UNIVERSIDADE POTIGUAR - UnP PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
FERNANDA CYNTIA FERNANDES NASCIMENTO JACKELINE LEITE DA COSTA
O ADOLESCENTE REINCIDENTE EM ATO INFRACIONAL NO SEU PROCESSO DE (RE) INSERÇÃO SOCIAL NA CIDADE DE
NATAL
NATAL – RN 2006
UNIVERSIDADE POTIGUAR - UnP PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
FERNANDA CYNTIA FERNANDES NASCIMENTO JACKELINE LEITE DA COSTA
O ADOLESCENTE REINCIDENTE EM ATO INFRACIONAL NO SEU PROCESSO DE (RE) INSERÇÃO SOCIAL NA CIDADE DE
NATAL
NATAL – RN 2006
FERNANDA CYNTIA FERNANDES NASCIMENTO JACKELINE LEITE DA COSTA
O ADOLESCENTE REINCIDENTE EM ATO INFRACIONAL NO SEU PROCESSO DE (RE) INSERÇÃO SOCIAL NA CIDADE DE NATAL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à coordenação do Curso Superior de Psicologia, da Universidade potiguar, como requisito final para obtenção do título de bacharel em Psicologia. ORIENTADOR: Profº Especialista Carlos Roberto de Morais e Silva
NATAL 2006
FERNANDA CYNTIA FERNANDES NASCIMENTO JACKELINE LEITE DA COSTA
O ADOLESCENTE REINCIDENTE EM ATO INFRACIONAL NO SEU PROCESSO DE (RE) INSERÇÃO SOCIAL NA CIDADE DE NATAL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à coordenação do Curso Superior de Psicologia, da Universidade potiguar, como requisito final para obtenção do título de bacharel em Psicologia.
Aprovado em:____/____/_____
BANCA EXAMINADORA
____________________________________ Profº Especialista Carlos Roberto de Morais e Silva
Orientador Universidade Potiguar – UnP
____________________________________ Profª Drª Clarisse Carneiro
Professora Convidada Universidade Potiguar – UnP
___________________________________ Patrícia Vasconcelos Membro Examinador
Diretora da FUNDAC - RN
TERMO DE AUTORIZAÇÃO
Eu, Fernanda Cyntia Fernandes Nascimento, Brasileira, solteira, Psicóloga, residente e domiciliada na Rua João Francisco de Oliveira, 36 A, Bairro Dix-Sept Rosado, na cidade de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, portadora do documento de Identidade: 1.881.584 – SSP/RN, CPF: 052.053.944-39, na qualidade de titular dos direitos morais e patrimoniais de autora da obra sob o título: O Adolescente Reincidente em ato Infracional no Seu Processo de (re)inserção Social na Cidade de Natal, sob a forma de Trabalho de Conclusão de Curso, apresentada na Universidade Potiguar – UnP, em 30/11/2006, com base no disposto na Lei Federal nº 9.160, de 19 de fevereiro de 1998. Sob a orientação do Profº. Especialista Carlos Roberto de Morais e Silva, CPF: 407.771.564-34. 1. ( ) AUTORIZO, disponibilizar nas Bibliotecas do SIB / UnP para consulta a OBRA, a partir desta data e até que manifestações em sentido contrário de minha parte determina a cessação desta autorização sob a forma de depósito legal nas Bibliotecas, bem como disponibilizar o título da obra na Internet e em outros meios eletrônico." 2. ( ) AUTORIZO, disponibilizar nas Bibliotecas do SIB / UnP, para consulta e eventual empréstimo, a OBRA, a partir desta data e até que manifestações em sentido contrário de minha parte determina a cessação desta autorização sob a forma de depósito legal nas Bibliotecas. 3. ( ) AUTORIZO, a partir de dois anos após esta data, a Universidade Potiguar - UnP, a reproduzir, disponibilizar na rede mundial de computadores - Internet e permitir a reprodução por meio eletrônico, da OBRA, até que manifestações contrária a minha parte determine a cessação desta autorização. 4. ( ) CONSULTE-ME, dois anos após esta data, quanto a possibilidade de minha AUTORIZAÇÃO à Universidade Potiguar - UnP, a reproduzir, disponibilizar na rede mundial de computadores - Internet - e permitir a reprodução por meio eletrônico, da OBRA. Natal, ____ de ______________ de 2007.
______________________________ Nome do aluno
TERMO DE AUTORIZAÇÃO
Eu, Jackeline Leite da Costa, Brasileira, solteira, Psicóloga, residente e domiciliada na Rua Sérgio Severo, 1115, Bairro Lagoa Nova, na cidade de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, portadora do documento de Identidade: 1.733.209 – SSP/RN, CPF: 050.290.004-02, na qualidade de titular dos direitos morais e patrimoniais de autora da obra sob o título: O Adolescente Reincidente em ato Infracional no Seu Processo de (re)inserção Social na Cidade de Natal, sob a forma de Trabalho de Conclusão de Curso, apresentada na Universidade Potiguar – UnP, em 30/11/2006, com base no disposto na Lei Federal nº 9.160, de 19 de fevereiro de 1998. Sob a orientação do Profº. Especialista Carlos Roberto de Morais e Silva, CPF: 407.771.564-34. 1. ( ) AUTORIZO, disponibilizar nas Bibliotecas do SIB / UnP para consulta a OBRA, a partir desta data e até que manifestações em sentido contrário de minha parte determina a cessação desta autorização sob a forma de depósito legal nas Bibliotecas, bem como disponibilizar o título da obra na Internet e em outros meios eletrônico." 2. ( ) AUTORIZO, disponibilizar nas Bibliotecas do SIB / UnP, para consulta e eventual empréstimo, a OBRA, a partir desta data e até que manifestações em sentido contrário de minha parte determina a cessação desta autorização sob a forma de depósito legal nas Bibliotecas. 3. ( ) AUTORIZO, a partir de dois anos após esta data, a Universidade Potiguar - UnP, a reproduzir, disponibilizar na rede mundial de computadores - Internet e permitir a reprodução por meio eletrônico, da OBRA, até que manifestações contrária a minha parte determine a cessação desta autorização. 4. ( ) CONSULTE-ME, dois anos após esta data, quanto a possibilidade de minha AUTORIZAÇÃO à Universidade Potiguar - UnP, a reproduzir, disponibilizar na rede mundial de computadores - Internet - e permitir a reprodução por meio eletrônico, da OBRA. Natal, ____ de ______________ de 2007.
______________________________ Nome do aluno
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar agradeço a Deus, por ter sido a minha fortaleza
quando eu pensei em desistir e sem dúvidas foi quem me deu saúde,
sabedoria e paz para seguir sempre em frente.
Agradeço a meus pais e aos meus irmãos, pelo amor a mim dedicado,
pela compreensão e palavras de incentivo.
A minha família e meus amigos, que entenderam a minha ausência nos
momentos em que a minha faculdade exigia toda a minha dedicação e
prioridade.
Agradeço a todos os professores, pois se hoje me considero uma
pessoa com postura ética, com um olhar diferenciado, e uma profissional
consciente de que estarei sempre em construção o mérito também é deles.
Ao professor Carlos Roberto, enquanto orientador sempre nos incentivou
na construção do nosso trabalho, nos dedicou seu tempo, abriu as portas de
sua casa, nos fez refletir sobre questões relevantes para o nosso crescimento
social e profissional, nos influenciando cada vez mais a buscar novos
conhecimentos.
As instituições em que realizamos nosso trabalho, o meu agradecimento
pela compreensão da importância do nosso trabalho, pela atenção e pelo
acolhimento que nos foi ofertado.
Por fim quero agradecer a minha amiga Jackeline Leite, por te confiado
em mim, por ter estado sempre ao meu lado nas minhas angústias, com suas
reflexões pertinentes, por sua visão crítica, pela disponibilidade de estar
sempre pronta para produzir, por ter dado sempre o melhor de si em todo o
trabalho.
Fernanda Cyntia Fernandes Nascimento
À Deus por tudo que me proporciona;
À minha mãe, por toda a compreensão, paciência, companheirismo,
torcida e principalmente amor dedicados a mim, todos estes anos;
Ao meu pai, pelo amor incondicional a mim. Até hoje, depois de tantos
anos separados fisicamente sinto seu amor, que de tão grande, reflete nas
palavras dos meus tios e amigos.
À minha prima Lucinha, minha grande incentivadora e amiga. Mesmo
longe a sinto sempre por perto. Obrigada por tudo!
À Carlos Roberto de Morais e Silva, que me incentivou em todos os
momentos. Antes e professor é meu mestre e se tornou um grande amigo.
À “galera da porta”, por toda a paz que me traz, companheirismo e
inocência. Agradeço à Deus ter conhecido vocês. São meu tesouro!
À meu namorado Alisson, pela paciência e todo o amor nos meus
melhores e piores momentos. Você é especial.
Aos meus tios e tias, paternos e maternos, pelo carinho, torcida e amor.
Todo o meu respeito e ternura a vocês.
À minha companheira de jornada e amiga Fernanda Cyntia, pela
coragem em ser minha “comparsa” neste trabalho, pelas reflexões e
indagações sempre pertinentes que me fizeram crescer muito. Nanda, obrigada
por estar á meu lado, ser minha cúmplice e ajudar a realizar um grande sonho.
Você é essencial. Espero que continuemos nosso trabalho num futuro muito
próximo.
Aos professores e coordenação do curso de psicologia da UNP, pelos
momentos de sabedoria, reflexões críticas e paciência. Nas dificuldades
sempre tinham uma palavra amiga. Muito obrigada.
Às professoras Jeanne D’garin, Carina Cavalcanti e Roberta Barzaghi,
que me acolheram nas minhas inseguranças e medos, meu amadurecimento
profissional devo grande parte à vocês. Professoras, vocês são especiais.
Obrigada pela paciência, carinho e pelo apoio nos momentos acadêmicos mais
angustiantes, meu carinho a vocês.
À professora Clarisse Carneiro por aceitar tão carinhosamente nosso
convite para ser leitora do nosso trabalho, e a Patrícia Vasconcelos. Meu muito
obrigada à vocês.
Jackeline Leite da Costa
RESUMO
É perceptível nos dias atuais a aparente dicotomia entre o que se realiza de fato no que propõe o Estatuto da Criança e do Adolescente e o que de fato se cumpre pela forma de atendimento dada a crianças e adolescentes no Brasil, nas mais diversas esferas de seus interesses, através de um sistema de leis que procura implementar a teoria da proteção integral e o retorno que se tem em termos de resultados sociais, políticos e econômicos. O nosso estudo refere-se aos "Adolescentes Reincidentes em Ato Infracional, no seu Processo de (re) inserção Social na Cidade de Natal/ RN", onde temos como objetivo geral, fazer um estudo para verificar se há adolescentes reincidentes em ato infracional na cidade do Natal, e como confirmado, investigamos as medidas sócio-educativas realizadas nas Instituições que tem a função de reeducá-los. Também verificamos as atividades e a proposta da Fundação Estadual da Criança e do Adolescente - FUNDAC, desenvolvida pelo Governo do Estado do Rio Grande do Norte; a partir daí, constatamos como se dá o processo de intervenção do adolescente em liberdade assistida, reincidente em ato infracional no contexto social atual; apuramos as formas de "punições" e suas conseqüências tanto para os jovens que passam por privação de liberdade quanto para toda a sociedade. Ao longo da nossa pesquisa, fizemos uma reflexão acerca da inclusão e exclusão social, assim como reintegração e integração social, levando em consideração o que estes termos evocam, buscando conceituá-los com situações concretas da realidade do adolescente em conflito com a lei, restando ainda um campo aberto a ser explorado para a apreensão e compreensão dos processos subjetivos que diferenciam social e individualmente grupos e segmentos que, cada vez mais, perdem seu lugar e suas referências enquanto participantes de uma dada comunidade de valores. Palavras-chave: Adolescente. Ato Infracional. Reincidentes. Medidas sócio-Educativas.
ABSTRACT
The apparent dichotomy is perceivable in the current days between what it is become fulfilled of fact in that considers the Estatuto da Criança e do Adolescente and what of fact if it fulfills for the given form of attendance the children and adolescents in Brazil, the most diverse spheres of its interests, through a system of laws that it looks to implement the theory of the integral protection and the return that if has in terms of social, economic and politicians results. Our study one mentions the “relapsing adolescents to it in infracional act, in its process of (re) insertion in the city of Natal – RN”, where we have as objective generality to make a study to verify if she has relapsing adolescents of infracional act in the city of Natal , and as confirmed, we investigate the carried through partner-educative measures in the institutions that the function is to reeducate them. Also, we verify the activities and the proposal of FUNDAC – Fundação Estadual da Criança e do Adolescente (State Foundation of the Child and the Adolescent), that developed for the government of the State of the Rio Grande do Norte; from this point, we evidence there as if it gives the process of intervention of the adolescent in attended freedom, relapsing in infracional act in the current social context occurs; we in such a way select the forms of “punishment” and its consequences for the young that passes for privation of freedom how much for all the society. During our research, we made a reflection concerning the inclusion and social exclusion, as well as reintegration and social integration, leading in consideration what these terms evoke, searching to appraise them in scientific way so that let us can approach its content and still collate them with concrete situations of the reality of the adolescent in conflict with the law, remaining an open field to be explored for the apprehension and understanding of the subjective processes that differentiate social and groups individually and segments that, over and over again, lose its place and its participant references while a certain community of values. KEYS-WORDS: Adolescent. Infracional act. Recidivists. Partner-educative measures.
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.........................................................................................13 1.1 PROBLEMATIZAÇÃO..............................................................................13 1.2 OBJETIVOS.............................................................................................17 1.2.1 Objetivo Geral........................................................................................17 1.2.2 Objetivos Específicos...........................................................................17 1.3 JUSTIFICATIVA.......................................................................................18 2 REFERENCIAL TEÓRICO.......................................................................21 2.1 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E A ADOLESCÊNCIA..............21 2.1.1 O adolescente e sua identidade............................................................23 2.1.2 MARGINALIDADE E DELINQUÊNCIA...................................................25 2.1.3 A cultura da violência.............................................................................28 2.1.4 Delinquência juvenil................................................................................29 2.2 ECA, FUNDAC – E SUAS INSTITUIÇÕES (CIAD E CEDUC PITIMBÚ...31 2.2.1 O ECA......................................................................................................31 2.2.2 A FUNDAC – RN.....................................................................................31 2.2.3 CIAD........................................................................................................32 2.2.4 CEDUC’s................................................................................................33 2.2.5 MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA OU PUNIÇÃO?......................................35 2.2.6 A Reincidência em ato infracional........................................................39 2.2.7 O papel da família do adolescente em conflito com a lei...................40 3 METODOLOGIA.......................................................................................43 3.1 TIPO DE PESQUISA.................................................................................43 3.2 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS...............................................43
3.3 ANÁLISE DOS RESULTADOS.................................................................43 4 REFLETINDO SOBRE OS DADOS OBTIDOS........................................44 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................46 6 REFERÊNCIAS.........................................................................................48
1 INTRODUÇÃO
1.1 PROBLEMATIZAÇÃO
É perceptível nos dias atuais a aparente dicotomia entre o que se
realiza de fato nas ações jurídicas - em termos do que propõe o Estatuto da
Criança e do Adolescente - ECA - no poder judiciário - e o que de fato se
cumpre pela forma de atendimento dado a crianças e adolescentes no Brasil,
nas mais diversas esferas de seus interesses, através de um sistema de leis
que procura implementar a teoria da proteção integral e o retorno que se tem
em termos de resultados sociais, políticos e econômicos.
A polêmica gerada pela dicotomia do que é empregado pela legislação
e o que é realmente executado pelos órgãos competentes, assim como suas
conseqüências sociais, sempre alvo de tantas críticas, representou o pano de
fundo da referente pesquisa exploratória, que teve na importância deste tema
às razões mais que justificáveis para se realizar, pois o ECA assevera que a
finalidade do cumprimento de privação de liberdade (em alguns casos), antes
de se constituir em castigo ou punição, representa uma maneira
institucionalizada da sociedade buscar condições para que os sujeitos que
cometem ato infracional possam ser submetidos a um tratamento sócio-
educativo que os habilite a retornar ao convívio social. Segundo uma
reportagem no Jornal Folha de Londrina:
A falência do sistema de contenção de adolescentes infratores está em crise em vários países. Há casos de rebeliões, maus-tratos e violência registrados em unidades de internamento no Brasil, Argentina, México e nos Estados Unidos. Em comum, estes países têm uma visão de punir o infrator. No Brasil, há mais de 13 mil adolescentes em unidades de internação. (NUNOMURA, 2005, p. 11)
A complexidade do tema “O adolescente reincidente em ato infracional
no seu processo de (re)inserção social1 na cidade de Natal-RN” que envolve
interesses e historias de vidas diversas destes adolescentes, exigiu o
estabelecimento de algumas questões norteadoras que de certo acrescentam e
1 O termo (re)inserção social está entre parênteses e em negrito porque fizemos um estudo científico no desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso sobre a contextualização a que este termo está sendo empregado, buscando conceitua-lo para que venhamos a utiliza-lo corretamente. Nos questionamos se há realmente uma reinserção destes adolescentes ou se é a própria inserção dos mesmos.
nos fazem pensar veementemente a respeito, como por exemplo o fato do
mercado de trabalho não absorver a mão de obra do indivíduo adulto que já
passou pela privação de liberdade, ou liberdade assistida pelo seu estigma de
ter sido recluso, e isso faz com que nos preocupemos com o futuro dessa
geração adolescente que pratica atos infracionais e que de certa forma
também podem passar por um período de privação de liberdade, ou semi-
liberdade, onde devemos considerar que a criança e adolescente tem direito a
escolarização, saúde, cultura, esporte, lazer, convívio familiar e isso acaba
refletindo na nossa discussão, se esses direitos realmente estão assegurados.
No Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 69º ao assegurar o direito a
uma profissionalização vemos que:
Art 69º - O adolescente tem direito à profissionalização e a proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros: I- respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento; II- capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho.
No entanto, observamos que uma significativa parcela dos agentes
governamentais pouco tem iniciativa de promover a capacitação de mão de
obra do indivíduo institucionalizado e por se tratar de adolescentes a ressalva é
maior por considerar que a fase da adolescência se caracteriza pela constante
mudança do individuo ainda em desenvolvimento. A suspensão da escola,
convivência familiar e a não oportunidade à profissionalização agravam ainda
mais as condições da adaptação do adolescente no seu retorno ao convívio
social de origem.
O Projeto de execução da medida sócio-educativa, em parceria com a
FUNDAC - Fundação Estadual da Criança e do Adolescente (órgão
responsável pela execução) e outras Organizações, baseiam-se no texto
Constitucional e no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que
considera o adolescente autor de ato infracional2 até 18 anos, inimputável, ou
seja, em condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, não condenável,
mas, sujeito às medidas sócio-educativas impostas pelo Poder Judiciário.
2 Segundo o ECA (art. 103º), o ato infracional é a conduta da criança e do adolescente que pode ser descrita como crime ou contravenção penal. Se o infrator for pessoa com mais de 18 anos, o termo adotado é crime ou delito.
Conforme previsto no art. 112º do ECA, as medidas sócio-educativas ,
são instrumentos de que dispõe o Poder Judiciário, na busca de superação do
envolvimento em ato infracional, pelo adolescente ao citar:
Art. 112º - Verificada a prática do ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I – advertência; II – obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.
O artigo 112 reza, que as medidas sócio-educativas devem desenvolver-
se através de Programas de Atendimentos necessários à eficácia de sua
proposta legal.
Os Projetos de Atendimento aos adolescentes, portanto, estão voltados
ao disposto no art. 88 do ECA, que trata da reinserção do adolescente na
comunidade de origem, trabalhando as peculiaridades do indivíduo, grupo
familiar e social, onde está inserido, como cita:
Art. 88. São diretrizes da política de atendimento: I - municipalização do atendimento; II - criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais e municipais; III - criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa; IV - manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente; V - integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional; VI - mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade.
No presente trabalho “O adolescente reincidente em ato infracional no
seu processo de (re)inserção social na cidade de Natal”, observa-se a
relevância da qualidade de vida3 destes adolescentes, que se dá dentre os
direitos observados, na vivência em especial da cultura, do lazer e da
cidadania, como fatores que favorecem a não entrada do adolescente na
criminalidade.
O Art. 123 da ECA cita que a internação do adolescente infrator, deverá
ser cumprida em entidades exclusivas, e em local destinado ao abrigo,
obedecendo rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e
gravidade da infração e que durante a internação serão obrigatórias atividades
pedagógicas.
Com base no exposto acima é que se fundamenta este trabalho, onde
nos dispusemos a analisar a questão da qualidade de vida do adolescente
como processo de inclusão social que, por sua vez, consiste na inserção do
mesmo no contexto social atual assim como sua integração familiar e
comunitária.
Portanto, questiona-se: na cidade de Natal há um grande índice de
reincidência em ato infracional cometido por adolescentes? É possível ocorrer
o processo de inclusão social de adolescentes reincidentes em ato infracional,
em Internação em estabelecimento educacional; desenvolvidos em projetos da
FUNDAC? Qual o fator mais responsável pelo índice de reincidência do
adolescente em ato infracional?
3 Conceituamos aqui, Qualidade de Vida como: "São aqueles aspectos que se referem às condições gerais da vida individual e coletiva: habitação, saúde, educação, cultura, lazer, alimentação, etc. O conceito se refere, principalmente, aos aspectos de bem-estar social que podem ser instrumentados mediante o desenvolvimento da infra-estrutura e do equipamento dos centros de população, isto é, dos suportes materiais do bem-estar" (SAHOP, 1978, p. 18).
1.2 OBJETIVOS
1.2.1 Objetivo Geral
Fazer um estudo para verificar se há adolescentes reincidentes de ato
infracional na cidade do Natal, e em caso afirmativo, investigar as atividades
implementadas com as medidas sócio-educativas realizadas nas Instituições
que tem a função de reeducá-los.
1.2.2 Objetivos Específicos
• Constatar como se dá o processo de intervenção do adolescente em
conflito com a lei, reincidente, ou não, em ato infracional no contexto social
atual;
• Apurar as formas de “punições” e suas conseqüências tanto para os jovens
que passam por privação de liberdade e quanto para toda a sociedade;
• Fazer um estudo teórico conceitual, acerca da marginalidade, delinqüência
e reinserção social.
1.3 JUSTIFICATIVA
É notória na sociedade atual brasileira a grande participação da criança
e do adolescente na criminalidade1. Muito se fala em diversos âmbitos da
sociedade sobre a delinqüência juvenil, atribuindo a ela fatores meramente
socioeconômicos das suas famílias.
No Brasil, a situação de baixa escolaridade do adolescente em conflito
com a Lei replica os dados da América do Norte: quase a totalidade dos
adolescentes que estão cumprindo alguma medida sócio-educativa abandonou
os estudos muito cedo. Pereira e Mestriner apud Gallo e Williams (2004):
A evasão escolar deve-se à ineficácia dos métodos educacionais em sua totalidade, por falhar em ensinar as habilidades acadêmicas necessárias, e também à exclusão social por parte dos colegas e professores da escola. Por serem tachados de alunos problemáticos, colegas agressivos e outros estereótipos estigmatizantes, tais adolescentes evadem-se das escolas e preferem assumir a “identidade do bandido. (Gallo e Willians, 2004, p. 86)
Há também estudos que afirmam que estes adolescentes fazem parte
de famílias monoparentais (que são chefiadas apenas por um membro da
família, como o pai, ou a mãe), onde Gallo e Williams (2004) constataram que
40,7% dos adolescentes em conflito com a Lei de uma cidade de porte médio
viviam com ambos os pais e 43,1% viviam somente com a mãe. As famílias
monoparentais sofrem um impacto mais severo de inúmeros fatores de risco. A
mulher, na maioria das vezes chefiando tais famílias, lida com o estresse de
prover financeiramente a casa, assim como educar os filhos. Vale ressaltar que
não é o simples fato de se viver em famílias monoparentais que acarreta no
surgimento de problemas no desenvolvimento infantil, mas sim a relação que
essa condição tem com outras variáveis de risco. A dificuldade de prover
1 No panorama brasileiro, o aumento da mortalidade por causas violentas vem se tornando um fenômeno de alta relevância[...]Se, até meados da década de 1990, o crescimento da violência parecia estar restrito às grandes capitais da região sudeste do Brasil, hoje as taxas estão crescendo em capitais médias e mesmo pequenas[...]Estudos têm observado que as mortes por causas externas, muitas vezes, resultantes de homicídio têm como alvo preferencial, adolescentes[...]estudos mostram cada vez mais o envolvimento de jovens brasileiros com o mundo do crime. (PRIULI, MORAES, 2006)
financeiramente a casa e cuidar dos filhos, aliada a uma rede de apoio ineficaz
(ausência de apoio do parceiro, falta de recursos na comunidade como
creches, entre outros), afeta diretamente o estilo parental que é estabelecido e
até mesmo psicopatologias dentre algum membro da família que não são
investigadas e tratadas da melhor forma.
Em geral, a sociedade civil2, ignora o que se passa com essa parcela
populacional tutelada pelo Estado ou fica sabendo alguma coisa apenas
quando há rebeliões nas instituições responsáveis por estes adolescentes, e a
imprensa entra com denúncias de maus-tratos ou carências administrativas.
Muitas vezes os adolescentes em conflito com a lei são assemelhados, por
esta sociedade, aos adultos em suas atividades delitivas, principalmente se
este adolescente pratica homicídio, sendo atribuídos esta violência a seu
caráter, atuantes de má índole e com desvio moral, sendo desconsiderado que
são indivíduos muitas vezes “criados” pela situação social em que vivem. Se
valem da emoção para julgar os “criminosos”, quando vemos que os fatos
ficam muito aquém da percepção. E um dos fatores determinantes para tal é o
fato de nós, culturalmente, não somos educados para sermos neutros em
nossos julgamentos.
Na adolescência as interações sociais ampliam-se com a participação
nos diferentes grupos aos quais os adolescentes pertencem. A identidade é um
dos temas de maior importância na personalidade do adolescente por vincular-
se à sua história pessoal, uma vez que é na adolescência que começamos a
tecer nosso próprio relato de vida e que caracterizará nossa individualidade.
O nosso sistema econômico3 enfatiza muito a questão do trabalho como
único meio de sobrevivência. Vemos que para uma pessoa adulta e qualificada
já é muito difícil conseguir um emprego, muito mais complicado é se esta
pessoa for um adolescente e principalmente aquele que passou por privação
de liberdade.
2 Vários são os autores que identificaram o uso variado e muitas vezes indiscriminado do conceito de sociedade civil. No entanto, nos referimos nesta narrativa ao conceito dado por Gramsci e descrito por Bobbio: “conjunto de organismos vulgarmente chamados ‘privados’” que tem como função articular o consenso das grandes massas e a adesão destas à orientação social impressa pelos grupos dominantes. São eles os que definem o conteúdo ético do Estado, nas palavras de Grasmci. (BOBBIO, 1999) 3 De acordo com Marx, a sociedade capitalista em que vivemos é uma "sociedade do trabalho" sob a forma social determinada da acumulação do capital. (MARX, 1980).
Acreditamos que a (re)inserção de adolescentes reincidentes em ato
infracional ao meio, não acontece por que as formas de recuperação não
atingem o público alvo. As resistências estão relacionadas ao fato de como
acontecem as internalizações dessas normas e valores, se estas serão
socialmente aceitas.
A relevância social do referente trabalho consiste em provocar na
sociedade natalense um olhar crítico sobre a importância da inclusão social dos
adolescentes que praticaram ato infracional enquanto cidadãos que já
são/serão participantes no processo econômico-social e que, devido a isso, são
dignos de respeito e possuem o direito de usufruir o tempo que dispõem para a
vivência de sua cidadania.
A relevância acadêmica desse estudo consiste em fundamentar um
embasamento teórico que forneça dados relevantes acerca do processo de
inclusão do adolescente infrator, especialmente o reincidente em infração,
servindo também de subsídios para complementar o acervo para posteriores
consultas e/ou servir de vertente para outros trabalhos acadêmicos.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E A ADOLESCÊNCIA
Sabemos que a psicologia do desenvolvimento estuda as mudanças
biológicas, cognitivas, emocionais e sociais que ocorrem ao longo da vida.
Como tal tem como objeto de estudo o próprio ser humano, que se apresenta
em permanente evolução, analisando as várias etapas da vida – infância,
adolescência, fase adulta e velhice.
Destas etapas, a adolescência neste capítulo será o nosso “carro chefe”
sendo muito importante sua caracterização no presente trabalho, pois além de
ser nosso alvo de estudo, representa um período de transformação e de
experimentação e exploração no sentido da procura e construção da identidade
(profissional, social e sexual). Daí que este período de desenvolvimento
específico seja de considerável importância e mereça um estudo aprofundado.
Para tanto utilizaremos como base teórica o livro de Dianne Papalia e Saly
Olds: Desenvolvimento Humano.
A adolescência é um processo dinâmico entre a infância e a idade
adulta. A adolescência dura quase uma década, aproximadamente dos 12 ou
13 anos até por volta dos 20 anos, mas esse período tem se estendido cada
vez mais. Geralmente, considera-se que a adolescência se inicia na
puberdade, o processo que leva à maturidade sexual, ou fertilidade –
capacidade de reprodução (Papalia e Olds, 2000). Os seus limites cronológicos
variam e, acreditamos ser difícil definir biologicamente o início da puberdade, já
é mais complicado situar o término da adolescência, pois baseia-se em critérios
psicológicos, sociais e culturais e, como tal, mais variáveis. Há muitas
tentativas de se definir adolescência, embora nem todas as sociedades
possuam este conceito. Cada cultura possui um conceito de adolescência,
baseando-se sempre nas diferentes idades para definir este período. No Brasil
o Estatuto da Criança e do Adolescente define esta fase como característica
dos 13 aos 18 anos de idade.
A adolescência, por sua vez, é uma atitude cultural. É, portanto, uma
atitude ou postura do ser humano durante uma fase de seu desenvolvimento,
que deve refletir as expectativas da sociedade sobre as características deste
grupo. A adolescência é um papel social e esse papel social de adolescente,
parece sempre ter sido simultâneo à puberdade.
De fato, a transformação trazida pela puberdade tem sentido. Basta
lembrar a chegada dos desejos sexuais, que já existiam, mas que agora são
reconhecidos como tais pelos próprios sujeitos e, aos poucos, a descoberta de
uma competição possível com os adultos, tanto na sedução quanto no
enfrentamento (Calligaris, 2000).
A compreensão do adolescente à luz do contexto de suas relações
amplia nosso estudo em direção às redes sociais (família, amigos, escola,
trabalho, comunidade), ou seja, às relações interpessoais que ele percebe
como significativas ou que de alguma forma fazem parte de sua vida. É através
da rede que o adolescente constrói seu universo relacional, reconhecendo-se
como cidadão e construindo sua auto-imagem (Sluzki, 1997).
O adolescente se percebe com um corpo estranho, com novos impulsos
e sensações. Seu esquema corporal não mais corresponde ao que usava até
então. Ele se percebe com pensamentos diferentes, com idéias, metas,
projetos e vê que os outros o olham com novos olhos.
Juntamente com as mudanças físicas, o jovem experimenta mudanças
subjetivas e este desenvolvimento põe em jogo seu sentido de
autoconsciência, necessitando de tempo para a integração destas mudanças
na sua identidade de forma positiva e com autoconfiança. Um dos adventos
que ocorrem nesta fase é a passagem da dependência da família para a
dependência do grupo de pares (amigos) como forma de segurança,
identificação e aceitação (Mussen, 1977).
Podemos perceber na nossa sociedade que grande parte dos
adolescentes prefere ficar com amigos, em grupos ou pares, que se identificam
e se sentem à vontade, do que com sua própria família. Acreditamos que
muitas vezes estes adolescentes tendem a achar que a maioria dos outros
adolescentes participa de um mundo “só deles”, compartilhando assim de
valores em comum, onde a maioria dos adultos não faz parte. A quantidade de
tempo que os jovens passam com os pais diminui drasticamente na
adolescência. Segundo Papalia e Olds (2000), os adolescentes sentem-se
mais felizes, livres e motivados quando estão com amigos em contraste com a
família, onde a atmosfera tende a ser mais monótona e séria.
2.1.1 O adolescente e sua identidade
A questão de construir a própria identidade é sumamente importante,
na adolescência. Cada indivíduo possui uma necessidade de se perceber como
um ser único e distinto das demais pessoas, ainda que compartilhe valores e
atitudes com outros. Ele passa a se preocupar com a sua imagem perante as
outras pessoas, tendo que conciliá-la com seus reais sentimentos, com seus
papéis sociais e habilidades. Para Erickson (1972), a identidade se configura
em três áreas básicas que são a identidade sexual, a profissional e a
ideológica. A identidade sexual é aquela em que a segurança do papel sexual
assumido é o que lhe permitirá estabelecer as ligações características das
etapas seguintes. É estando seguro do que se é, que se pode finalmente
buscar a relação com o outro sem que haja confusão de papéis, ou seja, o
outro não é visto como extensão do eu, mas sim como um outro com quem se
relacionar. A identidade profissional é importante, pois, é a realização
profissional que dará ao indivíduo a capacidade de sentir-se membro ativo e
produtivo no grupo social a qual pertence. A escolha de uma profissão é
fundamental na normalização das relações com o mundo. Já a definição
ideológica, se dá, quando o adolescente por estar em uma fase de sua vida
onde ocorre permanentemente reconstruções internas, deve acompanhar a
reconstrução do mundo e posicionar-se. De acordo com ele, esta postura
cognitiva é um complemento na produção de um sentido de identidade, já que
ele tem que escolher delimitadamente seus compromissos pessoais,
ocupacionais, sexuais e ideológicos. A resolução dos três níveis da identidade
dará ao indivíduo a segurança necessária para as etapas posteriores onde,
definido o que é, poderá se projetar com um realizador e daí partirá para a
formação de uma identidade positiva. A identidade negativa “baseia-se em
todas as identificações e papéis que, em momentos críticos do
desenvolvimento, foram-lhes apresentados como sumamente indesejáveis ou
perigosos e, também, como os mais reais”. Ela pode advir, também, da
“necessidade de encontrar e defender um nicho próprio contra os ideais
excessivos exigidos ou por pais morbidamente ambiciosos” (Erickson, 1972).
De acordo com Silvia Leser (2004) os jovens são vitimas, predestinadas porque
estão na idade de maior inquietação e demanda por experiências novas e
diferentes. Quando não encontram na escola, na família ou nos bairros
respostas às suas insatisfações, vão procurá-las nas ruas, espaço
desestruturado e aventuroso, com possibilidade de ganho ou diversão, porém
cheio de perigos.
Neste caso, a formação da identidade recebe a influência de fatores
intrapessoais (as capacidades inatas do indivíduo e as características
adquiridas da personalidade), de fatores interpessoais (identificações com
outras pessoas) e de fatores culturais (valores sociais a que uma pessoa está
exposta, tanto globais quanto comunitários).
Devemos considerar ainda a crise de identidade, que segundo Erickson
(1972), é normal na adolescência, significando um definir dos seus limites face
às exigências da sociedade, como antes acontecera face à família. Se o jovem
não chega a uma resolução desse conflito, depara-se com uma confusão de
papéis, que o pode levar a optar por uma identidade negativa para satisfazer a
sua necessidade de ser reconhecido pelos outros. Os comportamentos
desajustados têm, em princípio, caráter transitório e experiencial. Erickson
(1972) chega a sugerir que os indivíduos que não experimentaram esta crise
na adolescência e que não a ultrapassaram, são adultos menos saudáveis e
menos maduros. Tais comportamentos desajustados podem, entretanto, vir a
ter conseqüências graves no ajustamento social e pessoal do indivíduo
quando, por exemplo, entram em confrontos com a Lei e as autoridades, dos
quais resultem punições legais e conseqüente estatuto de “delinqüente” que vai
ser melhor detalhado no decorrer deste trabalho.
2.2 MARGINALIDADE E DELINQUÊNCIA
Diariamente, as pessoas passaram a ser expostas ao risco constante de
ataques a sua integridade física e moral. Várias situações limites passam a ser
imaginadas e repetidas, como uma maneira de preparar o psiquismo para a
idéia de que só a força resolve conflitos, tornando a violência um item
obrigatório na visão do mundo que nos é transmitida. Cria-se uma subjetividade
de que o crime e a brutalidade são inevitáveis, e que a pessoa deve estar
preparada para eles e para reagir em conformidade. Esta familiarização com a
violência torna, no nosso cotidiano, um acontecimento corriqueiro, cuja
proliferação indiscriminada mostra que as leis perderam o poder normativo e os
meios legais de “repressão”, a força que deveriam ter e, com isto, indivíduos e
grupos passam a arbitrar o que é justo ou injusto, segundo visões privadas,
dissociadas de princípios éticos validos para todos. O crime é, assim,
relativizado em seu valor de infração e os criminosos, ao invés de se sentirem
marginais, agem com tranqüilidade, não se julgando fora da lei ou da moral,
pois se conduzem de acordo com o que estipulam ser o preceito correto.
Disseminam-se "sistemas morais" particularizados, que "legalizam" os atos
praticados dentro da ótica moral e ética própria, podendo nelas uma atitude
criminosa ser justificada e legitima.
No livro de Leda Schneider (1987) “Marginalidade e Delinqüência
Juvenil” podemos ver que o conceito de Marginalidade foi dado primeiramente
por Robert Park em 1928, que caracterizou o homem marginal como
populações imigrantes que procuravam se integrar à sociedade norte-
americana: Os imigrantes por serem indivíduos ligados à duas culturas à sua
sociedade de origem e aquela em que passam a viver, estavam sujeitos a uma
situação de conflito cultural.
Everett Stonequist apud Leda Scheneider (1987) caracteriza o homem
marginal diz: “Em resumo, é um contraste, tensão ou conflito de grupos sociais
que diferem quanto à raça ou cultura e onde os membros de um grupo estão
procurando ajustar-se ao grupo que se acredita possuir maior prestígio e poder.
No Brasil, como nos demais paises da América Latina, o conceito de
marginalidade começou a ser encarada tanto como problema teórico, como
prático, conforme Schneider (1987). Logo depois da segunda guerra mundial,
houve muitas migrações das comunidades rurais para a urbana, o que fez com
que as populações migrantes fossem se estabelecendo na periferia das
grandes cidades. Na medida em que essas migrações foram se tornando
exorbitantes, cresceram vastos conjuntos habitacionais muito pobres e
primitivos que, pela sua localização física, geralmente à margem das grandes
cidades passaram a ser denominados bairros marginais e seus habitantes
populações marginais. Inicialmente estes conceitos eram usados meramente
pela localização física de pessoas que moravam as margens das grandes
cidades. Oscar Lewis apud Schneider (1987) reflete ao falar sobre o conceito
da “cultura da pobreza” caracterizando como:
[...] ausência de participação e integração efetiva dos pobres nas principais instituições da sociedade; ao nível de comunidade observa-se a existência de condições precárias de habitação, grande densidade e, acima de tudo, um mínimo de organização além do nível da família nuclear e extensa; no âmbito da família, os principais traços da cultura da pobreza são a ausência da infância como um estágio prolongado e protegido do ciclo vital, a iniciação sexual precoce, uniões livres ou casamentos consensuais, ocorrência relativamente freqüente de abandono da esposa e filhos; no nível do indivíduo, os principais traços são um forte sentimento de marginalidade, de desamparo, de dependência e inferioridade. (Schneider, 1987, p.27).
Fala-se de exclusão cultural, espacial, social e econômica. Neste
contexto, podemos perceber que os habitantes pobres da periferia constituem
se, a priori, como indivíduos marcados por essas exclusões, subjetivando-se
como “os de fora”.
De acordo com Quijano (1978), o termo marginal esta ligado à questão
do crescimento acelerado e desigual das grandes cidades, ocorrido, sobretudo,
a partir da década de 1950 e que moradias precárias não se encontravam
apenas nas áreas marginais, como sendo os de fora da urbanização, mas
também eram localizáveis nos setores mais centrais e tradicionais das cidades.
Além desse fato, verifica que "não era unicamente a moradia ou a habitação
como tais que se encontravam em precariedade, mas todo o conjunto de
'serviços comunais' (água, esgoto, luz elétrica, transportes) de certas áreas da
cidade" (Quijano, 1978, p. 19).
Quando falamos de desigualdade, discriminação e separação, como
sendo “os de fora” da sociedade, os membros dos grupos acabam sendo
referenciados como menores, inferiores, subordinados, mas vemos que tomam
parte do mesmo universo, da mesma sociedade. Esta é uma visão positivista
de união destas populações marginalizadas com a urbanização, onde formam
um conjunto, e não seriam neste caso, excludentes, o que nos remete a pensar
em um exercito de reserva citado por Marx (1980), que é composto de
desempregados, ávidos pela necessidade, de um emprego, qualquer que seja.
O Capitalismo é um sistema econômico, como tal só tem compromissos com o
capital. Todavia, o Estado tem compromissos com a sua subsistência e de sua
população, necessitando evitar que o contingente de desempregados acabe
indo buscar atividades ilícitas e/ou fora do controle do Estado para sobreviver.
Dessa forma, procura-se conformar as exigências de um exército de reserva do
capitalismo com o controle das massas, da classe perigosa. A classe dos
marginalizados está definitivamente fora do mercado capitalista, pois que, por
demais conformada, com este estado – não necessariamente com a miséria –
não tem a ambição de ser um trabalhador formal, ao contrário, suas ambições
estão relacionados ao seu meio marginal.
De acordo com Sawaya (2004) :
Para as classes dominantes é difícil reconhecer um igual nas personagens da pobreza. Reconhece-se o diferente como desigual. Da desigualdade à inferioridade não há muita diferença. Da desigualdade, reconhecida como inferioridade e do desconhecimento ao temor, do ponto de vista psicológico, não há também, grande distância. O medo à desordem e à perda da vida e das propriedades, um grande descrédito na polícia e na justiça podem transformar a insegurança e o temor difusos em acusações contra segmentos sociais ou grupos específicos de sujeitos de quem se desconfia, que não são reconhecidos como iguais, ou seja, não são portadores da mesma humanidade que reconheço em mim e nos meus iguais (Sawaya, 2004, p. 135)
Com o conceito dado por Marx (1980), de reserva flutuante, em que ele
caracteriza como sendo composta por trabalhadores, atraídos às vezes pela
indústria moderna e rechaçados por outras, especialmente jovens e pessoas
mais idosas nos tempos dele; hoje em dia pode-se caracterizar por grande
parte migrantes recém chegados na cidade e antigos migrantes marginalizados
que, de outro modo, subsistem graças aos seguros sociais. Em relação ao
conceito de reserva de trabalho intermitente é uma parte do exército de mão-
de-obra ativa, que tem um emprego sumamente irregular. Tem os mínimos
salários (devido à competição premente das massas de trabalhadores latentes
ou flutuantes) e as condições de vida desse grupo estão abaixo do padrão do
resto da classe operária. Podemos ver que boa parte dos adolescentes em
conflito com a lei têm renda familiar mensal por volta de um salário mínimo, e
são agraciados por políticas publicas do governo atual, como Bolsa Escola,
Salário Família, Vale-gás, dentre outros.
Entretanto, de acordo com Marx (1980), a desigualdade e a pobreza são
vitais para o funcionamento normal das economias capitalistas. A desigualdade
é necessária para produzir uma força de trabalho diversificada, por seu papel
na produção de um excedente expropriável e por sua função como incentivo
para trabalhar. A mecanização, a automatização e o ritmo desigual do
desenvolvimento econômico produzem inevitavelmente desemprego,
subemprego e pobreza. A desigualdade está na base de todo sistema
econômico de vida. É neste sentido que os “marginais” representam uma forma
de questionamento da ordem vigente (de caráter liberal burguês), pois que não
se conformam em serem mais um trabalhador explorado, e assim não tendo
desejo de o serem, procuram outras formas, fora da lógica capitalista, da
sociedade liberal burguesa recém escravocrata, lhe oferece, como é o caso
dos adolescentes em conflito com a lei, que por voltarem para este modo de
subsistência, passam a reincidir, não havendo a política de bem estar social
por parte do governo.
2.2.1 A cultura da violência
Atualmente, a cultura da violência, valorizando a utilização da força,
constrói uma nova hierarquia moral. O universo social simplifica-se
monstruosamente entre fortes e fracos. De acordo com o Psicanalista Jurandir
Freire (2004), Sobre os ombros dos poderosos pesa, no seu entender, a
responsabilidade pelas principais mazelas sociais que atormentam o País, em
especial a altíssima criminalidade. Não seria apenas a cruel concentração de
renda que gera o crime, como se repete à exaustão, mas também a adoção de
um comportamento em que “sociabilidade e moralidade se tornaram
adversárias”. Quem ocupa a posição de agressor é objeto de temor e ódio por
parte da vitima e quem ocupa a posição de vitima é objeto de desprezo e
indiferença por parte do agressor. Pouco importa as características físicas,
psíquicas ou sociais dos sujeitos. Na montagem violenta o que conta é a força
ou a fraqueza de quem ataca e de quem se defende. Termos como compaixão,
consideração, culpa ou responsabilidade diante do semelhante desaparecem
do vocabulário e ações. Crianças e adolescentes são assassinados
diariamente por motivos banais, tal como a disputa por um controle de vídeo
game, ou apenas por morarem em comunidades diferentes. Estes
adolescentes passaram a “brincar” com suas vidas e com a vida das outras
pessoas.
O termo "crime" antes de ser um fato definido por lei antes é um conceito
social que tem evoluído no espaço e no tempo. Na verdade, podemos afirmar
que os conceitos sociais de criminalidade variam com o tempo e o lugar, pelo
que a prática de um ato num determinado país e época histórica definida pode
corresponder a uma certa repressão penal, enquanto noutras pode ser punido
de uma forma diferente, ou mesmo nem sequer o ser. Os adolescentes em
conflito com a lei mais especificamente, são submetidos a medidas sócio-
educativas, que serão melhor definidas nos capítulos seguintes.
Se os limites sociais, culturais e jurídicos do que pode ser visto como um
ato desviante, criminal e delituoso são variáveis e evoluem de acordo com o
próprio desenvolvimento cultural, também, numa perspectiva psicológica, se
tem visto essa variação, quando se dá a possibilidade de tratar de diversas
psicopatologias e desvios de caráter e personalidade.
2.2.2 Delinqüência juvenil
Focando somente a delinqüência juvenil o que se verifica é que ao longo
das gerações este conceito, apesar de valorizado, continua a permanecer
ligado a noções de caráter estritamente jurídico, social e mesmo moral,
deixando de lado, no essencial, a sua constituição como objeto de análise
psicológica. Salvo quando é associado à patologia mental e social; como uma
forma de adoecer. Podem ser considerados delinqüentes, assim como
desviantes, os indivíduos que transgridem regras e tabus, hábitos e costumes
aceitos normalmente sem contestação pela maioria das pessoas e que variam
segundo as sociedades.
O desvio e o crime não são sinônimos. O conceito de desvio é muito
mais complexo do que o de crime, o qual se refere apenas a uma conduta de
quem infringe uma lei. Numa perspectiva jurídica e técnica, só é considerado
delinqüente o indivíduo que infringiu a lei, isto é, que cometeu um delito. As leis
que definem a delinqüência, bem como a apreciação dos delitos são, como
referimos acima, específicas de cada sociedade.
De acordo com Antony Guiddens:
As abordagens biológica e psicológica para a criminalidade presumem que o desvio seja um sinal de algo “errado” com o indivíduo, e não com a sociedade. Vêem o crime como se sua causa fosse fatores que estivessem fora do controle do indivíduo, incrustados no corpo ou na mente. Então, se a criminologia científica fosse capaz de identificar com sucesso as causas do crime, seria possível trata-las. Nesse aspecto, tanto a teoria biológica do crime quanto a psicológica são positivistas por natureza. (Guiddens, 2005 p. 175)
Ao considerarmos, porém, os comportamentos desviantes é necessário
levar sempre em conta, de que na perspectiva jurídica, nem todo o ato
desviante é delito1. Assim como no âmbito psicológico nem todo o delito é um
ato desviante. Assim, a transgressão da norma não define por si só o crime e
nem o desvio, porque os atos nunca são percebidos do mesmo modo e porque
nem todos os atos anti-normativos são ilegais ou desviantes. Dado que
estamos inseridos numa realidade social, é necessário que não nos limitemos à
simples constatação do ato, mas antes, estejamos atentos para as motivações
e ao contexto psicossocial em que o mesmo se desenvolveu, ainda mais se
tratando de um adolescente em conflito com a lei, como podemos falar em
delinqüência juvenil quando devemos prestar atenção na especificidade do seu
1 Se não é delito pode ser somente uma contravenção penal, a contravenção penal não cabe pena, utiliza-se medidas alternativas, como é o caso do adolescente em conflito com a lei que Segundo o sistema jurídico-penal brasileiro, o menor de 18 anos é inimputável e está sujeito a uma legislação específica, mais branda, dado o seu peculiar estado de desenvolvimento psicossocial que, entendem os legisladores, não torná-los aptos a serem punidos por suas ações delituosas como se adulto fosse. Orienta GUSMÃO apud PAULA (1989, p.469) na justificação de seu esboço: “o Juiz fará a aplicação das medidas segundo a sua adaptação ao caso concreto, atendendo aos motivos e circunstâncias do fato, condições do menor e antecedentes. A liberdade, assim, do magistrado é a mais ampla possível, de sorte que se faça uma perfeita individualização do tratamento.
discurso, uma vez que o comportamento do adolescente é algumas vezes,
visto como um comportamento preenchido por pequenos delitos, sendo assim,
normativo para esta fase da vida em que o mesmo esta envolvido numa fase
de turbulência e mudanças.
2.3 ECA, FUNDAC – E SUAS INSTITUIÇÕES (CIAD E CEDUC-Pitimbú)
2.3.1 O ECA
Estatuto da Criança e do Adolescente, regulamentou em 13 de julho de
1990 que “crianças e adolescentes brasileiros, sem distinção de raça, cor,
classe social, passariam a ser reconhecidos como sujeito de direitos,
considerados em sua condição de pessoas em desenvolvimento e a quem se
deve prioridade absoluta, seja na formulação das políticas públicas e
destinação privilegiada de recursos das diversas instâncias político-
administrativas do país”.
Nos detemos, para a construção do presente estudo, aos artigos que se
referem aos adolescentes em conflito com a lei, as atribuições, cumprimentos
de medidas sócio-educativas, seus deveres e direitos.
2.3.2 A FUNDAC - RN
A Fundação Estadual da Criança e do Adolescente foi o nosso universo
de estudo. Onde podemos conhecer como acontecem na prática as medidas
sócio-educativas descritas pelo ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, e
conhecemos também um pouco das dificuldades enfrentadas pelos
coordenadores para realizarem um trabalho eficaz.
A FUNDAC é a entidade responsável por formular e executar, em todo o
Estado, uma política uniforme de proteção dos direitos da criança e do
adolescente, competindo-lhe o estudo do problema e o encaminhamento das
soluções. A FUNDAC foi criada em 1994, substituindo a FEBEM, com o
objetivo de executar e humanizar as políticas do Governo do Estado de
proteção e atenção às crianças e adolescentes.
O trabalho desenvolvido pela FUNDAC é voltado para os adolescentes
em conflito com a lei; adolescentes egressos de medidas sócio-educativas,
crianças e adolescentes em situação de risco social e pessoal, crianças e
adolescentes em situação de abandono, orfandade e vitimização.
Seus objetivos principais são Educar para o convívio social, fortalecer
vínculos familiares e comunitários, promover a defesa dos direitos de crianças,
adolescentes e jovens, oferecer programas nas áreas da educação, esporte,
cultura, lazer e profissionalização.
A FUNDAC possui três diferentes linhas de ação. Cada uma delas
desenvolve atividades voltadas para um público específico:
Proteção Jurídico Social: Atende a adolescentes autores de ato infracional ou
egressos de medida sócio-educativa, corresponde ao Programa de Liberdade
Assistida e ao Programa de Prestação de Serviços à Comunidade.
Proteção Especial: Abriga crianças e adolescentes de ambos os sexos (de 0 a
18 incompletos) em situação de risco pessoal, abandono ou orfandade através
do Programa SOS Criança.
Ações Suplementares: Atende a crianças e adolescentes em situação de
risco pessoal e social advindos dos programas da FUNDAC, de órgãos
parceiros e da comunidade sendo estes: Programa de Criança, Programa
Serviço Civil Voluntário, Programa de Educação Profissional e Cidadania,
Programa Jovem Cidadão (Guarda Mirim), Programa Jovem Guia de Turismo,
Projeto Paz em Casa, Programa de Encaminhamento ao Trabalho, Serviço de
Apoio ao Servidor – SAS.
2.3.3 CIAD
Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente (acusado de ato
infracional) é a unidade que integra operacionalmente, no mesmo espaço
físico, os seguintes órgãos: Juizado da Infância e Juventude, Promotoria da
Infância e Juventude, Defensoria da Criança e do Adolescente, Secretaria de
Estado da Defesa Social (Policia Militar e Delegacia da Criança e do
Adolescente), além dos serviços de Internação Provisória da FUNDAC/ RN,
para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescentes a quem se
atribua autoria de ato infracional.
No CIAD, o adolescente passa até 45 dias no regime de internação,
onde irá aguardar a decisão da promotoria qual será a medida sócio-educativa
que irá cumprir. Os serviços oferecidos, divulgados pelo site do Governo do
Estado do Rio Grande do Norte, além da internação provisória são os
atendimentos sociais, psicológicos, médico-odontológico, atividades artísticas e
culturais, fornecimento de alimentação, vestuário, medicamentos,
acompanhamento bio-psico-social, alfabetização e orientação sexual.
2.3.4 CEDUC’s
Os Centros Educacionais são unidades operacionais de atendimento
direto, em regime de internação e semi-liberdade para adolescentes de ambos
os sexos, com medida sócio-educativa de privação de liberdade, determinada
pela justiça, por atribuição de autoria de ato infracional.
Aqui no Rio Grande do Norte temos o CEDUC – Pitimbú, onde os
adolescentes em conflito com a lei ficam privados de liberdade, podendo ficar
de três meses a três anos, dependendo do ato infracional cometido e também
do seu comportamento; o CEDUC – Pe. João Maria, onde adolescentes do
sexo feminino em conflito com a lei ficam privadas de liberdade; o CEDUC –
Esperança onde os adolescentes em conflito com a lei cumprem a medida
sócio-educativa de semi liberdade. CEDUC – Mossoró, que está para
inaugurar, que irá atender toda a região Oeste do Estado. No CEDUC, segundo
informações obtidas no site oficial do governo do estado, são oferecidas
Internações; atendimento social e psicológico; atendimento médico-
odontológico; escolarização; qualificação profissional; esporte; lazer; atividades
artístico-culturais; fornecimento de alimentação, vestuário, medicamentos e
material escolar; acompanhamento jurídico; apoio bio-psico-social; orientação
sexual; apoio às famílias e egressos; atividades externas e apoio ao servidor.
Nos detemos as atividades desenvolvidas com os adolescentes em
conflito com a Lei, que estão cumprindo medida sócio-educativa no CEDUC –
Pitimbú, por querermos verificar como a privação de liberdade favorece ao
desenvolvimento desse adolescente, a eficácia na reeducação do adolescente
em conflito com a lei para um convívio social, ou se são ineficientes e assim,
estão servindo como uma maior probabilidade de continuarem na
criminalidade, já que à volta para o seio da sociedade na realidade mostra-nos
um cidadão muito pior, ainda mais violento e anti-social.
Os dado que identificam quantos adolescentes são reincidentes não
estavam disponíveis, para a nossa avaliação, os únicos dados eram os
registros de entradas desses adolescentes no CEDUC por meio de livros de
registro.
O CEDUC – Pitimbú hoje tem um quadro de noventa e três funcionários,
entre eles, é composto por 01 diretor, 01 vice-diretor, 02 psicólogas, 04
assistentes sociais, 01 médico, 01 nutricionista, 04 auxiliares de enfermagem,
01 dentista, 06 motoristas, 22 agentes educacionais e educadores, 02 arte
educadores, 03 cozinheiros, 04 auxiliares de cozinha, 02 pedagogas, 04 apoios
administrativos, 33 policiais, 01 almoxarife, 01 técnico de serigrafia e 01 apoio
técnico, totalizando 94 funcionários.
2.4 MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA OU PUNIÇÃO
As Medidas Sócio-Educativas são sentenças judiciais previstas no
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8069 de 13/07/1990,
Capítulo IV do Título III). Impostas por Varas especiais, responsáveis pela
medida corretiva de adolescentes que desrespeitaram o Código Penal
Brasileiro, essas medidas são direcionadas à adolescentes entre 12 anos de
idade completos e 18 anos incompletos, podendo ser estendidas até aos 21
anos, em casos específicos (Art. 2º - ECA).
Com vistas à temática desta obra, ater-nos-emos ao sexto parágrafo do
art. 112º do ECA1, ou seja, a internação.
Sobre internação, diz o Estatuto:
“(É prevista para) ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência
à pessoa; por reiteração no cometimento de outras infrações graves; ou por
descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta”.
Neste caso, refletem as crenças humanas sobre o comportamento
humano, atribuindo-lhe significados institucionalizados e iniciando o processo
de socialização dos indivíduos. Este é o caso dos estatutos que, como
documentos oficiais de uma dada instituição, enunciam as normas e regras
socialmente aceitas em suas circunvizinhanças e nas relações interpessoais e
denunciam a dinâmica oficial proposta. A análise desses estatutos permite,
portanto, a apreensão do contexto de desenvolvimento institucional de
crianças, via compreensão das suas práticas institucionais, as quais
permeavam o relacionamento dos atores sociais.
No contexto institucional, a formação perpassa um processo de
normatização do comportamento. Impõe-se um cotidiano preestabelecido de
acordo com um sistema de normas e regras de controle e/ou de correção
disciplinar do corpo, caracterizado por uma rígida rotina e por espaços de
circulação restritos aos limites da instituição, de forma a instrumentalizá-lo
(Foucault, 2005).
Chegando aqui, debatemos sobre a seguinte pergunta quando
pensamos nos adolescentes em conflito com a lei, que estão cumprindo
1 Vide página 15.
medida sócio educativa de acordo como ato infracional em estabelecimento
educacional: seria o caso de se proteger do jovem ou de proteger o jovem?
As instituições que acolhem esses adolescentes considerados infratores
se propõem a isolar, a punir ou educar? Em algum momento, esses
adolescentes vão sair. Nos perguntamos se estarão prontos para conviver com
a sociedade embutida de preconceitos e excludente por natureza.
De acordo com nossas leituras, pudemos perceber que a falta das
atividades propostas por lei das medidas sócio-educativas são deturpadas, pois
onde deveria haver educação esta sendo executada como punição.
Entretanto, Foucault, referindo-se a regra da quantidade mínima nos faz
refletir sobre que é necessário “punir exatamente o suficiente para impedir, pois
um crime é cometido porque traz vantagens. Se a idéia do crime fosse ligada a
idéia de uma desvantagem um pouco maior, ele deixaria de ser desejável”
(Foucault, 2005, p. 79) e continua: “[...] A punição visa não à ofensa passada,
mas a desordem futura. Fazer de tal modo, que o mal feitor não possa ter
vontade de recomeçar, nem possibilidade de ter imitadores”. (Foucault 2005,
p.78).
No decorrer da construção deste trabalho pudemos conhecer as duas
instituições ligadas a FUNDAC e são as responsáveis pela aplicação das
medidas: o CIAD (Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente), que
funciona em Natal e o CEDUC (Centro Educacional – Pitimbú) que funciona em
Parnamirim.
Com estruturas bastante similares, estes órgãos deixam a desejar no
que tange as condições mínimas de (re)socialização, mantendo assim,
características tipicamente prisionais, nos remeteremos ao longo do nosso
discurso à essa relação. Para tanto, vemos as Internações em estabelecimento
educacional na cidade de Natal, como prisões e no decorrer do trabalho
faremos menção do estabelecimento educacional como uma instituição
responsável pela reclusão de adolescentes em conflito com a lei, que em
quase nada se parece com um local para promover a educação. Consideremos
aqui a ressocialização como a idéia de proporcionar a transformação aos
indivíduos enclausurados, onde estes indivíduos refizessem suas existências
dentro da prisão para depois serem levados de volta à sociedade.
Foucault, 2005 ao refletir sobre a prisão e a delinqüência afirma:
A prisão não pode deixar de fabricar delinqüentes. Fabrica-os pelo tipo de existência que faz os detentos levarem: que fiquem isolados nas celas, ou que lhes seja imposto um trabalho inútil, para o qual não encontrarão utilidade, é de qualquer maneira não “pensar no homem em sociedade; é criar uma existência contra a natureza inútil e perigosa”; queremos que a prisão eduque os detentos, mas um sistema de educação que se dirige ao homem por ter razoavelmente como objetivo agir contra o desejo da natureza? A prisão fabrica também delinqüentes impondo aos detentos limitações violentas; ela se destina a aplicar as leis, e a ensinar o respeito por elas; ora, todo o seu funcionamento se desenrola no sentido do abuso de poder. Arbitrário da administração: o sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta é uma das causas que mais podem tornar indomável seu caráter. Quando se vê assim exposto a sofrimentos que a lei não ordenou nem mesmo previu, ele entra num estado de cólera contra tudo que o cerca; só vê carrascos em todos os agentes da autoridade: não pensa mais ter sido culpado; acusa a própria justiça. (Foucault, 2005 p. 222)
Para tanto, esta idéia de retorno à sociedade provem de uma
conceituação de exclusão social, e reinclusão social. Entretanto, acreditamos
que estes indivíduos não voltam ao convívio social, e sim, fazem parte de uma
inclusão social perversa, assim como cita Bader Sawaya:
A sociedade exclui para incluir e esta transmutação é condição da ordem social desigual, o que implica o caráter ilusório da inclusão. Todos estamos inseridos de algum modo, nem sempre decente e digno, no circuito reprodutivo das atividades econômicas, sendo a grande maioria da humanidade inserida através da insuficiência e das privações, que se desdobram para fora do econômico. (Sawaya, 1999, pg. 8)
No CIAD os adolescentes em conflito com a Lei passam até 45
(quarenta e cinco) dias em um regime fechado, com direito a duas visitas de
amigos e familiares por semana, o que diferencia do CEDUC, visto que lá os
adolescentes podem ficar de seis meses até três anos em regime fechado, e,
para alguns, é concedido o direito de receber visitas intimas.2
As atividades realizadas pelo CEDUC são: aulas de alfabetização, aula
de artes, sessão de cinema, acesso à biblioteca interna, jogos de futebol, muito
semelhantes às desenvolvidas no CIAD.
2 Hoje só dois adolescentes têm direito a receber visitas intimas o que depende do comportamento, exames de saúde, comprovação de que tem um relacionamento estável e a participação das orientações sexuais oferecidas pela instituição.
As medidas sócio-educativas se dão através de aulas, cumprindo as
exigências do poder público. Uma de tais exigências é a de que todos devem
ter acesso ao conhecimento, para tal, na unidade há um complexo destacado
da Escola Estadual Djalma Marinho onde funcionam 08 turmas, onde são
oferecidas aulas do programa educação de jovens adultos (EJA).
O cultivo de uma horta também faz parte das atividades destes
adolescentes, que ainda participam de aulas de teatro, de dança, de artes, de
cidadania e das sessões de cinema.
Estrutura
Situada no município de Parnamirim, a instituição em si muito se
assemelha a uma penitenciária: celas gradeadas, superlotadas, mal
iluminadas, mal ventiladas, mal higienizadas o que já descumpre o que exige o
Art. 124º do ECA, inciso X – “habitar alojamento em condições adequadas de
higiene e salubridade”
Foucault(1983) ao escrever sobre uma “racionalidade penitenciária”
afirma:
Elabora por todo o corpo social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles um aparelho completo de observação, registro e notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza. (Foucault, 1983, p. 207).
Construída em uma localidade de difícil acesso - o que dificulta a visita
dos familiares -, o CEDUC acolhe hoje uma média 95 adolescentes (novembro
de 2006), distribuídos em nove pavilhões, sua construção foi idealizada para
abrigar 50 adolescentes. A divisão dá-se menos de acordo com o ato
infracional cometido e mais de uma forma que os adolescentes possam ficar
protegidos, longe de seus inimigos, nada que, visivelmente proporcione aos
adolescentes um sentimento de que ao mesmo tempo que estão pagando
pelas conseqüências de seus atos, estão também tendo uma oportunidade de
ter acesso a educação, esporte, cultura, lazer, cursos profissionalizantes, que a
punição pelo ato infracional cometido estar privado de liberdade e não estar em
condições precárias de salubridade.
A visão dos pavilhões, assim que se entra é a dos adolescentes, diante
das grades, tomando banho de sol. D’outros, nas celas, só conseguíamos ver
braços e pernas, esticados para fora do que mais pareciam jaulas, através dos
pergolados. Em nada lembra um centro educacional. A péssima infra-estrutura,
as precárias condições dos alojamentos e os próprios relatos nos fazem refletir
se realmente as condições oferecidas pelo sistema torna-los-ão capazes de
fazer parte da sociedade, com uma nova postura, de maneira convencional,
assim que saiam do CEDUC.
A partir do contato que tivemos com alguns adolescentes e também com
os responsáveis pelos centros, percebemos que as medidas em vigor, não
condizem muito com a realidade vivida por estes adolescentes. As atividades
realizadas nos centros revelam-se meros paliativos, tentativas insossas de
quebra na ociosidade da vida nas celas.
Em nenhuma fala percebemos que o aprendizado que pode ser tirado
dos trabalhos desenvolvidos pelos profissionais ali atuantes é de fato
aproveitado. A realidade é que os adolescentes, em sua maioria, são viciados
em drogas, não possuem uma família estruturada e fora da instituição são os
donos de suas vidas, vivendo em função de seus próprios limites.
2.4.1 A reincidência em ato infracional
Estes adolescentes, em sua maioria, não assimilam a passagem pelo
CIAD ou CEDUC como uma possibilidade de sair da vida do crime, mas sim
como uma comprovação de que não fizeram o serviço da forma mais correta e
estão pagando apenas por que foram pegos e não por que infringiram a lei.
“Não se pune para apagar um crime, mas para transformar um culpado; o
castigo deve levar em si uma certa técnica corretiva” (Foucault, 2005 p.105)
Através de acesso ao livro de registro do CEDUC Pitimbú, pudemos
comprovar que há reincidência em ato infracional. Entretanto, não se tem
dados estatísticos sobre o ato infracional repetido, e sim, suas entradas nas
Instituições, independente da prática delitiva. Esta falta de dados dificulta que
se faça um trabalho onde se possa verificar quais as causas da reincidência,
como falhas nas medidas sócios-educativas, mal acompanhamento familiar dos
adolescentes em conflito com a lei, dentre outros.
Foucault ao falar sobre reincidência em ato infracional descreve que “A
quebra de banimento, a impossibilidade de encontrar trabalho e a vadiagem,
são os fatores mais freqüentes das reincidências” (Foucault, 2005, p.223).
As reincidências em atos infracionais por partes destes jovens dão-se,
também, por essa não-consciência, a de que precisam dar um novo rumo às
suas vidas. A análise da sociedade atual leva-nos a crer que eles, por vezes,
até mesmo por não querem mudar “o caminho”.
A família também tem grande influência em casos de reincidência, pois
os problemas familiares, como questões financeiras, violência e abandono -
não falamos aqui meramente de ser apenas fatos, mas toda a subjetividade
que estas problemáticas adquirem em seu conjunto - afastam esses
adolescentes de casa. Uma vez na rua, procuram o caminho mais “fácil” para
conseguir o que querem, seja através do roubo - para comprar algo que
desejam, ou até mesmo dos homicídios – utilizando o álibi de legitima defesa
contra os inimigos declarados.
Nesse sentido, diz Silvia Leser (2004):
Os jovens são vitimas, predestinadas por que estão na idade de maior inquietação e demanda por experiências novas e diferentes. Quando não encontram na escola, na família ou nos bairros respostas às suas insatisfações, vão procurá-las nas ruas, espaço desestruturado e aventuroso, com possibilidade de ganho ou diversão, porém cheio de perigos (Leser, 2004, p. 135-136)
Acreditamos que não se deve trabalhar com o adolescente que cometeu
um ato infracional, reincidente ou não, apenas na perspectiva do dano, pois por
isso ele já foi julgado e recebeu pena. O ideal seria que as atividades listadas
no Estatuto da Criança e do Adolescente fossem postas em prática, o que só
se vislumbra possível quando da priorização, pelos governantes, de direitos
básicos, tais como educação, cultura e lazer. E não só para os adolescentes
em conflito com a lei, mas também, e principalmente, para todas as crianças e
adolescentes, no intuito de desviar estes dos caminhos que levam à
marginalidade e às drogas. Anntony Guiddens, reflete:
[...] Fazer das prisões lugares completamente desagradáveis, provavelmente auxilia a intimidar transgressores potenciais, mas torna extremamente difícil alcançar as metas de reabilitação das prisões. Porém, quanto menos rigorosas forem as condições das prisões, maior será a perda do efeito intimidador da detenção (Guiddens, 2005 p. 199).
2.4.2 O papel da família do adolescente em conflito com a lei
O sujeito humano, ao contrário dos outros animais, não nasce
geneticamente programado, com comportamentos pré-estabelecidos,
instintivos. O ser humano se constitui através de identificações com aquelas
pessoas mais próximas e amadas por ele, especialmente aquelas da primeira
infância, ou seja, os pais. O ser humano vai introjetando aspectos, maneiras,
formas de ser, sentimentos e características destas pessoas queridas e vai,
com isso organizando seu próprio aparelho psíquico. No livro “Adolescer” 3
encontramos a definição de família como: ”A família, como toda instituição
social, apresenta aspectos positivos, enquanto núcleo afetivo, de apoio e
solidariedade. A família constitui-se como o primeiro elemento socializador da
criança, com quem aprende as noções de ”certo” e “errado”, hábitos, costumes,
crenças e valores. É a partir dela que a criança aprende a relacionar-se com o
mundo e com o seu eu, valorizando, ignorando ou reprimindo. é a família a
primeira instituição à qual o indivíduo pertence e onde forma sua base moral e
consciência social. A família não pode deixar de ser a estrutura fundamental
que molda o desenvolvimento psíquico da criança, uma vez que é, por
excelência, o local de troca emocional e de elaboração dos complexos
emocionais, que se refletem no desenvolvimento histórico das sociedades e
nos fatores organizativos do desenvolvimento psicossocial. Por isso, torna-se
importante o estudo das eventuais variações psicológicas provenientes das
modificações decorrentes no agregado familiar sem desprezar o
enquadramento espacial do mesmo, como o meio físico, cultural e social.
As pesquisas sugerem, segundo Straus (1994), que os adolescentes
com vínculos pouco efetivos com a família têm maior probabilidade de se
envolver em infrações do que aqueles com relações familiares estreitas.
3 Vide referência, ROCHA, Cláudia. TASIITANO, Cleide. SANTANA, Judith.( 2001).
Estudos mostram que a disciplina pouco consistente e ineficiente imposta pelos
pais está associada ao comportamento delituoso
É neste sentido que se dá a sua importância como fator de risco ou
de proteção contra a infração. Acreditamos que a fragilidade das relações
familiares e das instituições sociais remete este adolescente à criação de
novos vínculos e, em conseqüência, motiva-o ao cometimento dos atos
infracionais.
De acordo com Feijó (2001), em sua tese de doutorado:
Basicamente, há dois aspectos centrais na constituição do núcleo familiar: a estrutura e o relacionamento (Werner, 1990; Schoemaker, 1996). A primeira vem sendo estudada há bastante tempo no que se refere à sua influência no ato infracional. Ela inclui os lares desfeitos, onde um ou ambos os pais são permanentemente ausente, em virtude de morte, abandono ou separação. Faz-se aqui uma ressalva quanto à possibilidade das diversas conseqüências que podem advir das diferentes causas da desagregação do lar: a perda de um dos pais devido à morte traz sentimentos e uma carga emocional distinta de um afastamento por um divórcio. (...) A mudança da estrutura familiar, geralmente com a saída do pai, seja por morte ou evasão, coloca sobre a mulher a responsabilidade de prover os outros membros, fazendo com que o grupo caia nos estratos inferiores de renda. (FEIJÒ, 2001, p. 44)
Quando tivemos acesso ao livro de registro do CEDUC Pitimbú,
pudemos ver que a maioria dos adolescentes tem famílias monoparentais,
sejam eles criados por mães (nas fichas como solteiras ou separadas), avós ou
tias, em que o responsável pelo adolescente normalmente é do sexo feminino.
Acreditamos que o ambiente familiar não deve ser somente uma
instituição social, delimitada pelo sistema de parentesco e de seus
personagens morarem juntos em um espaço. Uma família forte, que marca
positivamente o indivíduo, deve prevalecer em densidade, permanência,
continuidade e envolvimento dos seus membros, de tal forma que favoreça a
criança em seu corpo e sua mente. As famílias que tem adolescentes em
conflito com a lei devem receber apoio para que exista uma preparação da
família para receberem de volta seus adolescentes após cumprirem medida
sócio-educativa em que para que se tenha o impacto desejado é necessária a
ação conjunta de vários profissionais. O restabelecimento da postura de ajuda
dos pais para com os filhos é revigorar sua confiança na competência que
possuem para orientar e auxiliar a prole nas suas escolhas, condutas e,
também, para apoiar e servir como suporte afetivo primário.
3 METODOLOGIA
A metodologia escolhida para este estudo foi de caráter exploratório e de
cunho qualitativo. A intenção deste estudo, como sustenta a pesquisa
qualitativa, foi como intuito de estabelecer a possibilidade de construção de
argumentos, não esgotá-los, podendo assim abrir novos caminhos, suscitar
outras dúvidas, despertar novas indagações e trazer contribuições para os
próximos estudos acerca deste fenômeno tão complexo como o da reincidência
de atos infracionais. A pesquisa foi realizada através de dados oriundos da
nossa observação ao visitar a FUNDAC, CEDUC Pitimbú e CIAD, assim como
revisão bibliográfica de todas as temáticas que envolvem o nosso Trabalho de
Conclusão de Curso.
3.1 TIPO DE PESQUISA
A pesquisa foi realizada através de estudo teórico, no qual foram
analisados os fatores que contribuem para a reincidência em ato infracional por
adolescentes em conflito com a lei, assim como o processo de inclusão social
que se manifesta no mesmo; e de estudos explicativos, a fim de tornar claro a
importância da qualidade de vida destes adolescentes, analisando também as
causas e conseqüências da ausência dos direitos previstos por lei na vida do
adolescente em conflito com a lei que passa por Internação em
estabelecimento educacional.
3.2 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
Para a execução desse trabalho, foram realizadas algumas visitas à
FUNDAC, assim como ao CIAD e CEDUC Pitimbú, onde realizamos conversas
informais e observações, visando conhecer um pouco do cotidiano dos
adolescentes em privação de liberdade assim aliados com estudo teórico
fundamentar a nossa pesquisa.
3.3 ANÁLISE DOS RESULTADOS Os resultados obtidos por meio de análise de conteúdo a fim de
esclarecer questões referentes à problemática, foram apresentados através de
textos explicativos e, logo em seguida, nas considerações finais.
4 REFLETINDO SOBRE OS DADOS OBTIDOS
Com os dados obtidos foi possível perceber que, dentre a população que
dá entrada nas instituições responsáveis por aplicar as medidas sócio
educativas do adolescente em conflito com a lei, não possibilita, até o presente
momento, mensurar dados estatísticos da reincidência em ato infracional por
adolescentes em conflito com a lei, visto que as informações documentais não
são informatizadas (gerando uma maior dificuldade de acesso e informação) e
se dão pela entrada do adolescente nas instituições, onde não tem informações
de como é caracterizado o retorno do adolescente. Por exemplo, se um
adolescente em conflito com a lei esta cumprindo medida no CEDUC e foge, e
com alguns dias depois retorna, seja por conta própria, ou por policiais, é
registrado o retorno dele como uma nova entrada, no livro de registro. Vimos
que nos registros contam que do ano de 2000 a junho de 2006, já tiveram 826
entradas (no CEDUC), não especificando o índice de reincidência em ato
infracional nestes números. Não existe um controle sobre as causas do retorno
deste adolescente, a não ser as pessoas que acompanham os casos destes
adolescentes. Mas, pelo que nos foi informado pelos funcionários do CEDUC, a
reincidência em ato infracional não é mensurada.
Outra observação que fizemos é que a FUNDAC não tem dados sobre
os benefícios das medidas sócio-educativas junto aos adolescentes que
passaram por Internação em estabelecimento educacional. Ora, como visto por
nós, muito dos adolescentes entram na instituição analfabetos ou semi-
analfabetos e na instituição freqüentar a escola é obrigatório. Nos indagamos:
“Será que sendo obrigatório a freqüência à escola, sairiam do cumprimento da
pena, estes, alfabetizados? Quantos ao cumprir as medidas sócio-educativas
conseguem um emprego com o que aprenderam no CEDUC?” Achamos muito
importante a coleta de dados dos fatores positivos, que deram certo na
instituição.
O CEDUC possui atividades como aulas teatrais, e já tem um grupo de
adolescentes que estão bem engajados na atividade, proporcionando até
algumas apresentações em outros locais, como foi o caso de uma
apresentação destes adolescentes a adolescentes que estavam no CIAD. O
cultivo da horta está sendo realizado por alguns adolescentes e aula de
pinturas, em que os adolescentes têm demonstrado muito interesse e
participação.
Pudemos perceber que as famílias dos adolescentes que cumprem
medida de Internação em estabelecimento educacional, em sua maioria têm
baixos salários, variando de menos de um salário mínimo a um salário e meio,
e suas famílias são monoparentais, ficando sobre a responsabilidade da mãe
ou avó.
Um dado que observamos, é a alta mortalidade dos adolescentes que
passaram por Internação em estabelecimento educacional. E que de acordo
com um funcionário da FUNDAC, estes adolescentes foram assassinados em
sua grande parte, onde apenas em dois casos foram por policiais.
Para tanto, vemos que o combate da criminalidade não pode ser feito só
mediante medida sócio-educativa. Faz-se necessário à congregação do todo o
sistema na área de educação, saúde, alimentação, lazer e principalmente uma
mudança de consciência da população. De modo que precisam ser
desenvolvidos dentro das unidades de internação projetos educacionais que
trabalhe para a conscientização dos adolescentes, fazendo-os o perceber a
realidade e conseqüentemente seu lugar na história, desenvolver nos
“educandos” a capacidade de reflexão, fazendo-os compreender a realidade
para que de posse dessa compreensão possam então desejar sua
transformação.
O sistema de medidas sócio-educativas necessita de uma educação que
se preocupe prioritariamente em desenvolver a capacidade crítica e criadora do
adolescente, capaz de alertá-lo para as possibilidades de escolhas e a
importância dessas escolhas para a sua vida e conseqüentemente a do seu
grupo social. Isso só é possível através de uma ação conscientizadora capaz
de instrumentalizar o adolescente para que ele firme um compromisso de
mudança com sua história no mundo.
Acreditamos que no caso de adolescentes que ainda não estão
institucionalizados e, portanto, não são infratores, há a possibilidade de se
atuar preventivamente, para promover a resiliência, a fim de que estes jovens
atuem sem violência diante da adversidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer da construção do nosso trabalho, pudemos muitas vezes
confrontar a teoria com a prática, no momento em que estávamos conhecendo
a realidade dos adolescentes em conflito com a lei, que estão cumprindo
medidas sócio-educativas, verificando com o que é dito na lei, sobre os direitos
e deveres das crianças e dos adolescentes.
Em nosso trabalho não era nosso objetivo julgar as formas como estão
sendo ofertadas as medidas e atividades para os adolescentes em conflito com
a lei. Nosso principal objetivo foi ver a ligação das medidas com a reincidência.
Poder possibilitar uma maior reflexão sobre a eficácia do que se está fazendo
hoje, e quais as deficiências que estão acontecendo no sistema que não está
suprindo a necessidade da demanda que cresce a cada dia.
Conhecer as Instituições e seus dirigentes foi muito importante, pois
vimos neles um desejo de melhorar os serviços já oferecidos, nos mostraram o
que vem fazendo e também o que ainda precisa ser melhorado, todos
reconhecem que a forma como os adolescentes são tratados ainda não é a
mais adequada e lutam por melhorias, o que já revela que essa iniciativa é o
primeiro passo para que o que regulamentado pelo ECA seja de fato cumprido.
A falta de números exatos de adolescentes reincidentes em ato
infracional, que passam pela FUNDAC, dificultou que pudéssemos trabalhar
em cima dos possíveis motivos que contribuem para a reincidência, mas isso
não nos impossibilitou de fazer um trabalho rico em informações. A cada visita
nas instituições, a cada encontro com os diretores responsáveis ou a cada
nova leitura teórica, tínhamos conteúdos para discutir e fazer reflexões sobre a
importância do tema abordado e da grandiosidade que envolve essa temática.
Discussões instigantes nos motivaram a levantar questões de suma
relevância para toda a sociedade, consideramos que o sistema de medidas
sócio-educativas necessita de uma educação que se preocupe prioritariamente
em desenvolver a capacidade crítica e criadora do adolescente, capaz de
alertá-lo para as possibilidades de escolhas e a importância dessas escolhas
para a sua vida e conseqüentemente a do seu grupo social. Isso só é possível
através de uma ação conscientizadora capaz de instrumentalizar o adolescente
para que ele firme um compromisso de mudança com sua história no mundo.
Sobre isso, Gadotti (1999) diz que “Educar é libertar [...] dentro da prisão, a
palavra e o diálogo continuam sendo a principal chave. A única força que move
um preso é a liberdade; ela é a grande força de pensar”.
Em sua análise Paulo Freire (1980) afirma que:
A conscientização não consiste em “estar frente à realidade” assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constituí, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. A conscientização trabalha a favor da desmistificação de uma realidade e é a partir dela que uma educação dentro do sistema penitenciário vai dar o passo mais importante para uma verdadeira ressocialização de seus educandos, na medida em que conseguir superar a falsa premissa de que, “uma vez bandido, sempre bandido”. (FREIRE, 1980, p.26)
É sabido que não é possível “ressocializar” ninguém mediante privação
de liberdade. Não podemos fazer isso tirando o adolescente infrator da
convivência em sociedade. A sociedade que existe lá dentro não é a mesma
que há aqui fora. Nem no melhor sistema previdenciário é possível. Não
reeduca nem é preventiva, haja vista que os crimes continuam ocorrendo assim
como sua reincidência em ato infracional.
Por fim, consideramos que o nosso trabalho não se encerra aqui, esse
foi apenas o começo de uma longa jornada que visa proporcionar na sociedade
como um todo uma reflexão acerca da sua responsabilidade sobre a
“recuperação” e da inclusão desses adolescentes ao convívio social.
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