio de Janeiro e o Município de
Petrópolis, mais especificamente.
O processo de descentralização não se restringe apenas aos aspectos administrativos e
seus conseqüentes desdobramentos nas finanças públicas. Trata-se de um importante passo de
autogestão, na qual os municípios passam a formular as suas próprias propostas político-
pedagógicas e têm, em teoria, a oportunidade de realizar dentro da comunidade escolar o
exercício da autonomia.
O fim da tutela exercida pelas esferas administrativas superiores, no caso os Estados e
a União, traz para o cenário político uma experiência inédita não apenas na história político-
administrativa brasileira, mas também na gestão e formulação de políticas educacionais. A
descentralização da educação, via municipalização do ensino, parte do pressuposto de que os
municípios já são capazes de determinar seus próprios caminhos, a despeito de fórmulas e
regras vindas de instâncias superiores. Portanto a descentralização é um testemunho e um
reconhecimento da maturidade política adquirida pela sociedade brasileira nas últimas
décadas.
18
Para tratar de políticas públicas que envolvem democracia, autonomia ou maturidade
política, é necessário enfocar uma de suas condições prioritárias, a educação. Há inúmeros
trabalhos como os de Azevedo (2001), Cury (2005), Rosar (1997), Souza (2004) entre outros,
relacionando ambos os conceitos. A educação é cada vez mais considerada um instrumento
legitimador da ordem social e econômica vigente e fundamental para o funcionamento das
instituições democráticas. Contudo a defesa de uma educação de qualidade e que promova
socialmente o indivíduo, transformando-se em um instrumento de inclusão social, ultrapassa
em muito os argumentos apenas de ordem política e/ou social para se tornar pré-requisito de
desenvolvimento econômico. Nesse sentido, as políticas voltadas para a educação básica e,
em particular, para o ensino fundamental, revestem-se de grande relevância, pois a análise do
histórico da gestão da educação no país revela os princípios e finalidades que os governantes
têm postulado para com esse setor.
A expansão das redes municipais de educação básica, atendendo a pequenas
comunidades em locais remotos e à ampliação da escolaridade, é apontada, hoje, como
instrumento de diminuição das desigualdades sociais, promovendo uma maior oferta de
oportunidades.
Segundo Oliveira (2004), a municipalização é uma das modalidades de aprimoramento
da descentralização que tem como objetivo a transferência dos estados para os municípios da
responsabilidade pela oferta da educação infantil e do ensino fundamental. Posição
semelhante a respeito do conceito e do objetivo da municipalização tem Souza (2004), ao
afirmar que a municipalização é uma forma de descentralização que se pode denominar de
divisão técnica e política da gestão da educação, que rompe com a figura solidária da
colaboração existente entre os entes da federação. A municipalização é vista como uma
estratégia de se descentralizar o aparato burocrático e de elevar o grau de autodeterminação
administrativa dos municípios.
19
O fato de a administração municipal estar mais próxima da comunidade a ser
atendida, quando comparada às esferas administrativas estadual e federal, é encarado por
seus defensores como um dos mais fortes argumentos a favor da descentralização. Esta
“proximidade”, entre o centro de decisões e a comunidade escolar, é apontada como um
fator de otimização tanto dos recursos financeiros quanto humanos, o que resulta em uma
administração mais eficiente, maximizando recursos de toda ordem. Em tese, presume-se que
as decisões sejam tomadas por pessoas oriundas da comunidade atendida, e que esta tenha
sido consultada ou que, no mínimo, tenha sido facultada a sua participação no processo de
tomada de decisões. Outro ponto a ser considerado dentro do processo de municipalização da
educação é a possibilidade de a comunidade escolar poder elaborar as suas próprias propostas
político-pedagógicas e colocar em prática a sua implantação nas UEs do município. Isto
descaracteriza o regime de subordinação às políticas estaduais, que chegavam prontas para os
municípios, na forma de determinação a ser cumprida.
Porém como as políticas de municipalização, mesmo depois de décadas de seu início,
ainda são vistas a partir de posições ora antagônicas, ora cautelosas, esta temática constitui
um importante objeto de estudo na área das políticas educacionais, bem como de pesquisas
que se referem à administração pública brasileira.
Além disso, é comum na grande maioria dos municípios brasileiros, se não em todos,
as secretarias de educação constituírem-se, no setor do Poder Executivo, com o maior
contingente de funcionários. Portanto, não há como desconsiderar a importância política,
social e administrativa das propostas descentralizadoras e municipalizantes colocadas em
prática e a necessidade de um estudo aprofundado sobre esse tema.
A inclusão social e a inserção dos indivíduos em uma condição de vida digna,
capacitando-os para as demandas decorrentes da modernidade que se impõem de maneira
veloz, são pré-requisitos para uma disputa cada vez mais difícil no mercado de trabalho.
20
Dessa forma, torna-se imperioso que as políticas de educação estejam em sintonia com as
aspirações e os valores da sociedade para a qual são formuladas, respeitando as características
locais, mas sem esquecer que é imprescindível estar conectado às exigências de uma
economia global, cada vez mais dominada pelas inovações tecnológicas que requerem
necessário domínio sobre os novos códigos advindos da modernidade.
Nesse sentido, inserido no âmbito da pesquisa de políticas educacionais, o presente
estudo tem como objetivo, apresentar um panorama acerca do que foi realizado dentro do
programa de municipalização implantado no Estado do Rio de Janeiro, a partir da década de
70, denominado de Programa de Municipalização do Ensino de 1º grau do Estado do Rio de
Janeiro – PROMURJ, (Anexo A) que permanece em vigor até a atualidade, tomando-se como
foco o processo de municipalização e as circunstâncias em que ele ocorreu no município de
Petrópolis. São apresentadas ainda reflexões teóricas sobre a municipalização, nas quais
foram confrontadas as posições de alguns autores, relativas à gestão da educação básica nas
redes públicas estaduais e municipais.
1.1. METODOLOGIA E ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
A realização de uma pesquisa científica, tem como objetivo elucidar questões tanto
que desafiam o que está posto nas ações do cotidiano, quanto aquelas que buscam novos
paradigmas. “É o conhecimento vivo, que conduz a grande aventura da descoberta do
universo, da vida, do homem” (MORIN, 1999, p. 15). Por algumas vezes foi apenas a
curiosidade humana que levou o ser humano a novas descobertas, e a avanços significativos
na ciência, transformando o modo de viver, de se relacionar e produzir, de satisfazer as
necessidades sociais (MORIN, 1999).
As descobertas ou trabalhos de investigação diferem nos métodos utilizados para se
chegar aos objetivos pretendidos ou aos resultados alcançados. Consoante com o objetivo de
21
se conseguir êxito nos trabalhos científicos, Quivy ( 1988) destaca para as ciências humanas
o seguinte:
Importa, acima de tudo, que o investigador seja capaz de conceber e de por em prática um dispositivo para a elucidação do real, isto é, no seu sentido mais lato, um método de trabalho. Este nunca se apresentará como uma simples soma de técnicas que se trataria de aplicar tal e qual se apresentam, mas sim como um percurso global do espírito que exige ser reinventado para cada trabalho. (p 13)
Ao fazer tal colocação, o autor enfatiza a capacidade individual e a subjetividade de
cada pesquisador, numa alusão de que um mesmo tema investigado por diferentes pessoas
poderá chegar a diferentes conclusões. Conforme Costa (2002), podemos dizer que “a
originalidade da pesquisa está na originalidade do olhar”( p .152).
O trabalho de investigação a que me propus é um tema de caráter político, a
descentralização administrativa do setor público, posta em execução no Brasil, nas últimas
décadas, mais especificamente, na forma de municipalização da educação. Trata-se de um
trabalho no campo das ciências humanas, cujo recorte refere-se à descentralização através da
municipalização em Petrópolis.
Inicialmente, pareceu-me estar apenas diante de uma pesquisa qualitativa, mas no
decorrer do trabalho de investigação e levantamento documental, tornou-se necessário buscar
dados quantitativos que funcionaram ao mesmo tempo como fatores instigadores e
verificadores do objeto de pesquisa.
A dificuldade de se definir com precisão as características do que é uma pesquisa
qualitativa é demonstrada através da fala de André (1995), ao fazer a seguinte colocação:
Muito embora a leitura disponível seja razoavelmente extensa e esteja aumentando cada vez mais, parece que o próprio conceito de pesquisa qualitativa não tem sido suficientemente discutido, o que tem resultado em críticas ou defesas, às vezes pouco fundamentadas, de posições, sem que se explicite de que tipo de pesquisa qualitativa cada um está falando. (p 22)
22
Numa linha semelhante de raciocínio, Gaston Bachelard (1965) resumiu o processo
científico dizendo: “O fato científico é conquistado, construído e verificado: Conquistado
sobre os preconceitos; construído pela razão; verificado nos fatos”(QUIVY, 1988, p. 23).
Os números entram neste estudo como a demonstração de alguns fatos, ou seja, o que
realmente se concretizou em termos práticos na transferência entre as partes envolvidas no
processo de municipalização. Porém os dados numéricos não se restringem a meros
verificadores, podendo ser usados como indicadores de outros fatores que, numa análise
superficial, apresentam-se encobertos ou manipulados. Os dados quantitativos podem ajudar a
traduzir com mais clareza a evolução do processo de descentralização em curso na
administração pública brasileira. Ou seja, conforme afirma Bachelar (1965), pode se verificar
nos fatos, o processo científico.
Dessa forma, para se obter os dados numéricos e macrossociais é necessário recorrer
aos acervos que armazenam essas informações, especialmente aqueles tidos como oficiais,
isto é, que são considerados válidos para fins de estatísticas e planejamentos. Além dos
acervos citados, Quivy (1988, p.202) ressalta que
não se deve desprezar as bibliotecas, os arquivos e os bancos de dados sob todas as suas formas, que são ricos em dados e apenas esperam pela atenção dos investigadores. É portanto inútil consagrar grandes recursos para se recolher aquilo que já existe, ainda que a apresentação dos dados possa não ser totalmente adequada e deva sofrer algumas adaptações.
No caso deste estudo, os dados foram recolhidos em institutos nacionais de estatísticas
como o IBGE ou INEP, bem como nas instituições públicas, objeto da pesquisa: a Secretaria
de Estado de Educação e a Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis.
Tais dados permitem verificar o grau das reformas já implementadas na estrutura da
educação pública estadual e municipal, porém, sempre tendo o cuidado de não esquecer os
fatores sociais e políticos que levaram às ações implantadas.
23
Assim sendo, para a realização desta pesquisa o primeiro procedimento metodológico
constituiu-se no levantamento do material bibliográfico que forneceu as bases teóricas do
conceito e das práticas de descentralização. Um breve histórico mostrou que a dicotomia
centralização/descentralização não é polêmica recente na história da administração brasileira,
estando presente desde o período Imperial.
Para ilustrar essa trajetória das propostas de descentralização administrativa na política
brasileira, em especial, na área educacional, recorreu-se a um levantamento documental que
informou a respeito das transformações ocorridas na legislação e nos respectivos argumentos
que embasavam estas mudanças.
Quanto à origem das fontes, utilizaram-se diversos tipos de documentos, como dados
retirados de órgãos governamentais, tabelas fornecidas pelas Secretarias de Educação do
Estado e do município de Petrópolis; entrevistas com funcionários destas secretarias; Portarias
publicadas no Diário Oficial do Rio de Janeiro; dados do Censo Escolar INEP e do Censo
Demográfico do IBGE; dissertações de mestrado e teses de doutorado sobre o mesmo tema;
bem como artigos publicados em periódicos.
Para se realizar o confronto entre os autores que vêem a descentralização sob óticas
diversas – uns como uma alternativa benéfica e outros com argumentos diametralmente
opostos – recorreu-se também a pesquisas acadêmicas já realizadas que serviram de
referencial teórico para as considerações aqui apresentadas.
Após o levantamento dos acervos documentais relativos ao tema, procedeu-se a uma
ampla análise do material documental encontrado, que se constitui de Portarias, Decretos,
Leis e dados estatísticos/quantitativos, com a finalidade de compreender a evolução do
processo municipalização em seus aspectos de negociação e transferência de encargos entre as
partes envolvidas, no caso, as administrações estadual do Rio de Janeiro e municipal de
24
Petrópolis. O trabalho de levantamento documental e de dados estatísticos foi realizado nos
centros de documentação e dados estatísticos dos seguintes órgãos:
• Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
• Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP)
• Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-E)
• Coordenadoria Regional 11 da Região Serrana III (CR11S III)
• Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis (SME)
• Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC)
Na leitura e interpretação do material encontrado relativo ao tema da pesquisa, foi
necessária uma análise criteriosa para que, partindo de dados estátisticos, fosse possível retirar
a maior quantidade de informações. Para isso, foi fundamental o uso de critérios pré-
estabelecidos acerca do que se queria averiguar, levando em conta o que afirma Morin,
(1999, p. 21) no sentido de que “não se deve desprezar a enorme massa do saber
quantificável”, mas a mesma “deve ser utilizada com liberdade e reflexão”.
Com base na análise dos dados quantitativos e dos números que deles emergiram,
procedeu-se a um paralelo entre eles e as propostas contidas na legislação e nos objetivos do
PROMURJ. Este procedimento foi concretizado com a construção de um conjunto de gráficos
e quadros que demonstram com maior precisão as várias categorias adotadas para se
detalharem os números, o que possibilita maior clareza na leitura de dados. O detalhamento
quantitativo de informações sobre os sistemas de educação estudados foi tratado ao longo do
estudo a partir de categorias de análise relativas às esferas administrativas: municipal,
estadual, federal e privada; além de se abordar de forma estatística e quantitativa também as
várias etapas e/ou modalidades da educação básica.
25
A partir desta etapa do trabalho de pesquisa, procedeu-se à complementação das
lacunas deixadas pelo levantamento dos dados quantitativos, por meio de entrevistas, que
deram sentido aos números, na medida em que as partes envolvidas neste processo
manifestaram as suas considerações sobre a descentralização, como proposta política para a
administração pública e seus efeitos na prática cotidiana.
Procurou-se adotar entrevistas exploratórias não muito formais ou estruturadas,
realizadas após o preenchimento de um breve questionário padronizado. As entrevistas menos
formais, de acordo com Quivy (1988, p.68) “servem para encontrar pistas de reflexão, idéias e
hipóteses de trabalho, e não para verificar hipóteses pré-estabelecidas”. Posição muito
semelhante é verificada nas colocações de Thiollent (1982, p. 80) ao criticar as entrevistas
padronizadas, afirmando que estas foram consideradas pelos positivistas como um
instrumento de “comparabilidade e confiabilidade” e portanto necessárias apenas à base de
quantificação. Thiollent (1982, p. 80), ainda em uma linha de raciocínio semelhante a de
Quivy (1988, p. 68), pondera que uma maior liberdade em entrevistas não diretivas pode
superar os inconvenientes e limitações das entrevistas e dos questionários tradicionais.
As partes ouvidas por meio de entrevistas são classificadas por Quivy (1988, p. 69)
como “testemunhas privilegiadas”. Foram, portanto, tomadas como tal neste estudo, as
seguintes personagens entrevistadas: a Coordenadora de Integração e Municipalização da
Secretaria de Estado de Educação – SEEDUC-E, a representante da Secretaria Municipal de
Educação de Petrópolis, a representante da Coordenadoria Regional Serrana III – CR11RSIII3
e a Presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME/RJ.
A escolha dos entrevistados foi feita pela importância dos órgãos em que cada um
deles atuava e atua ao longo do processo de municipalização. Nesse caso, a entrevista com a
representante da Coordenadoria de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, tornou-se
26
fundamental por se tratar do órgão criado especificamente para acompanhar os processos de
municipalização e servir como canal de negociação com as secretarias municipais de
educação de todo o Estado do Rio de Janeiro, constituindo-se, assim, na principal fonte de
reconstrução do cenário da municipalização no território fluminense. Além disso, ao ouvir a
Coordenadora deste órgão, pode-se acompanhar o processo de municipalização, a partir da
implantação do PROMURJ, pela continuidade do trabalho que vem sendo realizado,
vinculado a este mesmo setor da administração pública, desde a década de 80. Ao longo de
vários encontros, a Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E foi
dissipando dúvidas e preenchendo as lacunas que surgiram na elaboração deste estudo.
Apenas no primeiro encontro, a entrevista teve caráter mais formal usando-se um questionário
pré-estabelecido. A partir do segundo encontro, foi procurado dar a entrevistada liberdade
para fazer colocações que pudessem aumentar a quantidade de informações, mesmo
acrescentando novos rumos ao trabalho. Nos demais encontros, ainda que dúvidas e questões
surgissem, colocadas pelo entrevistador, uma grande quantidade de informações inéditas foi
apresentada de forma espontânea pela Coordenadora de Integração e Municipalização da
SEEDUC-E, possibilitando a divulgação de fatos que não estariam disponíveis em outras
fontes. Foi também por meio da Coordenadora de Integração e Municipalização da
SEEDUC-E, que parte significativa do material impresso com informações pertinentes às UEs
municipalizadas foi obtido.
A primeira entrevista com a Coordenadora de Integração e Municipalização da
SEEDUC-E foi realizada no dia 10 de abril de 2007, com algumas perguntas previamente
preparadas (Anexo J). A partir desta entrevista, uma série de novos questionamentos e
hipóteses foi incorporada ao estudo, por conta de intervenções e acréscimos feitos pela
entrevistada. Depois desta primeira entrevista, outros três encontros ocorreram nos dias 23 de
3 Órgão Regional da Secretaria de Estado de Educação, localizado em Petrópolis, e cuja jurisdição administrativa abrange Petrópolis e alguns municípios limítrofes.
27
abril, 14 de junho e 7 de agosto de 2007. Após cada encontro, a entrevista era transcrita,
procedendo-se as análises e a escrituração do texto referente, assim como as dúvidas que
surgiam eram anotadas para serem esclarecidas no encontro seguinte.
Paralelamente aos encontros com a representante da Coordenadoria de Integração e
Municipalização da SEEDUC-E, foi realizada uma entrevista com a representante da
Coordenadoria Regional 11 da Região Serrana III – CR11RSIII, em 12 de junho de 2007, na
qual foram obtidos os dados estatísticos e as informações mais específicas sobre a rede
estadual localizada no município de Petrópolis (Anexo C).
A representante da Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis foi entrevistada
em dois momentos ocorridos nos dias 7 e 21 de maio de 2007, após vários contatos informais.
Nestes encontros, foi sugerida a realização de visitas a outros órgãos municipais, a fim de se
obter material estatístico com dados contendo os números de UEs e de matrículas da rede
municipal de educação (Anexo F).
Em 18 de novembro de 2007, foi realizada entrevista com a Presidente da União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME, com a finalidade de identificar
e analisar a posição e a argumentação dos secretários municipais de educação em relação ao
processo de municipalização no Estado do Rio de Janeiro.
Em um trabalho desta natureza, eminentemente político, não se pode desprezar o que é
apontado por Quivy (1988 p. 75) como “o discurso como fonte de informação”, uma vez que
este está impregnado de conteúdo ideológico, por mais que o entrevistado se esforce para
demonstrar uma posição de neutralidade em relação ao tema central da entrevista. Coube,
desta forma, ao entrevistador levar em conta “quem falava” e “de onde” estava falando.
O resultado da pesquisa realizada apresenta-se organizado neste estudo em cinco
capítulos estruturados da seguinte forma: no capítulo I encontram-se a introdução e a
descrição da metodologia utilizada; o capítulo II aborda a questão da descentralização da
28
administração pública como a estratégia considerada mais adequada pelos governantes, no
intuito de tornar mais eficiente a máquina administrativa. Neste capítulo, procurou-se relatar
as influências externas nas diretrizes da política nacional e os princípios que inspiraram tais
decisões. São relatos construídos a partir de “leituras exploratórias” (QUIVY, 1988) que
contribuíram para a constituição da temática da investigação, relativa ao problema de partida.
Ainda, no mesmo capítulo, com base nas leituras exploratórias, foram priorizadas as
abordagens e conceitos que versavam sobre as políticas adotadas para a descentralização da
máquina administrativa e as políticas específicas para descentralização da educação,
particularmente, as denominadas de municipalização, relacionando-as às decisões adotadas
para toda a administração pública. Trata-se, portanto, de um capítulo que procurou esclarecer
as origens das diretrizes governamentais descentralizantes e seus efeitos na área educacional.
Todavia não se pretendeu mostrar a educação como algo que esteja “a salvo” das influências
da política internacional e das determinações que emanam de acordos nestas esferas. O
inevitável confronto surge e é demonstrado através de autores de diferentes posicionamentos,
por vezes, denunciando interesses advindos das esferas da macro-política.
No item intitulado Reflexões teóricas sobre a municipalização, são enfatizadas, ainda,
as condições e estratégias necessárias para a implementação das determinações contidas na
legislação vigente, tornando-se necessário fazer considerações de ordem política, palavra esta
que aqui adquire forma mais específica, sendo entendida como a negociação entre
governantes e entre estes e a sociedade. Portanto este item não se limita a um recorte das
determinações legais que versam sobre a educação pública, ainda que sejam freqüentes as
citações de artigos ou parágrafos dos textos contidos na CF de 1988 e na LDBEN nº 9394/96.
No capítulo III, são analisadas as políticas de municipalização no Estado do Rio de
Janeiro, tomando-se como base as determinações contidas no PROMURJ, na legislação
29
pertinente ao tema, bem como no discurso político que dá sustentação à proposta
municipalizante.
Para proceder tal demonstração com maior clareza, são apresentados quadros com
dados estatísticos que permitem retratar a estrutura das redes públicas e privada do Estado,
detalhando a participação por esfera administrativa e por etapas da educação básica (Anexo
X). Partindo-se da proposta contida no PROMURJ e nos dispositivos legais que estabelecem a
delegação de competências, procedeu-se a análise dos números que resultou em estatísticas
que possibilitaram avaliar a evolução do processo de municipalização e o que está por ser
feito. São números como o total de matrículas e de docentes e suas respectivas participações
percentuais em cada uma das esferas administrativas e em cada etapa da educação básica.
Com base nestes dados, verificou-se o que ainda é passível de transferência entre as esferas
administrativas, e o que já foi concretizado, remetendo-se sempre aos princípios da proposta
de descentralização.
Ao se trabalhar com um significativo volume de dados numéricos, é preciso cuidado
para não se associar quantificação a positivismo, e, portanto, ultrapassar a dicotomia
qualitativa/quantitativa (André, 1995). Assim sendo, neste capítulo, a análise do processo de
municipalização não está focada apenas nos dados quantitativos, mas procurou-se
correlacionar estes dados com os argumentos de ordem técnica e empírica que dão
sustentação política aos programas de descentralização implementados não apenas na
educação, mas também em outros setores da administração pública brasileira.
O capítulo IV, em que pese a subjetividade das questões políticas envolvidas, procurou
abordar aspectos que possam ter influenciado as negociações entre as partes, nos processos de
transferência administrativa e delegação de competências, no município de Petrópolis. Porém
para se mensurar a evolução destes processos, recorreu-se mais uma vez aos dados
30
quantitativos, procurando fazer uma leitura analítica dos aspectos implícitos e explícitos
nestes números.
Procedimento semelhante ao detalhamento numérico e estatístico adotado no capítulo
III se repete no capítulo IV, mas agora em relação à estrutura das redes de educação públicas
existentes apenas no município de Petrópolis. Os dados quantitativos demonstram qual a
participação de cada uma das esferas administrativas, em determinada etapa da educação
básica e apontam a evolução destas no período de tempo determinado.
Dessa forma, os procedimentos metodológicos adotados e descritos anteriormente,
bem como a estrutura e organização do estudo, revelaram-se suficientes para apresentar um
panorama da municipalização no Estado do Rio de Janeiro, e, mais especificamente, em
Petrópolis. Todavia como na investigação de qualquer tema, outras pesquisas certamente
deverão complementar o estudo e lançar novos olhares sobre o mesmo assunto.
31
2 - A DESCENTRALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E A MUNICIPALIZAÇÃO
COMO ALTERNATIVAS DE GESTÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO BRASIL
A descentralização da administração pública não surge no cenário político como uma
proposta inovadora e inusitada, ao contrário, pois se trata de tema bastante conhecido dos
foros políticos brasileiros, nos quais sempre suscitou considerações díspares e argumentos
distintos, defendidos pelas partes envolvidas na questão. As concepções sobre
descentralização são, há muito, objeto de estudo de vários pesquisadores, brasileiros, ou não,
estando portanto sujeitas às influências de teorias de autores estrangeiros e aos fatores da
conjuntura internacional que têm reflexos na política brasileira (ROSAR,1997). Um dos
exemplos, a ser apontado como reflexo da política internacional nas diretrizes da política
interna, foi a crise do socialismo ao longo da década de 80. Com o fim do regime socialista,
na extinta União Soviética – URSS, ganhou maior credibilidade e divulgação a ideologia
neoliberal, em evidência na Grã-Bretanha e nos EUA, no período anteriormente citado.
Segundo Rosar (1997), não há como deixar de ressalvar a grande importância que estes dois
países têm nos organismos internacionais e nas relações exteriores do Brasil.
Concomitante ao processo de derrocada do socialismo na URSS e no Leste Europeu,
vários países da América Latina se encontravam em processo de redemocratização, entre eles,
o Brasil. Naquele momento, a grande maioria dos países do continente latino-americano se
via com graves problemas no seu balanço de pagamentos decorrentes do alto grau de
endividamento externo e, portanto, mais suscetível às determinações dos agentes financeiros
internacionais. Como toda instituição bancária, estes organismos internacionais de
financiamento determinam condições que devem ser seguidas como forma de garantir o
sucesso da operação de empréstimo.
Entre os vários postulados que as teorias neoliberais determinam estão: a redução do
estado, dos gastos públicos, a descentralização administrativa, a desregulamentação de vários
setores da economia, entre outros. Azevedo (2002, p. 3) afirma que a adoção destas e outras
32
diretrizes na política caracterizavam-se como pré-requisitos para novos empréstimos e
facilidades na administração de dívidas já existentes.
Esse momento foi de tensão política no Brasil, pois o governo tinha que conciliar as
exigências dos agentes internacionais de financiamento com as demandas sociais reprimidas
por décadas e que vinham à tona por conta da abertura política e da redemocratização do
país. Entre os organismos internacionais de crédito, merecem destaque o Banco Internacional
de Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD, também chamado de Banco Mundial, e o
Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, que sofrem grande interferência dos países
centrais, entre eles os EUA e a Grã-Bretanha. Estas e outras instituições bancárias atrelavam
a concessão de novos financiamentos e da rolagem da dívida dos países periféricos às
políticas adotadas pelos governos destes países. Para Rosar (1997), a descentralização estaria
articulada ao processo de globalização e à adoção de políticas neoliberais, nas quais a
contenção dos gastos públicos e o enxugamento da máquina administrativa se encontravam
entre as principais exigências contidas para as políticas econômicas dos países que captavam
recursos nestas instituições.
Porém, não era apenas do exterior que vinham pressões e argumentos no sentido de se
reformar o Estado. O forte endividamento interno e o crescente déficit fiscal também
demandavam reformas na gestão pública, defendidas por forças internas. Desta forma, as
pressões por mudanças na administração pública se davam tanto por exigências de
organismos externos como internos, provenientes das demandas da sociedade brasileira que
pleiteava maior participação nas decisões políticas e econômicas a serem adotadas.
As eleições para a Assembléia Nacional Constituinte juntamente com as eleições
diretas para a Presidência da República, em 1987, refletiram as duas tendências anteriormente
citadas: a da conjuntura internacional que acenava com o fim do sistema centralizador vigente
em vários países, com a conseqüente ascensão do modelo neoliberal em importantes países do
33
mundo capitalista, e as pressões internas facilmente detectadas no discurso dos políticos
brasileiros. No plano interno, havia uma grande demanda por políticas sociais mais
abrangentes e inclusivas que compensassem os pleitos reprimidos, em conseqüência do
retrocesso político vivido entre os anos de 1964 e 1985, período em que o país foi governado
por uma ditadura militar.
A educação apareceu com destaque e relevância na retórica política, como fator de
inclusão e de justiça social. Entende-se por esses discursos que não há outro instrumento tão
eficaz que leve à democratização e à promoção da cidadania. Entretanto, segundo Azevedo
(2002), o Brasil apresenta péssimos indicadores no que se refere à educação nacional,
mesmo se comparados com os de outros países latino-americanos de menor expressão
econômica.
Estratégias diversas para melhorar o desempenho das escolas e dos estudantes
brasileiros são apontadas, há muito tempo, por diferentes correntes ideológicas da política e
da elite intelectual brasileira. Contudo, como gerenciar os recursos para a educação, de modo
a financiar os sistemas públicos de ensino, fazendo-os chegar a todos os municípios de um
país com desigualdades regionais tão grandes como o nosso?
Com base nas políticas adotadas nas últimas décadas no Brasil, podemos deduzir que
o governo brasileiro considerou que a descentralização administrativa, através da delegação
de competência da educação infantil e do ensino fundamental para os municípios, seria o
melhor caminho. Para ilustrar a evolução dos números referentes ao ensino fundamental,
Azevedo (2002) contrapõem dados de 1970, início dos programas de municipalização, aos de
2000, ou seja, dois momentos distintos do processo de descentralização da educação no
Brasil. No primeiro momento, verifica-se uma taxa de escolarização do ensino fundamental
de 67 % passando para 95% no ano 2000 (MEC/INEP, 2000). O que se constata é que, em
1970, apenas dois terços dos brasileiros freqüentavam a escola e um terço encontrava-se
34
excluído do ensino formal; já 30 anos mais tarde, no fim do século XX, praticamente todos os
brasileiros em idade escolar tinham acesso à educação formal. Tais dados referem-se à faixa
etária entre 7 e 14 anos de idade, quando o ensino fundamental é obrigatório e gratuito por
força do dispositivo constitucional. Contudo a mesma autora (AZEVEDO, 2002) ressalva que
a taxa de escolarização mais abrangente não se traduziu automaticamente em qualidade da
educação e, para tal afirmação, faz referência aos resultados do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica - SAEB, os quais demonstram que os alunos não chegam a
dominar 50% das competências esperadas. O que a autora pretende ao comparar o avanço
quantitativo do percentual de matrículas aos resultados do SAEB, é evidenciar que, embora a
educação tenha se universalizado, este avanço quantitativo não se traduziu em avanço
qualitativo.
Portanto a escola pública e gratuita de qualidade ainda é uma realidade distante das
camadas populares no Brasil. Como afirma Azevedo (2002), o grande aparato estatístico
sobre a educação é manipulado de acordo com as conveniências políticas, pois são objeto de
análise dos agentes financeiros internacionais para a concessão de novos empréstimos, e
ponto de divergência entre governo e oposição.
Em uma análise estatística, podem-se retirar conclusões de acordo com as
conveniências e, portanto, é fato que o acesso à educação no Brasil é, atualmente, mais
abrangente em termos percentuais. Mas será que esta abrangência se traduz em inclusão
social ou se trata apenas de avanço quantitativo, mas não qualitativo?
Um dos principais argumentos que embasam a justificativa de descentralização é a
qualidade. Nas discussões sobre a municipalização da educação, constantemente, aparece o
discurso da produtividade e da melhor adequação das propostas pedagógicas formuladas
pelos próprios municípios, como caminho para uma educação de melhor qualidade.
35
As imposições vindas dos agentes financeiros internacionais, entretanto, não parecem
ter como preocupação a qualidade. Tais determinações são pela adoção de políticas de
descentralização da administração pública, não só para a educação, mas também para outras
áreas, como o Sistema Único de Saúde – SUS, sendo que o instrumento para se viabilizar
essas propostas seria um conjunto de medidas que transferem encargos da União e dos
Estados para os Municípios, visando a reduzir o déficit fiscal, através do equilíbrio entre os
gastos e as receitas do Estado. Para que tal equilíbrio ocorra nas contas públicas, uma série de
medidas é preconizada: a reforma fiscal, a privatização de várias empresas públicas e o
“enxugamento” dos setores públicos. Dando prosseguimento ao “figurino” neoliberal, retira-
se o Estado de inúmeros setores da economia, mudando a regulamentação destes setores, nos
quais a administração pública não é vista como eficiente e, portanto, cedendo espaço à
iniciativa privada. Por conseguinte estimula-se a participação de empresas estrangeiras no
mercado interno. A abertura de mercado aparece como uma forma de incentivar a
concorrência, sendo esperado como resultado uma maior eficiência. Para que tal fato ocorra, é
necessária a abertura do mercado nacional para o capital estrangeiro.
Com a posse de Collor de Mello na Presidência da República, em 15 de março de
1990, a maior parte destes postulados constantes do modelo neoliberal foi atendida e, segundo
Azevedo (2001), dá-se início ao desmantelamento do Estado e a abertura da economia
brasileira ao capital internacional. Uma vez vendo seus interesses contrariados pela perda de
espaço dentro do mercado nacional, a elite empresarial brasileira comandou um intenso
movimento de repúdio ao governo Collor de Mello. Este movimento ganhou forte adesão
popular uma vez que escândalos de corrupção do governo tiveram grande destaque na
imprensa da época e culminaram com o impedimento de Collor de Mello, decretado pelo
Congresso Nacional, “atendendo” ao clamor de manifestações populares. Collor de Mello
deu início às propostas neoliberais para a economia e para a política administrativa brasileira.
Contudo a derrubada do governo não pôs fim à implementação de políticas neoliberais que
36
pregavam a redução e o re-ordenamento das funções do Estado, assim como uma nova
distribuição de competências entre os entes da federação: União, Estados e Municípios. Os
governos seguintes de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, e o atual adotaram uma
série de medidas que deram continuidade às políticas de descentralização, através do repasse
de recursos e do re-ordenamento jurídico.
Os mesmos argumentos relativos à descentralização muitas vezes são usados por
defensores e opositores, mas com interpretações diferentes, demonstrando uma posição
contraditória entre causa e efeito para as mesmas medidas. Silva (1998) descreve
interpretações antagônicas sobre o papel do Estado na educação e, por conseguinte, sobre a
descentralização: “ou se torna público o Estado e se fortalece a sociedade civil, ou o Estado se
desobriga da Educação.” Fávero (2005) faz referência a um argumento semelhante na época
do Império, quando o Ato Adicional de 1824 instituía a delegação de competências para as
Províncias, responsabilizando-as pelas escolas de primeiras letras. De acordo com Sucupira
(2005), este fato demonstrava qual era a importância dada pelo governo central, no Império, à
educação fundamental.
Atualmente, os defensores da descentralização argumentam que esta modalidade
administrativa vai assegurar o equilíbrio das contas fiscais, sendo um atributo do federalismo
moderno e, portanto, mais democrático, tirando do governo central o poder de decisão,
resguardando o respeito aos governos sub-nacionais, ou seja, Estados e Municípios (Prado
apud Oliveira, 2003, p. 41). A otimização dos recursos, por conta da esperada agilidade
burocrática da gestão municipal, é defendida por estar próxima do objeto a ser administrado,
argumento também usado pelos defensores da descentralização administrativa via
municipalização. Para os adeptos desta modalidade de gestão, são usados ainda argumentos
de natureza política, afirmando que ela fortalece a sociedade civil, ampliando a participação
da sociedade local que passa a ter o poder de decisão, não ficando este restrito apenas às
37
esferas mais elitizadas da sociedade, que tem voz nos escalões mais altos do governo central.
Já em 1935, Anísio Teixeira criticava o centralismo, afirmando em palestra realizada na V
Conferência Nacional de Educação da Associação Brasileira de Educação – ABE - que “a
uniformidade da educação significava a morte e a petrificação”. Para justificar a sua posição
contrária ao centralismo imposto pelo Governo Vargas, Anísio Teixeira argumentava que só
uma estrutura descentralizada poderia garantir respeito à diversidade cultural brasileira e à
construção de um Estado democrático.
Portanto não só argumentos em defesa da eficiência e da otimização de recursos são
levantados em prol da descentralização, fatores de ordem político-social também sustentam
as políticas descentralizantes, ao se afirmar que, por meio destas, é dada voz e vez aos
moradores de municípios pequenos e sem expressão, para formularem suas próprias políticas
de educação com adequação pedagógica à realidade local, além de autonomia financeira e
administrativa.
O centralismo administrativo ficou associado aos regimes ditatoriais e às políticas
implantadas por esses governos, seja na era Vargas ou nos governos militares que vigoraram
após o golpe de 64, até a década de 80. Durante muito tempo, os partidos de oposição, no
Brasil, levantaram a bandeira da descentralização como forma de democratizar a
administração pública.
Conforme vimos ao longo deste capítulo, a descentralização foi bandeira de diferentes
correntes políticas e ideológicas, em diferentes momentos históricos. A proposta
descentralizadora atravessou os períodos da história brasileira, sendo sempre objeto de
indagações por ideologias diversas. Autores distintos, de épocas diferentes, se posicionaram
de maneira diversa, com argumentos favoráveis ou contrários a esta ou àquela modalidade
de administração pública no Brasil.
38
Além disso, as influências externas na política brasileira sempre estiveram presentes,
seja por meio da filosofia contida em novas propostas que circulam nos ambientes
acadêmicos, seja por força da imposição contratual dos financiamentos obtidos em
organismos internacionais. Tais fatos são observados em vários momentos da nossa história,
tanto no passado mais distante, quando os autores iluministas influenciaram os movimentos
pró-independência, como no princípio do século XX, quanto a Escola Nova do americano
Jonh Dewey influenciou o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932. As
ideologias políticas estrangeiras também exerceram forte influência na política nacional ao
longo do século XX, sendo que as mais sentidas foram a ascensão e a queda do comunismo.
Atualmente, fatores externos, advindos da conjuntura política internacional e de um
mundo cada vez mais globalizado, têm tido significativa influência tanto na política, como
nos autores brasileiros, refletindo-se nas propostas para a educação nacional e nas propostas
pedagógicas em geral.
Portanto, a política educacional brasileira é, em parte, resultado de influências externas
e de peculiaridades internas tanto de ordem cultural, como de ordem política. Nesse sentido,
nas políticas governamentais para a educação básica no Brasil, a face mais evidente da
descentralização adotada é a municipalização da educação, que ganha determinação legal na
Lei 5692/71 e se consolida em instrumentos jurídicos posteriores como a CF de 1988 e a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN nº 9394/96. Como decorrência mais
evidente destes ordenamentos jurídicos são implementados os programas de municipalização
da educação no Brasil, que, pouco a pouco, se concretizam, deixando de ser mera retórica
como em momentos passados.
39
2.1 – REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A MUNICIPALIZAÇÃO
A Constituição de 1988 é a principal fonte jurídica de um novo ordenamento
federativo que distribui competências administrativas e tributárias entre os entes da federação:
União, Estados, Distrito Federal e Municípios. As modificações tributárias e administrativas
refletem as pressões da sociedade brasileira sobre o Congresso Nacional, naquele momento,
quando houve um intenso embate entre as forças políticas que se intitulavam progressistas,
em oposição ao avanço das forças que estes chamavam de conservadoras. Os progressistas
acusavam os conservadores de defensores dos interesses do grande capital, fosse ele nacional
ou internacional. O embate entre os defensores das diferentes correntes da educação
continuou, mais tarde, na elaboração da LDBEN nº 9394/96. As forças intituladas de
progressistas defendiam a escola pública gratuita e de qualidade e temiam o avanço da
privatização do ensino como defendiam conservadores.
Além disso, também se fizeram presentes no texto da LDBEN nº 9394/96, interesses
tanto dos defensores de políticas descentralizantes e, neste caso, municipalizantes, para
educação, como as idéias daqueles que preferiam a indefinição de papéis para que as decisões
e regulamentações acabassem a cargo dos governos centrais.
Apesar da LDBEN nº 9394/96 procurar estabelecer incumbências, baseadas em uma
lógica que já vinha da Lei de Ensino anterior (Lei nº 5692/71), de iniciar o processo de
repasse aos municípios de prioridades no âmbito da educação, o Estado permaneceu com a
responsabilidade de assegurar o ensino fundamental e priorizar o ensino médio.
Note-se o que diz o artigo 10 da LDBEN nº 9394/96:
Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino;
II - definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público;
40
III - elaborar e executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios;
IV - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino médio.
Parágrafo único. Ao Distrito Federal aplicar-se-ão as competências referentes aos Estados e aos Municípios.
O artigo 10 da LDBEN nº 9394/96 faz menção às competências do Estado, e as formas
de cooperação entre os Estados e os Municípios, no que diz respeito ao ensino fundamental,
de maneira que exista uma convergência de interesses e de espaços de atuação, para que não
haja a superposição da oferta de um mesmo nível de ensino, em detrimento de outro.
Entretanto é importante ressaltar que os Estados têm o ensino médio como prioridade,
enquanto o ensino fundamental deve ser objeto de colaboração entre Estados e Municípios,
sendo prioridade para os municípios, e estes ainda podem oferecer outros níveis de ensino,
desde que a oferta de vagas no ensino fundamental esteja atendendo plenamente à demanda.
O artigo 11 da LDBEN nº 9394/96 define as áreas de competência da educação para os
municípios:
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica.
No texto da Lei, vale destacar o fato de ainda ser facultativo ao município ter o seu
próprio sistema de ensino, uma vez que, no artigo 11, parágrafo único, é dada ao município a
opção de integrar-se ao sistema estadual de educação básica.
41
Uma vez observada a forma como a legislação vigente trata as incumbências de
Estados e Municípios, pode-se iniciar a reflexão sobre a municipalização, as origens de sua
discussão e a progressiva implantação nos sistemas de ensino do país. Para isso, torna-se
necessário voltar ao contexto macro-educacional, a fim de entender as influências que se
fizeram presentes não só na elaboração da Lei, mas nos discursos que embasaram a defesa das
políticas educacionais descentralizadas.
Os postulados neoliberais presentes nas políticas brasileiras, nas últimas décadas do
século XX, misturaram-se às idéias nacionalistas e estatizantes, numa disputa ideológica que
vem atravessando os últimos governos. Esta disputa tem reflexos no que diz respeito à
descentralização da administração pública e à distribuição de encargos e subsídios para as
diferentes esferas administrativas do Estado, inclusive a educação.
Para Rosar (1997), as décadas de 70 e 80, durante os governos militares, marcaram o
início das políticas de descentralização no Brasil, que se materializaram por meio da
municipalização. Na Lei nº 5692/71, já estavam previstos projetos federais nesse sentido,
porém sem o devido repasse de recursos para os municípios, sendo, então, necessário que
estes arcassem com as suas novas atribuições, estabelecidas em projetos como o
Promunicípio4, Edurural,5 Pólonordeste6, Pronasec7, Projeto Nordeste, entre outros.
O Banco Mundial foi o principal agente financiador destes projetos. Rosar (1995)
ressalta que, naquele momento, décadas de 70 e 80, o governo federal induzia à
municipalização do ensino, mas centralizava a administração de recursos captados em agentes
financeiros internacionais.
4 Programa de Coordenação e Assistência Técnica do Ensino Municipal, criado em 1974 pelo MEC como forma de viabilizar a transferência do 1º grau para os municípios. 5 Programa de Expansão e Melhoria da Educação no Meio Rural do Nordeste, criado pelo MEC para atuar no período de 1975/79 na capacitação de recursos humanos. Acordo MEC/BIRD. 6 Projeto de Educação Básica para o Nordeste, criado em 1982, como alternativa a projetos anteriores tinha recursos do Banco Mundial e foi relançado em 1992, para a região que carecia de atenção especial. 7 Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas para o Meio Rural, vinculado à Secretaria Geral do MEC.
42
Com a chamada redemocratização do país, veio a CF de 1988, que não se preocupou
apenas com um novo ordenamento jurídico, disposto no artigo 211, o qual discorre sobre a
distribuição de competências que visassem a um melhor gerenciamento dos recursos públicos
para a educação, mas procurou desenvolver instrumentos que aperfeiçoassem a democracia
brasileira. Para que tal ocorresse, não houve apenas uma partilha de poder entre os entes da
federação, mas também a preocupação com uma maior participação da sociedade civil
organizada nas decisões de diferentes setores. A nova CF de 1988 contemplou, em seu texto,
a determinação de que se constituíssem conselhos e agências reguladoras nas diferentes
esferas da sociedade civil.
Contudo há um paradoxo nos discursos relativos à descentralização. Silva (1998),
evidencia os argumentos usados em suas duas faces: uma que acredita que a proximidade do
centro de decisões torna mais forte a sociedade civil através da participação, e outra que
afirma a possibilidade de ocorrer uma liberação da União quanto à problemática educacional.
Críticos ferrenhos do modelo centralizador usado durante os governos militares, também
alegavam na ocasião que esta modalidade administrativa afastava a sociedade do poder e que
as decisões políticas eram tomadas por uma cúpula a despeito da soberania popular.
Ratificando esses discursos, Bomeny (1998), aponta para a falta de participação popular e a
centralização burocrática nas políticas para a educação no Brasil, até os dias atuais. Já Borghi
(2000), acredita que se houvesse uma participação mais efetiva da comunidade, cobrando,
fiscalizando e demandando a descentralização, a mesma conseguiria ter sucesso. Na fala
dessas autoras, percebe-se o descrédito em relação a uma participação popular efetiva nas
decisões sobre a educação nos pequenos núcleos urbanos do interior do Brasil. Silva (1998)
ao dizer que “ou se torna público o Estado e se fortalece a sociedade civil, ou o Estado se
desobriga da Educação”, ressalta as duas faces dessa política de descentralização da educação,
que pode dar margens a diferentes interpretações e hipóteses, estimulando o paradoxo
anteriormente citado. Mas as controvérsias não param por aí.
43
Para Borguetti (2000), a tomada de decisões em nível local foi positiva, pois agilizou a
administração das escolas e melhorou a qualidade do ensino, ainda que se constate que houve
uma concentração de poder local, dificultando a participação dos indivíduos e, mais ainda, a
implantação de um modelo de gestão participativa.
Observa-se ainda que tanto Vasconcelos (2003) como Rosar (1995), falam do processo
de descentralização, mas a partir de direções opostas. Rosar (1995) se reporta aos agentes
externos indo do universo da macro-política, ao se referir à conjuntura internacional, para os
seus efeitos no universo da micro-política, no caso, os municípios. Esta trajetória fica evidente
em sua argumentação, quando recorre à hipótese de que a descentralização está articulada ao
processo de globalização que ocorre tanto no plano econômico, como no plano ideológico,
com a difusão das idéias neoliberais, cujas implicações têm sido, em última instância,
contribuir para a desconstrução dos Estados Nacionais e dos seus sistemas educacionais.
Vasconcelos (2003) investiga, na célula menor do processo de descentralização, o município,
os possíveis obstáculos que resultam nos fracassos, ressaltando que, contudo, muitos avanços
são verificados e, portanto, justificam a continuidade deste processo.
Em outro artigo, Prado (2003) define os municípios como Governos Subnacionais –
GSN - e ressalta o processo de descentralização fiscal e a autonomia orçamentária que a CF
de 1988 propõe para os GSNs, ou municípios. Numa exposição técnica, o autor afirma que a
descentralização é uma tendência em vários países do mundo, embora ressalve que a
dependência dos municípios brasileiros do repasse de recursos do governo federal, coloca a
autonomia administrativa e os defensores da descentralização, em cheque, pois não basta ter
autonomia administrativa, uma vez que permanece a dependência financeira.
A criação do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do
Magistério – FUNDEF, através da Lei nº 9424, de 24 de dezembro de 1996, e a sua
implantação em 1997, com o intuito de financiar o ensino fundamental, procurou suprir a
44
carência de recursos financeiros dos municípios, ao estabelecer critérios para a redistribuição
dos recursos deste fundo. O FUNDEF contribuiu para o êxito das políticas de
descentralização na área da educação, pois atenuou as dificuldades relativas às imensas
desigualdades regionais encontradas em nosso país. Nesse sentido, fortalecendo a idéia de
descentralização e a distribuição de recursos via FUNDEF, a aprovação da Emenda
Constitucional nº 29/2000, determinou a vinculação dos recursos orçamentários para a
educação às três esferas de governo: federal, estaduais e municipais, independente das
vinculações político-partidárias, de cada uma. A distribuição dos recursos do FUNDEF,
obedecia a critérios técnicos, baseados no número de alunos matriculados nas redes públicas
dos municípios, sendo observados os níveis e modalidades de ensino. No entanto não eram
contemplados pelo FUNDEF: a educação infantil, a educação de jovens e adultos e o ensino
médio. O FUNDEF foi apontado por Santos (2000) como um marco no "processo de
democratização das oportunidades educacionais", em contraposição a Arelaro (1999) que
atacava este mesmo fundo, por causar dependência dos municípios em relação a um repasse
de verbas da União. Esta autora reivindicava uma melhor definição da distribuição de
recursos em uma proposta de reforma tributária nacional. Posição semelhante a respeito da
dependência dos recursos originários do FUNDEF repassados às prefeituras para o
financiamento da educação do ensino fundamental é defendida por Lo Bello (1996) que
propõe a efetivação de uma verdadeira descentralização fiscal, com a distribuição de recursos
que permita aos municípios uma maior participação na carga tributária e, conseqüentemente,
uma maior autonomia financeira, independente das articulações políticas. Ainda, Pascoalino
(2001) também aborda a necessidade de se dotar os municípios de autonomia política, no
lugar de uma dependência constante de verbas federais repassadas via FUNDEF.
45
O financiamento da educação é a questão mais complexa de todo o processo de
descentralização da educação, por meio da municipalização. A alegação de falta de recursos é
o principal argumento e, ainda que possa encobrir outras questões, pode ser colocado como
um fator que levaria à impossibilidade do cumprimento do que determina a Lei. Para rebater
este argumento é que foram criados os fundos de financiamento da educação, como o
FUNDEF, que foi recentemente extinto e que deu origem a um novo fundo, o Fundo de
Manutenção da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB.
O FUNDEB foi criado por meio da aprovação da Emenda Constitucional de nº 53, de
19 de dezembro de 20068, na qual se encontra fixada a origem dos recursos e o método de
cálculo de distribuição de suas verbas em função do número de alunos, além de outras
variáveis. O FUNDEB difere do FUNDEF, ao contemplar toda a educação básica e não
apenas o ensino fundamental e, também, ao abranger, na redistribuição dos recursos, outras
modalidades de ensino e não apenas o ensino regular, conforme estava prescrito no FUNDEF.
Um dos argumentos constantemente usado, quando se fala de municipalização é o de
que pequenos municípios do interior não teriam condições de custear sozinhos todo o ensino
fundamental, além da educação infantil. Com os fundos específicos para o financiamento da
educação este problema começa a ser encaminhado, embora a gigantesca disparidade
existente entre as regiões e os municípios brasileiros permaneça como um obstáculo, já que,
ao se utilizar uma única fórmula de cálculo para custeio da educação em todo país, essa tarefa
torna-se difícil, senão impossível.
O grau de municipalização no Brasil difere entre os Estados, estando mais avançado
na região Nordeste, justamente, onde os municípios têm menor arrecadação e, em teoria,
deveriam ter mais dificuldade de arcar com uma parcela maior de estudantes do ensino
fundamental nas escolas públicas sob sua administração. Entretanto, é importante lembrar
46
que, por força da Lei nº 5692/71, vários projetos, anteriormente mencionados, já haviam sido
postos em execução nas áreas mais pobres do país, principalmente, no Nordeste, o que
explica, em parte, os altos índices de municipalização.
No capítulo a seguir, apresentam-se as políticas de municipalização específicas para o
Estado do Rio de Janeiro, onde esse processo se encontra em implantação desde a década de
80, embora ocorra lentamente, uma vez que municípios situados na região metropolitana, com
grande população e alguns com grande arrecadação de impostos, não têm demonstrado
interesse em municipalizar UEs da rede estadual ou absorver estudantes do 1º segmento do
ensino fundamental, entre outras razões, pelos inúmeros encargos que tal processo acarreta às
prefeituras.
Portanto, a falta de uma determinação específica contida na legislação sobre as
competências das instâncias administrativas para as etapas da educação básica, ou de como se
dará o previsto “regime de colaboração”, tornam-se fatores limitantes a municipalização.
Além disso, a baixa adesão de municípios com grande contingente populacional, localizados
na região metropolitana do Rio de Janeiro, ao programa de municipalização do Estado, o
PROMURJ, contribuem para que o número de alunos matriculados no ensino fundamental em
UEs da rede estadual permaneça alto e continue bastante expressivo em relação ao total do
Estado.
8 Publicada no Diário Oficial de 20-12-2006. As alterações determinadas por esta Emenda Constitucional já foram processadas no texto da Constituição.
47
3 - AS POLÍTICAS DE MUNICIPALIZAÇÃO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
De acordo com a pesquisa realizada nos arquivos da SEEDUC-E, o primeiro passo para
a descentralização da educação no Estado do Rio de Janeiro se iniciou como resultado da
determinação expressa na Lei Federal 5692/71, artigo 58, § único:
Art. 58 A legislação estadual supletiva, observado o disposto no artigo 15 da Constituição Federal, estabelecerá as responsabilidades do próprio Estado e dos seus Municípios no desenvolvimento dos diferentes graus de ensino e disporá sobre medidas que visem a tornar mais eficiente a aplicação dos recursos públicos destinados à educação. Parágrafo único. As providências de que trata este artigo visarão à progressiva passagem para a responsabilidade municipal de encargo e serviços de educação, especialmente. de 1º grau, que, pela sua natureza, possam ser realizados mais satisfatoriamente pelas administrações locais.
O artigo 58 da Lei nº 5692/71, acima destacado, buscou no texto da Constituição de
1967, no artigo 15, a determinação para que a legislação estabelecesse competências
distribuídas entre Estados e municípios. Observa-se que, já naquele momento, está presente no
texto o discurso de que os municípios por sua condição de “administração local” podem tornar
mais eficiente a gestão dos recursos públicos. Tal recomendação baseava-se no artigo
constitucional nº 15, no qual nota-se a determinação de uma “progressiva passagem” de
encargos dos Estados para os Municípios.
Em 1969, foi realizada uma retificação da Constituição de 1967, outorgada pelo
governo militar, na qual a preocupação com a segurança nacional aparecia com grande
destaque. De acordo com Carneiro (1998, p. 21), este texto constitucional apresentava algumas
contradições no que dizia respeito à educação. O texto de 1967 ampliava a obrigatoriedade do
ensino fundamental dos 7 aos 14 anos de idade, o que é considerado pelo autor um avanço, mas
permitia o trabalho infantil de crianças de 12 anos, o que conflitava com a disponibilidade de
tempo para freqüentar uma escola.
Entre as várias prescrições legais estabelecidas na Constituição Federal de 1988, na
legislação federal, na legislação estadual supletiva para a educação, até se chegar ao primeiro
48
ato formal e legal de descentralização administrativa da educação pública, via municipalização
no Estado do Rio de Janeiro, o lapso de tempo ultrapassou uma década. Num primeiro
momento, após a Lei 5692/71, o que se fez no Estado do Rio de Janeiro foram convênios de
repasses técnicos, para, só mais tarde, se dar início ao programa efetivo de municipalização.
Somente em 1987, no governo Moreira Franco, foi assinada pelo Secretário de
Estado de Educação, Carlos Alberto Direito, a Resolução SEE nº 1.411 de dezembro de 1987,
( Anexo A) que criava o primeiro programa de descentralização da educação pública, também
denominado de municipalização, no Estado do Rio de Janeiro.
Contudo a preocupação já expressa na Lei 5692/71, de tornar a gestão da educação
pública mais ágil e eficiente não foi completamente desconsiderada pela administração
estadual, e algumas medidas anteriores foram adotadas.
Em 1978, no Governo Faria Lima9, iniciou-se um trabalho de parceria entre o governo
do Estado do Rio de Janeiro e os Municípios, denominado Pró-Município10, portanto, bem
antes de 1987, e da Resolução anteriormente citada que deu origem ao Programa de
Municipalização do Ensino de 1º Grau do Estado do Rio de Janeiro – PROMURJ.
Esse convênio de cooperação técnica junto às prefeituras, o Pró-Município, teve início
em 1978 e era classificado apenas como um regime de colaboração entre as diferentes esferas
da administração pública: estadual e municipal.
Naquele momento, no final da década de 70, a precariedade da maior parte das
administrações municipais no Estado do Rio de Janeiro era flagrante. Muitas prefeituras não
tinham sequer secretaria de educação, contando apenas com um departamento de educação
que, na maioria dos casos, funcionava em uma sala da prefeitura com deficiência de recursos
9 Faria Lima foi governador do Estado do Rio de Janeiro, entre 15/03/1975 e 15/03/1979, sendo indicado pelo governo central para eleição indireta na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. 10 Não se trata do programa de mesmo nome citado anteriormente e que foi criado em 1974, de caráter federal, mas este a que nos referimos imediatamente, era um convênio de repasse técnico entre o governo do Estado do Rio de Janeiro e os municípios.
49
materiais e humanos, tanto nos aspectos quantitativos quanto qualitativos. A carência de
recursos humanos se verificava não apenas nos quadros administrativos, mas também e,
principalmente no corpo docente, que, em grande parte, era constituído por leigos, sem a
formação profissional adequada. O magistério público possuía parte de seus professores sem
habilitação, o que era facilitado pelo fato de não haver concurso público nem regime
empregatício.
Os problemas enfrentados pela educação municipal não paravam por aí: as aulas eram
ministradas em turmas multisseriadas, em escolas com instalações muito precárias, por vezes,
sem energia elétrica e com outras deficiências de estrutura física. Somavam-se a essas
adversidades o acesso difícil, principalmente, na zona rural. Nestas condições, era comum nas
escolas rurais, situadas dentro de fazendas, a filha e/ou a esposa de um fazendeiro dar aula,
ainda que não habilitada.
A falta de capacitação dos gestores das redes de educação municipal também era vista
pela administração estadual como um entrave a um melhor desempenho das atividades da
educação, bem como de outros setores da administração pública. A profissionalização dos
servidores e o repasse de técnicos administrativos eram considerados como medidas
fundamentais ao desenvolvimento sócio-econômico do interior do Estado do Rio de Janeiro.
O Governo do Estado, na ocasião, julgou então necessário repassar conhecimentos técnicos
aos municípios, com intuito de agilizar o desempenho administrativo destes no que concerne
à educação. Para tal, foi criado o Pró-Município, que se caracterizava como um convênio de
assessoria técnica entre a Secretaria de Estado de Educação e as prefeituras, antecipando-se
aos programas de descentralização da educação, via municipalização, que iriam ocorrer mais
tarde. Por meio desse convênio, a SEE-RJ foi a todos os municípios do Estado do Rio de
Janeiro, “treinar” as prefeituras através de sua assessoria administrativa, técnica, financeira,
pedagógica, objetivando uma melhoria na qualidade dos serviços prestados pelas
50
administrações municipais na área da educação, incluindo nessas capacitações servidores e
professores.
O Pró-município foi, portanto, uma alternativa anterior ao PROMURJ, tendo em vista
a necessidade de melhorar a qualidade da educação no Estado e cumprir a determinação
contida na Lei nº. 5692/71, que já contemplava a descentralização da educação como
alternativa para a escola pública no Brasil. Entretanto é somente com o PROMURJ,
estabelecido no governo Moreira Franco, pela Resolução nº. 1411 de 1987, que, oficialmente,
instala-se um programa de municipalização no Estado do Rio de Janeiro. Apesar de esta idéia
estar mais ou menos em pauta desde o Governo Faria Lima, em 1978, a “inauguração” do
PROMURJ revestiu-se de novas perspectivas e era apresentada como o cumprimento, ainda
que, com atraso, do disposto na Lei 5692/71, porém, nem todos os autores são unânimes em
relação à idéia de que apenas se cumpriu a determinação legal.
A assinatura da Resolução nº. 1411 de 1987, no Governo Moreira Franco, é apontada
por Pimenta, (2000) como uma alternativa ao elevado custo do programa de educação em
tempo integral em UEs conhecidas como Centro Integrado de Educação Pública – CIEP. O
programa dos CIEPs foi instituído pelo primeiro governo de Leonel Brizola11, imediatamente
anterior ao governo Moreira Franco, e as escolas construídas com uma arquitetura singular
tiveram seu nome associado ao do então governador Leonel Brizola, e passaram a ser chamadas
de “Brizolão”, o que pode ter sido, segundo Pimenta, (idem), um dos motivos da aceleração do
programa de municipalização proposto por Moreira Franco no Plano dos 100 dias12. Por este
plano, segundo Pimenta (Ibidem), o governo recém empossado transferia algumas UEs de
tempo integral – CIEPs, para a administração municipal. Contestando esta versão, a
Coordenadora de Integração e Municipalização, afirma que as primeiras municipalizações de
11 Leonel Brizola teve dois mandatos como governador do Estado do Rio de Janeiro, sendo o primeiro no período de 15/03/1983 até 15/03/1987; e o segundo no período de 15/03/1991 até 15/03/1994. 12 Programa de Governo com metas estabelecidas para os primeiros 100 dias de governo.
51
CIEPs só ocorreram no governo Marcelo Alencar13, e acrescenta afirmando que o primeiro
CIEP a ser municipalizado, foi o Vicente Cicarino no município de Itaguaí.
Dentro do que estabelecia o PROMURJ, o primeiro convênio de municipalização
assinado entre o governo do Estado e 17 prefeituras municipais do Estado do Rio de Janeiro,
ocorreu em 25 de fevereiro de 1988, portanto ainda no governo de Moreira Franco, e
contemplava a transferência de 317 UEs para a administração municipal, sendo que entre elas
não constava nenhuma UE funcionando em CIEP.
Um fato que ajuda a elucidar essa diferença de posições e que parece procedente é o
de que alguns CIEPs já surgiram municipais, principalmente na cidade do Rio de Janeiro. Em
1983, quando Leonel Brizola assumiu o governo do Estado do Rio de Janeiro pela primeira
vez, não havia eleição para as prefeituras das capitais, sendo o prefeito destas indicado pelo
governador. Marcelo Alencar foi nomeado pelo então governador Leonel Brizola para ser
prefeito do município do Rio de Janeiro. O primeiro CIEP, inaugurado pela gestão conjunta
entre Leonel Brizola e Marcelo Alencar, foi o CIEP Tancredo Neves, localizado no bairro da
Glória, e que pertencia à administração municipal do Rio de Janeiro, atendendo apenas à
educação infantil e ao primeiro segmento do 1º grau, ou seja, até a 4ª série. Durante a primeira
gestão de Leonel Brizola no governo do Estado, e Marcelo Alencar na prefeitura do Rio de
Janeiro, vários CIEPs foram construídos pela prefeitura e vale lembrar que sempre foram
municipais e, portanto, não foram incluídos no processo de municipalização. O que de fato
ocorreu foi que, durante o período de Moreira Franco à frente do governo estadual, o então
prefeito do Rio de Janeiro, Saturnino Braga, já não mais nomeado e sim eleito pelo voto direto,
extinguiu o regime de turno único dos CIEPs sob administração municipal, passando os
mesmos a funcionar como qualquer outra escola da rede municipal de educação.
13 Marcelo Alencar foi governador do Estado do Rio de Janeiro no período de 01/01/1995 até 01/01/1999.
52
Pela Resolução nº 1411, que instituiu o PROMURJ, o objetivo do Estado era de se
retirar do antigo 1º grau, atual ensino fundamental, atendendo a determinação contida na Lei
Federal nº 5692/71. Esta Lei também contemplava o discurso da produtividade, da agilidade e
da eficiência administrativa que servia como suporte filosófico para esta transferência de
encargos entre os entes públicos. A proximidade existente entre as UEs e as secretarias
municipais de educação, sempre foi o argumento técnico mais usado, como o de maximização
da produtividade e de otimização dos recursos públicos, além de tornar mais democrática a
gestão das escolas públicas.
De acordo com os dados contidos na tabela fornecida pela SEEDUC-E, podemos
verificar que os primeiros 7 anos, após o início do PROMURJ, foi o período no qual houve
uma maior transferência de UEs do Estado para os municípios, num total de 836 UEs,
havendo um declínio acentuado para os períodos seguintes, não obstante a tabela citada
fornecer dados para períodos de tempo de abrangência variável (Anexo B).
Dessa forma, no período compreendido entre os anos de 1988 e 1995, portanto, em um
intervalo de 7 anos, foi bastante significativo o número de UEs transferidas para as
administrações municipais, respondendo por mais da metade de todas as UEs
municipalizadas no Estado. Porém, entre 2004 e 2005, ainda houve um número considerável
de UEs municipalizadas, num total de 156, sendo que, a partir deste ano, uma queda brusca é
verificada no total de UEs municipalizadas, conforme demonstra o gráfico 01 a seguir. Em
2006, foram transferidas para os municípios 32 UEs e, em 2007, foram registradas apenas 7
municipalizações de UEs no Estado. De 1988 até maio de 2007, o número total de UEs
municipalizadas era de 1407, sendo que, destas, 464 foram desativadas pelas administrações
municipais e 943 se mantiveram ativas.
O gráfico 01, a seguir, mostra a evolução do processo de municipalização no Estado,
evidenciando que, no primeiro momento, que se segue a assinatura do PROMURJ, de 1988 a
53
1995, uma grande quantidade de UEs foi municipalizada, havendo um declínio que se
mantém até os dias atuais:
GRÁFICO 01 - EVOLUÇÃO DAS UEs MUNICIPALIZADAS NO RIO DE JANEIRO ENTRE 1988 E 2007
836
376
156
32 70
100200300400500600700800900
1988/1995
1995/2003
2004/2005
2005/2006
2006/2007
Nº de UEs
Fonte: Coordenadoria de Integração e Municipalização / SEEDUC-E - 2007.
Os dados do gráfico 01 acima e da tabela fornecida pela SEEDUC-E (ANEXO B)
mostram a trajetória de declínio no número de UEs municipalizadas no período compreendido
entre 1988 e 2007, o que poderia levar à conclusão de que o processo de municipalização já
estaria em vias de conclusão. Ao questionar a Coordenadora de Integração e Municipalização
se o processo de municipalização, PROMURJ, já teria sido concluído e, portanto, passível de
extinção, a resposta foi “não”. Para justificar tal resposta, foi alegado o baixo número de UEs
transferidas aos municípios nos dois últimos anos, pois os municípios que aderiram de
imediato ao PROMURJ são do interior e com menor população. Já os municípios com grande
contingente populacional, em particular os localizados na região metropolitana, ainda estão
em processo de organização de seus sistemas de ensino e, concluído esse processo, poderiam
estabelecer novos convênios de municipalização.
O objetivo do governo Moreira Franco em 1987, quando criou o PROMURJ, era
transferir inicialmente os encargos da educação pré-escolar e das turmas de 1ª a 4ª série do
54
ensino de 1º grau, para os municípios e deixar o Estado livre para atuar nas turmas de 5ª a 8ª
série do 1º grau e no 2º grau, conforme era organizada a educação nacional de acordo com a
Lei nº 5698/71. Convém lembrar que somente após a LDBEN nº 9394/96, foi que a SEE-RJ
começou a municipalizar as séries de 5ª a 8ª, do agora denominado 2º segmento do ensino
fundamental, antigo 1º Grau .
No quadro 01 a seguir observam-se as mudanças ocorridas no ensino, em dados comparativos
entre as três leis que dispuseram normas para a educação nacional:
QUADRO 1 - ORGANIZAÇÃO DO ENSINO DE ACORDO COM AS LEIS DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL: 4024/61; 5692/71 E 9394/96. LEI 4024/61 DURAÇÃO LEI 5692/71 DURAÇÃO LEI 9394/96 DURAÇÃO Ensino Primário 4 anos Ensino de Primeiro
Grau 8 anos Educação Básica:
- Educação Infantil variável
Ciclo Ginasial do Ensino Médio
4 anos Ensino de Primeiro Grau
3 a 4 anos - Ensino Fundamental 8 anos14
Ciclo Colegial do Ensino Médio
3 anos Ensino de Segundo Grau
3 a 4 anos - Ensino Médio 3 anos
Ensino Superior
variável
Ensino superior variável Educação Superior variável
Fonte: Carneiro (1998 p. 28).
O que se verifica na história da organização educacional no Brasil, com base nos atos
legais, é que a municipalização não é proposta recente, seja no campo de idéias, seja em
determinações expressas em lei. Porém a implementação das determinações legais é lenta e
extremamente complexa, em virtude do grande número de variáveis de diferentes naturezas
implícitas neste processo: legal, política, técnica, financeira, tributária, administrativa etc.
Envolve, portanto, uma ampla negociação política que demanda tempo e disponibilidade de
recursos de origens distintas. Tal assertiva pode ser observada através dos constantes avanços e
recuos ao longo do período aqui retratado, entre a determinação contida na Lei nº 5692/71,
passando pela criação do Pró-município em 1978, até chegar ao PROMURJ, que é de fato um
programa de descentralização da educação via municipalização, que continua em fase de
execução, como veremos a seguir.
55
Após o Governo Moreira Franco, houve um segundo Governo Leonel Brizola15, quando
foi criada uma secretaria especial só para administrar e gerenciar os CIEPs e Ginásios Públicos
– GPs. A partir deste momento, o Estado do Rio de Janeiro passou então a ter duas secretarias
encarregadas da gestão da educação pública: a primeira chamada de Secretaria Extraordinária
de Programas Especiais que administrava os CIEPs e os GPs, e uma outra que era a Secretaria
de Estado de Educação, responsável pela gestão das escolas estaduais que trabalhavam em
regime de turnos e que permanecia com a estrutura dos governos anteriores.
Com a existência de duas secretarias, encarregadas da educação no Estado do Rio de
Janeiro, e com diferentes quadros profissionais, os funcionários da Secretaria Estadual de
Educação passaram a classificar oficiosamente esta secretaria de “Secretaria Ordinária de
Educação” em função da menor quantidade de recursos nela investidos e pela menor atenção
dada pelo então governo estadual, quando comparada à Secretaria Extraordinária de Programas
Especiais.
Na Secretaria Extraordinária de Programas Especiais ocorria uma política de gestão
paralela à política praticada nas escolas da rede pública da Secretaria de Estado de Educação
do Estado do Rio de Janeiro – SEE-RJ. A rede subordinada à Secretaria Extraordinária de
Programas Especiais recebeu, neste segundo Governo Leonel Brizola, uma injeção de recursos
muito grande. Por conta destas administrações paralelas, até mesmo os concursos públicos
eram realizados para as diferentes secretarias, a de Educação e a Extraordinária de Programas
Especiais e atendiam às respectivas particularidades e às propostas pedagógicas de cada uma
delas. Nesse sentido, procurando atender às necessidades do projeto de turno único dos CIEPs,
os concursos públicos da época contrataram docentes com carga horária de 40 horas semanais
e com dedicação exclusiva.
14 Atualmente a duração do ensino fundamental é de 9 anos, tendo sido alterada por força da Lei nº 11.274 de 06/02/2006, artigo 3º, que modificou o artigo 32 da LDBEN nº 9394/96. 15 De 1991 a 1994.
56
Por se tratar de duas redes de educação com propostas díspares, ao término do Governo
Leonel Brizola e início do Governo Marcelo Alencar, o programa de municipalização
PROMURJ se viu diante de duas realidades distintas a serem enfocadas no repasse das UEs
entre Estado e Municípios. De acordo com a Coordenadora de Integração e Municipalização da
SEEDUC-E foi somente neste governo que os primeiros CIEPs foram municipalizados ou
transformados em escola de turno único.
Com a gestão Marcelo Alencar no Governo do Estado, a partir de 1º de janeiro de 1995,
iniciou-se o repasse das UEs instaladas em CIEPs para as prefeituras e a conseqüente absorção
das mesmas pelas redes municipais de educação. Ainda neste governo, houve a extinção da
Secretaria Extraordinária de Programas Especiais, responsável pela administração dos CIEPs,
sendo realizada a sua fusão com a Secretaria de Estado de Educação. A partir deste momento,
foi criada uma nova proposta dentro do programa de municipalização, PROMURJ, denominada
como projeto “Integrar para Municipalizar”. Este projeto pretendia uma gestão compartilhada
sob a forma de convênios, ou seja, uma nova etapa dentro do PROMURJ e não um novo
programa.
Dentro do “Integrar para Municipalizar” foi idealizado um outro projeto específico
para se municipalizar os CIEPs, uma vez que estas UEs atendiam às séries determinadas na
legislação como passíveis de serem municipalizadas no ensino fundamental, conforme o
previsto na CF de 1988 e na LDBEN nº 9394/96 como, prioritariamente, de competência
municipal. A se valer do disposto na LDBEN nº 9394/96, não havia qualquer determinação
legal ou ressalva que excluísse os CIEPs apenas pelo fato de funcionarem em horário integral.
O projeto “Integrar para Municipalizar” foi uma etapa de levantamento de diversas
variáveis: das condições materiais, estruturais, do número de alunos, de professores e
funcionários para uma posterior redistribuição racional destes recursos, fato que precedia a
descentralização pretendida. Dessa forma, antes das municipalizações ocorrerem, neste
57
período, a partir de 1995, era feito um inventário das UEs da rede de educação do Estado,
levando-se em conta vários aspectos que seriam usados como critérios técnicos norteadores da
transferência de encargos entre Estado e Municípios. Entre esses critérios eram considerados: a
etapa de ensino oferecida, a localização geográfica das UEs, o número de alunos em cada UE,
a estrutura física das escolas, o quantitativo e o qualitativo do pessoal envolvido nestas UEs,
entre outros.
Nesse sentido, foi estabelecida uma redistribuição de UEs de acordo com critérios
operacionais, para que, num mesmo bairro ou em locais muito próximos, não houvesse várias
escolas oferecendo o mesmo nível de ensino e podendo haver a ausência em outro, acarretando
o sub-aproveitamento da capacidade das escolas e a má gerência dos recursos humanos. Após
ser realizada esta reorganização das UEs e do ensino oferecido por elas, sempre obedecendo
aos critérios anteriormente citados, procedia-se à municipalização. Assim sendo, a educação
infantil e o ensino fundamental eram transferidos para a administração municipal, enquanto a
administração estadual se encarregava de oferecer o ensino médio e, em alguns casos, o ensino
fundamental de 5ª a 8ª série, atualmente do 6º ao 9º ano do ensino fundamental.
Um exemplo dessa nova modalidade de parceria administrativa contemplada pelo
projeto “Integrar para Municipalizar” está no modelo de empréstimo de prédios, ou de apenas
parte deles, entre os dois entes públicos, ou seja, Estado e municípios. Neste caso, a
administração estadual empresta o prédio à prefeitura que usa as instalações, arcando com as
despesas de pessoal e de material de consumo. Pode também ocorrer o contrário, pois há casos
em que é o município que empresta a estrutura física para o Estado oferecer a sua modalidade
ou nível de ensino, conforme determina a lei.
Esta segunda situação é comum no município do Rio de Janeiro, que é um caso
“excepcional” no cenário da municipalização no Brasil. Tal excepcionalidade se deve ao fato
de esta cidade ter sido o Distrito Federal até 1960, quando a capital do Brasil foi transferida
58
para Brasília e, por conseguinte, a cidade do Rio de Janeiro passou à condição de Estado da
Guanabara, com o status de cidade-estado, pois não era dividido em municípios, só existindo a
administração estadual, legado da sua condição de Distrito Federal.
Em 1975, com a Lei Complementar de nº 20, houve a fusão do Estado da Guanabara
com o Estado do Rio de Janeiro, e a cidade do Rio de Janeiro passou à condição de município
integrante do Estado do Rio de Janeiro. Neste momento, já em obediência à determinação da
Lei nº 5692/71, o recém criado município do Rio de Janeiro ficou com a quase totalidade das
escolas de ensino fundamental e a administração estadual com as de ensino médio. Portanto, o
município do Rio de Janeiro, ao ser criado, já obedeceu à determinação legal de o ensino
fundamental pertencer à administração municipal e de o ensino médio estar subordinado à
Secretaria Estadual de Educação. Este fato é um episódio isolado no processo de
municipalização no Estado do Rio de Janeiro, mas ilustra a aplicação da determinação contida
na Lei nº. 5692/71, bastante anterior à atual CF de 1988 e a LDBEN nº. 9394/96.
Em alguns casos, há também uma gestão compartilhada entre Estado e município de um
mesmo prédio, no qual as redes municipal e estadual se revezam em turnos diferentes,
oferecendo as suas respectivas modalidades e as etapas de ensino, de acordo com o previsto na
lei.
A proposta do projeto “Integrar para Municipalizar” não se limitou a um mero
empréstimo de prédios e mobiliário. O PROMURJ pretendia alargar os horizontes da
municipalização e procurava ir além da visão estreita, na qual o Estado trocava alunos do
ensino fundamental por alunos do ensino médio de escolas dos Municípios. No entanto, o fato
de as propostas serem adequadas e planejadas não garante a sua execução, especialmente,
quando se trata do poder público, no qual as ações estão atreladas à vontade política dos
governantes.
59
Cabe ressaltar que o PROMURJ continua em vigência e que o “Integrar para
Municipalizar” foi uma etapa, havendo ainda, segundo a Coordenadora de Integração e
Municipalização da SEEDUC-E, vários aspectos a serem trabalhados dentro do programa, que,
portanto, não se limita apenas ao repasse de prédios e, por vezes, à cessão de pessoal. Nos
casos de cessão de professores, é comum que ocorra o repasse de Docentes II16 que atendem à
educação infantil e aos 5 primeiros anos do ensino fundamental. Quando a UE municipalizada
atende a turmas do 6º ao 9º ano de escolaridade, o município é que deve providenciar os
professores, o Docente I17, pois, neste segmento do ensino fundamental, o Estado ainda tem
grande carência e necessita desses profissionais para atender as turmas do ensino médio,
conforme determina a Lei nº 9394/96.
Para a Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, o processo de
municipalização ainda não está concluído e prossegue, embora num ritmo mais lento, o que
pode ser observado na tabela fornecida pela SEEDUC-E (ANEXO B), com o número de UEs
municipalizadas, a partir do PROMURJ até os dias atuais. O baixo número de UEs
municipalizadas no ano de 2007, deve-se ao fato de se tratar de um ano em que houve troca do
governo estadual, sendo dado andamento apenas aos processos que já haviam começado
anteriormente. Todavia, em algumas regiões do Estado, notadamente na Baixada Fluminense,
São Gonçalo e Niterói, ainda há um percentual significativo de escolas passíveis de serem
municipalizadas, ou de se estabelecer um regime de colaboração. Vale ressaltar que se trata de
regiões de grande contingente populacional e que, por conseguinte, representam um expressivo
percentual no total de alunos ainda matriculados no ensino fundamental da rede estadual,
mesmo que a Lei indique que este é um encargo prioritariamente exercido pelas prefeituras.
Entretanto a CF de 1988 no artigo 211, §3º delega aos Estados e ao Distrito Federal também
16 Docente II é o profissional habilitado para dar aulas no 1º segmento do ensino fundamental, cuja formação exigida era o curso normal em nível médio. 17 Docente I é o profissional habilitado para dar aulas no 2º segmento do ensino fundamental e no ensino médio, cuja formação exigida é a licenciatura plena na área em que for atuar.
60
em caráter prioritário a atuação no ensino fundamental e médio, o que não exime os Estados de
sua obrigação com esta etapa da educação básica.
Na teoria, o processo de municipalização só estará concluído quando todo o ensino
fundamental estiver sob gestão dos municípios, como recomendava a Lei 5692/71 e a LDBEN
nº 9394/96. A administração estadual, no que diz respeito à contratação de professores, já
obedece à lógica da divisão de competências, estabelecida pela municipalização, pois não
realiza mais concursos para Docente II, que é o professor habilitado para dar aulas até a 4ª série
(atual 5º ano do ensino fundamental). Tal fato deve-se à administração estadual ter como meta
se retirar da educação infantil e do ensino fundamental para poder expandir a rede dedicada ao
ensino médio, não cabendo mais, então, a realização de concursos para o provimento de vagas
em um cargo dedicado a atender apenas as turmas até o 5º ano do ensino fundamental.
Porém, a questão de onde e como lotar alguns profissionais que já pertenciam ao quadro
do magistério estadual antes do PROMURJ persiste. Trata-se de uma questão bastante
complexa, pois há professores contratados em regimes diferentes, com habilitações distintas,
muitas das quais a legislação em vigor não mais permitiria a contratação. No tocante aos
salários e à carga horária de tais profissionais a situação também não é diferente, o que torna
cada caso de municipalização objeto de intensa negociação com inúmeros fatores a serem
levados em consideração.
De acordo com a Coordenadora de Integração e Municipalização, cada caso de
municipalização é uma situação específica, não podendo se generalizar o processo como um
todo. É possível ser feita só a cessão de prédios e/ou mobiliários, ou o repasse de pessoal, ou
abranger todos esses fatores. Nos contratos de municipalização, o Estado está cedendo o
prédio e não doando-o aos municípios. A cessão é por um tempo determinado que consta nos
contratos assinados entre os entes, sendo normalmente estabelecido o prazo de dez anos, que
poderá ser renovado, ou não. A renovação fica a critério de ambas as partes, mas sempre
61
procurando respeitar o ano letivo, pois qualquer interrupção ou ato que prejudique os alunos,
tenta ser evitado.
Ainda na gestão Marcelo Alencar, foi criada a Fundação de Apoio à Escola Técnica –
FAETEC, que não estaria subordinada à Secretaria de Estado de Educação e sim à Secretaria
de Ciência e Tecnologia. Um fato curioso que é relevante ressaltar é que logo no início de seu
governo, Marcelo Alencar funde as duas secretarias que foram criadas por seu antecessor
imediato, Leonel Brizola, reunindo em uma só as duas redes de ensino com propostas
diferentes, uma com os CIEPs de tempo integral e outra com as escolas por turnos. Contudo,
um pouco mais adiante, o governo de Marcelo Alencar cria uma rede de escolas técnicas que
será administrada pela Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia, e não pela Secretaria de
Estado de Educação. Ou seja, se por um lado Marcelo Alencar tentou uniformizar novamente a
rede de escolas públicas do Estado, fundindo as duas Secretarias de educação existentes, por
outro lado, ele retorna à gestão de duas redes paralelas com a criação das escolas da FAETEC,
subordinadas à outra secretaria, que não à de Estado de Educação.
Originalmente, a proposta da FAETEC era de gerir apenas as escolas técnicas;
entretanto, com o passar do tempo a FAETEC se desviou de sua função original de oferecer o
ensino técnico profissionalizante em nível médio e passou a atuar em outros níveis e
modalidades da educação que não eram os da sua proposta original, nem o que se encontra
determinado em lei.
Atualmente, além do ensino médio profissionalizante, a FAETEC oferece outras
modalidades como o ensino fundamental e até mesmo a educação infantil, incluindo creches.
Este fato relativo à FAETEC - merece destaque por caminhar na direção contrária da proposta
de municipalização, onde caberia ao Estado oferecer apenas o ensino médio e, neste caso, em
particular, o técnico-profissional.
62
Dessa forma, verifica-se que, no governo de Leonel Brizola, foram criadas duas redes
para o mesmo nível de ensino, subordinadas a diferentes Secretarias de Estado e com planos
de cargos e salários bastante diferenciados. O governo de Marcelo Alencar repetiu o mesmo
feito, só que agora com a extinção de uma secretaria, e a criação de uma outra modalidade de
ensino subordinada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia.
Nos processos de municipalização não são apenas a estrutura física, prédios e
mobiliário, que causam impactos de difícil negociação política, mas também a gestão de
profissionais da educação e, em particular, a de professores tem sido uma questão muito
delicada. Atualmente, há, na rede estadual, um significativo número de professores “Docente
II”, que atuam da educação infantil até a 4ª série do ensino fundamental (atual 5º ano do ensino
fundamental) e carência de professores “Docente I”, que atuam no 2º segmento do ensino
fundamental (6º ao 9º ano) e/ou no ensino médio. Em algumas UEs municipalizadas, o Estado
empresta professores “Docentes II” aos municípios e já não realiza mais concursos para este
tipo de profissional. O motivo alegado para não haver mais concursos para os docentes da
educação infantil e do 1º segmento do ensino fundamental é o de cumprir o objetivo do
PROMURJ, ou seja, do Estado se retirar gradualmente destes segmentos de ensino.
Ao se observar as tabelas com o quantitativo de docentes ou as do número de
matrículas no Estado do Rio de Janeiro, percebe-se que já é reduzida a participação do Estado,
quer no número de matrículas, quer no número de professores da rede estadual que atuam na
educação infantil. No ano de 2005, apenas 872 docentes da rede estadual atuavam na educação
infantil, o que representa 1,2 % do quadro total de professores do Estado. A se cumprir os
objetivos do PROMURJ deve-se reduzir ainda mais o quantitativo de alunos em séries da
educação infantil em escolas estaduais, por se tratar de uma modalidade de ensino de
competência municipal. O total de alunos matriculados na educação infantil em UEs estaduais
63
em 2005 18 já respondia por apenas 3,61% de todos os alunos matriculados em escolas de
educação infantil existentes no Estado do Rio de Janeiro, incluindo as do setor privado e as de
qualquer esfera administrativa do setor público.
De acordo com as determinações da SEEDUC-E, as diretoras de UEs, nas quais ainda
existem turmas de educação infantil, não devem abrir mais vagas ou iniciar novas turmas
para esta modalidade, apenas manter os alunos nas turmas para o ano seguinte, de forma que,
ao longo de poucos anos, os alunos da educação infantil estejam cursando o ensino
fundamental dando por extinta a oferta de educação infantil nessas UEs. Essa é uma das
estratégias da SEEDUC-E para ir “forçando” a municipalização; a outra estratégia considerada
“oficial” é a de se assinar os convênios de municipalização, remanejamento e cooperação entre
Estado e municípios, realizando o que está previsto no PROMURJ.
Segundo a Coordenadora de Integração e Municipalização, a SEEDUC-E precisa suprir a
grande carência de professores Docentes I na rede de ensino médio, nível de ensino este que
precisa ser expandido com urgência para atender à grande demanda conseqüente do acesso
universal ao ensino fundamental. Atualmente, a maioria dos alunos conclui o ensino
fundamental e ingressa no ensino médio, somando-se a outros alunos que, por motivos
diversos, pararam de estudar ao concluir o ensino fundamental e que agora retornam
procurando vagas nas escolas estaduais que oferecem o ensino médio.
Os dados retirados do INEP não fazem distinção em que turmas estão atuando os
professores do ensino fundamental, ou seja de 1º ao 5º ano, ou do 6º ao 9º ano de
escolaridade, denominados respectivamente de 1º e 2º segmentos do ensino fundamental. Os
dados estatísticos também não esclarecem o grau de formação destes professores, em
cuja legislação atual estão previstas exigências legais referentes à habilitação. Concomitante às
exigências advindas da legislação são oferecidos diferentes projetos para a capacitação de
18 Censo Escolar/ INEP 2005
64
professores realizados ou subsidiados pelas secretarias, em distintas esferas da administração
pública: federal, estadual e municipal e que contribuem para compor um quadro um tanto
complexo no que diz respeito aos profissionais da educação.
É importante observar ainda que a participação da rede privada é expressiva em todas as
modalidades de ensino, chegando a ter 48,53 % dos docentes da educação infantil em exercício
dentre todas as escolas existentes no Estado do Rio de Janeiro para esta modalidade de ensino.
O quadro 02, na página a seguir, demonstra o número total de profissionais atuando no
Estado do Rio de Janeiro, e a sua distribuição entre as várias etapas da educação básica e pelos
setores privado e público federal, estadual e municipal.
QUADRO 02 - DISTRIBUIÇÃO DOS DOCENTES NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, POR ESFERA ADMINISTRATIVA, EM NÚMERO DE PROFISSIONAIS E SEUS RESPECTIVOS PERCENTUAIS POR ESFERA ADMINISTRATIVA E POR NÍVEL DE ENSINO:
SETOR PÚBLICO ESFERA ADMINISTRATIVA
SETOR PRIVADO MUNICIPAL ESTADUAL FEDERAL
TOTAL DE DOCENTES
Nº de docentes da Ed. Infantil
11694 11499 872 31 2.496
% de docentes na Ed. Infantil
48,53 % 47,73 % 3,61 % 0,13 % 100%
Nº de docentes no Ensino Fundamental
36.840 69126 32.170 943 139.079
% de docentes no Ensino Fundamental
26,5 % 49,7 % 23,13 % 0,67 % 100 %
Nº de docentes no Ensino Médio
15.258 752 39.828 1.314 57.152
% de Docentes no Ensino Médio
26,7 % 1,31 % 69,69 % 2,3 % 100 %
Total de docentes da Educação Básica
63.792 81.377 72.870 2.288 220.327
% de docentes na Educação Básica
28,65 % 36,93 % 33,07 % 1,03 % 100 %
Fonte: Tabela construída com base nos dados no Censo Escolar 2005 INEP.
O quadro 02, ao ilustrar a participação das escolas federais na educação básica no
Estado do Rio de Janeiro, demonstra que a mesma é modesta, pois esse nível de ensino não é
da competência da União, de acordo com o texto constitucional e com a LDBEN nº. 9394/96.
A educação infantil nas escolas federais é oferecida pelos colégios de aplicação das
universidades federais além do Colégio Pedro II, que é uma das poucas instituições federais no
país, que oferecem esta etapa da educação básica.
65
No tocante ao ensino médio, o setor federal é um pouco mais expressivo do que na
educação infantil e no ensino fundamental, em virtude de os Centros Federais de Educação
Tecnológica – CEFETs, que oferecem o ensino médio tecnológico profissionalizante, o que
pode ser demonstrado pelo quadro 02, por meio do número e distribuição dos docentes, e no
quadro 03, a seguir apresentado, pelo número de matrículas, ambas para o Estado do Rio de
Janeiro, por nível de ensino e por esferas administrativas.
O quadro 03, a seguir, apresenta a distribuição do total de matrículas da educação básica
no Estado do Rio de Janeiro e a sua respectiva participação percentual sobre o número total de
matrículas, entre as várias etapas da educação básica e a esfera administrativa a que estão
subordinadas, seja do setor privado, seja do público federal, estadual ou municipal.
QUADRO 03 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, POR ESFERA ADMINISTRATIVA, EM NÚMERO DE MATRÍCULAS E SEUS RESPECTIVOS PERCENTUAIS POR ESFERA ADMINISTRATIVA E POR NÍVEL DE ENSINO:
Esfera administrativa
SETOR PÚBLICO
Nível de Ensino
SETOR PRIVADO
MUNICIPAL ESTADUAL FEDERAL
Nº TOTAL DE MATRÍCULAS e total de %
Nº matrículas na Educação Infantil
168.888 219 .248 16.265 228 404.629
% sobre total na Educação Infantil
41,75 % 54,18 % 4,02 % 0,05 % 100 %
Nº de matrícula no Ensino Fundamental
475.946 1.450.973 542.380 9.806 2.479.105
% sobre o total no Ensino Fundamental
19,20 % 58,52 % 21,88 % O,4 % 100 %
Nº de matrículas no Ensino Médio
130.478 10.796 606.073 12.478 759.825
% sobre o total no Ensino Médio
17,17 % 1,42 % 79,77 % 1,64 % 100 %
Total de matrículas na Educação Básica
775.312 1.681.017 1.164.718 22.512 3.643.559
% sobre o total na Educação Básica
21,27 % 46,13 % 32,0 % 0,6% 100 %
66
Fonte: Censo Escolar 2005 INEP.
A cidade do Rio de Janeiro tem uma situação extremamente peculiar no tocante às
políticas de municipalização, pois apesar de possuir uma rede escolar bastante extensa com
977 19 UEs na rede pública municipal, todas trabalham apenas com o ensino fundamental, não
havendo, portanto, nenhuma UE municipal oferecendo o ensino médio.
Paralelo a esta exclusividade, ou seja, a de o município do Rio de Janeiro atender
apenas o que a legislação determina como prioritário: a educação infantil e o ensino
fundamental, a rede estadual trabalha com um número bastante reduzido de vagas no ensino
fundamental na capital, com apenas 31.669 alunos 20. O número anteriormente citado pode
parecer expressivo, mas para um município com população superior a seis milhões de
habitantes21, como é o caso do Rio de Janeiro, este número corresponde a 3,7 % de todo o
contingente de alunos matriculados no ensino fundamental nas escolas localizadas na cidade
do Rio de Janeiro.
De acordo com a SEEDUC-E, estas UEs estaduais existentes na cidade do Rio de
Janeiro, voltadas para o ensino fundamental, funcionam na sua maior parte como colégios de
aplicação dos Institutos de Educação (formação de professores em nível médio) da rede
estadual subordinada à SEEDUC-E. Também estão incluídas as matrículas da rede estadual,
subordinadas à Secretaria de Ciência e Tecnologia, no caso, os alunos das várias unidades da
FAETEC e do Colégio de Aplicação do Instituto Superior de Educação e, ainda, as matrículas
do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro - CAP-UERJ. O questionamento que se faz é por que apenas as UEs da SEEDUC-E,
dentro da rede estadual, são passíveis de serem municipalizadas, sendo permitido à rede
administrada pela FAETEC continuar com o atendimento na educação infantil?
19 Fontes: Ministério da Educação, INEP - Censo 2005. 20 Fontes: Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas -INEP Censo 2005. 21 Fonte: IBGE – 2005.
67
O número de alunos matriculados em cada UE, e a sua totalização por municípios,
ganhou importância com a implementação do FUNDEF e, atualmente, do FUNDEB, pois o
cálculo do repasse de verbas oriundas deste fundo é feito em cima do total de matrículas de
cada rede seja ela municipal seja estadual.
Ao se observar os dados do quadro 03 e do gráfico 02, a seguir, são muitas as
considerações a serem feitas sobre a distribuição das matrículas ou alunos nos diferentes níveis
e nas diferentes redes, seja do setor privado, seja do setor público, para a educação básica no
Estado do Rio de Janeiro.
O gráfico 02, a seguir, demonstra a distribuição percentual do total de matrículas existentes na
educação básica no Estado do Rio de Janeiro, entre as redes privada e públicas: federal,
estadual e municipal.
GRÁFICO 02 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO POR ESFERA
ADMINISTRATIVA
0%
5%10%
15%
20%25%
30%
35%
40%45%
50%
MunicipalEstadualPrivado Federal
Fonte: Gráfico construído com base nos dados do Censo Escolar 2005 INEP.
Vale ressaltar a participação da iniciativa privada no total das matrículas da educação
básica no Estado do Rio de Janeiro, que em 2005, era de 21,27 %, o que é muito significativo,
respondendo por mais de 1/5 do total de matrículas para a educação básica. Ao se calcular o
percentual da iniciativa privada nas matrículas da educação infantil em todo o Estado, pode-se
constatar que 41,75 % (ver quadro 03) das matrículas estão em UEs da rede privada,
68
constituindo um percentual extremamente elevado, que não se verifica em nenhum outro
segmento da educação básica, por esfera administrativa.
Para se interpretar melhor os dados quantitativos de matrículas nas redes públicas
federal, estadual e municipal, cabe observar os dispositivos legais que versam sobre a
distribuição de competências que emanam do texto da CF de 1988, sobre o dever do Estado
com a educação, no artigo 208, e sobre a distribuição de competências prioritárias entre os
entes da federação, no artigo 211, ambos a seguir:
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, a sua oferta gratuita para todos o que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – progressiva universalização do ensino médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até
5(cinco) anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da
criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do
educando; VII – atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de
programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.
§ 3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar junto aos pais e responsáveis, pela freqüência à escola.
As competências dispostas na Lei, que determinam a responsabilidade dos municípios
com a educação infantil, estão sendo apenas parcialmente atendidas, uma vez que a
participação da iniciativa privada é muito grande neste setor. Uma ação judicial por parte da
sociedade civil, através do Ministério Público, com base no artigo 211, do texto
constitucional, pleiteando vagas na educação infantil e/ou no ensino fundamental de
instituições públicas poderia levar as administrações municipais a uma crise, uma vez que
mais de 20 % das matrículas nestas etapas da educação básica se encontram em instituições
privadas.
69
A participação da União e dos Estados na educação infantil é muito reduzida,
conforme já relatado anteriormente. A União não chega sequer a ter 1% das matrículas da
educação infantil no Estado do Rio de Janeiro, e a rede estadual responde por 4, 02 % deste
total, mas está diminuindo de ano para ano, com tendência a manter apenas nas UEs de
aplicação dos institutos de educação e das universidades sob administração estadual,
independente da secretaria a que elas estejam subordinadas.
Em relação ao artigo 211 da Constituição Federal de 1988, sobre a competência de
cada um dos entes da federação, está estabelecido:
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir a equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.
§ 2º Os Municípios atuaram prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.
No ensino fundamental, a participação da União, mais uma vez, é insignificante, não
respondendo sequer por 1 % das matrículas por motivos que já foram objeto de consideração
anterior. Nesta etapa do ensino, é que se encontra o grande potencial para se prosseguir com a
municipalização, pois a administração estadual ainda responde por 21,88 % do total de
matrículas no ensino fundamental do Estado do Rio de Janeiro, o que significava de acordo
com o Censo Escolar 2005 do INEP, 542.380 estudantes.
No entanto, é importante lembrar que, de acordo com o caput artigo 211 da CF de
1988, não é competência exclusiva dos municípios oferecer o ensino fundamental. O texto
70
constitucional fala em “regime de colaboração” entre a União, os Estados, o Distrito Federal
e os municípios. O PROMURJ é um programa de municipalização que atende ao regime de
colaboração prescrito no texto constitucional, mas não é obrigação apenas dos municípios
oferecer e garantir o acesso ao ensino fundamental, os Estados, por força da lei, também não
estão liberados desta competência. Porém a demanda crescente pelo ensino médio e a
determinação constitucional de se universalizar este nível do ensino, acarreta para os Estados
uma sobrecarga em sua rede pública de educação, com conseqüências para as finanças
públicas.
A implantação do FUNDEB pode melhorar essa situação, uma vez que a
redistribuição contempla além do ensino fundamental, o ensino médio, a educação infantil e a
educação de jovens e adultos, com recursos oriundos do mesmo fundo. A ressalva prevista no
FUNDEB para o ensino fundamental e médio está no que diz respeito à modalidade, pois só
serão consideradas para efeito de distribuição de recursos do FUNDEB, as matrículas
realizadas em cursos presenciais. Portanto, os Centro de Estudos Supletivos – CES, não
presenciais, seja no ensino fundamental, seja no ensino médio, não receberão recursos do
FUNDEB.
Se, no ensino fundamental, o texto da CF de 1988 divide as competências entre
Estados e municípios, na educação infantil e no ensino médio isto não ocorre. Fica claro que o
ensino médio é de competência prioritária dos Estados, e a educação infantil dos municípios.
Os municípios podem oferecer o ensino médio desde que o acesso ao ensino fundamental
esteja integralmente garantido.
No Estado do Rio de Janeiro, as redes públicas pertencentes à administração estadual,
quer subordinadas à Secretaria de Estado de Educação, quer à Secretaria de Estado de Ciência
e Tecnologia, como os Colégios de Aplicação das Universidades Estaduais, somavam, no
71
ensino médio, um total de 606.073 matrículas22, que respondiam por 79,77 % do total de
matrículas para o ensino médio no ano de 2005, no Estado. A rede privada tem, também,
participação expressiva neste nível de ensino, com 130.478 matrículas que representavam
17,17 % do total de matrículas no Estado em 2005.
As matrículas da rede federal e das redes municipais no ensino médio no Estado do
Rio de Janeiro para o ano de 2005 representavam respectivamente: 1,64 % e 1,42 % do total
de matrículas. Convém relembrar que nenhum deste dois entes, União e municípios, estão
obrigados por lei a oferecer o ensino médio, mas a legislação também não veta a presença de
qualquer um dos entes da federação, em qualquer nível de ensino, desde que atendidos os
níveis de sua prioridade legal. As matrículas verificadas na rede federal para o ensino médio
existente no Estado do Rio de Janeiro são compostas em sua maioria por alunos dos CEFETs.
No que diz respeito às matrículas do ensino médio municipal, pode-se verificar que
são em número ainda menor do que as do setor federal. São poucos os municípios que
oferecem este nível de ensino e os que dispõem de escolas de ensino médio tinham que
mantê-las com recursos próprios, não podendo usar os recursos do FUNDEF, e somente após
ter sido atendida a universalização do ensino fundamental prevista na LDBEN nº 9394/96.
A municipalização foi a forma de descentralização da administração pública,
encontrada para a educação, em particular para o ensino fundamental. Pelo texto legal, seja
da CF de 1988, seja da LDBEN nº 9394/96, os municípios não estão obrigados a assumir, por
completo, a responsabilidade para com o ensino fundamental, mas esse é o nível da educação
básica prioritário para a sua atuação. Em relação aos Estados, a lei determina que atuem com
prioridade no ensino médio, e supletivamente no ensino fundamental.
Ao se confrontar o que está disposto na CF de 1988 e na LDBEN nº 9394/96, vários
autores têm uma posição crítica em relação à definição mais precisa sobre as competências e
a autonomia dos entes da federação: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Carneiro
22 Fonte: Censo Escolar 2005 INEP
72
(1998) é enfático ao criticar o que está disposto nos artigos 8º, 9º, 10 e 11, da LDBEN nº
9394/96, quando diz que o texto legal propõe um regime de colaboração entre os entes da
federação, mas a mesma Lei confere à União a função de coordenar a política nacional e de
ter funções normativas, redistributivas e supletivas, através do Ministério da Educação. Ainda
em crítica ao disposto na LDBEN nº 9394/96, Carneiro (1988) prossegue afirmando que:
a organização dos sistemas de ensino nos termos desta Lei fica restrito, praticamente, à sua organização burocrática, sem qualquer possibilidade do exercício da autonomia plena no tocante à concepção, gestão, configuração e avaliação do respectivo sistema. (p60 –61)
Não é apenas esse autor que faz críticas à LDBEN nº 9394/96 e as imprecisões
prescritas em seu texto Savianni (1998) Stropparo (1998) entre outros, também mencionam as
lacunas e dualidades encontradas na legislação no que concerne à responsabilidade e à
autonomia de cada uma das esferas administrativas públicas, no que diz respeito à educação.
De acordo com a Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E não
é obrigatório que os municípios assumam toda a responsabilidade pelo ensino fundamental e,
conseqüentemente, venham a aderir ao PROMURJ. O que ocorre é que a distribuição de
verbas com base no número de matrículas, serve de estímulo às prefeituras para expandir a
rede de escolas sob a sua administração e para tal recorrem à municipalização, absorvendo
UEs, antes, sob administração estadual. Partindo-se do princípio de que um maior número de
cargos e verbas conferem ao administrador público maior poder de influência e de barganha
política, pode-se deduzir que é bastante conveniente aos prefeitos ter uma rede de escolas
mais numerosa e com maior quantidade de matrículas, independente de ser a educação
pública a prioridade deste administrador municipal.
Pode-se afirmar que a educação é uma das políticas públicas mais abrangentes. Em
termos percentuais, as matrículas na educação básica, só nas escolas públicas, superam os
10% da população total dos municípios. Este fato é observado em todo o Estado do Rio de
73
Janeiro, seja na capital, seja nos municípios do interior, conforme ocorre também em
Petrópolis, recorte principal de investigação deste trabalho.
Além do alto valor numérico e percentual dos usuários diretos da educação pública,
que são os alunos matriculados nas respectivas redes, deve ser lembrado que a CF de 1988
estabelece a obrigatoriedade do ensino fundamental, e a LDBEN nº 9394/96 determina 200
dias letivos, o que torna estreita a relação entre o cidadão e este segmento do poder público.
A adesão à municipalização, entretanto, não fica apenas restrita a possíveis interesses
de políticos clientelistas que desejam a administração das UEs como material de barganha
eleitoral, mas também é reconhecido o papel equalisador e de promoção social atribuído à
educação. Todavia ao longo dos processos de negociação de UEs que podem ser objeto de
municipalização, observa-se que as administrações municipais estão mais interessadas em
UEs com grande número de alunos e prestígio junto à população do que em seguir as normas
técnicas contidas no PROMURJ.
Neste contexto político, o processo de municipalização não está imune a interesses
pontuais e localizados. Vale lembrar que ambas as partes, tanto a administração estadual
como a municipal, levam seus interesses de ordem político-eleitoral para o momento das
negociações interferindo ou, por vezes, prevalecendo sobre os pareceres técnicos. Num
processo eleitoral, os candidatos a cargos de esferas estaduais ou federais precisam de apoio
local, ou seja, alguns líderes municipais aproveitam este momento para ações que resultem em
dividendos políticos nas eleições municipais. Ainda que estes fatos interfiram no bom
andamento do processo de municipalização, não podem ser vistos como obstáculos
intransponíveis ou como uma prerrogativa exclusiva da educação pública, uma vez que a
prática clientelista permeia todo o cenário político nacional.
No capítulo a seguir, será relatado o processo de municipalização da educação em
Petrópolis, a partir da criação do PROMURJ até 2007, sendo considerados aspectos como a
74
atual estrutura do ensino fundamental, e o que ainda hoje é possível de ser melhor distribuído
entre as administrações estadual e municipal.
75
4 – A MUNICIPALIZAÇÃO EM PETRÓPOLIS: AS NEGOCIAÇÕES POLÍTICAS E
A TRAJETÓRIA DO PROCESSO DE DESCENTRALIZAÇÃO
O processo de descentralização da administração pública via municipalização é um
ato político, no qual, inevitavelmente, há um grande número de fatores que são levados em
consideração. Como em toda negociação política, na transferência da gestão da rede de
escolas públicas, há conflitos de interesses. A educação é de todos os serviços públicos o que
mais demanda pessoal e por meio do qual todo cidadão é atendido ou deveria ser atendido,
durante uma boa parcela de sua vida. Se somados todos os anos que um estudante leva para
concluir a educação básica, chega-se aproximadamente a 17 anos. Durante este longo
período, há um contato cotidiano entre o cidadão e o serviço público que se reveste de uma
importância, cada vez maior, no planejamento em todas as esferas administrativas.
Para poder contextualizar o município de Petrópolis no processo de descentralização
da educação fluminense, serão feitas, a seguir, algumas considerações sobre a realidade local.
Apesar de Petrópolis ser muito próximo à capital do Estado, não está mais inserido na
região metropolitana. Hoje, o município é o segundo maior do interior do Estado do Rio de
Janeiro em contingente populacional,23 apenas superado por Campos dos Goytacases no norte
do Estado. Cabe ressaltar que estão sendo considerandos como do interior do Estado todos os
municípios, excetuando-se os localizados na região metropolitana do Rio de Janeiro, inclusive
a capital do Estado.
O processo de municipalização em Petrópolis começou tardiamente em relação ao
PROMURJ e ainda não pode ser considerado como concluído, pois, de acordo com a
Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, ainda há espaço para
transferência de encargos entre as partes, Estado e Município.
23 Petrópolis tem população de 306.645 habitantes. (Contagem da população 2007 –IBGE), e se situa a 60 quilômetros da cidade do Rio de Janeiro.
76
Fazendo-se uma breve retrospectiva sobre os trâmites da municipalização em
Petrópolis, vê-se que a Prefeitura fez os seus primeiros contatos com a Secretaria de Estado de
Educação para efeito da municipalização no ano de 1994, ou seja, quase dez anos após o início
do PROMURJ. Naquela ocasião, quatro UEs estaduais foram municipalizadas: Avelino de
Carvalho, Calembe, Pedro Amado e Sebastião Lacerda. Entretanto, este convênio foi anulado
no ano seguinte, em virtude de problemas de repasse de recursos do Estado para o Município e
as UEs retornaram para a administração estadual. Convênios de curto prazo, de um ano,
sucederam à devolução das UEs anteriormente citadas e, só em 1998, foi publicado, no Diário
Oficial do Estado do Rio de Janeiro, o primeiro convênio de municipalização entre Petrópolis
e a administração estadual. Nesta data, apenas duas UEs passaram para a administração
municipal: a Escola Estadual Avelino de Carvalho e a Escola Estadual Carmem Nunes
Martins, que mantiveram o mesmo nome, mas sem a condição de “Escola Estadual” e sim de
“Escola Municipalizada”.
Naquele momento, toda a Região Serrana pertencia à jurisdição de uma única
Coordenadoria Regional de Educação, que tinha sede em Nova Friburgo. Foi, por meio desta
Coordenadoria, que se deram os contatos iniciais entre os secretários municipais de educação e
o representante da então SEE-RJ. Cabia à Secretaria de Estado de Educação o encargo de fazer
os estudos preliminares de viabilidade técnica das UEs, passíveis de municipalização. Não
havia ainda a prática da gestão compartilhada de UEs entre Estado e municípios, que mais
tarde entrou em vigor, com o projeto “Integrar para Municipalizar”. Portanto, até este
momento, a UE era totalmente administrada pelo Estado ou pelo Município e não se adotava a
divisão de uma escola de acordo com o turno, nível ou modalidade de ensino oferecida, entre
diferentes administrações públicas.
Ao deixar o Governo do Estado, em março de 1994, para se candidatar à Presidência da
República, Leonel Brizola passa o comando do Estado para o Vice-Governador Nilo Batista.
77
Neste final de mandato, houve a tentativa de municipalização de várias UEs em Petrópolis,
entre elas, o tradicional Colégio Estadual D. Pedro II, situado na principal avenida do centro da
cidade. Além desta UE, outros colégios estaduais foram requeridos pela Prefeitura de
Petrópolis para serem objeto da política de municipalização. Contudo o critério adotado pelos
dirigentes municipais fugia totalmente do que era estabelecido pela lei ou pelos critérios
técnicos, uma vez que se tratava de escolas que ofereciam o antigo 2º grau, atual ensino médio,
que não era o objeto das políticas de municipalização.
A Prefeitura de Petrópolis manifestou interesse por UEs com grande número de
alunos, prédios com boa estrutura física, localização privilegiada e que pudessem render
dividendos políticos à administração municipal. Este episódio, ocorrido no primeiro momento
da municipalização, em Petrópolis, caracterizou, de acordo com a Coordenadora de Integração
e Municipalização da SEEDUC-E, um caso em que fatores de ordem político-partidária
preponderaram sobre os de ordem administrativa. Ao mesmo tempo, a Prefeitura não
demonstrou interesse por pequenas escolas, algumas rurais, que se enquadravam nas
determinações de ordem técnica ou legal.
O Colégio Estadual D. Pedro II, a maior e mais bem localizada escola pública
presencial de Petrópolis, chegou a ser municipalizada no final do governo Marcelo Alencar,
quando foi implantada uma gestão compartilhada. Neste convênio, firmado entre o Estado e o
Município para o Colégio Estadual D. Pedro II, toda a educação infantil e o ensino fundamental
passaram a ser de responsabilidade da Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis. Esta
UE chegou a ter a sua municipalização publicada no Diário Oficial do Estado do Rio de
Janeiro, porém o SEE-RJ agiu com veemência, para que fossem respeitados os termos de
municipalização, estabelecidos pelo PROMURJ. Logo, nos primeiros dias de seu governo,
Anthony Garotinho anulou o Decreto que deu origem à municipalização desta UE.
78
A partir deste momento, a Prefeitura de Petrópolis passou a adotar uma postura mais
cautelosa nas suas pretensões e entrou em acordo com a SEE-RJ, para dar prosseguimento ao
processo de municipalização. Porém, diante disso, o processo de municipalização foi
desacelerado.
Contudo, ao se levar em conta a importância do município de Petrópolis dentro do
contexto estadual, considerando aspectos de número de UEs, número de matrículas, e
também a posição da Coordenadora de Integração e Municipalização do Estado da SEEDUC-
E, constata-se que ainda há UEs, ou segmentos do ensino passíveis de municipalização.
No presente capítulo, por meio de gráficos e quadros estatísticos, procurou-se
demonstrar o perfil das redes públicas e privadas em Petrópolis e a sua evolução nos últimos
anos após a criação do PROMURJ. Os gráficos demonstram os quantitativos por esferas
administrativas: federal, estadual, municipal e privada, ou sob a forma de convênios entre o
poder público e a iniciativa privada. O levantamento e as considerações realizadas abordam a
esfera administrativa e os respectivos níveis e etapas do ensino oferecidas no município de
Petrópolis. Através dos dados quantitativos, observa-se que, apesar dos repasses de UEs do
Estado para o Município, o número de matrículas na rede estadual localizada em Petrópolis
continua a crescer nos últimos 3 anos, enquanto a rede municipal teve uma pequena redução
no número total de matrículas em suas UEs.
Para demonstrar o processo de municipalização ocorrido em Petrópolis, no item a
seguir, a distribuição das matrículas entre as redes de ensino será objeto de observação e
análise.
79
4.1 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS ENTRE AS REDES DE ENSINO
PÚBLICO E PRIVADO EM PETRÓPOLIS.
O município de Petrópolis tem uma população de 306.645 habitantes24 e um total de
77. 561 matrículas na educação básica25, o que lhe confere a posição de uma das maiores
redes públicas municipais do Estado do Rio de Janeiro, com 183 unidades escolares, sob
administração municipal ou sob a forma de convênios26 com a Prefeitura. Estes números
demonstram que pouco mais de 1/4 da população total do município se encontra matriculada
na rede de educação básica, em UEs dos setores públicos e do privado. O perfil econômico
do município faz com que a demanda pelo ensino médio seja cada vez maior, o que deve ter
influenciado na retomada recente do processo de municipalização. Para que o Estado possa
atender esta demanda, é necessário repassar ao município algumas UEs que ainda oferecem a
educação infantil e o ensino fundamental.
Para ilustrar a distribuição do atendimento nos diferentes níveis da educação básica
em Petrópolis, de acordo com a esfera administrativa: estadual, municipal e privada,
recorremos a um conjunto de gráficos.
No gráfico 03, a seguir, apresenta-se o total de matrículas da educação básica que é de
77.561 alunos, somando-se todas as UEs de Petrópolis, públicas e privadas:
24 Fonte: IBGE Contagem da população 2007. 25 Fonte: IBGE estatística 2005. 26 A Prefeitura de Petrópolis tem convênios com várias entidades da sociedade civil, o que será detalhado no item 4.1.2. deste estudo.
80
GRÁFICO 03 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA DE PETRÓPOLIS POR SETORES PÚBLICO E
PRIVADO
17,4%
18,0%
64,6%
Privada
Pública Estadual
Pública Municipal
Fonte: Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais – INEP – Censo Educacional 2005. *27
Com base no gráfico 03, constata-se que a participação estadual nas matrículas da
educação básica no município era de 18% sobre o total de matrículas para este nível de ensino,
com 13.968 estudantes28 atendidos na sua maior parte em UEs, que oferecem o ensino médio.
Outra observação importante é a participação da iniciativa privada, com 13.491 estudantes, o
que representa 17,4% do total29, ou seja, bastante próximo em termos quantitativos aos
números da rede estadual.
A participação municipal na educação básica é a mais expressiva, com quase 2/3 de
todas as matrículas das redes pública e privada no Município de Petrópolis. Cabe ressaltar que
o ensino fundamental responde por 72,32 % dessas matrículas da educação básica, o que
significa que o município concentra a grande maioria das matrículas nesta etapa de ensino.
Prosseguindo com a análise, o gráfico 04 a seguir, demonstra a distribuição das matrículas na
educação infantil em Petrópolis nas redes públicas estadual e municipal e na rede privada.
27 Não há qualquer instituição de ensino federal em Petrópolis. 28 Fonte: IBGE – INEP –2005. 29 Fonte: IBGE – INEP –2005.
81
GRÁFICO 04 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL DE PETRÓPOLIS POR SETORES PÚBLICO E PRIVADO
37%
1%
62%
Privada
Pública Estadual
Pública Municipal
Fonte: Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais – INEP – Censo Educacional 2005.
Observa-se que a presença da rede estadual na educação infantil já é muito
reduzida, em torno de 1% do total de matrículas. Ao se indagar o porquê de a
SEEDUC-E manter o atendimento nesta modalidade, com apenas 87 matrículas em
2005, foi esclarecido que esta UE é usada como Colégio de Aplicação para os Cursos
Normais em nível médio da rede estadual, que existem no Município de Petrópolis.
Dessa forma, percebe-se que esta etapa da educação básica é passível de se extinguir
na rede estadual de Petrópolis, após ser feito um convênio com o município para as
estagiárias do Curso Normal.
Ressalta-se, novamente, que a participação da iniciativa privada é significativa: mais
de 1/3 do total na educação infantil, com 3.249 matrículas para o ano de 2005.
Os números e o percentual alto para esta etapa do ensino, a educação infantil, na rede
municipal, justifica-se uma vez que, observadas as competências para as redes públicas
estabelecidas na LDBEN nº 9394/96, apenas os municípios aparecem como responsáveis pela
educação infantil.
82
O gráfico 05, a seguir, demonstra a distribuição do número total de matrículas no
ensino fundamental em Petrópolis; somando-se o quantitativo das redes públicas estadual e
municipal e da rede privada.
GRÁFICO 05 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NO ENSINO FUNDAMENTAL DE PETRÓPOLIS POR SETORES PÚBLICO E
PRIVADO
12,12%
9,97%
77,91%
Privada
Pública Estadual
Pública Municipal
Fonte: Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais – INEP – Censo Educacional 2005.
Há grande participação do município nesta etapa da educação básica, na qual 77,91 %
das matrículas estão em escolas municipais. O ensino fundamental concentra o maior número
de alunos matriculados na educação básica, com 56.088 matrículas, que, em 2005,
representavam 72,32 % do total de alunos que cursavam as séries deste nível de ensino. O
alto percentual de matrículas na rede municipal se deve, em parte, a ser o ensino fundamental
um segmento longo, composto até o ano de 2006 por 8 anos e, atualmente, por 9 anos30.
Essa maior abrangência do ensino fundamental na rede municipal se reflete, de
maneira significativa, quando calculado o percentual sobre o total da educação básica, uma
vez que os municípios devem atender preferencialmente ao ensino fundamental e, com a
municipalização do ensino, a participação das prefeituras nesta etapa deve ser cada vez maior.
Infelizmente, os dados do IBGE – INEP 2005 não detalham o número de matrículas para cada
um dos segmentos do ensino fundamental, do 1º ao 5º ano e do 6º ao 9º ano. Esta divisão
entre os dois segmentos do ensino fundamental será objeto de análise, posteriormente, em
83
cima de dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis e apenas para
as escolas municipais.
O gráfico 06, a seguir, mostra a divisão do total de matrículas no ensino médio em
Petrópolis para o ano de 200531, quando somadas todas as redes: municipal, estadual e
privada. Conforme se observa, no gráfico 06, a participação do município no ensino médio,
embora pequena, com 1020 matrículas, que representam 8% do total, pode ser considerada
significativa por vários aspectos, dentre os quais estarem os municípios impedidos de atender
a esta etapa da educação básica, no caso de ainda não ter atendido toda a demanda do ensino
fundamental. Deve-se, portanto, concluir que, ao oferecer também o ensino médio, não deve
haver carência de vagas no ensino fundamental público no município de Petrópolis.
Cabe observar, no gráfico 06, que a participação da iniciativa privada é significativa,
com 3.444 alunos que respondem por 27 % do total de matrículas do ensino médio. Neste
caso, a situação dos poderes públicos, seja municipal seja estadual, é bem mais confortável,
uma vez que não há na lei, ainda, a obrigatoriedade de se oferecer o ensino médio
gratuitamente.
GRÁFICO 06 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS NO ENSINO MÉDIO DE PETRÓPOLIS POR SETORES PÚBLICO E PRIVADO
27%
65%
8%
Privada
Pública Estadual
Pública Municipal
Fonte: Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais – INEP – Censo Educacional 2005.
30 Fonte: Lei nº 11.274 de 06/02/2006, artigo 3º, que modifica o artigo 32º da Lei 9394/96. 31 Fonte. IBGE – INEP -2005
84
O Estado, apesar de ter como prioridade o ensino médio, não está obrigado a suprir
toda a carência de vagas para esta etapa da educação básica, deixando para a iniciativa
privada uma fatia do mercado conseqüente, também, da impossibilidade de atendimento pelo
poder público.
Em um primeiro momento, é provável imaginar que, com o processo de
municipalização, a participação do Município no ensino fundamental aumente, bem como a
participação do Estado no ensino médio, em função das UEs municipalizadas e/ou da
transferência de alunos por meio de acordos e convênios realizados entre o Estado e os
municípios.
Entretanto são muitas as variáveis a serem consideradas para uma melhor
compreensão da evolução das redes públicas de educação e da transferência de encargos e
competências entre Estado e município, bem como da participação da iniciativa privada. Não
são apenas questões de ordem legal ou política que interferem neste processo de
gerenciamento das redes públicas da educação básica, em particular no ensino médio.
O mercado de trabalho, cada vez mais, estabelece como prerrogativa ao acesso, a
conclusão do ensino médio, aumentando a demanda por vagas nesta etapa da educação básica.
Fatores demográficos, culturais e econômicos, de caráter local e nacional, também têm
influência na evolução do número de matrículas por nível e/ou modalidade de ensino,
conforme demonstraremos mais adiante. A queda na taxa de crescimento demográfico
brasileiro tem provocado um envelhecimento da população, o que, na prática, significa um
percentual maior de jovens que, num primeiro momento, irão freqüentar as turmas do 2º
segmento do ensino fundamental e, posteriormente, do ensino médio. Portanto, a tendência é
de que estes dois segmentos do ensino aumentem a sua demanda dentro da educação básica.
As considerações feitas até aqui fundamentaram-se em gráficos e quadros com dados
sobre a rede educacional no Estado do Rio de Janeiro e no município de Petrópolis, nas
85
diferentes esferas administrativas: federal, estadual, municipal e privada, para o ano de 2005,
com dados do IBGE32, apontando as tendências para os diferentes níveis da educação no
município de Petrópolis.
4.1.1. - Estrutura da rede estadual de ensino no município de Petrópolis
A estrutura de rede estadual de educação, localizada no município de Petrópolis, é o
objeto central do processo de municipalização e, portanto, não poderia deixar de ser
pesquisada em termos quantitativos e qualitativos, para se verificar o que ainda é possível de
ser transferido à administração municipal e o que já foi realizado neste sentido.
No quadro 04, a seguir, tem-se a totalização das matrículas da rede estadual no
município de Petrópolis, para o ano de 2005, dividida por etapas da educação básica:
QUADRO 04 – DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS ENTRE OS NÍVEIS DE ENSINO E POR UNIDADES ESCOLARES ADMINISTRADAS PELA SEEDUC-E EM PETRÓPOLIS:
NÍVEL
EDUCAÇÃO INFANTIL
ENSINO FUNDAMENTAL
ENSINO MÉDIO
Nº DE MATRÍCULAS EM 2005
87
5590
8291
TOTAL DE MATRÍCULAS EM TODOS OS NÍVEIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: 13.968 ALUNOS Fonte:Tabela construída com base nos dados IBGE –INEP 2005.
O quadro 04 mostra dados da mesma rede para os anos de 2005 que, se confrontados
com 2007, no quadro 0533, demonstram que houve um acréscimo de 6.428 alunos,
significando uma expansão de 46 % sobre o total verificado no ano de 2005, de acordo com
os dados repassados para o INEP.34
32 IBGE –INEP – Censo Escolar 2005 33 Dados levantados na Coordenadoria Regional 11 da Região Serrana III para o 1º semestre de 2007. 34 IBGE –INEP – Censo Escolar 2005.
86
QUADRO 05 – DISTRIBUIÇÃO DAS MATRICULAS NA UES ESTADUAIS DE PETRÓPOLIS: ETAPA/MODALIDADE
Etapa Educação infantil Ensino fundamental Ensino Médio Total
Modalidade regular supletivo EJA regular supletivo normal técnico Educação Especial
21 4.460 4.198 263 7.703 3.494 61 174
Total 85 21 8.921 11.369
20.396
Fonte: Coordenadoria Regional Serrana III SEEDUC-E - julho de 2007.
Verifica-se, portanto, uma expansão considerável para um período menor do que 2
anos, o que, com certeza, resulta da pressão sobre a Secretaria Estadual de Educação no
sentido de expandir sua rede de ensino médio para atender ao crescimento acelerado da
demanda. Mesmo tendo municipalizado 10 UEs, a rede estadual experimentou uma expansão
elevada no número de matrículas, acima de 20 %, em média, ao ano, nos últimos dois anos.
Em contrapartida, na rede municipal, houve um decréscimo de 1.225, matrículas
representando uma redução de 2,31% verificado sob o total de matrículas desta rede, de
acordo com números de meados de 200735, ou seja, o mesmo período em que se levantou os
dados da rede estadual.
Os dados comparativos, entre as evoluções das redes municipal e estadual em
Petrópolis, demonstram que a proposta de descentralização da educação, via municipalização,
prossegue atual, no sentido de deixar a esfera estadual atuar no nível que a lei determina
como prioritário para os Estados, que é o ensino médio.
Através da observação dos dados comparativos, ainda que, por um período tão curto,
inferior a dois anos, percebe-se que a proposta municipalizante prossegue. Um exemplo disso
é a determinação às diretoras das UEs estaduais que ainda trabalham com a educação infantil,
que não mais ofereçam vagas para esta etapa em 2008.
Em 2005, havia 87 matrículas na educação infantil estadual no município de
Petrópolis, já, em 2007, eram apenas 21. De acordo com a Coordenadoria de
35 Dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Petropolis para julho de 2007.
87
Municipalização, para o ano de 2008, há a determinação da SEEDUC-E de que não mais se
efetivem matrículas para esta etapa da educação básica nas escolas estaduais localizadas no
município de Petrópolis. A mesma tendência se repete no ensino fundamental, porém, com
maior ênfase, para o 1º segmento, que abrange as turmas do 1º até o 5º ano de escolaridade.
De acordo com os critérios administrativos, a característica principal a diferenciar os dois
segmentos do ensino fundamental é a exigência legal sobre a formação do professor que vai
atuar em cada um desses segmentos. Para atuar no primeiro segmento, o profissional é
classificado como Docente II, pelo plano de cargos da SEEDUC-E, e deve ser formado em
pedagogia ou normal superior. Contudo não há determinação expressa na lei que proíba os
professores com formação em nível médio para o magistério, o Curso Normal, de atuarem
nas turmas do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Entretanto os últimos concursos realizados,
para ingressar no quadro de docentes efetivos da Secretaria Estadual de Educação do Estado
do Rio de Janeiro e, também, do município de Petrópolis, tinham em seus editais a exigência
de docentes formados em nível superior. Um fato curioso é que só é exigido do profissional a
habilitação em nível superior, quando este é contratado sob regime estatutário por meio de
concurso público, sendo, posteriormente, efetivado. Nos casos, em que o Docente II é
contratado por tempo determinado, sem estabilidade e vínculo empregatício, é aceita a
formação em nível médio, o Curso Normal.
Vale lembrar que a SEEDUC-E ainda mantém mais de 70 Cursos Normais na sua rede
de escolas em diversos municípios do Estado, inclusive na capital e no município de
Petrópolis, onde há 61 matrículas para as turmas do Curso Normal. Os últimos concursos
para ingresso no magistério estadual do Rio de Janeiro só contemplaram vagas para o
professor Docente I, com licenciatura plena, específica em um dos componentes curriculares
do 2º segmento do ensino fundamental e do ensino médio.
Seguindo as diretrizes do PROMURJ, a SEEDUC-E não mais realiza concursos para o
cargo de Docente II, estando, portanto, coerente com a proposta de descentralização que
88
preconiza a transferência do ensino fundamental para as redes municipais, com o objetivo de
atender a crescente demanda pelo ensino médio. A falta de Docentes I e o excesso de
Docentes II na rede estadual criam embaraços administrativos para a SEEDUC-E, que, em
alguns casos de municipalização, acaba por ceder Docentes II para atuarem nas turmas do 1º
segmento da UE municipalizada.
A municipalização de todo o 1º segmento do ensino fundamental significa, na prática,
que as UEs pertencentes a SEEDUC-E não mais irão oferecer vagas neste segmento. Em
função deste fato, ocorrerá que um grande número de professores classificados como
Docentes II, permanecerão na condição de funcionários públicos estaduais. Este profissionais
não poderão ser demitidos, pois são efetivos e têm estabilidade, mas estarão impedidos por
determinação legal de atuarem no 2º segmento do ensino fundamental por não estarem
habilitados para tal, caso não sejam graduados em alguma das licenciaturas. Já no caso do
Docente I, mesmo que o Estado se retire do 2ºsegmento do ensino fundamental, do 6º ao 9º
ano de escolaridade, este profissional será aproveitado para lecionar no ensino médio, uma
vez que a habilitação determinada pela lei é a mesma para as duas etapas da educação básica.
Nas escolas estaduais localizadas no município de Petrópolis, ainda há 935 alunos
cursando turmas do 1º segmento do ensino fundamental regular, na sua maior parte nos turnos
da manhã e da tarde, o que, em princípio, configura um quadro favorável à municipalização.
Os dados da tabela da Coordenadoria Regional Serrana III, infelizmente, não especificam em
que turmas estão estes alunos; mas, de qualquer forma, são proporcionalmente números pouco
expressivos, respondendo por 4,51 % das matrículas da rede estadual, em todo o município
de Petrópolis. Se a estratégia de não abrir vagas paras as turmas iniciais do ensino
fundamental for mantida, é possível que, em 5 anos, o Estado tenha se retirado do 1º
segmento do ensino fundamental em Petrópolis. Caso haja interesse de ambas as partes,
através de uma negociação, poderá haver mais UEs municipalizadas e com isso o Estado
retirar-se-á mais rapidamente do ensino fundamental.
89
Ao se indagar à Coordenadora de Integração Municipalização da SEEDUC-E se ainda
há UE a ser municipalizada em Petrópolis, a colocação foi a seguinte:
Do ponto de vista técnico, sim, pois ainda há unidades escolares trabalhando com turmas do ensino fundamental nos dois segmentos; mas não há interesse da SEEDUC-E em ceder os prédios maiores e com melhor estrutura, uma vez que o Estado necessita deles para atender a crescente demanda pelo ensino médio.
A Coordenadora de Integração e Municipalização ressalta ainda que a atual situação
caracteriza uma sub-utilização dos CIEPs que foram projetados para atender confortavelmente
algo em torno de 600 alunos, trabalhando em horário integral, pois se trata de um prédio com
18 salas de aulas. No caso de se trabalhar em três turnos, esta capacidade fica triplicada,
lembrando que, para efeito de cálculo, consideram-se turmas com cerca de 30 alunos, o que
nem sempre ocorre nas redes públicas.
De acordo com dados contidos na tabela da CR11RSIII, ( Anexo C), pode-se
observar que os CIEPs Santos Dumont, Cecília Meireles e Maestro Guerra Peixe têm,
respectivamente, 456, 314 e 275 alunos matriculados no ensino fundamental. Este quadro
exemplifica a afirmação da Coordenadora de Integração e Municipalização, de que ainda há
uma viabilidade técnica para a municipalização quando se trata de UEs que trabalham
exclusivamente com o ensino fundamental. Porém este tipo de prédio, por possuir uma
excelente estrutura física, não são no atual momento, visualizados como objeto de negociação
entre o governo do Estado do Rio de Janeiro e qualquer prefeitura.
Quando observados os números para o 2º segmento do ensino fundamental regular,
percebe-se que o total de matrículas é bem mais significativo, com 3.525 alunos que
respondem por 17,24 % do total de matrículas da escolas da SEEDUC-E em Petrópolis. Esta
não é a etapa de maior número de matrículas na rede estadual localizada em Petrópolis, mas é
onde está o ensino com maior número de UEs ao longo de todo o município, sendo oferecido
em 14 das 16 UEs, sob administração da SEEDUC-E.
90
Considerando o ensino fundamental em todas as suas modalidades: regular, educação
de jovens e adultos - EJA, supletivo presencial e supletivo não presencial – CES36; todas as
UEs estaduais localizadas em Petrópolis ainda oferecem o ensino fundamental. Este fato
parece ser um complicador para se prosseguir com a municipalização, uma vez que não há
intenção da SEEDUC-E em ceder qualquer dos prédios em uso por escolas estaduais em
Petrópolis.
A rede estadual, em Petrópolis, conta com 4.942 alunos matriculados no ensino
fundamental presencial e, em outras diversas modalidades, não calculados os alunos
matriculados no supletivo fundamental não presencial, o CES. O quantitativo referente ao
ensino não presencial será excluído desta consideração por demandar infra-estrutura bem
menor e menos complexa que as UEs de modalidade presencial. Porém, para se proceder a
transferência de todo o contingente que, atualmente, cursa o ensino fundamental presencial,
nas escolas estaduais localizadas no município de Petrópolis, sem que a SEEDUC-E ceda
qualquer uma das suas UEs localizadas neste município, seria necessário construir algo em
torno de 10 UEs com capacidade para 500 alunos cada uma. Outra alternativa seria a de se
realizar um remanejamento de alunos das UEs estaduais para UEs municipais, o que é tarefa
extremamente complexa, devendo-se considerar, inclusive, o desgaste político.
A localização das UEs, os vínculos existentes entre os alunos e destes com os
professores, o turno em que seriam oferecidas as aulas, entre outros aspectos, são muitas das
variáveis a interferirem em uma negociação desta magnitude. Além disso, o impacto dos
custos na rede municipal, com a construção de escolas, o pagamento de pessoal e a burocracia
administrativa, também é um impedimento para medidas desta natureza.
Por outro lado, o ensino fundamental, sob administração da SEEDUC-E em
Petrópolis, em todas as suas modalidades, apresentou um crescimento de 54,8 % entre os anos
de 2005 e 2007, passando de um total de 5.590 alunos no ano de 2005 para 8.658 alunos em
36 CES – Centro de Ensino Supletivo (semi-presencial).
91
julho de 2007. Numa primeira análise, poderíamos considerar que estes números retratam
uma situação que vai no sentido oposto ao da proposta de descentralização. Porém deve-se
observar que a rede estadual teve considerável crescimento de suas matrículas no ensino
fundamental na modalidade do ensino supletivo não presencial que responde por cerca de
42% do total de todas as matrículas do ensino fundamental das UEs estaduais em Petrópolis.
Para traduzir, com maior confiabilidade estes números no que diz respeito à política estadual
para a municipalização da educação em Petrópolis, seria conveniente dados sobre o perfil dos
alunos do CES, sua origem, faixa etária etc, o que poderia explicar o porquê de tão alta taxa
de crescimento no ensino fundamental das escolas estaduais; enquanto o total de matrículas da
rede municipal, que atende quase que exclusivamente ao ensino fundamental presencial teve
uma redução, ainda que pequena neste mesmo período.
O quadro 06, a seguir, permite-nos compreender melhor a estrutura da rede estadual,
localizada no município de Petrópolis, uma vez que retrata a distribuição das matrículas e os
seus respectivos percentuais no ensino fundamental de acordo com as modalidades:
QUADRO 06 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS DO ENSINO FUNDAMENTAL POR MODALIDADE DE ENSINO NAS ESCOLAS ESTADUAIS DA SEEDUC-E NO MUNICÍPIO DE PETRÓPOLIS:
Modalidade Nº de matrículas Participação % no total de matrículas no Ensino Fundamental
1º segmento regular 935 10,48 % 2º segmento regular 3525 39,51 % Supletivo presencial 482 5,40 %
Supletivo não presencial (CES)
3716 41, 65 %
Educação de Jovens e Adultos (EJA)
263 2,96 %
Total 8921 100,00 % Fonte: Tabela construída com dados fornecidos pela Coordenadoria Regional Serrana III, em junho de 2007.
O crescimento do número de matrículas no ensino fundamental, nas escolas estaduais,
localizadas no município de Petrópolis, deve ser, portanto, objeto de investigação detalhada e
atenta, para não dar margem a interpretações errôneas, levando a crer numa primeira análise
que as administrações estaduais e municipais estão em descompasso com o objetivo do
PROMURJ. O que se percebe é que o número de matrículas cresce nas duas esferas
92
administrativas: estadual e municipal, mas grande parte das novas turmas trabalha com
modalidades não regulares de ensino.
Uma vez excluídas do cálculo de crescimento as matrículas no ensino fundamental na
modalidade supletivo não presencial e contabilizadas somente as matrículas do ensino
fundamental regular, teríamos, desta forma, uma redução 11,6 % na rede de ensino
fundamental, sob administração da SEEDUC-E para o município de Petrópolis. Esta
observação ganha relevância, pois demonstra que as metas de descentralização não foram
desconsideradas. As modalidades regulares de ensino parecem perder espaço não apenas no
ensino fundamental, mas nas etapas iniciais da educação básica na rede de escolas estaduais.
Um fato importante que não pode ser desconsiderado são os incentivos contidos na
legislação como forma de se financiar os municípios e apoiar os programas de
descentralização, postos em prática no Brasil, ao longo dos últimos anos, entre eles a criação
do FUNDEF e a sua substituição, recentemente, pelo FUNDEB. Estes dois fundos de
redistribuição de verbas do governo federal dos Estados e Municípios, e fazem uma divisão
dos recursos proporcionais ao número de alunos matriculados nas redes públicas. Com a
substituição do FUNDEF pelo FUNDEB novas etapas e modalidades de ensino passaram a
ser contempladas.
Todavia é preciso considerar também que as matrículas no ensino médio nas escolas
estaduais administradas pela SEEDUC-E em Petrópolis, subiram de um patamar de 8.921
matrículas no ano de 2005 para 11.432 no ano de 2007, significando um aumento de 37,8 %
para o período citado, principalmente nos cursos não presenciais que não são contemplados
pelo FUNDEB.
Em um primeiro momento, pode-se ter a impressão de que ao poder público estadual
caberia apenas e tão-somente atender aos alunos do ensino médio oriundos do ensino
fundamental regular, normalmente oferecido pelo poder público municipal, seguindo a
distribuição de incumbências prescrita na LDBEN nº 9394/96 e na CF de 1988. Entretanto,
93
conforme demonstramos nas considerações anteriores sobre a rede estadual de ensino
fundamental em Petrópolis, pode-se constatar que o ensino regular responde apenas por uma
parte desta rede e que as modalidades de ensino supletivo presencial, supletivo não presencial
e a EJA37 - educação de jovens e adultos vêm apresentando uma taxa de crescimento bem
superior à verificada no ensino regular. Isto ocorre em virtude do grande número de pessoas
que não concluíram seus estudos dentro da faixa etária esperada e, hoje, por motivos diversos
retornam às escolas. No ensino médio, as modalidades não regulares de ensino também têm
apresentado um crescimento bastante acelerado, pressionando a administração estadual no
sentido de agilizar novas turmas e/ou novas UEs. Para Souza (2007) o atraso escolar de
grande parte da população é um fator importante a ser considerado ao analisar as altas taxas
de crescimento das modalidades não regulares de ensino médio oferecidas pela rede
estadual.
Um fato importante observado quando se levantam dados relativos à rede estadual de
educação, é que ainda o poder público estadual não trabalha apenas com a SEEDUC-E para
oferecer o ensino de nível médio, pois conta também com a Fundação de Apoio à Escola
Técnica – FAETEC, subordinada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e que tem
uma unidade em Petrópolis, oferecendo curso técnico nas áreas de Informática, Inglês e
Esportes com um total de 2.621 alunos38. Entretanto os dados do INEP não fazem distinção da
Secretaria de Estado a que está vinculada a matrícula, apenas apresentam dados para toda a
rede estadual, sem fazer qualquer espécie de categorização dentro desta esfera administrativa.
O ensino médio regular, oferecido pela SEEDUC-E em Petrópolis, é realizado em 10
UEs, totalizando 7.703 alunos, o que representa 67,37 % do total de alunos nesta etapa e
modalidade de ensino. O ensino supletivo, oferecido na modalidade não presencial é somente
37 As informações prestadas pela SEEDUC-E não fazem distinção entre a EJA e o ensino supletivo. 38 Fonte: FAETEC – Unidade Petrópolis dados para 2º semestre de 2007.
94
em uma única UE, o CES39 em Petrópolis, mas conta com um elevado número de matrículas,
7. 210, sendo 3.716 no ensino fundamental e 3.494 no ensino médio.
No quadro 07, a seguir, observa-se a distribuição das matrículas nas UEs das redes
estaduais localizadas em Petrópolis, quer subordinadas à SEEDUC-E, quer subordinadas à
Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia.
QUADRO 07 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRICULAS DO ENSINO MÉDIO POR MODALIDADE E ADMINISTRAÇÃO NAS ESCOLAS ESTADUAIS NO MUNICÍPIO DE PETRÓPOLIS: *
MODALIDADE/ADMINISTRAÇÃO Nº DE MATRÍCULAS % SOBRE O TOTAL DE MATRÍCULAS
REGULAR 7.703 67,37 % SUPLETIVO NÃO PRESENCIAL40 3.494 30,58 % CURSO NORMAL 61 0,53 % TÉCNICO-SEEDUC-E 174 1,52 % TOTAL DE MATRÍCULAS NO ENSINO MÉDIO: 11.432 100 % *Fonte: Tabela montada com dados da SEEDUC-E e da FAETEC em junho de 2007, (Anexo E).
É necessário detalhar informações quantitativas para não se proceder a interpretações
equivocadas. A descentralização da educação tem como fundamento a otimização de recursos,
por meio de uma repartição de competências em que se julga que uma determinada esfera do
poder público poderá prestar um serviço de melhor qualidade à população. O aumento
crescente e em ritmo acelerado por vagas nas redes públicas, nas diferentes modalidades e
etapas da educação básica, é outro fator que deve ser considerado, na análise dos dados
obtidos. Para corresponder a esta demanda, as secretarias de educação, quer estadual quer
municipal, bem como a iniciativa privada, procuram oferecer modalidades de ensino que
venham ao encontro do que é demandado.
Percebe-se, pelo quadro 03, que o poder público municipal já responde por 64,6 % de
todas as matrículas da educação básica no município de Petrópolis. Este número evidencia
que a proposta contida no texto da CF de 1988 e na LDBEN nº 9394/96 que instituiu o ensino
fundamental como gratuito e obrigatório, causou grande pressão política sobre as
39 CES Centro de Estudos Supletivos – modalidade de ensino não presencial para os níveis médio e fundamental, com orientação de professores para entrega de material e retirada de dúvidas. 40 Observação: não é oferecido ensino supletivo presencial em nível médio.
95
administrações municipais, fazendo com que houvesse rápida expansão do ensino
fundamental e das redes municipais de educação em todo o país.
A expressiva queda das taxas de crescimento demográfico, verificada no Brasil nas
últimas décadas, aponta para um envelhecimento da população. Isto significa que, num
primeiro momento, há um aumento do percentual de adolescentes e jovens e uma
conseqüente redução no percentual de crianças para o total da população. Porém não é só o
fator demográfico que colabora com um maior crescimento das matrículas no ensino médio
em relação ao ensino fundamental, outros fatores de ordem social e cultural contribuíram para
que um grande número de pessoas retomasse os estudos, fato que explica a grande procura
por cursos noturnos em diferentes modalidades: regular, EJA e supletivo, presencial ou não.
Este somatório de fatores leva a concluir que é preciso agilidade no processo de
municipalização e, especialmente, de colaboração entre as redes públicas de educação, de
forma que os poderes públicos consigam acompanhar a demanda por vagas, de acordo com o
nível e a modalidade de ensino.
Para entendermos melhor o processo de municipalização em Petrópolis, é necessário
ainda, a seguir, fazer um levantamento detalhado da rede pública de educação municipal, que
é o objeto deste estudo.
4.1.2 Estrutura da rede municipal de ensino no município de Petrópolis
O município de Petrópolis tem na sua rede de escolas uma particularidade que merece
ser analisada logo no primeiro momento: são os convênios entre o poder público municipal e
instituições privadas de ensino. A maior parte destes convênios é feita com instituições
privadas confessionais, ligadas a alguma instituição religiosa, católica ou protestante, ainda
que existam uns poucos convênios com instituições laicas. Quando somadas todas as
96
matrículas em UEs conveniadas totalizam 9.709 alunos que respondem por 18,69 % de todas
as matrículas da rede municipal.
Os convênios variam bastante de uma UE para outra e estão em todas as etapas da
educação básica: na educação infantil e nos dois segmentos do ensino fundamental. No ensino
médio, há apenas um convênio firmado com a Organização Não Governamental - ONG -
Viva Rio, na modalidade Educação de Jovens e Adultos - EJA. Os convênios podem ainda
ser parciais em uma mesma UE quando apenas uma determinada etapa do ensino ou segmento
desta está conveniada, e a etapa seguinte funciona como uma instituição privada. Na etapa da
educação que é conveniada, o mais comum é a administração municipal arcar com o
pagamento de professores, enquanto a estrutura física fica por conta da instituição
conveniada. Há alguns casos de UEs conveniadas nas quais o poder público municipal entra
com a verba e não com os professores, havendo um acompanhamento e fiscalização dos
gastos das verbas públicas municipais repassadas para a UE.
Ao se indagar à representante da Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis o
porquê da origem destes convênios, o que foi informado é que, foram realizados quando a
educação pública não atendia a toda a demanda, como forma de contemplar a população em
idade escolar nas instituições educacionais já existentes. Outro argumento dado foi o fato de
haver uma “tradição” na educação petropolitana de parceria com instituições religiosas, em
todos os níveis.
As informações sobre o futuro dos convênios são evasivas, pois trata-se também de
uma questão política, já que há um grande número de escolas conveniadas. Cada caso de UE
conveniada é um caso específico, ficando a critério da UE, da instituição conveniada e do
poder municipal renovar, ou não, o convênio. O rompimento de um convênio envolve um
custo político alto, havendo pressão de diversas formas sobre a administração pública.
Contudo é de grande importância lembrar que, caso um número grande de convênios venha a
ser cancelado, em um curto período, as demais UEs da rede municipal não teriam como
97
atender a procura por vagas de imediato, havendo uma superlotação de turmas em algumas
UEs. O quadro 08, a seguir, demonstra o tamanho e a participação da UEs conveniadas
na rede de Petrópolis, evidenciando a sua importância quantitativa e a sua participação por
etapas, modalidades e segmentos da educação básica
QUADRO 08 - PARTICIPAÇÃO DOS CONVÊNIOS NA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS Administração Nível de ensino Instituição conveniada Nº de U.Es Nº de alunos
Educação Infantil 18 1.006 Igreja Católica 29
Igrejas Evangélicas 06
SME convênios
Ensino Fundamental
Instituições Laicas 07
42
8.703
Total para os convênios 60 9.709
Educação Infantil Sem convênios 29 4.906 Ensino Fundamental Sem convênios 94 35.116
Ensino Médio Sem convênios 01 862 Educação Especial S/d 09 346
Educação Jovens e Adultos S/d 08 193
SME Sem convênios
VIVA RIO S/d 14 832 Total exclusivo SME sem convênios S/d* 42.255
Total da rede municipal inclusive convênios. 183 51.964
Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis - 2007 * Sem dados, pois há uma superposição de modalidades para uma mesma UE.
Uma questão fundamental, e que deve ser considerada em qualquer planejamento de
educação pública, é o da localização das UEs. Há casos de escolas com excesso de alunos nas
turmas e outras trabalhando abaixo da capacidade de atendimento, causando um sub-
aproveitamento operacional no atendimento, o que caracteriza uma má administração de
recursos de toda ordem.
A localização da UE próxima ao local onde residem os alunos é fator de grande
importância para os pais da educação infantil e do 1º segmento do ensino fundamental, uma
vez que estes alunos dependem dos pais ou de um responsável para levá-los até a escola. O
fator localização pode ter sua importância reduzida para alunos jovens e adultos, mas não
pode ser desconsiderado. Esta observação também é válida para a lotação dos professores.
Nestes dois casos, a proximidade com o local de trabalho e a facilidade de transporte ganham
relevância.
98
O problema da alocação de alunos e professores em uma determinada UE é complexo
para as redes de ensino, não apenas as públicas, mas também para as escolas privadas. A
Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis informa que algumas UEs têm turmas
superlotadas e outras, por causa de sua localização, trabalham com capacidade ociosa. A
alocação de alunos em uma determinada UE pode se transformar em um episódio de
influência política.
Convém lembrar que um dos sustentáculos filosóficos da descentralização da
educação através da municipalização é, justamente, a otimização dos recursos e a eficiência.
O que ocorre com os convênios, quando em vias de término de contrato, é semelhante
ao processo de transferência de matrículas verificado entre as redes estadual e municipal. A
retirada da oferta de vagas tem de ser gradual, sempre respeitando as datas dos anos letivos
de forma a não prejudicar o aluno. A modalidade de ensino e o turno oferecido também
ganham importância na distribuição das matrículas, nas quais as turmas noturnas têm, em
média, um número maior de alunos do que as diurnas. Lamentavelmente, os dados da
Secretaria Municipal de Educação não detalham a distribuição das matrículas por turno, com
dados médios por turma e o perfil etário desses alunos.
Além disso, verifica-se que as turmas do turno da tarde para o 2º segmento do ensino
fundamental são poucas e com poucos alunos por turma. A explicação fornecida pela
Secretaria Municipal de Educação se baseia no fato de que os adolescentes já realizam
trabalhos remunerados, normalmente, no turno da tarde.
O gráfico 07, a seguir, retrata a evolução do número total de matrículas na rede
pública municipal de Petrópolis, incluindo a educação infantil, o ensino fundamental e o
ensino médio, em diferentes modalidades e já somadas as instituições privadas conveniadas.
99
GRÁFICO 07 - EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS NA REDE MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS NO PERÍODO DE 1996 -
2007
34.240
36.926
37.094
38.280
40.679
44.765
44.765
48.156
49.834
53.189
52.595
51.964
0
10000
20000
30000
40000
50000
60000
Ano
Nº de m
atrículas
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis - 2007
O quadro 08, a seguir, demonstra de que forma se encontram distribuídas as
matrículas na rede pública municipal de Petrópolis nas etapas da educação básica e seus
respectivos percentuais:
QUADRO 09 - TOTAL DE MATRÍCULAS POR NÍVEL SEGMENTO/MODALIDADE NA REDE MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS ANO 2007: ETAPA/MODALIDADE Nº DE MATRÍCULAS % S/ TOTAL MATRÍCULAS EDUCAÇÃO ESPECIAL *1 346 0,67% EDUCAÇÃO INFANTIL 5.912 11,38% ED. FUNDAMENTAL 1º SEG 26.032 50,10% ED. FUNDAMENTAL 2º SEG 17.787 34,23% ENSINO MÉDIO 862 *2 1,66% *2 OUTROS 1.025 1,97% TOTAL 51.964 100% *1 A educação especial só atende no nível fundamental. *2 Estão excluídas deste total as matrículas no ensino médio, através de convênios, que estão incluídas em outros. Fonte: Quadro construído com dados da Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis – 2007.
O gráfico 08,a seguir, retrata os números do quadro 09 imediatamente acima, de
forma que se torne mais nítida a participação das matrículas por etapas da educação básica na
rede municipal de Petrópolis:
100
GRÁFICO 08 - DISTRIBUIÇÃO DAS MATRÍCULAS POR NÍVEL/MODALIDADE DE ENSINO NA REDE MUNICIPAL DE PETRÓPOLIS
11,38%
0,67%
50,10%
34,23% 1,66%
1,97%Educação Infantil
Educação Especial
Ed. Fund. 1º seg
Ed. Fund. 2º seg
Ensino Médio regular
Outros*
Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis – 2007.
Outros: BB educar e educação de jovens e adultos e atuam nos níveis fundamental e médio - (parceria do Banco do Brasil com a PMP); Bralf Brasil alfabetizado – (*parceria SESI PMP).
Com base nos dados do gráfico 08, acima, percebe-se que, em 2007, o ensino
fundamental é responsável por 87,22 % do total de matrículas da rede municipal de educação
de Petrópolis, sendo que o 1º segmento representa um pouco mais da metade, com 50,10 %
dos alunos. Contudo é importante observar que, de acordo com dados da Secretaria Municipal
de Educação de Petrópolis, o crescimento do 2º segmento foi muito significativo no período
pesquisado, passando de 13.074 matrículas no ano de 2001 para 17.787 no ano de 2007,
representando um crescimento de 36 %, o que, vale lembrar que, é muito acima da taxa de
crescimento populacional verificada no município para este mesmo período, que é de cerca
2 % ao ano.
Para reforçar o argumento de que a expansão verificada no 2º segmento do ensino
fundamental não está atrelada somente ao crescimento populacional, ressalta-se que, neste
mesmo período, a taxa de crescimento do número de matrículas do ensino fundamental no 1º
segmento teve decréscimo, reduzindo de 26.932 matrículas no ano de 2001 para 26.032
alunos em 2007. Em termos absolutos são 900 alunos a menos; porém, em termos percentuais
101
houve uma redução de 3,4%. Cabe ressaltar que, neste mesmo período, a população de
Petrópolis aumentou, enquanto que a rede estadual vem reduzindo gradativamente a sua
oferta de vagas para o 1º segmento do ensino fundamental diurno e regular, em consonância
com as diretrizes estabelecidas pelo PROMURJ. Para explicar este fenômeno, um conjunto de
variáveis devem ser consideradas: expansão da rede privada; migração de alunos fora da faixa
etária para os cursos noturnos presenciais ou não presenciais; registro equivocado de turmas
noturnas que trabalham com a EJA41 como turmas de ensino fundamental regular, de forma a
serem contempladas pelo extinto FUNDEF; além da redução da taxa de natalidade
impactando o ritmo do crescimento demográfico,42 que indica um número menor de
nascimentos.
Ainda no sentido de evidenciar a importância de um planejamento competente nas
políticas públicas para a educação e a sua relação com o andamento do processo de
municipalização, vale demonstrar que, no mesmo período, entre os anos de 2001 e 2007,
houve um grande crescimento das matrículas efetuadas no 2º segmento do ensino
fundamental nas modalidades não presenciais, na educação de jovens e adultos e no ensino
médio. No ano de 2001, o 1º segmento representava 60,16 % das matrículas na rede municipal
e hoje representa 50,10 % , com tendência a reduzir a sua participação, pelo menos em
termos percentuais, sobre o total de matrículas da rede municipal.
Portanto a agilidade no processo de municipalização aparece como fator de grande
importância no sentido de se atender uma demanda que muda de perfil com uma velocidade
considerável, conforme nos mostram os gráficos, os quadros e as considerações feitas em
cima das informações obtidas através deles.
Não se deve partir de uma observação simplista, em que o município atenderia a
demanda pelo ensino fundamental, e o Estado, pelo ensino médio, sem se levar em
41 Educação de Jovens e Adultos – modalidade de ensino não contemplada pelas verbas do FUNDEF.
102
consideração uma série de fatores como o aumento significativo de modalidades não regulares
de ensino, presenciais ou não, oferecidas em turnos noturnos e freqüentados por jovens e
adultos que, agora, por motivos diversos, reivindicam o seu direito à educação.
O acesso à educação é direito público subjetivo, garantido pela CF de 1988, no seu
artigo 208, inciso VI, parágrafo 3 e importa em crime de responsabilidade à autoridade
competente que não o cumprir. De acordo com o dispositivo constitucional citado, a
importância política da educação extrapola aspectos considerados como de promoção social,
de cunho ideológico ou humanista, e passa a condição de instrumento legal de pressão sobre o
poder público. Os governantes precisam estar atentos às penalidades previstas na legislação,
uma vez que o não cumprimento do estabelecido na Lei pode levar a desdobramentos que
ultrapassam a esfera político-eleitoral, chegando a instâncias judiciais.
No município de Petrópolis, 10 escolas foram municipalizadas desde 1998 até 2007,
o que não tem grande expressão numérica e quantitativa, se comparado com o total de
matrículas e de UEs verificadas na rede municipal para o ano de 2007. Ao se observar os
dados contidos no quadro 08, verifica-se que foram municipalizadas 10 UEs que
representam 5,46 % do número total de UEs da rede municipal, incluindo as UEs
conveniadas. Em um levantamento da participação das UEs municipalizadas sobre o total de
matrículas verificadas em julho de 2007, a importância quantitativa é ainda menor, uma vez
que responde por 3,96 % do total de alunos matriculados na rede municipal.
Porém, coerente com o ideal de eficiência administrativa, que serve de argumento
para o processo de descentralização, a municipalização destas UEs é justificada como uma
forma de dar à máquina administrativa do Estado maiores possibilidades para atuar em UEs
voltadas para as etapas do ensino que mais crescem e que lhes são atribuídas como
prioritárias pela legislação.
42 Índice do IBGE que mede a proporção de crianças até 15 anos de idade em relação ao total da população caracterizando envelhecimento populacional e estreitamento da base da pirâmide etária. (CENSO DEMOGRÁFICO – IBGE 2000 – P36).
103
O quadro 10, a seguir, apresenta as UEs municipalizadas em Petrópolis, seus
respectivos nomes ainda com a sigla E.E que representa Escola Estadual. Também, no quadro
10, estão as datas de publicação no Diário Oficial das transferências destas UEs para o
município de Petrópolis, assim como o número de alunos no momento da transferência para a
administração municipal e o número de alunos no início do ano letivo de 2007.
QUADRO 10 – UNIDADES ESCOLARES MUNICIPALIZADAS EM PETRÓPOLIS
Nº Unidade Escolar Data Nº de alunos no ano da municipalização
Nº de alunos em 2007
1 E E Almirante Tamandaré 16/01/01
145 82
2 E E Avelino de Carvalho 14/12/98 86 182
3 E E Carmem Nunes Martins 14/12/98 70 439
4 E E Paulo Motta 16/01/01 130 87
5 E E Frei Aniceto 16/01/01 154 154
6 E E Pedro Amado 16/01/01 200 175
7 E E Professora Maria da Glória Queiroz Vasconcellos 16/01/01 S/d 202
8 E E Santa Teresinha 16/03/05 S/d 405
9 E E Sebastião Lacerda 16/01/01 S/d 90
10 E E Sérgio Ribeiro da Rocha 16/01/01 150 244
Total de matriculas: ___ 935 2.060
% e total sob o nº de matrículas em junho de 2007
2060 matrículas que respondem por apenas 3,96% do total de matrículas da rede municipal em 2007
Fonte: Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis.
Desde a criação do PROMURJ, com a publicação da Resolução de nº 1.411 de 1987,
já foram municipalizadas 1.407 UEs em todo o Estado do Rio de Janeiro (Anexo B), sendo
que, deste total, 464 foram desativadas posteriormente e 943 ainda estão ativas. O grande
número de UEs desativadas, 464, representa 32, 9 % sobre o total de UEs que foram
transferidas para os governos municipais, o que demonstra que, mesmo para as
administrações municipais mais próximas às UEs, não foi interessante manter estas unidades
em funcionamento.
104
De acordo com a Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, as
escolas desativadas tinham estrutura muito precária e/ou número reduzido de alunos, sendo
“mais racional” oferecer transporte gratuito para os alunos até uma unidade próxima. Este
tipo de prática administrativa é compatível com a filosofia implantada de racionalização dos
recursos, “em nome da eficiência e da democratização da administração pública”43.
O grande número de UEs que deixaram de estar subordinadas à Secretaria de Estado
de Educação e passaram para as administrações municipais, é um dos fatores principais na
justificativa de otimização dos recursos, por meio da descentralização administrativa que é
proposta pelas políticas de municipalização. Esta transferência de UEs é também justificada
como uma das etapas da reestruturação das redes públicas, de forma a permitir que os poderes
públicos possam atender com mais qualidade, as suas atribuições legais no que diz respeito à
educação básica.
Muito provavelmente, outros programas para a educação básica, envolvendo diferentes
entes da federação, em regime de colaboração, devem surgir para dar continuidade ou não, ao
atual modelo de gestão da educação pública. As constantes e aceleradas transformações
ocorridas na sociedade se refletem na educação e não apenas nela, mas em toda a burocracia
administrativa estatal.
Nesse sentido, o planejamento das políticas públicas para a educação deve considerar
que o modelo de administração precisa estar sempre sendo questionado e revisto, para atender
as novas demandas da sociedade.
A importância da educação vai muito além do modelo de gestão administrativa e do
ente público a que a Lei delega competências e deveres, mas eles são peças fundamentais para
a definição da educação que a sociedade quer, e os objetivos que se esperam dela.
43 Entrevista com a Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, realizada em 10 de abril de 2007.
105
5 - AVANÇOS E RECUOS NO PROCESSO DE MUNICIPALIZAÇÃO
O período, objeto de análise, neste estudo, está delimitado entre os anos de dezembro de 1987
até maio de 2007, abrangendo quase duas décadas. Tomou-se como ponto de partida a data de
criação do Programa de Municipalização do Ensino de 1º Grau do Estado do Rio de Janeiro –
PROMURJ, estabelecido em dezembro de 1987.
Ao ser criado, o PROMURJ tinha como embasamento legal a Lei nº 5692/71, que,
em seu artigo 58, parágrafo único, estabelecia competências para cada um dos entes da
federação considerados sistemas de ensino: União, Estados e Distrito Federal e, ainda, referia-
se à possibilidade de delegação de incumbências aos Municípios. A referida Lei, por sua vez,
atendia aos princípios estabelecidos pelo artigo 15 da Constituição de 1967.
No início de 1988, ano seguinte ao da criação do PROMURJ, foi assinado o primeiro
convênio de municipalização no Estado do Rio de Janeiro, pelo qual o governo estadual
transferia para as administrações de várias prefeituras um grande número de UEs.
Passadas quase duas décadas da data de publicação da Resolução nº 1.411 da SEE/RJ,
que deu início oficial às políticas de municipalização no Estado do Rio de Janeiro, são
muitas as considerações a serem feitas, bem como os avanços e recuos apontados, quer de
ordem administrativa, quer de ordem política.
Ao longo dos capítulos anteriores, diferentes argumentos foram expostos no que se
refere às políticas públicas descentralizadoras que deram origem à municipalização. Nesse
sentido, para ilustrar melhor a evolução da municipalização no Estado do Rio de Janeiro e no
Município de Petrópolis, recorreu-se aos dados quantitativos do Censo Escolar realizado
anualmente pelo INEP, dados do IBGE e das próprias Secretarias de Educação, além das
determinações contidas nas leis que direcionaram o processo de municipalização verificado
durante o período que sucedeu à criação do PROMURJ.
106
Com base nestes dados contata-se que os municípios aumentaram a sua participação
na educação básica, notadamente no ensino fundamental, quer em termos percentuais, quer
em termos nominais. Especificamente, os dados demonstram o aumento sobre o total de
matrículas verificadas no ensino fundamental, seja para todo o Estado do Rio de Janeiro, seja
para o município de Petrópolis.
No quadro 11, a seguir, visualiza-se o crescimento do total de matrículas existentes
no ensino fundamental regular, nas redes municipais do Estado do Rio de Janeiro entre os
anos de 1999 e 2006.
QUADRO – 11 – EVOLUÇÃO COMPARATIVA DAS MATRÍCULAS DO ENSINO FUNDAMENTAL REGULAR PRESENCIAL, ENTRE AS REDES ESTADUAL E MUNICIPAIS PARA TODO O ESTADO DO RIO DE JANEIRO NO PERÍODO ENTRE 1999 E 2006.
Ano
Nº matrículas E.F. regular municipal
% de crescimento
ao ano
Nº matrículas E.F. regular estadual
% de crescimento
ao ano
Total do nº de matrículas estado + municípios
% de crescimento
ao ano
1999 1.303.228 -------- 676.980 -------- 1.980.208 ------ 2000 1.334.163 2,37 % 666.327 - 1,58 % 2.000.490 1,02% 2001 1.358.549 1,82 % 641.871 -3,68 % 2.000.420 - 0,01% 2002 1.368.209 0,71 % 633.773 -1,27 % 2.001.982 0,7% 2003 1.386.301 1,32 % 599.002 -5,49 % 1.985.303 -0,9% 2004 1.415.810 2,12, % 576.083 -3,83 % 1.991.893 0,3% 2005 1.450.973 2,48 % 542.380 -5,86 % 1.993.353 0,7% 2006 1.448.184 - 0,2 % 515.661 -4,93 % 1.963.845 -1.5% Totais + 144.956 11,12 % - 161.319 -23,83 % -16.363 - 0,83 % Fonte: INEP – Censo Escolar 2006. Observação: Os dados são referentes apenas ao ensino fundamental regular presencial, não sendo computadas outras modalidades.
Os percentuais de crescimento do total de matrículas para o ensino fundamental
regular no Estado do Rio de Janeiro, apresentam uma oscilação anual, ora com acréscimos e
ora com redução do número de matrículas, não havendo um crescimento linear e constante
ano após ano. Para a Presidente da UNDIME/RJ, as oscilações na oferta de emprego têm
reflexos no número de alunos matriculados, principalmente em cursos noturnos, uma vez que,
ao ingressarem no mercado de trabalho, é comum que alunos jovens ou adultos acabem por
abandonar a escola, ainda que temporariamente. Contrariamente às expectativas de
crescimento constante do número de matrículas, o que se verifica pelo quadro 11, é que o
107
número total de matrículas estaduais e municipais entre 1999 e 2006, apresenta um pequeno
decréscimo de 0,83% o que representa uma redução de 16.363 matrículas no ensino
fundamental regular para este período de oito anos. Cabe ressaltar que a redução demonstrada
no quadro 11 se refere apenas ao ensino fundamental regular44.
De acordo com os números do quadro 11, pode-se verificar que os municípios
aumentaram a sua participação sobre o total de matrículas do ensino fundamental regular,
tanto em valores nominais quanto em valores percentuais. Observa-se ainda que a rede
estadual para esta etapa e modalidade de ensino teve redução de 161.319 matrículas no
período analisado, o que representa uma diminuição de 23,83%, Em contrapartida, há um
acréscimo verificado nas matrículas sob administração municipal, com um aumento numérico
de 144.956 alunos, o que representa um crescimento de 11,12% para o mesmo período.
Todavia trata-se de um desempenho modesto que reflete a lentidão com que o Estado se retira
do ensino fundamental regular e passa aos municípios a responsabilidade pela oferta desta
etapa da educação básica. Por outro lado, também denota as dificuldades encontradas pelos
sistemas de ensino estadual e municipais para estabelecerem um regime de colaboração que
possa acelerar o processo.
Ainda assim, a leitura do quadro 11, mostra que ao longo do período compreendido
entre os anos de 1999 e 2006, as matrículas nas redes municipais avançaram de 65,82% para
72,75% em oposição ao recuo das matrículas estaduais que, neste mesmo intervalo de tempo,
decresceram de 34,18% em 1999 para 27,25% no ano de 2006.
O gráfico 09, a seguir, demonstra a evolução da municipalização do ensino
fundamental regular no Estado do Rio de Janeiro, através da distribuição das matrículas
estaduais e municipais, e a participação de cada instância administrativa em termos
percentuais para o período compreendido entre 1999 e 2006, analisado no quadro 11.
44 A redução de 16.363 matrículas no ensino fundamental regular, nas redes públicas estadual e municipais deve-se um conjunto de variáveis: queda nas taxas do crescimento demográfico; a migração de alunos para o ensino não regular e o registro equivocado das matrículas por parte destas redes públicas.
108
GRÁFICO 09 - EVOLUÇÃO DA MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
34,18
33,3
32,08
31,65
30,17
28,92
27,2
27,25
66,7
67,92
68,35
69,83
71,08
72,8
72,75
65,82
0
20
40
60
80
100
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
%
municipio
estado
Fonte: Censo Escolar INEP- 2006
Com base na interpretação dos números do quadro 11 e do gráfico 09 percebe-se que
houve um avanço do poder municipal, ou da municipalização do ensino fundamental, mas de
forma lenta e gradual, e verificado somente para a modalidade regular desta etapa da
educação básica.
Os números também indicam que a municipalização ultrapassa o mero repasse de UEs
de ensino fundamental entre o poder estadual e o poder municipal. Ambas as esferas
administrativas têm criado novas modalidades de ensino, convertendo-se em estratégia para
atender a demanda. A dinâmica demográfica e outros fatores de ordens diversas, que já foram
objeto de considerações, pressionam por um redimensionamento das redes de educação
básica, no que diz respeito às modalidades e turnos oferecidos quer pelo Estado, quer pelos
municípios.
Na comparação entre os dados do quadro 11 e do quadro 12, exposto, a seguir,
verifica-se que, de fato, a municipalização avançou no ensino fundamental regular, embora
em um ritmo muito lento cuja taxa média foi de cerca de 1,5% ao ano para o período 1999-
2006. Entretanto, no ensino fundamental não regular, o avanço das redes municipais foi
muito mais significativo em termos percentuais, 328,18 % para o período analisado, o que
109
significa uma taxa média anual de crescimento de cerca de 47% ao ano, e, portanto, muito
superior à taxa de expansão verificada para ensino fundamental regular no mesmo período.
No quadro 12, a seguir, constata-se o crescimento acelerado das modalidades não
regulares do ensino fundamental:
QUADRO – 12 EVOLUÇÃO COMPARATIVA DO ENSINO FUNDAMENTAL NÃO REGULAR (EJA/ SUPLETIVO/ PRESENCIAL/ NÃO PRESENCIAL) ENTRE AS REDES MUNICIPAIS E ESTADUAL, NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO NO PERÍODO 1999 – 2006.
Ano
Nº matrículas E.F. não regular municipal
% de crescimento ao
ano
Nº matrículas E.F. não regular estadual
% de crescimento ao
ano
Total do nº de matrículas do
E.F. não regular estado + municípios
(RJ) 1999 30.123 -------- 179.395 ------- 209.518
2000 43.012 42,7% 144.218 -19,61%
2001 51.995 20,88% 112.681 - 21,87%
2002 67.528 29,87% 185.147 64,3%
2003 78.800 16,6% 204.259 10,32%
2004 95.183 20,7% 138.472 -31,86%
2005 97.716 2,66% 203.233 46,76%
2006 98.859 1,16% 198.688 - 2,24% 297.547
Total +68.736 328,18% +19.293 10,75% +88.029
Fonte: INEP –Censo Escolar anos de 1999 – 2006.
Com base nos dados dos quadros 11 e 12, conclui-se que os municípios avançam
anualmente de forma gradual, quer em termos nominais quer em percentuais, sobre o total de
matrículas do ensino fundamental nas modalidades regular e não regular, no Estado do Rio de
Janeiro. O que ocorre é que o número de matrículas efetuadas no ensino fundamental das
escolas estaduais também vem apresentando crescimento numérico, porém em taxas inferiores
às verificadas nas redes municipais. Esta diferença entre as taxas de crescimento da rede
estadual e das redes municipais contribui para que a participação dos municípios aumente em
110
termos percentuais sobre o total de matrículas do ensino fundamental, para todas as
modalidades.
Com relação ao ensino fundamental não regular exposto no quadro 12, fica
demonstrado que as matrículas das redes municipais cresceram 328,18% e as da rede estadual
apenas 10,75% para o mesmo período. Apesar disso, deve-se considerar o fato de que o
ensino fundamental não regular sob administração do Estado, ainda é o dobro em termos
numéricos, que a soma de todas as redes municipais.
Quando se faz a análise dos números cabe lembrar, ainda, que, na cidade do Rio de
Janeiro, capital do Estado, todo o ensino fundamental já se encontra municipalizado há muito
tempo, e este município responde sozinho por mais de 40% da população total do Estado.
Caso fosse feita a análise do percentual de municipalização do ensino fundamental no Estado
do Rio de Janeiro, excluindo a extensa rede municipal da capital, chegaria-se-ia a números
muito mais modestos em relação aos objetivos do PROMURJ.
Ao enfocar os avanços e recuos no processo de municipalização, cabe rever as
determinações contidas na Lei nº 5692/71, na LDBEN nº 9394/96 e na CF de 1988. A
legislação brasileira, segundo os autores já citados, não é objetiva ao delegar competências,
especialmente, no que se refere ao ensino fundamental. A CF de 1988 afirma a atuação
“prioritária” no ensino fundamental para os municípios, mas não exclusiva, e deixa para os
estados o ensino fundamental “supletivamente” e o ensino médio “prioritariamente”. Na
LDBEN nº 9394/96, o artigo 11 diz que o ensino fundamental será “prioritariamente”
oferecido pelos municípios, sendo permitido aos mesmos atuar nos outros níveis de ensino,
quando já estiverem plenamente atendidas as necessidades de sua área de competência, com
os percentuais de recursos acima dos vinculados na Constituição Federal. Para os estados a
LDBEN nº 9394/96, no artigo 10, determina um “regime de colaboração com os municípios”
e fala em “distribuição proporcional das responsabilidades”, mas deixa lacunas para
interpretações relativas à forma como seriam realizadas essas recomendações legais.
111
Além disso, para se cumprir as determinações oriundas da legislação é necessário um
grande esforço político e administrativo, de todas as esferas do poder público federal,
estadual e municipal. De acordo com Rezende (1998), não se pode falar em descentralização e
transferência de encargos sem se realizar uma reforma tributária que torne os municípios
capazes de arcar com os custos decorrentes de um acréscimo considerável no número de
matrículas nas redes municipais de ensino fundamental. Para esse autor, as tentativas mais
ousadas de reforma tributária, ao longo da história, esbarraram em intrincados interesses
políticos e impediram o avanço na modernização do federalismo brasileiro, que contemplaria
com maior autonomia cada um dos entes da federação.
A alternativa à reforma tributária eficaz – que não foi realizada – fez-se através da
criação de fundos de participação e capacidade redistributiva. Para tornar viável o custeio da
educação municipal, foi criado o FUNDEF, posteriormente substituído pelo FUNDEB, que é
mais abrangente em relação às modalidades e etapas da educação básica. Porém para a
Presidente da UNDIME/RJ, as mudanças introduzidas com o FUNDEB não representaram
nenhum avanço. Ao fazer tal afirmação, a entrevistada45 argumentou que este novo fundo só
fez o rateio de uma verba que já existia, prevista no artigo 211, da Constituição de 1988 e
concluiu, afirmando que a modificação se deu apenas na abrangência das etapas e
modalidades da educação básica. Todavia ambos são fundos de redistribuição de verbas com
a participação dos governos federal, estadual e dos municípios, no intuito de financiar os
sistemas de ensino. A Presidente da UNDIME/RJ acrescentou que o critério de distribuição
dessas verbas, continua sendo calculado sobre o número de alunos matriculados nas
respectivas redes, obedecendo aos requisitos que a lei determina, sobre etapas e modalidades
de ensino a serem contempladas com os recursos de cada um desses fundos, tornando as
referidas verbas objeto de disputas políticas entre os estados e os municípios. Reiterando a
afirmação feita pela presidente da UNDIME/RJ, Ribeiro que cita a competição por matrículas
112
entre os poderes estadual e municipais no Estado de Mato Grosso (2004) como forma de ser
contemplados com verbas do FUNDEF. De acordo com Davies (2007) houve registro
equivocado de matrículas, em turmas noturnas onde a maioria dos alunos é de adultos, mas
que foram registrados como ensino fundamental regular de forma que tivessem direito as
verbas do FUNDEF. Ainda sob a ótica de Davies, é preciso ter “cautela” ao se analisar os
números relativos ao ensino fundamental regular e não regular, pois só as turmas regulares
entravam na partilha das verbas do FUNDEF.
Numa tentativa de ordenar o processo de municipalização, regulamentar e disciplinar
a subjetividade da legislação existente, um novo dispositivo legal entrou em vigor em 28 de
março de 2005, no Estado do Rio de Janeiro, quando a Assembléia Legislativa aprovou a Lei
Estadual nº 4528/2005. Essa lei estabeleceu as diretrizes para a organização do Sistema de
Ensino do Estado do Rio de Janeiro e, em seus artigos 61 e 62, determinou regras para o
processo de municipalização das UEs estaduais.
De acordo com o artigo 61 da Lei nº 4528/2005, o Estado deverá no prazo de três
anos a contar da data de publicação, cessar a oferta de educação infantil. Atualmente, há
vários municípios no Estado do Rio de Janeiro, nos quais o poder público estadual através
das UEs subordinadas à SEEDUC-E, já não mais oferece a educação infantil. De acordo com
as informações obtidas em órgãos da SEEDUC-E, a determinação legal foi acatada, conforme
se verifica em Petrópolis, onde as UEs estaduais encerraram em 2007 as matrículas para a
educação infantil.
Ao se cumprir o que determina o artigo 61 da Lei Estadual nº 4528/2005, pode-se
deduzir que para o ano letivo de 2008, a educação infantil pública no Estado do Rio de
Janeiro só será oferecida gratuitamente pelo poder público municipal, salvo as exceções a que
já foram feitas referências nos capítulos anteriores sobre instituições federal, estadual e
municipais.
45 Entrevista realizada com a Presidente da UNDIME/RJ, realizada em 08 de novembro de 2007.
113
Já o artigo 62 da Lei nº 4528/2005 determinou um prazo de dez anos, a contar da data
de publicação, para que o Estado suspenda a oferta do ensino fundamental nas séries iniciais,
ou seja até o 5º ano de escolaridade, desta etapa da educação básica.
Quando o Projeto de Lei foi enviado para a sanção da então Governadora Rosinha
Matheus, a mesma vetou os dois artigos anteriormente citados, numa demonstração de não
concordar com os prazos estabelecidos, e/ou com a determinação de exclusividade de apenas
os municípios oferecerem a educação infantil. Entretanto o veto da governadora foi derrubado
pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e, conseqüentemente, os artigos
entraram em vigor.
Os artigos 61 e 62 da Lei Estadual nº 4528/2005, ao determinarem a retirada do Estado
da oferta da educação infantil e do ensino fundamental até o 5º ano de escolaridade, deixam
este encargo para os municípios, restando ao regime de colaboração previsto na lei, entre o
governo estadual e as prefeituras, a oferta do ensino fundamental do 6º ao 9º ano de
escolaridade. Portanto, a Lei Estadual nº 4528/2005 procurou definir no âmbito do Estado, as
indefinições de competências contidas na CF de 1988 e na LDBEN nº 9394/96.
O que parecia ser o resultado decorrente de um longo caminho em busca da
descentralização e da municipalização do ensino fundamental, encontrou diversos obstáculos
para a sua realização com desdobramentos políticos, especialmente, no âmbito estadual.
A se cumprir o que determina a Lei Estadual nº 4528/2005, a SEEDUC-E não deverá
mais realizar concursos públicos para contratar professores Docente II, uma vez que os
mesmos estão habilitados somente para trabalhar em turmas de educação infantil e das séries
iniciais do ensino fundamental.
Contudo, em 29 de maio de 2007, o deputado estadual Alessandro Molon, deu entrada
na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro no Projeto de Lei de nº 483/2007, em
que pede a revogação dos artigos 61 e 62 da Lei Estadual nº 4528/2005.
114
Para justificar o seu Projeto de Lei, o referido deputado faz algumas considerações: a
primeira é a grande desigualdade econômica existente entre os municípios do Estado do Rio
de Janeiro. Para o deputado este fato impede que alguns municípios possam arcar sozinhos
com os custos de toda a educação infantil e do 1º segmento do ensino fundamental. Em uma
segunda consideração, o deputado Alessandro Molon coloca que, ao atender o que
determinam os artigos 61 e 62 da referida lei e, portanto, ao se retirar da educação infantil e
do 1º segmento do ensino fundamental, a SEEDUC-E não tem realizado concurso público
para preencher as vagas de Docente II, o profissional habilitado para esta etapa da educação
básica. Ainda de acordo com a justificativa do deputado Alessandro Molon, tal prática tem
contribuído para que um grande número de UEs sob administração da SEEDUC-E esteja
com falta de professores habilitados para as turmas referidas.
As justificativas apresentadas pelo deputado Alessandro Molon são veementemente
contestadas pela representante da SEEDUC-E, a Coordenadora de Integração e
Municipalização, que, por sua vez, contra-argumenta dizendo que as vagas de Docente II
estão sendo preenchidas por contratos temporários, tendo em vista que não haveria sentido em
contratar um profissional sob regime estatutário, para um cargo que deve ser extinto por força
dos prazos da Lei Estadual nº 4528/2005. Além disso, segundo os argumentos da SEEDUC-E,
não há turmas sem aulas por falta de professores Docentes II, muito pelo contrário, de acordo
com a Coordenadora de Integração e Municipalização, logo haverá um excesso destes
profissionais, caso sejam cumpridos os prazos e determinações da Lei Estadual nº 4528/2005.
O terceiro argumento usado pelo deputado Alessandro Molon a favor de seu Projeto
de Lei, é de ordem constitucional, citando o artigo 211 da Constituição Federal de 1988 que
estabelece que os Estados e o Distrito Federal atuarão “prioritariamente” no ensino
fundamental e médio. Ainda na defesa de seu Projeto de Lei, o deputado propõe que o Estado
continue supletivamente a oferecer a educação infantil, e também o 1º segmento do ensino
115
fundamental nos municípios que não possam custear na íntegra estas etapas da educação
básica.
O Projeto de Lei nº 483/2007 pode significar um recuo no longo caminho percorrido
pela municipalização no Estado do Rio de Janeiro, desde a criação do PROMURJ até aos dias
atuais. Todavia, por outro lado, demonstra que os parlamentares estão acompanhando as
políticas educacionais implementadas pelo poder executivo, apresentando projetos de lei
consonantes com os limites e possibilidades da educação no Estado do Rio de Janeiro.
Caso o Projeto de Lei nº 483/2007 não seja aprovado, pode-se esperar que, por força
da Lei 4528/2005, os entes envolvidos na questão, Estado e municípios se esforcem para
chegar a uma solução que atenda aos interesses tanto dos governos, quanto da população
fluminense. Numa situação contrária, ou seja, se aprovada a revogação dos artigos 61 e 62
da Lei Estadual nº 4528/2005, o texto legal continuará a servir de instrumento jurídico para
que administradores públicos, quer o governador, quer os prefeitos, possam se valer da
indefinição das atribuições para imputar a outras instâncias o atendimento das etapas da
educação básica.
Voltando a um dos principais argumentos usados pelo deputado Alessandro Molon,
para justificar o seu Projeto de Lei nº 483/2007, sobre a incapacidade financeira de alguns
municípios de custear toda a educação infantil e o 1º segmento do ensino fundamental e,
confrontando-o com as municipalizações já realizadas, verifica-se que não há uma lógica que
siga critérios estritamente econômicos para justificar esta situação.
Os dados fornecidos pela SEEDUC-E sobre as UEs municipalizadas, quando
comparados com dados sobre população, situação econômica46 e arrecadação tributária dos
municípios 47 mostram que a municipalização ocorre independente da condição econômica do
município. Para fazer tal afirmação procedeu-se o confronto entre o número de UEs
116
municipalizadas e a receita per capita e o pib per capita de alguns municípios, chegando-se à
conclusão que não há necessariamente uma relação direta entre ambas.
O quadro 13, a seguir, mostra o percentual de UEs municipais, estaduais e privadas de
municípios de diferentes regiões do Estado do Rio de Janeiro, que confrontado com os dados
dos quadros 14 e 15, demonstra que não há uma relação direta entre a situação econômica e a
participação das prefeituras no ensino fundamental.
Quadro 13 – Distribuição percentual das unidades escolares no ensino fundamental entre as redes públicas e a rede privada em alguns municípios do Estado do Rio de Janeiro.
Redes Públicas Rede privada Município Estadual % Municipal %
Receita Per Capita anual dos
municípios em R$ * Petrópolis 7,4 65,9 26,7 1100,00 Porciúncula 20,0 70,0 10,0 1571,00 Natividade 17,64 70,6 11,76 1547,00 Bom Jesus do Itabapoama 28,57 52,39 19,04 929,00 Niterói 27,32 17,56 55,12 1473,00 São Gonçalo 30,2 21,38 48,42 326,00 Nova Iguaçu 29,41 33,92 36,67 550,00 *Fonte IBAM - MF/STN Fonte: IBGE – INEP 2006
Quadro 14 – Distribuição percentual das matrículas no ensino fundamental entre as redes públicas e a rede privada em alguns municípios do Estado do Rio de Janeiro.
Redes Públicas Município Estadual % Municipal %
Rede privada %
Petrópolis 9,97 77,91 12,12 Porciúncula 44,67 46,09 9,24 Natividade 34,19 57,21 8,60 Bom Jesus do Itabapoama 49,50 36,59 13,91 Niterói 42,32 24,66 33,02 São Gonçalo 41,85 33,54 24,61 Nova Iguaçu 40,51 41,85 17,64 Fonte: IBGE – INEP 2006
Nos quadros 13 e 14, observa-se que alguns municípios apresentam receita per capita
alta, não obstante o grau de municipalização do ensino fundamental ser reduzido, como é o
caso do município de Niterói, com elevada arrecadação per capita, mas que apresenta um
índice de participação no número de UEs e nas matrículas sob administração municipal de
17,56% e 24,66% respectivamente.
46 Censo Econômico – IBGE
117
Algumas outras considerações devem ser feitas para explicitar o que se pretende
demonstrar com os dados contidos nos quadros 13, 14 e 15. Apenas o número de UEs não
traduz por si só o grau de participação dos municípios na oferta do ensino fundamental. Para
tal demonstração é mais eficaz o número de matrículas, pois uma UE pode ter um número
bastante variável de alunos.
Como forma de tornar mais evidente uma possível distorção no coeficiente de
municipalização do ensino fundamental, nos quadros 13 e 14, procede-se o confronto entre
estas duas metodologias: a do percentual de UEs versus o percentual de matrículas, tendo
como base a esfera administrativa de cada uma delas: estado, município ou iniciativa privada.
Ao se observar apenas os dados contidos na tabela de UEs municipalizadas,
fornecida pela Coordenadoria de Municipalização e Integração da SEEDUC-E48, conclui-se
que são os municípios menores, no interior do Estado, os que tiveram maior participação no
processo de municipalização entre 1988 e maio de 2007.
Na Coordenadoria Regional do Noroeste Fluminense I, que engloba quatro pequenos
municípios: Bom Jesus do Itabapoama, Natividade, Porciúncula e Varre-Sai, o número de
UEs municipalizadas chega a 158, o maior entre todas as Coordenadorias Regionais do
Estado do Rio de Janeiro. Se somadas as populações desses quatro municípios não totalizam
100.000 habitantes (ver quadro 15). Fato semelhante também ocorreu na Coordenadoria
Regional do Noroeste Fluminense II, na qual houve um número elevado de UEs
municipalizadas, 156. Portanto, apenas nessas duas Coordenadorias citadas, foram
municipalizadas mais de 300 UEs.
Contudo apenas o número de UEs municipalizadas não significa, obrigatoriamente,
um grande número de matrículas transferidas para as administrações municipais, uma vez
que, na maioria dos casos, tratam-se de UEs localizadas em áreas rurais e com reduzido
número de alunos.
47 Ministério da Fazenda – Secretaria do Tesouro Nacional – 2006.
118
De acordo com a fala da Presidente da UNDIME/RJ, o elevado número de UEs
municipalizadas nestas coordenadorias, localizadas no Noroeste Fluminense, resulta do
entendimento político entre o governo estadual e as prefeituras destas regiões. Ainda na
intenção de esclarecer o motivo de tão elevado número de UEs municipalizadas, a Presidente
da UNDIME/RJ alegou o fato de ser esta região, a base eleitoral do governo estadual que
estava no poder no período da municipalização das referidas UEs.
Os números apresentados pelos quadros 13, 14 e 15 também se contrapõem ao
argumento usado pelo deputado Alessandro Molon, na justificativa de seu Projeto de Lei nº
483/2007, quando relaciona a capacidade financeira dos municípios com a possibilidade de
oferecerem com exclusividade a educação infantil e o 1º segmento do ensino fundamental.
Partindo da premissa de que a fragilidade financeira dos municípios é o principal
empecilho para estas prefeituras custearem integralmente as despesas resultantes da oferta da
educação infantil e do 1º segmento do ensino fundamental, é contraditório o fato de que o
grande número de UEs municipalizadas localiza-se nos menores municípios do interior do
Estado. Ainda contrariando o argumento de incapacidade tributária dos pequenos municípios,
o que se constata nas várias Coordenadorias Metropolitanas, responsáveis pela administração
do ensino estadual nos municípios de maior contingente populacional e com um PIB per
capita, quase sempre, superior aos municípios citados do Noroeste Fluminense, é que o
número de UEs municipalizadas é extremamente reduzido.
No entanto os custos da educação apresentam uma significativa variação de um
município para outro, uma vez que há uma grande diferença entre os itens que incidem neste
cálculo: salários de professores, do pessoal de apoio e administrativo, transporte escolar,
estrutura e manutenção das escolas, entre outros.
O quadro 15, a seguir, demonstra a disparidade existente entre o quantitativo de UEs
municipalizadas nas coordenadorias do interior e nas da região metropolitana, da mesma
48 Ver Anexo B e quadro 15 da página 119.
119
forma, que é bastante díspare o quantitativo populacional e, em alguns casos, também, o
econômico.
QUADRO 15 - DADOS COMPARATIVOS ENTRE O TOTAL DE UEs MUNICIPALIZADAS POR COORDENADORIA REGIONAL COM A RENDA PER CAPITA E A POPULAÇÃO DOS MUNICÍPIOS.
Coordenadoria Municípios População (nºde habitantes)
Pib per capita Em r$ anuais
Total de UES municipalizadas
Varre-Sai 8.322 5.453
Natividade 14.925 5.275
Bom Jesus do Itabapoama
33.834 5.857
Noroeste Fluminense I
Porciúncula
17.191 8.093
158
Nova Iguaçu 830.672 5.695
Nilópolis 152.223 5.070
Mesquita 182.495 3.988
Metropolitana I
Queimados 130.275 6.805
13
Metropolitana II São Gonçalo 960.631 5.481 10
Metropolitana V Duque de Caxias 842.686 21.615 21
Metropolitana VII Belford Roxo 480.555 6.083 5
Metropolitana VIII Niterói 474.002 12.369 6
Fonte: Coordenadoria de Municipalização e Integração – SEEDUC-E - maio de 2007 e IBGE estatística 2007. * OBS - As coordenadorias metropolitanas acima citadas são as do entorno do Município do Rio de Janeiro, área mais populosa. As coordenadorias metropolitanas não citadas se localizam dentro do próprio município do Rio de Janeiro.
Pelos dados do quadro 15, verifica-se que municípios maiores apresentam um baixo
número de UEs municipalizadas, mesmo aqueles com bons indicadores econômicos. Em
contrapartida, municípios pequenos apresentam um grande número de UEs municipalizadas.
Os municípios da região metropolitana, citados no quadro 13, representam, se
somados, um contingente populacional maior do que todo o interior do Estado do Rio de
Janeiro. Entretanto o número de UEs municipalizadas é insignificante se levarmos em
consideração que alguns desses municípios tem população próxima a um milhão de
habitantes, como é o caso de São Gonçalo e Duque de Caxias.
120
Utilizando-se apenas a questão econômica e desconsiderando-se o número de
habitantes como critério de viabilidade técnica para se proceder à municipalização, constata-
se, no município de Niterói, um exemplo que contraria este argumento.
Ao se observar os dados do quadro 15, vê-se que, em municípios do Noroeste
Fluminense, cuja renda per capita está abaixo da média de R$ 6.000 anuais, este fator não se
tornou um impedimento para assumirem um grande número de UEs repassadas da
administração estadual. Neste caso, há um total 158 UEs municipalizadas na Coordenadoria
Regional Noroeste Fluminense I. Ressalvando-se que os dados informados pela SEEDUC-E
não fornecem o total isolado por municípios a não ser nos casos em que só exista um único
município por coordenadoria.
A Coordenadoria Regional Metropolitana V abrange somente o Município de Duque
de Caxias com grande população, e uma renda per capita quase quatro vezes maior que os
referidos municípios do Noroeste Fluminense. No entanto, nesta Coordenadoria, somente 21
UEs foram municipalizadas. O município de Niterói cuja renda é o dobro dos municípios do
interior referidos, apenas 6 UEs foram municipalizadas. Portanto não se pode atribuir apenas
ao aspecto econômico o principal impedimento para que os municípios possam assumir
integralmente as despesas com a educação infantil e com o 1º segmento do ensino
fundamental.
Sabe-se que dados quantitativos e estatísticos não são suficientes para se chegar a
conclusões absolutas, e que apenas os números de UEs municipalizadas não traduzem toda a
realidade do processo de municipalização. O tamanho das UEs, o número de alunos
matriculados em cada UE, a estrutura física destas, as séries que oferecem, as etapas, as
modalidades, o número de professores, entre muitas outras observações, precisam ser levadas
em consideração para se entender a municipalização e suas peculiaridades.
Entretanto a partir das verificações e análises realizadas neste estudo, é possível
afirmar que a adesão ao PROMURJ é muito mais um fato de natureza política do que um
121
mero aspecto de viabilidade técnica e econômica. Os entraves de natureza técnica podem ser
superados desde que exista vontade e entendimento político. Ajustes na legislação dependem
de acordos políticos, mas deveriam considerar os pareceres técnicos de quem está diretamente
envolvido neste tema. Cabe aos órgãos responsáveis pela articulação entre Estado e
Municípios tornar mais ágil o processo de municipalização da educação infantil e do ensino
fundamental, fazendo com que a universalização do ensino médio venha a se tornar uma
realidade mais rapidamente.
122
6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
No município de Petrópolis, a adesão ao PROMURJ foi até agora pouco significativa,
em número de UEs municipalizadas, apenas 10 ao longo do período compreendido entre 1998
– quando houve a primeira UE transferida para a administração municipal – até o ano de
2005, quando ocorreu a última municipalização. Se somadas todas as UEs municipalizadas,
em Petrópolis, elas respondem, no ano letivo de 2007 por somente 3,96 % do total de
matrículas, sob a administração municipal, com 2.060 alunos. Porém a administração
municipal é responsável por 77,91% da oferta do ensino fundamental, índice considerado
bastante elevado se comparado com os demais municípios pesquisados no estado.
A atual rede estadual de ensino fundamental sob a administração da SEEDUC-E
localizada em Petrópolis tem 8.92149 alunos, em 20 UEs, o que representa cerca de 10 % de
todos os estudantes desta etapa da educação básica no município. De acordo com a
Coordenadora de Integração e Municipalização da SEEDUC-E, apesar da viabilidade, não há,
no momento, a intenção de se municipalizar mais nenhuma UE em Petrópolis, uma vez que,
os prédios escolares da rede estadual existentes no município são necessários para a
ampliação do ensino médio.
Ao analisar a rede municipal de educação de Petrópolis, chama atenção o grande
número de UEs privadas conveniadas com a prefeitura. São 42 instituições conveniadas, que
totalizam 9.709 alunos, respondendo por 18,68 % das matrículas na rede municipal em 2007.
Dessa forma, observa-se que os convênios com as instituições privadas têm um quantitativo
maior de alunos matriculados no ensino fundamental do que a rede sob a administração da
SEEDUC-E, neste município.
Com estes dados, conclui-se que a adesão ao PROMURJ em Petrópolis tenha sido
modesta, quer pelo número de UEs municipalizadas, quer pelo número total de matrículas
123
resultantes deste processo. Contudo a situação do município em relação à participação da
administração municipal no ensino fundamental está mais adequada ao que prevê a LDBEN
nº 9394/96, quando comparada a municípios maiores ou de maior expressão econômica no
Estado do Rio de Janeiro. Enquanto, no município de Petrópolis, somente cerca de 10 % das
matrículas do ensino fundamental estão em UEs sob administração da SEEDUC-E, no Estado
do Rio de Janeiro este percentual é de cerca de 27 %.
A municipalização do ensino fundamental em Petrópolis não deve ser considerada
como um objetivo distante de ser atingido, nos prazos estabelecidos pela Lei Estadual nº
4528/2005, ou de acordo com o que está proposto pelo PROMURJ. Contudo este objetivo
demanda esforços da administração municipal no sentido de construir novas UEs e/ou ampliar
as que já existem.
Traçando um panorama geral do processo de municipalização do ensino fundamental
em Petrópolis, objeto deste estudo, alguns aspectos devem ser destacados. A proposta de
descentralização da educação básica das redes públicas, tem origem distante, e segundo
estudiosos, sofreu influência de vários fatores externos, bem como estava presente já nos
acordos firmados entre o governo da União e órgãos internacionais de financiamento nas
décadas de 70 e 80.
Posições distintas em relação aos programas de descentralização postos em andamento
no país, dão origem a intensos debates, nos quais um mesmo fato é visto com repercussões
antagônicas. Para alguns teóricos, a municipalização aumenta o grau de autonomia dos
pequenos municípios, enquanto, para outros, com base neste mesmo argumento, ela apenas
transfere o poder de tomada de decisões das oligarquias federal ou estadual para as
municipais.
Assim, como não existe um consenso sobre a eficácia desta transferência de poder por
conta da municipalização, o mesmo ocorre ao se afirmar que há vantagens para o município e
49 Fonte: Coordenadoria Regional Serrana III Junho de 2007.
124
para a comunidade atendida pela rede de educação municipalizada. Na linha de defesa da
autodeterminação, proporcionada via municipalização da educação, caberia às prefeituras
gerir recursos e formular suas próprias propostas pedagógicas. Todavia, outras controvérsias
são flagrantes: como obter autonomia financeira, capacitar pessoal para gestão administrativa
e pedagógica e ainda produzir um projeto pedagógico consoante com as peculiaridades locais.
A dependência de verbas repassadas pelo governo central ou pelos governos estaduais é um,
entre os muitos argumentos, usados tanto para criticar a falta de autonomia reivindicada pelos
municipalistas, como pelos defensores de que o Estado deve ser responsável pela oferta
supletiva do ensino fundamental.
A grande dependência dos pequenos municípios em relação ao repasse de recursos
oriundos de outras instâncias governamentais, torna-se um obstáculo à autonomia defendida
nas propostas de municipalização. Esta dependência interfere, igualmente, quando se propõe
uma solução para a distribuição de competências via regime de colaboração entre os entes,
que, por sua vez, está previsto na legislação. Os fundos de redistribuição de verbas para a
educação e outros mecanismos de financiamento têm procurado minorar estas dependências,
mas os entraves burocráticos, políticos e até partidários continuam prevalecendo em muitos
casos.
Os discursos teóricos para as políticas públicas de municipalização da educação têm
usado palavras de ordem semelhantes: falam de modernização gerencial, eficiência, atribuição
de competências, autodeterminação, entre outros. Tais termos são constantemente evocados
como pressupostos prioritários para a construção de uma sociedade moderna, livre e
democrática. Não obstante a vulgarização que acaba por ocorrer na utilização dos mesmos
termos repetidamente sem que sejam acompanhados de ações concretas, o discurso reiterado é
necessário, para que, a partir do debate possa se vislumbrar alternativas e possibilidades
concretas, para se alcançar o objetivo comum: a melhoria das condições de ensino oferecidas
à população.
125
O discurso favorável à descentralização vem, desde muito, carregado de teorias
econômico-instrumentais, mas nem por isso é desprovido de teor político e, tampouco, a sua
prática. Mesmo a alternativa comumente aventada do estabelecimento de um regime de
colaboração entre os entes da federação somente pode ser concretizada a partir de acordos
políticos, que deverão ser viabilizados de forma semelhante aos processos de municipalização
de UEs. Portanto a política é condição indispensável em qualquer projeto de distribuição de
competências para a educação entre os entes federados.
Em síntese, o estudo revela com relação aos processos de municipalização, que as
determinações contidas em acordos internacionais, tiveram seus reflexos na legislação, como
foi o caso do artigo 58 da Lei 5692/71, que determinava uma maior participação dos
municípios no ensino fundamental. A idéia de se descentralizar a educação, inicialmente
presente nas políticas da União, chegou aos estados e serviu de inspiração aos programas
governamentais de colaboração entre estado e municípios. Programas de municipalização,
entre eles o Pró- Município e o PROMURJ foram e são exemplos das políticas de
descentralização postas em prática no Estado do Rio de Janeiro. No decorrer de um novo
processo político, posto em curso com a redemocratização da sociedade brasileira, as
propostas deixaram de ser oriundas apenas do Poder Executivo, na forma de uma imposição e
passaram a ser discutidas e incorporadas pelo Poder Legislativo, tomando a forma de projetos
de leis que modificam o ordenamento jurídico vigente. Ainda por conta da retomada do
processo democrático, as decisões deixaram de estar centralizadas no âmbito do governo
federal, e os estados passaram a legislar em termos de diretrizes para a educação, dentro do
que lhe é permitido pela CF de 1988.
Nesse sentido, a Lei Estadual nº 4528/2005, que institui o sistema de ensino do
Estado do Rio de Janeiro, pode ser vista como um marco na definição das competências entre
Estado e municípios fluminenses. No entanto, não basta a determinação da Lei, é preciso que
126
a municipalização ou o regime de colaboração entre os entes seja uma determinação de todos
os envolvidos, especialmente, os governantes e a comunidade educacional.
As competências oriundas da CF de 1988 e da LDBEN nº 9394/96, ao atribuírem aos
estados e municípios a responsabilidade pela oferta do ensino fundamental, ainda que com
ressalvas de “prioritariamente” ou “supletivamente”, são motivo de interpretações díspares,
deixando lacunas que podem ser preenchidas de acordo com a conveniência ou o momento
político. Além disso, a questão semântica das palavras utilizadas no texto da legislação como
assegurar, oferecer, priorizar, entre outras, refletem as dissonâncias políticas existentes já na
elaboração da Lei no que se refere à municipalização e a possibilidade de estabelecimento de
regimes de colaboração.
A mudança na legislação do Estado – Lei Estadual nº 4528/2005 –, ainda que ocorra,
não garantirá, por si só, que o Estado se faça mais presente nas primeiras etapas da educação
básica, sem prejuízo do atendimento ao ensino médio e que os municípios possam atender a
toda a demanda da educação infantil e do ensino fundamental, mesmo auxiliados pelo Estado.
O que se percebe é a necessidade, cada vez maior, do regime de colaboração, mesmo para
encaminhar os processos de municipalização.
Os dados quantitativos, trazidos ao longo deste estudo, reforçam a idéia de que não há
um único critério ou argumento, para se afirmar onde cabe a municipalização e para quem ela
é mais ou menos vantajosa: estados ou municípios, pois a singularidade de cada caso de
municipalização demonstra as inúmeras variáveis que interferem neste processo.
No presente estudo, coube abordar o levantamento acerca dos aspectos qualitativos e
quantitativos, bem como os aspectos políticos que surgem como variáveis para a
municipalização. A continuidade deste estudo e de outras pesquisas sobre o mesmo tema,
devem necessariamente, enfocar as implicações do financiamento da educação nestes
processos de municipalização da educação. Portanto outras pesquisas podem partir dos dados
127
já levantados para complementar a investigação realizada, trazendo mais dados para elucidar
o cenário das políticas públicas para a educação no Estado do Rio de Janeiro.
128
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ANEXOS
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