24
Estruturas de Gestão Pública Instituto Serzedello Corrêa Aula 5 Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União Março, 2012

Estruturas de gestao_publica_aula_5

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Curso de estruturas de gestão pública, EAD oferecido pelo Tribunal de Contas da União

Citation preview

Page 1: Estruturas de gestao_publica_aula_5

Estruturas de Gestão Pública

Instituto Serzedello Corrêa

Aula 5

Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Março, 2012

Page 2: Estruturas de gestao_publica_aula_5

RESPONSABILIDADE PELO CONTEÚDO

Tribunal de Contas da União

Secretaria Geral da Presidência

Instituto Serzedello Corrêa

2ª Diretoria de Desenvolvimento de Competências

Serviço de Planejamento e Projetos Educacionais

CONTEUDISTA

José Arimathea Valente Neto

TRATAMENTO PEDAGÓGICO

Violeta Maria dos Santos Galvão

RESPONSABILIDADE EDITORIAL

Tribunal de Contas da União

Secretaria Geral da Presidência

Instituto Serzedello Corrêa

Centro de Documentação

Editora do TCU

PROJETO GRÁFICO

Ismael Soares Miguel

Paulo Prudêncio Soares Brandão Filho

Bianca Novais Queiroz

DIAGRAMAÇÃO

Herson Freitas

Cláudio Holanda

Paulo Arthur C. Alves

Brasil. Tribunal de Contas da União. Estruturas de gestão pública : Aula 5 : atuação do TCU e

sua relação com os poderes da União - 2.ed. / Tribunal de Contas da União. – Brasília : TCU, Instituto Serzedello Corrêa, 2012.

24 p.

1. Administração pública, estudo e ensino. 2. Tribunal de Contas da União. I. Título.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Ministro Ruben Rosa

© Copyright 2012, Tribunal de Contas de União <www.tcu.gov.br>

Permite-se a reprodução desta publicação, em parte ou no todo, sem alteração do conteúdo, desde que citada a fonte e sem fins comerciais.

Page 3: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 3 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Até aqui, vimos que o Estado cria diversas estruturas e descentraliza várias atividades para melhor cumprir os deveres impostos pela Constituição Federal de 1988.

Nesse contexto, também vimos os sistemas que integram o Ciclo de Gestão dos recursos públicos federais, bem como as características do Estado Regulador.

Vista toda estrutura da máquina administrativa federal, vamos agora conhecer as formas de controle que o TCU exerce sobre as atividades estatais e as atividades descentralizadas.

Qual é a posição do TCU no contexto do Estado brasileiro e como ele se relaciona com os outros órgãos?

Até onde essa posição influencia na fiscalização a ser exercida pelo TCU?

Quando se aplicam as fiscalizações do Tribunal?

Para responder a essas questões, precisamos situar o TCU na organização do Estado e conhecer suas principais competências.

Page 4: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 4 ] Estruturas de Gestão Pública

Ao final dos estudos desta unidade, esperamos que você tenha condições de:

Identificar o TCU no contexto do Estado Brasileiro e dos Poderes da União;

Relacionar as competências do TCU, de acordo com a CF/88, sua Lei Orgânica e seu Regimento Interno;

Identificar limites do controle feito pelo TCU sobre as atividades descentralizadas a outros entes públicos e organizações privadas.

Módulo 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União ..................... 31. Introdução .................................................................................................................................... 52. Posição do TCU na organização do Estado brasileiro................................................ 53. Jurisdição do TCU ...................................................................................................................... 6

3.1 Princípio da independência das instâncias ............................................................ 74. Natureza do controle exercido pelo TCU ........................................................................ 85. Limites ao controle exercido pelo TCU ......................................................................... 13

5.1 Fiscalização das empresas estatais ....................................................................... 145.2 Fiscalização de atos realizados por advogados ................................................ 155.3 Fiscalização das transferências ............................................................................... 165.4 Fiscalização de obras públicas ................................................................................ 175.5 Fiscalização das privatizações, concessões, permissões e autorizações 195.6 Fiscalização das agências reguladoras .................................................................. 205.7 Fiscalização das entidades paraestatais ............................................................... 21

Síntese ............................................................................................................................................. 23

A fim de facilitar o estudo, essa unidade está organizada da seguinte forma:

Page 5: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 5 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

As competências

constitucionais privativas

do TCU constam dos artigos

71 a 74 e 61 da CF.

1. Introdução

Segundo o art. 71 da CF, cabe ao TCU auxiliar o Congresso Nacional no exercício do controle externo da Administração Pública Federal.

É certo que o controle a ser exercido sobre um órgão da Administração Pública é bem mais rigoroso que o exercido sobre uma entidade privada que atua em cooperação com o Estado. Mas até onde vão essas diferenças? E até que ponto elas se justificam?

Antes de estudarmos os controles exercidos pelo Tribunal, vamos situá-lo no contexto da organização do Estado brasileiro, para entendermos como ele interage com os órgãos e entidades de todos os Poderes.

A partir daí, exemplificaremos algumas das competências do TCU, estabelecidas na CF, em sua Lei Orgânica e em seu Regimento Interno.

Com base nessas competências, delimitaremos as atribuições do TCU de acordo com a unidade a ser fiscalizada, mencionando os entendimentos da doutrina e da jurisprudência (inclusive do próprio TCU) sobre a sua competência para controlar certas entidades.

2. Posição do TCU na organização do Estado brasileiro

O TCU pertence a algum dos Poderes da União?Ele é subordinado a algum outro órgão?

O modelo de controle externo brasileiro apresenta algumas particularidades, em relação ao estabelecido nos outros países da América Latina.

No Brasil, o Tribunal de Contas da União é vinculado ao Poder Legislativo, pelo menos em termos orçamentários e financeiros. Esse vínculo tem origem constitucional, pois a Constituição Federal de 1988 conferiu ao TCU o papel de auxiliar o Congresso Nacional no exercício do controle externo.

Entretanto, tem de ficar claro que o TCU é órgão autônomo. Não é subordinado a nenhum outro órgão dos Poderes da União, nem mesmo ao Congresso Nacional. Atua em colaboração com os outros órgãos e Poderes do Estado, e suas competências, previstas constitucionalmente, são próprias e privativas.

Page 6: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 6 ] Estruturas de Gestão Pública

O modelo brasileiro de controle externo apresenta algumas aparentes peculiaridades, como por exemplo:

apesar de ser vinculado ao Legislativo, o TCU segue normas pertinentes ao processo administrativo (e não ao processo legislativo) e consubstancia-se em um órgão administrativo, o que o faz assemelhar-se aos órgãos do Poder Executivo.

embora o TCU siga normas pertinentes ao processo administrativo, obedece, primeiramente, às normas processuais estabelecidas no seu Regimento Interno (RI/TCU). As outras normas processuais, como as do processo administrativo (Lei 9.784/1999) e o Código Processual Civil, aplicam-se apenas subsidiariamente ao TCU, conforme o art. 298 do RI/TCU.

apesar de o TCU ser composto por ministros e julgar contas dos gestores públicos, ele não pertence ao Poder Judiciário e, por conseguinte, suas decisões não têm autoridade de coisa julgada, pois são consideradas decisões administrativas.

Esse ponto gera fragilidades no sistema de controle externo. Por exemplo, uma auditoria realizada pelo TCU em alguns casos pode levar anos para ser concluída, devido às análises a efetuar e aos regramentos do processo a observar (contraditório, ampla defesa, prazos, etc.). Após todo esse processo, essa auditoria pode ser simplesmente anulada pelo Judiciário.

Espera-se que o Supremo Tribunal Federal - órgão competente para julgar questões envolvendo as decisões do TCU – aja com cautela ao anular uma decisão do Tribunal de Contas da União, mesmo que seja com base na estrita observância da legalidade, pois anos e anos de trabalho podem ser perdidos com a decisão do Judiciário. Além disso, o TCU possui corpo técnico capacitado e especializado para analisar as questões envolvendo o controle externo dos recursos públicos federais e, por isso, suas decisões tratam do tema com bastante propriedade.

3. Jurisdição do TCU

Há, na doutrina, extrema divergência acerca da jurisdição dos Tribunais de Contas: uma parte nega a sua existência e outra a afirma e delimita.

Afinal, o TCU possui ou não jurisdição?

A corrente que nega a existência de jurisdição dos Tribunais de Contas entende que a atividade judicante no Brasil é exclusiva dos órgãos do Poder Judiciário, pois somente esses podem proferir decisões definitivas e imutáveis. Nesse sentido, o TCU seria órgão técnico, e não jurisdicional.

Os processos do TCU

obedecem às normas do

seu Regimento Interno. As

outras normas processuais

aplicam-se apenas

subsidiariamente e desde

que compatíveis com a Lei

Orgânica do Tribunal.

Jurisdição: poder de

aplicar o Direito ao caso

concreto, para solucionar

conflitos e resguardar a

autoridade da lei.

Page 7: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 7 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

De outro modo, parte da doutrina considera o termo “jurisdição” adequado às atividades desenvolvidas pelo TCU, pois este, ao proceder ao julgamento das contas, decide sobre a regularidade ou irregularidade de modo soberano, privativo, indelegável e definitivo.

Assim, mesmo que as decisões tenham caráter administrativo, o Tribunal exerce um poder jurisdicional administrativo, com amparo na própria CF, que preceitua, em seu art. 73, que o TCU tem “jurisdição em todo o território nacional”.

Na mesma linha, a Lei 8.443/92 (Lei Orgânica do TCU – LO/TCU), em seu art. 4º, define que o TCU tem “jurisdição própria e privativa, em todo o território nacional, sobre as pessoas e matérias sujeitas à sua competência”. Regra geral: estão sob jurisdição do TCU aqueles que administram, sob qualquer forma, recursos públicos federais

Para saber mais sobre as pessoas sujeitas à jurisdição do TCU, consulte o art. 5º da Lei 8.443/92 e o art. 5º do Regimento Interno do Tribunal. (http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2417477.PDF).

Mesmo que a atividade jurisdicional não possa ser afastada, segundo o art. 5º, XXXV, da CF, o Poder Judiciário apenas pode rever a legalidade das decisões do TCU, sem, no entanto, alterar-lhes o mérito.

Por exemplo, se o TCU julgou determinada conta irregular, os órgãos do Poder Judiciário podem anular a decisão, diante de eventual ilegalidade – suponhamos, inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa  –, e tirar a validade da decisão do TCU. Porém, os órgãos do Judiciário não podem considerar a decisão do TCU legal e transmutar o julgamento da conta para regular, pois o juízo de mérito (contas regulares, regulares com ressalva ou irregulares) é privativo do TCU. Assim, cabe ao Judiciário apenas manter ou anular a decisão do TCU, mas nunca mudar o mérito do julgamento das contas.

3.1 Princípio da independência das instâncias

Um ponto importante a ser ressaltado é a vigência, no Brasil, do princípio da independência das instâncias, pelo qual, via de regra, as decisões tomadas nos âmbitos administrativo, civil e penal não interferem umas nas outras.

As decisões do TCU

são, quanto ao mérito,

soberanas, privativas, indelegáveis e definitivas.

Page 8: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 8 ] Estruturas de Gestão Pública

A única exceção é o âmbito penal, cuja decisão pode afetar as outras instâncias, quando reconhecer a inexistência material do fato ou a negativa de autoria.

Para exemplificar, suponhamos que uma sentença criminal afirme que não houve o fato (roubo de computador, por exemplo), e que nenhuma responsabilidade pode ser atribuída a qualquer agente (inexistência material). De modo semelhante, se uma setença criminal afirmar que o autor de determinado crime não foi fulano, não cabe às outras instâncias tentar condenar a mesma pessoa (negativa de autoria).

A razão de ser dessa interferência é que impera, no juízo criminal, a busca da verdade material. No juízo civil, há a busca da verdade formal (o juiz decide somente de acordo com os elementos que as partes trouxeram aos autos).

Apesar de haver busca da verdade material também no âmbito administrativo, as averiguações efetuadas no âmbito criminal são muito mais intensas, pois delas podem advir duras penas para os condenados, inclusive a pena de restrição da liberdade. Por isso, as decisões do âmbito penal devem ser respeitadas pelas outras instâncias.

Assim, a decisão penal interfere no resultado final das decisões do TCU. Nesse contexto, uma decisão penal de inexistência material ou de negativa de autoria impede uma eventual condenação pelo TCU.

4. Natureza do controle exercido pelo TCU

Segundo o art. 70 da CF, as fiscalizações inerentes ao controle externo compreendem três aspectos: legalidade, legitimidade, economicidade.

De acordo com parte da doutrina, como Maria Sylvia Zanella Di Pietro, esses aspectos, principalmente a economicidade, permitem ao TCU realizar análise de mérito da atividade administrativa, na medida em que seria possível analisar a conveniência e a oportunidade da adoção do ato. Como veremos, esse posicionamento é polêmico, pois:

O controle de legalidade é, meramente, a verificação do cumprimento dos textos legais.

O controle de legitimidade, por sua vez, é a verificação da plena observância do ordenamento jurídico vigente. Verifica-se a obediência aos normativos e, principalmente, à CF e aos

Verdade material: busca-se averiguar os

fatos na sua completude,

independentemente

do que está alegado e

comprovado no processo.

Verdade formal: analisam-se os fatos de

acordo somente com

o que está alegado e

comprovado no processo.

Page 9: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 9 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

princípios públicos. De forma genérica, analisa-se a observância dos gastos relativamente ao interesse público.

O controle de economicidade permite verificar se estamos gastando o mínimo possível para atingir determinado objetivo. Para Di Pietro, esse aspecto seria subdividido em efetividade, eficácia e eficiência.

No entanto, o TCU entende que são todos aspectos diferentes:

Dispêndio do mínimo possível para se atingir determinado objetivo sem comprometimento da qualidade.

Relação entre a quantidade de produtos gerados com os custos relativos (mais produtos, mais eficiente o processo).

Grau de alcance das metas pré-estabelecidas.

Grau de impactos observados na sociedade.

Economicidade

Eficiência

Eficácia

Efetividade

TCU

No exercício da fiscalização, o TCU pode avaliar todos estes aspectos da atividade administrativa. A figura abaixo, uma adaptação da contida no documento ISSAI 3000/1.4 da Intosai, exemplifica claramente esses aspectos:

Diagrama de Insumo-produto

Compromisso(objetivos definidos)

Insumo(recursosalocados)

Ação/Produção(ações

desenvolvidas)

Produto(bens e

serviçosprovidos)

Resultados(objetivosatingidos)

Efetividade

Economicidade

EficiênciaEficácia

Intosai: sigla em inglês

para Organização

Internacional de Entidades

Fiscalizadoras Superiores,

da qual o TCU faz parte. A

Intosai elabora diretrizes,

como a ISSAI 3000, para

que o controle seja

exercido com excelência.

Diagrama de Insumo-produto

Page 10: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 10 ] Estruturas de Gestão Pública

Por exemplo, suponhamos um programa de vacinação. Os aspectos e processos relacionados poderiam ser assim analisados:

economicidade: comprou-se a vacina, de qualidade atestada, mais barata?

eficiência: as vacinas adquiridas permitiram imunizar um bom número de pessoas?

eficácia: o número de pessoas imunizadas foi igual ao planejado?efetividade: a população foi realmente imunizada, diminuindo

a incidência da doença?

Certamente, há algum grau de subjetividade na análise desses princípios, o que poderia suscitar a hipótese de ingerência no mérito da atividade administrativa (poder de decidir a conveniência e a oportunidade de se adotar certo ato).

Por exemplo, o gestor pode alegar que é eficiente um lote de vacinas que permite imunizar 1.000 pessoas, ao passo que o TCU pode entender que esse lote somente seria eficiente se imunizasse 1.200. De modo semelhante, para alguns o programa de vacinação teria efetividade se diminuísse a incidência da doença em 50%, ao passo que para o TCU deveria ser de 70%.

É lógico que o TCU leva em conta estudos e evidências para fazer as suas análises, mas nada impede que o gestor disponibilize informações sobre o caso concreto, de modo que as condições façam a percepção do TCU sobre a efetividade de vacinações passar, naquele caso, de 70% para 50%.

Assim, a primeira constatação que temos é que o TCU não faz suas análises baseado somente no que ele “acha” que é o correto. O Tribunal utiliza critérios técnicos, como estudos, casos concretos semelhantes de outras localidades (outros países, por exemplo), entre outros. Mesmo assim, o administrador sempre pode comprovar que, para aquele caso concreto, os critérios técnicos do TCU não podem ser plenamente aplicados, devido a algumas peculiaridades.

Voltemos, agora, ao exemplo da vacinação. Suponhamos que o órgão tenha comprado lotes da vacina A por R$ 1.000,00, sendo que há no mercado a vacina B por R$ 800,00, que age sobre a mesma doença.

Por um lado, se o administrador não possuir argumentos para comprovar a razão da escolha mais cara, a situação será antieconômica, ou seja, ilegítima. Aqui, cabe a atuação do TCU, pois o princípio da economicidade não foi atendido.

Page 11: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 11 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Por outro, se o administrador comprovar que a vacina B, apesar de ser 20% mais barata, tem capacidade de imunização 20% menor que a vacina A, a situação estará atendendo todos os princípios, pois nem sempre o que é mais barato é mais econômico. Nesse caso, não cabe a atuação do TCU, pois uma vacina é mais barata mas imuniza proporcionalmente menos, ao passo que a outra é mais cara mas imuniza mais. Qualquer das duas situações estaria atendendo plenamente os princípios públicos (economicidade, eficiência, eficácia e efetividade).

Assim, a segunda constatação é que só haveria análise de mérito se, ao constatar duas situações que atendessem plenamente todos esses princípios (bem como os outros princípios públicos em geral, como proporcionalidade e razoabilidade), o TCU determinasse ao órgão ou à entidade fiscalizada a adoção de uma situação, em detrimento da outra.

Se a situação encontrada não satisfaz algum desses princípios, a situação será, ao fim, ilegítima, pois não atende plenamente o interesse público, já que as ações poderiam ser executadas de forma mais “correta”.

Em resumo, podemos refutar a análise de mérito pelo TCU sob dois aspectos:

o TCU sempre observa critérios técnicos em seus julgamentos, os quais, todavia, sempre poderão ser afastados pelos argumentos do administrador, no caso concreto;

o TCU, quando se depara com duas situações que igualmente atendem às leis e aos princípios públicos, não determina ao administrador a adoção de uma em detrimento da outra.

Mesmo nos trabalhos em que o julgamento carrega alguma carga de subjetividade, o Tribunal observa o atendimento dos princípios públicos, seja os que medem o desempenho (economicidade, efetividade, eficiência e eficácia), seja os que medem a atividade sob o senso considerado comum (proporcionalidade e razoabilidade).

Por isso, via de regra, quando o Tribunal realiza auditorias operacionais (para medir o desempenho) e não encontra situações absurdas, ele emite apenas recomendações, para que o gestor, sob seu juízo discricionário, defina a melhor forma de realizar as atividades atendendo plenamente os princípios públicos.

Por exemplo, se o TCU, ao realizar uma auditoria para medir o desempenho das escolas de determinada região, constata que a merenda escolar é estocada sem a observância mínima das normas de higiene

Page 12: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 12 ] Estruturas de Gestão Pública

sanitária (situação absurda, pois além de provocar o desperdício, compromete a saúde dos alunos), pode determinar ao órgão responsável que adote imediatas providências para o saneamento da situação, em vez de expedir recomendação.

De todo modo, verifica-se que a atuação do TCU é abrangente, engloba os mais diversos aspectos e pode chegar, até certo ponto, a analisar a atuação administrativa com algum grau de subjetividade, sem adentrar ao mérito propriamente dito.

Resumindo, a Constituição Federal e legislação infraconstitucional conferem ao TCU as seguintes atribuições:

Atribuições do TCU Exemplos

Opinativa ou consultiva: elaboração de parecer prévio às contas de Governo e resposta a consulta formulada por autoridade competente.

Esclarecer ao consulente que: o emprego da tecnologia SISCOPEN não está vedado pela jurisprudência do TCU, desde que atendidas as seguintes condições (Acórdão 1.814/2010 – Plenário).

Fiscalizadora: fiscalizações realizadas por iniciativa própria ou das Casas e órgãos do Legislativo; fiscalização dos recursos repassados voluntariamente; entre outras.

Levantamento de auditoria nas obras existentes no Aeroporto de Congonhas/SP, em atendimento à solicitação do Congresso Nacional. (TC 007.138/2006-4).

Julgamento de contas: julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos, e daqueles que derem causa a irregularidade de que resulte prejuízo ao erário.

Julgar irregulares as contas do Sr. XXX, com fulcro nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alínea “c” e 19, caput, da Lei n. 8.443/92, condenando-o ao pagamento da importância de R$ 378.540,70 (trezentos e setenta e oito mil, quinhentos e quarenta reais e setenta centavos), fixando-lhe o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprove o recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente e acrescida de juros de mora, calculados a partir de 31/12/2002 até a data da efetiva quitação do débito, nos termos do art. 23, inciso III, alínea “a”, da citada Lei c/c o art. 214, inciso III, alínea “a”, do Regimento Interno/TCU; (Acórdão 21/2010 – Plenário)

As competências do TCU,

estão nos art. 71 da CF, os

arts. 1º a 3º da Lei 8.443/92

(LO/TCU) e os arts. 1º a 3º

do Regimento Interno do

Tribunal (RI/TCU).

Constituição Federal

http://www.planalto.gov.

br/ccivil_03/constituição/

Constituição.htm

http://portal2.tcu.gov.

br/portal/pls/portal/

docs/2417477.PDF.

LO/TCU

http://www.planalto.gov.br/

ccivil_03/Leis/L8443.htm

Page 13: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 13 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Atribuições do TCU Exemplos

De registro: apreciação, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, excetuadas as nomeações para cargo em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões.

Considerar ilegais os atos de admissão dos servidores acima arrolados e negar-lhes registro; (Acórdão 156/2010 – 2ª Câmara)

Sancionadora: aplicação de multa; declaração de inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança; declaração de idoneidade do licitante fraudador para participar de licitação.

Aplicar ao responsável acima mencionado multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser recolhida aos cofres do Tesouro Nacional atualizada monetariamente do dia seguinte ao do término do prazo abaixo estipulado até a data do pagamento; (Acórdão 5.831/2009 – 2ª Câmara)

Corretiva: assinatura de prazo para que o órgão ou entidade adote as providências para o exato cumprimento da lei; sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado; adotar as providências necessárias, no caso de contrato, se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo não o fizerem.

Acordam os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões expostas pelo Relator, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal c/c o art. 45 da Lei n° 8.443/92, em fixar o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária cumpra integralmente o determinado no item 9.2 do Acórdão n° 1.740/2004-Plenário, especialmente no que refere à apuração de desvios funcionais no âmbito da Superintendência Regional do Amapá, sob pena de aplicação da multa prevista no art. 58, § 1º, da Lei nº 8.443/92. (Acórdão 15/2006 – Plenário)

5. Limites ao controle exercido pelo TCU

Vimos como o TCU se posiciona na organização do Estado brasileiro e qual é a abrangência da sua jurisdição. Abordamos também as diversas competências do Tribunal, derivadas, em sua maioria, da Constituição Federal. Agora, exploraremos algumas diretrizes do controle a ser exercido pelo TCU.

Quais são os limites do controle exercido pelo TCU? Em que situação o controle exercido pelo TCU é limitado?

Page 14: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 14 ] Estruturas de Gestão Pública

Sabemos que, no Brasil, vigora o princípio da inafastabilidade da prestação jurisdicional, conforme art. 5º, XXXV, da CF (a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito). Assim, o primeiro tipo de controle a que o TCU está submetido é o judicial.

Imaginemos que o TCU receba uma tomada de contas especial (TCE), instaurada em razão da não prestação de contas do Convênio 123, firmado entre o Ministério da Saúde e o Município de Fim do Mundo, para a aquisição de duas ambulâncias.

Para realizar suas atribuições e proteger os cofres públicos, o TCU precisa observar certas limitações:

limitações decorrentes do dever de acatar o devido processo legal;limitações decorrentes do dever de garantir a ampla defesa e o

contraditório;Limitações específicas de órgãos de controle (respeito ao poder

decisório, quando houver teses juridicamente razoáveis, e impossibilidade de criar procedimentos para a atividade-fim da Administração).

Os limites impostos pelo devido processo legal são o dever de o TCU observar as regras processuais vigentes, estabelecidas no seu Regimento Interno, na própria CF e nas normas de aplicação subsidiária (Lei do Processo Administrativo, Código de Processo Civil, etc.).

No nosso exemplo, esses limites seriam: necessidade de pronunciamento do Controle Interno sobre a TCE; necessidade de citação do responsável pelo convênio; respeito aos prazos para defesa; entre outros.

Os limites impostos pela garantia de ampla defesa e contraditório são decorrência do disposto no inciso LV do art. 5º da CF, segundo o qual “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Assim, antes de julgar o responsável pela apresentação da prestação de contas do Convênio 123, o TCU deve proporcionar a oportunidade de se defender das ocorrências que lhes são imputadas. O responsável deve ser devidamente citado, para que apresente alegações de defesa sobre a não apresentação da prestação de contas.

Page 15: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 15 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

A garantia de ampla defesa e contraditório é um princípio muito valorizado no Estado de Direito, como o que vigora no Brasil. Exemplo disso foi a edição, pelo STF, da Súmula Vinculante 3.

Por fim, temos as limitações específicas dos órgãos de controle, que se dividem em duas:

respeito ao poder decisório, quando houver teses juridicamente razoáveis: o TCU deve respeitar a decisão do administrador, quando o assunto não for pacificado e houver teses igualmente aceitáveis;

impossibilidade de criar procedimentos para a atividade-fim da Administração: o TCU não pode substituir o administrador e indicar qual o melhor caminho a ser seguido; deve apenas conduzir o gestor a observar a lei, cabendo a este decidir sobre a melhor forma de realizar os seus atos.

Assim, suponhamos que no nosso exemplo do Convênio 123, verificou-se que os gestores do Ministério da Saúde analisaram devidamente a proposta de convênio apresentada pelo Município Fim do Mundo, aceitando que a ambulância a ser adquirida não fosse da marca mais barata do mercado, por razões técnicas (por exemplo, capacidade interna).

Desse modo, como há uma situação justificável, por critérios técnicos, não cabe TCU impugnar a atuação dos gestores do Ministério. De forma semelhante, também não cabe ao Tribunal determinar o caminho a ser seguido, pois a compra da ambulância mais cara estava justificada, de conformidade com os princípios e normativos públicos.

Esses são os controles que o TCU geralmente deve observar nas suas fiscalizações. Entretanto, há particularidades que tornam o controle diferenciado, conforme veremos a seguir.

5.1 Fiscalização das empresas estatais

Suponhamos que um gestor da Caixa Econômica Federal concedeu um empréstimo a um cidadão comum, mas não observou as normas internas da empresa relativas à matéria, tais como análise prévia da capacidade de pagamento por parte do tomador do empréstimo. Teria o TCU competência para julgar os atos desse gestor?

Súmula Vinculante 3:

Nos processos perante

o Tribunal de Contas

da União asseguram-

se o contraditório e a

ampla defesa quando da

decisão puder resultar

anulação ou revogação

de ato administrativo que

beneficie o interessado,

excetuada a apreciação

da legalidade do ato

de concessão inicial de

aposentadoria, reforma e

pensão.

Page 16: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 16 ] Estruturas de Gestão Pública

Em 2003, por meio do Mandado de Segurança 23.627/DF, o STF proferiu decisão afirmando que os bens das empresas estatais seriam privados e, por isso, o TCU não teria competência para julgar os atos dos seus gestores.

Em 2005, mediante o Mandado de Segurança 25.092/DF, o Supremo reviu o posicionamento e afirmou a competência do TCU para julgar os atos dos gestores das empresas estatais, em face do que dispõe o art. 71, II, da CF (competência para julgar as contas dos responsáveis por recursos públicos federais), não importando se a empresa é prestadora de serviço público ou exploradora de atividade econômica.

Conforme o próprio Regimento Interno do TCU (art. 5º, IV), as empresas estatais estão sob sua jurisdição. Entretanto, a fiscalização do Tribunal deve ser exercida primordialmente nas atividades-meio da empresa. Por exemplo, se a Petrobrás realiza uma licitação para compra de maquinários, cabe a fiscalização do TCU. Mas se ela realiza um leilão de barris de petróleo (atividade-fim), o TCU não deve intervir, desde que a empresa esteja seguindo a normalidade do mercado.

Assim, de acordo com a jurisprudência do TCU, no exemplo do gestor da Caixa Econômica Federal, se o ato do gestor causou prejuízo à CEF, cabe atuação do TCU, pois o responsável agiu contrariamente às normas vigentes para a atividade-fim.

5.2 Fiscalização de atos realizados por advogados

Imagine que um gestor necessite realizar um procedimento licitatório para compra de cadeiras. Para isso, ele submete o processo à consultoria jurídica do órgão, para manifestação sobre a exigência da licitação ou sua dispensa. Se o advogado público opinar pela dispensa de licitação, ele poderá ser responsabilizado por este ato, se a dispensa for irregular?

Ponto controverso no âmbito do TCU e do STF é o grau de responsabilidade a ser atribuído aos advogados públicos por sua manifestação, quando esta for determinante para a prática de um ato que resultou prejuízo ao erário.

O art. 133 da CF preceitua que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Prestadoras de serviço público (mais regras

de Direito Público) e

exploradoras de atividade

econômica (mais regras

de Direito Privado).

Independentemente disso,

o STF afirmou que ambas

submetem-se à fiscalização

do TCU.

Na atividade-fim, justifica-

se a atuação do Tribunal

somente nos casos em que os

gestores atuam com extrema

falta de bom-senso ou com

infringência de normas.

Page 17: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 17 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

À primeira vista, esse dispositivo poderia induzir ao raciocínio de que o advogado não pode ser responsabilizado pelas suas manifestações. Entretanto, conforme defendido pela doutrina, ele não pode estar isento quando agir fora dos “limites da lei”, por expressa previsão constitucional. Esse é o posicionamento defendido por Lucas Rocha Furtado, que assim resume seus apontamentos:

“Em resumo, pode-se afirmar que os advogados podem ser responsabilizados em razão de manifestações jurídicas produzidas em processos administrativos que causem dano ao erário em razão de fraude, de conluios, ou quando for adotada tese jurídica absurda ou já rejeitada pela jurisprudência. Não é legítimo, todavia, responsabilizá-los, judicial ou administrativamente, em razão do conteúdo das suas manifestações, se defenderem tese razoável e bem fundamentada.”

Essa é a linha adotada pelo TCU.

Atualmente, o STF tem posicionamento claro de que o advogado é responsável quando sua manifestação for obrigatória para o prosseguimento de alguns procedimentos, como no parágrafo único do art. 38 da Lei 8.666/93. Entretanto, o STF ainda não se manifestou claramente sobre a responsabilidade do advogado quando não há essa obrigatoriedade, como nos casos em que o gestor pede apenas parecer opinativo para dar maior segurança às suas decisões.

De todo modo, o gestor, baseado em manifestação irregular do advogado, não está isento de responsabilidade, mesmo tendo tomado a decisão com base em opinião equivocada.

5.3 Fiscalização das transferências

Suponhamos que a União, por meio do Ministério da Cultura, tenha celebrado convênio com o Distrito Federal, para construção de uma biblioteca pública. O TCU pode fiscalizar a efetiva construção dessa biblioteca, ou a partir do momento da transferência os recursos passam a ser do Distrito Federal, cabendo ao TCDF a fiscalização?

Sabemos que a aplicação dos recursos transferidos de forma obrigatória para outros entes não pode ser fiscalizada pelo TCU. Nesse caso, cabe ao TCU fiscalizar somente se efetivamente houve o repasse e a correção desses quantitativos.

Parágrafo único do art. 38 da Lei 8.666/93: As

minutas de editais de

licitação, bem como as

dos contratos, acordos,

convênios ou ajustes

devem ser previamente

examinadas e aprovadas

por assessoria jurídica da

Administração.

Page 18: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 18 ] Estruturas de Gestão Pública

Quanto às transferências voluntárias, como os convênios e os contratos de repasse, os recursos transferidos pela União voluntariamente não perdem a qualidade de recursos públicos federais, cabendo, assim, a fiscalização plena do TCU. Aliás, a própria CF, no art. 71, VI, estabelece que é competência do TCU “fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município”.

Existia dúvida sobre eventual conflito de competência entre o TCU e os tribunais de contas locais (tribunais de contas estaduais, tribunais de contas municipais e tribunais de contas dos municípios), quando da celebração de convênios entre a União e órgãos/entidades de outra esfera governamental.

De fato, tanto o TCU quanto os tribunais de contas locais têm competência para fiscalizar a celebração e execução do ajuste, pois tanto recursos federais quanto recursos locais estão em jogo. Entretanto, no caso de alguma irregularidade, cabe a cada TC realizar o processamento e o julgamento das contas relativamente aos recursos de sua competência.

Segundo Jacoby Fernandes, a definição da eventual competência do TCU nas transferências e sua exata dimensão depende das seguintes ocorrências:

Os recursos sejam públicos federais (lato sensu).

Os órgãos repassadores sejam jurisdicionados ao TCU.

O instrumento ou a legislação que ensejar o repasse estabeleça o dever de prestar contas.

O direito-dever de exigir as contas seja afeto ao órgão repassador ou a outro, desde que sujeito à jurisdição do TCU.

O órgão tomador das contas instaure tomada de contas especial - TCE, por dano causado ao erário.

A irregularidade seja comprovada e não afastada.

A TCE seja encaminhada ao TCU.

Page 19: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 19 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

5.4 Fiscalização de obras públicas

O Congresso tem incluído, nas leis de diretrizes orçamentárias, dispositivo solicitando a manifestação do TCU sobre a regularidade das obras públicas financiadas com recursos da União. Nesse contexto, cabe ao TCU indicar obras que apresentam indícios de irregularidades graves, opinando pela sua paralisação cautelar.

Desse modo, o TCU orienta o Congresso a determinar a suspensão da execução orçamentária, física e financeira dos contratos, convênios, parcelas ou subtrechos questionados, até que o próprio Tribunal se manifeste acerca da adoção, pelo órgão executor, de medidas saneadoras.

Tal medida tem levantado intensos debates, devido a recomendações do TCU pela paralisação de obras integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Prova dessa polêmica é o veto do Presidente da República a partes de dispositivo da LOA-2010 (Anexo VI da Lei 12.214/2010) que previa corte de orçamento, fundamentado na recomendação do TCU. Em suas análises o Tribunal identificou graves irregularidades na aplicação de recursos destinados à Petrobrás, tais como superfaturamento, sobrepreço, critérios inadequados de medição e gestão temerária.

O Tribunal de Contas da União (TCU) enviou ao Congresso Nacional, ao longo deste ano, 14 relatórios apontando casos de irregularidades graves em obras desenvolvidas com recursos públicos. Dessas, seis estão incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Com base nas informações, os deputados e senadores analisam as propostas orçamentárias concebidas pelo Executivo.

Fonte: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2341283/tcu-aponta-irregularidades-graves-em-14-obras-publicas

TCU VÊ PROBLEMAS EM 14 OBRAS

Page 20: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 20 ] Estruturas de Gestão Pública

Sobre essa polêmica, podemos fazer duas considerações:o TCU não determina suspensão da execução, apenas a

recomenda ao Congresso Nacional, a quem cabe aprovar a LOA;os benefícios da suspensão sempre devem ser examinados com

parcimônia pois, se por uma lado pode haver benefícios pela suspensão de obras com irregularidades graves, por outro o atraso para a finalização das obras pode causar sua deterioração e maiores prejuízos ao erário.

Assim, concluímos que a atuação do TCU é importante, pois evita a concretização de irregularidades graves, com o consequente prejuízo aos cofres públicos, mas deve sempre haver análise do caso concreto, para avaliar os custos da medida em relação aos benefícios.

5.5 Fiscalização das privatizações, concessões, permissões e autorizações

O TCU tem fiscalizado os processos de desestatização realizados pela Administração Pública Federal (APF). Essa fiscalização compreende as privatizações de empresas, inclusive instituições financeiras, as concessões, permissões e autorizações de serviço público, nas mais diversas áreas, como, por exemplo, energia elétrica, telecomunicações, serviços postais, portos, rodovias, ferrovias, transporte de passageiros interestaduais e internacionais, estações aduaneiras interiores, petróleo e gás.

O Tribunal de Contas da União (TCU) autorizou hoje (25) o governo a publicar edital da segunda etapa de concessão a investidores de sete trechos de rodovias federais, entre elas a Fernão Dias, que liga São Paulo a Belo Horizonte, e a Régis Bittencourt, que faz a ligação entre São Paulo e Curitiba.

Na decisão foi mantida a proposta do governo de que a Taxa Interna de Retorno (TIR), que garante o ganho dos investidores, seja de 8,95%. Com isso, o governo pode publicar o edital sem fazer alterações.Fonte: http://www.boonic.com.br/noticiasbr/1054568/tcu-autoriza-publicacao-de-edital-para-concessao-d.html

TCU APROVA EDITAL DE CONCESSÃO

Page 21: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 21 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

Nessas fiscalizações, o Tribunal acompanha todo o processo de privatização e delegação de serviços, como o exame preliminar dos estudos de viabilidade. Acompanha, também, o processo de revisão tarifária, para os serviços pelos quais se cobram taxas dos usuários.

A fiscalização exercida nessas ocasiões tem caráter prévio e concomitante, pois atua desde a etapa preparatória da licitação até a celebração e execução contratuais.

É importante ressaltar que, segundo a jurisprudência do TCU, não lhe cabe controlar, diretamente, as empresas delegatárias de serviços públicos, mas sim examinar se o poder concedente está fiscalizando e controlando de forma adequada a execução dos contratos.

5.6 Fiscalização das agências reguladoras

A atuação das agências reguladoras é marcada por uma elevada discricionariedade, pois são entidades muito especializadas nas matérias dos setores que regulam. Assim, segundo a jurisprudência do TCU, a fiscalização das atividades finalísticas das agências reguladoras dá-se em segundo plano.

Nesse contexto, se o Tribunal se deparar com atos discricionários das agências, sua atuação limita-se a recomendar a adoção de providências consideradas por ele mais adequadas.

Por exemplo, se a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) edita um ato que restringe o embarque de passageiros em aeronaves portando frascos com mais de 100 ml de líquido, o TCU não deve, a princípio, realizar determinações sobre o assunto. Mas se o Tribunal entender que 100 ml é uma quantidade muito baixa e que a norma devia aumentá-la, pode até recomendar à Anac que reveja o normativo, mas cabe à agência reguladora, que é especializada no assunto, decidir sobre o acatamento da recomendação.

No entanto, se a agência agir com violação de dispositivo legal ou deixar de praticar ato vinculado que lhe incumbia executar, o TCU exerce sua jurisdição plena, determinando as providências necessárias ao cumprimento da lei.

Assim, se a Anac edita uma norma concedendo eventual gratificação a seus servidores, sem fundamento legal para isso, estaria agindo com violação à lei e, nesse caso, o TCU exerce sua jurisdição plena, apurando responsabilidades e determinando a adoção de providências para correção da irregularidade.

Exemplo da jurisprudência: Acórdãos

1.703/2004, 575/2007

e 1.757/2004, todos do

Plenário.

Exemplo da jurisprudência: Acórdãos

2.692/2008 – Plenário e

2.658/2009 Plenário.

Page 22: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 22 ] Estruturas de Gestão Pública

A efetiva atuação do TCU pode ser constatada, por exemplo, na revisão de valores estabelecidos pelas agências reguladoras em concessões, como foi o caso da hidrelétrica Belo Monte (PA) em que a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o TCU orçaram o valor da usina em dezenove e meio bilhões de reais, enquanto parte do setor privado, interessado na concessão, estimava valores superiores a trinta bilhões de reais.

A intervenção do Tribunal gera muita economia aos cofres públicos, ao rever os cálculos feitos também para definir o preço mínimo de leilão para a concessão de uma rodovia federal, ou leilão de uma faixa de determinada frequência para serviços de telecomunicação, como na Decisão 182/2001 – Plenário, em que o TCU constatou que o método de cálculo de preço mínimo de outorga de TV a cabo e de Serviços de Distribuição Multiponto Multicanal (MMDS) não estava compatível com os valores de mercado.

Outro importante ponto é o processo de revisão tarifária (nos serviços de energia elétrica, por exemplo), em que o TCU verifica se os cálculos estão sendo feitos corretamente, para não onerar desnecessariamente os consumidores.

Assim, mesmo que se trate de assuntos evidentemente relacionados à atividade-fim das agências, o TCU tem o dever de fiscalizar a correção dos atos dessas agências, sem que isso signifique interferência indevida na atuação dessas entidades.

5.7 Fiscalização das entidades paraestatais

Os serviços sociais autônomos (SSA) prestam contas normalmente ao TCU, pois o vínculo formado com o Poder Público é maior, já que administram recursos públicos que lhes são diretamente repassados (contribuições parafiscais). Assim, o TCU exerce plenamente suas competências sobre essas entidades.

As organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) são utilizadas para prestação de serviços bem específicos. Logo, a prestação de contas das OSCIP deve ser apresentada aos órgãos concedentes, mas ao TCU cabe fiscalizar, diretamente, os termos de parceria firmados.

As organizações sociais (OS), por sua vez, submetem-se a fiscalização um pouco mais rígida do que as OSCIP, pois são originadas do processo de publicização, muitas vezes decorrente da extinção de algum órgão

Publicização: Transferência

da gestão de serviços

públicos para entidades

públicas não-estatais que o

Governo passa a subsidiar.

Vejam o seguinte trabalho

desenvolvido pelo TCU

sobre revisão tarifária,

para audiência pública da

Câmara dos Deputados:

http://www2.camara.gov.

br/atividade-legislativa/

comissoes/comissoes-

permanentes/cdc/eventos/

audiencias-publicas-1/

audiencias-realizadas-em-

2007-1/14-03-07-pulso-

minuto/TCU.pdf

Page 23: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 23 ]Aula 5 – Atuação do TCU e sua relação com os Poderes da União

público, e seu vínculo com o Poder Público é mais estreito (presença de representantes do Governo no Conselho de Administração, cessão de servidor público, permissão de bens públicos, etc.). Por isso, também prestam contas ao TCU.

Devemos lembrar, contudo, que a sistemática atual do TCU, para definir quais das suas unidades jurisdicionadas apresentarão processo de tomadas de contas, é estabelecida anualmente, por meio de decisão normativa. Assim, nada impede que o TCU, analisando critérios de relevância, materialidade e risco, dispense uma unidade (pode ser da Administração Direta, da Indireta e os próprios entes paraestatais) de prestar-lhe contas em determinado exercício, e nos seguintes passe a cobrar as contas dessa mesma unidade.

Quanto às OS, entretanto, há bastante controvérsia acerca da abrangência do controle a ser exercido sobre elas. É fato que a Lei 9.637/1998 privilegiou o controle com foco no alcance de resultados. Entretanto, dois aspectos devem ser levados em conta:

o controle de meios (procedimentos), apesar de ceder espaço ao controle de resultados, continua fazendo parte das competências do TCU, emanadas diretamente da CF;

o efetivo controle de resultados depende de as OS e os órgãos supervisores estabelecerem metas e indicadores de desempenho objetivos e critérios claros, a fim de que os órgãos de controle possam focar as fiscalizações no alcance de resultados.

Segundo a Instrução

Normativa TCU 63/2010:

relevância: aspecto ou fato

considerado importante,

em geral no contexto do

objetivo delineado, ainda

que não seja material

ou economicamente

significativo;

materialidade: volume de

recursos envolvidos;

risco: possibilidade de

algo acontecer e ter

impacto nos objetivos,

sendo medido em termos

de consequências e

probabilidades.

Page 24: Estruturas de gestao_publica_aula_5

[ 24 ] Estruturas de Gestão Pública

Síntese

Nesta aula, vimos como o TCU faz parte da organização do Estado brasileiro. Para a doutrina majoritária, embora o TCU seja órgão autônomo, ele é vinculado, pelo menos para fins orçamentários e financeiros, ao Poder Legislativo, porque sua principal função é auxiliar o Congresso no exercício do controle externo da Administração Pública Federal.

Observamos que há divergência acerca do uso da palavra jurisdição para sinalizar a abrangência do controle exercido pelo Tribunal, porém a doutrina administrativista admite a jurisdição do TCU em todo território nacional, sobre a aplicação dos recursos públicos federais, decidindo acerca da regularidade ou irregularidade das contas de modo soberano, privativo, indelegável e definitivo.

Vimos que o controle exercido pelo Tribunal possui as mais diversas naturezas, de acordo com a competência analisada: opinativa ou consultiva, fiscalizadora, de julgamento de contas, de registro, sancionadora e corretiva.

No exercício das suas competências, o TCU analisa os mais diversos aspectos dos gastos públicos: legalidade, legitimidade, economicidade, eficiência, eficácia e efetividade.

De posse de todas essas informações, vimos os limites encontrados pelo Tribunal no exercício da sua missão, a variar de acordo com quem pratica o ato a ser analisado: empresas estatais; advogados públicos; entidades que celebram transferência voluntária; concessionárias, permissionárias e autorizatárias de serviço público; agências reguladoras, entidades paraestatais; entre outras.

Assim, observamos que a abrangência de atuação do TCU é ampla. Alcança órgãos e entidades públicas e toda e qualquer pessoa física e jurídica que utilize recursos públicos federais. No entanto, o Tribunal também tem suas limitações, que variam de acordo com a forma em que os recursos são despendidos.