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1 “A INFLUÊNCIA DO CINEMA HOLLYWOODIANO NO PROCESSO DE EMANCIPAÇÃO DA MULHER BRASILEIRA” Aline Rocha Bortoti Prof. Ms. Roberto Marcelo Caresia RESUMO: O cinema foi um elemento que favoreceu a propagação de ideias e de um projeto de sociedade. Mais precisamente o cinema hollywoodiano levou o American Way of Life para os países onde suas películas foram exibidas. Como difusor de comportamentos, ele trouxe à tona questionamentos referentes à questão da condição social da mulher, abordando os mais variados temas em seus filmes como o casamento, o divórcio, a maternidade, o trabalho e a educação das mulheres. Podemos observar que os filmes E o vento levou (1939), Gilda (1946), Ardida como pimenta (1953) e Confidências à meia-noite (1959) atuam como transmissores destes questionamentos, mesmo que em meio a diversas contradições, favoreceram a naturalização de valores modernos, que serão levantados como pauta nos anos 70 com a segunda onda feminista. PALAVRAS-CHAVE: Cinema; Hollywood; Feminismo; Emancipação da Mulher Brasileira; ABSTRACT: The film was an element that favored the spread of ideas and a project of society. More specifically the Hollywood cinema led the American Way of Life for countries where his films were shown. As behaviors diffuser, he brought up questions regarding the issue of social status of women, addressing various themes in his films such as marriage, divorce, motherhood, work and education of women. We can see that the film Gone with the Wind (1939), Gilda (1946), Calamity Jane (1953) and Pillow Talk (1959) act as transmitters of these questions, even in the midst of many contradictions, favored the naturalization modern values, which will be raised as an subjects in the 70s with the second feminist wave. KEY-WORDS: Film; Hollywood; Feminism; Emancipation of Brazilian Women;

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“A INFLUÊNCIA DO CINEMA HOLLYWOODIANO NO PROCESSO DE

EMANCIPAÇÃO DA MULHER BRASILEIRA”

Aline Rocha Bortoti

Prof. Ms. Roberto Marcelo Caresia

RESUMO: O cinema foi um elemento que favoreceu a propagação de ideias e de

um projeto de sociedade. Mais precisamente o cinema hollywoodiano levou o

American Way of Life para os países onde suas películas foram exibidas. Como

difusor de comportamentos, ele trouxe à tona questionamentos referentes à questão

da condição social da mulher, abordando os mais variados temas em seus filmes

como o casamento, o divórcio, a maternidade, o trabalho e a educação das

mulheres. Podemos observar que os filmes E o vento levou (1939), Gilda (1946),

Ardida como pimenta (1953) e Confidências à meia-noite (1959) atuam como

transmissores destes questionamentos, mesmo que em meio a diversas

contradições, favoreceram a naturalização de valores modernos, que serão

levantados como pauta nos anos 70 com a segunda onda feminista.

PALAVRAS-CHAVE: Cinema; Hollywood; Feminismo; Emancipação da Mulher

Brasileira;

ABSTRACT: The film was an element that favored the spread of ideas and a project

of society. More specifically the Hollywood cinema led the American Way of Life for

countries where his films were shown. As behaviors diffuser, he brought up questions

regarding the issue of social status of women, addressing various themes in his films

such as marriage, divorce, motherhood, work and education of women. We can see

that the film Gone with the Wind (1939), Gilda (1946), Calamity Jane (1953) and

Pillow Talk (1959) act as transmitters of these questions, even in the midst of many

contradictions, favored the naturalization modern values, which will be raised as an

subjects in the 70s with the second feminist wave.

KEY-WORDS: Film; Hollywood; Feminism; Emancipation of Brazilian Women;

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Introdução

O processo de emancipação da mulher brasileira foi uma longa trajetória. Ele

se deu por uma diversidade de influências que ainda está em processo. As mulheres

desde o século XIX lutavam por galgar mais espaço na sociedade, por conseguir

equiparar seus direitos aos masculinos. Nesta perspectiva o cinema, a música, a

modernização do Brasil, a influência americana foram importantes disseminadores

de novos valores.

O Brasil foi parte do projeto americano de reestruturação da sua economia,

após a crise de 1929. Com os olhos voltados para os brasileiros e seu mercado em

potencial, os Estados Unidos criaram ícones como a atriz e cantora portuguesa

Carmem Miranda, que fez sucesso entre os anos de 1928 e 1955, e a criação do

personagem Zé Carioca em 1943, no filme Alô, amigos, que revelam ainda mais

essa postura imperialista e cultural. A partir de então, a presença norte-americana

no Brasil somente aumentou, durante os governos de Dutra (1946-1950) e Juscelino

Kubitschek (1956-1960), principalmente.

A partir da década de 1930, o Brasil já sofria influência americana em outros

aspectos. O Feminismo no Brasil sofreu influência direta dos movimentos das

mulheres americanas e inglesas, os ideais de igualdade advindos do liberalismo

econômico americano e a divisão de métodos de luta feminista, herança inglesa

foram importantes para a organização teórica e prática do movimento feminista

brasileiro.

Após a vitória no Congresso, e finalmente conseguir o direito ao voto, a luta

feminina perde força, tornando mais lento o processo de emancipação da mulher,

que não necessitava apenas do direito ao voto, mas o direito ao respeito e

tratamento igual entre homens e mulheres. É neste momento que o cinema se torna

tão importante como grande difusor de comportamentos e valores, pois atingia

grande parte da população como iremos observar nos capítulos que seguem este

trabalho.

O cinema traz para o Brasil novas perspectivas femininas, temas

contraditórios, que ora estão alinhados com ideias modernas, de cunho feminista,

ora com ideias extremamente conservadoras, que traduzem bem o recorte temporal

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do final da década de 1930 até o início dos anos 60, mas que foram de extrema

importância, pois a contradição traz a tona discussões sobre os diferentes temas

que envolvem as mulheres e ainda lentamente vai naturalizando o que a sociedade

encarava com repúdio.

Uma Breve História de Hollywood

O cinema nasce em 1895, com o cinematógrafo, construído pelos irmãos

Lumiére, em Paris. Era caracterizado por fotografias que em sequência criavam

movimento, isso gerou o espanto e admiração do público parisiense, que participou

da primeira apresentação pública. Desde então, o que ficou conhecido como a

sétima arte, se espalhou pelo mundo e foi absorvendo novas tecnologias para o seu

aprimoramento, e, por consequência, seduziu o mundo por sua beleza em reproduzir

o “real”.

O cinema surge e se populariza nos Estados Unidos, segundo o artigo de

Angrisano, nos bairros operários americanos como Nova York e Chicago.

Curiosamente os estúdios americanos, não foram formados pela classe dominante

americana, mas sim por pequenos comerciantes, na maioria judeus, como Daryl

Zanuck, Samuel Bronston e Samuel Goldwyn, que controlavam os Estúdios Fox,

Universal e Paramount. (ANGRISANO, 2005: 14)

Após a Primeira Guerra Mundial o polo cinematográfico vai se mudando para

Los Angeles, na Califórnia, por conta até mesmo da maior possibilidade de gravarem

cenas fora dos estúdios, pois o clima no litoral era mais favorável. Com isso,

estabelece o que conhecemos como a cidade dos sonhos. Os Studios Metro-

Godwyn-Mayer, Columbia, Universal, Paramount, United Artists, que produziam

filmes mudos durante o início do século XX, iniciaram o que posteriormente foi

chamado de a era dos Estúdios de Hollywood.

Hollywood criou sua própria linguagem cinematográfica, com padrões de

câmera, recortando, focalizando ou expandindo imagens para passar sensações

específicas aos espectadores.

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Filmar então pode ser visto como um ato de recortar o espaço, de determinado ângulo, em imagens, com uma finalidade expressiva. Por isso, diz-se que filmar é uma atividade de análise. Depois, na composição do filme, as imagens filmadas são colocadas uma após as outras. Essa reunião das imagens, a montagem, é então uma atividade de síntese. (BERNARDET,1985: 36-7).

A montagem cria a linguagem de determinado diretor, é alma do filme e que

determina a sequência da narrativa. A ideia do “enquanto isso” da literatura demorou

um pouco para chegar ao cinema, pois é um conceito de linguagem mais

aprimorado, duas cenas acontecendo ao mesmo tempo sendo mostradas em

paralelo, uma após a outra, mas que dão a entender ao espectador que são

simultâneas.

O cineasta americano D.W. Griffith foi uns dos primeiros, se não o primeiro, a

utilizar uma linguagem mais aprimorada em seus filmes: Nascimento de uma Nação,

de 1915, e Intolerância, de 1916, pois, foi o primeiro que claramente recortava as

cenas e as selecionava em sequência temporal. Outros tipos de linguagens como a

do cinema Europeu e do Russo foram criadas, mas a de Hollywood foi a que mais foi

consumida pelo público comum.

Seguindo uma ordem cronológica e observando outros aspectos sobre os

Estados Unidos podemos perceber que eles saíram da Primeira Guerra como a

maior potência industrial dos anos 1920, atingindo, em 1929, a fatia de 42% da

produção industrial mundial. E saíram também como primeiro país credor do mundo.

Esses foram os chamados “Loucos anos 20”, no qual os EUA eram o símbolo do

desenvolvimento capitalista, porém com a quebra da Bolsa de Nova York em 1929,

toda essa prosperidade é freada, pois, a crise leva as indústrias americanas a

despedirem milhares de funcionários, e a mecanização da agricultura outros

milhares. Mas o cinema toma o caminho contrário, pois, com a inovação do som

junto as imagens, o cinema americano atinge novas proporções, torna-se então a

Indústria do entretenimento, o que ajuda no processo de reorganização da economia

norte-americana.

Em 1927, o nascimento de novas tecnologias permitiu a implantação do som

junto às produções cinematográficas. O filme The Jazz Singer (O cantor de Jazz) de

1927, foi um musical produzido pelo estúdio Warner (que entrará para o páreo dos

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grandes estúdios com a sincronização do som com a imagem), foi o primeiro filme

sonoro. Este filme não era inteiramente sonoro, mas continha alguns diálogos e

canções que eram sincronizadas com as imagens. Portanto, o cinema hollywoodiano

toma espaço no cenário mundial e torna-se a maior indústria cinematográfica do

mundo, passando a exportar suas películas por todos os continentes do globo.

Com o advento do som, muitos atores e atrizes de Hollywood perderam seus

empregos, afinal suas vozes não eram agradáveis ao público, o que gerou algumas

fofocas em revistas especializadas, mesmo depois de anos, e também filmes sobre

os artistas nos quais suas carreiras foram ceifadas com o advento das novas

tecnologias.

Ao passar dos anos Hollywood aprimora suas produções, com tecnologia,

linguagens mais elaboradas, criando e trabalhando com gêneros específicos, mas

acima de tudo, criando seu celeiro de estrelas. O star system é parte principal na

formação da Indústria cinematográfica, criando a imagem das estrelas de Hollywood,

criando fãs fiéis que assistiriam determinado filme, apenas por serem estrelados por

seus atores favoritos.

Segundo Meneguello, a utilização do modelo Star System, nas décadas de 40

e 50, criou-se as estrelas, principalmente atrizes, para vender suas imagens. Os

filmes lançavam atores, porém, na mídia, a vida das atrizes era esmiuçada, os

bastidores faziam tanto ou mais sucesso do que os próprios filmes. Os contratos já

estabeleciam qual seria a imagem que determinado ator ou atriz deveria ter em sua

vida particular, as revistas exploravam-nos até a exaustão. Os produtos das estrelas

de Hollywood eram usados em propagandas de revistas especializadas, o público de

cinema consumia muito mais que os filmes, consumiam todo o universo produzido e

veiculado por Hollywood. (MENEGUELLO, 1996: 97)

Contudo, o Brasil também foi influenciado por esse cinema, e por todo

universo criado por Hollywood. A mídia brasileira especializada em cinema sofreu

forte influencia do Star System e das grandes obras hollywoodianas. O Brasil

consumia tudo que vinha dos Estados Unidos, tecnologia, produtos alimentícios,

produtos de beleza, o cinema, e, por consequência a cultura, que foi importante no

processo de formação de valores da população.

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O feminismo e o sufrágio na Inglaterra

Segundo o artigo, Luta das mulheres pelo direito de voto: movimentos

sufragistas na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, de Zina Abreu, a primeira

pensadora que se ateve a questão da mulher na Inglaterra foi Mary Wollstonecraft,

que com a obra A Vindication of the Rights of Woman (1792) expôs sua indignação,

sobretudo, a diferença da educação feminina para a masculina, e argumentava que

esta era a causa das diferenças políticas e sociais sobre os sexos. Fortemente

influenciada pelas teorias dos filósofos Francis Bacon e de John Locke, reivindicava

os mesmo avanços no âmbito da liberdade e direitos civis para as mulheres. Seu

livro influenciou mulheres inglesas e americanas a pensarem seus direitos e

reivindicarem mais espaço na política de seus países. (ABREU, 2002: 443)

Segundo Zina Abreu foi baseado na lógica protestante de seu período, de que

os cristãos deveriam resistir a qualquer forma de opressão e violação dos direitos

divinos, que as mulheres passaram a pensar em seus direitos, logo:

Foi a percepção da sua ‘igualdade cristã’ que levou as mulheres a se consciencializarem da sua desigualdade civil: se como cristãs tinham ‘almas iguais’, como cidadãs deveriam ser, tal como os homens, também detentoras de direitos naturais e inalienáveis. Foi esse despertar de consciência cívica que dotou as mulheres dessa geração revolucionária do estímulo e coragem suficientes para intervirem no domínio público, desafiarem as autoridades civis e eclesiásticas, desobedecerem ao pai, irmão ou marido, escreverem, publicarem e expressarem publicamente e de viva voz as suas crenças e opiniões, de teor político, civil e teológico. Foi dessa geração de mulheres britânicas politicamente activas e alfabetizadas que, já nos fins do século XVII, surgiram as primeiras escritoras proto-feministas, como Margaret Cavendish, duquesa de Newcastle, Bathsua Makin e Mary Astell, cujo discurso e consciencialização sócio-políticos prenunciam os das feministas, sufragistas e sufragetes de gerações ainda remotas. (ABREU, 2002: 446)

Por consequência, destes questionamentos no século XVIII, e também da

maior abertura da importância da mulher, até mesmo dentro do próprio lar, que a

perspectiva da mulher em um âmbito público, vai aumentando, criando novos

espaços.

Peter Gay, em seu livro O Século de Schnitzler: A formação da cultura da

classe média (1815-1914), já analisava o aumento da importância social da mulher,

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que em seu lar participava das decisões, mesmo que ainda na esfera pública fosse

considerada inferior ao homem, dentro de casa, ela tomava as decisões juntamente

a seu marido, a exemplo disso, o controle de natalidade era assunto e certa decisão

da mulher, que por querer preservar sua família e seu bem estar, resolvia não ter

muitos filhos. (GAY, 2002: 68)

Em um artigo de seu livro póstumo, Tempos Fraturados, Eric Hobsbawm

aponta que no período da bella époque, as mulheres de classe média europeia já

frequentavam universidades e tomavam contato com ideias diferentes. Para ele,

esse contato com ideias novas e percepções de mundo facilitaria a organização dos

movimentos pela igualdade jurídica e emancipação feminina, a partir da década de

1920. (HOBSBAWM, 2013: 121-41) Sobretudo, a educação e um aumento nos

índices de instrução, podem ser observados, como importantes para os

questionamentos que as mulheres do século XIX promoveram, pois, a leitura, por

exemplo, possibilitava o contato com artigos e livros como o de Mary Wollstonecraft.

Além da luta intelectual e nas ruas das mulheres Inglesas, o apoio de alguns

homens, de influência, dos meios políticos e filosóficos, que possibilitou a formação

de instituições e debates sobre a importância social da mulher, o sufrágio e a

igualdade de direitos. John Stuart Mill foi um desses homens, que influenciado pelo

feminismo de sua esposa Harriet Taylor Mill escreveu um ensaio Enfranchisement of

Women (1851), no qual defendia o direito das mulheres ao sufrágio.

Portanto, na Inglaterra em meados do século XIX formou-se então a maior

organização pelo sufrágio feminino de até então, a ‘NUWSS—National Union of

Women’s Suffrage Societies’, que levou a luta a âmbito internacional, reforçou e

aprimorou as reivindicações na Grã-Bretanha e também nos Estados Unidos.

Em 1866, John Stuart Mill apresentou uma proposta, ao Parlamento Inglês, de

emenda que concederia o direito ao voto para a mulher. Apesar disso, a emenda

não foi aprovada por uma minoria de votos a favor.

Em 1884, uma nova emenda foi apresentada ao Parlamento e outra vez

derrotada, mas entre as derrotas, já existia a presença feminina nas eleições, pois,

desde que a mulher tivesse propriedades como os homens, poderiam votar. Mas

mesmo com o voto ligado as propriedades, as suffragettes (ativistas da causa

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feminista) continuaram em defesa ao voto para todas as mulheres, sem distinção de

renda, ou qualquer outra.

É importante salientar que nos Estados Unidos e na Inglaterra, Segundo Zina

Abreu, os movimentos pelo sufrágio tiveram duas facetas, uma constitucionalista, no

qual a luta era contida, com ordem, apenas no campo das ideias, tentando inserir

esses valores na sociedade e na política por meio do discurso, no qual as

integrantes eram conhecidas como sufragistas; e a faceta militante, que estabeleceu

uma luta agressiva, como a dos operários ingleses no século XIX, quebrando

literalmente instituições que representavam o poder, portanto, eram conhecidas por

suffragettes. (ABREU, 2002: 461-2)

A organização NUWSS—National Union of Women’s Suffrage Societies,

fundada em 1897, representava as Sufragistas e a WSPU—Women’s Social and

Political Union, fundada em 1903, representava as Suffragettes, mesmo as

instituições seguindo cada qual uma opinião acerca da ação feminista, todas foram

de extrema importância no processo de emancipação da mulher inglesa, não apenas

elas que eram mais expressivas, mas as pequenas instituições também.

Em 1913, a suffragette Emily Davison em um ato de loucura e bravura jogou-

se na frente do cavalo do Rei Jorge V, tentando atrair atenção para sua causa,

Emilly morreu, mas deixou ainda mais forte as reivindicações, pois, em seu enterro

os protestos foram violentos e causaram comoção.

Contudo, mesmo após muita luta das feministas, foi apenas após a Primeira

Guerra Mundial, no qual as mulheres participaram de diversas formas, e ajudaram a

definir o conflito, que finalmente foi dado o direito ao voto as inglesas com mais de

30 anos, só abaixando a idade mínima, em 1928, para 21 anos.

O feminismo e o sufrágio nos Estados Unidos

Junto ao movimento abolicionista no século XIX, mulheres americanas,

questionavam seu estatuto social, que era parecido com o dos negros escravos, elas

eram como parte da propriedade do marido. A luta contra a violência da escravidão

deu voz e impulsionou as americanas a reivindicarem seus direitos. Mas, é apenas

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em 1866 com a conquista do direito ao voto dos Negros, que a luta feminista separa-

se do movimento abolicionista e sufragista negro.

As irmãs Sarah e Angelina Grimké, foram às primeiras mulheres a poder falar

em público, segundo Zina Abreu, isso trouxe voz às opiniões femininas, e trouxe o

espaço necessário à luta árdua que viria, pois, é apenas no século XX, que as

mulheres americanas conquistam o direito ao voto.

Na primeira metade do século XIX, mulheres como Hannah Mather Crocker,

Frances Wright e Margaret Fuller influenciadas por Mary Wollstonecraft, promovem

em alguns Estados, debates e palestras sobre a educação da mulher americana.

Fuller anos mais tarde escreve um livro Woman in the Nineteenth Century (1845),

em que questiona a situação do negro e da mulher na sociedade. Portanto, como já

abordado, nos Estados Unidos a questão da mulher é levantada juntamente a

questão do negro, ao movimento abolicionista.

Segundo Zina Abreu:

Foi esta tradição cultural e corrente ideológica — produto da evolução do pensamento teológico, filosófico e constitucional britânico, sobretudo durante o período entre a Reforma da Igreja do século XVI e a Revolução de Independência da América (1776) — que constituiu a plataforma a partir da qual surgiram os movimentos libertatários, entre os quais se incluem os movimentos abolicionistas e os feministas. (ABREU, 2002: 453)

Foi baseado nos ideais de liberdade e de igualdade expressos na Declaração

de Independência da América, que mulheres como Seneca Falls, Elizabeth Cady

Stanton, Susan Anthony e outras figuras importantes para a luta feminista

americana, entre os séculos XVIII e XIX, baseavam seus discursos em prol da

emancipação da mulher americana e do sufrágio.

Alguns anos depois, em 1869 foi fundada a revista ‘National Woman Suffrage

Association’, pelas pró-sufragistas Elizabeth Stanton, Susan Anthony e Lucy Stone e

com o passar dos anos várias outras revistas e instituições seguiram no caminho ao

sufrágio universal como a ‘International Women’s Suffrage Alliance’, que tinha sua

sede em Londres, mas tinha como presidente a americana Susan Anthony.

Susan Anthony foi figura importantíssima no processo de abolição da

escravidão e na luta feminista pelo sufrágio. Durante a Guerra Civil Americana,

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1861-1865, Susan foi incumbida de coletar assinaturas, e conscientizar os cidadãos

americanos de que a escravidão deveria chegar ao fim, pois, não fazia sentido com

os ideais americanos e com a Declaração de Independência, que pregava a

liberdade e igualdade. Em 1863 é declarada a abolição por Abraham Lincoln e mais

tarde em 1870 foi aprovada a emenda na constituição americana, que garantia o

direito ao voto, a todos os cidadãos independentemente da cor. Mas a luta pró-

sufrágio continuava, organizando passeatas, manifestações de rua, debates,

discursos, travando uma luta no congresso. Susan continuou defendendo o voto

feminino até a sua morte em 1906, no qual aumentou a violência e indignação nas

manifestações, portanto, Susan não viu seu sonho se realizar, mas em 1916

Jeannette Rankin torna-se a primeira deputada pelo Estado de Montana, e continuou

levantando sua bandeira.

Contudo, apenas em 1920, após longa luta de Susan Anthony e de várias

mulheres não apenas no mundo público, mas também do privado, que é

estabelecida a 19º emenda na Constituição Americana, no qual o direito ao voto e a

atuação política não pode ser mais restrita a nenhum sexo, ou seja, finalmente o

voto passa a ser um direito da mulher americana.

O feminismo e o sufrágio no Brasil

Desde a segunda metade do século XIX, juntamente a luta pró-abolição,

algumas mulheres, de classes sociais abastadas, questionavam a submissão da

mulher frente ao homem, e principalmente o direito de estudarem, no Brasil e

também no exterior. Aproveitando o momento de extrema agitação política, essas

mulheres fizeram barulho, principalmente nos grandes centros urbanos, como São

Paulo e Rio de Janeiro. Mas com o fim da escravidão a luta foi perdendo força,

retomando somente nos anos 20.

As mulheres dos anos 20 no Brasil já estavam inseridas nas fábricas, na vida

e no cotidiano que até então estava restrito ao universo masculino. Mulheres de

classes sociais mais altas já estudavam no exterior. As mulheres tomavam os

espaços públicos e expandiam suas oportunidades de emprego e carreira.

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Os movimentos em prol dos direitos da mulher no Brasil tomaram rumos

parecidos com a Inglaterra, pois se dividiam em grupos, as divisões mais distintas

eram as femininas e as feministas. A luta feminina estava mais alinhada à mulher

como mãe e esposa que exerce sua cidadania, buscando creches, união nas

famílias, paz e questionando problemas socioeconômicos. A luta feminista buscava

igualdade de direitos entre os sexos, buscava a educação igualitária, direitos

trabalhistas, salários iguais, melhores condições de trabalho, e um novo papel da

mulher na sociedade, não sendo apenas mãe e esposa. (SINGER, 1983: 109-39)

Havia militantes mais brandas como Bertha Lutz, que buscavam na política

um caminho para seus objetivos, que não debatiam profundamente alguns temas e

que feririam as grandes instituições da época. Já as feministas mais radicais, não

ponderavam, organizavam manifestações, apoiavam partidos de esquerda e greves

de operárias.

A luta feminista mais radical tomou forma, nos anos 20, junto às operárias nas

fábricas. Muitas mulheres eram contratadas para trabalharem em cargos iguais aos

masculinos, mas por salários menores e condições precárias, neste contexto, muitas

operárias feministas lutaram contra a exploração e o preconceito de que eram

vítimas, mobilizavam greves, manifestações, protestos e passeatas, mas nem

sempre eram apoiadas por um número significativo de trabalhadoras, pois eram

consideradas radicais e por isso, mal vistas pela sociedade da época.

Já no contexto da luta feminina muitos foram os argumentos levantados pelas

mulheres, durantes às primeiras décadas do que podemos chamar de reivindicação

das mulheres em vários setores, principalmente na educação. Um deles era que

uma mulher instruída poderia desenvolver melhor suas funções de esposa e mãe,

por sinal educaria melhor seus filhos, logo, seria parceira de seu marido e não serva.

Outro argumento das mulheres menos radicais era a questão da renda familiar, pois,

apenas os salários dos maridos não eram suficientes.

Bertha Lutz foi grande expoente do feminismo mais ameno do início do século

XX, pois, sua principal reivindicação era educação de qualidade e igualitária.

Segundo Macedo, Lutz nasceu em 1894, fez Biologia na França, foi casada e

separou anos depois, lutou pela emancipação da mulher, pelo voto e por direitos

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trabalhistas como a licença maternidade. Em 1919, fundou a Liga para a

Emancipação Intelectual da Mulher, o que em 1922 se tornaria a Federação

Brasileira pelo Progresso Feminino, foi à segunda mulher a trabalhar no setor

público, foi a primeira suplente de deputado federal e participou da elaboração da

Constituição de 1934 que trouxe a igualdade de direitos políticos as mulheres

brasileiras. (MACEDO, 2003: 92)

Maria Lacerda de Moura foi outra importante militante do feminismo no Brasil.

Em 1918, publicou o livro chamado Em Torno da Educação, no qual já expressava

suas ideias de que a libertação da mulher se daria em torno da educação. Lutou

contra os ideais do totalitarismo fascista e do clericalismo. Defendia a mudança do

papel social da mulher, que se restringia a procriação e submissão ao homem. Foi

uma mulher de vanguarda, pois foi grande defensora da igualdade de direitos entre

homens e mulheres. (MACEDO, 2003: 93)

A luta pelo voto se deu neste contexto, mulheres como Lutz e Moura, de

classe burguesa, que tinham influência e prestigio no mundo dos homens, levaram

essas discussões até senadores e deputados. A Liga para Emancipação da Mulher

foi criada com esse intuito, de reunir um pequeno grupo de mulheres da alta

burguesia, que discutiriam questões como o sufrágio feminino, o papel social da

mulher, a educação feminina e outros assuntos ligados à emancipação da mulher

em vários âmbitos. Sobretudo, tentavam uma luta amena, que não atacasse

diretamente as grandes instituições, como a Igreja Católica.

A Liga, criada por Lutz e Moura foi ganhando espaço, e organizando em

vários Estados, reuniões a cerca dos direitos femininos, mais tarde A Liga para

Emancipação da Mulher tornou-se Liga para Emancipação Feminina, que ainda foi

sucedida pela Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que organizou o I

Congresso Internacional Feminista no Rio de Janeiro, em 7 de setembro de 1922, no

qual reuniram grandes lideranças feministas e simpatizantes da causa.

Segundo Macedo, anos mais tarde a luta conseguiu apoio do deputado

Juvenal Lamartine, que foi eleito governador do Estado do Rio Grande do Norte,

após a vitória, Lamartine organizou uma nova legislação, que incluía o direito ao

voto feminino nas eleições estaduais e municipais. A lei vigorou em 25 de outubro de

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1927, uma grande vitória para as feministas do Estado, mas os votos das mulheres

potiguares não foram computados na primeira votação, o que trouxe grande

desapontamento e levou as feministas a formularem o Manifesto Feminista,

declarando os direitos da mulher. (MACEDO, 2003: 98-9)

Em 1930, com o início do governo Vargas, a luta feminista tornou-se mais

difícil, mas a FBPF continuou sua abordagem de aproximação com as instituições de

poder. Tornando-se praticamente um movimento sufragista e não mais um

movimento em prol dos direitos da mulher, a FBPF foi ganhando apoio incluindo da

Igreja Católica, pois declaravam que o voto feminino não feriria as convicções da

Igreja. Com o apoio da Igreja e do Estado, em 24 de fevereiro de 1932 o voto

feminino tornou-se finalmente Lei pelo Decreto número 21.176.

Contudo, após a vitória feminina ao conseguir finalmente o direito de

igualdade política entre homens e mulheres, a luta feminista perdeu força, só

retomada com a segunda onda feminista nos anos 70, esse fenômeno aconteceu

em vários países, a exemplo a Inglaterra, no qual após o Sufrágio, os ânimos se

acalmaram, e os movimentos feministas foram se diluindo até desaparecem em

muitas regiões. Sobretudo, havia muito a alcançar no contexto dos direitos das

mulheres no Brasil, pois, o voto não era suficiente para acabar com a desigualdade

entre os sexos, ou mesmo para mudar o papel social da mulher, portanto, foram

necessários alguns anos de interiorização da sociedade sobre esses novos valores,

essas novas ideias, que de novas não tinham nada, mas que no inconsciente

coletivo foram durante anos repudiadas.

O cinema e sua influência

Do final dos anos 30 até fins dos anos 60 o movimento feminista diminuiu sua

militância, mas os avanços no contexto da mulher continuaram caminhando, a

passos lentos, mas seguindo um caminho importante, de mudanças subjetivas nos

valores sociais. Os temas como divórcio, trabalho e carreira feminina, maternidade,

educação, comportamento e casamento foram sendo abordados com aspectos

diferentes das décadas anteriores. A sociedade passou a conviver com a

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contradição das velhas e novas opiniões e visões sobre esses temas, a música, o

teatro, a moda e o cinema foram importantes propagadores de novas abordagens

sobre esses assuntos. Portanto, é de extrema importância analisar o papel do

cinema hollywoodiano no contexto da abordagem desses temas, para o gradual

avanço da perspectiva da mulher em sociedade.

Nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo durante a primeira metade do

século XX, o cinema foi o principal entretenimento da população.

Em cidades de grande porte, como Rio de Janeiro ou São Paulo, 80% da população frequentava as salas de exibição centrais ou as de bairro pelo menos uma vez por semana. Parte considerável deste grupo consumia materiais midiáticos relacionados a este cinema, fosse por meio de colunas de jornais, de revistas de variedades, de revistas especializadas, ou de álbuns de fotografias. (MENEGUELLO, 1996: 11)

Os cinemas eram elegantes, bem frequentados, era o novo teatro, os

espectadores estavam ali para ver e para serem vistos, mas acima de tudo, o

cinema era a arte do real, expressava desejos, conflitos, amores, geravam opiniões,

reflexões e repúdio a diversos temas. O cinema hollywoodiano foi a grande

preferência, pois, eram filmes feitos para a massa, mas que representavam as

grandes contradições da época, as ideias feministas coexistiam com ideias

extremamente conservadoras, de uma forma ou de outra alguns filmes consagrados,

durante a primeira metade do século XX, abordavam temas como o divórcio, o

desejo pelo trabalho, as mulheres se tornaram personagens centrais das obras, ou

seja, a mente dos brasileiros era constantemente influenciada por esses novos

valores.

As salas de cinema se tornaram locais de sociabilidade e de liberdade, os

jovens encontraram um espaço para namorar, os solteiros buscavam companhia, os

amigos se encontravam. A sociedade cresceu e se modificou em torno das salas de

cinema.

O cinema hollywoodiano no Brasil foi muito consumido e não apenas os

filmes, mas todo universo construído por Hollywood. Os filmes hollywoodianos

tinham um público fiel. A lógica de vida americana, os filmes de faroeste, os dramas,

as comédias, os romances chamavam a atenção de muitos brasileiros.

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Na obra de Meneguello é possível analisar outro modelo hollywoodiano que

fez muito sucesso no Brasil, o Star System, que produzia a vida de seus artistas,

que criava padrões de personalidade, comportamento e vendia nas revistas de

fofocas e especializadas em cinema. Os brasileiros consumiam as histórias sobre

seus artistas preferidos, consumiam os produtos utilizados por eles, como produtos

de beleza, roupas, sapatos, penteados e comidas preferidas. (MENEGUELLO, 1996:

97; 100; 102-3)

A vida, o comportamento, as opiniões sobre diversos assuntos eram

influenciados pelos filmes, pelos comportamentos das atrizes, sobre as vidas fictícias

que viveram e sobre a vida real. O cinema tornou-se uma das artes mais

abrangentes, pois, era consumido em diferentes camadas sociais, e foi

homogeneizando as diferentes sociedades no padrão de vida americano, o american

way of life.

[...]Os filmes retratando o modo de vida americano, os dramas e histórias de amor encarnados pelos artistas favoritos e os seriados de aventura e suspense participaram da formação de um público cativo e profundamente envolvido com as temáticas hollywoodianas em sua estética peculiar. (MENEGUELLO, 1996: 12)

Sobretudo, a análise dos temas que envolvem as contradições sobre a mulher

e seu papel social, seus direitos, seu comportamento, é mais abrangente

observando os filmes que marcaram essas décadas conflitantes.

Sobre os filmes

No filme consagrado em 1939, E o vento levou, do diretor Vitor Flaming, o

papel principal é reservado a uma mulher, a atriz Vivien Leigh, que interpreta a

peculiar Scarlett O’Hara, garota mimada do Sul dos Estados Unidos. O filme é

ambientado nos anos em que ocorre a Guerra Civil Americana entre 1861 e 1865,

mas aborda também os anos prósperos do pós-guerra em que os Estados Unidos

tentam se erguer novamente. Scarlett é uma moça bonita, jovem, elegante e rica,

que se encontra na miséria, quando os homens vão para guerra, e o sul perde.

Apaixonada por um homem que não a ama, Ashley Wilkes, filho do fazendeiro

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vizinho, se casa no inicio do filme com uma garota doce, oposto de Scarlett. Com

seu amor não correspondido, a ganância, coragem e determinação de Scarlett para

enriquecer novamente, ela se casa três vezes, a primeira por ciúmes, segunda por

interesse e terceira por conveniência. Scarlett é uma personagem forte, de

personalidade, que arrisca tudo para conseguir realizar seus desejos, que em muitas

situações não tem remorso de passar por cima de ninguém, e mesmo assim, não é

representada como vilã, mas sim como uma mulher complexa, que com todos os

defeitos, ainda cativa o público e chama a atenção com sua força.

Em Gilda, 1946, a personagem principal, estrelada por Rita Hayworth, dá

nome à obra. O filme criado por Charles Vidor tem como ambientação um Cassino

na Argentina. A obra é produzida em preto e branco, classificando o tipo de filme,

Gilda é considerado um filme Noir, que é caracterizado por filmes policiais, no qual

os personagens tem personalidade ambígua, não são exemplos da moral da época,

são produzidos em preto e branco, normalmente em meios urbanos, com narrativas

niilistas, cheios de paranoia, medo, conflitos morais e éticos, cinismo e

desconfiança. Herança do expressionismo alemão, os filmes Noir fizeram sucesso

durante o pós-guerra. Sobretudo, Gilda é um filme intenso, no qual a mulher está no

centro da obra, caracterizada como mulher fatal, a protagonista se casa com um

figurão argentino. Ao ir morar com seu marido e aproveitar o mundo proibido do

Cassino, ela encontra seu antigo caso, que se tornou braço direito de seu marido

nos negócios, a presença dela incomoda fortemente Johnny, que sofre percebendo

o amor que ainda sente por Gilda, mas que é totalmente proibido, causando-lhes

risco de morte pela traição iminente. Gilda é representada como uma mulher forte,

que brinca com o perigo enganando o marido em seus encontros com outros

homens para fazer ciúmes ao antigo amor, Gilda caminha entre a vanguarda

pretendendo o divórcio, e a submissão, apanhando de seu marido mafioso em

algumas cenas, portanto, Gilda é a representação das contradições de valores

presentes na sociedade do período.

Na Comédia Musical, Ardida como Pimenta, de 1953, a personagem principal

leva fama de durona, Calamity Jane, estrelada por Doris Day, é uma mulher

peculiar, pois, é uma aventureira, que luta com os índios, anda armada, utiliza uma

linguagem masculina e se veste como um Cowboy. A comédia western é

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ambientada no Velho Oeste, retrata a luta por território, dos garimpeiros e Cowboys

da região contra os Índios. Calamity, ao tentar ajudar o amigo, dono do Saloon da

cidade, a encontrar uma cantora famosa para substituir a atração que não apareceu

no bar, e deixou os frequentadores irritados e insatisfeitos, vai á Chicago, onde

encontra a suposta cantora. Sonhando com a fama a camareira da famosa cantora,

se passa por ela, aceita o convite e vai a Deadwood Stage, fazer à apresentação.

Desmascarada, a falsa cantora vai embora, mas Calamity impede o retorno á

Chicago, e a leva para morar com ela. Calamity, então, toma contato, com o mundo

feminino, impressionando a cidade com trajes femininos em uma festa. Calamity se

envolve em um triângulo amoroso, pois sempre foi apaixonada por seu amigo Danny

Gilmartin, que deseja namorar a falsa cantora Katie Brown, agora amiga de

Calamity, logo, a protagonista se vê decepcionada com a amiga e com sua mudança

para agrada-lo, no desenrolar da história ela descobre que o amor estava ao lado, e

que não era necessário à mudança no seu visual e nem no seu comportamento para

encontrar o verdadeiro amor. Calamity muda razoavelmente sua roupa, mas não sua

personalidade. Como personagem central, ela aborda um tema importante na vida

das mulheres, a mudança pelo amor, de forma engraçada leva a reflexão, Calamity

como personagem de personalidade forte, que não desiste de ser quem é, encanta

os espectadores, e deixa claro os problemas com os padrões comportamentais

imposto ás mulheres.

Em Confidências á Meia Noite, a atriz Doris Day interpreta Jan, uma moça de

mais ou menos 30 anos, que mora sozinha, trabalha, tem uma carreira como

decoradora, e que sofre alguns preconceitos por ainda não ser casada. O filme de

Michael Gordon, de 1959, retrata os problemas enfrentados pelas mulheres

modernas do período, que queriam trabalhar, ter uma carreira, mas ainda

alimentavam o sonho do matrimônio. Jan, ao enfrentar problemas em sua linha

telefônica, que era dividida com seu vizinho Brad, um compositor musical, que ficava

pendurado ao telefone com suas namoradas, foi reclamar na companhia telefônica e

sofreu forte descriminação pela reclamação. Jan começa a sair com seu vizinho sem

saber, pois, ele quer conquista-la fingindo ser outra pessoa, um fazendeiro rico, que

conquista a atenção de Jan com galanteios românticos. Durante todo o filme, a

personagem de Jan condena a grosseria do vizinho Brad, e não dá importância as

investidas de um amigo, que aparentemente supre um carinho especial por ela. A

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personagem de Day procura o verdadeiro amor, mas não se importa de permanecer

sozinha, caso não o encontre, pois, não acredita no casamento apenas para ser

bem vista na sociedade nem ao menos para ter uma vida estável, pois o próprio

trabalho já lhe dá. A personagem de Jan representa as mulheres de opinião, que ao

final dos anos 50, já não aceitavam relacionamentos apenas como base do seu

sustento, representa mulheres que ainda acreditavam no casamento, por influência

de uma sociedade patriarcal, mas que já não planejavam suas vidas para o lar.

Divórcio

Sobre o que versa então esse clichê? Usando como fio condutor o próprio discurso difundido pela mídia, em sua banalização e velocidade características, a reportagem da revista Manchete, “Os anos 50, a década do sonho dourado”, começa a responder. Nas fotos, as normalistas do Instituto de Educação fazem ginástica com sainhas, e depois tiram fotos em poses de amizade bem-comportadas. Entrevistados vão desfilando seus relatos sobre a época, ressaltando a autoridade que possuem para falar dela – pois, se afinal estavam lá, é dado ao seu relato o estatuto de verdade, identificando a memória á história. Nesse procedimento, esquece-se de que os entrevistados criam e são produto da criação da imagem de uma época, não possuindo nada que os redima de participar da revitalização dos clichês e de um retrabalhar de imagens e ideias. (MENEGUELLO, 1996: 57)

Observando o fragmento de texto tirado do Livro Poeira de Estrelas, de

Cristina Meneguello, podemos observar que os anos 40 e 50 foram alvo de um

clichê, criado pela mídia e pela memória sobre o período. Logo as Mulheres

“certinhas”, que viviam para a família e para os filhos, não eram uma unanimidade

como as revistas e a memória sobre o período querem demonstrar. Os filmes

descritos acima servem como um parâmetro de que as mulheres eram complexas, e

que temas como o divórcio, um tabu extremamente mal visto no período, segundo o

estudo de Meneguello, eram pensados e debatidos pelas mulheres. Não apenas as

feministas nos anos 20, mas as mulheres que não estavam envolvidas nos

movimentos em prol dos direitos das mulheres, já estavam por dentro destes temas,

tomados como pautas nos filmes e nas revistas.

O divórcio em Gilda e E o vento Levou, são exemplos disso, pois, a

personagem Gilda, cansada de viver um amor proibido e de ser casada com um

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homem que não amava, e que por vezes mostrou-se violento, passou a pensar em ir

para outro país atrás do divórcio e de se ver livre para viver a vida como quisesse e

com quem quisesse. É válido analisar que mulheres, nos países em que o filme foi

reproduzido, que se encontravam na mesma situação que a personagem Gilda,

levantasse a mesma questão que ela. Mulheres que não estavam vivendo este

drama hollywoodiano, provavelmente discutiriam a questão a cerca do divórcio.

Em E o Vento Levou, a personagem Scarlett também passa pela questão da

separação, mas de forma diferente, seu terceiro marido, o vigarista Rhett, cansado

de todos os problemas matrimoniais e de perceber que Scarlett não o ama, rompe o

relacionamento. Sentido a separação, Scarlett procura um jeito de recomeçar e

lembra-se de sua terra, sua fazenda herdada do pai, logo, encontra-se novamente, e

o trabalho, a terra se torna sua nova família. Portanto, pode-se analisar o divórcio,

ou a separação no filme, não apenas como o fim da vida social da mulher, mas sim

como um recomeço, um novo caminho, que não é apenas a vida de esposa que

compõe a complexidade da mulher.

Trabalho e Carreira

O trabalho feminino como já foi observado, começou ainda no final do século

XIX. As mulheres pobres tiveram mais cedo o contato com o universo do trabalho,

pois a renda de seus maridos não era suficiente. Mas o trabalho encarado como

libertador, como um caminho para a emancipação começou a ser levado em

consideração em torno dos anos 20, com as feministas, como Lutz. O cinema como

gerador e difusor de ideias e comportamentos, não deixou de abordar esse tema.

Em E o Vento Levou, a personagem Scarlett é gananciosa, e quando perde toda sua

fortuna por conta da guerra se encontra desesperada, mas mesmo sendo uma

garota mimada, organiza as mulheres da região, e alguns homens que não foram

para a guerra, para trabalharem nas terras de Tara, sua fazenda, pois, estavam

praticamente sem alimentos. Mais tarde, em seu segundo casamento, toma conta de

todo o patrimônio de seu marido e gerencia seus negócios. Scarlett foi retratada no

filme como uma mulher forte, que se reestrutura em qualquer situação, uma mulher

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que trabalha e que mesmo muitas vezes passando por cima da ética, encontra um

caminho para seu sustento e prosperidade.

No filme Ardida como Pimenta, a questão do trabalho também está presente,

a protagonista Calamity, é uma Cowgirl, que aparentemente ganha seu sustento

guerreando contra índios para tomar posse das terras locais. Seu trabalho é

equiparado, no filme, ao dos homens, sem grandes distinções, gerando até a sua

masculinidade, mas Calamity não encontra nenhum problema em manusear armas,

e era extremamente respeitada no mundo masculino no que diz respeito a sua

pontaria.

Mas é no filme Confidências á Meia Noite, que a questão do trabalho é

significativa, na perspectiva de trabalho emancipador, pois, a personagem Jan é

uma moça independente, que trabalha como decoradora e tinha uma vida

confortável. Jan vivia em um prédio bonito, tinha uma empregada doméstica e era

muito competente em seu trabalho. Mas sua postura independente incomodava a

sociedade ao seu redor, como podemos perceber na cena em que ela vai à empresa

de telefonia e é mal tratada pelo atendente por reclamar do seu vizinho namorador.

Uma mulher solteira, beirando os 30, que mora sozinha e não tem namorado era

muito mal vista socialmente. Esta cena fictícia de Jan foi à realidade durante muitas

décadas do século XX, mas que o cinema já questionava.

Maternidade

A História da mulher sempre esteve relacionada à maternidade. Desde os

anos 20, como já foi observado, as feministas lutavam contra o papel social da

mulher de mãe e esposa. Um grande tabu, durante a primeira metade do século XX,

foram às mulheres que não se identificavam com a maternidade.

No filme E o Vento Levou, a protagonista Scarlett conviveu com essa

realidade. Scarlett foi casada três vezes, durante os dois primeiros casamentos, nos

quais ficou viúva, não teve filhos, mas no terceiro casamento com o vigarista Rhett

Butler, teve uma filha e na segunda gravidez perdeu o bebê. Nas cenas em que

Scarlett e Rhett estão com a filha é possível perceber a falta de afinidade dela com a

maternidade, os cuidados e carinhos com a criança são deixados a cargo do pai,

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pois ela não é muito atenciosa ou amável. Quando descobre a segunda gravidez a

protagonista fica enfurecida, questiona o marido o que acontecerá com seu corpo,

culpa o marido e reflete que terá de amamentar novamente e que engordará, mas

seu marido ao contrário fica extremamente feliz com a novidade. No acidente em

que perde o bebê caindo da escada, Scarlett fica triste, mas fica evidente que seu

marido sofreu mais com a notícia. No segundo acidente em que sua filha cai do

cavalo e morre, seu marido beira a insanidade, e não quer ao menos enterrá-la,

Scarlet fica profundamente triste, mas mantém a calma para ajudar o marido.

Mulheres durante toda a história sofreram e porque não dizer que ainda

sofrem por não desejarem a maternidade. Com o filme recorde de bilheteria, E o

Vento Levou em 1939, a sociedade passou a ter contato com esse tema tão

polêmico, que foi sendo assimilado paulatinamente, mas que ainda hoje vemos

reflexos em nossa sociedade.

No filme Confidências á Meia Noite, outro tema polêmico é abordado quase

que subjetivamente, a maternidade fora do matrimônio. A protagonista, Jan, após

ser enganada por seu vizinho Brad descobre que o ama, mesmo com toda a mentira

contada por ele. Quando o casal se une pela primeira vez, a cena quase ao final do

filme mostra Jan grávida, deixando subjetiva a ideia de que os dois se uniram, mas

não oficialmente com o matrimônio, que relevante mesmo é o amor dos dois, logo,

gerou uma criança.

A gravidez fora do casamento foi outro tabu da primeira metade do século XX,

mas que também foi sendo assimilada pela sociedade durante as décadas que se

seguiram, até os anos 70, que com a nova onda do feminismo no Brasil, passou a

ser pauta de reivindicação. Contudo, podemos perceber que a questão da

maternidade fora do casamento, foi se desmistificando, que a sociedade passou a

encará-la com mais naturalidade, e o cinema como um difusor de comportamentos,

certamente influenciou durante as décadas do século XX na diminuição de padrões

morais tão enraizados como esse.

Educação

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A Educação feminina foi outra pauta da luta feminista no Brasil. Segundo Lutz

e Moura, a emancipação da mulher só aconteceria por meio da educação. O Ensino

Básico em meados do século XX apenas existia para famílias de classes mais

abastadas. Com o advento da modernização do Brasil, no governo de Getúlio

Vargas, torna-se necessário inserir a classe popular na escola, pois a nascente

Indústria precisava de mão-de-obra minimamente instruída, precisava, então, de

trabalhadores especializados, de uma educação técnica. A escola pública, gratuita e

laica apenas será pensada por intelectuais do movimento denominado Escola Nova,

que por influência do filósofo estadunidense John Dewey (1859-1952), passou-se a

pensar a educação desligada da pedagogia tradicional, no qual o professor é centro

do ensino-aprendizagem, pois o aluno também está inserido neste processo.

As mulheres, que estavam inserindo-se no mercado de trabalho,

principalmente no setor industrial, foram beneficiadas por essa nova realidade, a

realidade escolar, mas claramente recebendo um ensino tecnicista, como fora

projetado pelo governo vigente. As mulheres da elite já estavam inseridas no

contexto escolar básico e também no ensino superior, como Bertha Lutz, que foi

para Paris estudar Biologia, mas para as mulheres da classe média, a educação

ainda era uma realidade distante, pois, não precisavam trabalhar, e não eram ricas o

suficiente para se graduarem fora do Brasil, e também estavam ainda enraizadas no

papel de mãe e esposa.

No filme Confidências á Meia Noite a protagonista Jan está inserida no

contexto das mulheres instruídas, pois, como decoradora, que mora sozinha e tem

uma carreira já estabelecida, é provável que tenha passado pela escola. Podemos

supor que se a personagem trabalha em uma loja de móveis e decoração, e faz

projetos para diferentes casas, visita os clientes, supostamente deva ter uma boa

dicção, deve ter estudado os modelos de decoração que estavam em voga no

período, e que saiba ler, escrever, interpretar, e que tenha um bom raciocínio lógico.

O mesmo acontece com Scarlett em E o Vento Levou, pois, o filme também

não deixa claro o processo educacional em que a personagem foi inserida, mas

analisando a classe social da personagem e sua habilidade em gerenciar os

negócios de seu segundo marido, podemos perceber que era instruída.

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É correto então analisar que, mulheres que após assistir filmes como os

citados, que desejassem sua emancipação como Jan, ou desejassem a perspicácia

de Scarlett nos negócios, certamente relacionariam a educação como meio para

realizarem seus desejos.

Casamento

Em Poeira de Estrelas, a autora analisa que o casamento é abordado nas

revistas brasileiras como um rumo pros desajustados, como sonho que se realiza

para as moças solteiras, ou seja, como um ideal de vida, mas os filmes retratavam

também o mau casamento, a tristeza da infidelidade e da falta de amor entre os

cônjuges. (MENEGUELLO, 1997: 147-64)

Em Gilda, o casamento da protagonista e o dono do Cassino Ballin Mundson

não era feliz, ela aparentemente não o amava, casou-se para mudar de vida, e ainda

guardava sentimentos por seu ex caso, que tornou-se seu amante. Seu marido com

ciúmes tornou-se violento, transformando sua vida em sofrimento constante.

Em E o Vento Levou, a personagem principal também não foi feliz em seus

casamentos, pois, amava Ashley Wilkes, mas não era correspondida. Quase ao fim

de seu terceiro casamento, Scarlett descobre que já tinha esquecido Ashley e que

gostava de Rhett seu parceiro, mas já era tarde demais.

Más há também retratado nos filmes os amores clássicos, o Happy end, que

não estava necessariamente ligado ao casamento, mas a felicidade, a encontrar o

parceiro certo e seguir a vida.

Em Confidências a Meia Noite, o casal Jan e Brad, depois de toda confusão,

finalmente chegam ao happy end, ficam juntos e não fica claro que oficializaram a

união, mas o amor supera tudo, até mesmo os padrões morais, os preconceitos.

Em Ardida Como Pimenta, o amor chega até Calamity e lhe ensina uma lição,

que não é necessário mudar de vida e/ou personalidade para encontrar o amor, que

quem te ama terá que amar por ser quem é, e não tentar mudá-la.

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O casamento, como todos os aspectos observados, é contraditório. Foi

durante muitos séculos a única realidade feminina, foi idealizado e corria o risco de

ser o martírio de uma vida. Os filmes românticos, com o final feliz entre os casais,

foram muito bem aceitos entre as mulheres brasileiras, que choravam e idealizavam

o casamento perfeito, se de um lado era ruim esse parâmetro tão alto para um

casamento feliz, por outro foi certamente positivo, pois o casamento por amor, a

procura pela felicidade, deixou as mulheres cada vez mais exigentes, procurando o

parceiro perfeito e tornando cada vez mais ultrapassada a ideia do casamento

arranjado.

Contudo, com as mulheres se inserindo no mercado de trabalho, estudando,

tomando o espaço público, observando no cinema que o casamento não é mais

necessário para garantir sua sobrevivência e conforto, que casar por comodidade

pode ser um martírio, que o homem certo deve lhe aceitar e caminhar ao seu lado, a

mentalidade feminina sobre seu papel social, sobre sua realidade, vai mudando e

por consequência mudando lentamente a sociedade.

Considerações Finais

O avanço cultural é muito significativo em qualquer processo de mudança,

mas o avanço se forma em meio a contradições. Sempre existe um período de

transição e este recorte é um deles, é o período de maturação de novos valores.

Trabalhar com cinema que é uma expressão artística e cultural nos permite observar

as contradições, mas também nos permite analisar os avanços, as formas de

abordagens de certos temas, mas devemos levar em consideração que a arte é

subjetiva, que as análises sobre a cultura de determinado período e lugar são

complexas de serem analisadas.

Com os filmes podemos observar como os temas foram sendo retratados,

como o divórcio, que nos filmes analisados, não era retratado necessariamente

como o fim da vida social da mulher, que a educação e a carreira feminina eram

meios para sua emancipação, que a maternidade não era o único futuro feminino,

que existiam mulheres que não desejavam ser mães, que o casamento nem sempre

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era o melhor caminho, que era necessário procurar um parceiro pela afetividade,

pois o casamento para o sustento não era mais necessário.

Mas não podemos afirmar categoricamente que essas abordagens chegaram

a todas as mulheres, e que chegaram da mesma forma, que foram aceitas ou bem

vistas, pois não estamos tratando de política, de certo ou errado, mas sim de

sentimentos, sensações, opiniões e comportamentos, mas podemos analisar que se

o cinema fora tão bem aceito nas sociedades urbanas brasileiras, certamente esses

temas foram abordados, que esses filmes foram assistidos e refletidos por seus

expectadores.

Na década seguinte ao período analisado, as feministas dos anos 70 vão

abordar exatamente estes temas, vão reivindicar direitos, mas principalmente

reivindicar a mudança da mentalidade a cerca da mulher, logo, esse período de 30

anos que antecede o movimento não pode ser ignorado, pois foi ali que o debate

começou não no Congresso, não em passeatas, não em manifestações, mas nos

bares, nas casas, nos cinemas, nas janelas, nas conversas.

Para a História das mentalidades, 94 anos é pouco tempo, logo, ainda

podemos refletir sobre os reflexos desses temas até os dias atuais, pois como foi

observado algumas opiniões não mudaram, alguns comportamentos não se

modificaram, como a questão da mulher que não quer ser mãe, ela ainda é mal vista

e cobrada pela sociedade por um desejo que ela não tem, e não precisamos ir tão

longe para essa análise, pois está na casa do vizinho, no trabalho e até em nós

mesmos.

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