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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – UFRGSESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA – ESEFLICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA
EDUARDO GOTTEMS PERGHER
A HEGEMONIA DO ESPORTE NA ESCOLA
Porto Alegre
2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – UFRGSESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA – ESEFLICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA
Eduardo Gottems Pergher
A HEGEMONIA DO ESPORTE NA ESCOLA
Trabalho de conclusão de curso apresentado como exigência final para obtenção da titulação de licenciado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Vicente Molina NetoCo-orientador: Prof. Mestrando Giovanni Frizzo
Porto Alegre
2008
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Eduardo Gottems Pergher
HEGEMONIA DO ESPORTE NA ESCOLA
Trabalho de Conclusão do Curso de Educação FísicaUniversidade Federal do Rio Grande do Sul
_____________________________Estudante Eduardo Gottems Pergher
_________________________________Orientador: Prof. Dr. Vicente Molina Neto
________________________________Avaliador: Prof Dr. Alberto R. Reppold Filho
Trabalho entregue dia 17 de novembro de 2008Apresentação dia 03 de dezembro de 2008
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Agradecimentos:
Ao povo brasileiro, que paga seus impostos, no intuito de que o Estado reverta esses em melhorias para a sociedade, tenho uma dívida eterna com vocês;A todas e todos que lutaram e lutam pela Universidade Pública, Gratuita e de Qualidade, pois sem ela dificilmente estaria escrevendo essas palavras;A meu pai, Eno José Pergher, minha mãe, Jania Inês Gottems, meu irmão, Rodrigo Pergher e minha irmã Sheila Pergher, minha querida família, que muitas vezes não compreendeu, mas aceitou, a distância que nos separa, e que me auxiliaram em tudo desde sempre para que conseguisse chegar hoje aqui;Ao meu orientador, Professor Molina Neto, companheiro, que busca compreender meus anseios, e tem me ensinado, me ajudado, me auxiliado nessa caminhada;Ao meu co-orientador, Geová, que tem me ajudado, a partir das nossas discussões, a avançar nessa empreitada;A companheirada do grupo de pesquisa F3p-Efice, pela força;Ao Movimento Estudantil de Luta, Organizado e Combativo, que não rebaixa suas bandeiras e luta com a classe trabalhadora por dias melhores;À companheirada que toca o ME no DCE da UFRGS nas últimas gestões: Dani, Bernardo, Raka, Gabi, Vico, Fernada, Kcarol, Ana, Rodolfo, Barbara, Beliza, Baggio, Thiago, Lemes, Hulk, Jéssica, Bino, Glauco, Juzinha, Paulo, Tita, Paula, Gabi, Fábio, entre tantos...À companheirada do Movimento Estudantil de Educação Física, o MEEF, com certeza esquecerei alguns nomes, mas farei um esforço de lembrá-los: Mel, Xisão, Carlão, Pamplona, Gabrielzinho, Monstro, Vivi, Cíntia, Emyly, Camila, Adriano Abu, Fuchs, Gika, Eduardo, Guilherme, Fran, Mineiro, Tocha, Laércio, Gabriel, Andressa, Pequeno, Diego, Jomar, Morena, Marcello, Afonso, Amandinha, Youself, Samile, Gaspar, Laryssa, Sara, Luis Milonga, Tiago, Jo, Anderson, entre tantas... À companheirada que coordenou nacionalmente a Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física (ExNEEF) nas duas últimas gestões: Canguru, Carol, Fabão, Luis Gustavo, Xisinho, Alan Jonh, Linna e Rafael Góes.Ao camarada Shin Pinto Nishimura, que coordenou a ExNEEF comigo, que sempre soubemos divergir, porém na hora da peleia, sempre nos atirávamos abraçados.À gurizada que vem transformando a ESEF/UFRGS num dos maiores pólos de resistência estudantil do Brasil: Gil, Geová, Shin, Lari, Luth, Vico, Berna, Dessa, Carol, Zingano, Diel, Andrade, Wando, Piranha, Pedro, Taty, Nessa, Isa, Duran, Fred, Ju, Abib, Vivi, Marina, Régis, Renatinha, Salsa, Marião, Tolloti, Maurício e ao Ílson, onde quer que ele esteja...
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Que para todos haja sempre pão para iluminar a mesaEducação para aliviar a ignorância
Saúde para espantar a morteTerra para colher o fruto
Teto para abrigar a esperançaE trabalho, para fazer dignas as mãos
(EZLN, 1996)
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SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS...............................................................................8
1 APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA..................................................................................101.1 Breve contextualização da sociedade em que vivemos .................................................101.2 Escola e trabalho...............................................................................................................151.3 Esporte e trabalho.............................................................................................................201.4 Esporte na escola...............................................................................................................241.4.1 Tema polêmico: a Revista Movimento discutindo o esporte na escola e esporte de rendimento................................................................................................................................251.4.1.1 Esporte: uma abordagem com a fenomenologia ......................................................271.4.1.2 Esporte na escola e esporte de rendimento................................................................271.4.1.3 Sobre o esporte para crianças e jovens......................................................................291.4.1.4 Desporto educacional: realidade e possibilidades das políticas governamentais e das práticas pedagógicas nas escolas públicas......................................................................311.4.1.5 Relações entre o esporte de rendimento e o esporte na escola.................................341.4.1.6 Técnica, esporte, rendimento......................................................................................361.4.2 Intelectuais da educação física.......................................................................................37
2 DECISÕES METODOLÓGICAS......................................................................................392.1 Problema da pesquisa........................................................................................................392.2 Caracterização do estudo..................................................................................................402.2.1 Análise de documentos...................................................................................................412.2.2 Observação participante................................................................................................422.2.3 Entrevistas semi-estruturadas.......................................................................................432.2.4 A Escola escolhida...........................................................................................................442.2.5 Os professores colaboradores........................................................................................45
3 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES: A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO ESPORTE NA ESCOLA...................................................................................................................................463.1 Prática pedagógica nas aulas de educação física............................................................463.2 Esporte como conteúdo hegemônico ...............................................................................543.3 Lógica do esporte de rendimento presente na escola......................................................583.4 Jogos escolares: o desfile de pobreza...............................................................................65
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................71
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................76
APÊNDICES............................................................................................................................82ROTEIRO BÁSICO DE ENTREVISTAS.............................................................................82TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO.........................................83DECLARAÇÃO DE CONSENTIMENTO...........................................................................85
ANEXOS..................................................................................................................................86
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RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar o esporte dentro da escola, buscando apontar as implicações que esse fenômeno social, no contexto escolar, traz a partir da prática pedagógica dos professores de educação física. Assim, fizemos uma contextualização da sociedade que vivemos, seguida de uma breve revisão de literatura sobre a Escola, fazendo o resgate histórico e o relacionando com a sociedade. Articulamos essa discussão com a de esporte, que será apresentada com mais ênfase, tendo em vista a relevância que o mesmo tomou mundialmente, abordando seu processo histórico especifico como fenômeno, apresentando os fatores internos e externos que o influenciam e direcionam. Nos aproximamos também da discussão crítica ao esporte feita no Brasil na década de 1980 e início da década de 1990, bem como examinamos seus efeitos nos dias de hoje. Após essa revisão bibliográfica, discutimos o esporte dentro da área do conhecimento da educação física, e desenvolvemos o trabalho de campo em uma escola pública. A partir das referências teóricas e da contribuição de professores de educação física que atuam nela, estreitando assim os laços da teoria com a prática social a partir do trabalho pedagógico dos professores de educação física, construímos um processo analítico consistente que procura dar conta de compreender e propor possibilidades para o esporte na escola. A partir dessas constatações, analisamos a prática pedagógica de professores de educação física na escola pública. Utilizamos como principais instrumentos de coleta de informações, a análise de documentos, a observação participante e entrevistas semi-estruturadas, constituindo dessa forma um estudo de caso. Finalmente relacionamos as informações coletadas do trabalho de campo com o aporte teórico, buscando dessa forma a síntese acerca das reflexões propostas por esse estudo, bem como apontando as implicações da temática para formação de professores.
Palavras-chave: Escola. Esporte. Prática Pedagógica. Hegemonia.
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CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS
O presente trabalho tem por objetivo analisar o esporte dentro da escola, buscando
apontar as implicações que esse fenômeno social, no contexto escolar, traz a partir da prática
pedagógica dos professores de educação física.
Assim, apresentamos1 no primeiro capítulo uma contextualização geral da sociedade
em que vivemos, buscando apresentar alguns apontamentos em relação ao modo de produção
capitalista.
Após traçamos uma breve revisão de literatura sobre a Escola, fazendo o resgate
histórico e o relacionando com a sociedade. Tratamos também dos processos que contribuíram
com sua consolidação, contextualizando-a na sociedade atual e os fatores externos e internos
que a influenciam e demarcam na ação junto as crianças, jovens e adolescentes.
Articulamos essa discussão com a de esporte, que será apresentada com mais ênfase,
tendo em vista a relevância que o mesmo tomou mundialmente, abordando seu processo
histórico específico como fenômeno, apresentando os fatores internos e externos que o
influenciam e direcionam. Referenciamos o debate promovido pela Revista Movimento, na
seção Temas Polêmicos de 2000 e 2001, intitulado Esporte na Escola e Esporte de
Rendimento, para apresentar uma discussão mais aprofundada sobre esporte na escola.
Pretendemos também nos aproximar da discussão crítica ao esporte feita no Brasil na década
de 1980 e início da década de 1990, bem como examinar seus efeitos nos dias de hoje.
No segundo capítulo desenvolvemos as nossas decisões metodológicas,
caracterizando o problema de pesquisa. Faremos uso, como principais instrumentos de coleta
de informações, a análise de documentos, a observação participante e entrevistas semi-
estruturadas, constituindo dessa forma um estudo de caso. É nesse momento que apresentamos
também nossos colaboradores, e a escola envolvida no trabalho.
O terceiro capítulo é o momento em que analisamos as informações do campo a partir
das referências teóricas e da contribuição de professores de educação física que atuam nela,
estreitando assim os laços da teoria com a prática social a partir do trabalho pedagógico dos
professores de educação física. Esperamos construir um processo analítico consistente que dê
conta de explicar e propor possibilidades para o esporte na escola.
1Por mais que eu tenha escrito, feito o trabalho de campo, as leituras, e tudo mais, opto por utilizar os verbos, dentro do possível, na primeira pessoa do plural, por entender esse trabalho como uma construção coletiva, em que várias outras pessoas contribuíram, sem dúvida alguma em alguns momentos serei impedido dessa opção, tendo que utilizar o verbo no singular, porém dentro do possível acato a posição acima.
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A partir dessas constatações, pretendemos analisar a prática pedagógica de
professores de educação física na escola pública.
Finalmente relacionaremos as informações coletadas do trabalho de campo com o
aporte teórico e com nossas formulações, buscando a síntese acerca das reflexões propostas
por esse estudo, bem como apontando as implicações da temática.
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1 APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA
Para fazer uma análise relacionada ao esporte na escola, é necessário pautarmos
brevemente o contexto em que as duas instituições, a escola e o esporte, estão inseridas, bem
como resgatarmos a história das mesmas e a íntima ligação entre elas. Dessa forma, iniciamos
com uma breve discussão acerca da sociedade, seguida de uma discussão sobre a escola,
entendendo esta como uma instituição maior em relação ao esporte, em que o mesmo se
insere, buscando entender sua função quando começa a ser organizada durante a Revolução
Industrial, bem como o papel desempenhado hoje. A discussão do esporte segue essa mesma
linha de raciocínio, porém, a relevância remetida ao esporte hoje enquanto fenômeno social
acarreta uma análise bem mais aprofundada.
1.1 Breve contextualização da sociedade que vivemos
Para compreender as implicações do esporte no contexto escolar é necessário
discutirmos brevemente o modo de produção a que essas duas instituições se submetem,
trazendo pressupostos acerca da sociedade em que estão inseridos, tratando a conjuntura,
entendendo que não podemos fazer uma análise dos mesmos de forma isolada, sem fazer uma
relação com a totalidade.
Nesse sentido, faremos aqui uma breve análise do modo de produção da existência
vigente na sociedade: o capitalismo. Este sistema, pautado na divisão da sociedade em classes,
busca a acumulação de capital, seja qual for a maneira para isso se concretizar. As classes
presentes nesse contexto são classes antagônicas, de um lado a burguesia, que se constitui em
uma minoria, detentora dos meios de produção; de outro, a classe trabalhadora, a maior
parcela da sociedade, que vende sua força de trabalho com objetivo de garantir o seu sustento.
Os interesses dessas classes também são antagônicos e podem ser classificados, segundo
Souza (1987, p.11) “tanto como imediatos quanto históricos”: a acumulação de riqueza, a
exploração dos recursos naturais cada vez mais escassos, a ampliação do consumo, do
patrimônio, etc. são os interesses imediatos da classe dominante, acompanhado do interesse
histórico de manter-se no local privilegiado a fim de garantir o poder e a qualidade de vida
deferida a partir desse privilégio. A necessidade de sobrevivência, a luta pelo emprego,
melhoria nas condições de trabalho, acompanhada das reivindicações pelos direitos
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trabalhistas, constituem-se nos interesses imediatos da classe trabalhadora. A tomada da
direção da sociedade constitui-se enquanto interesse histórico da classe trabalhadora, através
da luta e da vontade política, a fim de chegar a um sociedade justa, apropriando-se do produto
de seu trabalho.
Um dos principais mecanismos que determinam esse processo de divisão de classe é
através da expropriação do produto do trabalho, pelo capitalista, do trabalhador. Marx, ao
tratar desse ponto, diz que:
[ . . . ] na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e á qual correspondem formas sociais determinadas de consciência (2007, p.45).
Dessa forma, observamos a relação/articulação entre os três níveis gerais da
sociedade: 1) a base econômica ou estrutura, em que estão as relações entre os homens e a
natureza, e entre os homens com os homens, sendo assim relações sociais; que condiciona a
superestrutura, dividida em 2) sociedade civil2, configurando-se em diversas esferas da vida,
tais como: escolas, imprensa, igreja, sindicatos, partidos, entre outras, em que exercem, como
um campo de domínio da ideologia; e 3) sociedade política ou Estado3, enquanto
superestrutura política, presentes neste todo aparato estatal desde o governo, parlamento, até o
aparato militar. Gramsci elucida melhor acerca da superestrutura quando diz que
[ . . . ] pode se fixar dois grandes “planos” superestruturais: o que pode ser chamado de “sociedade civil” (isto é, o conjunto de organismos chamados comumente de “privados”) e o da “sociedade política ou Estado”, que correspondem à função de “hegemonia” que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de “domínio direto” ou de comando, que se expressa no Estado e no governo juridico”. (1978, p.13-14).
Essa relação/articulação demonstra o que Gramsci chamou de “bloco histórico”,
enquanto um conjunto complexo e contraditório. Essa relação/articulação não se dá de forma
mecânica e unilateral, pelo contrário, acontece de forma recíproca, orgânica e contraditória,
sendo através da contradição que se problematizam as relações sociais de produção, ou mais
2 Entendida na citação de Marx como superestrutura jurídica, e podendo ser utilizada o termo de consciência social também. Porém utilizaremos neste trabalho o termo sociedade civil, nos aproximando assim a formulação de Gramsci.3 No sentido estrito.
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especificamente de exploração. Da mesma forma que Marx (2008) em suas formulações deixa
entendido que a superestrutura não é autônoma nem desligada da estrutura, Gramsci ao trazer
à tona a contribuição acerca da superestrutura, é enfático ao dizer que não podemos nos pautar
unicamente na estrutura e na relação direta de poder – o Estado – e dá um peso maior4 do que
Marx nessa questão:
No desenvolvimento de uma classe nacional, ao lado do processo de formação no terreno econômico, deve-se levar em conta o desenvolvimento paralelo nos terrenos ideológicos, jurídico, religioso, intelectual,, filosófico: aliás, deve se dizer que não existe desenvolvimento no terreno econômico sem estes outros desenvolvimentos paralelos (GRAMSCI, 1978 p.47).
Sendo assim, o papel da superestrutura é fundamental na manutenção das relações
sociais, no modelo de sociedade que estamos pautando aqui, o capitalismo, forjado na
exploração do homem pelo homem. Essa manutenção não se dá de forma pacífica e “natural”,
pelo contrário, se dá “através de meios não-econômicos”. Esses mecanismos podem ser tanto
diretos, pela coerção do Estado, chegando à utilização da força, quanto mecanismos indiretos,
e ideológicos, situados na sociedade civil, agindo no sentido de garantir consenso,
“objetivando a negação da exploração e divisão de classes, através de um discurso
pretensamente universal, igualitário, e, portanto, falsamente idêntico e homogêneo” (CURY,
2000, p.47).
Portanto, percebemos a partir das constatações acima trabalhadas brevemente, a
necessidade da burguesia de manter a sua exploração, após assumir o poder do Estado, através
de uma direção ideológica e cultural. Ora, se ela dependesse unicamente da força estatal,
através da coerção, utilizando a força e a repressão, o desgaste frente à classe explorada seria
imenso tendo em vista que a mesma não conceberia viver sob uma forte coerção estatal,
colocando em jogo mais rapidamente o poder da burguesia enquanto classe detentora do poder
político. Dessa forma ela busca criar meios ideológicos, no sentido de ter a direção cultural e
ideológica da sociedade civil através da construção da hegemonia.
A partir de uma leitura de Gramsci, Cury traça o “conceito” aproximado do que seria a
conceituação do termo hegemonia, entendendo a mesma como:
[ . . . ] a capacidade de direção cultural e ideológica que é apropriada por uma classe, exercida sobre o conjunto da sociedade civil, articulando seus interesses particulares com os das demais classes de modo que eles venham a se constituir em interesse
4 Segundo Gadotti (1992).
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geral [ . . . ] (2000, p.48).
O conceito de hegemonia, relacionado ao consenso “espontâneo”, nos permite, “que se
capte, a complexidade dos planos superestruturais, assim como a complexidade de todo
desenvolvimento da formação econômico-social” (GRUPPI, 2000 p.90).
Essa leitura é atual, ficando explícito ao analisarmos a forma como o capitalismo se
coloca hoje, no sentido de entender que o mesmo, por viver em contradição vem gerando e
atravessando crises ao longo dos anos. Marx (2006) ao tratar dessa questão diz que “a
sociedade burguesa moderna que gerou, como por encanto, meios de produção e de troca tão
poderosos assemelha-se ao feiticeiro que já não consegue dominar as potências demoníacas
que evocara”, apontando, assim, que “nas crises eclode uma epidemia social que teria parecido
um contra-senso a todas as épocas anteriores: a epidemia da superprodução”. Como o capital
gera essas crises, a própria burguesia busca superar as mesmas, anunciada de modo explícito
no Manifesto do Partido Comunista no ano de 1848:
[ . . . ] de uma parte, pela aniquilação forçada de um enorme contingente de forças produtivas; de outro pela conquista de novos mercados e pela exploração mais acirradas dos antigos [ . . . ] preparando crises mais extensas e mais violentas e reduzindo os meios preveni-las [...] (MARX, 2006, p. 34).
A necessidade de resgatarmos esses precedentes históricos se faz para situarmos o
momento que vivemos hoje. Após a Segunda Guerra Mundial, os estados europeus deflagram
a política de bem estar social, em que, através da intervenção do Estado, buscam atender aos
trabalhadores garantias sociais, bem como garantir o crescimento econômico, tendo nas
décadas de 1950 e 1960 os chamados “anos de ouro”, em que as taxas de crescimento foram
as mais rápidas da história.
Porém, o mundo avança novamente para outra crise, e no início dos anos 70 as taxas de
crescimento voltam a cair seguido de altas taxas de juros. A partir daí, entra em vigor a face
mais perversa do capitalismo, que vem no sentido de remediar a crise: o neoliberalismo. Este
se constitui num modelo hegemônico, uma forma de dominação de classe adequada às
relações tanto econômicas, quanto sociais, ideológicas e políticas (ANDERSON, 2008), em
que acontece uma desresponsabilização do Estado (Estado mínimo) pela garantia do bem estar
da sociedade e das políticas sociais, tais como saúde, educação, lazer, segurança, entre outros,
remetendo para o setor privado essa demanda, resultando em uma sociedade regida pelas
regras do mercado, sem a mediação do Estado. Passamos por um período de implementação
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de reformas neoliberais também, onde cada vez mais os direitos trabalhistas são retirados,
conjuntamente com uma onda de privatizações desencadeadas na década de 1990. O
neoliberalismo através de suas políticas e de sua ideologia avança no sentido de transformar
tudo em mercadoria, desde o trabalhador, os seus direitos conquistados historicamente, seu
tempo de lazer, entre outros.
Aqui podemos estabelecer uma relação íntima acerca da discussão que tratamos
anteriormente sobre a questão da sociedade civil e do Estado. É através do processo de
consentimento e consenso, deflagrado na sociedade civil, que a burguesia consegue criar uma
idéia de demonização do Estado. A mensagem de que o “público” não funciona, é lento,
burocrático e gasta muito mais é difundida em favor do setor privado. Isso busca garantir uma
das grandes metas dessa face do capitalismo intitulada neoliberalismo, que consiste no
processo de privatização do Estado, da entrega do mesmo ao mercado, seja através da
privatização de empresas estatais, através de bens estatais, através de serviços do Estado,
deixando-o forte unicamente no sentido da coerção, na garantia da manutenção da ordem. Em
uma análise minuciosa feita por Anderson (2008) através de um Balanço do Neoliberalismo5 o
mesmo conclui que um dos grandes triunfos do neoliberalismo, além da questão social – em
que o mesmo atingiu níveis de desigualdades extremos – foi política e ideologicamente.
Analisando a implementação do neoliberalismo no Brasil, percebemos que diversas
esferas da vida passam por um processo acelerado de sucateamento através das reformas do
Estado ou já foram entregues à iniciativa privada sendo privatizadas, como a segurança, a
saúde, a previdência, a educação superior, que passam por um processo gradual de
privatização, como demonstram Pergher e Nishimura (2008) através da reforma universitária,
entre outros exemplos que explicitam muito bem essa questão.
Com a educação básica pública não é diferente, pois há hoje um amplo processo de
sucateamento das escolas públicas, demonstrando um total descaso por parte do Estado para
com a educação básica, acompanhado de um processo de privatização. Como dado relevante,
é necessário termos clareza da relevância da escola pública, que atende 87% dos estudantes do
Brasil, segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Os
salários indignos, o número excessivo de alunos nas salas de aula e a falta de infra-estrutura
são grandes problemas vividos no cotidiano escolar, explanados de forma sistematizada no
documento, gerado a partir de uma pesquisa, intitulado Retrato da Escola, construído pela
5 Título do artigo do mesmo autor no livro de SADER, E. at all. Pós-Neoliberalismo. As Políticas Sociais e o Estado Democrático. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
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CNTE. A pesquisa do Fundo das Nações Unidas para Educação e Cultura (Unesco) e da
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), citada no mesmo
documento da CNTE, revela que os trabalhadores da educação têm um dos piores salários
entre 32 países de economia equivalente, sendo a média dos salários girando entre R$ 500,00
e R$ 700,00. A privatização, citada com certa ênfase pelos professores consultados na
pesquisa, vem se apresentando, como os mesmos colocam, através dos contratos temporários,
dos estagiários ocupando o espaço do professor e tendo que desenvolver tarefas que não
competem a eles, criando assim dificuldades no processo de formação dos mesmos,
conjuntamente com a elevação de contratações terceirizadas no segmento de funcionários. O
aluguel das dependências das escolas para atividade com outros objetivos também é algo
presente, conjuntamente com a política de parcerias privadas, o que demonstra indícios do
processo de privatização.
Esse processo acompanhado na escola também acontece no esporte, em que podemos
presenciar essas questões relacionadas a uma onda mercantilizadora. As escassas áreas para a
prática de atividades esportivas nas cidades são um exemplo, já que o espaço antes público vai
sendo cedido para outros setores, principalmente privados, conjuntamente com o
sucateamento dos mesmos atrelados à falta de manutenção. Os próprios direcionamentos
governamentais presenciados no último período, em que o governo federal investiu bilhões
nos Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro e após o evento grande parte das estruturas
construídas foram repassadas para a iniciativa privada. A vinda da Copa do Mundo de Futebol
de 2014 para o Brasil também já remete a grandes investimentos públicos para o esporte de
alto rendimento.
A partir dessas considerações e das aproximações seguintes, conseguimos situar a
escola enquanto esfera presente na sociedade civil, conjuntamente com o esporte, que além de
estar inserido na escola, tem grande influência e atuação fora da escola, contribuindo para a
construção da hegemonia da classe dominante, enquanto direcionamento cultural e ideológico.
1.2 Escola e trabalho
Durante o movimento histórico da humanidade, a escola desempenhou uma função
muito importante para a sociedade, principalmente no período da revolução industrial, como
assinala Enguita (1989), debatendo acerca da implementação – no advento do capital e para a
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sua reprodução – do trabalho assalariado e da nova organização do trabalho. É através da
discussão do trabalho que se torna possível contextualizar o papel desempenhado pela escola
na sociedade.
O período pré-industrial era caracterizado pela organização do trabalho artesanal e de
subsistência, no qual o trabalhador se apropriava do resultado do seu trabalho, bem como tinha
consciência do processo e o organizava segundo suas demandas. Com a revolução industrial, o
trabalho artesanal e de subsistência cedem espaço para o trabalho industrial, pautado na linha
de montagem, acarretando em diversas mudanças sociais no trabalho e na vida do operário e
do camponês.
Essa nova organização do trabalho remetia à submissão do operário ao tempo, e era
diferente das outras duas formas, em que o trabalhador trabalhava o necessário para
subsistência, o remetia a grandes jornadas de trabalho, muitas vezes sem intervalos. Outro
grande diferencial era a desapropriação por parte do trabalhador do controle do processo de
trabalho, em que o mesmo acabava perdendo o senso criativo que havia nas outras
organizações de trabalho já citadas cedendo espaço para uma pré-organização ditada de forma
vertical, onde a autonomia dava espaço para a submissão.
Isso levava à divisão do trabalho, fator esse determinante que acaba por gerar a
alienação do trabalhador, sendo que o mesmo não se reconhece mais no trabalho, mas
consegue somente se sentir fora dele quando deixa o macacão da fábrica e veste sua roupa
para retornar ao seu lar. O produto final do trabalho também é retirado do trabalhador, ficando
para o capitalista o produto de todo o processo. A constatação é que, com o advento da forma
de organização do capital, o capitalista além de se apropriar da produção, organiza o trabalho,
tendo total controle de todo o processo, desde o início até o final.
Porém houve resistência por parte da classe trabalhadora frente à implementação
desse método de organização do trabalho. Essa resistência foi pautada na negação da
subordinação ao trabalho assalariado. Os trabalhadores não tinham inculcado em si o
pressuposto da acumulação que vinha sendo amplamente difundido com a nova organização
da sociedade, pois os mesmos viviam ainda num processo de trabalhar pela subsistência. Não
aceitavam trabalhar longas jornadas, bem como dedicavam mais tempo ao ócio (ENGUITA,
1989). Dessa forma, o Estado interviu, de forma arbitrária, taxando os que não se adaptavam
ao sistema de vagabundos, empregando-lhes leis que os obrigavam a trabalhar e se utilizando,
além da ordem, da via moral para “naturalizar” essas relações.
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É nesse momento que a escola ganha um papel importante no processo todo, pois a
partir dessa recusa por parte dos trabalhadores ao trabalho assalariado e à nova ordem de
organização da vida – o capitalismo – os burgueses ativamente interessados na consolidação
do capital se remetem à educação formal como instrumento estratégico para garantir seus
interesses enquanto classe e preparar o futuro trabalhador para a fábrica. O objetivo é utilizar a
escola como espaço estruturador do novo trabalhador, em que os pensadores da burguesia
consensuavam que o povo deveria ser educado para operar máquinas e adotar hábitos
higiênicos.
Diversos eram os objetivos com a escola, todos com intuito de modelar o novo
trabalhador, reproduzindo assim os valores da sociedade que estavam se formando. Entre eles
a ordem era o primordial, pois diversos eram os casos de desobediência e a ordem era
pressuposto para o progresso, dentro de uma lógica positivista ou conservadora. Através da
ordem conseguiriam modelar moralmente, bem como já configuravam para que quando essas
crianças chegassem na idade apta ao trabalho assalariado, não questionassem as longas
jornadas de trabalho e já tivessem a pontualidade como algo a ser cumprido, mantendo-as,
assim, ocupadas na escola permanentemente, entendendo as crianças como futura mão de obra
disciplinada. Essa função foi desempenhada pela escola, e dessa forma ela foi difundida e
espalhada tanto para a burguesia quanto para a classe trabalhadora.
Esse papel não era difícil para a escola, pois ela recebia, como recebe hoje, uma
legitimidade concedida pela sociedade, alicerçada na idéia de que ela é um dos caminhos,
senão o principal, para que o indivíduo consiga “sucesso”. Isso acaba por reforçar também a
lógica da responsabilidade pessoal, pois a forma de organização da escola remete a isso,
tornando como grande responsável, pela desgraça ou pelo sucesso, o próprio indivíduo. Isso se
dá através do processo meritocrático em que está pautada a escola, que através do processo de
avaliação, acaba por já dividir entre os aptos e os não aptos.
[ . . . ] na realidade a escola é hoje o principal mecanismo de legitimação meritocrática de nossa sociedade, pois supõe-se que através dela tem lugar uma seleção objetiva dos mais capazes para o desempenho das funções mais relevantes,às quais se associam também recompensas mais elevadas (ENGUITA, 1989, p.192).
Assim, a escola contribui também com o individualismo, isolando através do
processo meritocrático, em que somente o aluno é responsável pelo seu sucesso, criando assim
uma rivalidade entre os mesmos, que também será presenciada após o período escolar,
disputando o pouco espaço que resta no mercado do trabalho.
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Dessa forma a escola desempenha funções claras dentro do sistema capitalista, como
ressalta Enguita ao dizer que
a educação formal serve para muitas outras coisas além da qualificação da força de trabalho: é um estacionamento onde deixar as crianças, oculta o desemprego real, forma bons cidadãos, educa futuros consumidores, adestra trabalhadores dóceis, facilita a justificação meritocrática da divisão em classes da sociedade capitalista, permite que a propriedade se esconda atrás do emaranhado da administração, oferece uma oportunidade a capitais improdutivos, satisfaz a demanda popular de cultura e distrai a população de outros problemas mais importantes etc. (1993, p.197).
O que fica constatado através desses apontamentos é a destinação a segundo plano
dos conteúdos escolares, ficando num primeiro plano a manutenção da ordem e a difusão dos
valores burgueses. Temos acordo com Freire, de que “não é a educação que modela a
sociedade mas, ao contrário, a sociedade é que modela a educação segundo os interesses dos
que detêm o poder” (1986, p.46).
A escola passará por diversas transformações ao longo dos tempos, porém muito das
suas reais funções vigoram ainda, por isso muitas vezes ao caracterizarmos a escola dos
primórdios, da revolução industrial – por mais que ela tenha passado por grandes
transformações como a passagem da unidocência para o método seriado – a essência acaba por
ser a mesma, a submissão ao capital atendendo aos interesses da classe dominante
(MÉSZÁROS, 2005).
A divisão do trabalho também é uma característica na escola. Um exemplo disso é o
processo de implementação do conteúdo por disciplina ditado por especialistas aos
professores, distanciando dessa forma os que estão no dia-a-dia da escola com o trabalho
intelectual, ocasionando sua proletarização (GIROUX, 1987). A divisão do trabalho acontece
também em outros pontos referentes à escola, em que a criança participa minimamente da
escolha do que aprender e do porquê aprender determinada disciplina, ficando a seu encargo
somente aceitar o que está sendo imposto. Essa caracterização contribui no entendimento da
escola como uma quase fábrica, concebendo o aluno como um operário, com a rigidez da
carga horária, da pontualidade, da ordem, da atenção destinada, contribuindo para a alienação,
em que o processo e o fim são pré-determinados de forma alheia.
Grande parte dos que buscam pensar a escola e dos professores que nela atuam,
equivocadamente, entendem a mesma como uma ilha isolada do resto do mundo, que não
sofre influências e não está sujeita à intervenção do mundo exterior à mesma. Os argumentos
19
citados acima auxiliam na compreensão de que forças exteriores à mesma atuam pelos
interesses de determinada classe.
É nesse sentido também que é necessário cuidado no debate acerca da escola, para não
nos perdermos na curva do pessimismo e abandonar a mesma. Diversas são as teorias que
versam sobre a escola, sendo que existem as teorias não críticas – entendendo a escola como
autônoma – e as teorias crítico-reprodutivistas, como assinala Saviani (2006). A crítica que
Saviani faz às teorias crítico-reprodutivistas remete muito ao pessimismo das mesmas.
Tratando da pedagogia histórico-crítica, compromissada com a transformação da sociedade,
atendendo aos anseios da classe trabalhadora, Saviani ao tratar da escola diz que
a escola é, pois, compreendida a partir do desenvolvimento histórico da sociedade; assim compreendida, torna-se possível a sua articulação com a superação da sociedade vigente em direção a uma sociedade sem classes, a uma sociedade socialista. É dessa forma que se articula a concepção Político Socialista com a concepção Pedagógica Histórico-crítica, ambas fundadas no mesmo conceito geral de realidade, que envolve compreensão da realidade humana como sendo construída pelos próprios homens (1997 p.120).
Nessa linha que Pérez Gómes (1998, p.24) diz que “o desafio educativo da escola
contemporânea é atenuar, em parte, os efeitos da desigualdade e preparar cada indivíduo para
lutar e se defender, nas melhores condições possíveis, no cenário social”.
Pistrak (2005) é mais incisivo em sua argumentação, tratando de dois pilares de
aprendizado para as crianças: lutar e construir. Segundo o autor, “isto deveria ser aprendido
por cada um de nossos alunos”, apontando assim que a escola deve tomar partido frente à
realidade atual, os alunos devem se armar dos conhecimentos e os conteúdos de ensino servem
para “armar a criança para a luta e para a criação da nova ordem”.
Dessa forma, estes autores apontam um caminho para a atuação, articulando os
interesses da escola com os interesses populares, o que não significa que vamos superar o
antagonismo de classes e a lógica do capital através da transformação da escola. Essa tarefa
caberá à organização coletiva dos trabalhadores, porém, temos que nos apropriar desse espaço
de transmissão de valores que é a escola (MÉSZÁROS, 2005).
1.3 Esporte e trabalho
É nesse contexto que o esporte está inserido – além dos demais locais em que se
20
apresenta – atuando e sofrendo intervenção da escola e da sociedade em seu processo. O
esporte constitui hoje um dos maiores fenômenos sociais, visto que o mundo pára apreciando
duelos, sejam na Copa do Mundo de Futebol ou nos Jogos Olímpicos, movimentando
fortunas. Os Jogos Olímpicos de Pequim 2008, igual a outros, se constituem em um ensaio à
hipocrisia. Os governos se utilizam destes eventos para auto-promoção, auto-afirmação
mundialmente enquanto potências, e também para mascarar problemas sociais e econômicos.
A censura à liberdade de informação, principalmente no país sede, e o ufanismo presente em
cada delegação são também exemplos da manipulação do esporte com objetivos geo-políticos.
No Brasil, em um certo espaço de tempo a cada quatro anos, mais especificamente na
realização da Copa do Mundo de Futebol, em que os problemas do nosso país somem
momentaneamente. Para Molina Neto, ao tratar especificamente do esporte no Brasil
direcionado aos Jogos Olímpicos, a busca de medalhas “como forma de afirmação do país no
exterior traz perversas conseqüências no comportamento de toda sociedade brasileira” (1996,
p.9).
Brohm (1978) trata da mistificação relacionada à “doutrina nacional do esporte”, em
que traz a questão ufanista no setor esportivo, utilizado pelos países no âmbito internacional. A
intervenção do Estado no esporte é intensa, como observa Bracht (2005), elucidando o fato do
esporte ser objeto de atenção do Estado no sentido de garantir a reprodução do capital, função
básica do Estado nas sociedades capitalistas. Cavalcanti, tendo acordo com os autores, diz que
“o Estado utiliza de certa forma consciente o espetáculo esportivo com fins políticos, tendo
em vista um obscurecimento ideológico e procurando camuflar ou embelezar a realidade
social” (1984, p. 53).
A esfera do esporte tem um papel muito importante, pois na forma como
presenciamos o esporte difundido hoje fica evidente a questão da manutenção do capital e a
teoria da alienação de Marx nos propicia a compreensão desse fenômeno de tão grande
abrangência universal, quando diz que
Alienação é um conceito eminentemente histórico. Se o homem é alienado, deve sê-lo em relação a alguma coisa, em conseqüência de certas causas — o jogo mútuo dos acontecimentos e circunstâncias em relação ao homem como sujeito dessa alienação — que se manifestam num contexto histórico. Da mesma forma, a "transcendência da alienação" é um conceito inerentemente histórico, que prevê a realização bem-sucedida de um processo que leva a uma situação qualitativamente diferente (MÉSZÁROS, 1981).
.
Portanto, nessa análise, também o esporte serve de instrumento para crítica das
21
relações estabelecidas pelo modo de produção capitalista. O contraponto da ideologia
contrária à dominação se faz presente; entretanto, só pode materializar-se na luta de classes,
no concreto das contradições do cotidiano e, principalmente, no concreto da luta pela
apropriação das mercadorias para a satisfação da objetivação e existência.
À medida que, no capitalismo, o modo de viver e produzir é permeado pela forma
mercadoria, esta se torna a mediadora por excelência, a forma das relações sociais,
transformando-se na aparência de relações entre coisas, coisificando-se. O esporte enquanto
mercadoria a ser consumida ramifica-se como fetiche e, hoje, se expressa no aprofundamento
da alienação, que tem como pilar fundamental, o estranhamento. Esse estranhamento é
entendido, segundo Lukács (1981), como a existência de barreiras sociais que se opõem ao
desenvolvimento da individualidade em direção à omnilateralidade humana, à individualidade
emancipada. O capital contemporâneo, ao mesmo tempo em que pode, através do avanço
tecnológico e informacional, potencializar as capacidades humanas, faz expandir o fenômeno
social do estranhamento. Aqui podemos localizar o chamado esgotamento das possibilidades
humanizadoras do capital, isto é, uma época em que a ciência e o desenvolvimento econômico
produzem os maiores instrumentos para a emancipação humana, porém o que se percebe é a
exploração, alienação e opressão cada vez mais exacerbada por esse sistema.
O que fica evidenciado é que o esporte não é uma instituição autônoma, pois
enquanto produção histórico-cultural, “o esporte subordina-se aos códigos e significados que
lhe imprime a sociedade capitalista e por isso não pode ser afastado das condições a ela
inerentes” (COLETIVO DE AUTORES, 2005, p.70). É nesse sentido que se faz necessário, ao
iniciar a discussão de esporte, que se faça uma contextualização histórica desde a sua origem
até os dias de hoje, pois ao verificarmos as contradições presentes no atual contexto,
recorremos à história para buscar explicações sobre o desenvolvimento dos fenômenos sociais
tão difundidos na atualidade.
Dessa forma apresentamos a discussão acerca do surgimento do esporte, bem como o
contexto no qual estava inserido, seguido de uma análise da conjuntura atual e do papel que o
esporte desempenha hoje na sociedade, e nas práticas pedagógicas escolares. Por entender que
no campo da história do esporte existem divergências em relação a duas correntes de
pensamento – a da continuidade e a da ruptura – pretendemos fazer um resgate teórico sobre
as duas teses, expondo a idéia de alguns autores.
Stigger (2005) resgata de forma aprofundada e embasada essa divergência. É
22
necessário apresentar minimamente essa divergência e seus autores buscando situar, assim, o
nascedouro do esporte.
Compreendendo o esporte como algo praticado em cada momento da história,
defendendo a tese da continuidade, considerando o que se conhece hoje por esporte como
“esporte moderno”, advogando em favor dessa autores como Guttmann e Mandell (STIGGER,
2005, p.12). Guttmann (1978) auxilia a compreender essa tese ao comparar os esportes
praticados em determinados contextos históricos: esporte primitivo, esporte grego, esporte
romano, esporte medieval e esporte moderno. A partir da organização de um quadro em que o
autor relaciona o esporte praticado em determinadas épocas, leva a considerar que o esporte
moderno difere dos demais por comportar amplamente tais categorias, essas estabelecidas a
priori: secularização, igualdade, especialização, racionalização, burocracia, quantificação e
recorde. A conclusão do autor é a de que sempre existiu o esporte, sendo o que existe hoje uma
versão moderna do que eram as práticas esportivas das civilizações mais antigas.
Autores como Elias e Dunning (1992), Hobsbawm (1984), Bourdieu (1983),
apresentam o esporte partindo de outra perspectiva, a da ruptura, em que o esporte surge no
fervilhão da Inglaterra industrializante do século XVIII. Segundo estes autores, havia uma
necessidade, naquele momento, de tornar os jogos praticados pela população em geral menos
violentos e regulados por regras com objetivo de controlar essa violência, tirando como
conclusão que o esporte é resultado de um processo de civilização, com objetivo de
sensibilizar a população em relação à violência (ELIAS, 1992). Dá assim uma caracterização
do fenômeno de forma institucionalizada para os jogos e passatempos da sociedade inglesa.
A partir da transformação dos jogos populares desregrados em práticas corporais
formalizadas por regras, nas public schools6, surgem as primeiras formas de esporte com os
contornos hoje conhecidos. Surge com objetivo de controlar a agressividade das crianças, num
momento de turbulência total na sociedade, em que a Revolução Industrial estava sendo
desencadeada.
Ambos os autores, que defendem tanto a tese da continuidade quanto a da ruptura,
têm unanimidade em dizer que o esporte (moderno) teve seu surgimento num contexto bem
específico: a Inglaterra industrializante do século XVIII (STIGGER, 2005).
Esse surgimento na Revolução Industrial, conjuntamente com todo o processo de
mudança no processo produtivo, que teve desdobramentos não só no setor econômico, mas
6 Escolas inglesas destinadas aos filhos da burguesia inglesa. Eram conhecidas pelas suas desordens, principalmente nos jogos.
23
também nos setores culturais, político e sociais influenciou muito o esporte. Houve um grande
deslocamento da população do meio rural para o meio urbano acarretando na constituição de
periferias urbanas e precárias condições de moradias.
A produção, mais especificamente, deixava de ser artesanal para tornar-se industrial,
onde o operário cada vez mais sofria o processo nas fábricas com altas jornadas de trabalho,
sendo esse feito em etapas, distanciando cada vez mais o trabalhador do produto final do seu
trabalho. Isso caracteriza um entendimento funcionalista da sociedade, em que cada um tem
uma função, reforçando dessa forma a alienação do trabalhador, com objetivo de manter as
relações antagônicas de classe na sociedade. Essa Revolução Industrial constitui-se em uma
revolução burguesa, ficando claro quem realmente estava a ganhar com a mesma.
A partir disso, o esporte é difundido pelo mundo juntamente com os ideais e os
valores da Revolução Industrial desencadeada na Inglaterra. O esporte sofre diversas
transformações nessa difusão a nível mundial, passando a ser praticado e privado em
ambientes de associativismo (clubes, federações, confederações, associações, etc.), praticado
de forma amadora pela elite que possuía tempo livre para a prática. Logo após, difundiu-se de
maneira muito rápida enquanto mercadoria, tomando proporções imensuráveis em nível de
mercado mundial, movendo montanhas de dinheiro, consagrando diversos nomes conhecidos
na humanidade.
Entendendo o esporte como reprodutor dessa realidade, com funções estabelecidas
dentro da sociedade capitalista, Brohm tece críticas nesse sentido, entendendo o esporte
moderno como a reprodução da sociedade capitalista, ficando explícito esse pensamento
quando afirma que o “desporto é uma parte integrada na totalidade concreta: a sociedade
capitalista e seu dinamismo”, sendo que a “sua função social e política (...) lhe é ditada pelo
lugar que ocupa dentro da totalidade de relações sociais” enfatizando que “o destino do
esporte é um destino capitalista” (1978, p.18).
No esporte percebemos esse avanço também, pois valores do modelo de sociedade
atual, tais como: sobrepujança, rendimento, comparação, especialização, instrumentalização e
padronização, comparação de resultados a partir de um ideal (KUNZ, 2006), individualismo,
competitividade, burocratização, regramento; estão cada vez mais explícitos nas práticas
esportivas. Segundo Hildebrandt-Stramann (2005), o esporte enquanto um sistema, no sentido
da redução da sua complexidade, se caracteriza, segundo este autor, por duas regras básicas:
“a regra do sobrepujar (no sentido de vencer) e a regra da comparação objetiva”.
24
O problema da especialização precoce está presente no esporte, em que a criança é
subordinada a cargas de treinamentos sistemáticas em determinadas modalidades, a repetição
para a absorção da técnica é elemento fundamental, não estimulando a criatividade das
mesmas. Assim a criança acaba por ter uma formação escolar deficiente, tem reduzida
participação em atividades, brincadeiras e jogos do mundo infantil, devido à dedicação de
tempo para aperfeiçoar-se na determinada prática esportiva (Kunz, 2006).
O processo de esportivização é desencadeado nesse contexto, que é visto hoje em
diversas manifestações culturais, como é o caso da capoeira, perdendo dessa forma todo o
acúmulo histórico que traz determinada prática corporal. Remodela-se a própria prática para a
espetacularização e o amadorismo cede espaço para o profissionalismo, enquanto categoria do
trabalho, correspondendo aos anseios do mercado, pautado no alto rendimento.
A clareza para buscar o entendimento da demanda de discussão acerca de currículos
que desmistifiquem o esporte como conteúdo “sufocante” das demais manifestações da cultura
corporal é uma necessidade dentro da academia. O esporte que nos é apresentado dentro da
universidade segue uma lógica alinhada com os interesses da burguesia: o esporte de alto-
rendimento; isso é fato quando analisamos os currículos de formação de diversos cursos de
educação física.
A partir dessa análise podemos situar a esfera do esporte no contexto da sociedade
hoje, quais os reais objetivos e interesses com o esporte e a quem realmente ele está
favorecendo. A constatação dos objetivos, tantos imediatos quanto históricos, da classe
dominante nos permite compreender objetivamente e fazer uma reflexão do esporte que
presenciamos hoje na escola.
1.4 Esporte na escola
Tendo em vista essas questões levantadas, por entender o esporte enquanto prática
social construída historicamente (COLETIVO DE AUTORES, 2005), entendendo assim a
importância da inserção do esporte em âmbito escolar, bem como nas demais esferas sociais,
se faz necessário discutir os rumos tomados pelo mesmo.
As críticas ao esporte na escola têm sido amplamente suscitadas a partir das
discussões que oxigenaram a educação física a partir da segunda metade da década de 1980.
Foi nesse período, que caracterizou a abertura política do país, vindo de uma repressiva
25
ditadura civil-militar, que os trabalhos de Cavalcanti (1984)7 e Bracht (1986), podem se
configurar como os “pioneiros” nesse sentido. As críticas mais contundentes eram remetidas
ao caráter funcionalista que o esporte tinha no contexto escolar e fora dele. A esse movimento
na área da educação física, alguns termos são usadas para caracterizá-lo, tal como Betti (1991)
chama de “discursos pedagógicos inovadores”, Castellani Filho (2007) como a “tendência
histórico-crítica” da educação física, e Bracht (1992), chamando de “educação física
revolucionária”.
As questões relacionadas ao esporte na escola que vêm suscitando discussões ao
longo dos anos giram em torno da exacerbação da técnica ligada à busca de rendimento,
ajustados a uma visão hegemônica do esporte enquanto conteúdo da educação física. Dessa
forma, diversos são os espaços, sejam na escola, na academia, nos congressos, seminários,
encontros de professores ou estudantes em que esse debate vem sendo pautado, se
constituindo assim num tema polêmico da área, por apresentar diversas posições, muitas vezes
divergentes, ao extremo em determinados pontos, e que têm reflexos diretos e indiretos na
prática pedagógica de professoras e professores de educação física. Assim há uma necessidade
de problematizarmos cada vez mais essa relação – esporte na escola X esporte de rendimento
– objetivando traçarmos pontos comuns, o que seriam as convergências, e a partir da
problematização em cima das divergências, avançarmos do debate para a prática pedagógica
efetivamente.
1.4.1 Tema polêmico: a Revista Movimento discutindo o esporte na escola e esporte de
rendimento
A Revista Movimento da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (ESEF/UFRGS), fazendo uma leitura da necessidade de abordar esse tema, traz
nas edições de 2000 (números 1 e 2), 2001 (números 1 e 2), na seção Temas Polêmicos, o
debate à tona. Entendemos essa discussão como uma reoxigenação8 das discussões acerca
desse tema para a educação física, tendo em vista a relevância da temática, a forma como se
organizou, trazendo algumas perspectivas teóricas da área, e por ser até esse momento, o
último debate sistematizado acerca do tema.
7 Por mais que esse não se detenha especificamente ao âmbito escolar, tratando mais detalhadamente do programa Esporte Para Todos, que se deteve na esfera do lazer.8 A relevância desse debate foi tamanha, que será lançado um livro pela Editora Autores Associados, com os autores envolvidos no mesmo.
26
Esta publicação se organizou através de artigos, sempre dois por revista, sendo a
última com um artigo somente (todos os artigos de autoria individual) Para a produção desses
artigos foram chamados os professores Valter Bracht (2000/n.1), Elenor Kunz (2000/n.1),
Marco Paulo Stigger (2001/n.1), Adroaldo Gaya (2000/n.2), Alexandre Vaz (2001/n.1), Hugo
Lovisolo (2001/n.2) e a professora Celi Taffarel (2000/n.2)9.
Nos utilizaremos dessa discussão sistematizada da Revista Movimento para fazer a
discussão sobre esporte na escola10. Tentaremos apresentar um pouco das discussões e
apontamentos relevantes dos trabalhos11, especialmente no que diz respeito ao tema tratado
nesse sub-capítulo, e os pontos que atravessam ou não o mesmo, como o esporte de
rendimento. Essa primeira observação se faz necessária, por entendermos que a partir da
leitura dos textos percebemos que alguns autores não se detiveram na polêmica, e trouxeram
outros elementos que tangenciam ou se distanciam da questão central. Sendo assim, temos
acordo com Lovisolo – que na discussão assume um caráter de mediador – afirmando a “falta
de estrutura que permitisse a organização da polêmica”, resultando assim em textos sem “eixo
comum”. Este mesmo autor, mais adiante, diz que os leitores podem ter a impressão de que
cada autor organizou seu texto de forma independente.
Mais uma vez acordando com Lovisolo, a partir da leitura atenta ao debate, fica
evidenciado que somente Bracht, Gaya e Taffarel assumiram o caráter de debate, em que se
detiveram dentro da temática proposta pela revista. Os outros autores escaparam para outros
temas, relevantes também, mas específicos demais se relacionados ao que estava propondo a
Revista Movimento. Portanto, o desenvolvimento das idéias desses três autores será mais
extensa, tendo em vista a detenção dos mesmos na temática. Procuramos nesse espaço nos
determos nas idéias principais dos autores, sendo assim necessário, para garantir ao máximo a
fidedignidade das mesmas, transpormos para esse trechos, e articularmos as mesmas a partir
das citações dos autores. Seguiremos a ordem dos textos proposto pela Revista Movimento,
utilizando nos subtítulos a seguir os títulos originais dos artigos. O último texto, de Hugo
Lovisolo, por se tratar da mediação da discussão, por mais que o autor traga elementos seus
9 As citações feitas nesse subcapítulo (a partir dessas já feitas) que se referem às edições da Revista Movimento que abordam essa temática nos temas polêmicos, não seguirão as normas técnicas referentes ao ano por motivos de dinamização do debate. Quando houver a referência (ano) ao lado do nome significa que é outro trabalho do mesmo autor.10 Deixamos claro que nosso aporte teórico referente a esporte na escola não é condicionado somente a esses textos. Entendemos a importância dos mesmos, mas buscaremos interagir com outros autores e outros trabalhos que trouxeram e trazem também avanços significativos nas suas formulações para a área.11 Faremos um esforço para não entrarmos nesse momento no debate, buscando apresentar os pontos de vista acerca da discussão, e em determinados momentos confrontando as perspectivas dos autores entre si.
27
para ampliar e contribuir com o debate, mas no exercício de mediação, tende a utilizar muito
dos demais autores. Dessa forma não o utilizaremos na discussão aqui, para não acabar por
repetir pontos já tratados, nos detendo exclusivamente nos demais.
1.4.1.1 Esporte: uma abordagem com a fenomenologia
Iniciamos a partir do texto de Kunz (2000), em que o mesmo busca relacionar o
esporte com a abordagem fenomenológica. Acaba o autor por deter muito do espaço no texto
para a caracterização da fenomenologia, porém traça apontamentos relevantes acerca da
discussão, tratando do esporte no chamado “leque olímpico”, em que segundo o autor mesmo
quando praticado por não-atletas ou profissionais, “como prática de lazer ou na escola, tem
seus princípios de desenvolvimento fundados sobre valores físicos como força, velocidade,
resistência, coordenação e flexibilidade entre outros”, apresentando assim como regras básicas
a sobrepujança e a comparação objetiva. Desenvolve a partir dessas duas regras “medidas para
atender a otimização de rendimentos e a maximização de resultados, como a especialização; o
selecionamento; e a instrumentalização”. Assim o autor defende enquanto “partes inerentes
em todas as fases de realização de movimentos e condutas deste esporte a sensibilidade,
percepção e intuição” tratando-as como “decisivas na qualidade da execução de diferentes
movimentos” desenvolvendo o restante do texto, a partir da explicação dessas manifestações
humanas à luz da fenomenologia, articulando com a prática esportiva num âmbito mais geral,
não se detendo principalmente na escola.
1.4.1.2 Esporte na escola e esporte de rendimento
Seguindo para o texto de Bracht, este autor introduz a discussão com questionamentos
relacionados à polêmica do tema, e conclui que o “reascendimento da polêmica é suscitada
muito mais pelas ações ligadas a política para o setor dos últimos dois governos federais
através do INDESP” que busca uma efetivação dos ganhos de medalhas olímpicas
principalmente para o Brasil, investindo no âmbito das Ciências do Esporte relacionando aos
Centros de Excelência, que segundo o autor objetivam, dentre outras coisas, detectar talentos
esportivos.
Nas suas demarcações, Bracht destaca que o “objeto não é propriamente o esporte de
28
rendimento e sim, a relação entre o esporte de rendimento e a educação física, entendida esta
enquanto uma prática pedagógica”. O autor é categórico ao dizer que o “esporte de
rendimento foi colocado sob suspeita” a partir do desenvolvimento no âmbito da sociologia da
educação, das teorias da reprodução, enfatizando assim o papel conservador do sistema
educacional nas sociedades capitalistas, trazendo “na sua estrutura interna, os mesmos
elementos que estruturam também as relações sociais”. A partir dessas críticas feitas,
principalmente da década de 1980, o autor aborda em seu texto o que ele chama de
“equívocos/mal entendidos”, desenvolvendo quatro deles.
O primeiro equívoco/mal-entendido, segundo Bracht, ficaria direcionado a “quem
critica o esporte é contra o esporte” criando dessa forma “uma visão maniqueísta: ou se é a
favor, ou se é contra o esporte”. Para o autor, essa visão é considerada tosca, pois “trabalha
com pressupostos de que o esporte é algo a-histórico”, divergindo dessa forma dos autores que
falam em “essência do esporte” ou “natureza do esporte”. O autor apresenta o esporte como
algo construído pelo homem histórico-socialmente em “constantes transformações e fruto de
múltiplas determinações”, o que remete a que as “críticas ao esporte só podem ser endereçadas
ao seu sendo, a como ele se apresenta historicamente”, buscando colaborar para que o “esporte
assuma outras características, mais adequadas a uma outra concepção de homem e sociedade”.
Por final desse tópico o autor esclarece que “negar o esporte não vai ao sentido de aboli-lo” ou
de “negá-lo enquanto conteúdo das aulas de educação física”, pelo contrário, o autor defende
que a modificação pretendida se dará através do trato pedagógico numa perspectiva crítica.
O segundo equívoco/mal-entendido é relacionado à negação da técnica por parte dos
críticos do esporte nas aulas de educação física. O autor deixa claro que “é fundamental
perceber que a técnica é (deve ser assim considerada) sempre um meio para atingir fins” e não
como ela vem se colocando, atingindo “grande centralidade” no sistema esportivo, reforçando
essa proposta dizendo que:
a pedagogia crítica em EF propôs/propõe, não é a abolição do ensino das técnicas, ou seja, a abolição da aprendizagem de destrezas motoras esportivas. Propõe sim, o ensino de destrezas motoras esportivas dotadas de novos sentidos, subordinadas a novos objetivos/fins, a serem construídos junto com um novo sentido para o próprio esporte (2000, p.XVI).
O terceiro equívoco/mal-entendido remete à contraposição entre o rendimento e o
lúdico. Aqui Bracht alerta para as idealizações do lúdico e ressalta que este não existe na sua
forma pura, sendo assim moldado culturalmente. Observa também, enquanto conseqüência
29
paralela a acusação àqueles que “defendem o esporte enquanto jogo, de negarem a aptidão
física ou a atividade física enquanto promotora de saúde”. O autor esclarece que “não se trata
de negar os beneficios das práticas corporais para a saúde” mas sim “de não reduzir o sentido
destas práticas a este objetivo e também, de não entender a especificidade da EF (e sua função
na escola) seria exatamente a promoção da saúde”.
Finalizando os equívocos/mal-entendidos, ele traz que o trato crítico do esporte
acarretaria em “abandonar o movimento em favor da reflexão”, transformando assim “as aulas
de EF em aulas de sociologia/filosofia do esporte” dentro da sala de aula. Segundo o autor,
“não se trata de substituir o movimento pela reflexão, mas de fazer esta acompanhar aquele”,
conjuntamente a um processo de reconstrução.
Em suas considerações finais Bracht enfatiza que, no seu entendimento, “o esporte na
escola só tem sentido se integrado ao projeto político-pedagógico”, sendo que esse deve
entender “como problemático educar no sentido da integração ao sistema societal” pois
somente assim “a maioria das críticas ao esporte de rendimento feitas pela pedagogia crítica
fazem sentido”.
Por fim o autor ressalta que “pedagogizar o esporte tornou-se um problema para o
sistema esportivo”, pois esse gera um confronto “com os princípios, com a lógica que orienta
as ações no âmbito do esporte”, defendendo que se deva privilegiar na escola o esporte com
“significado menos central ao rendimento máximo e à competição” e sim ao “rendimento
possível e a cooperação”.
1.4.1.3 Sobre o esporte para crianças e jovens
O artigo de Gaya traz no seu cerne a pluralidade acerca das visões relacionadas ao
esporte, sustentada na afirmação de Jorge Bento12 de que “o esporte é polissêmico e
polimorfo”, não podendo dessa forma “ser apreendido em sua complexidade de formas e
sentidos por qualquer teoria unificadora”. Dessa forma o autor entende “que as práticas
esportivas através de suas diferenciadas formas de expressão propiciam diversos sentidos ou
significados que diferem a partir dos objetivos, dos sentidos e das necessidades atribuídas por
seus praticantes”. Tem influência de dois autores portugueses, Boaventura Souza Santos e
Leonardo Coimbra, em que ambos utilizaram de espelhos como “objeto para criar uma
12 No texto original o autor faz a citação sem colocar a referência exata como ano, página, livro ou artigo, etc.
30
imagem metafórica por demais interessante para explicitar suas idéias” sendo assim o autor
utiliza dos espelhos “para introduzir meus argumentos de ordem epistemológica no debate
sobre o esporte na escola e o esporte de rendimento”.
Inicia assim uma história relacionada a uma viagem que o mesmo fez para uma cidade
do interior do Rio Grande do Sul, em que em determinado momento autores “cujo interesse
em estudar o esporte originam-se em áreas diversas das ciências do esporte” acompanham o
mesmo na viagem. Professores ligados à fisiologia do esporte, biomecânica, aprendizagem e
desenvolvimento motor, treinamento esportivo ou aptidão física, psicologia, história,
antropologia e social13 são citados, mostrando rapidamente o que seria a descrição de cada
grupo de professores no mesmo contexto, apresentando diversos discursos sobre o esporte. Ao
final desse espaço tece uma crítica à pedagogia crítica sustentada por Bracht em seu artigo, a
partir dos espelhos novamente, intitulando a mesma de “espelho super-ego”.
O autor refere quatro expressões para o esporte: esporte de excelência, esporte escolar,
esporte de lazer e esporte de reabilitação e reeducação. Se detém no texto seguindo as
orientações propostas pela Revista Movimento, no esporte de excelência, termo que o autor
tem preferência em relação a esporte de rendimento e esporte na escola.
Gaya remete à dificuldade de comunicação, em grande parte, o motivo das desavenças
relacionadas ao esporte de excelência, conjuntamente na falta de consenso na definição do
esporte de alto rendimento, motivando “interpretações muito diversas o que acaba por
proporcionar um debate entre estudiosos que usam as mesmas palavras, todavia com
significados distintos”. Assume a definição de DaCosta, acerca do esporte de excelência,
sendo esse uma “expressão na qual predomina aspectos parciais do comportamento corporal e
motor, objetiváveis e mensuráveis” e nas palavras de DaCosta apud Gaya “expressão corporal
e motora em que se evidencia um fluxo contínuo de ações com comportamentos ordenados e
estáveis, aos quais se aplicam os propósitos fundamentais de padronização, sincronização e
maximização”.
A partir dessa definição o autor observa que, pautado nos objetivos do esporte de
rendimento, enfatizando a maximização de desempenho, ele é “inadequado para constituir-se
como conteúdo da educação física escolar”. Porém diverge de Kunz e Bracht, entendendo
“que o esporte de excelência não deixa de proporcionar a seus praticantes mais jovens
aspectos de alto sentido formativo e educacional”.
13 Os termos são utilizados dessa forma pelo autor.
31
A discussão sobre o talento esportivo também ganha espaço no texto do autor, dizendo
que “não é uma questão que possa ser tratada no âmbito da educação física escolar”. As
demais divergências são direcionadas a Bracht, no que diz respeito à obsessão pela vitória e à
forma como os profissionais atuam em relação ao esporte de rendimento nos programas de
treinamento.
Enfatiza o autor que, divergindo de Bracht e Kunz, não compartilha da necessidade da
reformulação do esporte enquanto conteúdo da educação física. Deixa claro assim que não tem
acordo com as propostas que buscam minimizar as categorias centrais como rendimento e
competição. O desacordo principal do autor é relacionado à imputação sobre as práticas
esportivas dos valores críticos referentes às ideologias dominantes.
Mais além no texto o autor converge com os autores da pedagogia crítica, se referindo
à utilização das aulas de educação física para treinamento de equipes, se colocando contrário a
essas práticas. Ressalta que o esporte na escola tem objetivos distintos do esporte de
excelência, porém deixa claro que “na escola, e aqui não vai nenhuma novidade, o esporte
deve ser orientado pelo princípio do auto-rendimento. Onde todos tenham a oportunidade para
aprendê-lo e atingir os melhores níveis possíveis, se assim o desejarem”. Aumenta mais a
polêmica ainda quando defende o “esporte escolar como disciplina”, deixando claro que essa
proposta não se confunde com formação de equipes, não possuindo assim, segundo o autor,
“qualquer caráter de exclusão por critério de performance”. Por fim, o autor defende, desde
que hajam condições, a “incrementação nas escolas dos clubes esportivos”.
1.4.1.4 Desporto educacional: realidade e possibilidades das políticas governamentais e das
práticas pedagógicas nas escolas públicas
Passamos agora para o artigo da Taffarel. Ela inicia colocando as três dimensões a
serem levadas em conta na reflexão crítica direcionada ao desporto14 educacional, sendo elas a
gênese do desporto, a análise das políticas públicas e as práticas pedagógicas. A autora discute
a articulação entre os interesses políticos e econômicos de exploração do mercado, colocando
a escola como espaço privilegiado para a introdução e ampliação desse mercado, sendo
enfática ao dizer que “a estratégia para tal é máxima: escola é celeiro de atletas”. Seguindo o
texto, reconhece as estratégias de recomposição da hegemonia do capital, elencando três
14 A autora opta por utilizar o termo desporto, deixando claro que tanto desporto com esporte têm o mesmo sentido.
32
pontos: a) reestruturação produtiva, ligada à organização do mundo do trabalho na garantia
das relações de produção; b) a formação do Estado, em que através das reformas e de ajustes
estruturais, garantam as relações na sociedade de classes, garantindo a supremacia imperialista
estadunidense e; c) formação de consciências, adequadas as tais reestruturações e ajustes,
recorrendo a tudo que possa sustentar essas posições privilegiadas da burguesia, inclusive o
desporto.
Taffarel diz que na passagem dos Jogos Olímpicos Modernos de 1896 para as empresas
patrocinadoras dos Jogos Olímpicos, submeteu o esporte a uma lógica produtivista, ligada ao
rendimento, e a seu modo de avaliação, a moeda. Dessa forma a autora coloca o agravamento
do fenômeno subordinado as leis econômicas, em que o “capital transnacional assumindo a
direção das empresas esportivas lucrativas e a eliminação exclusão do considerado não
rentável”. Alertando para que num dos grandes bolsões de miséria da América Latina15, a
educação física e esportes na universidade e no Sistema Nacional de Educação Pública, “esta
sendo considerado imediatamente não-rentável”, e que o rentável está localizado no âmbito de
consumo de produtos da indústria cultural esportiva. A partir dessa constatação de ordem
econômica, elenca três movimentos que auxiliaram nesse sentido:
a) esporte aparecendo como uma espécie de nova religião, o único modo de comunicação universal e acessível, oferecendo investimentos afetivos, resguardando símbolos e alimentando mitos e ainda, prestando-se a dramaturgia – manipulação do imaginário popular -pelos meios de comunicação de massa, via televisiva; b) (...) a manipulação dos “valores esportivos” como lealdade, o senso de responsabilidade, o esforço pessoal, o espírito de equipe, caros as novas formas de gerenciamento cientifico da produtividade e da exploração da mais-valia. c) criação de necessidades, com a emergência de um tempo livre e o desenvolvimento do mito do corpo, criando-se um verdadeiro setor econômico (2000, p.XVII).
Ao tratar dos questionamentos que o desporto vem sofrendo, seja relacionado às
políticas pública, remetendo à figura do então presidente da República16 Fernando Henrique
Cardoso, ou relacionada às práticas dos professores, ressaltando as péssimas condições
objetivas de trabalho, a falta de financiamento, a inacessibilidade ao conhecimento cientifico,
a precarização tanto da formação inicial quanto da continuada. Assim ela diz que o desporto
educacional vem sendo questionado devido à atual caracterização hegemônica que ele tem,
não contribuindo “para debelar a revoltante e desumana desigualdade social e não está
sintonizado com os anseios de uma sociedade justa, pelo contrário, acentua e assegura
15 Referindo-se ao nordeste brasileiro.16 Na época da escrita do artigo.
33
desigualdades”. A autora entra em acordo com Kunz (1994) quando resume as críticas ao
esporte, seja na sociedade ou na escola: o esporte não apresenta elementos de formação geral,
na sua prática hegemônica; quando ensinado na escola seguindo a lógica das competições ou
do rendimento, fomenta vivências de sucesso para uma minoria, e fracasso ou insucesso para a
grande maioria; isso é considerado pelos autores como uma irresponsabilidade pedagógica por
parte dos professores que fomentam essas vivências; e o esporte de rendimento segue os
princípios básicos da sobrepujança e das comparações objetivas; defendendo ao final, a autora,
a reinvenção do esporte.
Dessa forma Taffarel confronta em seu texto, dados referentes ao desporto no Brasil,
retirados do Diagnóstico da Educação Física/Desporto realizado em 1969 com os atuais. Os
dados são relacionados à política do governo, política nacional, formação de professores,
inserção da educação física nas escolas, educação física no ensino superior, espaços urbanos,
organização desportiva, participação feminina, escolas de preparação de professores
(denominadas escolas normais) e questões jurídicas. A constatação é que “contraditoriamente
muitas das variáveis estudadas continuam hoje apresentado, na essência, os resultados trágicos
da década de 60” confirmando, segundo a autora, as “tendências à destruição, à degeneração, à
desagregação, à precarização e, só aparentemente, podem ser visualizadas superações nos
indicadores estudados”.
A partir desses levantamentos, Taffarel ressalta as dimensões básicas a serem atingidas,
em que enfatiza que sem as quais compromete qualquer intenção política no âmbito
educacional:
1. sólida formação inicial e continuada dos profissionais propiciada por consistente base teórica; 2. as condições objetivas de trabalho; 3. alterações a organização do processo de trabalho 4.salários dignos e plano de cargos e salários para os trabalhadores da educação; 5. consistente base organizativa, reivindicatória e confrontacional dos setores envolvidos e interessados pela qualidade na educação e na educação física (2000 p.XXIII).
Esclarecendo que o desporto não pode estar desarticulado das políticas públicas da
educação e de bem estar da população, não podendo também estar fora do projeto político
pedagógico da escola, e por final “fora do grande esforço de reinvenção da própria sociedade.”
Portanto a autora começa a trilhar o caminho para a reinvenção do esporte, inicialmente
através do acesso real à cultura corporal, entendendo o esporte enquanto uma produto dos
homens e mulheres, ou seja, “sua realidade e suas possibilidades estão inseridas na aventura
34
humana”, diferente do entendimento natural. A superação, no plano de políticas públicas,
sustentada por Bracht, da idéia da pirâmide esportiva são indicações da autora, ao lado da
reorientação das relações com a cultura, lazer e esporte, no sentido de uma perspectiva de
formação cultural crítica e divertida intimamente relacionada à auto organização e
participação.
Vale destacar que a autora adverte, juntamente com Castellani Filho (2002), “que a
desesportivização da educação física não deve conduzir a desconsideração e abandono do
esporte enquanto conteúdo dela”, mas sim levar a uma crítica à mentalidade esportiva.
Ressalta o resgate da ludicidade como possibilidade no sentido da reinvenção do esporte, e
conclui dizendo que o “desporto educacional não pode ser discutido, pesquisado, vivenciado
fora da teoria pedagógica”, e indo mais além “fora do marco político, ideológico, da luta de
classes reduz a possibilidade de compreensão das problemáticas significativas relacionadas ao
desporto educacional”.
1.4.1.5 Relações entre o esporte de rendimento e o esporte na escola.
O artigo de Stigger inicia convergindo com Bracht em relação aos “motivos externos”
para o reascendimento da polêmica, mas diz que buscará contribuir, a partir de razões internas,
as quais, para o autor “contribuem para o seu renascimento”.
Começa o debate apresentando a discussão contemporânea do esporte visto numa
perspectiva sociocultural, sustentando em vários autores, estabelecendo dois campos: a
homogeneidade e a heterogeneidade do esporte.
O privilegio de aspectos estruturais da sociedade, remetendo especial atenção à
questões sociais, políticas e econômicas caracterizam a visão homogênea do esporte,
caracterizando assim o “esporte como uma realidade cultural específica”. O autor traça como
um dado em comum nessa abordagem “é a origem das suas análises, as quais têm como
referências fundamentais as observações e reflexões relacionadas com competições esportivas
de grande evidência”. Dessa forma, segundo Stigger, esses autores criticam o esporte moderno
pelo excesso de competitividade, “ideologicamente reprodutor dos valores dominantes, e fator
de alienação e exclusão social”. Finaliza o autor nesse ponto, dizendo que a partir dessa
abordagem, o esporte se identificaria como uma atividade desenvolvida numa “perspectiva
monocultural”, se expressando de uma maneira, “independente dos locais em que fosse
35
praticado, assim como das características, interesses e motivações dos seus praticantes”.
A segunda perspectiva, da heterogeneidade, segundo o autor, volta-se para “aspectos
individuais e subjetivos dos atores sociais”. Para a gama de autores que defendem essa
posição, tal como o autor do artigo, “o esporte poderia ser visto como uma prática social
passível de ser apropriada de forma diferente em diversas realidades específicas, na medida
em que fosse praticado por grupos particulares”. Diferente da outra perspectiva, explica
Stigger, essa última “ao invés de apresentar a sociedade como um todo de valores e funções
sociais, que conferem coerência e funcionalidade ao sistema, destaca as relações de conflito
entre diferentes grupos sociais”. Dessa forma, é identificada, pelos autores, na prática de
esportes possibilidades “de se desenvolver numa perspectiva multicultural” se expressando na
diversidade das manifestações, pra além do esporte espetáculo, ocorrendo “vinculado ao
contexto cultural em que o esporte fosse praticado, assim como às características dos seus
praticantes”.
O autor passa para o próximo ponto do artigo, trazendo referências da discussão na
educação física brasileira, dizendo que prevalece a perspectiva homogênea do esporte nas
formulações que emergem da década de 1980, alertando para que, mesmo com alguns
movimentos partindo dos autores no sentido de propostas motivados por um otimismo prático
(KUNZ, 1994, p.6) voltadas para uma visão multicultural do esporte, o que prevalece no
pensamento da comunidade é um “pessimismo teórico” (ibid.).
Desenvolvendo brevemente pontos relacionados a perspectiva heterogênea, com
exemplos empíricos feitos em trabalho anterior, o autor, que privilegiou aspectos
microssociais do esporte, caracterizando por ser uma “análise interpretativa da cultura, a qual
não esta à procura de leis sociais, mas preocupada em compreender o significado que está
prática social tem para os seus praticantes, em universos culturais específicos”, observa a
discussão da categoria rendimento, comprovando através dos depoimentos dos seus
colaboradores do trabalho de campo a falta de preocupação em relação a esse tema, dizendo
que a mesma não é central para aqueles grupos estudados. Assume a posição próxima àqueles
que defendem a transformação do esporte na escola, pautando a educação física enquanto uma
prática pedagógica, que objetiva tematizar, no contexto escolar, os conteúdos da cultura
corporal, entre eles o esporte. Ao final do texto apresenta um trabalho desenvolvido por
Molina Neto17 com os estudantes da graduação da Escola de Educação Física da Universidade
17 Trabalho sistematizado e publicado em forma de artigo na revista Movimento de 1995.
36
Federal do Rio Grande do Sul. Através da problematização, buscou relacionar o conhecimento
que os alunos tinham com possibilidades ou alternativas àquele modelo, em que ao final do
trabalho, o autor pode identificar mudanças de comportamento “em relação as possibilidades
educacionais do ensino do futebol e das expectativas que os alunos tinham da disciplina”.
Concluindo, o autor diz reconhecer a validade de muitos aspectos das formulações dos
trabalhos acadêmicos, porém alerta que muitas de suas “conclusões são muitas vezes frutos de
reflexões teóricas e de observações distanciadas do espaço concreto onde o esporte acontece”
tendo muitas vezes suas formulações sustentadas por “reflexões realizadas sobre competições
esportivas oficiais”.
1.4.1.6 Técnica, esporte, rendimento
O artigo de Vaz inicia dizendo que “o debate acadêmico nem sempre foi tranqüilo,
também porque ao questionar o esporte, ele colocou sob suspeita (moral?, política?) aqueles
que se ocupavam com sua prática, desestruturando uma das mais fortes fontes de identidade
dos professores e professoras de educação física”. Busca inspiração na obra de Theodor W.
Adorno, detendo-se principalmente na questão da técnica, algo que para o autor parece
fundamental, porém insuficientemente discutido.
O autor cita a linguagem matematizada , na análise da busca do rendimento cada vez
maior no esporte, dizendo que “construímos, é bom que se lembre, uma sociedade que ama
grandes números, e detalhadas estatísticas”. Assim, para ele
a preocupação com rendimento traduzido em números, obedecendo a lógica do progresso quantificável, aparece em nossas diversas manifestações sobre o fenômeno que, tecnificados, parecem perder sua qualidade intrínseca, seu conteúdo internos, degradados em números (2001, p.93).
Dessa forma, o autor deixa claro que a questão da “fascinação pela técnica e pelo
progresso” não se limita , não se esgota no esporte. Segundo Vaz,
[...]o esporte apenas radicaliza essa fascinação, reforçando a fé de que o progresso do corpo é infinito. Talvez isso aconteça porque oe sporte tende a tornar tudo passível de mensuração, o que facilita a comparação objetiva, sem a qual a idéia de rendimento se tornaria inócua (20001, p. 93).
Assim, o autor destaca que os elementos da cultura corporal e o esporte “devem ser
37
duplamente aprendidos: por um lado pela mediação reflexiva sobre os temas relacionados ao
corpo e à corporeidade; por outro lado pelas dimensões técnica e mimética, pela aproximação
estética entre sujeito e objeto (2001, p. 95).
1.4.2 Intelectuais da educação física
A partir das leituras feitas tanto no que tange a produção da Revista Movimento,
relacionado aos Temas Polêmicos, quanto aos demais, situamos os autores dessas produções
com intelectuais da educação física. Deixamos claro que não entendemos eles como os únicos
formuladores do direcionamento ideológico que a educação física vem tendo, mas como
alguns dos principais. Isso se deve ao fato desses atuarem em universidades que formam
futuros professores e ampliando o alcance pra além do espaço em que eles se encontram,
formularem a partir de suas concepções e produções acadêmicas, difundidas através de
artigos, livros, revistas, entre outros, defendendo dessa forma teorias que são utilizadas por
outros professores em outros espaços.
Gramsci (1978, p.10) em suas formulações desenvolve o conceito de intelectual
partindo da premissa de que “todos os homens são intelectuais; mas nem todos os homens
desempenham na sociedade a função de intelectuais”. O autor traz que cada classe cria seus
intelectuais:
Cada grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo e de um modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico, mas também no social e no político (1978, p.7).
Diante disso, Gramsci descreve que os intelectuais são os responsáveis pela tarefa de
tratar das funções da hegemonia social e do domínio político, sendo que esses dois pontos
dizem respeito, respectivamente a:
1) do consenso “espontâneo” das grandes massas da população quanto à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante, à vida social, consenso que nasce “ historicamente” do prestigio (e, portanto, da confiança) que o grupo dominante obtém, por causa de sua posição e de sua função no mundo da produção; 2) do aparato de coerção estatal, que assegura “legalmente” a disciplina dos grupos que não “consentem”, nem ativa nem passivamente, mas que é constituído para toda a sociedade, na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais fracassa o consenso espontâneo (1978, p. 14).
38
Dessa forma, Gramsci explica que os intelectuais – ligados à classe dominante – são os
responsáveis por manter a coesão do bloco histórico, elaborando e construindo a hegemonia
que mantém a classe dominante na direção da sociedade, que sem essa hegemonia através dos
canais já citados, se daria através da força repressiva. Dias (2006) desenvolvendo acerca dos
intelectuais, enquanto direção, ressalta que:
os intelectuais formados por esses saberes de classe tornam-se disponíveis para o exercício de elaboração/manutenção da ordem intelectual e política dominante. São eles que ditam o universo das questões, o que ler, os que julgam a legitimidade intelectual podendo desqualificar o pensamento do(s) outro(s). ao proceder desse modo, se expressam sempre na forma da expansão/defesa das classes dirigentes/dominantes. Trabalham no interior da ordem (2006, p.109).
Giroux, relacionado o conceito com os intelectuais da educação, mais precisamente os
educadores radicais, a partir dos papéis contraditórios realizados pelos educadores dentro das
escolas, destaca a “posição paradoxal” enfrentada pelos educadores tanto na escola como na
universidade. Apresentando dessa forma os dois lados da questão, por um deles o fato de que
esses intelectuais estão submetidos a uma instituição – a escola ou a universidade – que tem
por objetivo desempenhar um papel fundamental na produção da cultura dominante, e por
outro, ao definirem seu terreno político, oferecem a seus alunos “discursos alternativos e
práticas sociais críticas, cujos interesses estão frequentemente em dissonância com o papel
hegemônico da escola e com a sociedade que a mesma apóia”(1987, p.40).
A relação da aproximação teórica feita com os artigos da Revista Movimento e com as
idéias de Gramsci, especificamente na busca do consenso “espontâneo”, nos auxilia a buscar
alguns apontamentos dos motivos que levam o esporte a assumir o espaço enquanto conteúdo
hegemônico das aulas de educação física. Os intelectuais da educação física, especificamente
os formuladores das abordagens, tendências, metodologias, daí para além dos citados, e para
além daqueles artigos, entrando no desenvolvimento das formulações e produções acadêmicas
mais ampliadas daqueles autores e os direcionamentos que elas geram, principalmente no
processo de formação inicial, deixando claro que esse direcionamento não acontece de forma
mecânica e unilateral, mas de forma dialética, conseguimos iniciar a procura dos motivos que
possibilitam a compreensão do esporte enquanto conteúdo hegemônico nas aulas de educação
física. O que queremos evidenciar aqui é que essa construção foi e vem sendo feita por
homens e mulheres, sujeitos históricos agentes da transformação e sendo assim, não é algo
natural, dado ou irreversível.
39
2 DECISÕES METODOLÓGICAS
As decisões metodológicas, em determinado estudo, constituem-se em importantes
“passos” ao longo da “caminhada”. Concordamos com Freitas (1995) e Triviños (2001)
quando afirmam que no processo de estudo a teoria do conhecimento orienta o mesmo,
precedendo questões e decisões metodológicas. Dessa forma, utilizamos da teoria crítico-
superadora, apresentada principalmente no Coletivo de Autores (2005). Essa escolha é feita
partindo de alguns pressupostos: 1) o entendimento do avanço qualitativo que significou para
a educação física, a partir do acúmulo da segunda metade da década de 1980; 2) por também
tratar o esporte e a educação física a partir de uma perspectiva transformadora, não se
limitando em analisá-lo unicamente, mas propondo intervenções nesse sentido; 3) por tratar
também, segundo Castellani Filho (2002), de uma das concepções propositivas sistematizadas,
ao lado da aptidão física18.
Os apontamentos acima reforçam a constatação de que todo o método implica em uma
teoria. Deixamos claro dessa maneira que esse estudo se pauta numa perspectiva crítica e
superadora às relações sociais determinadas, buscando traçar apontamentos, tendo como
referência a prática pedagógica da educação física no bojo do processo de compreensão do
modo de produção no qual vivemos, dessa forma tendo clareza das relações de explorações
postas na sociedade, apontando assim as contradições do esporte na escola, para intervir no
sentido de mudá-lo e transformá-lo.
2.1 Problema da pesquisa
O problema de pesquisa que direcionou todo o processo referente a essa pesquisa é
descrito da seguinte maneira: Quais as implicações que o esporte, enquanto conteúdo
hegemônico da prática pedagógica dos professores de educação física na escola,
acarretam para a educação física?
Acreditamos que a aproximação, tanto da literatura quanto ao campo, possibilitou
desdobramentos referentes tanto à temática do esporte, quanto da prática pedagógica em
educação física, como da própria formação de professores, entre outros.
18 Ver mais em Castellani Filho (2002).
40
2.2 Caracterização do estudo
Analisamos nesse estudo, a prática pedagógica relacionada ao esporte, dos professores
de educação física, de uma escola da rede estadual gaúcha. Nos detivemos nas quatro séries
finais do ensino fundamental, pois é em uma dessas séries que acontece a passagem da
unidocência para a de um professor por disciplina, e também por entendermos que o esporte
começa a ser trabalhado efetivamente nas aulas de educação física, tomando proporções
maiores. É a partir daí que a crianças já começam a ter mais autonomia na escola e reivindicar
mais o esporte como conteúdo, e também trabalhar com o mesmo implica em menos
dificuldades do que nas séries iniciais, devido ao próprio desenvolvimento corporal dos
estudantes. É nesse momento que fica mais claro as questões relacionadas à inserção nas
práticas esportivas e as reais implicações que o ensino do esporte na escola apresenta.
Assim, optamos por uma turma de cada série, sendo uma 5.ª série, uma 6.ª série, uma
7.ª série e uma 8.ª série. As quatro turmas possuem professores distintos, dessa forma, tendo
quatro colaboradores. A divisão dos períodos não era algo homogêneo, ou seja, igual nas
quatro séries.
Para analisar a prática pedagógica de professores de educação física, relacionada ao
esporte, na escola pública, realizamos um estudo de caso, tendo como principais instrumentos
de coleta de informações a análise de documentos, a observação participante e entrevistas
semi-estruturadas. Para Molina (2004, p.99) “no âmbito educativo, o estudo de caso pode ser
definido como sendo aquele que se ocupa da compreensão de uma ação educativa em uma
dimensão especifica” tendo como grande vantagem “o fato desse conectar-se rapidamente com
a realidade” possibilitando maior interação “teórico-prática e por isso, afastar mais os riscos
de simplificações”, em que através dele “podemos teorizar a partir da prática, teorizar sobre a
prática ou teorizar quanto a transformação desta”. É partindo dessa constatação, alicerçada na
teoria já citada acima, que buscamos não somente compreender o fenômeno, mas apontando
possibilidades para uma mudança.
Para Triviños (1987) o estudo de caso é um “tipo de pesquisa cujo objeto é uma
unidade que se analisa profundamente” dessa forma determinando “duas condições básicas
dele: a abrangência da unidade e também sua complexidade”. André (1998), sintetizando
idéias de vários autores, coloca que o estudo de caso deve ser usado: 1) quando se está
interessado numa instância em particular, isto é, numa determinada instituição, numa pessoa
41
ou num específico programa ou currículo; 2) quando se deseja conhecer profundamente essa
instância em particular em sua complexidade e totalidade; 3) quando se estiver mais
interessado naquilo que está ocorrendo e no como está ocorrendo do que nos seus resultados;
4) quando se busca descobrir novas hipóteses teóricas, novas relações, novos conceitos sobre
um determinado fenômeno; e 5) quando se quer retratar o dinamismo de uma situação numa
forma muito próxima do seu acontecer natural.
Foi dado ênfase, como já dito anteriormente, a três elementos de coleta de informações
para desenvolver esse estudo: análise de documentos, observação participante e entrevista
semi-estruturada.
2.2.1 Análise de documentos
A análise de documentos, por mais que não seja muito explorada, pode se constituir
“numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as
informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou
problema” (ANDRÉ; LÜDKE, 1986, p.38).
A análise de documentos procurou buscar dados e informações referentes a escola,
professorado, alunos, conjuntura tanto local quanto em níveis mais amplos, dando o suporte
teórico, principalmente histórico, com informações sobre os aspectos que envolvem a
temática, com a finalidade tanto de situar o local específico de realização da pesquisa,
expondo suas características peculiares e sua descrição mais aproximada do real, quanto de
buscar elementos que auxiliem na discussão que propomos nesse trabalho. Os principais
foram o Projeto Político Pedagógico do Instituto de Educação Estadual Paulo da Gama, as
orientações da Secretaria Estadual da Educação do Estado do Rio Grande do Sul, o plano de
trabalho dos professores de educação física da escola, as políticas do Estado, as aproximações
ao currículo de formação dos professores do ano de 2008, a Leis de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, os Parâmetros Curriculares Nacionais, os regimentos dos jogos escolares,
tanto dos Jogos Escolares do Rio Grande do Sul (JERGS) quanto do projeto Guri Bom de
Bola.
42
2.2.2 Observação participante
A observação consistiu – em linhas gerais – na vivência do investigador no contexto
que pretende investigar (STIGGER, 2002). O objetivo dessa técnica é observar com
determinada atenção traços e manifestações que o campo possa trazer para o estudo. Ela
possibilita “um contato pessoal e estreito do pesquisador com o fenômeno pesquisado”
(LUDKE; ANDRÉ, 1986, p.26).
Dessa forma, inseri-me no contexto escolar em que realizei o estudo, buscando uma
interação social com os colaboradores. Isso contribuiu para reduzir a imagem de “estranho”
que poderia vir a gerar a minha inserção. Para Triviños (2001) isso é “uma oportunidade de
compreender melhor o espírito, os valores, os costumes que caracterizam essas pessoas” e essa
análise contribuirá para “descobrir [ . . . ] elementos básicos que poderão ser aproveitados para
alcançar o êxito na realização de sua pesquisa”.
Ressalto que estou me referindo a uma observação participante e não a uma mera
observação, em virtude de que já acompanho, como monitor, turmas de estagiários da Prática
de Ensino de educação física, disciplina obrigatória do curso de Licenciatura em Educação
Física na ESEF/UFRGS. Sendo assim, em diversos momentos, durante a prática das aulas, me
coloco como interventor nos processos de ensino-aprendizagem junto aos alunos da escola. É
nesse momento, então, que se caracteriza a participação deste pesquisador que observa uma
realidade, sendo que todas essas situações compõem o conteúdo do referido diário de campo.
Esse é um elemento muito importante no processo, que diz respeito à questão da
observação: o diário de campo. Optei por um caderno pequeno, para não chamar a atenção das
crianças. Ele serviu para transcrever todas as anotações relacionadas ao campo, desde o
primeiro até o último momento. Nele estão registradas questões desde os trâmites burocráticos
de inserção no âmbito escolar, as próprias constatações referentes à estrutura física das aulas,
apontamentos referentes às professoras, aos estudantes e tudo o mais que achar importante
para o estudo. Apontamentos de ordem pessoal do pesquisador estão registrados nesse espaço
também, tais como dúvidas, sentimentos, reflexões, essencialmente anotações descritivas.
Após analisar as anotações do diário de campo é que percebi o quanto ele pode contribuir com
o estudo.
43
2.2.3 Entrevistas semi-estruturadas
As entrevistas me deram o suporte necessário, pois através delas tomei contato com os
colaboradores. Ouvi a partir do ponto de vista deles, da opinião direta dos mesmos. Entrevistei
agentes do processo sendo esse método privilegiado, pois:
o que torna a entrevista um instrumento privilegiado de coleta de informações para as ciências sociais é a possibilidade de a fala ser reveladora de condições estruturais, de sistemas de valores, normas e símbolos e ao mesmo tempo ter a magia de transmitir, através de um porta-voz, as representações de grupos determinados, em condições históricas, socioeconômicas e culturais específicas (MINAYO, 1996, p. 109 – 110).
Para Lüdke e André a entrevista tem uma grande vantagem sobre outras técnicas, pois
“ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com
qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos” (1986, p.34).
O grau de liberdade também presente nesse ponto é relevante, segundo Triviños (1987,
p.146), pois estabeleceu uma relação entre o pesquisador e o entrevistado que possibilitou a
obtenção de informações precisas e necessárias ao estudo, “valorizando assim a presença do
investigador”, oferecendo “todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a
liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação”, sendo nesse estudo
optado pela entrevista semi-estruturada, tendo uma gama de perguntas traçadas, porém com
flexibilidade no sentido de ampliar essa gama de perguntas, dependendo do andamento do
dialogo, transformando a entrevista, como ressalta Triviños (2001, p.86) “num diálogo vivo do
qual participam duas pessoas com objetivos diferentes, mas que podem se tornar
convergentes” procurando “construir um conhecimento relativamente comum para
determinada realidade pessoal e coletiva”.
Essas entrevistas foram gravadas, sendo esse um passo importante, segundo Triviños
(2001) pois em primeiro lugar “o entrevistado pode escutar o que disse e introduzir nesse texto
as modificações que considere pertinentes” e em segundo lugar “a gravação permite a
transcrição da entrevista”. Elas foram realizadas individualmente, após a assinatura do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice), pelo colaborador.
Após a transcrição das entrevistas elas foram remetidas para os colaboradores que
fizeram suas ressalvas e mudanças na descrição, constituindo isso também uma intervenção do
colaborador, contribuindo com o conteúdo da entrevista.
44
2.2.4 A Escola escolhida
Optamos pelo Instituto de Educação Estadual (IEE) Paulo da Gama por alguns motivos
que consideramos de relevância para o estudo. Foi nessa escola que realizei a Prática de
Ensino, no primeiro semestre de 2007, disciplina curricular obrigatória do curso de
licenciatura plena de educação física da ESEF/UFRGS. Após ter concluído a prática de
ensino, ingressei como monitor voluntário na mesma disciplina, me inserindo nessa mesma
escola, acompanhando por um ano as atividades desenvolvidas pela disciplina, o que facilitou
o acesso ao campo de estudos. Algumas pesquisas do grupo de pesquisa no qual faço parte, o
Grupo de Estudos Qualitativos de Formação de Professores e Prática Pedagógica em
Educação Física e Ciências do Esporte (F3P -EFICE) e Trabalhos de Conclusão de Curso
(TCC) da ESEF/UFRGS também foram realizados na mesma instituição, o que possibilita, a
partir desse estudo, avanços no trato do conhecimento já produzido pelo grupo de pesquisa e
pela ESEF/UFRGS. A “parceria” com a escola proporcionou os subsídios necessários para o
desenvolvimento do estudo, devido à aproximação já existente com os professores da mesma,
com os próprios estudantes, já acostumados com os estagiários da Prática de Ensino, e com os
pesquisadores do grupo.
O IEE Paulo da Gama, está situado em uma zona que poderíamos considerar de tensão,
tendo em vista os quartéis da Brigada Militar que a envolvem, tendo o do Batalhão de
Operações Especiais (BOE) à frente e ao lado, conjuntamente com o canil da Brigada Militar
numa das laterais também. Outro prédio que interfere também o cotidiano escolar é o Presídio
Central de Porto Alegre, situado a poucos metros da escola. Esse contexto todo tem
interferência significativa na realidade escolar. Um elevado número de crianças tendo seus
pais ou outros parentes detidos residem nos arredores do presídio, da mesa forma que a escola
comporta também filhos de brigadianos19 que moram nos arredores dos quartéis. Ao lado do
fato da escola estar situada na periferia de Porto alegre, atendendo principalmente crianças de
classe média baixa e baixa, segundos os dados do Projeto Político Pedagógico.
A escola possui três quadras poliesportivas, sendo duas que poderíamos chamar de
abertas, pois não possuem telas na sua volta, e uma fechada, conhecida como a “gaiola”,
levando esse nome devido às altas telas que a cercam. Há também o saguão do bar da escola,
19 É como são conhecidos os policiais militares no Estado do Rio Grande do Sul.
45
que é utilizado para algumas práticas, porém vem sendo discutido entre os professores, a não
utilização desse espaço para práticas de educação física, devido ao barulho que atrapalha as
demais aulas. Existe ainda o estacionamento, que se divide em dois espaços abaixo das
quadras, sendo que em alguns momentos várias turmas utilizam o pátio, e o estacionamento se
divide em três. Há uma discussão também acerca desse espaço, pois alguns professores da
escola reivindicam esse espaço para poderem estacionar seus automóveis, devido à falta de
segurança em deixá-los na rua, a partir de alguns casos de arrombamento de carros em frente à
escola. Porém o espaço estava sendo utilizado pela educação física. O “areião”, ao lado da
“gaiola”, também se configura como espaço para as aulas de educação física, além do saguão
destinado às turmas de 1.ª a 4.ª séries.
Por mais que as duas quadras tenham sido reformadas nesse ano, o principal espaço da
educação física na escola é a “gaiola”. Além das telas que auxiliam para que durante o jogo a
bola não vá para longe, a quadra também é boa, gerando a preferência por parte das crianças.
2.2.5 Os professores colaboradores
Contamos nesse trabalho com a colaboração de quatro professores. Optamos por trocar
seus nomes verdadeiros por nomes fictícios, a fim de preservar suas identidades. Abaixo
apresentamos um quadro com algumas informações sobre os professores, que consideramos
relevantes para o estudo.
Nome Série obs. Carga horária no Estado
Carga horária fora da escola
Tempo de serviço
Prof.ª Carla 5.ª 20 h 15 h Não informadoProf. Sílvio 6.ª 49 h Não possui 30 anos
Prof.ª Roberta 7.ª 20 h 20 h 13 anos
Prof.ª Amália 8.ª 32 h 15 h 6 anosQuadro 1: Professores colaboradores do estudo
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3 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES: A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO ESPORTE NA
ESCOLA
Nesse espaço do trabalho, estabelecemos a relação entre a literatura e as informações
empíricas, conjuntamente com as nossas formulações, buscando sínteses relacionadas ao
problema que está direcionando este trabalho. Dessa forma, a partir das análises da literatura
referente à temática esporte na escola, bem como com a leitura sistemática das informações do
campo referente a análise de documentos, as observações e as entrevistas, elencamos enquanto
categorias o esporte como conteúdo hegemônico na escola, conjuntamente com o esporte na
lógica do rendimento, sendo outra categoria. A prática pedagógica nas aulas de educação física
surge a partir da análise principalmente da realidade observada, relacionada também com o
aporte teórico a que nos aproximamos. Por fim, algo que emergiu principalmente do campo,
são os jogos competitivos escolares, que está elencado como categoria também, porém, com
outro nome chamado aqui de desfile de pobreza.
Optamos aqui por elencá-las tendo como primeiro a prática pedagógica, seguido do
esporte enquanto conteúdo hegemônico na escola, lógica do rendimento, e por fim os jogos
competitivos.
3.1 Prática pedagógica nas aulas de educação física
A prática pedagógica da aula de educação física sofre diversas interferências, tal como
as demais disciplinas, porém, tem uma peculiaridade em relação a essas pois em grande parte
suas atividades são realizadas fora da sala de aula, se tornando assim, como relatou a Prof.ª
Roberta, as aulas de educação física bem transparente, “diferente das outras que fecham a
porta e tu não sabe o ta acontecendo lá dentro”, caracterizando a aula como “uma vitrine”.
O barulho que atormenta a escola, seja nos treinamentos do BOE no campo da frente,
com cachorros, tiros, bombas, ou helicópteros, seja com as sirenes das viaturas em alta
velocidade, trazendo ou levando detentos para o presídio, interfere nas aulas na escola, e mais
precisamente nas aulas de educação física, sendo estas realizadas no pátio da escola, quase
sempre podendo ser visualizadas as ações acontecidas.
A discussão relacionada a estrutura propiciada pela escola para desenvolvimento das
aulas de educação física nos chamou muito a atenção. O IEE Paulo da Gama possui uma
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estrutura física adequada, constatando isso a partir das observações realizadas, e também por
ter desenvolvido a prática de ensino nessa escola. Salvo alguns momentos em que muitas
turmas estavam no pátio, quando acontecia de o espaço diminuir demais, as duas quadras
junto com o estacionamento, mais a “gaiola”, aparentemente tende a mostrar uma estrutura
adequada para as aulas. Analisando as entrevistas, percebemos que os professores corroboram
com essa idéia, porém com uma ressalva, como explicam a Prof.ª. Carla, a Prof.ª. Roberta e a
Prof.ª. Amália dizendo que
O espaço físico da escola eu acho excelente, comparado com outras escolas acho que ele é muito bom (Prof.ª Carla 06/10/2008) [grifos meus].
O Paulo da Gama é uma escola grande então ele tem bastante espaço físico em relação a outras escolas que já trabalhei, tem bastante quadra, a gente consegue se organizar entre outros professores, organizar o espaço que a gente vai usar (Prof.ª Roberta 06/10/2008) [grifos meus].
Aqui nessa escola, eu considero uma situação relativamente boa, o espaço é bem amplo, a única coisa que nos falta é cobertura, espaço coberto, a gente só tem aqui o saguão do bar e a nossa sala de Educação Física, mas em relação a espaço tem bastante (Prof.ª Amália 08/10/2008)[grifos meus].
Tendo como única divergência com o professor Sílvio que considera “o espaço físico
é um problema, não só nessa escola que eu trabalho, mas também na maioria das escolas do
Estado, é muito pobre a estrutura física” (07/10/2008). Os grifos feitos foram para apontar a
ressalva, que consiste em mesmo considerando o espaço adequado, isso se dá sempre
relacionado a realidades de outras escolas que os professores já vivenciaram, o que podemos
perceber, que está bom em relação a outras, o que pode significar que não esteja da melhor
forma possível, a ponto de garantir efetivamente condições estruturais suficientes para as aulas
de educação física. Recentemente as quadras foram pintadas e reformadas; porém, as tabelas
de basquetebol, os canos que sustentam as redes de vôlei e as goleiras não foram trocadas, e
em alguns casos, como as tabelas e os canos das redes, nem existem mais. A falta de materiais
vem a somar ao leque de problemas para o desenvolvimento do trabalho dos professores,
como constatado nas entrevistas e nas observações, a precariedade e falta dos materiais.
O número elevado de crianças também foi algo relatado pelos professores.
Acompanhando as aulas, era visível a dificuldade para o desenvolvimento das aulas pelo
elevado número de crianças. Isso não significa que seja o único problema, mas na busca de
melhorias percebemos que dois professores dividiam a turma, entre guris e gurias, para
conseguir intervir pedagogicamente, sendo esse o caso da Prof.ª Roberta e do Prof. Silvio. O
48
caso de Sílvio foi percebido a partir das observações das aulas, dividindo a turma e
direcionando o trato pedagógico de determinada modalidade para determinado grupo,
enquanto o outro tinha aula livre, da mesma maneira que a Prof.ª Roberta, porém ela invertia
os grupos ou na próxima aula, ou no próximo período em alguns momentos. No diálogo com a
Prof.ª Roberta a mesma explicou a opção:
Eu optei por trabalhar assim, dividido, já trabalhei com eles juntos, mas a maioria das vezes eu separo por que eu prefiro, eles tem mais atenção em grupos menores, por que as vezes eles estão em grupos maiores, tu ta falando na quadra eles não estão te ouvindo, eles tão neh, numa idade assim complicada, então as vezes eles não te escutam, então tu passa o tempo todo gritando uma coisa que uns te escutam outros não, então prefiro trabalhar em grupos pequenos (Prof.ª Roberta 06/10/2008).
O número de alunos por turma dessa forma se torna um problema para o
desenvolvimento da prática pedagógica na escola, pois para que o professor consiga organizar
seu trabalho, dentro de suas limitações, ele é obrigado a privilegiar alguns alunos em
determinado momento, enquanto outros ficam livres da atividade. Por mais que ocorra a troca
de papéis dos grupos em momentos posterior, isso significa, tendo em vista que atividade livre
não é aula, que as crianças têm somente a metade das aulas que são designadas.
A Prof.ª Carla, ao tratar sobre esse ponto, dizendo que “com a enturmação aumentaram
os alunos (...) e com um número muito grande de alunos é difícil tu fazer um trabalho bom”
(06/10/2008), fala sobre a política do governo do Estado do Rio Grande do Sul, do último
período, chamada de enturmação que vem para agravar mais ainda a situação. A enturmação
vem na contramão de resolver os problemas que estamos contextualizando aqui, pois ela visa
a diminuição de turmas, para diminuir os gastos do governo com a educação, através do
aumento de alunos por turma, diminuindo assim as turmas e conseqüentemente os professores,
chegando em algumas escolas a propor o número de 50 alunos por turma segundo o Centro de
Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CEPRS/Sindicato) (2007). Para o
CPERS/Sindicato
só quem não tem contato real com as escolas e com processo pedagógico pode pensar em amontoar 40 alunos ou mais em uma sala de aula e achar que pedagogicamente isso dará bons resultados. Ignoram que o excesso de alunos em aula compromete a qualidade do ensino [ . . . ] (2007).
Em diálogos estabelecidos com as professoras da escola, disseram que a enturmação
não atingiu o IEE Paulo da Gama como atingiu outras escolas, sendo que o aumento foi de 3 a
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5 alunos por turma, porém alguns reflexos, como esse relatado pela Prof.ª Carla nos dá
indícios dos efeitos dessa política e das suas conseqüências.
Algo que surgiu também após a escolha das turmas a serem observadas, foi o fato das
4 turmas terem educação física somente uma vez por semana. Uma 5.ª e uma 6.ª séries tem 3
períodos consecutivos, e as 7.ª e 8.ª séries, 2 períodos no mesmo dia também. A Prof.ª Roberta
explica o motivo da 7.ª e 8.ª não terem os 3 períodos de educação física semanais:
A escola Paulo da Gama, tem um currículo diferente, com uma disciplina diferente, que eu acho que senão me engano, é desenho geométrico, entra dentro da matemática, mas aqui no Paulo da Gama, é uma matéria separada, no momento que tu tem essa matéria separada,acho que ate deve ter outras, então diminui um período da Educação Física, porque uma matéria a mais no currículo deles (ROBERTA, 06/10/2008).
Questionada sobre isso, as professoras Roberta e Amália, respectivamente dizem que:
[...]depende de cada escola, mas não desmerecendo a nossa profissão, mas pra trabalhar a matemática, ou seja la qual for a mateira, com turmas enormes, grandes, onde tu tem muito conteúdo pra trabalhar com as crianças, eu acho que o certo, se tu conseguir separar as disciplinas melhor, que foi o que aconteceu com desenho geométrico e matemática, pra que as crianças possam ter um maior, maior atendimento maior atenção, né, e ai o que fica ruim é que o que vai tirar deles, a educação física, por que as outras são mais importantes né, mas também não foi um total, eles tem 2 períodos, continuam, não foi um corte tão grande (06/10/2008).
[...] é, eu acho que é pouco, porque eu considero pra eles praticarem uma atividade física, mas acho que pelo que eles tem de conteúdo na escola, carência de matérias eu acho que a nossa disciplina pelo menos entrando em dois períodos já ta bom, pior é não ter (08/10/2008).
Em relação a isso o caso dos professores Sílvio e Carla são problemáticos também.
Eles têm educação física somente uma vez por semana, porém três períodos consecutivos. O
professor Sílvio é enfático ao tratar disso, dizendo que,
[...] isso é totalmente antipedagógico, pelo menos na minha concepção, concentrar a EFI em 3 períodos seguidos, eu acho um absurdo, mas são aquelas coisas que a gente vai aceitando ou vai tendo que aceitar, ao longo do tempo essa questão do acertar o horário, a disponibilidade, então se faz essas coisas as vezes de fazer 3 períodos seguidos, claro que em termos de treinamento, que não é o caso da escola neh, pedagogicamente mesmo, acho que não é o ideal se concentrar, acho até nas outras matérias, não é muito produtivo, se acumular 3 períodos seguidos, ideal seria que fossem dias alternados, eu acho neh, mas enfim tem que se aceitar, essas imposições da estrutura neh (09/10/2008).
Para a Prof.ª Carla o problema se concentra no cansaço gerado por estar à frente da
mesma turma por três períodos seguidos, por “não ser muito pedagógico”, não havendo a
50
retomada dos conteúdos como ela bem relata na passagem da entrevista que
[...] acaba sendo ruim , no meu caso de pegar uma turma de 3 períodos, que eu pego 3 períodos, com o, até tem o intervalo do recreio, mas eu tenho turma que são 3 períodos e é bem complicado, não é tão complicado porque a turma é uma turma muito boa de trabalhar, mas com outra, ou outras turmas, acho que, acho não, sei que é bem complicado, principalmente no verão, fica muito cansativo pra mim e pra eles, não é muito pedagógico, não tem uma retomada de atividades, é uma coisa que acaba numa semana e só vai recomeçar na outra então isso acho bem ruim de trabalhar (06/10/2008)
Como alguns já elencaram em suas falas, a não retomada dos conteúdos num período
de tempo menor que uma semana, ao lado do extenso espaço no caso dos três períodos, ou no
caso de somente dois períodos semanais, comprometem a construção do conhecimento por
parte dos alunos na disciplina de educação física. Mais especificamente no caso dos
professores que trabalham três períodos seguidos, recordo das primeiras observações
realizadas em que eu saía completamente desgastado. E numa delas, fiz um esforço abstrato de
me colocar no lugar do professor que ministrava a aula, e indo mais além dialoguei com a
professora Carla sobre essa questão, e a mesma me relatou um profundo cansaço gerado pela
maratona dos três períodos, por mais que a turma fosse comportada, mas barulhenta como ela
mesma dizia, sendo obrigada a utilizar medicações para suportar as dores de cabeça, e mostrou
também a utilização de uma meia medicinal que abrangia a perna e parte da coxa esquerda,
que a atormentava com dores sistemáticas. Aqui observamos os efeitos perversos desse
procedimento pedagógico adotado, para a saúde dos trabalhador da escola.
Os baixos salários acabam também forçando os professores a buscarem fora da escola
um complemento salarial. Excetuando-se o Prof. Silvio, que está em vias de se aposentar e
hoje tem um contrato de quarenta e nove horas no Estado, as demais colaboradoras têm
empregos fora da escola, ou mais horas em outra escola, como é o caso de Amália, que além
das vinte horas feitas do Paulo da Gama, tem mais doze em outra escola, trabalha como
personal trainer em uma academia e como personal cooker20 aos finais de semana. As
professoras Roberta e Carla trabalham com hidroginástica e ginástica laboral,
respectivamente. Isso consiste em ultra-trabalhadores, se desdobrando em diversos espaços
de trabalho e que tem que garantir um processo de formação para inúmeras crianças.
A formação acadêmica também foi levantada nas entrevistas, buscando traçar
apontamentos no sentido de perceber a relação que a formação acadêmica tem com o chão da
20 “Organização de cardápios” segundo a professora Amália.
51
escola. Dentre os colaboradores, as professoras Amália e Roberta tiveram sua formação inicial
no Instituto Porto Alegre da Igreja Metodista (IPA) formadas respectivamente nos anos de
1988 e 1999 e os professores Sílvio e Carla são formados pela ESEF/UFRGS, nos anos de
1978 e 1996, respectivamente. Ao relatarem suas experiências com a formação acadêmica,
eles tratam da base que a formação deu, mas especificamente do leque aberto pra além da
escola:
[...] olha eu acho que até naquela época me deu bastante base inclusive pra modalidades que eu não conhecia, como ginástica artística, handebol mesmo eu acabei pegando mais na faculdade, futebol de campo, inclusive eu engravidei no ultimo semestre, e tava com barriga jogando e , depois fiquei de técnica no banco, mas eu acho que deu uma base boa, mas eu senti necessidade de fazer cursos de especialização por fora, principalmente pra área que eu trabalhava que era ginástica neh, localizada e corretiva, eu fiz especialização em ginástica corretiva, coluna e joelho ah, porque eu trabalhava basicamente com isso, até hoje, todas as pessoas que estão com problemas vem pra mim na academia neh, e eu gosto muito dessa parte, mas foi uma base boa (Prof.ª AMÁLIA, 08/10/2008).
na faculdade a gente descobre outros caminhos outros leques, né, não é só escola, tem outras coisas que a gente pode trabalhar né, durante a faculdade foi muito bom, a gente passa por todas as opções, e ai depois tu escolhe, como eu já tinha o magistério, então prendi pra esse lado da escola, mas claro tenho 20 horas na escola e , e fiquei com vontade de fazer outras coisas, então já trabalhei, agora trabalho com hidro, mas já trabalhei em acadêmica, já trabalhei cm ginástica laboral, já trabalhei com personal, então sempre, no outro turno eu sempre quis fazer alguma coisa fora da escola (Prof.ª ROBERTA, 06/10/2008).
participei de mais de 20 congressos e cursos, fiz dois pós, um em 1979 de treinamento esportivo, na área do futebol la na ESEF mesmo, em 2001 fiz um curso de administração esportiva, na PUC e claro que todo curso, todo congresso que se participa, todo livro que se lê, traz conhecimento, quem quer saber mais vai atrás esses conhecimentos, mas é a bagagem cultural que a gente busca, que facilita neh, o conhecimento, a experiência, o professor, quanto mais informado, mais atualizado, ele vai saber mais, ele vai passar mais conhecimento para os alunos, então tudo o que estudei eu procuro aplicar neh, esse embasamento cientifico, que eu tive, eu procuro aplicar na minha aula (Prof. SÍLVIO, 08/10/2008).
a ver com a Educação Física escolar, tem a ver agora com a minha prática aqui na escola e, fora isso, algumas cadeiras la na ESEF, com a prof Miriam de ginástica pré-escolar e escolar, que a gente fez um estágio na creche da UFRGS, então essa foi a minha experiência assim em termos, que tem mais a ver com a prática escolar. [...] eu posso te citar a cadeira de recreação que eu tive com a prof Diná, e ai a cadeira, de, ginástica, pré-escolar e escolar , que tem mais a ver assim com tu montar o plano de aula e bota em prática esse plano de aula, pré escolar , talvez uma prática de ensino, mas eu fiz poucas acabei pegando práticas de ensino assim numas cadeiras, de esgrima, meio fora, não que seja impossível, mas é meio fora da prática aqui da escola, então acho que contribuiu pouco pra mim, e eu também de repente, , falto um pouco de discernimento de tu procurar, fazer cadeiras, porque na verdade quando eu fiz o curso eu não tava ainda focada em que eu iria trabalhar, então hoje em dia seria bem diferente a minha escolha (Prof.ª CARLA, 06/10/2008).
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A partir desses relatos, conjuntamente com o diálogo feito com os professores, em
meio as aulas, no caso do Prof. Sílvio, podemos mapear o viés dado ao esporte pelo processo
de formação enquanto um conteúdo prioritário. Se nos detivermos no currículo da licenciatura
da ESEF/UFRGS hoje, podemos evidenciar esse viés prioritário, em que as disciplinas, tidas
como as práticas do currículo são distribuídas em forma de modalidades esportivas, e
ministradas em grande parte por profissionais formados ligados às modalidades esportivas.
Isso pode ser chamado de esportivização do currículo, e tem reflexos diretos na prática
pedagógica dos futuros professores.
A afirmação da educação física enquanto disciplina curricular dentro da escola também
é motivo de questionamentos e tensionamentos. O objetivo implícito da disciplina como eixo
direcionador tem diversos efeitos. Por mais que a Prof.ª Carla diga que
o importante é eles [crianças] saberem que a Educação Física é como qualquer outra disciplina em termos de trabalho em conjunto, eles não tem matemática separados, então tem que deixar isso claro eles são uma turma e vão aprender juntos aprender a respeitar as diferenças entre eles com respeito (06/10/2008) [grifo meu],
quando se refere à divisão de gênero na turma, mas enfatizando que é uma disciplina como as
outras, o trato dado a ela não condiz com essa afirmação. Mapeamos isso, e percebemos os
reflexos na prática pedagógica principalmente em diversos momentos, seja nas observações
das aulas ou nas próprias entrevistas. Quando a aula de educação física do dia 2 de Setembro
de 2008, segundo o Diário de Campo, foi interrompida, independente da atividade que estava
acontecendo, para que outras séries ensaiassem o Hino Nacional no pátio por alguns minutos .
O relato da Prof.ª Roberta vai nesse sentido também, em que a mesma diz que quando os
alunos estão com notas baixas,
não tem a educação física, o que é ruim pra nós professores cortar o aluno da educação física, mas a gente sabe que aquilo ali é pra ajudar, neh então o aluno ama educação física mas ta com vermelho em todas matérias então, prof vai la da um jeito de cortar a educação física ou até chamar os pais, os pais autorizam a eles pra eles poderem melhorar neh [...] (07/10/2008).
E indo mais além nessa questão ela traz que,
uma vez que outra, um prof de história ou matemática por exemplo e diz ah, essa turma não ta muito legal na matéria, tão bagunceiros, não tão se comportando, então eu acho que hoje se tu não te importar eu vou ficar no teu período com eles continuar trabalhando a matéria, por que eles não tão se comportando, não tão querendo estudar, ai eu acho certo o professor vir falar comigo neh falar na frente deles e eles saberem que eles não tão se comportando por isso que eles não ter aquele período de educação física (06/10/2008).
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A professora deixa claro que isso não pode acontecer sempre, pois ela também tem um
currículo para seguir. Tratando especificamente da importância que o esporte tem na educação
física, dentro da escola, apareceu na entrevista da Prof.ª Carla o relato de um fato que a deixou
profundamente chateada, em que, para a equipe da escola treinar, ela foi obrigada a se retirar
da quadra onde estava lecionando sua aula:
um outro porém que pra acontecer esses esportes [relacionando as equipes da escola] o espaço de Educação Física escolar é usado, e as vezes a gente fica até sem o espaço, pois tem que ceder o espaço pro pessoal que tem que treinar, já aconteceu de me tirarem da quadra, que eu tava dando aula, com a minha turma, sai porque tem que treinar, daí fica eu, andando para um lado e pro outro tentando achar um espaço, então, pra mim interfere na Educação Física escolar, de uma maneira negativa (06/10/2008) [grifo meus].
Uma das possíveis justificativas para essa questão, acreditamos ser a falta de
entendimento, muitas vezes dos professores e da comunidade escolar, do objeto de estudo da
educação física, fruto como podemos perceber no aporte teórico feito nesse trabalho das
inúmeras tendências e abordagens que existem hoje na educação física brasileira,
conjuntamente da intensa abordagem relacionada ao esporte também, que acaba sendo tratado
como algo natural, sem uma devida reflexão que venha a problematizar realmente os
interesses colocados e objetivados na sua disseminação. Isso partindo da formação inicial,
acaba por se reproduzir, surtindo efeitos na pratica pedagógica, como podemos também ver,
além desses exemplo citado anteriormente, com o exemplo citado da retirada de um dos
períodos da educação física para criar outra disciplina no IEE Paulo da Gama. A defesa da
pluralidade nas discussões em relação ao esporte, feita por Gaya (2000) pode ser transposta
para a educação física, pois na defesa dessa tese, ele se remete a abordagens feitas à educação
física, que contribuem no nosso entendimento para o que vinha sendo relatado. Assim temos
acordo com Castelani Filho, quando trata dos que defendem o “pensamento plural, buscam-se
construir práticas consensuais desde que essa pluralidade não macule a ordem estabelecida e o
consenso seja obtido em torno do pensamento dominante, comprometido com a manutenção
do status quo” (2002, p.77).
54
3.2 Esporte como conteúdo hegemônico da escola
A afirmação do esporte como conteúdo hegemônico nas aulas de educação física em
escolas tem sido característica em diversos espaços de discussões, em congressos, seminários,
encontros, aulas de faculdades, grupos de pesquisas, entre outros. Alguns autores também já
fizeram a mesma afirmação, tais como Castellani Filho (2007), Assis de Oliveira (2005),
Bracht (1992, 2000 e 2005), Betti (1991).
No trabalho de campo evidenciaram-se essas afirmações, que auxiliam no
entendimento dos interesses do esporte como um consenso dentro das aulas de educação
física, como afirmou um dos nossos colaboradores “o nosso meio de trabalho, a nossa grande
ferramenta” (SILVIO 03/10/2008), podemos perceber também, a partir do Plano de Trabalho
(2008) dos professores, que fica explícita a importância remetida ao esporte. A divisão do ano
escolar é feita em trimestres, e a cada trimestre é trabalhada uma modalidade esportiva.
Analisando atentamente o Plano de Trabalho (2008), no desenvolvimento do programa,
relacionado aos conhecimentos, dez pontos são elencados sendo que um relacionado a jogos,
um a ginástica, um a recreação e atividades rítmicas, um a organização de gincanas e torneios,
um de trabalho de lateralidade e motricidade fina e cinco pontos dizem respeito a esporte,
respectivamente a voleibol, futsal, basquetebol, handebol e atletismo. As entrevistas
confirmam também que todos os professores afirmaram ser o esporte o conteúdo trabalhado:
normalmente no inicio do ano os professores se reúnem e fazem uma planejamento anual da sua área de trabalho, educação física, geografia, matemática enfim todos professores, fazem planejamento anual no inicio do ano, e ali então, a partir dali cada um com seu conhecimento com a sua, objetivo neh, vai então planejar, normalmente em termos de trimestres se trabalha, pelo menos nas escolas que eu trabalho, então se faz atividades a partir das condições estruturais que se tem e dos objetivos, então se faz esse planejamento trimestral a partir do anual, que é variável, é a partir da estrutura que se tem normalmente uma quadra e do material também neh de trabalho, bola, bastões e colchonetes, então se faz a partir disso se faz o objetivo, o planejamento, que é basicamente trabalhar com esporte, vôlei, futsal, basket neh, eu normalmente o que eu tenho trabalhado é o que se tem condições, estruturas aqui pra se trabalhar, então basicamente o que eu tenho feito é um traballho de iniciação não é de competição, de grandes jogos, basicamente futsal e vôlei (Prof. SÍLVIO, 09/10/2008).
[...]bom a gente geralmente faz um planejamento anual, no inicio do ano uma reunião com todos professores, pelas disciplinas, desculpa, pelas séries, e, como eu sou coordenadora, geralmente a gente vai trocando alguma coisa por ano, esse ano a gente mudo muito pouca coisa do ano passado, eu tento seguir aquele plano, mas as vezes foge um pouco[...] basicamente é vôlei, futsal,handebol e basket (Prof.ª AMÁLIA, 08/10/2008)
[...]claro que a gente sabe que o futebol é uma coisa que a gente não consegue se
55
desligar nunca, eles jogam sempre, ou as atividades livres que gostam mais de jogar, tem escola, eu já passei por outras escolas, que tem escolas que tu encontra que os alunos só jogam futebol, e as gurias só handebol, vôlei nem pensar, ai tu vai em outra escola, ah as meninas é vôlei, e os guris futebol, futebol tem sempre, e aquelas outras modalidades ficam assim com deficiência, então por mais que, aqui no Paulo da Gama, é quando eu entrei, aqui era o futebol e o vôlei, o handebol as gurias, os guris nem sabiam, então eu procuro trabalhar com as modalidades, eu procuro distribuir no trimestre, essas modalidades e eles saberem, que eles estão sendo avaliados naquilo ali, independente deles jogarem futebol, né, independente disso, claro vai ter um momento que o futebol vai ser trabalhado mais detalhadamente, mas independente de eles estarem jogando quase que todo ano praticamente, eles jogam futebol eles sabem que vão ser avaliados no handebol, vão ser avaliados no vôlei, no basket (Prof.ª ROBERTA 06/10/2008).
[...]é agora to trabalhando, eu dividi o ano, com a 524 em 3 esportes, não que eu me foque só nos esportes, mas é, to tentando ensinar pra eles alguns fundamentos , algumas regras assim, nada muito especifico, mas a regra básica pra na aula de Educação Física aprenderem a joga, tanto que tem regras que eu nem tenho conhecimento,[...] que não seja também só jogo, mas eu tento deixar o final da aula, o ultimo período, pra fazer um desporto, esse trimestre a gente dividiu, pra trabalhar no primeiro trimestre voleibol, no segundo trimestre futsal e agora nesse ultimo trimestre eu to trabalhando o handebol, então são essas modalidades que eles preferiram e eu tenho um pouco mais de conhecimento (Prof.ª CARLA, 06/10/2008).
O consenso em relação ao esporte enquanto prioridade já acontece na academia,
quando o futuro professor buscará se apropriar dos conhecimentos construídos pelo homem e
se defronta com currículos que privilegiam o esporte como conteúdo. Nas entrevistas os
colaboradores deixam claro que os conteúdos principais trabalhados no processo de formação
inicial eram modalidades esportivas, em que os mesmos afirmam que um dos pontos positivos
da formação acadêmica foi a aproximação a modalidades esportivas que eles não tinham
conhecimento.
Novamente ressaltamos que o esporte não tem autonomia, e se há uma busca desse
consenso, dessa direção em relação a hegemonia enquanto conteúdo, isso tem motivos e
interesses. Ao tornar-se conteúdo hegemônico, ele influencia a educação física, se sobrepondo
a ela, como afirma Bracht: “o esporte se impõe à educação física, ou seja instrumentaliza a
educação física para o atingimento de objetivos que são definidos e próprios do sistema
esportivo” (2000, p.XV). A construção dessa hegemonia frente à educação física foi feita,
segundo Assis de Oliveira (2005), após a 2º Guerra Mundial, em que o esporte se afirma como
elemento hegemônico da cultural corporal. Bracht ao tratar desse ponto diz que,
ao analisarmos através da literatura especifica a forma cultural do movimento corporal que tem sido objeto da educação física no Brasil, veremos que inicialmente havia o predomínio do exercício ginástico – principalmente de orientação militarista
56
– que a partir de então cede lugar progressivamente ao movimento de forma cultural do esporte. É lógico que outras expressões da cultura corporal ou de movimento, estiveram/estão presentes ou são tematizadas na educação física, como a dança os jogos e brincadeiras populares. Parece-me no entanto que estas expressões constituem a minoria, e que podemos falar da ginástica e posteriormente do esporte como atividades, nos respectivos momentos históricos, que se apresentam como hegemônicos da educação física (1992, p.17).
Para Freitas (1991) a educação física e os esportes desempenharam a função, durante o
período da ditadura militar, de cansar os indivíduos e tirá-los do foco de discussão política,
que poderia vir a comprometer a ordem vigente. Para Cavalcanti (1984) o esporte desempenha
a função de
ocupar esse espaço cognitivo, afastando as pessoas das preocupações reais para engajá-las em pseudo-atividades sérias. Considerando uma droga, o esporte não enfraquece o individuo como as outras drogas, mas tem a mesma função: fuga e evasão das contingências sociais (1984, p.54).
Trazendo a discussão para os dias atuais, em que não vivemos tempos de coerção
estatal21 tão intensa como a ditadura militar, percebemos que o esporte continua sendo
utilizado pelo Estado e pela classe dominante para manutenção do status quo.
Podemos citar, como exemplo, a Copa do Mundo de Futebol de 1994, enquanto o
mundo delirava com o futebol dos jogadores Romário e Bebeto pela seleção brasileira,
Roberto Baggio e Maldini pela seleção italiana, Batistuta e Maradona pela seleção argentina,
Mathaus e Klinsmann pela seleção alemã, Ruanda ardia em meio a uma guerra civil, em que
mais de 800.000 pessoas foram assassinadas, ficando conhecido como o Genocídio de
Ruanda. Isso não significa dizer que é culpa do esporte, mas a população mundial estava
entretida com o futebol naquele momento, e pouco espaço a mídia deu para esses fatos, no
sentido de garantir uma intervenção que pudesse minimizar os efeitos dessa guerra.
A mídia desempenha um papel central na difusão do esporte. Partindo da premissa,
segundo Cavalcanti (1984 p. 55) de que “o esporte é concebido como um meio neutro de
diálogo entre as classes” em que ele “minimiza as barreiras sociais, temporariamente, por
ocasião dos encontros esportivos”, aqui poderíamos tratar também dos jogos de futebol das
ligas ou campeonatos internos e externos dos países22 em que, no estádio, todos são iguais e
estão por um mesmo objetivo. Freitas (1991 p.112) ao discorrer sobre a mídia, a intitula como
um dos “demônios burgueses, que busca, a priori, fazer nascer uma nova necessidade nos 21 Se analisarmos a forma como a Brigada Militar tratou as últimas manifestações, poderemos ver que a coerção estatal, no estado do RS, remetido aos Movimentos Sociais de luta da classe trabalhadora vem se acentuando.22 A exemplo do campeonato brasileiro.
57
indivíduos”.
Ao revisitar o debate acerca de Esporte na escola e Esporte de rendimento, Taffarel diz
que:
O esporte, enquanto conteúdo cultural, socialmente produzido e historicamente acumulado, apropriado pelo estado burguês, pela mídia privatizada, pela indústria cultural de massas, pela escola capitalista, vem sim, servindo para sustentar um sistema violento de destruição das forças produtivas (2008, p.3).
Em todas as observações das aulas, sendo na quadra ou em sala, o esporte foi tratado
quase que na totalidade do tempo, ficando evidenciado a prática de vôlei e futsal, mais
precisamente nas aulas livres, isso pode ser remetido ao planejamento trimestral, mas como os
professores mesmo relataram, quando a aula era livre, o futsal e o vôlei ganhavam proporções
maiores em relação a outros esportes. Durante as observações o Prof. Sílvio levou raquetes e
bolinhas para jogar com as crianças algo próximo ao tênis, porém, como tinha apenas duas
raquetes e três bolinhas, sendo uma perdida com dez minutos de atividade, ficou limitado o
desenvolvimento da prática para um conjunto menor de crianças (DIÁRIO DE CAMPO
25/09/2008). Em relação à Prof.ª Carla, ela buscou trabalhar mais recreação, partindo sempre
de uma parte mais ampla, afunilando até chegar ao esporte, que no caso era o futsal e, em
relação a ela, de forma efetiva para guris e gurias.
A estrutura da escola também contribui nesse sentido. Se atentarmos a análise da
estrutura propiciada, veremos que essa vem reforçar o esporte enquanto conteúdo prioritário.
Os únicos materiais que fogem a uma lógica esportiva seriam os colchonetes, os saquinhos de
areia, os cones, os arcos e os bastões. Os demais estão alinhados ao esporte: bolas de várias
modalidades, quadras poliesportivas, redes de vôlei, entre outros. Isso não significa que seja
condicionante, mas vem a contribuir.
A constatação do esporte como conteúdo único se aproxima da formulação de Gaya
(2000) na defesa da disciplina de esporte escolar também, sem descartar a educação física. O
que estamos acompanhando é que este processo já está acontecendo, e a educação física, na
sua totalidade, sendo amputada da gama de conhecimentos construídos historicamente.
Assim, o esporte acaba por sufocar as demais manifestações da cultura corporal,
tornando-se dessa forma hegemônico frente à demais práticas corporais. As crianças deixam
de se aproximar, de tomar conhecimento, de se apropriar, das manifestações da cultura
corporal pra além do esporte, tais como a dança, as lutas, os jogos, entre outros.
58
A constatação do direcionamento ideológico e cultural dado ao esporte o coloca na
sociedade civil, descrita por Gramsci23, mais precisamente na discussão que estamos fazendo
aqui relacionada à escola, que também está inserida nesses aparatos ideológicos e culturais do
Estado como um todo. Assim, busca inculcar nas consciências dos sujeitos a ideologia
dominante, através desses dois canais, o esporte e a escola, construindo a “própria influência
ideal, a própria capacidade de plasmar as consciências de toda a coletividade, a própria
hegemonia” (GRUPPI, 2000 p.68).
Ao analisar a conjuntura relacionada ao esporte, Taffarel apoiando-se em Mészáros
(2005), identifica que “se intensificam as práticas esportivas e os processos de construção da
subjetividade humana e da internalização de valores adequadas à manutenção do modo
hegemônico do capital organizar a vida” (2008, p.4) Porém essa dominação ideológica entra
em contradição, a partir da realidade delas com a concepção de mundo que elas estão sendo
educadas (GRUPPI, 2000 p.68).
3.3 A lógica do esporte de rendimento presente na escola
Concordando com a perspectiva de Bracht acerca do esporte de rendimento, em que
“traz na sua estrutura interna, os mesmos elementos que estruturam também as relações
sociais de nossa sociedade: forte orientação no rendimento e na competição, seletividade via
concorrência, igualdade formal perante leis ou regras etc.” (2000, p.XV) e avançando nesses
elementos apresentando outros como: produtividade, busca pela vitória, da individualização
dos participantes, o regramento e a padronização, da especialização das atividades através de
um sistema de exercício pautados na repetição como forma de aprendizagem, como uma
mercadoria ditada pelas regras do mercado, da exacerbação da técnica. Sendo assim, os
apontamentos que trouxemos aqui, obviamente não são condicionados única e exclusivamente
à difusão e reprodução do esporte de rendimento no âmbito escolar. Se tivesse, a mudança
emergencial do esporte de rendimento na escola, mudaria as relações pelas quais as crianças se
submetem também. Da mesma maneira que a escola não é uma ilha isolada, o esporte também
não o é, reforçando a constatação de que ele não tem autonomia e é condicionado pelas
relações sociais, já desenvolvidas anteriormente nesse trabalho. Essas relações se reproduzem
para além das aulas de educação física, seja nas suas casas, famílias, outras aulas, na escola,
23 Discutida no capítulo 1.
59
vizinhança, entre outros espaços que as crianças freqüentam ou possam vir a freqüentar.
Porém, na escola, ao adentrar as aulas de educação física, o esporte
é de tal magnitude que temos, não o esporte da escola, mas sim o esporte na escola. Isso indica a subordinação da educação física aos códigos/sentidos da instituição esportiva, caracterizando-se o esporte na escola como um prolongamento da instituição esportiva: esporte olímpico, sistema desportivo nacional e internacional. Esses códigos podem ser resumidos em: princípios de rendimento atlético/desportivo, competição, comparação de rendimento e recordes, regulamentação rígida, sucesso no esporte como sinônimo de vitória, racionalização de meios e técnicas etc. (COLETIVO DE AUTORES, 2005 p.12).
Dessa forma a educação que a prática esportiva dentro do contexto escolar evidencia
também é alvo de debate e, como já dito, é justificativa para a inserção do esporte enquanto
conteúdo escolar na educação física. Na mesma linha, Bracht (1986, p.64) traça a discussão
acerca da educação pelo esporte alertando que “precisamos entender que as atitudes, normas e
valores que o indivíduo assume através do processo de socialização no esporte, estão
relacionados com o sistema de significados e valores mais amplos, que se estendem para além
da situação imediata do esporte”. O que este autor procura esclarecer nesse ponto é que o
esporte na escola vem desempenhando um papel íntimo com o sistema esportivo. Dessa
forma, percebemos o papel que a escola desempenha para o cenário esportivo, em que assume
a base da pirâmide esportiva, sendo nela o “local onde o talento esportivo vai ser descoberto, e
o esporte na escola o braço prolongado da própria instituição esportiva” (BRACHT, 1992). Ao
afirmar isso não significa dizer que essa relação do esporte de rendimento com o contexto
escolar acontece somente quando é visível a relação com a competição, entre escolas ou entre
turmas, a partir de campeonatos ou torneios, ou que os clubes tenham que estar dentro das
escolas para essas relações serem estabelecidas. Elas acontecem no cotidiano escolar, nas
aulas de educação física, nos simples jogos de quaisquer esportes e atividades que não sejam
práticas esportivas, seja de forma explícita, objetivada e direcionada, ou de maneira implícita,
sem que numa primeira análise possa ser percebido.
Durante as observações, nos remetendo ao Diário de Campo, constatamos que diversas
foram as vezes que presenciamos crianças do lado de fora, que não participavam da atividade,
ou participavam somente das atividades mais gerais, mas quando chegava a parte final24 da
aula que seria o jogo, elas ficavam de lado. Mais precisamente no caso do futsal, praticado
24 O final aqui pode ser questionado, pois como já apontamos, dois colaboradores optavam na maioria das vezes por dividir a turma e deixar como atividade livre um grupo, e outro colaborador deixava a turma mais solta na maioria das vezes.
60
pelos guris, em três das quatro turmas observadas, em que o jogo era mais solto, sem a
intervenção efetiva dos professores,
[..] o futsal é direcionado pelos melhores, pois pelo que percebemos (nas aulas observadas) os mesmos sempre começam jogando. Ser o próximo a jogar consistia em 2 dos 6 que estavam fora, entrar em algum dos 2 times que já estavam jogando (DIÁRIO DE CAMPO).
Percebemos que por ser o melhor ou um dos melhores no jogo, garantia a permanência
na quadra, dentro das regras estabelecidas pelos alunos de que o time ficava na quadra por
mais rodadas enquanto estivesse vencendo, por mais que alguns teriam que esperar duas ou
três rodadas para entrar em algum dos times, e daí entrar quadra. Outro caso também relatado
no Diário de Campo, foi quando a Prof.ª Amália estava tratando, em sala de aula, de algumas
considerações de regras sobre handebol e o torneio interno da escola, e os levou ao pátio, já
com apenas meio período para a prática esportiva. Dividiram os times os guris e iniciaram o
jogo de futsal. Alguns fora da quadra esperando para jogar, e quando chegou o momento de
entrarem dois dos quatro alunos que aguardavam, surge um aluno de outra turma, que havia
saído da sua sala para ir ao banheiro, e passando pela quadra avistou alguns ex-colegas,
segundo pude perceber, e se aproximou da quadra, e em meio a organização da próxima
partida, ele entrou num dos times, para jogar rapidinho, como o mesmo disse. O motivo da
entrada dele na quadra, que ficou constatada a partir do início do jogo, era que a habilidade
dele se sobressaia em relação aos outros. Ele jogou alguns minutos e acabou o período, sendo
que alguns nem tiveram a oportunidade de participar da partida. A professora não se
encontrava no espaço, atendendo as alunas que jogavam vôlei em outra quadra (24/08/2008).
O fator condicionante desses tratamentos era ditado pela busca da vitória, dos que
estavam jogando, a qualquer custo, por mais que alguns jogavam muito menos do que outros,
ou que não jogavam em momento algum. Esses por sua vez se inseriam no jogo das gurias,
que era o vôlei, buscando assim um mínimo de espaço. As gurias que não jogavam, pois isso
se reproduzia também no jogo delas também, ficavam de fora de vez, pois não seria no espaço
masculino que elas buscariam uma inserção, tendo em vista as relações existentes entre eles.
Ora, entendendo que tendo a vitória, como elemento central da atividade, essas relações são
entendidas como necessárias para o processo.
Outro fator importante também observado, tanto no futsal quanto no vôlei, é o
individualismo exacerbado que acontece por parte das crianças. Querer vencer, querer mostrar
61
eficiência, querer ser o ou a melhor na atividade, consistia em centralizar em si as funções
mais expressivas – dentro dessa lógica do esporte de rendimento em que o resultado é
maximizado – sendo essas designadas como o ataque em ambos os esportes, a cortada ou a
passada da bola para outra quadra, que poderia vir a gerar o ponto no vôlei e o gol no futsal. A
disputa por essa colocação dentro da quadra sempre envolvia os mais habilidosos, ninguém
disputava quem seria o goleiro, ou como escrevemos no Diário de Campo, o goleiro era
sempre o menos habilidoso, e o menor da turma (04/09/2008). Essa busca exacerbada pela
performance direcionada pelo rendimento é discutida por Taffarel:
Em uma concepção elitista da educação física, somente os considerados mais capazes ou mais dotados é que teriam oportunidade de demonstrar seus talentos, treinar suas habilidades e capacidades e assim demonstrar serem os mais velozes, mais altos e mais fortes. Os menos capazes seriam relegados a um segundo plano, como se não lhe fosse dado o direito de valerem-se dos benefícios da educação física (1985, p.12).
Isso auxilia também na compreensão de outro apontamento, o fato de que estar na
quadra, a inserção no jogo, não garante a plena participação no mesmo. Observando
atentamente os jogos, ficava claro os que tinham mais dificuldades com o futsal, eram
renegados a ficar atrás, na marcação ou defesa, participando do processo de tentar retirar a
bola do adversário, evitando que ele fizesse gol. Sendo essa uma tarefa que pode ser feita com
pouca habilidade dentro de um jogo, o simples atrapalhar, ou se colocar a frente já contribui
para a desestabilização da jogada. Isso pode até ser entendido como uma participação plena do
jogo, mas analisando após o momento de defesa, que resulta ou não no gol, o momento de
atacar, ficava explícito que os menos habilidosos não participavam da troca de passes que
envolveria o outro time com objetivo de fazer gol. Nesse caso, a diferenciação técnica se
caracteriza como uma forma de discriminação. Oliveira questiona essa discriminação ao
discutir sobre
O fascínio pela superação, intrinsecamente, não é um fato bom nem mau. Levado a extremos, cria sérias deformações. Nas escolas, a busca de campeões conduz a especialização prematura, inibindo o desenvolvimento do potencial psicomotor das crianças. Destas, passa a ser cobrada uma perfeição técnica na execução dos gestos esportivos. Os alunos passam a ser encarados como futuros atletas e não, simplesmente, como pessoa. As influências tecnicistas fazem com que a atividade do jogo esteja sistematicamente voltada para o desempenho e para os resultados de alto nível. Nesse caso, os menos habilidosos, que seriam os maiores beneficiários do esporte, são marginalizados e preteridos em benefício dos talentos. A educação física pode permitir essa discriminação? (1993, p.77).
62
No vôlei também aconteciam casos como esses relatados. Por mais que houvesse uma
intervenção constante dos professores Sílvio e Roberta durante o jogo de vôlei, mais no
sentido de garantir uma movimentação dentro da quadra, inserção de um gesto, arbitragem do
jogo, apresentação de regras, havia dificuldades no desenvolvimento desse jogo, pois as
crianças não tinham domínio mínimo para desenvolver a prática. Elas sempre queriam jogar,
mas não sabiam jogar, acabando o jogo de vôlei virando um ping-pong em que a bola ia de um
campo ao outro, a partir de um toque somente, não acontecendo um mínimo de
desenvolvimento da prática através de troca de passes. A inserção de uma prática esportiva
que requer elementos táticos e técnicos como o vôlei sem um desenvolvimento mínimo que
garanta o jogo acaba tornando a prática maçante e desprazerosa. Isso não significa centrarmos
esforços somente no desenvolvimento de habilidades. Dessa forma as que detinham um
mínimo de controle do jogo eram que conseguiam fazer com que a bola passasse para o outro
lado, as demais permaneciam em quadra e participavam minimamente quando a bola vinha na
sua direção.
Essa segregação também tinha reflexos na divisão por gênero nas aulas de educação
física. Nas observações das aulas, à exceção das aulas da Prof.ª Carla, que buscava
desenvolvê-las conjuntamente entre guris e gurias, apesar de não ser regra, nas demais, ficou
evidenciada a divisão de gênero. Em se tratando de aula livre, era algo dado, presente na
totalidade – guris no futsal, e gurias no vôlei. Já com a intervenção mais efetiva dos
professores, como já relatamos devido ao número de alunos, a divisão de gênero também
acontecia. Para o Prof. Sílvio, quando chegava a parte de desporto da aula os guris se
envolviam com o futsal e as gurias ficavam no vôlei, em que ele destinava sua intervenção
pedagógica. A Prof.ª Roberta realizava uma divisão por gênero na prática esportiva, que
segundo ela também não era algo constante e irreversível, porém a intervenção pedagógica
dela se destinava a um segmento por dia ou por período25, enquanto o outro poderia escolher a
atividade que queria praticar. Com a Prof.ª Amália, a divisão acontecia em grande parte das
aulas também, mas não era engessada a modalidade para cada segmento. Ao discorrer sobre
essas questões, os professores mostraram opiniões diferentes:
[...]a gente tenta trabalhar a maioria das vezes juntos, mas não é sempre tem alguns momentos que eu separo a turma, deixo os meninos jogarem entre eles, as meninas jogarem entre elas, mas o importante é eles saberem que a Educação Física é como qualquer outra disciplina em termos de trabalho em conjunto, eles não tem
25 Dependendo da aula.
63
matemática separados, então tem que deixar isso claro eles são uma turma e vão aprender juntos, aprender a respeitar as diferenças entre eles com respeito os meninos tem que entender que as meninas são mais frágeis, que tem outros órgãos então podem se machucar com uma bolada , e eles tem que respeitar essas diferenças e tentar trabalhar juntos (Prof.ª CARLA, 06/10/2008).
[...] separo as gurias dos guris, não por nada assim até pra trabalhar melhor, até pra que eles entendam melhor neh, então procuro fazer isso, já que tem dois períodos, eu separo, trabalho uma coisa, trabalho outra sabe, pra naquele momento ali eles estão sendo avaliados e tal, então eles foram seguindo essa minha linha de trabalho, não que num dia qualquer eu não possa dar uma aula inteira com eles todos, não tem problema, se eu disser ó, hoje toda a turma tal esporte eu sei que eles vão la e vão fazer (Prof.ª ROBERTA, 06/10/2008).
Essa divisão de gênero acarretava outras questões pra além do relatado pela Prof.ª
Carla na sua intervenção, superando a questão da discriminação, respeitando as diferenças
entre eles, tem intervenções relacionadas a questões pra além da aula ou do momento dela.
Analisando a divisão de espaços tanto para guris, quanto para gurias, quando as aulas eram em
volta da “gaiola”, que era o melhor espaço para a prática da educação física, com telas ao
redor da quadra, e o piso dela mais adequado em relação aos outros espaços, ficava nítida a
supremacia dos guris sobre as gurias. Quando a aula era livre, elas ficavam do lado de fora, no
“areião”, jogando vôlei e os guris na quadra jogando futsal, desfrutando do melhor espaço.
Essa relação não acontecia devido às condições, no caso de só poder praticar o futsal dentro da
quadra; pelo contrário, tanto futsal como vôlei poderiam ser praticados dentro ou fora da
quadra. O que constatamos é que as relações de opressão do homem em relação a mulher se
fazem presentes também nas aulas de educação física, sendo potencializadas pela lógica do
rendimento, em que na busca por melhores resultados e performances, homens e mulheres não
ocupam os mesmos espaços, e mais ainda, os homens oprimem as mulheres. Em relação a essa
divisão, Engels diz que,
[...] a primeira divisão do trabalho é a que se fez entre o homem e a mulher para a procriação dos filhos. Hoje posso acrescentar: o primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre homem e a mulher na monogamia; e a primeira opressão de classes, com a opressão do sexo feminino pelo masculino (s/d p.67).
Em um dos relatos descrito no Diário de Campo, fica visível essa questão quando, após
o sorteio dos espaços para realização da aula, entre guris e gurias, realizado pelo Prof.ª
Amália, em que as gurias ganharam na sorte o direito de usufruir, naquela aula, do espaço
físico da “gaiola”, e os guris ficaram remetidos à utilização das outras quadras, pois como não
64
estavam sendo utilizadas por outra turma de educação física, elas puderam ser apropriadas
para a aula, não necessitando fazer a aula no “areião”. Na oportunidade, os guris, não
aceitando a derrota ocasionada pela sorte, correram na frente das gurias, entraram e ocuparam
a quadra da “gaiola”, inciando o jogo, gerando um conflito com as gurias, que reivindicavam a
utilização da quadra. No processo de negociação mediado pela Prof.ª Amália, foi cogitada e
defendida por algumas gurias a propostas delas cederem o espaço para o guris, porém algumas
não aceitaram, dando continuidade a discussão, e até o momento em que a Prof.ª Amália,
percebendo que a negociação estava atingindo seus limites, resolveu encerrar a aula no pátio e
levá-los de volta para a sala. Nesse momento, os guris cederam nas suas proposições e se
encaminharam para as outras quadras (24/09/2008).
A intimidação das gurias por parte dos guris, principalmente através da força, também
reforça a questão da opressão implícita na divisão de gênero. Quando as gurias buscavam
participar do jogo de futsal, em que as professores não acompanhavam efetivamente, era
através de chutes fortes, de chegada firmes, da não participação feminina das jogadas, somado
a exacerbação de jogadas individuais, no sentido de mostrar a superioridade técnica, que
caracterizavam esse jogo. Na aula do Prof. Silvio, havia uma aluna que tinha preferência em
jogar futsal em relação ao vôlei, nesse sentido ela buscava espaço em meio aos guris, para
satisfazer sua vontade de jogar futsal. O que acontecia é que, por mais que ela demonstrasse
uma habilidade considerável, ela era remetida a se enquadrar na lógica posta no jogo, esperar
a derrota de um time, daí trocava dois ou três indivíduos no time derrotado, e após algumas
rodadas ela se inseria no jogo.
Percebemos também a violência gerada no jogo. Ela se materializava ou em jogadas
violentas, gestos violentos, palavras violentas, ou através de promessas de violência, tanto de
guris com guris, como de gurias com gurias e guris com gurias. A Prof.ª Carla, ao dizer que os
esporte é às vezes muito traiçoeiro, traz à tona essas questões, dizendo que já trabalhou com
turmas que ao final da atividade, “só faltavam terminar o jogo e partir para a violência, e se
pegar mesmo, porque não tem essa coisa de brincadeira para alguns alunos” (06/10/2008). A
violência é algo presente no cotidiano da comunidade como já relatamos; porém, há um
reforço dessa tendência, quando colocamos a vitória ou a derrota em jogo, sendo que ao final
alguns sairão de cabeça erguida, e outros sendo zoados pelos colegas. É nesse sentido que ela
buscava direcionar suas aulas, para um lado mais da cooperação, como sempre ressaltava, de
respeito entre os colegas. As aulas da Prof.ª Carla eram as que mais tentavam distanciamento
65
da lógica do rendimento. As atividades e as conversas com as crianças buscavam
problematizar as questões levantadas anteriormente, que permeiam a lógica do rendimento e
seus efeitos. A defesa da Prof.ª Carla é que a intervenção do professor deve ser constante, que
é a condução das aulas que pode garantir que essa lógica atue no sentido da discriminação, do
desrespeito, para não ser o “esporte pelo esporte” (06/10/2008).
3.4 Jogos escolares: o desfile da pobreza
O termo desfile da pobreza provém da entrevista do Prof. Sílvio (09/10/2008),
referindo-se aos jogos escolares. Mais especificamente estava se referindo aos Jogos Escolares
do Rio Grande do Sul (JERGS) e ao Guri Bom de Bola. Nessa categoria do trabalho,
desenvolveremos acerca dos jogos escolares, nos detendo nesses dois citados acima, que são
jogos externos que o IEE Paulo da Gama participa, e o torneio interno da escola.
Iniciando pelo JERGS, buscando fazer uma síntese breve do que são esses jogos, a
partir do Regulamento Geral JERGS (2008), podemos ter uma noção geral. Esses jogos são
promovidos pela Secretaria da Educação, através da Coordenação de Educação Física, Esporte
e Lazer do Departamento Pedagógico, executados pelas Coordenadorias Regionais de
Educação, com o apoio das Prefeituras Municipais e da comunidade gaúcha escolar
envolvendo as escolas públicas municipais, estaduais e federais. Dentre seus propósitos
justificadores para a realização desses jogos, segundo o documento, a finalidade é estimular a
prática esportiva em todas escolas públicas do Estado. A justificativa principal, contida no
artigo IV do regulamento é a seguinte:
Justifica-se a execução dos JERGS, porque, através deles, estaremos proporcionando aos alunos da rede pública escolar a prática do desporto educacional e, com esta prática, reforçamos a sua cidadania, direcionando-os à construção de um mundo melhor, livres de qualquer tipo de discriminação e dentro do espírito de compreensão mútua, fraternidade, solidariedade e cultura da paz. Através dos JERGS e o meio de representação que é o desporto, pretende-se levar todos os participantes a construir seus valores, seus conceitos, aprenderem a respeitar a si mesmo e ao outro e, principalmente, a vivenciarem realidades diferentes daquelas de seu cotidiano (JERGS, 2008).
Após a justificativa geral, elenca os objetivos dos JERGS:
I - Fomentar a prática do desporto educacional, contextualizando-o como meio de educação; II - Estimular a iniciação e a prática esportiva entre os escolares, da rede
66
pública de ensino; III - Contribuir para o desenvolvimento integral do educando como ser social, estimulando o pleno exercício da cidadania, através do esporte; IV - Fomentar a ocupação do tempo do educando, tendo por fim o acesso a essa prática; V- Incentivar a integração entre a escola e a comunidade escolar, através das atividades esportivas, reforçando o espírito de grupo entre as escolas participantes (JERGS, 2008).
É desenvolvido em forma de três categorias por idade – mirim, infantil e juvenil – e
jogado nas seguintes modalidades: futsal, handebol, voleibol, basquetebol, atletismo, xadrez e
futebol, sempre masculino e feminino.
O segundo campeonato externo que a escola participa é o Guri Bom de Bola,
promovido pela Rede Brasil Sul de Televisão (RBS TV), sendo executado pelas Secretarias
Municipais de Educação, sendo destinado a escolas públicas e privadas. O artigo III do
Regulamento Geral do Guri Bom de Bola apresenta as finalidades do projeto:
Promover a continuidade do processo pedagógico vivenciado nas aulas de Educação Física; Desenvolver os princípios que norteiam o esporte educacional do Rio Grande do Sul: educação, integração, cooperação e participação; Situar a escola como centro esportivo e formativo da comunidade; Consolidar a parceria dos Governos Municipais com a iniciativa privada, em nível esportivo (Guri Bom de Bola, 2008).
É desenvolvido em categoria única para atletas, tanto masculinos quanto femininos,
tendo somente a modalidade de futebol a ser disputada.
O torneio interno é realizado na escola desde 2005, segundo a Prof.ª Amália,
idealizadora da proposta e responsável pela criação do mesmo. Ele é realizado todo ano na
semana de aniversário da escola. Comportava sempre quatro dias de atividades, porém nesse
ano será somente em três dias, tendo como modalidades o vôlei misto e o futsal masculino e
feminino. É dividido por turmas. Objetiva, segundo os relatos dos professores, atender a uma
gama maior de crianças, que não conseguiram ser selecionadas para os jogos fora da escola.
Esse tópico, em relação aos jogos escolares, apresentou bastante divergências por parte
dos colaboradores, mais precisamente relacionado aos jogos externos que a escola participa.
No diálogo com as professoras Amália e Roberta, elas se colocaram favoráveis aos jogos,
apontando pontos positivos que justificavam a participação nesse espaços. O Prof. Sílvio
relatou que já participou dos jogos, mas hoje tem uma idéia mais crítica em relação a eles e a
Prof.ª Carla teceu duras críticas aos jogos, optando por não participar dos jogos fora da escola.
As entrevistas nos auxiliam a visualizar as argumentações dos colaboradores:
67
Eu comecei trabalhando no JERGS, em 2003 aqui, e na época eu vou te ser bem sincera, eu entrei pro convite, e acabei levando equipes fora dos meus alunos pra ter a primeira experiência e gostei, eu gosto neh, de participar e eu acabo aprendendo muito com isso tanto que hoje eu virei técnica de futsal, virei técnica de futsal, pelo fator de ter que aprender pelos alunos, a necessidade de estudar o futsal, por eles, e acabei gostando, e na quando eu entrei na Educação Física, futsal era quase ultimo lugar pra mim sempre foi o vôlei, e agora eu não fico fora de nenhum torneio (Prof.ª AMÁLIA 08/10/208)
[...] acho isso importante o aluno não achar que neh, que é só aquilo ali dentro da escola, que ele pode ver coisas diferentes fora neh, conhecer novos, até novas modalidades esportivas neh, com esses campeonatos que tem, as vezes a gente trabalha algumas coisas, aqui na escola, que, em outros torneios, eles vêem que tem coisas diferentes, e eles tem vontade, e a gente procura por um lado aqui tentar fazer, como que eles participem, mesmo que seja alguma coisa que a gente não trabalhe aqui, a gente trabalha um pouquinho de cada coisa neh (Prof.ª ROBERTA 06/10/2008).
Eu já participei varias vezes com equipes das escolas que eu trabalhava praticamente todas as escolas que trabalhei, inscrevia e levava equipes equipes para participar de alguns desses jogos, hoje eu tenho uma idéia mais critica da participação de equipes das escolas nesses torneios eu vejo hoje que são estratégia de marketings de algumas empresas que buscam a participação das escolas, dos alunos nos jogos, simplesmente como um recurso de marketing de empresas, então hoje eu critico, não é o objetivo da escola fazer equipes pra competir, eu acho que o esporte escolar tem que ser formativo não competitivo (Prof. SÍLVIO 09/10/2008).
Como eu não participo, e por opção ,porque eu não me disponho a ta indo fim de semana, a ir ver a gurizada jogar, porque eu acho que, nesses jogos a gente daí tem a real certeza de que não é uma coisa saudável, não vejo o esporte competitivo como uma coisa boa, para se trabalhar na escola, porque sempre da confusão, os alunos tão num nível que eu não gosto de trabalhar com esse tipo de coisa, sempre da briga, sempre da confusão, sempre os professores saem das outras escolas assim meio que linchados, sendo ameaçados (Prof.ª CARLA 06/10/2008).
Esses argumentos explicam a divergência em relação à questão das competições fora
da escola. O argumento do conhecimento de novas modalidades é bastante pautado na defesa
da participação nesses espaços. A Prof.ª Roberta cita o exemplo da participação feminina na
categoria de futebol de campo, nos jogos Guri Bom de Bola, em que elas tiveram a
experiência da prática, tendo em vista que o IEE Paulo da Gama não conta com estrutura que
possa vir a proporcionar o desenvolvimento da modalidade de futebol de campo, salvo vezes
em que o BOE empresta o campo de futebol, mas segundo a própria professora, são raríssimas
as vezes. Para a Prof.ª Amália, esses campeonatos é que direcionam toda a sua atividade na
escola. Isso fica visível na entrevista, que em diversos momentos ela ressalta ser a professora
que treina e leva as crianças para os campeonatos. Dessa forma, a direção da escola, alicerçada
no Ofício Circular n.º 4 de 2008, da Coordenadoria de Educação Física, Esporte e Lazer,
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respaldada pela Secretaria da Educação do Estado, que implanta a destinação de carga horária
para treinamento de equipes esportivas e grupos de danças para apresentações, destina três
horas da carga horária da Prof.ª Amália para que ela treine as equipes da escola para participar
do campeonatos fora, prioritariamente, segundo o oficio anteriormente citado, a participação
no JERGS. Segundo a própria Prof.ª Amália: “como eu tenho a necessidade de treinar os
alunos para jogos fora, a direção me passou carga horária só pra isso, então eu sou a única
professora do Paulo da Gama que tenho treinamento na carga horária, eu sou paga pra isso”.
Ressalta a importância de manter as duas coisas, educação física e treino, pois para ela, para
ter uma visão para fora, só a educação física não vai dar a base, sendo enfática ao dizer que
“sem isso tu não motiva, fica sempre naquela mesma aula, na mesmice da educação física”
(09/10/2008). O Prof. Sílvio, além das questões relacionadas as questões de marketing
apresenta os problemas sociais também como um ponto controverso desses campeonatos.
Segundo ele vê
ali que é um desfile de pobreza, as escolas do Estado normalmente com a gurizada com calção de cada cor, vai se cruzar com escolas particulares, é aquela diferença social que fica exposta ali visivelmente neh daí chegam lá os barbadões com 12 ou 13 anos bem nutridos, bem vestidos, e a gente lá com umas crianças subnutridas, sem uniforme, sem dinheiro para um lanche, eu não sei, com tudo isso ai, não sei não é válido não vejo muita validade nesses torneios e eventos (09/10/2008).
A Prof.ª Carla, ao considerar esses campeonatos como algo não saudável, diz que há
uma interferência negativa na educação física,
porque eu acho que pros alunos não acrescenta nada pois não há organização, não tem uma segurança pra eles, e aqui é na parte da educação física escolar atrapalha porque eles acabam tirando , os espaços pra educação física escolar desvia o enfoque da educação pelo esporte e os alunos acabam entendendo errado o valor do esporte e o que se pode aprender através da sua prática (06/10/2008).
Outro ponto que pode ser considerado é a demanda criada a partir da representação da
escola na pessoa da Prof.ª Amália frente a esses jogos externos. Durante as observações,
houve dois casos de ausência desta professora por estar envolvida em reuniões sobre o
JERGS, o que ela relata na entrevista ao tratar da falta de tempo para organização das
atividades: “como eu participo de jogos, as vezes acaba não tendo, tempo disponível pra fazer
tudo isso, então acabo improvisando alguma coisa mas tento acompanhar, agora por exemplo
já tava atrasado vôlei, eu tive que retomar o conteúdo de vôlei, com a 8.º” (08/10/2008).
A forma de escolha dos participantes também gera divergências entre as professoras. O
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método utilizado pela Prof.ª Amália é o peneirão, em que ela abre o leque das modalidades
para a escola, segundo relatos através de cartazes espalhados pelos corredores, se constituindo
assim num espaço democrático. Porém o peneirão se detém no desempenho das crianças, o
que para a Prof.ª Roberta tem um efeito negativo, pois leva “os bom de bola, que não são bom
de comportamento ou bom de estudo”, em que é categórica ao dizer que “são sempre os
mesmos” (06/10/2008). A Prof.ª Carla relata que às vezes as escola acaba premiando uns
alunos que “aprontam o ano inteiro”, dizendo que tem alunos que “matam aula, desrespeitam
professor, se envolvem em brigas, daí chega na hora do campeonato é ele que ta selecionado
pra participar” (06/10/2008).
Ao dialogar sobre os que ficam de fora desses espaços, que não passam com sucesso
pelo peneirão, a Prof.ª Amália justifica dizendo que para o futebol de campo, do Guri Bom de
Bola, podem ser levados até vinte crianças, e que assim poucos ficam fora. A Prof.ª Roberta
ao falar disso traz novamente a discussão sobre os que não deveriam ir, na concepção dela, e
que ao estarem presentes nesses jogos, por não terem ou um comportamento bom ou estarem
com notas ruins, acaba acontecendo um choque entre os professores, e remete os que não
conseguem passar pelo peneirão ao torneio interno (06/10/2008). Para a Prof.ª Carla a
frustração é o sentimento dos que ficam fora desses espaços e que gostariam de participar.
Num esforço de ser propositiva em relação a essa questão a Prof.ª Carla faz alguns
apontamentos, no sentido de propor uma seleção envolvendo outras qualidades, que não se
detivessem na questão da técnica e do rendimento, olhando mais para o lado da cooperação,
dos alunos que não se metem em confusão, que respeitam e é clara ao final em dizer que “é ir
pro campeonato sabendo que tu vai perder” (06/10/2008).
Um ponto importante de ser levantado aqui é que, mais precisamente no JERGS, que
possui mais de uma modalidade, no regulamento fica claro que uma criança pode participar de
todas as modalidades. Dessa forma, como nos relatos ficou evidenciado, poucos ocupam
muitas vagas, e mascaram os números, além de impedir a presença de mais crianças nesses
espaços.
Os jogos internos realizados na escola são os que possuem uma maior aceitação e
aderência entre os colaboradores. Os quatro participaram da organização e efetivação das
atividades. Tive a oportunidade, em uma das aulas observadas, de participar do repasse dos
jogos para a turma da 8.ª série. A Prof.ª Amália, objetivando preparar o time para o torneio
interno, se adiantou em relação aos outros professores. Esse adiantamento consistia em
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direcionar as aulas até o dia dos jogos para que a equipe que saísse da turma pudesse utilizar a
aula de educação física para treinar. Os outros professores tratavam do assunto, mas não com
a ênfase dada pela Prof.ª Amália. Como já dito, o torneio interno objetiva também contemplar
aquelas crianças que não foram selecionados nos peneirões para representar a escola nos jogos
externos. As turmas que possuem uma demanda maior podem inscrever dois times em cada
modalidade. Mesmo assim, pensando nos que não são selecionados também para esses
torneios e entendendo o mesmo como atividade aula, criou-se um forma de contemplá-los.
Esses ficam responsáveis pela organização das torcidas, ou entram nas equipes de apoio, que
são grupos que buscam auxiliar os que estão jogando, com água para que eles não precisem se
deslocar até o bebedouro durante o jogo, gelo, para caso aconteça alguma lesão, buscar a bola,
caso ela transcenda a tela de proteção, etc.
Como já alertamos, há uma divergência presente acerca dos jogos escolares. Sobre o
torneio interno há uma convergência geral pelos professores; porém, sobre os externos fica
explícita a divergência. Dessa forma, a partir dos relatos, fica claro a interferência que os
jogos escolares, tanto os externos como o interno tem na prática pedagógica dos professores
de educação física. Seja na questão estrutural, relacionada aos espaços, seja na forma como
está sendo organizado, quem está participando, o que esta reproduzindo essa maneira de
organização.
71
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise feita nesse trabalho, relacionando sociedade-escola-esporte-escola-sociedade,
nos apresentou problemas. Entender a conexão e a relação entre a sociedade e esses canais é
algo que devemos ter para conseguir formular propostas que visem reformulações,
reinvenções, transformações tanto no âmbito do esporte, como da escola e também da
sociedade. Nosso propósito não é negar o esporte, ou fazer críticas a ponto de retirá-lo das
aulas de educação física; queremos sim é problematizá-lo, com objetivos de auxiliar em
proposições superadoras.
Entendemos a limitação desse trabalho, por ser um Trabalho de Conclusão de Curso, e
por ousar se apropriar de uma teoria que está cada vez mais sendo negada dentro da
universidade: o marxismo. Temos clareza de que o problema dessa pesquisa requer uma
análise mais profunda, e que discuta mais com a teoria, e com o próprio campo. Porém,
mesmo com essas limitações, nesse momento, a aproximação com a literatura e as
informações obtidas no campo, nos mostram apontamentos relevantes para o debate:
1. as questões econômicas e sociais interferem no cotidiano da escola, da mesma
maneira que essa interfere também nessas questões;
2. as condições de trabalho dos professores estão cada vez mais precárias. Os salários
estão baixos, as turmas estão super-lotadas, a enturmação da política do Governo
do Estado tem efeitos perversos. Nesse momento que encerro o trabalho, o CPERS
Sindicato, em assembléia geral, com mais de 10 mil professores, entra em greve. O
motivo é a forma como a governadora Yeda (PSDB) resolveu aderir ao piso
nacional para a categoria, estipulado pelo Governo Federal em R$ 950,00, em que
ela adere ao piso nacional, porém incluindo nele todas as vantagens da carreira, o
que a categoria está rechaçando;
3. a aula de educação física uma vez por semana é um problema, por não ser possível
avançar efetivamente no conteúdo e ter uma retomada, juntamente com os três
períodos seguidos, vistos em duas das quatro turmas observadas, o que é
considerado como antipedagógico pelos professores;
4. o esporte se impõe à educação física enquanto conteúdo hegemônico, através do
consenso “espontâneo”, sufocando as demais manifestações da cultura corporal,
fazendo com que as crianças não tenham aproximações e apropriações do
72
conhecimento construído e acumulado por homens e mulheres durante o
movimento histórico da humanidade em relação à cultura corporal;
5. esse consenso “espontâneo” não é fruto único e exclusivo dos professores que estão
ministrando as aulas de educação física nas escolas, mas sim é algo que vem sendo
construído em estruturas maiores, no sentido de difundir através do esporte valores
e significados da sociedade vigente, para a manutenção do status quo;
6. as universidades têm um papel fundamental nesse sentido, pois é nelas que os
futuros professores e professoras estarão buscando apropriar-se e construir o
conhecimento para trabalhar posteriormente nas escolas. Assim, as universidades
devem estar ligadas intimamente às escolas públicas, para que as contribuições
sejam efetivadas em todos os sentidos;
7. nesse sentido os intelectuais orgânicos da educação física devem girar suas
formulações e produções para entender a educação física não como uma ilha
isolada do resto do mundo, que termina em si mesma, mas sim como um dos canais
que podem atuar no sentido de disputar as consciências para problematizar
questões, para buscar superar as relações de exploração;
8. a lógica do esporte de rendimento está presente nas aulas de educação física. Essa
lógica não aparece exclusivamente no treinamento de equipes ou em campeonatos,
seja interno ou externo, mas sim no cotidiano das aulas;
9. os melhores têm a oportunidade de praticar e de se apropriar das atividades, e
condicionam a atividade quando ela é o jogo propriamente dito;
10. a presença da lógica do rendimento vem contribuindo para gerar o individualismo
nas aulas, em que há um fortalecimento do jogar contra, e ganhar custe o que
custar;
11. a violência é reflexo também dessa forma como o esporte é tratado e difundido;
12. a divisão de gênero é reforçada pelo tratamento dado ao esporte;
13. os jogos escolares interferem na prática pedagógica dos professores de educação
física;
14. na escolha das equipes, através do peneirão, o desempenho no esporte é que
condiciona a participação ou não;
15. esses jogos estão premiando, em grande parte, alunos que são considerados
problemáticos nas aulas. Pois são os alunos mais bagunceiros, e/ou com notas mais
73
baixas, que são os escolhidos, devido a performance, para representar a escola nos
campeonatos externos.
Assim, percebemos como um problema o esporte como conteúdo hegemônico na
escola. O problema se agrava mais ainda quando está pautado na lógica do esporte de
rendimento. O diálogo com a literatura já vem apontando esses problemas, porém, sentimos
falta de trabalhos que tratem dessa temática, partindo da abordagem que esse trabalho
pretendeu, precisamente falando da sala de aula, do chão da escola. Nesse sentido, a partir da
relação do que vimos, presenciamos, analisamos, conversamos, entrevistamos, a prática
pedagógica dos professores, constatamos que o esporte como está sendo tratado vem trazendo
problemas significativos, e necessita ser problematizado e reinventado.
A forma como o esporte vem sendo tratado na escola, como conteúdo hegemônico das
aulas de educação física, alinhado à lógica do rendimento, gera um verdadeiro apartheid26 nas
aulas de educação física. O apartheid se diferencia do conceito de exclusão, pois no esporte
como na sociedade, refletindo os valores e o modelo de sociedade do capital, para que as
relações sociais aconteçam, é necessário a submissão, a exploração, a separação de outros. É
necessário ter quem dominar, quem vencer, por isso ele não está excluindo, mas sim deixando
dentro do processo, separado, relegado a uma posição necessária para que as relações se
perpetuem. No esporte na escola isso acontece, como pudemos ver nesse trabalho. As crianças
ficam de fora, para que algumas outras de alguns times consigam saborear a vitória. As
crianças não têm o acesso à cultura produzida pelo homem e a mulher, sendo enclausuradas
numa única prática corporal, ditada pelo sistema. Desde o nascimento de cada um, o esporte se
insere nas nossas vidas desse jeito devastador, ou traiçoeiro, como prefere designar a Prof.ª
Carla, sendo reafirmado veementemente quando atravessamos a universidade, para
aperfeiçoarmos e nos aproximarmos dos conhecimentos produzidos pela humanidade, e lá
somos amputados mais uma vez de conhecer, usufruir, poder nos apropriarmos das práticas
corporais, e o reflexo disso pode ser visto na escola.
Há a necessidade de resgatar as outras manifestações da cultura corporal, para que ao
lado do esporte, a ginástica, a dança, os jogos, as lutas, entre outras, possam ter espaço, e ser
aproximadas do contexto das crianças, para que elas possam tomar, conhecer, modificar,
problematizar para desenvolvê-las da melhor maneira.
26 Apartheid é uma palavra de origem africana que significa vida separada, muito utilizada pra designar um regime instaurado na África do Sul, no qual os “brancos” possuíam o poder e os demais povos eram obrigados a viver separadamente.
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Temos acordo com as formulações de Bracht (2000), na discussão feita na Revista
Movimento. Necessitamos criticar, problematizar o esporte, e em acordo com Castellani Filho
(2002), em relação à desesportivização da educação física, atentando para a não negação ou
abandono do esporte como conteúdo. As críticas e formulações feitas nesse trabalho, se num
momento remetem a um pessimismo muitas vezes enfatizado, e que acaba por sufocar as
possibilidades de transformação, deixamos claro aqui que vislumbramos possibilidades reais
de transformação do esporte. Dessa forma nos aproximamos de Taffarel (2000) e de Assis de
Oliveira (2005), e reivindicamos a reinvenção do esporte.
Nesse sentido, um dos pontos que ressaltamos aqui, é o entendimento de que os
professores e professoras da escola pública, enquanto intelectuais, devem ser orgânicos e
formularem, a partir das suas realidades e do conhecimento construído historicamente, seus
conteúdos, suas metodologias, suas reivindicações, rompendo assim com um dos processos de
divisão do trabalho existente na escola, que visa alienar o professorado. O exemplo do Estado
do Paraná pode elucidar o que estamos tentando dizer. O Livro Didático Público, construído
coletivamente pelos professores e professoras da rede Estadual de Ensino do Paraná para as
escolas públicas. Ele demonstra a necessidade do professorado das escolas públicas
assumirem um papel de protagonistas no processo educacional para além das salas de aula.
Mais que um livro didático, ele busca uma interação e desafia as crianças a ir além dele (Livro
Didático Público 2006).
A partir do momento que o professorado se entender como intelectuais orgânicos, que
esse entendimento esteja ligado intimamente à universidade e aos intelectuais que lá estão,
sendo a universidade comprometida com os anseios da classe trabalhadora, é que
conseguiremos avançar efetivamente na reinvenção do esporte, atingindo estruturas maiores,
questionando políticas públicas relacionadas ao esporte, efetivadas pelo Estado, bem como
processos de formação ligados ao mercado, que estão abandonando o trato pedagógico
direcionado à escola.
A reinvenção do esporte deverá trazer no seu cerne o processo de auto-organização das
crianças, em que elas consigam pensar, construir, efetivar as atividades a partir de seus
anseios, esses problematizados pra além da prática esportiva momentânea, pra além dos muros
da escola, adentrando nas relações da sociedade, nas políticas dos governos e do Estado.
Deverá garantir que as crianças tenham acesso à cultura corporal, bem como do esporte
inserido nessa, produto de homens e mulheres. Deverá apontar para a problematização da
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lógica do rendimento e da técnica, buscando diminuir essas categorias, que são centrais hoje,
não a ponto de negá-las, mas a ponto de que todas e todos possam participar da prática
esportiva, sem que se sintam relegados dentro dessa a posições inferiores, e assim podendo ter
uma participação mais ativa no jogo, contribuindo para o direcionamento do mesmo. Deverá
estar conectada com a prática pedagógica dos professores e professoras das escolas, no sentido
de resgatar a ludicidade, privilegiando a solidariedade. A reinvenção do esporte não poderá
tolerar que nossas crianças sejam usadas como meras mercadorias, fontes de lucro, a serem
descobertas em testes e tabelas de laboratórios. Ela terá que saber a melhor maneira de
organizar os jogos escolares, para que aconteça a socialização efetivamente, e que não se torne
um campo de batalha, ou um espaço para poucos, para que mais crianças possam ter uma
participação ativa, que não seja algo feito para atingir números e propagandear empresas, ou
que alguns poucos sairão felizes ao final, em detrimento de muitos. A reinvenção do esporte
deverá se desenvolver no sentido de estar ligada aos anseios da classe trabalhadora, por uma
sociedade justa e igualitária, buscando difundir outros valores e significados.
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APÊNDICES
Roteiro básico de entrevistas
1) Apresentação geral, com nome, idade, carga horária.
2) Se trabalha em outro lugar ou outra escola?
3) Formada por qual faculdade ou universidade?
4) Fala sobre a tua trajetória até ingressar na faculdade.
5) Fala sobre a tua formação acadêmica.
6) Fala sobre as condições de trabalhos dos professores hoje.
7) Fala sobre as condições estruturais da escola.
8) Como tu organiza as atividades, os conteúdos que tu trabalha?
9) Como o esporte interfere na formação das crianças?
10) Fala sobre os jogos escolares?
11) Como se dá a relação rendimento - competição com as aulas de educação física
12) Teria mais algum ponto que tu considere relevante de ser tratado?
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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado a participar de um estudo sobre esporte na prática pedagógica de professores do IEE Paulo da Gama . Peço que você leia este documento e esclareça suas dúvidas antes de consentir, com a sua assinatura, sua participação neste estudo. Você receberá uma cópia deste Termo, para que possa questionar eventuais dúvidas que venham a surgir, a qualquer momento, se assim o desejar.
Objetivos do estudo:
Quais as implicações que o esporte, enquanto conteúdo hegemônico da prática
pedagógica dos professores de educação física na escola, acarretam para a educação?
Procedimentos:
Durante a realização do trabalho de campo, as informações serão coletadas através de observações, registros em diários de campo, entrevistas e análise de documentos. As observações serão feitas no horário de funcionamento da escola e de realização das atividades docentes como aulas, reuniões, conselhos de classe e intervalos. Serão feitos registros em diários de campo do que for observado. Os registros serão de forma descritiva, não emitindo juízo de valor sobre as observações.
As entrevistas serão previamente agendadas, a ser realizada em seu ambiente de trabalho ou em algum local de sua preferência, com duração máxima de uma hora. Esta entrevista será gravada, transcrita e devolvida para sua confirmação e, se necessário, correção das informações coletadas.
O relatório final deste estudo também lhe será devolvido para leitura e apreciação das informações coletadas e interpretações realizadas.
Riscos e benefícios do estudo:
1º) Sua adesão como colaborador deste estudo não oferece risco à sua saúde e não lhe submeterá a nenhum tipo de constrangimento;
2º) Você receberá cópia da sua entrevista para validar, retirar ou modificar as informações, a seu critério, antes do texto ser transformado em fonte de pesquisa;
3º) Este estudo poderá contribuir no entendimento dos problemas relacionados com os processos de ensinar e aprender, vivenciados pelos educadores, principalmente em âmbitos escolares;
4º) Você será convidado a assistir a apresentação deste estudo para a banca examinadora em data a ser agendada pela Comissão de Graduação da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
5º) A apresentação do relatório final deste estudo também será realizada em sua escola de modo a socializar e discutir com a comunidade escolar os achados da investigação.
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Confidencialidade:
Todas as informações coletadas, sob a responsabilidade do pesquisador, preservarão a identificação dos sujeitos pesquisados e ficarão protegidas de utilização não autorizadas.
Voluntariedade:
A recusa do participante em seguir contribuindo com o estudo será sempre respeitada, possibilitando que seja interrompido o processo de coleta das informações a qualquer momento, se assim o for desejado.
Novas Informações:
A qualquer momento os participantes do estudo poderão requisitar informações esclarecedoras sobre o projeto de pesquisa e as contribuições prestadas, através ed contato com o pesquisador.
Contatos:
1) Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Escola de Educação Física
Endereço: Rua Felizardo, nº 750, Jardim Botânico, Porto Alegre-RS.
Telefone: (51) 3308-5821
Vicente Molina Neto
Orientador do trabalho
2) UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – COMITÊ DE ÉTICA DA UFRGS
Endereço: Av. Paulo Gama, 110 - 7° andar - Porto Alegre/RS
Telefone: (51) 3308.4085
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DECLARAÇÃO DE CONSENTIMENTO
Eu _________________________________________________________, professor da
Escola Municipal de Ensino Fundamental _________________________________________
tendo lido as informações oferecidas acima e tendo sido esclarecido das questões referentes à
pesquisa, concordo, livremente, em participar do estudo.
Assinatura: _____________________________________________
Data: __ / __ / _____ .
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ANEXOS
Anexo 1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
DECLARAÇÃO
NOME DA ESCOLA: ______________________________________________________Nome do(a) Diretor(a):_____________________________________________________Endereço:________________________________________________________________CEP:_____________ Cidade: __________________ Telefone: ______________
Declaro que o Professor Vicente Molina Neto, juntamente com seu bolsista de graduação, Eduardo Pergher, está autorizado a realizar coleta de dados para a pesquisa intitulada: “Esporte na escola: impliações na educação física” no segundo semestre de 2008, nesta Escola.
Tenho conhecimento de que a pesquisa objetiva compreender quais implicações o esporte enquanto conteúdo da prática pedagógica das aulas de educação física na escola acarreta. Para efetivar a coleta de dados, o pesquisador terá permissão para realizar entrevistas com os professores de educação física.
Estou ciente de que o pesquisador preservará a identidade dos sujeitos colaboradores e observará os procedimentos éticos no manejo das informações obtidas.
As atividades do pesquisador deverão ser executadas com planejamento prévio e sem prejuízo nas atividades da comunidade escolar.
Porto Alegre,............... de agosto de 2008.
___________________________________________ (Assinatura e carimbo do Representante Legal da Escola)
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Anexo 2
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
CARTA DE ANUÊNCIA DA ESCOLA IDENTIFICADA EM PRESENTE PROJETO DE PESQUISA.
NOME DA ESCOLA: ______________________________________________________Endereço:________________________________________________________________CEP:_____________ Cidade: __________________ Telefone: ______________
Pelo presente instrumento comprometo-me a permitir o acesso do Dr. Vicente Molina Neto e seus estudantes de Mestrado, Doutorado e Bolsistas de Iniciação Científica aos estagiários aqui lotados bem como ao grupo de crianças e adolescentes aqui matriculados, participantes que forem identificados com o perfil de interesse do Projeto de Pesquisa intitulado: “Esporte na escola: implicações na educação física”. O acesso será negociado, em seus detalhamentos, tais como o número de pessoas envolvidas, número de horas de entrevistas, número de observações, forma de retorno das informações à escola, locais e horários nos quais se dará a coleta das informações, etc. após a aprovação Comissão de Pesquisa da ESEF/UFRGS e pelo Comitê de Ética da UFRGS”.
Caberá ao professor pesquisador obter a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), de todos os atores que compuserem o grupo pesquisado.
Porto Alegre,............... de agosto de 2008.
___________________________________________(Nome, assinatura e carimbo do Representante Legal da Escola)