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AULA 002 PRISÃO : FORMALIDADES LEGAIS PARA A MATERIALIZAÇÃO DO ATO A) COMUNICAÇÃO DA PRISÃO: A lei 11.449/07 encerrou debate doutrinário e jurisprudencial sobre o prazo para a lavratura da prisão em flagrante e determinou, com a alteração do art. 306 do CPP a obrigatoriedade de comunicação, no prazo de 24 horas: 1. do Juiz , 2. aos familiares do preso, 3. Ao advogado do preso, ou não declinando um à Defensoria Pública. Em relação à comunicação à Defensoria Pública surge o questionamento se a omissão por parte da autoridade policial de tal determinação acarretaria em nulidade do Auto de Prisão em Flagrante? A jurisprudência informa que: RHC 200900434713 RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS - 25633 Relator(a) FELIX FISCHER STJ QUINTA TURMA DJE DATA:14/09/2009 PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE. COMUNICAÇÃO TARDIA. MERA IRREGULARIDADE. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. I - Na linha de precedentes desta Corte, não há que se falar em vício formal na lavratura do auto de prisão em flagrante se sua comunicação, mesmo tendo ocorrida a destempo da regra prevista no art. 306, § 1º, do Código de Processo Penal, foi feita em lapso temporal que está dentro dos limites da razoabilidade (precedentes). B) DA PRISÃO EM DOMICÍLIO: A regra constitucional da inviolabilidade do domicílio ( Art. 5º XI) excepciona a garantia nas hipóteses de socorro aos moradores, prisão em flagrante, e durante o dia em cumprimento de ordem judicial, daí a necessidade de conciliar o tratamento do Código com a disposição constitucional. Assim a prisão por mandado judicial, salvo consentimento expresso do morador( seja ele ou não a pessoa aprisionada) somente pode realizar-se durante o dia . Prevalece na doutrina o conceito de dia como sendo o período entre as 06 horas da manhã e as 18 horas da noite( Ex. TOURINHO FILHO), independente da condições de presença ou não de sol nesses horários. A segunda, adotada pelos Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, dia é o período que vai da aurora ao crepúsculo. Essa segunda teoria adota o critério da luminosidade natural. Por fim, Alexandre de Moraes traz uma terceira teoria. Trata-se um híbrido entre a primeira e a segunda teorias. Para ele, dia é o período que vai das 6h às 18h, podendo ultrapassar este período em caso de ainda permanecer a luminosidade natural.

Aula 02 formalidades da prisão

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Page 1: Aula 02 formalidades da prisão

AULA 002 – PRISÃO : FORMALIDADES LEGAIS PARA A MATERIALIZAÇÃO DO ATO

A) COMUNICAÇÃO DA PRISÃO: A lei 11.449/07 encerrou debate doutrinário e jurisprudencial

sobre o prazo para a lavratura da prisão em flagrante e determinou, com a alteração do art.

306 do CPP a obrigatoriedade de comunicação, no prazo de 24 horas:

1. do Juiz , 2. aos familiares do preso, 3. Ao advogado do preso, ou não declinando um à

Defensoria Pública.

Em relação à comunicação à Defensoria Pública surge o questionamento se a omissão por

parte da autoridade policial de tal determinação acarretaria em nulidade do Auto de Prisão em

Flagrante?

A jurisprudência informa que:

RHC 200900434713

RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS - 25633

Relator(a) FELIX FISCHER

STJ

QUINTA TURMA

DJE DATA:14/09/2009

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE

ENTORPECENTES. NULIDADE DO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE. COMUNICAÇÃO TARDIA.

MERA IRREGULARIDADE. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. I - Na linha de precedentes desta

Corte, não há que se falar em vício formal na lavratura do auto de prisão em flagrante se sua

comunicação, mesmo tendo ocorrida a destempo da regra prevista no art. 306, § 1º, do Código

de Processo Penal, foi feita em lapso temporal que está dentro dos limites da razoabilidade

(precedentes).

B) DA PRISÃO EM DOMICÍLIO: A regra constitucional da inviolabilidade do domicílio ( Art. 5º

XI) excepciona a garantia nas hipóteses de socorro aos moradores, prisão em flagrante, e

durante o dia em cumprimento de ordem judicial, daí a necessidade de conciliar o tratamento

do Código com a disposição constitucional.

Assim a prisão por mandado judicial, salvo consentimento expresso do morador( seja

ele ou não a pessoa aprisionada) somente pode realizar-se durante o dia . Prevalece na

doutrina o conceito de dia como sendo o período entre as 06 horas da manhã e as 18 horas da

noite( Ex. TOURINHO FILHO), independente da condições de presença ou não de sol nesses

horários. A segunda, adotada pelos Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, dia é o período

que vai da aurora ao crepúsculo. Essa segunda teoria adota o critério da luminosidade natural.

Por fim, Alexandre de Moraes traz uma terceira teoria. Trata-se um híbrido entre a primeira e

a segunda teorias. Para ele, dia é o período que vai das 6h às 18h, podendo ultrapassar este

período em caso de ainda permanecer a luminosidade natural.

Page 2: Aula 02 formalidades da prisão

E há corrente que entende como dia o horário fixado pelo art. 172 do CPC , ou seja,

das 06 da manhã ás 20 da noite(TRF2 - EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE: ENUL 5553

RJ 2003.51.13.000688-8).

À noite, em não consentindo o morador, e não ocorrendo situação de flagrante delito

no interior da residência, o executor deve proceder na forma do art. 293 do CPP.

A parte inserida nas divisões da propriedade, tais como jardins, garagem etc.,

encontram-se protegidas pelo art. 5º, XI da CRFB/88.

O vocábulo morador, a seu turno, também deve ser esclarecida. A proteção não se

restringe ao proprietário. Em se tratando de locatário, o locador não pode, ainda que detenha

a posse de chave reserva, autorizar à autoridade policial adentrar no domicílio sem

consentimento daquele.

Mais ainda, quando se trata de mais de um titular, a palavra final sobre a possibilidade

de ingresso no domicílio é do chefe da casa, lembrando que pode ser tanto o homem quanto a

mulher, em conformidade com a igualdade de gênero prevista no art. 5º, I, e no art. 226 § 5º,

ambos da CRFB/88. Neste caso, caso haja divergência entre o marido e a esposa, ensina o

saudoso Nelson Hungria, que o desempate é a favor da proibição de ingresso.

O conceito de domicílio/residência é um conceito legal oferecido pelo art. 150, § 4º do

CPB:

§ 4º - A expressão "casa" compreende: I - qualquer compartimento habitado; II - aposento ocupado de habitação coletiva; III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. § 5º - Não se compreendem na expressão "casa": I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do n.º II do parágrafo anterior; II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Lembrar que o STF ratificou que, salvo em caso de flagrante delito, os quartos de

estabelecimentos de ocupação coletiva ( hotéis, motéis etc.) enquanto ocupados estão

cobertos pela inviolabilidade do domicílio.

Processo

RHC 90376

RHC - RECURSO EM HABEAS CORPUS

Relator(a)

Page 3: Aula 02 formalidades da prisão

CELSO DE MELLO

Sigla do órgão

STF

- Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o

conceito normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer aposento de

habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa

específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. - Sem que ocorra

qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5º,

XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito ("invito domino"),

ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva,

sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível,

porque impregnada de ilicitude originária. Doutrina. Precedentes (STF).

C) USO DE FORÇA: A regra do art. 284 do CPP é que o uso de força nas prisão sempre deve ser

a exceção e jamais a regra. O recurso da força deve sendo condicionada pela

necessidade/proporcionalidade devendo ser aplicada somente para vencer eventual

resistência ou eventual tentativa de fuga, mesmo que decorrente de ação de terceiros, CSA em

que deve ser lavrado o correspondente auto de resistência( CPP art. 292).

Nessa linha, o uso de armas de potencial letal deve ser também interpretado como

exceção e não como regra, devendo ser sempre a ultima ratio do agente público para vencer a

resistência, sob pena de configurar-se em crime doloso contra a vida.

D) FORMALIDADES NA PRISÃO POR MANDADO: Na prisão por mandado, além dos seus

requisitos de validade existem as formalidades do art. 286 , 288 291 do CPP.

Discute a doutrina sobre a recepção do art. 287 do CPP que admite a prisão sem a exibição do

mandado no caso de crimes afiançáveis. Na verdade o referido dispositivo deve ser entendido

como não recepcionado pela CF de 1988 já que incompatível com o sistema de garantias nele

fixado pois como admitir-se uma prisão sem flagrante e sem a comprovação da ordem escrita?

Não seria isso um retorno a “prisão para averiguações” sepultada pelo Regime de 1988?

A prisão por mandado pode ainda ser realizada por carta precatória e em casos de urgência

por telegrama, situação que por interpretação extensiva também deve contemplar as

modernas formas de comunicação( fac símile e meios digitais devidamente certificados).

E) PRISÃO EM PERSEGUIÇÃO: Segundo Pacceli, “a perseguição, sobretudo para fins de

preservação da situação de flagrante, ocorrerá quanto o agente policial( ou terceiro, no

flagrante), tendo avisado o réu( ou indiciado ou suposto autor do fato) sem interrupção da

diligência.” ( CPP art. 290). Se tem como interrompida a diligência com se encerram as buscas

e não quando se perde o agente de vista, enquanto a autoridade policial permanecer no

encalço do agente persistirá a situação de perseguição, que poderá inclusive ultrapassar os

limites de atuação da autoridade, caso em que efetuada a prisão, será o preso encaminhado à

autoridade local que providenciará a remoção daquele.

Page 4: Aula 02 formalidades da prisão

F) PRISÃO SEM AS FORMALIDADE LEGAIS: A realização de prisão sem as formalidades legais,

além de efeitos processuais, como o relaxamento da prisão ilegal( p. ex., por falta de

comunicação à autoridade judiciária), além da responsabilidade civil do Estado, administrativa

e penal do Agente Público responsável pela ilegalidade nos termos da Lei 4.898/65.

G) PRISÃO ESPECIAL: O art. 295 do CPP faz referência à figura da chamada prisão especial,

inicialmente prevista para os portadores de curso superior e determinadas autoridades, mas

que com o passar do tempo foi sendo ampliada para abarcar professores, sindicalistas,

religiosos e etc.

Importante lembrar que, ressalvado o art. 84, § 2º da LEP, a prisão especial limita-se ao

período de custódia cautelar do agente não sendo aplicável ao cumprimento da pena corporal.

A prisão especial na verdade representa odiosa discriminação já que reserva

tratamento especial a determinada camada da população, sem que haja qualquer critério

válido para tal diferenciação.

Do ponto de vista da criminologia crítica a afirmação que resulta da prisão especial é

que ele dá continuidade no ambiente prisional à diferença de classes que impera no Brasil. É

como se firmasse: “não me misturo com esse tipo de gente na rua, não será no cárcere que

me misturarei”, ou seja, as prisões superlotadas, fétidas ponde a degeneração impera devem

ser reservadas as classes sociais menos favorecidas, ao passo que os melhores espaços são

preservados para as classes ditas superiores.

Mesmo após a lei 1-.258/2001 o sistema ainda continua discriminatório, posto que as

circunstâncias garantidoras do privilégio foram mantidos, limitando-se a lei a fixar as regras de

cumprimento da prisão especial:

a) a prisão especial consistirá exclusivamente no recolhimento em local distinto da

prisão comum( §1º), ou seja, a regra é a existência de estabelecimentos penais

diversos para os presos provisórios comuns e o especiais.

b) Na ausência desses estabelecimentos os presos serão mantidos em celas

separadas dos demais presos, ditos comuns;

c) Os direitos e deveres do preso “especial” são os mesmos do preso comum

Mas existem ainda situações especiais, previstas em leis própria que garantem prisão

especialíssima a determinados sujeitos, como Magistrados( LC 35/79) membros do Ministério

Público( LC 75/93 e Lei 8.625/93), e Advogados( limitada a prerrogativa a prisões relacionadas

com o exercício da advocacia- Lei 8.906/96) aos quais é garantido a prisão especial em “Sala de

Estado Maior”, que é definida pelo STF como sendo:

Rcl 4713 Rcl – RECLAMAÇÃO Relator(a) RICARDO LEWANDOWSKI

STF

Page 5: Aula 02 formalidades da prisão

- Acórdãos citados: ADI 1127, Rcl 2665 AgR, Rcl 4535, HC 81632 (RTJ 184/640), HC 91089.

Número de páginas: 21 Análise: 28/03/2008, FMN. ..DSC_PROCEDENCIA_GEOGRAFICA: SC -

SANTA CATARINA

Ementa

EMENTA: RECLAMAÇÃO. PROCESSO PENAL. PRISÃO DE ADVOGADO. RECOLHIMENTO EM

DEPENDÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO DO STF NA ADI 1.127.

INOCORRÊNCIA. ENTENDIMENTO DA EXPRESSÃO "SALA DE ESTADO MAIOR" CONTIDA NA LEI

8.906/94. RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE. I - O Supremo Tribunal Federal estabeleceu que é

constitucional a prerrogativa de o advogado ser preso em sala de Estado Maior até o trânsito

em julgado da condenação. II - A prisão de profissional inscrito na Ordem dos Advogados do

Brasil em dependência da Polícia Militar não desafia o decidido por esta Corte. III - A expressão

"sala de Estado Maior" deve ser interpretada como sendo uma dependência em

estabelecimento castrense, sem grades, com instalações condignas. IV - O preceito legal que

confere aos advogados o direito à prisão especial, antes do trânsito em julgado da

condenação, não desnatura o caráter da medida, que representa uma restrição à liberdade de

locomoção, ainda que em condições diferenciadas dos demais presos. V - Reclamação cujo

alcance não pode ser ampliado, sob pena de transformá-la em verdadeiro sucedâneo do

recurso de apelação, ajuizada diretamente perante a Suprema Corte. VI - Reclamação julgada

improcedente.

H) O USO DE ALGEMAS: A LEP em 1984 já dispunha que “Art. 199. O emprego de algemas será

disciplinado por decreto federal.”, contudo tal disposição jamais foi regulamentada pelas

autoridades federais o que sempre deixou um vácuo normativo sobre o uso de algemas no

Brasil.

Uma das poucas diretrizes normativas era o art. 242 § 2º do CPPM:

Art. 234...

Emprego de algemas

1º O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de

agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o art.

242.

Posteriormente o art. 474, § 3º do CPP, alterado pela Lei 11.689/08, limitou no Tribunal do Júri

uso do referido instrumento, condicionando-o à necessidade da medida:

Art. 474. ....

§ 3o Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que

permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à

segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes. (Incluído pela Lei

nº 11.689, de 2008)

No vazio normativo o Judiciário foi chamado , sendo editada pelo STF a Súmula Vinculante 11:

Page 6: Aula 02 formalidades da prisão

Súmula Vinculante 11

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo

à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a

excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do

agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem

prejuízo da responsabilidade civil do Estado.