UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS/UNIPAC FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DE BARBACENA-FADI
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
HENRIQUE GERALDO CAMPOS JÚNIOR
DA NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
BARBACENA 2012
HENRIQUE GERALDO CAMPOS JÚNIOR
DA NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª Me. Maria José Gorini da Fonseca
BARBACENA 2012
Henrique Geraldo Campos Júnior
DA NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Aprovada em: 12/12/2012
BANCA EXAMINADORA
Prof. Me. José Newton de Faria Advocacia Geral da União – AGU
Profª. Me. Maria José Gorini da Fonseca Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC
Prof. Esp. Paulo Afonso de Oliveira Júnior Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC
Dedico este trabalho à toda minha família,
em especial minha mãe, Flávia, e minha
irmã, Gabriela, que fazem com que
minhas conquistas pareçam maiores do
que realmente são e acreditam,
incondicionalmente, em meu potencial.
Dedico, também, à minha namorada,
Anamaria, e ao grande amigo Michael que
presenciam meus momentos de tristeza e
euforia, me lembrando sempre que por
mais tênue que possa ser a linha entre o
fracasso e o sucesso, nossa evolução
pessoal e profissional só depende de nós
mesmos. Por fim, mas não menos
importante, dedico esta obra àqueles que
foram verdadeiros percussores do Direito
em minha vida, dando grande ênfase aos
amigos Jordão e José Newton, que me
mostraram a beleza que transcende as
ciências jurídicas e se traduz por justiça.
“Justitia est constans et perpetua voluntas
jus suum cuique tribuendi” (Justiça é a
constante e perpétua vontade de dar a
cada um o que é seu).
Ulpiano
RESUMO
A presente monografia tem por escopo o ativismo judicial brasileiro e a necessidade
de sua limitação em sede do Supremo Tribunal Federal. A análise do tema trazido à
baila se deu mediante a utilização de doutrinas e a comparação destas com a
jurisprudência do Pretório Excelso. Para que o estudo ocorra de maneira inteligível,
a obra abordará a evolução histórica do Poder Judiciário no Brasil, demonstrando
como a atuação ativa dos órgãos daquele Poder fora se desenvolvendo de acordo
com o crescimento da própria sociedade. Ultrapassado este aspecto, o instituto do
ativismo judicial será vastamente explorado para que o leitor tenha noção exata de
sua abrangência e possa entender com clareza sua importância no Direito pátrio.
Objetivando uma perfeita cognição acerca dos motivos determinantes para que seja
lançada a proposta de limitação do ativismo na Suprema Corte, este trabalho
abordará o controle de constitucionalidade previsto em nossa Constituição Federal,
o processo legislativo das medidas provisórias e, enfim, o desenrolar da ação direta
de inconstitucionalidade nº 4029, que declarou constitucional o Instituto Chico
Mendes após um conturbado julgamento, gerando na sociedade uma forte sensação
de insegurança jurídica.
Palavras-Chave: Ativismo Judicial. Supremo Tribunal Federal. Controle de
Constitucionalidade. Processo Legislativo. Medida Provisória.
ABSTRACT
This monograph has as scope the Brazilian judicial activism and the need to limit his
seat in the Supreme Court. The analysis of the topic brought up was made through
the use of doctrines and compared these with the jurisprudence of the Praetorium
Exalted. For the study occurs in an understandable way, the work will approach the
historical evolution of the judiciary in Brazil, demonstrating how the active role of
outside agencies of that Power is developing according to the growth of society itself.
Exceeded this, the institute of judicial activism will be widely exploited for the reader
to have an accurate idea of its scope and can clearly understand its importance in the
paternal law. Aiming a perfect cognition about the reasons for limiting activism on the
Supreme Court, this work will mention the constitutionality control provided in our
Constitution, the legislative process of provisional measures and, finally, the
development of direct action unconstitutionality No. 4029, which declared
constitutional the Chico Mendes Institute after a messy trial, generating in society a
strong sense of legal uncertainty.
Keywords: Judicial Activism. Supreme Court. Judicial Review. Legislative
Procedure. Provisional Measure.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ...................................................................................... 17 3 DO ATIVISMO JUDICIAL ....................................................................................... 21 3.1 O Ativismo Judicial Propriamente Dito ........................................................... 21 3.2 Poder Constituinte Difuso ................................................................................ 24 4 DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ................................................... 27 4.1 Do Controle Concentrado de Constitucionalidade em Âmbito Federal ....... 28 4.1.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica ................................................ 29 4.1.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão .......................................... 33 4.1.3 Ação Declaratória de Constitucionalidade ........................................................ 35 4.1.4 Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental .................................. 37 4.2 Teoria da Inconstitucionalidade por Arrastamento ........................................ 38 5 DO PROCESSO LEGISLATIVO BRASILEIRO ..................................................... 41 5.1 Do Processo Legislativo das Medidas Provisórias ........................................ 43 5.2 Da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional ...................................... 48 6 DA ATUAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 4029 E DA NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL NO PRETÓRIO EXCELSO .................................................... 51 6.1 Da Decisão Emanada Pela Suprema Corte ..................................................... 51 6.2 Da Questão de Ordem Suscitada pela Advocacia-Geral da União e da Alteração do Resultado do Julgamento ................................................................ 55 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 65 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 67
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1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação traz uma análise acerca do ativismo judicial no Brasil
e propõe sua limitação no Supremo Tribunal Federal, principalmente pelo fato de que
as decisões proferidas pelo Pretório Excelso, no mais das vezes, são revestidas de
irrecorribilidade, o que pode gerar uma forte sensação de insegurança jurídica frente
à capacidade lesiva da má utilização daquele instituto.
Para que o estudo seja elaborado de maneira prática e coerente, será
elaborada a evolução histórica do Poder Judiciário brasileiro, com o intuito
possibilitar a compreensão de como se deu o surgimento do ativismo judicial e como
esta prática se tornou tão comum e necessária ao Direito pátrio. Além disto, o
referido instituto será abordado de maneira detalhada, haja vista suas peculiaridades
complexas e sua alocação como gênero de várias espécies, como por exemplo, a
analogia, a edição de súmulas e a própria equidade.
Partindo, então, para o ponto nevrálgico deste estudo, o controle de
constitucionalidade previsto em nossa Constituição Federal será vastamente
explorado, principalmente com relação ao controle concentrado, que é exercido pelo
Supremo Tribunal Federal quando da superveniência de lei ou ato normativo, federal
ou estadual, que fere a Carta Magna e seus princípios. Visando a elucidação
completa acerca do referido tema, serão analisadas as quatro possíveis ações que
visam a movimentação da Suprema Corte em prol da declaração de
constitucionalidade ou não de determinada norma, quais sejam, a ação direta de
inconstitucionalidade genérica, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, a
ação declaratória de constitucionalidade e a arguição de descumprimento de
preceito fundamental.
Por conseguinte, a abordagem será direcionada ao processo legislativo do
Brasil, cingindo-se, mais especificamente, na elaboração de medidas provisórias
que, em suma, é uma espécie normativa criada pelo Presidente da República, em
casos de relevância e urgência.
Finalmente, exauridos todos os pontos acima descritos, o exame será
direcionado ao julgamento da ação direta de inconstitucionalidade genérica nº 4029,
que fora proposta objetivando a declaração de inconstitucionalidade do Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, haja vista a violação de um
preceito constitucional relativo ao processo legislativo da medida provisória que o
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criou. O referido julgamento gerou uma enorme sensação de insegurança jurídica
entre muitos brasileiros, já que a ação havia sido julgada parcialmente procedente,
havendo a declaração da inconstitucionalidade da citado autarquia, porém após o
levantamento de questão de ordem, por parte da Advocacia-Geral da União, o
Supremo Tribunal Federal alterou sua decisão, julgando improcedente o pedido e
declarando constitucional o Instituto Chico Mendes, mediante a utilização de uma
espécie do ativismo judicial, tal qual, a modulação temporal dos efeitos de sua
decisão, ou seja, o vício que eivou o referido processo legislativo somente seria tido
como inconstitucional a partir daquela data, o que acabou por permitir que nossa
legislação contemple centenas de leis que foram criadas por medidas provisórias
editadas em desacordo com a Constituição Federal, razão pela qual, torna-se
necessário que sejam criados meios hábeis à limitação do ativismo no Órgão
máximo do Poder Judiciário brasileiro.
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2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Para que exista a possibilidade de uma evolução organizada de qualquer
sociedade, torna-se imprescindível que as experiências do passado sejam
aproveitadas e tidas como exemplo a todo instante. Isto se dá, principalmente, pelo
fato de ser através de nosso próprio crescimento que conseguimos observar toda
nossa história e tudo de positivo que se conquistou, para que, então, possamos dar
real valor às vitórias advindas com o passar dos anos e continuar promovendo
alterações que visem o bom desenvolvimento de nossa sociedade.
Tal máxima aplica-se irrestritamente ao Direito, já que esta é uma disciplina
sabidamente dinâmica, temporal e territorial. Logo, não seria crível admitir que uma
sociedade que desconsidera o passado seja tida como juridicamente evoluída, já
que seus próprios membros não conseguiriam elencar as benesses que lhe foram
conferidas com o passar das gerações e, via de consequência, não poderiam dar
andamento a um avanço sadio e organizado.
Assim, antes de adentrarmos no ponto nevrálgico deste trabalho, cumpre-
nos a realização de um resumo histórico para que possamos conhecer o progresso
jurídico de nossa própria sociedade, analisando o desenvolvimento do Poder
Judiciário e o crescimento do ativismo judicial.
Como cediço, ao redor do mundo encontramos traços peculiares em cada
uma das nações, diante disto, é importante frisar que o surgimento e o crescimento
das balizas do Poder Judiciário em cada civilização ocorreu de forma diferenciada.
Na Grécia antiga, por exemplo, o processo judicial observava, basicamente, a
oralidade e o ônus da prova era quesito fundamental para o deslinde de qualquer
demanda, uma vez que os juízes gregos não possuíam amplos poderes para
intervirem em questões probatórias. Assim, cabia ao juiz, tão somente, dizer o direito
com relação às provas que lhe foram produzidas por ambas as partes, não sendo
comum que o magistrado exercesse seu livre convencimento, ou seja, a decisão era
objetiva e o juiz não era dotado de discricionariedade.
Noutra banda, em Roma, não havia consagração relativa à separação dos
poderes e, desta forma, cabia aos magistrados o exercício de funções jurisdicionais,
administrativas e, em alguns casos, até militares. Logo, conclui-se que o poder do
juiz romano era bastante extenso, não existindo limitações rígidas às suas atitudes,
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sendo que o magistrado podia, inclusive, recusar aos cidadãos o direito de
ingressarem com um processo.
No Brasil, a história também traz traços marcantes de uma evolução latente.
Inicialmente, antes de proclamada a Independência de nosso país, o Poder
Judiciário atuante em nosso território era basicamente português, tendo havido
várias formas distintas de jurisdição, porém não se conseguia um controle efetivo,
visto que os grandes líderes de Portugal não se encontravam em território brasileiro
e a justiça ocorria de maneira muito descontrolada. Assim, vendo-se diante da
necessidade de um efetivo controle jurisdicional em terras brasileiras, o governo
português, criou a Relação da Bahia1 e, posteriormente, a Relação do Rio de
Janeiro2, que eram compostas por desembargadores e presidida pelo governador da
respectiva capitania hereditária.
Daí em diante, teve início o surgimento do Poder Judiciário no Brasil, vez
que foram sendo criadas Cortes de Justiça, cargos de magistrados e tribunais
próprios. Naquele período, a jurisdição de primeiro grau já era completamente
realizada no Brasil, restando instaladas em Portugal, apenas, as instâncias
recursais.
Esta evolução nunca freou e, rapidamente, fora proclamada a Independência
do Brasil, posteriormente, a República, até que em 1988 fora promulgada a vigente
Constituição Federal.
Com a referida promulgação, houve a modulação da conhecida tripartição do
poder, ou seja, o Estado brasileiro seria divido em três poderes independentes e
harmônicos entre si, quais sejam, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Crível que
se destaque que a Carta Magna de 1988 somente modulou a divisão dos poderes
1 Constituída como o tribunal de apelação do Estado do Brasil, aos processos por ela julgados cabia
recurso apenas à Casa de Suplicação de Lisboa. Estabelecida pelo regulamento de 7 de março de 1609, funcionou até 1626, quando foi extinta pelo alvará de 5 de abril, sendo recriada somente em 1652. Em 1751, surgiu um novo tribunal na colônia, a Relação do Rio de Janeiro, elevada a Casa de Suplicação do Brasil em 1808, por ocasião da transferência da corte.< http://linux.an.gov.br/mapa/?p=2776> 2 O regimento de 13/10/1751 criou a Relação do Rio de Janeiro para atender às causas e
requerimentos "dos povos da parte sul do estado do Brasil", pois devido à distância, a Relação da Bahia não os atendia de forma satisfatória. Sua criação reflete a transferência do centro do poder econômico para a região sul-sudeste da colônia, devido ao fluxo de ouro, diamantes e a necessidade da criação de um porto para a região, ficando a Relação da Bahia responsável pela região norte-nordeste. Este mesmo regimento estabelecia como sua atribuição "a mais reta e pronta administração da justiça. A relação era administrada pelo governador da capitania do Rio de Janeiro e composta pelo chanceler da relação e desembargadores.”. <http://segall.ifch.unicamp.br/site_ael/index.php?option=com_content&view=article&id=180&Itemid=90>
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Estatais, adequando-a ao período em que vivíamos. Isto se dá, porque o modelo
divisório já existia desde a Constituição de 1824, que contemplava, além dos três
poderes mencionados, o Poder Moderador, que era exercido pelo Imperador e se
sobrepunha aos demais. Importante tecer que a teoria relativa a esta tripartição fora
criada por Montesquieu, em 1748, quando publicou o livro: Do Espírito das Leis.
Desde então, o desenvolvimento em cada um dos poderes vem ocorrendo
de forma mais notável, visto que cada um conserva suas próprias particularidades e
se auto organiza de maneira a propiciar um crescimento contínuo. No que concerne
ao Poder Judiciário, é importante ressaltar que sempre existiu uma grande limitação
à atuação de seus órgãos, sendo certo que estes não possuíam meios de assumir
uma postura ativa no processo. Porém, a democracia já não mais permitia uma
jurisdição tão inerte e com o advento de tantos direitos e garantias fundamentais que
vinham sendo criados em favor dos brasileiros, passou-se a ser necessária uma
atuação mais intensa dos magistrados, no sentido de que estes zelassem por um
processo justo, com a aplicação das normas materiais que contemplam o
Ordenamento Jurídico.
Entretanto, uma atuação dinâmica do Poder Judiciário não era suficiente
para o deslinde de várias ações, razão pela qual tornou-se necessária a criação de
meios capazes de melhorar a efetiva prestação jurisdicional do Estado. Assim, com o
passar dos anos foram surgindo teorias relativas ao ativismo judicial, até que estas
ideias foram, definitivamente, se tornando realidade.
Hoje, enfim, contemplamos uma enorme gama de possibilidades de uma
atuação ativista dos órgãos do Poder Judiciário (art. 92 da CF/88)3, sendo que estes
possuem discricionariedade para atuar, em determinados casos, como verdadeiros
legisladores, alterando a interpretação e a aplicabilidade das normas jurídicas.
Diante disto, evidencia-se um aumento significativo dos poderes inerentes à
atividade de magistrado, donde se conclui que surge, também, a necessidade de um
3 Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça; II - o Superior Tribunal de Justiça; III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes Militares; VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
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3 DO ATIVISMO JUDICIAL
3.1 O Ativismo Judicial Propriamente Dito
No período em que vivemos, é insuscetível a ideia de que o processo judicial
visa tutelar os direitos subjetivos das partes litigantes, já que a ciência jurídica, após
toda a evolução que enfrentou, contempla o interesse da coletividade, visando
sempre a paz e o equilíbrio social.
Diante disto, resta-nos claro que o processo não traz consigo, apenas, a
satisfação do interesse das partes que o integram, já que sua aplicabilidade garante
a vontade de toda a sociedade, haja vista o interesse comum pela justiça. Logo, não
há dúvidas de que a jurisdição atual exige uma atuação ativa dos membros do
Judiciário, uma vez que se pensarmos em sua absoluta inércia teremos de imaginar,
também, a inaplicabilidade dos preceitos inerentes ao nosso Ordenamento Jurídico.
Ora, não seria crível admitir um processo que não fosse efetivamente
conduzido pelo juiz, contudo se realizarmos uma análise sob este prisma nunca
teremos como conclusão decisões justas e o esclarecimento da verdade dos fatos.
Assim, diante de tal máxima e com o advento das teorias jurídico-ativistas,
os juízes se tornaram peças chave no processo e sua atuação ativa passou a ser
indispensável, no sentido de que a dilação probatória é enfrentada pelo magistrado
de forma extensa, para que, assim, haja o completo deslinde de qualquer demanda,
sem que para tanto, a justiça tenha de sucumbir.
Há se falar, porém, que inexiste justiça sem que haja imparcialidade,
cabendo ao próprio juiz sua manutenção. Para tanto, basta que o jurisconsulto
restrinja sua análise às provas carreadas aos autos, não trazendo ao seu livre
convencimento situações alheias ao que fora comprovado pelas partes. Nada
obstante, deve-se sempre conservar o zelo pelos princípios do contraditório e da
ampla defesa.
Sobre a imparcialidade do juiz:
O caráter de imparcialidade é inseparável do órgão da jurisdição. O juiz coloca-se entre as partes e acima delas: esta é a primeira condição para que possa exercer sua função dentro do processo. A imparcialidade do juiz é pressuposto para que a relação processual se instaure validamente. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2008, p. 58)
22
Ainda acerca da imparcialidade aqueles autores asseveram:
A imparcialidade do juiz é uma garantia de justiça para as partes. Por isso, têm elas o direito de exigir um juiz imparcial; e o Estado, que reservou para si o exercício da função jurisdicional, tem o correspondente dever de agir com imparcialidade na solução das causas que lhe são submetidas. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2008, p. 58-59)
Insta salientar que o referido princípio da imparcialidade não foi o único meio
que o Constituinte Originário encontrou para que o arbítrio do juiz fosse limitado.
Para tanto, houve a criação da tripartição do poder, ou seja, nosso Estado é divido
em três poderes, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.
Essa divisão é fundamental para que possa haver democracia, isto porque a
desconcentração das atribuições afasta o controle governamental de uma só
pessoa, possibilitando a manutenção dos direitos e garantias fundamentais previstos
na Carta Magna.
Há se falar, porém, que apesar da propalada divisão do poder, nosso país
sempre encontrou obstáculos burocráticos, visto que a atuação do Legislativo e do
Executivo segue procedimentos específicos e bastante sinuosos, o que acaba por
gerar omissões, desatualizações e imperfeições legislativas e executivas, que
prejudicam toda a sociedade. Frente aos mencionados problemas advindos da
burocracia existente no Brasil, as teorias ativistas começaram a se estender,
abrangendo maneiras mais efetivas de intervenção dos juízes. Daí em diante a
evolução de nosso Ordenamento Jurídico teve de seguir um panorama no qual o
Judiciário, em situações específicas, pode extrapolar sua esfera de atuação.
Surge, então, o atual ativismo judicial, que não possui um significado
específico, havendo, inclusive, dissenso quanto à sua real definição, mas que se
traduz, basicamente, na postura intervencionista do Poder Judiciário que, de
maneira significativa, sobrepõe-se aos demais poderes e atua além de suas
atribuições.
Resta evidenciado que o ativismo judicial que se vê nos dias de hoje é um
fenômeno bastante complexo, não sendo bem definido e atraindo críticas de vários
juristas.
Uma considerável corrente de doutrinadores acredita que esta prática fere o
princípio da separação dos poderes e se peculiariza por ser uma invasão do Poder
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Judiciário nas atribuições dos demais poderes, se caracterizando como algo que
ofende a democracia nacional.
Analisando friamente a tripartição do poder, somos remetidos à ideia de que
não caberia ao Judiciário a implementação de políticas públicas, já que nossa
Constituição Federal prevê que este tipo de ato deve ser elaborado por
representantes do povo, eleitos através de eleições periódicas. Desta máxima, surge
outra crítica dos juristas que descordam do ativismo, qual seja, a alegação de que
um país capaz de permitir que o mesmo ente crie o Direito, o execute e julgue
eventuais descumprimentos jamais pode ser considerado democrático, haja vista
assemelhar-se a uma monarquia absolutista.
Ocorre, entretanto, que apesar destas correntes contrárias ao ativismo
judicial, sua existência é uma realidade em nosso Direito.
Como cediço, seguimos o direito romano-germânico e, desta forma, grande
parte de nosso Ordenamento Jurídico está positivado. Frente a este fato,
imaginemos a situação hipotética da análise de qualquer texto legal sem a devida
adequação ao caso concreto. Teríamos, pois, textos frios e inacabados, uma vez que
as leis são revestidas de alto grau de abstração.
Esta é uma das várias situações em que encontramos o ativismo judicial, já
que sem a equidade, o juiz não traria às partes a justiça do caso concreto e nossa
legislação se afastaria, dia-a-dia, do justo.
A existência do ativismo judicial é tão latente que várias de nossas leis
prevêem hipóteses em que o magistrado deve fazer-se valer daquele para enfrentar
determinadas demandas, como podemos observar, por exemplo, no art. 335 do
Código de Processo Civil4, no art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro5 e no art. 27 da Lei 9868 de 10 de novembro de 19996.
Por tudo que fora exposto até o momento, não existe forma mais adequada
de se classificar esta atuação ativista como a ascensão institucional do Poder
Judiciário frente às mudanças do Direito. Por isso, não há dúvidas de que o ativismo
4 Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum
subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial. 5 Art. 4
o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os
princípios gerais de direito. 6 Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de
segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
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judicial é a resolução de problemas que existem na sociedade decorrentes da falta
de atuação dos poderes Executivo e Legislativo, quer pela ausência de criação de
determinado dispositivo legal, quer pela ineficiência na execução de políticas
públicas.
Assim, as qualidades inerentes ao ativismo judicial são indiscutíveis, mas
seu exercício deve ser bastante ponderado. Não seria novidade afirmar que
qualquer atuação no território nacional deve estar em conformidade com o texto
constitucional, porém esta não é a única forma de se controlar os magistrados.
Para que o Ordenamento Jurídico possibilitasse uma intervenção tão latente
do Poder Judiciário na estrutura governamental brasileira, deveria se revestir de
cautelas para trazer segurança jurídica aos cidadãos, o que, de fato, fora feito, como
bem se vê, por exemplo, no princípio do duplo grau de jurisdição, onde as decisões
judiciais proferidas, após recurso da parte interessada, são revistas em segunda
instância para se garantir a justiça do julgado. Entretanto, é deste aspecto que surge
um dos principais problemas inerentes ao ativismo judicial, tal qual, a falta de
instrumentos para se frear os magistrados, desembargadores e ministros que atuam
em alçadas que, muitas vezes, não admitem recursos das decisões que prolatam.
Destarte, o ativismo judicial se manifesta de várias formas, donde se conclui
que é gênero do qual podemos destacar várias espécies como a equidade, a
analogia, a modulação de efeitos pelo Supremo Tribunal Federal nos casos de
controle de constitucionalidade, o princípio do impulso oficial, a edição de súmulas e
uniformizações jurisprudenciais, dentre outros. O que não se discute é que esta
atuação ativa do Judiciário faz-se fundamental em nosso Ordenamento Jurídico,
mas a constante criação de instrumentos capazes de controlar esta prática é
indispensável para a manutenção da segurança jurídica nacional.
3.2 Poder Constituinte Difuso
Não é estranho aos estudiosos do Direito a denominação Poder Constituinte.
Este é, em si, o poder de elaborar ou atualizar uma Constituição, mediante
supressão, modificação ou acréscimo de normas.
Sua titularidade é pertencente ao povo, principalmente se considerarmos a
máxima do art. 1º da Constituição Federal de 1988, que estabelece que todo poder
emana do povo. Contudo, diferentemente da titularidade, temos a titularidade de
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exercício, que é dada àqueles que foram eleitos pelo povo para representarem o
Poder Legislativo.
A denominação Poder Constituinte subdivide-se em categorias, sendo que
duas delas são bastante conhecidas no Direito brasileiro, quais sejam, Poder
Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado. Apesar de existirem
classificações independentes em cada uma destas duas definições, restringiremos
nosso estudo ao conceito geral de cada uma delas.
O primeiro, se peculiariza por ser o responsável para instaurar uma nova
ordem jurídica, ou seja, cria-se uma nova Constituição e um novo Estado de Direito.
Normalmente sua atuação se dá quando determinado lapso temporal altera
substancialmente os valores, as garantias, o pensamento e as visões políticas de
uma sociedade, criando a necessidade de uma inovação constitucional.
Noutra banda, o Constituinte Derivado, que é instituído pelo Originário, tendo
que respeitar as normas por ele impostas, se manifesta através de reformas no texto
constitucional que visam a adequação da Lei Maior à evolução da própria sociedade.
Entretanto, mesmo sendo mais comum a utilização das duas denominações
alhures mencionadas, o ativismo judicial evolui de tal maneira que hoje se vislumbra
a hipótese de considerarmos o Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do Poder
Judiciário, como titular do exercício de alterar nossa Constituição Federal.
Antes da real análise sobre a posição da Corte Suprema como detentora da
qualidade de Poder Constituinte, insta salientar que existe uma crucial diferença
entre reformas constitucionais e mutações constitucionais. Aquelas são as
alterações no próprio texto legal, ou seja, alterações positivas, que se
instrumentalizam através de emendas constitucionais, enquanto as mutações são as
alterações tipicamente interpretativas, donde se conclui não há qualquer alteração
no texto da Carta Magna, ocorrendo apenas uma evolução na forma de se
interpretar, nascendo novo entendimento sobre determinado tema.
A partir desta distinção que existe entre uma mutação e uma reforma
constitucional, torna-se clara a alocação do Supremo Tribunal Federal como
Constituinte. A Suprema Corte é conhecida como o Poder Constituinte Difuso, e se
caracteriza por se manifestar através de mutações constitucionais.
Assim, se por um lado o Poder Constituinte Derivado se manifesta através
das emendas constitucionais, logo, de modo positivado, o Constituinte Difuso se
instrumentaliza de modo informal, como verdadeiro poder de fato do Órgão Supremo
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do Judiciário brasileiro, adequando a Constituição Federal aos mais diversos fatores
sociais, políticos e econômicos do país. É, portanto, uma alteração com caráter
meramente hermeneuta-interpretativo.
Conclui-se, pois, que o ativismo judicial atingiu um patamar que alguns anos
atrás era inimaginável, já que, mesmo existindo o princípio constitucional da
separação dos poderes, nosso Ordenamento Jurídico confere tais prerrogativas ao
Judiciário para que o exercício jurisdicional se materialize com excelência.
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4 DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Como de sabença geral, nossa Constituição Federal é do tipo rígida e,
nestes modelos constitucionais, a alteração do texto elaborado pelo Poder
Constituinte Originário ocorre de forma bastante controlada, razão pela qual possui
um procedimento bastante peculiar que é contemplado na própria Carta Magna.
Nada obstante, insta salientar que vigora no Brasil o princípio da supremacia
da Constituição, ou seja, as normas nela contidas se sobrepõem às demais, donde
se conclui que toda espécie normativa infraconstitucional deve estar em
conformidade com os preceitos previstos na Lei Maior, sob pena de ser considerada
inválida.
Nesse sentido, não seria crível a existência de todo este rigor quanto à
alteração do texto constitucional e a predominância deste em relação às demais
normas, se não houvesse, também, um órgão encarregado de realizar uma
fiscalização acerca do efetivo cumprimento de tais máximas. Além disto, frente à
importância da referida fiscalização, compete à própria Constituição Federal a
distribuição da competência para tanto.
Logo, para que possamos falar em controle de constitucionalidade, torna-se
essencial que estejamos diante de uma Constituição do tipo rígida que preveja um
mecanismo de fiscalização das normas infraconstitucionais, inclusive com relação ao
órgão que a realizará.
Dando continuidade ao estudo, é de vital importância a noção exata acerca
do que é a inconstitucionalidade. Basicamente, este conceito é extraído da ação ou
omissão que ofende o texto da Constituição Federal, porém sua definição exige
muito mais dos estudiosos do Direito, haja vista a imensa gama de espécies de
inconstitucionalidade. Citando as mais importantes, devemos nos ater para:
inconstitucionalidade por ação ou omissão, que se traduz pela atitude comissiva de
algum órgão estatal, capaz de gerar uma afronta à Constituição, ou a conduta
omissiva em face de um preceito constitucional que preveja determinada obrigação
do Poder Público; inconstitucionalidade material ou formal, onde aquela se refere à
desconformidade do texto de determinada lei com as regras constitucionais,
enquanto a última faz menção ao desrespeito relativo à própria elaboração da norma
infraconstitucional, caracterizando-se por ser uma afronta ao processo legislativo; e,
por fim, inconstitucionalidade total ou parcial, que como o próprio nome sugere, diz
28
respeito ao conteúdo do ato normativo a ser atingido, ou seja, na
inconstitucionalidade total, todo o ato deve ser expurgado, enquanto na parcial,
somente parte dele.
Não é novidade que a vigente Constituição Federal de 1988 outorgou
poderes ao Judiciário para a declaração de inconstitucionalidade das leis, logo se
conclui que vivemos um sistema jurisdicional de controle. Entretanto, é importante
ressaltar que nossa Magna Norma contempla tanto o controle difuso quanto o
controle abstrato ou concentrado, o que quer dizer que todos os seus órgãos
possuem legitimidade para reconhecer determinada afronta às regras e princípios
constitucionais, mas, em casos específicos, tal legitimidade se restringe ao Supremo
Tribunal Federal ou ao Tribunal de Justiça de cada Estado, no primeiro caso quando
a afronta se dá em relação à Constituição Federal e no último quando fere a
Constituição do respectivo Estado-Membro.
Vale ressaltar, que o controle de constitucionalidade poderá se apresentar de
forma preventiva, no qual a fiscalização da validade da norma ocorre antes de sua
efetiva criação, e de forma repressiva, quando a norma já está pronta e apta a gerar
seus efeitos.
4.1 Do Controle Concentrado de Constitucionalidade em Âmbito Federal
Dando início ao tema que mais nos interessa no controle de
constitucionalidade exercido no Brasil, adentramos na conceituação específica do
controle concentrado de constitucionalidade.
O controle abstrato, como também é conhecido, se caracteriza por ser a
ferramenta encarregada pela defesa do ordenamento constitucional frente à
eventuais espécies normativas com ele incompatíveis.
Como já explicitado alhures, o controle concentrado em relação à
Constituição Federal é exercido exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal.
Cumpre mencionar, ainda, que além da competência originária da Suprema Corte
para a análise de eventuais afrontas às normas constitucionais, tal fiscalização não
admite recursos, salvo embargos de declaração.
Diferentemente do controle de constitucionalidade difuso, no controle
concentrado não se verifica a análise subjetiva de um caso concreto, já que seu
objetivo é a verificação da adequação de determinada lei aos ditames estabelecidos
29
pela Constituição Federal. Isto posto, constata-se que o controle abstrato não surge
incidentalmente em um processo comum, motivo pelo qual existem maneiras
predeterminadas de se instaurar tal procedimento.
Assim, classificando as ações cabíveis para o acionamento da tutela
jurisdicional do Estado para o exercício do controle abstrato de constitucionalidade,
temos: ação direta de inconstitucionalidade genérica – ADI; ação direta de
inconstitucionalidade por omissão – ADO; ação declaratória de constitucionalidade –
ADC; e, por fim, arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF.
Passemos, então, ao estudo de cada uma destas hipóteses.
4.1.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica
A ação direta de inconstitucionalidade genérica é o procedimento mais
comum dentre os disponíveis para a averiguação, pelo Supremo Tribunal Federal, da
inconstitucionalidade ou não de determinada espécie normativa.
É crucial salientar que a lei ou o ato normativo a ser analisado nesta ação
tem, obrigatoriamente, de ser estadual ou federal, já que esta demanda não
comporta a análise de direito municipal. Logo, as normas do Distrito Federal podem
ser objeto de ADI, desde que editadas no desempenho de função estadual.
Nada obstante, insta esclarecer que, além de ser federal ou estadual, a
norma impugnada em sede de ação direta de inconstitucionalidade genérica deve ter
sido editada na vigência da Constituição Federal de 1988, implicar ofensa direta
àquela e, ainda, estar em vigor, já que não se admite ADI com relação ao direito que
já fora revogado.
Sua função é, basicamente, a proteção da Constituição Federal, de forma a
ensejar uma análise acerca da adequação de determinada lei ou ato normativo ao
nosso ordenamento jurídico e possibilitar sua extirpação quando necessário.
Como estudado, uma das principais características do controle concentrado
de constitucionalidade é a inexistência de interesses subjetivos na análise da
adequação de determinado dispositivo frente à Carta Magna. Neste mesmo sentido,
o autor da ação direta de inconstitucionalidade genérica não atua para resguardar
direitos individuais, pugnando sempre pela vontade coletiva. Diante disto, a
Constituição Federal, em seu art. 103, incisos I a IX, prevê um rol taxativo de
legitimados à propositura desta demanda, senão vejamos:
30
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
A respeito dessa disposição constitucional, é importante diferenciar os
legitimados universais dos especiais. Embora a Carta Magna não tenha elencado
qualquer diferenciação neste sentido, entende-se por legitimados universais aqueles
que têm discricionariedade para impugnar qualquer matéria em sede de ação direta
de inconstitucionalidade, sem que, para tanto, tenham de demonstrar interesse
específico. São eles: o Presidente da República, as Mesas da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, o Procurador-Geral da República, o Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e os partidos políticos com
representação no Congresso Nacional. Noutro giro, os legitimados especiais são
aqueles que possuem poderes para impugnações por meio de ação direta de
inconstitucionalidade, porém devem comprovar seu interesse de agir com relação à
matéria discutida, ou seja, o ato ou lei impugnados devem estar correlacionados com
as funções exercidas pelo órgão ou entidade impugnante. São legitimados
especiais: as confederações sindicais, as entidades de classe de âmbito nacional, as
Mesas das Assembléias Legislativas estaduais ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal e, por fim, os governadores dos Estados-Membros e do Distrito Federal.
Outras quatro questões cruciais ao estudo da ação direta de
inconstitucionalidade genérica são:
a imprescritibilidade, ou seja, a propositura da ADI pode ocorrer a
qualquer tempo, inexistindo prazo prescricional para que os legitimados ingressem
com a demanda. Isto se dá, pois as afrontas ao texto constitucional não se
convalidam com o tempo e, assim, o remédio cabível para se erradicar qualquer
vício desta natureza deve ser utilizado independentemente do tempo que demore;
a impossibilidade de desistência por parte do impetrante, que consiste
no impedimento de que o propositor da ação desista dos pedidos formulados na
31
petição inicial. Tal característica se traduz como a garantia de que o direito
indisponível à extirpação das inconstitucionalidades existentes em nosso
ordenamento não seja violado;
o pedido de informações feito pelo relator do processo para que a
demanda possa ser julgada, que, em suma, se apresenta como um embasamento
para que a ação possa ser julgada de forma bastante equânime. Detalhadamente, o
Ministro relator do processo fará um pedido de informações ao órgão que emanou a
espécie normativa impugnada para que, assim, o Pretório Excelso possa ter
elementos para decidir. Cumpre ressaltar que não haverá pedido de informações se
a ADI for proposta pelo mesmo órgão que criou a norma;
e, finalmente, a inadmissibilidade de intervenção de terceiros. O
entendimento acerca desta restrição salta aos olhos quando constatamos que a
intervenção de terceiros é inerente aos procedimentos de cunho estritamente
subjetivo, já que o terceiro, normalmente, tem interesse particular na causa. Desta
forma, como a ação direita de inconstitucionalidade genérica é objetiva, não haveria
se falar em utilização daquele instituto. Entretanto, antes de encerrarmos a questão
da impossibilidade da intervenção de terceiros, é crucial que destaquemos a
possibilidade de um órgão ou entidade que não possui legitimidade para a
propositura da ADI requerer ao relator do processo, antes que este entre em pauta
de julgamento, que se manifeste acerca da inconstitucionalidade, cabendo àquele o
deferimento ou não do pedido. Esta situação é comumente chamada de “amicus
curiae”, que se traduz por “amigo da corte”.
Exaurida a explanação acerca das características alhures mencionadas,
insta-nos salientar que nas ações diretas de inconstitucionalidade genéricas, após
colhidas as informações pedidas pelo relator do processo, serão ouvidos,
sucessivamente, no prazo de quinze dias cada, o Advogado-Geral da União e o
Procurador-Geral da República. Aquele atua segundo a regulamentação dada pelo
§3º do art. 1037 da Constituição Federal, sendo certo que seu papel é o de defender
a presunção de constitucionalidade de qualquer norma, porém possui plena
discricionariedade, podendo se posicionar em prol da constitucionalidade ou da
inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo impugnados. Noutra banda, temos a
7 Art. 103. (...) § 3º - Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese,
de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.
32
atuação do Procurador-Geral da República, que é obrigatória em qualquer ação
relativa à inconstitucionalidade de normas jurídicas e em todos os processos de
competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 103, §1º8 da
Constituição Federal. Sua atuação visa a defesa de nosso ordenamento
constitucional, agindo como verdadeiro fiscal da Constituição, manifestando-se
acerca da constitucionalidade ou não da matéria discutida no processo. Vale
ressaltar que sua participação no procedimento é indispensável, inclusive, nas ações
que ele próprio promove.
Antes de partirmos à análise da última etapa relativa ao estudo da ação
direta de inconstitucionalidade genérica, temos de nos ater ao fato da
permissibilidade de se requerer medida cautelar na demanda, bastando que o autor
comprove a existência dos pressupostos “fumus boni juris” e “periculum in mora”.
Este pedido será apreciado pelo Supremo Tribunal Federal, com o intuito de afastar
dano irreparável ou de difícil reparação que possam vir a ocorrer até que haja a
decisão do mérito. Sua concessão está condicionada à decisão da maioria absoluta
dos membros da Suprema Corte, sendo indispensável que estejam presentes na
sessão, pelo menos, oito dos onze Ministros, salvo no período de recesso, quando
será possível que o Presidente do Tribunal a conceda “ad referendum” do Tribunal
Pleno.
Via de regra, a medida cautelar na ADI tem eficácia “ex nunc”, porém caso a
Corte Suprema entenda ser necessário, a eficácia da cautelar pode ser retroativa, ou
seja, “ex tunc”. Há se falar, entretanto, que independentemente da eficácia retroativa
ou não, o efeito da medida cautelar será sempre vinculante aos demais órgãos do
Poder Judiciário e da Administração pública direta ou indireta, sendo certo, ainda,
que os processos que envolvam a aplicação da lei ou ato normativo que objetivou a
ADI ficarão suspensos.
Finalmente, para exaurirmos o estudo da ação direta de
inconstitucionalidade genérica, resta-nos analisar as peculiaridades da decisão de
mérito. De forma semelhante ao julgamento da medida liminar, para que possa ser
dada decisão meritória acerca da constitucionalidade ou não da norma impugnada,
devem estar presentes na sessão de julgamento, no mínimo, oito Ministros. Atingido
8 Art. 103. (...)
§ 1º - O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal.
33
o “quorum” e instalada a sessão, a decisão depende da manifestação da maioria
absoluta dos membros do Tribunal pela procedência ou improcedência do pedido de
declaração de inconstitucionalidade da espécie normativa. Caso a votação dos
Ministros presentes não atinja o número necessário para o deslinde da questão, o
julgamento será suspenso até que os demais membros da Corte possam votar e
resolver o mérito da demanda.
Não nos obsta mencionar que as decisões terminativas que resolvem o
mérito da ação direta de inconstitucionalidade genérica são dotadas de efeitos muito
particulares e, em regra, terão eficácia contra todos (“erga omnes”), efeito retroativos
(“ex tunc”), força vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e
à Administração Pública, e efeito repristinatório em relação à legislação anterior, ou
seja, na hipótese de declaração de inconstitucionalidade de determinada norma, a
lei o ato normativo que havia sido revogado quando da edição daquela terá sua
vigência restaurada.
Crível que se destaque, contudo, que a força vinculante da decisão não
alcança o próprio Supremo Tribunal Federal, que poderá mudar sua decisão em uma
outra ação sobre o mesmo tema, e o Poder Legislativo, que poderá editar,
livremente, outra espécie normativa com o mesmo conteúdo.
Outra ressalva a ser feita está na possibilidade trazida pelo art. 27 da Lei
9.868/1999, senão vejamos:
Art. 27, Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Logo, verifica-se que a Suprema Corte tem discricionariedade para modular
os efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade de qualquer norma,
bastando, apenas, que haja deliberação neste sentido de dois terços de seus
membros e razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social.
4.1.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão
34
Como já estudado, para se discutir questões inerentes a eventuais afrontas
ao texto da Constituição Federal existem procedimentos específicos, sendo certo
que a ação direta de inconstitucionalidade genérica é o mais comum deles, se
caracterizando por ser uma demanda complexa, que possui inúmeras
peculiaridades. Frente a este fato, o estudo das demais formas de movimentação do
Poder Judiciário para se resguardar a Carta Magna é menos abrangente,
principalmente pelo fato de que muitas de suas características são semelhantes às
da ADI.
Diante disto, passaremos à análise das demais ações que discutem a
constitucionalidade de leis e atos normativos traçando as particularidades que as
diferenciam da ação direta de inconstitucionalidade genérica.
A ação direta de inconstitucionalidade por omissão é uma inovação trazida
pela Constituição Federal de 1988 e se traduz como um procedimento de controle
das omissões do Poder Público que ferem o ordenamento constitucional.
Simplificadamente, a ADO visa sanar a omissão, por parte de órgão ou autoridade
encarregados de elaborar norma, que se destina a efetivar determinada disposição
constitucional que dependa de complementação, ou seja, as normas constitucionais
que não sejam autoaplicáveis, ou, ainda, as normas constitucionais de eficácia
limitada.
Percebe-se, então, que o Poder Constituinte Originário achou por bem
classificar a omissão dos órgãos que deveriam editar leis essenciais à eficácia da
norma constitucional como uma afronta ao Ordenamento Jurídico.
Como já destacado, muitas das características da ação direta de
inconstitucionalidade genérica se aplicam à ADO, inclusive no que tange à
legitimação ativa para a propositura da demanda, não havendo dúvidas de que os
legitimados para propor ação direta de inconstitucionalidade por omissão são todos
aqueles previstos no art. 103, incisos I a IX da Constituição Federal, porém devemos
nos ater para uma distinção significativa entre as duas modalidades de ação, qual
seja, a impossibilidade, na ADO, de que um dos legitimados proponha a demanda
caso seja ele a autoridade competente para iniciar o processo legislativo omisso.
Outra distinção entre a ação direta de inconstitucionalidade por omissão e a
genérica está na legitimação passiva. Enquanto a ADI é proposta em face de lei ou
ato normativo que fere a Lei Maior, a ADO corre contra o órgão ou autoridade
competente pela adoção de medidas necessárias à criação de determinada norma
35
essencial à efetiva aplicabilidade do texto constitucional. Cumpre esclarecer que o
agente passivo não será sempre integrante do Poder Legislativo, uma vez que,
normalmente, a omissão está na iniciativa da espécie normativa e não em sua
efetiva criação.
Questão crucial ao presente estudo encontra-se na atuação do Advogado-
Geral da União durante o decorrer da ação. Neste caso, a oitiva daquele não é
obrigatória, donde se conclui que somente haverá manifestação de sua parte se o
relator do processo a requerer. Logo, a Advocacia Geral da União somente
participará do processo caso o Ministro relator entenda necessário. Noutra banda
está o Procurador-Geral da República, que atuará, obrigatoriamente, em todas as
ações que não figurar como autor.
Importante frisar que a ação direta de inconstitucionalidade por omissão
também comporta a concessão de medida cautelar, seguindo os mesmos moldes da
ADI com relação à decisão da Corte.
Por fim, mas não menos importante, temos de nos ater para os efeitos da
decisão de procedência da ADO. Nesta hipótese, o Supremo Tribunal Federal
declarará a inconstitucionalidade da omissão praticada e determinará que o órgão
ou autoridade competente procedam à edição da respectiva norma. Caso o órgão ou
autoridade omissos sejam administrativos, o comando deverá ser cumprido em até
30 (trinta) dias, não havendo estipulação temporal na hipótese de omissão por parte
dos Poderes do Estado.
4.1.3 Ação Declaratória de Constitucionalidade
Diferentemente das ações diretas de inconstitucionalidade, a declaratória de
constitucionalidade se apresenta como procedimento hábil a classificar como
constitucional determinada norma que venha causando dissenso entre os órgãos do
Poder Judiciário.
Assim, verifica-se que na ADC o impetrante não pretende a extirpação da lei
ou ato normativo, pelo contrário, o que se quer nesta ação é que a matéria discutida
seja, definitivamente, tida como constitucional. Podemos, então, classificá-la como o
instrumento capaz de encerrar a discussão acerca da legitimidade de determinada
espécie normativa sem que seja necessário o decurso de um longo lapso temporal.
36
Crível que se destaque que a propositura desta demanda exige que o autor
comprove a existência de relevante controvérsia judicial, o que quer dizer que a ADC
somente será conhecida pelo Supremo Tribunal Federal se seu autor provar, de
forma satisfatória, que a matéria que objetivou o procedimento vem gerando
decisões em sentidos opostos pelos demais órgãos do Poder Judiciário.
Partindo à análise de sua natureza jurídica, vislumbra-se que a ação
declaratória de constitucionalidade se assemelha consideravelmente das ações
diretas de inconstitucionalidade (genérica e por omissão), principalmente pelo fato
de que sua propositura se dá pelos mesmos legitimados, a competência originária
para seu julgamento é do Pretório Excelso e o que se discute é a constitucionalidade
da norma.
Contudo, as semelhanças não param por aí. Isto se dá, pois a ADC também
se reveste de peculiaridades como a imprescritibilidade; a irrecorribilidade da
decisão emanada pelo STF, salvo embargos de declaração; a obrigatoriedade de
atuação do Procurador-Geral da República; a impossibilidade de intervenção de
terceiros, exceto na posição de “amicus curiae”; a possibilidade de deferimento de
medida cautelar no sentido de suspender os processos que envolvam a aplicação da
espécie normativa objeto da ação declaratória; eficácia “erga omnes” de sua
decisão; força retroativa; efeito vinculante perante aos demais órgãos do Judiciário e
à Administração Pública; e, finalmente, a possibilidade de modulação dos efeitos
temporais da decisão.
Ocorre, entretanto, que não existem apenas semelhanças entre as ações
diretas de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade. Como
mencionado alhures, existe diferenciação no pedido autoral, já que naquelas o autor
pretende a declaração de inconstitucionalidade de determinada norma, aqui o
objetivo é exatamente contrário, ou seja, visa-se a declaração de
constitucionalidade. Outra diferença significativa é que o objeto da ADC está limitado
a leis e atos normativos federais, não abrangendo as espécies normativas estaduais.
Nesta mesma linha não encontramos na ação declaratória o pedido de informações
que o relator, na hipótese de ADI, faz aos órgãos elaboradores da norma
impugnada, uma vez que inexiste pólo passivo na ADC. Finalmente, devemos nos
ater para a inexistência de atuação do Advogado-Geral da União neste
procedimento, já que seu papel é a defesa da presunção da constitucionalidade da
norma, e isto é exatamente o que pretende o autor da ação, razão pela qual a
37
Suprema Corte suprimiu a necessidade de manifestação da Advocacia Geral da
União.
4.1.4 Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
Prevista no art. 102, §19 da Constituição Federal, a argüição de
descumprimento de preceito fundamental é ação de competência originária do
Supremo Tribunal Federal e se caracteriza por ser uma norma constitucional de
eficácia limitada, o que quer dizer que sua real aplicabilidade se condiciona a outra
lei, qual seja, a 9.882/1999.
Para que possamos nos aprofundar no conhecimento acerca desta ação,
insta-nos conhecer o art. 1º da referida lei:
Art. 1o A argüição prevista no § 1
o do art. 102 da Constituição Federal será
proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público. Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental: I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição
Logo, verifica-se que a arguição de descumprimento de preceito
fundamental é uma demanda que trouxe nova possibilidade de reclamatória junto à
Suprema Corte, haja vista a previsão de sua admissibilidade para que qualquer ato
do Poder Público que acarrete lesão a preceito fundamental decorrente da Carta
Magna possa ser reparado ou evitado. Além disto, a ADPF inovou nosso
Ordenamento Jurídico ao elencar como objeto de sua aplicabilidade a ameaça ou
lesão a preceito fundamental previsto na Constituição Federal decorrente de leis e
atos normativos federais, estaduais e municipais, abrangidos os anteriores à vigente
ordem constitucional.
Constata-se, então, que a arguição de descumprimento de preceitos
fundamentais supre as lacunas deixadas pela ADI, ADO e ADC, ou seja, a matéria
9 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
cabendo-lhe:
(...)
§ 1.º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.
38
que não pode ser discutida sob o prisma das três modalidades supracitadas, poderá
ser objeto de ADPF, desde que cumpridos os requisitos do dispositivo alhures
transcrito. Nesse sentido, vale ressaltar que a arguição tem caráter subsidiário às
demais ações previstas para o efetivo controle de constitucionalidade, conforme
previsão do art. 4º, §1º10 da Lei 9.882/1999, ou seja, somente será admitida ADPF
quando não forem cabíveis a ação direta de inconstitucionalidade genérica, a ação
direta de inconstitucionalidade por omissão ou a ação declaratória de
constitucionalidade.
Da leitura cuidadosa do art. 1º da já citada Lei 9.882/1999, vislumbra-se a
previsão expressa acerca da necessidade de descumprimento de preceito
fundamental previsto na Constituição Federal, contudo inexiste classificação exata
acerca do que é preceito fundamental. Diante disto, o Supremo Tribunal Federal
determinou que cabe a ele próprio determinar o que se enquadra nesta modalidade,
sendo que nos dias de hoje tem-se a idéia de que se enquadram como preceitos
fundamentais os direitos e garantias individuais, os princípios protegidos por cláusula
pétrea e os princípios sensíveis, cuja violação pode dar ensejo à decretação de
intervenção federal nos Estados-Membros.
Assim como visto nas demais ações relativas ao controle de
constitucionalidade brasileiro, os legitimados à propositura da ADPF são aqueles
elencados no art. 103, incisos I a IX, da Constituição Federal. Outra característica
que assemelha a ADPF das demais formas de exercício do controle de
constitucionalidade é a possibilidade de deferimento de medida cautelar quando
comprovados o “fumus boni juris” e o “periculum in mora” por parte do impetrante.
Finalmente, no que tange à decisão de mérito na arguição de
descumprimento de preceito fundamental, insta salientar que os padrões são
semelhantes aos das demais ações inerentes à constitucionalidade das normas,
porém os efeitos da decisão se restringem em: efeito “erga omnes” e força
vinculante.
4.2 Teoria da Inconstitucionalidade por Arrastamento
10
Art. 4o A petição inicial será indeferida liminarmente, pelo relator, quando não for o caso de
argüição de descumprimento de preceito fundamental, faltar algum dos requisitos prescritos nesta Lei ou for inepta. § 1
o Não será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver
qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.
39
O tema relativo à teoria da inconstitucionalidade por arrastamento, também
conhecida por inconstitucionalidade por atração ou inconstitucionalidade
consequente de preceitos não impugnados, está intrinsecamente ligado aos limites
da coisa julga e ao efeito “erga omnes” das decisões relativas à
inconstitucionalidade de normas.
Para que se possa entender melhor a idéia trazida nesta teoria, temos de
imaginar a situação em que uma norma é declarada inconstitucional em um
processo inerente ao controle de constitucionalidade, logo, por decorrência desta
decisão, em uma demanda futura, outra norma dependente daquela também estará
eivada do vício da inconstitucionalidade e, consequentemente, deverá ser extirpada.
Conclui-se, pois, que diante desta teoria, tem-se que o Supremo Tribunal
Federal não poderia se esquivar da situação alhures transcrita, uma vez que novo
julgamento de norma dependente daquela que fora declarada inconstitucional, iria
em desencontro com a teoria dos motivos determinantes e banalizaria a ”ratio
decidendi” (razão da decisão). Além disto, é importante frisar que a Suprema Corte
tem o poder de utilizar tal teoria para embasar o dispositivo de sua decisão em um
único processo que envolva várias normas ou em processos distintos.
41
5 DO PROCESSO LEGISLATIVO BRASILEIRO
Como cediço, para a criação de qualquer espécie normativa é necessário o
correto atendimento de todos os requisitos previstos pela Constituição Federal da
República do Brasil. O conjunto dos atos que envolve a edição de qualquer inovação
legislativa é chamado de processo legislativo. Diante disto, resta claro que tal
matéria é de crucial importância para o desenvolvimento de nosso Ordenamento
Jurídico.
Nesse sentido, Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino conceituam o processo
legislativo da seguinte forma: “[...] o conjunto de atos (iniciativa, emenda, votação,
sanção e veto, promulgação e publicação) realizados pelos órgãos competentes na
produção das leis e outras espécies normativas indicadas diretamente pela
Constituição”. (PAULO; ALEXANDRINO, 2011, p. 197)
Assim, após a conceituação deste tema, cumpre-nos esclarecer que o
processo de elaboração de normas jurídicas, em âmbito federal, é composto de três
fases, quais sejam, a fase iniciativa, a fase constitutiva e a fase complementar.
A fase iniciativa, como o próprio nome sugere, é a primeira etapa do
processo legislativo. De maneira ampla, a Constituição Federal de 1988 atribui
competência às seguintes pessoas para a proposta de criação das espécies
normativas contempladas em nosso Ordenamento Jurídico:
Qualquer Deputado Federal ou Senador da República;
Qualquer Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, ou
do Congresso Nacional;
O Presidente da República;
O Supremo Tribunal Federal;
Os Tribunais Superiores;
O Procurador-Geral da República; e,
Os Cidadãos
Ultrapassado o aspecto geral da primeira fase do processo legislativo,
devemos observar que, basicamente, existem as leis de iniciativa concorrente, nas
quais várias pessoas podem propor sua edição, e de iniciativa privativa, nas quais
somente existe um legitimado específico à propositura do projeto de elaboração da
modalidade legal a ser criada.
42
Por sua vez, a fase constitutiva, segunda fase do processo legislativo, se
destaca por ser a etapa em que há a conjugação de vontade, ou seja, o Poder
Legislativo discute e vota o projeto e, então, o Executivo o sanciona ou veta.
Inicialmente, ocorre a deliberação parlamentar, ou seja, a discussão e
votação do projeto que fora elaborado na fase iniciativa. Desta forma, para que o
projeto seja encaminhado ao Executivo para sanção ou veto é necessária a
apreciação e aprovação pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.
Temos de salientar que, via de regra, o projeto será apreciado primeiramente
pela Câmara dos Deputados e, em seguida, pelo Senado Federal, salvo na hipótese
de projetos de lei de iniciativa dos Senadores ou de alguma Comissão do Senado,
quando a Câmara dos Deputados atuará após a iniciação do Senado.
Para que esta situação fique mais bem explicada, é crível que saibamos que
as Casas Legislativas são dividas em iniciadora e revisora, ou seja, o projeto será
proposto à Casa iniciadora que, como visto, normalmente é a Câmara dos
Deputados e, em seguida, será apreciado pela Casa revisora.
Após a apreciação e consequente deliberação legislativa, caso haja a
rejeição do projeto, ele será arquivado. Noutra banda, caso haja a aprovação, este
será enviado ao Chefe do Executivo para sanção ou veto
A sanção presidencial se dá quando o Presidente da República concorda
com o projeto de criação da espécie normativa, na fase em que se encontra. Aquela
poderá ocorrer de duas formas, expressa ou tácita. A sanção expressa se dá quando
o Chefe do Executivo deliberadamente manifesta a sua concordância com a criação
da inovação legislativa. Por sua vez, na sanção tácita, temos a não manifestação do
Presidente da República em 15 (quinze) dias úteis e, assim, seu silencio importará
aceitação. Logo, o prazo para deliberação do Poder Executivo acerca de sua
aceitação ou rejeição do projeto é de 15 (quinze) dias úteis.
Insta salientar, que em caso de discordância, o Presidente da República
poderá vetar o projeto, total ou parcialmente. Aquela hipótese se dá pela
discordância do projeto como um todo, enquanto o veto parcial somente abrangerá
texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou alínea, ou seja, o veto parcial
nunca abrangerá apenas palavras do texto de lei.
Diante, então, de eventual veto executivo, quer seja total, quer seja parcial, o
Presidente da República terá 48 (quarenta e oito) horas para comunicar os motivos
da rejeição ao Presidente do Senado. Daí, então, concluímos que o veto tem de ser
43
expresso e motivado, entretanto estas não são suas duas únicas características, vez
que deverá ser sempre escrito. Além destas características formais do veto,
devemos nos ater ao fato de que o veto será sempre: supressivo, ou seja, nunca
poderá adicionar nada ao projeto; irretratável, já que uma vez que realizado o projeto
é encaminhado ao Presidente do Senado e, desta forma, o Presidente da República
já não mais pode alterar seu posicionamento; e, por fim, superável, exatamente, o
veto do Chefe do Poder Executivo será sempre superável, ou seja, o Presidente da
República, em 15 (quinze) dias úteis, se manifesta, por escrito, motivando a sua
discordância com o projeto, ou parte dele, e veta-o. Daí, o projeto é enviado ao
Presidente do Senado para que haja deliberação acerca da manifestação negativa
do Presidente da República. Essa deliberação ocorrerá em, no máximo, 30 (trinta)
dias e será, obrigatoriamente, em sessão conjunta, onde se reúnem os membros do
Senado Federal e da Câmara dos Deputados, pelo voto da maioria absoluta, em
escrutínio secreto.
Realizada a referida deliberação, o veto poderá ser rejeitado. Assim, o
Parlamento, poderá não concordar com o veto presidencial e derrubá-lo, sendo que
tal ato terá os mesmos efeitos que a sanção.
Finda a fase constitutiva, havendo aprovação do projeto, inicia-se a fase
complementar, que envolve a promulgação e a publicação. A promulgação consiste
em um atestado da existência da lei e de sua executoriedade. Apesar de ainda não
estar em vigor e não ser eficaz, pelo ato da promulgação certifica-se o nascimento
da lei. Por sua vez, a publicação é o ato subsequente à promulgação, ou seja,
quando se levará ao conhecimento de todos o conteúdo da inovação legislativa.
Com a publicação tem-se o estabelecimento do momento em que o cumprimento da
lei deverá ser exigido.
5.1 Do Processo Legislativo das Medidas Provisórias
Por tudo que fora exposto, resta claro que o processo legislativo visa a
elaboração de espécies normativas isentas de vícios e injustiças, porém é um
procedimento bastante detalhado e burocrático.
Diante disto, visando uma maior segurança para os brasileiros, nosso Poder
Constituinte criou a possibilidade de, em caso de relevância e urgência, o Presidente
44
da República adotar medidas provisórias com força de lei, devendo submetê-las de
imediato ao Congresso Nacional.
Assim, a medida provisória individualiza-se por nascer da manifestação
exclusiva do Chefe do Executivo, que a publica no Diário Oficial da União.
A respeito desta espécie normativa vejamos a íntegra do art. 62 da
Constituição Federal da República:
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. § 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. § 5º A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais. § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. § 8º As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados. § 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.
45
§ 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. § 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.
Portanto, pelo dispositivo alhures transcrito, evidencia-se que as medidas
provisórias são de competência exclusiva do Presidente da República e marcadas
por sua indelegabilidade. Entretanto, estas não são suas únicas características, visto
que sua duração será de 60 (sessenta) dias, prorrogáveis, uma única vez, por igual
período. Todavia, caso não haja deliberação do Poder Legislativo acerca da medida
provisória no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias, aquela perderá eficácia.
Nada obstante, a tramitação da medida provisória merece alguns adendos,
uma vez que seu processo não é assim tão simples. Após sua submissão ao
Congresso Nacional, uma Comissão Mista de Deputados e Senadores irá examiná-
la e sobre ela emitir parecer, apreciando os seus aspectos constitucionais e de
mérito, bem como a sua adequação financeira e orçamentária e o cumprimento, pelo
Presidente da República, da exigência de no dia da publicação no Diário Oficial da
União, ter enviado seu texto ao Congresso, acompanhado da respectiva mensagem
e motivação para tal ato. Posteriormente, com o parecer da comissão mista, passará
pela apreciação do plenário de cada Casa, com início na Câmara dos Deputados. O
plenário de cada Casa analisará, preliminarmente, se a medida atende aos
pressupostos constitucionais de relevância e urgência, bem como a sua adequação
financeira e orçamentária, para, só então, examinar o mérito. Cumpre observar que
caso quaisquer das Casas delibere pelo descumprimento dos pressupostos
constitucionais ou inadequação financeira ou orçamentária, a medida provisória será
imediatamente arquivada.
Noutro giro, é importante ressaltar que esta espécie normativa pode ser
objeto de regime de urgência constitucional. Isto ocorrerá se não houver apreciação
da medida, pelo Congresso Nacional, em até 45 (quarenta e cinco) dias, contados
de sua publicação. O regime de urgência caracteriza-se pelo fato de que a medida
provisória em questão será submetida, subsequentemente, a cada uma das Casas,
46
ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações
legislativas da Casa em que estiver tramitando.
Outra questão a ser ressaltada é que, bem como nos casos de emendas
constitucionais, a medida provisória que for rejeitada pelo Congresso ou que tenha
perdido sua eficácia por decurso do prazo, não poderá ser reeditada na mesma
sessão legislativa, que como de sabença geral, corresponde ao período anual em
que o Congresso Nacional se reúne.
Destarte, após a submissão da medida provisória ao Congresso, este
poderá: aprová-la sem alteração, aprová-la com alteração, não apreciá-la e rejeitá-la
expressamente. Citemos, então, cada uma dessas hipóteses mais detalhadamente.
Caso o Congresso Nacional aprove a medida provisória sem alterá-la, seu
texto será dirigido, integralmente, ao Presidente da Mesa do Congresso Nacional,
para que este a publique no Diário Oficial da União como lei, donde se conclui que a
aprovação sem alteração afasta a necessidade de sanção presidencial.
Na hipótese de aprovação com alterações, o projeto de lei de conversão
(assim chamado, pois a conversão em lei não se deu automaticamente pela
ocorrência de emendas), com suas respectivas emendas, após ser apreciado por
uma das Casas, deverá ser apreciado pela outra, devendo ser, posteriormente,
levado ao Presidente da República para sanção ou veto. Daí, surge a possibilidade
de conversão da medida provisória em lei, para posterior promulgação e publicação.
No que tange à possibilidade de não apreciação do Congresso Nacional,
temos a ocorrência da rejeição tácita, matéria esta que já fora discutida alhures e se
resume na perda da eficácia da medida provisória se ultrapassados os 120 (cento e
vinte) dias de possível vigência de medida provisória sem que o Congresso Nacional
se manifeste.
Por fim, outra possível atitude a ser tomada pelo Congresso Nacional é,
expressamente, deixar de converter a medida provisória em lei.
È crível que se mencione que na hipótese de rejeição da totalidade ou parte
da medida provisória, o Congresso Nacional deverá disciplinar, por decreto
legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes. Caso este decreto não seja
editado, em até 60 (sessenta) dias da perda da eficácia da medida, as relações
jurídicas decorrentes de atos praticados durante sua vigência, continuarão por ela
regidas.
47
Noutra banda, se a medida provisória tiver sido aceita pelo Legislativo e
estiver em processo de transformação para se tornar lei, já tendo sido aprovado o
seu projeto, seu texto manter-se-á em vigor até a sanção ou veto do Executivo.
Não obstante, temos de mensurar quais são os efeitos da medida provisória
em nosso Ordenamento Jurídico, pois já vimos que tem força de lei, entretanto,
existe outra peculiaridade a ser suscitada, qual seja, a revogação das demais
normas do Ordenamento Jurídico que com ela sejam incompatíveis. Assim, se após
a apreciação do Congresso Nacional a medida for convertida em lei, a anterior, que
teve sua eficácia suspensa, será revogada; mas, caso a medida provisória seja
rejeitada, a lei que teve sua eficácia suspensa volta, imediatamente, a produzir seus
efeitos.
Por fim, mas não menos importante, cumpre elencar as limitações impostas
à edição de medidas provisórias, visto que se não as houvesse estaríamos diante de
um completo descontrole, onde o Executivo poderia agir como bem lhe conviesse.
Nesse sentido, a Constituição Federal veda expressamente a criação de medidas
provisórias que versem sobre:
Nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito
eleitoral;
Direito penal, processual penal e processual civil;
Organização do Poder Judiciário e do Ministério Publico, à carreira e à
garantia de seus membros;
Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento, créditos
adicionais e suplementares, salvo o previsto no art. 167, §3º (guerra, calamidade
pública, comoção interna, etc.)
Medida que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular
ou qualquer outro ativo financeiro;
Matéria reservada à lei complementar;
Matéria já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso
Nacional e pendente de sanção ou veto presidencial;
Que implique instituição ou majoração de impostos, salvo os dispostos
nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II (só produzirão efeito no exercício financeiro
seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi
editada) – O STF entende ser completamente possível a regulamentação de matéria
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tributária através de medida provisória desde que a mesma não exija lei
complementar;
Casos previstos em lei (Art. 25, § 2º da CF/88; art. 73 do ADCT; entre
outros).
Para exaurirmos, por completo, a questão da limitação às medidas
provisórias, temos de citar o art. 246 da Constituição Federal que diz: “Art. 246. É
vedada a adoção de medida provisória na regulamentação de artigo da Constituição
cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de
janeiro de 1995 até a promulgação desta emenda, inclusive”.
Assim, as medidas provisórias não poderão regulamentar artigos da
Constituição que tenham sido alterados por emenda constitucional no período de 1º
de janeiro de 1995 a 11 de setembro de 2001.
5.2 Da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional
Como já estudamos, existem diversas peculiaridades acerca das medidas
provisórias que podem ser criadas pelo Presidente da República, em casos de
relevância e urgência. Também fora visto que, após a adoção de medida provisória,
seu texto, acompanhado da respectiva mensagem e motivação do Presidente são
imediatamente encaminhados ao Congresso Nacional.
Daí, então, surge a atribuição do Órgão máximo do Poder Legislativo acerca
da apreciação da espécie normativa editada pelo Chefe do Executivo, atribuição esta
que é regulada pela Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional. Nos termos da
referida Resolução, cabe à Mesa do Congresso, nas 48 horas que se seguirem à
publicação da medida provisória, publicar e distribuir avulsos da matéria e designar,
em atenção ao comando do §9º do art. 62 da Constituição Federal, Comissão Mista
para emissão de parecer acerca da nova norma. Esta Comissão será composta por
13 (treze) Senadores e 13 (treze) Deputados e igual número de suplentes, indicados
pelo líder de cada uma das Casas, respeitando-se, na medida do possível, a
proporcional participação dos partidos ou blocos parlamentares de cada Casa. Após
a referida indicação do líder de cada Casa, este deverá comunicar ao Presidente da
Mesa do Congresso Nacional os respectivos nomes que representarão sua Casa na
Comissão Mista até às 12 (doze) horas do dia seguinte ao da publicação, sob pena
de ser o Presidente do Congresso o mentor da indicação.
49
Designados os membros que irão compor a Comissão Mista, esta, terá o
prazo de 24 horas para se instalar. Instalada, serão designados o Presidente, o Vice-
Presidente, um relator e um relator revisor.
Nos termos do art. 5º11 da Resolução que agora estudamos, a Comissão
Mista deverá emitir parecer acerca da medida provisória, quanto aos aspectos
constitucionais, os pressupostos de relevância e urgência, mérito e a adequação
financeira e orçamentária da medida, impreterivelmente, até o 14º dia após a
publicação daquela, sob pena de imediato encaminhamento do processo à Câmara
dos Deputados, conforme previsão do §1º do art. 6º da Resolução nº 1 de 2002 do
Congresso Nacional.
Há se falar, contudo, que por determinação do §2º do dispositivo alhures
mencionado, na hipótese de envio do processo à Câmara dos Deputados sem o
parecer da Comissão Mista, o relator ou o relator revisor desta, proferirá o parecer
no plenário da Câmara dos Deputados.
Vejamos a íntegra do art. 6º:
Art. 6º. A Câmara dos Deputados fará publicar em avulsos e no Diário da Câmara dos Deputados o parecer da Comissão Mista e, a seguir, dispensado o interstício de publicação, a Medida Provisória será examinada por aquela Casa, que, para concluir os seus trabalhos, terá até o 28º (vigésimo oitavo) dia de vigência da Medida Provisória, contado da sua publicação no Diário Oficial da União. § 1º Esgotado o prazo previsto no caput do art. 5º, o processo será encaminhado à Câmara dos Deputados, que passará a examinar a Medida Provisória. § 2º Na hipótese do § 1º, a Comissão Mista, se for o caso, proferirá, pelo Relator ou Relator Revisor designados, o parecer no Plenário da Câmara dos Deputados, podendo estes, se necessário, solicitar para isso prazo até a sessão ordinária seguinte.
Posteriormente à emissão do parecer da Comissão Mista,
independentemente de sua elaboração ter sido feita, individualmente, pelo relator ou
pelo relator revisor, a medida provisória é submetida à análise da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, sucessivamente.
11
Art. 5º A Comissão terá o prazo improrrogável de 14 (quatorze) dias, contado da publicação da Medida Provisória no Diário Oficial da União para emitir parecer único, manifestando-se sobre a matéria, em itens separados, quanto aos aspectos constitucional, inclusive sobre os pressupostos de relevância e urgência, de mérito, de adequação financeira e orçamentária e sobre o cumprimento da exigência prevista no § 1º do art. 2º.
50
O plenário de ambas as Casas deliberarão acerca do preenchimento dos
requisitos de relevância e urgência, bem como a adequação financeira e
orçamentária da medida provisória. Havendo decisão no sentido de não acatamento
destes pressupostos, por qualquer das Casas, a medida será arquivada.
Insta salientar, que caso o texto integral da medida provisória não seja
convertido em lei, a Comissão Mista reunir-se-á, novamente, para elaborar, em 60
(sessenta) dias, um projeto de decreto legislativo que discipline as relações jurídicas
decorrentes da vigência daquela. Cumpre dizer que, se o relator da Comissão Mista
não apresentar o projeto de decreto legislativo supracitado, qualquer Deputado ou
Senador poderá fazê-lo. Entretanto, caso não seja elaborado o referido decreto
legislativo, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados
durante a vigência daquela conservar-se-ão por ela regidas.
Por fim, na hipótese de rejeição da medida em qualquer das Casas, o
respectivo Presidente, comunicará, imediatamente o Presidente da República,
fazendo publicar no Diário Oficial da União o ato declaratório de rejeição. Caso
semelhante será se a vigência da medida provisória for exaurida por decurso de seu
prazo, visto que o Presidente da Mesa do Congresso comunicará o fato ao
Presidente da República e fará constar no mesmo Diário.
Noutra banda, havendo a aprovação da medida provisória, esta será
publicada pelo Presidente da Mesa do Congresso, no Diário Oficial da União, como
lei. Porém, se houver alterações em seu texto, o projeto de conversão em lei será
encaminhado ao Presidente da República para sanção ou veto.
51
6 DA ATUAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE Nº 4029 E DA NECESSIDADE DE LIMITAÇÃO DO
ATIVISMO JUDICIAL NO PRETÓRIO EXCELSO
Na data de 19/02/2008 fora protocolizada junto ao Supremo Tribunal Federal
a Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica nº 4029. Esta demanda fora movida
pela Associação Nacional dos Servidores do IBAMA – ASIBAMA Nacional, com o
intuito de que a Lei 11.516, de 28 de agosto de 2007, fosse declarada
inconstitucional.
A referida espécie normativa foi criada através da Medida Provisória nº
366/2007, que fracionou as atribuições do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e destinou grande parte delas ao então
criado Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio., que,
nos termos da exposição dos motivos para sua criação, fora desenvolvido com o
intuito de tornar os procedimentos de licenciamento ambiental mais céleres.
Contudo, extrai-se das alegações lançadas na petição inicial da ADI 4029,
que o processo legislativo da Medida Provisória 366/2007 feriu a Constituição
Federal ao desrespeitar o comando do §9º de seu art. 62, que é claro no sentido de
que a matéria objeto de medida provisória deve ser analisada por Comissão Mista
de Deputados e Senadores, o que não ocorreu naquele caso. Nada obstante, a
autora da ação assevera que a edição daquela Medida Provisória não respeitou os
requisitos de urgência e relevância, predeterminados por nossa Carta Magna. Além
dos referidos vícios formais da Lei 11.516/2007, a ASIBAMA Nacional fez menção a
supostos vícios materiais da propalada Lei, quais sejam, a destruição do sistema
operacional de proteção ao meio ambiente, advinda da criação do ICMBio e o
desrespeito ao princípio da proporcionalidade.
Diante disto, o pleito formulado na ADI cingiu-se à concessão de medida
liminar para determinar a sustação dos efeitos da Lei 11.516/2007 e à procedência
do pedido para que fosse declarada a inconstitucionalidade forma e material daquela
norma.
6.1 Da Decisão Emanada Pela Suprema Corte
52
Ultrapassado todo o desenrolar processual da Ação Direta de
Inconstitucionalidade Genérica nº 4029, o Supremo Tribunal Federal partiu ao
deslinde da demanda, colhendo os votos de cada um dos Ministros em condições de
fazê-lo. Isto porque os Ministros Dias Toffoli e Joaquim Barbosa não puderam votar,
já que aquele estava impedido e este estava, justificadamente, ausente.
Diante disto, na sessão plenária do dia 07/03/2012, a Corte, por maioria dos
votos, julgou parcialmente procedente a ação, com modulação da eficácia. Dentre os
09 (nove) votos, restaram vencidos os proferidos pelos Ministros Ricardo
Lewandoswski, que a julgava improcedente, e Marco Aurélio, que a julgava
totalmente procedente. Os demais seguiram os termos do voto do Relator, Ministro
Luiz Fux.
Para que possamos entender, exatamente, qual fora a decisão prolatada
pela Suprema Corte, insta-nos analisar o voto proferido pelo Ministro Relator Luiz
Fux. Nos termos de sua decisão, a previsão constitucional relativa à apreciação das
medidas provisórias por uma Comissão Mista de Deputados e Senadores visa uma
reflexão mais profunda sobre seu tema e garante que o Poder Legislativo realize
uma fiscalização impecável, haja vista o fato de que as medidas provisórias alocam-
se como exceção no processo legislativo pátrio, uma vez que são criadas pelo
Executivo e não pelo Legislativo. Além disto, por decorrência da referida explanação,
concluiu o Relator que, ainda que em caráter incidental, o art. 6º da Resolução nº 1
de 2002 do Congresso Nacional é inconstitucional por dispensar a atuação daquela
Comissão. Vejamos o trecho do voto que enfatiza a necessidade de apreciação das
medidas provisórias pela Comissão Mista:
Põe-se em cheque, desta feita, a própria constitucionalidade do processo legislativo estabelecido no art. 6º da Resolução do Congresso, por meio da qual foi aprovada a Lei impugnada na presente Ação Direta. A magnitude das funções das Comissões Mistas no processo de conversão de Medidas Provisórias não pode ser amesquinhada. Procurou a Carta Magna assegurar uma reflexão mais detida sobre o ato normativo primário emanado pelo Executivo, evitando que a apreciação pelo Plenário seja feita de maneira inopinada. Percebe-se, assim, que o parecer da Comissão Mista, em vez de formalidade desimportante, representa uma garantia de que o Legislativo seja efetivamente o fiscal do exercício atípico da função legiferante pelo Executivo. Em razão disso, há que se reconhecer, ainda que em caráter incidental, a inconstitucionalidade dos dispositivos da Resolução supracitada que dispensam a prolação de parecer por parte da Comissão Mista, não sendo suficiente sua elaboração por parlamentar Relator.
53
Não obstante ao trecho supracitado, o Ministro atacou novamente a previsão
que possibilita a dispensa de parecer da Comissão Mista de Deputados e Senadores
frente às medidas provisórias, exaltando a impossibilidade de que o Pretório Excelso
seja conivente com o desrespeito à Constituição Federal, senão vejamos:
A efetividade do art. 62, § 9º, da Carta Magna não pode mais ser negada. O Pretório Excelso não pode ser conivente com o desrespeito à Constituição, quanto mais quando a práxis vetusta se revela tão nociva à democracia e ao correto funcionamento do sistema de equilíbrio entre os Poderes da República.
Dando continuidade ao seu voto, após enfatizar a necessidade de atuação
da Comissão Mista no processo legislativo das medidas provisórias e afirmar serem
inconstitucionais as previsões contrárias a isto, o Relator afirmou que a
inobservância da previsão constitucional contida no art. 62, §9º da Carta Magna não
era o único vício de inconstitucionalidade formal da Lei 11.516/2007, visto que a
Medida Provisória nº 366/2007 fora editada sem o requisito constitucional de
urgência, porquanto criou autarquia que realizaria funções que já eram exercidas
pelo IBAMA.
No ponto, o trecho que afirmou a inexistência de urgência que justificasse a
edição da Medida Provisória supramencionada:
Porém, esse não é o único vício de inconstitucionalidade formal que inquina a Lei vergastada. Em verdade, não havia urgência para a edição da Medida Provisória nº 366 de 2007, porquanto criou autarquia (o Instituto Chico Mendes) responsável por funções exercidas por entidade federal pré-existente (o IBAMA), utilizando, ademais, recursos materiais disponibilizados por esta. Fica vencida, diante disso, a alegação de que a urgência, na hipótese, decorreu da necessidade de reestruturar a organização administrativa de defesa do meio ambiente, considerando que os danos ambientais, na maior parte dos casos, são irreversíveis.
Contudo, apesar de se posicionar inteiramente contra a forma pela qual o
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade fora criado, o Ministro
não poupou esforços para salientar como a pronúncia de nulidade da mencionada
autarquia seria nociva ao país, considerando sua importância na proteção ao meio
ambiente, principalmente pelo fato de estar em funcionamento desde o ano de 2007.
Nesse mesmo sentido, o Relator contemplou em seu voto que seria temerário
admitir que todas as normas elaboradas sem a devida observância do art. 62, §9º da
Constituição Federal devam ser extirpadas, com efeito ex tunc, de nosso
54
Ordenamento Jurídico, uma vez que estas espécies normativas regulam inúmeras
relações jurídicas que sofreriam intenso abalo.
Atentemo-nos para as sábias palavras redigidas pelo Ministro:
A proteção do meio ambiente, direito fundamental de terceira geração previsto no art. 225 da Constituição, restaria desatendida caso pudessem ser questionados os atos administrativos praticados por uma autarquia em funcionamento desde 2007. No que atine à não emissão de parecer pela Comissão Mista parlamentar, seria temerário admitir que todas as Leis que derivaram de conversão de Medida Provisória e não observaram o disposto no art. 62, § 9º, da Carta Magna, desde a edição da Emenda nº 32 de 2001, devem ser expurgadas ex tunc do ordenamento jurídico. É inimaginável a quantidade de relações jurídicas que foram e ainda são reguladas por esses diplomas, e que seriam abaladas caso o Judiciário aplique, friamente, a regra da nulidade retroativa.
Por consequência do temor relativo ao efeito ex tunc da decisão e sua
capacidade lesiva, o Relator fez clara menção quanto ao fato de que a
inconstitucionalidade da Lei 11.516/2007 deveria ser declarada, entretanto achou por
bem não pronunciar sua nulidade pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses, com o
intuito de que o Congresso Nacional possa aprovar nova lei, que tenha teor
semelhante, e possibilite a continuidade das ações desenvolvidas pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Porém, apesar desta benesse, o
Ministro suscitou que, findo o referido prazo de 24 (vinte e quatro) meses, a Lei
11.516/2007 perde sua eficácia, independentemente da criação de outra norma
capaz de regular as atividades desempenhadas pelo ICMBio.
Citemos o relevante trecho da decisão relativo à modulação temporal dos
efeitos:
Entendo, ante as razões narradas, que é o caso de declarar a inconstitucionalidade da Lei Federal nº 11.516/07, não pronunciando, contudo, a sua nulidade pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses. Nesse prazo, poderá o Congresso Nacional aprovar nova Lei, de teor semelhante, que impedirá a solução de continuidade na existência do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Em contrapartida, findo esse prazo, o referido diploma perde sua eficácia, deixando o ordenamento jurídico e permitindo a aplicação da normativa pretérita, que fora inconstitucionalmente revogada.
Com o fito de trazer equidade à sua decisão, o Ministro Luiz Fux, utilizando-
se das disposições que guarnecem a teoria da inconstitucionalidade por
arrastamento, ressaltou que futuras ações que visem a inconstitucionalidade formal
55
de leis criadas em desatenção ao §9º do art. 62 da Constituição Federal terão o
mesmo tratamento, especificamente com relação postergação da nulidade para o
futuro, nos seguintes termos:
É de se ressaltar, ainda, que inúmeras Medidas Provisórias foram convertidas em Lei observando o procedimento previsto no art. 6º da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional. Para conferir estabilidade e segurança jurídica às relações decorrentes dessas normas, cabe sinalizar aos jurisdicionados que, em futuras ações que discutam a constitucionalidade formal de Leis frutos de conversão de Medidas Provisórias pelo mesmo rito, será conferido idêntico tratamento, qual seja, a postergação da nulidade da Lei para o futuro.
Finalizando seu voto, o Relator averbou a inexistência de
inconstitucionalidade material na norma impugnada, o que, consequentemente,
acarretou na procedência parcial do pedido, para declarar a inconstitucionalidade
formal da Lei Federal nº 11.516/2007, modulando os efeitos desta decisão nos
moldes anteriormente citados.
6.2 Da Questão de Ordem Suscitada pela Advocacia-Geral da União e da
Alteração do Resultado do Julgamento
Da análise do subtítulo supra, é comum que se tenha a idéia de que a
questão relativa às medidas provisórias editadas em desconformidade com o art. 62,
§9º da Constituição Federal havia chegado ao fim. Ocorre, entretanto, que na
sessão plenária posterior à prolação daquele acórdão, o Advogado-Geral da União,
Luis Inácio Lucena Adams, apresentou, ao Ministro Relator da ADI 4.029, Luiz Fux,
questão de ordem que fora elaborada pela Secretaria-Geral de Contencioso
(SGCT)12, com o intuito de que houvesse reanálise da matéria discutida.
Tal questão fora suscitada no sentido de que a Suprema Corte revisse a
decisão, uma vez que cerca de 500 (quinhentas) leis haviam, até aquela data, sido
criadas sem parecer da Comissão Mista de Deputados e Senadores, e o resultado
da Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica nº 4029 colocava todas aquelas
normas em risco, o que poderia gerar grave insegurança jurídica ao cenário
nacional.
12
A SGCT é o órgão da Advocacia-Geral da União responsável pelo assessoramento do Advogado-
Geral da União nas atividades relacionadas à União perante o Supremo Tribunal Federal.
56
Diante disto, ponderou o Senhor Advogado-Geral da União no sentido de
que fosse conferido ao Congresso Nacional o prazo de 24 (vinte e quatro) meses
para adaptar o processo legislativo das medidas provisórias à nova orientação, além
de requerer que as espécies normativas editadas, até aquela data, com base na
Resolução nº 1 de 2002, do Congresso Nacional fossem resguardadas.
Frente à referida questão de ordem, o Relator do Processo, Ministro Luiz
Fux, achou por bem acolhe-la, posicionando-se em prol da alteração do resultado da
decisão que havia sido proferida. Após deliberação dos Ministros presentes naquela
sessão restou estabelecida a alteração do acórdão, sendo então julgada
improcedente a ação, com declaração incidental de inconstitucionalidade do artigo
5º, caput, artigo 6º, caput, §§ 1º e 2º, da Resolução nº 01/2002, do Congresso
Nacional, com eficácia ex nunc em relação à pronúncia dessa inconstitucionalidade,
nos termos do voto do Relator. Há se falar que divergiram do Relator os Ministros
Cézar Peluso e Ricardo Lewandowski, já que aquele votou pela procedência da ADI
e este se manifestou pela improcedência, mas asseverou que a análise dos
requisitos de urgência e relevância não competem ao Pretório Excelso.
Insta salientar, ainda, que tal qual ocorreu na primeira sessão plenária, os
Ministros Dias Toffoli e Joaquim Barbosa não puderam votar, já que aquele estava
impedido e este estava, justificadamente, ausente. Nada obstante, na questão de
ordem, também esteve ausente o Ministro Marco Aurélio.
É importante que ressaltemos quais foram as alterações que ocorreram,
relativamente ao acórdão que havia sido prolatado anteriormente.
Como a decisão se deu por maioria dos votos, nos termos daquilo que
decidiu o Ministro Relator Luiz Fux, basta que façamos uma análise de seu voto para
entendermos o posicionamento da Corte.
Crível que se destaque que a íntegra do acórdão permaneceu muito
semelhante à anteriormente proferida, salvo pequenas ressalvas que levaram à
completa alteração da decisão.
Como visto anteriormente, o Ministro Luiz Fux havia declarado a
inconstitucionalidade incidental do art. 6º da Resolução nº 1 de 2002, do Congresso
Nacional, contudo após a questão de ordem suscitada pela Advocacia-Geral da
União e o novo entendimento com relação ao deslinde da demanda, a
inconstitucionalidade incidental passou a abranger, também, o “caput” do art. 5º da
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referida Resolução, além de ter sido feita ressalva específica quanto ao fato de que
a nulidade do art. 6º abrangia seu “caput”, bem como seus parágrafos.
No ponto, o posicionamento do Ministro:
Põe-se em cheque, desta feita, a própria constitucionalidade do processo legislativo estabelecido nos artigos 5º, caput, e 6º, caput e parágrafos, da Resolução do Congresso, por meio da qual foi aprovada a Lei impugnada na presente Ação Direta. A magnitude das funções das Comissões Mistas no processo de conversão de Medidas Provisórias não pode ser amesquinhada. Procurou a Carta Magna assegurar uma reflexão mais detida sobre o ato normativo primário emanado pelo Executivo, evitando que a apreciação pelo Plenário seja feita de maneira inopinada. Percebe-se, assim, que o parecer da Comissão Mista, em vez de formalidade desimportante, representa uma garantia de que o Legislativo seja efetivamente o fiscal do exercício atípico da função legiferante pelo Executivo. Em razão disso, há que se reconhecer a inconstitucionalidade dos já citados artigos 5º, caput, e 6º, caput e parágrafos, da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional, pois dispensam a prolação de parecer por parte da Comissão Mista, não sendo suficiente sua elaboração por parlamentar Relator.
Outra questão crucial trazida no voto do Relator encontra-se na alteração da
modulação temporal dos efeitos. Utilizando-se de fundamentação embasa em teoria
denominada “prospective overruling” o Ministro adotou uma técnica conhecida como
“pueê prospectivity”, o que significa, basicamente, estender os efeitos da decisão,
tão somente, ao futuro, ou seja, as normas que já haviam sido editadas e aquelas
que tramitavam no Congresso Nacional não seriam atingidas pela
inconstitucionalidade, já que a força daquela decisão possuía eficácia somente com
relação às medidas provisórias que fossem editadas a partir daquela decisão.
Vejamos os dizeres do Relator:
Considerando o volume quantitativo de leis aprovadas com base na prática inconstitucional de dispensar a manifestação da Comissão Mista no trâmite parlamentar das Medidas Provisórias, a atitude mais prudente, a bem do interesse público, é adotar a técnica denominada pure prospectivity, modalidade de superação da jurisprudência (prospective overruling) na qual, conforme preleciona Bruno Bodart, “o novo entendimento se aplica exclusivamente para o futuro, e não àquela decisão que originou a superação da antiga tese” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Embargos de declaração como meio processual adequado a suscitar a modulação dos efeitos temporais do controle de constitucionalidade. RePro, vol. 198, p. 389, ago/2011). Sendo assim, fica declarada incidentalmente a inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput e parágrafos 1º e 2º, da Resolução nº 1 de
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2002 do Congresso Nacional, ficando preservada a higidez de todas as Medidas Provisórias convertidas em Lei até a presente data, inclusive da Lei Federal nº 11.516/07, impugnada na presente ação. Assegura-se, ainda, a validade da adoção do procedimento ora declarado inconstitucional para a aprovação das Medidas Provisórias que atualmente tramitam no Parlamento. Quanto às demais, deverá o Congresso dar cumprimento ao disposto no art. 62, § 9º, da Constituição, sendo vedada a apreciação pelo Plenário sem o prévio parecer da comissão mista de Deputados e Senadores
Da análise do trecho supra colacionado, já é possível constatar o conteúdo
do dispositivo do voto que objetivou o julgamento da ação. Em suma, a ADI nº 4029,
que antes havia sido julgada parcialmente procedente, com modulação de eficácia,
foi tida como improcedente, uma vez que o pedido principal de declaração da
inconstitucionalidade da Lei nº 11.516/2007 não fora acolhido, porém houve a
declaração incidental da inconstitucionalidade dos arts. 5º, “caput”, e 6º, “caput”
parágrafos 1º e 2º, da Resolução nº 1 de 2002, do Congresso Nacional, visto que o
conteúdo dos referidos dispositivos desrespeitava o art. 62, §9º de nosso texto
constitucional. Entretanto, os efeitos da decisão foram modulados, de forma a atacar,
apenas, as medidas provisórias que fossem editadas, em desconformidade com a
decisão, a partir daquela data, ou seja, a validade e a eficácia das medidas
provisórias que já haviam sido convertidas em lei, e aquelas que se encontravam em
trâmite no Congresso Nacional, seriam preservadas.
Finalmente, para que reste exaurida a análise da decisão final relativa à
Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica nº 4029, vejamos a íntegra de sua
ementa:
Tribunal: Supremo Tribunal Federal Adi 4029/Am – Amazonas Ação Direta De Inconstitucionalidade Relator: Min. Luiz Fux Julgamento: 08/03/2012 Publicação: 27/06/2012 Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI FEDERAL Nº 11.516/07. CRIAÇÃO DO INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE. LEGITIMIDADE DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DO IBAMA. ENTIDADE DE CLASSE DE ÂMBITO NACIONAL. VIOLAÇÃO DO ART. 62, CAPUT E § 9º, DA CONSTITUIÇÃO. NÃO EMISSÃO DE PARECER PELA COMISSÃO MISTA PARLAMENTAR. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 5º, CAPUT, E 6º, CAPUT E PARÁGRAFOS 1º E 2º, DA RESOLUÇÃO Nº 1 DE 2002 DO CONGRESSO NACIONAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS DA NULIDADE (ART. 27 DA LEI 9.868/99). AÇÃO DIRETA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. A democracia participativa delineada pela Carta de 1988 se baseia na generalização e profusão das vias de participação dos cidadãos nos provimentos estatais, por isso que é de se
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conjurar uma exegese demasiadamente restritiva do conceito de “entidade de classe de âmbito nacional“ previsto no art. 103, IX, da CRFB. 2. A participação da sociedade civil organizada nos processos de controle abstrato de constitucionalidade deve ser estimulada, como consectário de uma sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, na percepção doutrinária de Peter Häberle, mercê de o incremento do rol dos legitimados à fiscalização abstrata das leis indicar esse novel sentimento constitucional. 3. In casu, a entidade proponente da ação sub judice possuir ampla gama de associados, distribuídos por todo o território nacional, e que representam a integralidade da categoria interessada, qual seja, a dos servidores públicos federais dos órgãos de proteção ao meio ambiente. 4. As Comissões Mistas e a magnitude das funções das mesmas no processo de conversão de Medidas Provisórias decorrem da necessidade, imposta pela Constituição, de assegurar uma reflexão mais detida sobre o ato normativo primário emanado pelo Executivo, evitando que a apreciação pelo Plenário seja feita de maneira inopinada, percebendo-se, assim, que o parecer desse colegiado representa, em vez de formalidade desimportante, uma garantia de que o Legislativo fiscalize o exercício atípico da função legiferante pelo Executivo. 5. O art. 6º da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional, que permite a emissão do parecer por meio de Relator nomeado pela Comissão Mista, diretamente ao Plenário da Câmara dos Deputados, é inconstitucional. A Doutrina do tema é assente no sentido de que “'O parecer prévio da Comissão assume condição de instrumento indispensável para regularizar o processo legislativo porque proporciona a discussão da matéria, uniformidade de votação e celeridade na apreciação das medidas provisórias'. Por essa importância, defende-se que qualquer ato para afastar ou frustrar os trabalhos da Comissão (ou mesmo para substituí-los pelo pronunciamento de apenas um parlamentar) padece de inconstitucionalidade. Nessa esteira, são questionáveis dispositivos da Resolução 01/2002-CN, na medida em que permitem a votação da medida provisória sem o parecer da Comissão Mista. (...) A possibilidade de atuação apenas do Relator gerou acomodação no Parlamento e ineficácia da Comissão Mista; tornou-se praxe a manifestação singular: 'No modelo atual, em que há várias Comissões Mistas (uma para cada medida provisória editada), a apreciação ocorre, na prática, diretamente nos Plenários das Casas do Congresso Nacional. Há mais: com o esvaziamento da Comissão Mista, instaura-se um verdadeiro 'império' do relator, que detém amplo domínio sobre o texto a ser votado em Plenário'. Cumpre lembrar que a apreciação pela Comissão é exigência constitucional. Nesses termos, sustenta-se serem inconstitucionais as medidas provisórias convertidas em lei que não foram examinadas pela Comissão Mista, sendo que o pronunciamento do relator não tem o condão de suprir o parecer exigido pelo constituinte. (...) Cabe ao Judiciário afirmar o devido processo legislativo, declarando a inconstitucionalidade dos atos normativos que desrespeitem os trâmites de aprovação previstos na Carta. Ao agir desse modo, não se entende haver intervenção no Poder Legislativo, pois o Judiciário justamente contribuirá para a saúde democrática da comunidade e para a consolidação de um Estado Democrático de Direito em que as normas são frutos de verdadeira discussão, e não produto de troca entre partidos e poderes.” (In: CLÈVE, Clèmerson Merlin. Medidas Provisórias. 3ª ed. São Paulo: RT, 2010. p. 178-180. V. tb. CASSEB, Paulo Adib. Processo Legislativo – atuação das comissões permanentes e temporárias. São Paulo: RT, 2008. p. 285) 6. A atuação do Judiciário no controle da existência dos requisitos constitucionais de edição de Medidas Provisórias em hipóteses excepcionais, ao contrário de denotar ingerência contramajoritária nos mecanismos políticos de diálogo dos outros Poderes, serve à manutenção da Democracia e do equilíbrio entre os três baluartes da República. Precedentes (ADI 1910 MC, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 22/04/2004; ADI 1647, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 02/12/1998; ADI
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2736/DF, rel. Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 8/9/2010; ADI 1753 MC, Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 16/04/1998). 7. A segurança jurídica, cláusula pétrea constitucional, impõe ao Pretório Excelso valer-se do comando do art. 27 da Lei 9.868/99 para modular os efeitos de sua decisão, evitando que a sanatória de uma situação de inconstitucionalidade propicie o surgimento de panorama igualmente inconstitucional. 8. Deveras, a proteção do meio ambiente, direito fundamental de terceira geração previsto no art. 225 da Constituição, restaria desatendida caso pudessem ser questionados os atos administrativos praticados por uma autarquia em funcionamento desde 2007. Na mesma esteira, em homenagem ao art. 5º, caput, da Constituição, seria temerário admitir que todas as Leis que derivaram de conversão de Medida Provisória e não observaram o disposto no art. 62, § 9º, da Carta Magna, desde a edição da Emenda nº 32 de 2001, devem ser expurgadas com efeitos ex tunc. 9. A modulação de efeitos possui variadas modalidades, sendo adequada ao caso sub judice a denominada pure prospectivity, técnica de superação da jurisprudência em que “o novo entendimento se aplica exclusivamente para o futuro, e não àquela decisão que originou a superação da antiga tese” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Embargos de declaração como meio processual adequado a suscitar a modulação dos efeitos temporais do controle de constitucionalidade. RePro, vol. 198, p. 389, ago/2011). 10. Não cabe ao Pretório Excelso discutir a implementação de políticas públicas, seja por não dispor do conhecimento necessário para especificar a engenharia administrativa necessária para o sucesso de um modelo de gestão ambiental, seja por não ser este o espaço idealizado pela Constituição para o debate em torno desse tipo de assunto. Inconstitucionalidade material inexistente. 11. Ação Direta julgada improcedente, declarando-se incidentalmente a inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput e parágrafos 1º e 2º, da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional, postergados os efeitos da decisão, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99, para preservar a validade e a eficácia de todas as Medidas Provisórias convertidas em Lei até a presente data, bem como daquelas atualmente em trâmite no Legislativo.
13
6.2 Da Sensação de Insegurança Jurídica e da Necessidade de Limitação ao
Ativismo Judicial no Supremo Tribunal Federal
Finalmente, para exaurirmos toda a análise pertinente à constatação da
necessidade de limitação do ativismo judicial em sede do Supremo Tribunal Federal,
insta-nos analisar as consequências que a alteração no julgamento da Ação Direta
de Inconstitucionalidade Genérica nº 4029 trouxe ao país.
Como verificamos, a justificativa da apresentação de Questão de Ordem por
parte da Advocacia-Geral da União e o acolhimento daquela pelo Pretório Excelso,
embasava-se na necessidade de se conservar a segurança jurídica do cenário
nacional.
13
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%284029%29&base=baseAco
rdaos
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Mas, o que realmente ocorreu fora o contrário do pretendido. Exatamente, se
analisarmos o resultado daquele julgamento, iremos nos deparar como uma situação
deveras delicada. O desenrolar da ADI nº 4029 ocorreu entre 19/02/2008, data de
sua propositura, e 18/03/2012, quando a ação fora definitivamente julgada. Porém, o
que causa espanto, é o fato de que o processo esteve concluso para julgamento do
dia 01/08/2011 ao dia 07/03/2012, quando fora prolatada a primeira decisão de
mérito, ou seja, os Ministros da Corte Máxima desfrutaram de aproximadamente 07
(sete) meses para que formulassem um posicionamento e votassem acerca do
julgamento que entendiam ser o mais correto, entretanto após o levantamento de
Questão de Ordem por parte do Advogado-Geral da União, Luís Inácio Lucena
Adams, o Plenário do Tribunal decidiu, em 08/03/2012, pela alteração do resultado
do julgamento, convalidando a Lei 11.516/2007, que objetivou a demanda, além de,
aproximadamente, outras 500 (quinhentas) normas que haviam, na data anterior,
sido consideradas uma afronta à Constituição Federal.
Ora, não seria crível admitir que o Órgão Máximo do Judiciário Brasileiro se
convencesse, em 07 (sete) meses, acerca de determinada inconstitucionalidade e,
um dia após firmar sua decisão, tomando por base uma justificativa levantada pela
Advocacia-Geral da União, que como visto tem a função de defender a presunção
de constitucionalidade das normas jurídicas, alterasse sua decisão, preservando a
validade de centenas de normas que, 24 (vinte e quatro) horas antes, estavam
fadadas e serem declaradas nulas.
Como se não bastasse, restou evidenciado neste trabalho que o Ministro
Relator do Processo, Luiz Fux, deixou claro em seu voto que tinha conhecimento do
fato de que várias leis seriam afetadas pelo julgamento daquela Ação Direta, tendo,
inclusive, formulado regramento que possibilitaria que o Congresso Nacional
aprovasse leis para suprir cada uma daquelas que se encontravam eivadas pela
inconstitucionalidade formal decorrente do desrespeito ao art. 62, §9º da Carta
Magna.
Atentemo-nos para os dois trechos do referido voto que, apesar de já terem
sido transcritos alhures, confirmarão, de forma cabal, este posicionamento:
Entendo, ante as razões narradas, que é o caso de declarar a inconstitucionalidade da Lei Federal nº 11.516/07, não pronunciando, contudo, a sua nulidade pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses. Nesse prazo, poderá o Congresso Nacional aprovar nova Lei, de teor semelhante, que impedirá a solução de continuidade na existência do Instituto Chico
62
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Em contrapartida, findo esse prazo, o referido diploma perde sua eficácia, deixando o ordenamento jurídico e permitindo a aplicação da normativa pretérita, que fora inconstitucionalmente revogada. (...) É de se ressaltar, ainda, que inúmeras Medidas Provisórias foram convertidas em Lei observando o procedimento previsto no art. 6º da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional. Para conferir estabilidade e segurança jurídica às relações decorrentes dessas normas, cabe sinalizar aos jurisdicionados que, em futuras ações que discutam a constitucionalidade formal de Leis frutos de conversão de Medidas Provisórias pelo mesmo rito, será conferido idêntico tratamento, qual seja, a postergação da nulidade da Lei para o futuro.
Não há dúvidas de que a atuação do Supremo Tribunal Federal não
encontra alto grau de razoabilidade, sendo certo, inclusive, que o Ministro Marco
Aurélio posicionou-se de forma contrária à improcedência da ação, argumentando,
com excelência, que o compromisso maior do Supremo Tribunal Federal é com a
guarda da Constituição Federal, não podendo aquela Corte subjugar um dispositivo
previsto na Lei Maior, razão pela qual posicionou-se em prol da procedência do
pedido formulado na ação, fazendo considerar seu posicionamento de uma eventual
modulação de efeitos que protegesse a Lei 11.516/2007, haja vista seu objeto,
porém sem abarcar em um raciocínio que o levaria a permitir que aproximadamente
500 (quinhentas) leis fossem convalidadas, apesar de serem uma afronta ao
ordenamento constitucional brasileiro.
Observemos tal posicionamento:
Presidente, é preciso conferir-se eficácia à Constituição Federal; é preciso que as normas nela contidas vigorem e sejam observadas, principalmente por aqueles encarregados de normatizar. E essa observância, a toda evidência, no que deixou de atuar uma comissão mista para ter-se, simplesmente, ato individual de certo Deputado Federal, talvez integrante da comissão mista, não ocorreu, no que se converteu em lei a medida provisória, que não passou pela comissão mista, não mereceu o parecer da comissão mista. Colocou-se, em segundo plano, ferindo de morte, o processo legislativo. Dar um jeito na situação considerado o objeto? Não posso, Presidente, porque devo sopesar valores, e o compromisso maior do Supremo é com a guarda da Constituição Federal. Não desconheço a importância do instituto criado, que merece loas, mas não posso, potencializando o objetivo, simplesmente rasgar a Carta Federal e afastar do processo legislativo a forma essencial, como disse, prevista no § 9º do artigo 62 da Constituição Federal, que é claríssimo, é de uma clareza solar, e, mesmo assim, se mostrou desconhecido dos nossos representantes, deputados federais e senadores, a revelar: (...)
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Dir-se-á: mas a comissão autorizou o procedimento por parte do Deputado Federal. Que poder tem a comissão mista para colocar em segundo plano a Constituição Federal? A norma não é dispositiva, não é norma que somente atue quando não haja manifestação de vontade. Ela impõe às Casas do Congresso Nacional a arte de proceder. Por isso, Presidente, peço vênia para ficar do lado diametralmente oposto ao que adotou o Ministro Ricardo Lewandowski para acolher, de forma integral, o pedido formulado na inicial. A criação verificada não se mostra, a todos os títulos, válida, presente a Constituição, a não ser que, no tocante a essa medida provisória, tendo em conta o objetivo a ser alcançado, digamos que não incide o Texto Maior.
Destarte, a atuação do Pretório Excelso acabou por gerar aquilo que se
pretendia evitar, irrigando nos cidadãos brasileiros o sentimento de que nossa Corte
Máxima não parece exígua como deveria ser. É inimaginável a concepção de que o
Supremo Tribunal Federal, ao corrigir uma falha legislativa do Poder encarregado de
criar o Direito, tenha de se preocupar com a resiliência e a proatividade daquele em
aprovar normas capazes de corrigir o erro que ele próprio cometeu.
Não há dúvidas de que o ativismo judicial é resultado da evolução do Poder
Judiciário e representa uma garantia inafastável do brasileiro, qual seja, a certeza de
que as omissões e imperfeições do Legislativo e do Executivo não prejudicarão o
regular desempenho da justiça. Contudo, a intervenção do Judiciário não pode
substituir a competência daqueles Poderes. Isto se dá, pois o intuito do ativismo
judicial encontra-se no efetivo controle da constitucionalidade de todo o
Ordenamento Jurídico e na resolução de conflitos com base na interpretação e
argumentação racional, objetivando, sempre, o zelo pelas máximas previstas em
nosso texto constitucional.
Diante disto, salta aos nossos olhos a necessidade de se limitar a atuação
ativa do Supremo Tribunal Federal, porquanto, como já discutido nesta monografia,
grande parte de suas decisões são revestidas de irrecorribilidade e, assim, começa a
surgir o temor de que a discricionariedade para se intervir na atuação dos demais
Poderes possa se tornar a necessidade de implementação, pelo Pretório Excelso, de
suas próprias políticas públicas, o que seria fortemente repudiado.
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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depreende-se da presente monografia que fora proposta uma ideia
relativamente à necessidade de limitação do ativismo judicial no Supremo Tribunal
Federal, contudo é importante ressaltar que o enfoque motivador de tal tema
restringiu-se ao estudo da atuação do Pretório Excelso na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 4029, que acabou por gerar uma forte sensação de
insegurança jurídica na sociedade brasileira e desencadeou pensamentos como os
que foram expostos na dissertação. Entretanto, apesar do posicionamento em prol
da imposição de limites à atuação ativa da Suprema Corte, insta salientar que este
trabalho, em momento algum, visa desvalorizar a importância que o Órgão Máximo
do Poder Judiciário brasileiro tem para o regular desenvolvimento da justiça, nem,
tampouco, tecer uma crítica a um Tribunal revestido de uma enorme credibilidade no
Brasil e no mundo. Logo, o objetivo pretendido cinge-se à atenção que devemos ter
quanto ao poder que é conferido a uma única Corte e como a inexistência de
limitação em seu ativismo pode acarretar prejuízos à nossa nação.
Para que este estudo pudesse chegar à conclusão acima descrita, fora
abordada, de forma sintética, a evolução do Poder Judiciário brasileiro
possibilitando, assim, demonstrar aos leitores como a referida Esfera passou a atuar
de maneira ativa, podendo, até, realizar inferências nas atribuições dos demais
Poderes para suprir eventuais omissões e imperfeições que sigam em desencontro
do que é justo.
Ademais, o desenvolvimento desta monografia deu-se, como já mencionado,
por decorrência da atuação do Supremo Tribunal Federal frente à Ação Direita de
Inconstitucionalidade nº 4029, porém a análise deste julgamento exigiu que a obra
elencasse temas previstos em nossa Constituição Federal que são, de certa sorte,
indispensáveis para que a matéria abordada no decorrer do trabalho seja entendida
com clareza.
Mais detalhadamente, houve a abordagem do controle de
constitucionalidade exercido no Brasil e o processo legislativo previsto em nossa
Carta Magna. O estudo daquele foi direcionado, basicamente, ao controle
concentrado de constitucionalidade, ou seja, o controle exercido pela Suprema Corte
em situações nas quais se discuti a constitucionalidade ou não de determinada lei,
ato normativo ou omissão do Poder Público, sendo crível destacar que a abordagem
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elencou as quatro formas de se movimentar o referido controle, quais sejam, a ação
direta de inconstitucionalidade genérica, a ação direta de inconstitucionalidade por
omissão, a ação declaratória de constitucionalidade e a arguição de
descumprimento de preceito fundamental; noutro giro, o estudo do processo
legislativo tendeu às medidas provisórias, já que esta espécie normativa fora a
responsável pela impetração da ação que objetivou esta monografia.
Finalmente, o estudo direcionou-se ao desmembramento do julgamento da
alhures mencionada ADI nº 4029 e, vencida esta etapa, os motivos que ensejaram a
proposta aqui esculpida puderam ser claramente demonstrados, de maneira a
possibilitar que cada leitor faça sua própria crítica acerca do que fora lançado.
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REFERÊNCIAS
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