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Memorial descritivo

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PorAdriano Pasqualotti

A contingência do memorial

Desde 1993, quando concorri pela primeira vez a uma bolsa de iniciação científica daFapergs, escrevo e reescrevo o Curriculum Vitae. Todavia, memorial descritivo, é o primeiro queelaboro. Procurei seguir as orientações de Irany Novah Moraes (1992) e Edivaldo MachadoBoaventura (1995) para a elaboração do meu memorial, o qual será apresentado à coordenação doPrograma de Pós-Graduação em Informática na Educação para o processo seletivo ao Curso deDoutorado em Informática na Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Elaborar um memorial descritivo é reconstituir a própria existência. Essa não é uma tarefafácil, pois, na opinião de Moraes (1992), memorial é um retrato crítico do indivíduo visto por múltiplasfacetas através dos tempos, o qual possibilita inferências de suas capacidades. De acordo comBoaventura, “memorial é não somente crítico, como autocrítico do desempenho acadêmico docandidato. Crítica que conduz forçosamente à avaliação dos resultados obtidos na trajetória dacarreira científica” (1995). Portanto, para elaborar o presente memorial levei em conta as condições,situações e contingências que envolveram o desenvolvimento dos meus trabalhos aqui expostos.Procuro destacar os elementos que, marcados por quebras de paradigmas, por coerências eincoerências e por meio das relações estabelecidas com o mundo, possibilitaram a construção deminha vida profissional. Além de considerar este memorial auto-avaliativo, acredito que ele acaba setornando um instrumento confessional de meus sonhos.

O início

Sou o quarto filho de uma família de quatro irmãos – mesmo que sempre tenhamos nosrelacionado muito bem, uma de minhas maiores frustrações é não ter tido uma irmã. Meu pai, hojeaposentado, era funcionário da Companhia Estadual de Energia Elétrica e minha mãe, uma senhoradigna de ser chamada senhora do lar. Nasci no ano de 1972 em Boqueirão do Leão[1], que era, na

época, um dos distritos do município de Lajeado/RS.

Quando eu tinha três anos de idade fomos morar no município de Sarandi/RS[2], cidade onde

realizei os meus estudos em nível fundamental, em escolas municipais e estaduais. Porém, todo oensino médio foi desenvolvido em uma escola particular do município, pois naquela época era comumfazer-se no 2º grau um curso técnico em Contabilidade. Exatamente por isso, acabei sendoconvidado para trabalhar no setor de contabilidade da Cooperativa Tritícola Sarandi Ltda, trabalhoque realizei por alguns meses. Antes, já havia trabalhado por mais de três anos como servente nodepósito central de mercadorias da cooperativa, com a tarefa de selecionar as mercadoriasrequisitadas pelos supermercados que a cooperativa tinha nos municípios da região e fazer a notafiscal de transferência.

Outro fato marcante de minha vida foi a construção de uma família. Conheci minha esposaem um baile de carnaval em Sarandi; namoramos por alguns anos e acabamos casando muito jovens.Mesmo formando um casal que se amava profundamente, o principal motivo do casamento foi umagravidez prematura: quando meu filho nasceu, eu não tinha dezoito anos. Éramos tão jovens que,para casar, foi necessária a autorização de nossos pais. Essa experiência me fez ver o mundo de umaforma diferente. A obrigação de ser um chefe de família já nessa idade fez de mim um homem semprepreocupado com a repercussão de meus atos. Desde essa época, toda vez que sou instigado a daruma opinião, procuro fazê-lo sempre após muita reflexão.

Como a maioria dos meninos possuía fantasias de criança, porém a minha estava, por incrívelque pareça, relacionada à ciência e não ao futebol, que, no início da década de 80, constituía oimaginário de muitas crianças. Sempre dizia que, ao crescer, seria um cientista, embora não soubessedizer em que área. Hoje tenho certeza de que as minhas fantasias estavam relacionadas com asciências do cosmos, o que, provavelmente, se devia aos comentários que na época ainda se faziam

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sobre a conquista da Lua pela humanidade. Porém, o sonho tinha muito de fantasia, e a realidadeconcreta tornava-o impraticável.

O mais próximo que consegui chegar na realização de meus sonhos de criança foram ascartas que enviei, no final da década de 80, ao astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, entãodiretor do Museu de Astronomia e Ciências Afins, solicitando-lhe informações sobre o que era precisofazer para me tornar um astrônomo. A sugestão dele, enviada em inúmeras cartas-resposta, era deque eu deveria escolher entre cursar, em nível de graduação, diretamente o curso de Astronomia daUniversidade Federal do Rio de Janeiro, no Observatório do Valongo, ou cursar Física, Matemática ouEngenharia em qualquer universidade e, após, fazer uma pós-graduação em Astronomia; nesse caso,segundo Mourão, eu poderia escolher entre os vários institutos no Brasil que desenvolvem estudosem nível de especialização em Astronomia, inclusive a UFRGS.

A universidade mais próxima de Sarandi e que oferecia a melhor infra-estrutura no início dadécada de 90 era a Universidade de Passo Fundo[3] (UPF). Dos cursos de graduação indicados pelo

astrônomo Mourão, o único que a UPF não oferecia era o de Física; então, das duas opções quesobraram, optei por fazer Matemática, pois foi exatamente a partir de 1990 que o curso passou a sertodo ministrado à noite, diferentemente do curso de Engenharia, que era de tempo integral.

A universidade: um sonho e um compromisso

Para fazer o curso de Matemática na UPF, eu era obrigado viajar à noite de ônibus,aproximadamente uma distância de 180 km, que é o percurso de ida e volta entre Sarandi e PassoFundo. Isso ocorreu até 1992, ano em que eu e minha família nos mudamos para Passo Fundo. Atéesse momento, já tinha cursado a metade das disciplinas, pois, naquela época, o currículo do cursode Matemática era dividido em dez semestres.

Desde o início do curso, fazia de tudo para poder participar do maior número de atividadesacadêmicas que tivessem alguma vinculação com o que eu pretendia me tornar, como por exemplo,os cursos “Modelagem Matemática” e “Modelagem Matemática: Modelos Matemáticos II”, cada umcom uma carga horária de 60 horas. Entretanto, o curso que estava fazendo era de licenciaturaplena e eu comecei a perceber que o sonho inicial ficava cada vez mais distante, o que ocorreu nãopelas dificuldades que sabia que teria de enfrentar para ser um astrônomo, mas porque o sentimentode ser professor começou a crescer. Comecei a perceber que, trabalhando como professor, teriaoportunidades de contato que a outra profissão não poderia me oferecer. O marco da mudança depensamento ocorreu em 1993, pois, nesse ano, juntamente com um colega de turma, Vildomar LuizTartari[4], iniciei uma pesquisa como bolsista de iniciação científica da Fapergs, a qual tinha como

título “O ensino de Física balizado pela teoria da ciência de Duhem”, sob a orientação do prof. Dr.Fábio da Purificação de Bastos[5]. Nessa época, a internet ainda não estava bem difundida na UPF e

havia apenas alguns computadores conectados à rede; por isso, toda a orientação era realizada porcartas, uma vez que o prof. Fábio fazia doutorado na Universidade de São Paulo e praticamentepermanecia o tempo todo longe de Passo Fundo.

O objetivo da pesquisa era investigar a existência de uma teoria que suportasse os cursosde física[6]. Nessa época, esse era um assunto que na área de física poucos pesquisadores

trabalhavam; por isso, resolvemos apresentar as nossas conclusões em diversos eventos de iniciaçãocientífica, tais como: V e VI Salão de Iniciação Científica e III Feira de Iniciação Científica da UFRGS;II Seminário de Iniciação Científica e I Jornada de Pesquisa da Universidade do Noroeste do Estado doRio Grande do Sul; III e IV Mostra de Iniciação Científica da UPF; II Congresso de Iniciação Científicada Fundação Universidade de Rio Grande e Universidade Federal de Pelotas. Em todos eles, sempretivemos uma ótima recepção pelos ouvintes, os quais questionavam se os resultados alcançados pornós eram, efetivamente, implementados, pois, segundo eles, era preciso quebrar paradigmas tantopor parte do professor quanto dos alunos para que qualquer mudança pudesse ser implementada emsala de aula. Procurávamos mostrar que se tratava de um estudo teórico, mas que, mesmo assim,alguns professores de física de escolas do município de Passo Fundo se sentiam instigados a mudaras suas práticas educacionais depois das reflexões realizadas.

Naquela época, eu não me preocupava em apresentar e publicar mais de uma vez a mesmapesquisa, pois meu objetivo era difundir para o maior público possível os resultados alcançados, o que

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foi um erro. Entretanto, ao participar desses eventos, tive a oportunidade de conhecer outrospesquisadores e de fazer inúmeros contatos, os quais foram importantes na decisão de me tornar umprofessor-pesquisador e não mais querer ser um astrônomo.

Na IV Mostra de Iniciação Científica da UPF eu apresentei também outras duas pesquisas. Aprimeira, intitulada “Purificação estatística dos dados do monitoramento ambiental do rio Marau”,tinha como objetivo verificar se as diferenças observadas nos experimentos realizados para omonitoramento das características físicas e químicas do rio Marau eram ou não significativas. Durantequase dois anos fui estagiário nessa pesquisa, a qual fazia parte de um trabalho maior intitulado“Projeto Rio Marau Ano 2000”, desenvolvido pela Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente daPrefeitura Municipal de Marau.

O reconhecimento da comunidade marauense do “Projeto Rio Marau Ano 2000” era tãosignificativo que por várias vezes realizamos seminários para divulgar os resultados obtidos nasdiversas pesquisas[7] que eram desenvolvidas vinculadas ao projeto. No início de 1995, devido ao

“Projeto Rio Marau Ano 2000”, participei do programa Intercampus[8] do Instituto de Cooperação

Ibero-Americana. Durante praticamente um mês apresentei na Universidade de Barcelona osresultados alcançados nas pesquisas desenvolvidas em Marau. Nesse período, realizei, além deinúmeras pesquisas na área de estatística aplicada ao meio ambiente, contatos que resultaram navinda e também na ida de mais pesquisadores nos anos seguintes à Espanha, para divulgar ainda maisos trabalhos que realizávamos na Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente. A minha seleçãopara participar do programa no Intercampus foi tão bem reconhecida pela prefeitura de Marau queobtive, inclusive, ajuda financeira do município para viajar.

A segunda pesquisa apresentada na IV Mostra de Iniciação Científica da UPF chamava-se“Simulação do perfil de duração do período de molhamento foliar em culturas”, cujo objetivo eradesenvolver um modelo matemático determinístico para simular o perfil de duração do período demolhamento foliar em culturas de interesse agronômico com base em dados micrometereológicos e emobservações de estações metereológicas convencionais de superfície. Para o desenvolvimento dessapesquisa, durante praticamente quatro meses, fui estagiário no Centro Nacional de Pesquisa do Trigo(CNPT) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) de Passo Fundo, sob a orientaçãodo pesquisador Dr. Gilberto Rocca da Cunha.

Como referido anteriormente, eu procurava participar de eventos que tinham em suanatureza uma vinculação com o que eu queria ser. No início, eram aqueles cujo foco de discussãofosse na área de astronomia ou em área afim, como, por exemplo, o XVI Congresso Nacional deMatemática Aplicada e Computacional, evento promovido pela Sociedade Brasileira de MatemáticaAplicada e Computacional e Universidade Federal de Uberlândia, ou o Seminário de SupercomputaçãoAplicada – SuperComp 94, promovido pelo Centro Nacional de Supercomputação da UFRGS.Entretanto, com a decisão de querer ser professor, passei a participar de eventos que tinham umenfoque educacional, especialmente aqueles que tratavam sobre a formação de professor, como, porexemplo, o III Encontro Gaúcho de Educação Matemática, promovido pela Unijuí (nesse eventoapresentei a comunicação intitulada “A Matemática como instrumental nos cursos de Geografia eQuímica”), ou V Colóquio Nacional e III Colóquio Internacional de Educação Popular promovido peloCPERS/Sindicato – 7º Núcleo, Associação dos Professores da UPF e 1ª Delegacia do Simpro/RS.

O sentimento de ser professor

O meu primeiro contrato de trabalho como professor durou menos de um mês. Fui contratadopara ministrar física, principalmente os conteúdos de mecânica e termodinâmica, para alunos do 2ºano de uma escola particular de Passo Fundo. Nessa época eu ainda não era formado e a experiênciafoi muito frustrante, pois eu não conseguia passar os conteúdos de uma forma que os alunospudessem entender e assimilar. Hoje sei que o principal motivo de meu fracasso deveu-se àinexperiência em trabalhar com adolescentes. A partir desse fracasso, toda vez que preparo umanova aula, procuro utilizar uma metodologia que leve em conta o público que quero atingir.

Em uma outra escola particular de Passo Fundo tive, novamente, oportunidade de lecionarfísica para um grupo de adolescentes. Nessa segunda experiência, os resultados foram maissatisfatórios; mesmo tendo sido contratado para substituir o professor titular, faltando apenas três

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meses para o final do ano letivo, consegui desenvolver todo o conteúdo que faltava de uma formatão significativa que fui convidado para continuar lecionando no ano seguinte.

Após a formatura, que ocorreu no final de 1994, eu tinha duas opções: continuar lecionandofísica em escolas de Passo Fundo ou assumir um concurso público que tinha feito na PrefeituraMunicipal de Marau para lecionar matemática para alunos do ensino fundamental. Optei pela segunda,uma vez que eu já trabalhava na prefeitura como estagiário. Entretanto, antes de assumir o cargo deprofessor municipal, eu viajei à Espanha para participar do programa Intercampus.

Lecionar matemática para crianças e pré-adolescentes de escolas municipais de Marau porum período de cinco anos foi uma experiência extremamente significativa. Ao conviver com pessoassimples, na sua maioria da periferia e do interior do município, obtive um aprendizado que não énormalmente passado nos bancos das universidades. Por exemplo, não é ensinado como devemos noscomportar nas situações em que a violência na comunidade onde aluno vive influencia na suaaprendizagem, ou que atitudes devemos ter quando um aluno vem para a escola completamentedrogado. Exatamente por problemas desse tipo a Secretaria Municipal de Educação oferecia cursosde atualização para os professores da rede pública municipal, entre os quais destaco o curso de“Prevenção primária ao uso de drogas” e o de “Atualização Pedagógica”.

No ano de 1995, o vínculo que eu mantinha com a UPF poderia ser chamado “não-formal”,pois a minha participação nos grupos de pesquisa era totalmente voluntária e, nessa época, esse tipode participação não era reconhecido pela universidade. Apenas alunos com bolsas de iniciação daFapergs ou do CNPq tinham os seus dados registrados na Divisão de Pesquisa e Pós-Graduação daUPF. O convite formal para lecionar na universidade somente ocorreu no mês de abril de 1996,quando fui contratado para ministrar a disciplina de Estatística Básica para alunos do quarto ano docurso de Administração.

Depois dessa experiência inicial, já lecionei na UPF outras disciplinas. Por exemplo, no cursode Ciência da Computação, Estatística Inferencial, Probabilidade e Estatística e Realidade Virtual.Nesse curso, além de ministrar essas disciplinas, no Estágio orientei diversos trabalhos de conclusão.Além disso, ministrei aulas de Estatística e Informática em vários cursos, entre os quais destaco:Agronomia, Ciências Contábeis, Ciências Econômicas, Comunicação Social, Geografia, Letras:Habilitação em Língua Inglesa, Matemática, Química, Enfermagem e Secretariado Executivo.

Como é possível perceber, nesses sete anos como professor da UPF, tive a oportunidade detrabalhar em sala de aula tanto com alunos de cursos de formação técnica, como, por exemplo,Administração ou Ciências Contábeis, quanto com alunos de cursos de licenciatura, como Geografiaou Química. A experiência de lecionar currículos tão heterogêneos ajudou-me a definir o que é serprofessor: “Ser professor é fazer por merecer; façamos sempre o bem para poder merecer sempre”.

Uma outra experiência muito interessante que tive como professor na UPF foi trabalhar noProjeto oficina de Informática, Ciência e Tecnologia, do Centro Regional de Estudos e Atividades paraTerceira Idade (Creati – UNI 3). Num período de aproximadamente três anos lecionei informática parapessoas da terceira idade, experiência que me mostrou que, de modo geral, os ambientes de ensino-aprendizagem[9] desenvolvidos para o estudo de informática, ou, mesmo, os instrumentos e

equipamentos utilizados em sala de aula não são totalmente adequados quando se trabalha compessoas idosas. Exatamente por causa dessa constatação pretendo no doutorado pesquisar quemetodologias e interfaces os ambientes de Educação à Distância (EAD) deverão ter se o público-alvofor pessoas da terceira idade.

Na UPF[10], além de trabalhar em sala de aula, desde 1997 sou membro da Comissão de

Avaliação Institucional da UPF, cuja função é desenvolver os processos institucionais de avaliaçãorelacionados com a qualidade de suas atividades. Coordeno também, desde junho de 2000, o NúcleoUPF de Pesquisa e Estatística (Nupe), o qual tem como objetivo desenvolver pesquisas nas áreas nasquais a estatística é exigida como um instrumento de análise e de tomada de decisão; o núcleo estávinculado ao Instituto de Ciências Exatas e Geociências (ICEG) da UPF.

Além dessas experiências, destaco também a participação que tive na coordenação dobanco de dados do projeto de extensão “Ações de Apoio à Gestão do Qualificar RS 2001” da

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Secretaria do Trabalho, Cidadania e Assistência Social do estado do Rio Grande do Sul. Este projeto,desenvolvido no período de setembro a dezembro de 2001 pela Rede Interuniversitária de Estudos ePesquisas sobre o Trabalho – Unitrabalho[11], tinha como objetivo acompanhar, supervisionar e

avaliar os cursos com menos de 40 horas/aula.

O mestrado: uma nova fase

Em março de 1998 iniciei o mestrado do Programa de Pós-Graduação em Computação (PPGC)da UFRGS, onde defendi a dissertação “Ambientes VRML para o ensino-aprendizagem de Matemática:modelo conceitual e estudo de caso” em setembro de 2000, aliás, mês em que nasceu a minha filha.Minha orientadora foi a profa. Dra. Carla Maria Dall Sasso Freitas. Todas as disciplinas foram cursadasatravés do convênio PPGC–UFRGS/UPF.

A dissertação tinha dois objetivos; o primeiro era elaborar um modelo conceitual de umambiente virtual não-imersivo implementado com a linguagem Virtual Reality Modeling Language(VRML) para uso na educação; o segundo era estudar as possibilidades do uso desse ambiente noprocesso de ensino-aprendizagem de matemática. Com o primeiro objetivo, visava desenvolver ummodelo conceitual de ambientes de aprendizagem tanto para o ensino-aprendizagem de Matemática(em especial, o conteúdo de geometria) como para o desenvolvimento dos aspectos cognitivos (combase nas teorias do construtivismo), bem como implementar o modelo proposto.

O segundo objetivo do trabalho visava analisar estatisticamente a aplicação de um ambientevirtual modelado em VRML com alunos da 7ª de uma escola particular de Passo Fundo. O trabalhopretendia ser o início de um amplo diálogo sobre temas relacionados à questão da tecnologia deambientes virtuais aplicados à educação, pois a introdução de computadores nas escolas colocavaem evidência a necessidade de se refletir sobre uma série de questões, que vão desde a preparaçãodos professores até a falta de recursos para a compra de equipamentos. Discutir, portanto, um tematão em voga, envolvendo a polêmica relação entre informática e educação, constitui-se num desafio.Nesse sentido, buscou-se desenvolver um ensaio sobre a utilização da tecnologia de ambientesvituais não-imersivos no ensino de matemática, possibilitando, quem sabe, a desmistificação dessadisciplina como de aprendizagem difícil, com o que ela poderia passar a denominar-se Boa Temática.

As conclusões da dissertação foram apresentadas no 3RD Workshop On Virtual Reality – WRV2000, evento que ocorreu em setembro de 2000 na cidade de Gramado/RS, e publicadas no Boletimde Educação Matemática (Bolema) em 2001 e no Cyberpsychology Behavior The Impact Of TheInternet Multi Media Virtual Reality On Behavior Society em 2002.

O professor-pesquisador

Como referi anteriormente, meu sonho de criança era ser um pesquisador (“cientista” era otermo que eu usava naquela época). Na UPF pude realizar esse sonho, pois, nesses sete anos comoprofessor, já desenvolvi diversas pesquisas, bem como participo de vários grupos. Antes mesmo deobter o título de Mestre em Ciência da Computação, eu procurava integrar-me nos projetosinstitucionalizados de pesquisa do ICEG e, com a obtenção do título em 2000, pude institucionalizarmeus próprios projetos, bem como obter horas para o seu desenvolvimento. A seguir, destacoalgumas pesquisas que estão sendo desenvolvidas por mim na UPF e cujos resultados já foramapresentados em eventos científicos:

a) “Ambientes 3D em VRML para o ensino-aprendizagem de Matemática - MAT3D”: o objetivo destapesquisa é investigar as questões que envolvem o uso da realidade virtual não-imersiva no ensino-aprendizagem de matemática, bem como para o desenvolvimento dos aspectos cognitivos;

b) “A qualidade de vida dos acadêmicos de Enfermagem”: o objetivo é analisar a qualidade de vidados alunos do curso de graduação em Enfermagem de forma multidimensional da UPF por meio doinstrumento WHOQOL-BREF, elaborado pela World Health Organization Quality of Life daOrganização Mundial da Saúde;

c) “Experimentação de ambiente de educação à distância para a terceira idade – NeTI”: o objetivodesta pesquisa é analisar a melhoria da qualidade de vida das pessoas da terceira idade propiciadapela utilização de um ambiente de educação permanente na internet e conhecer a qualidade de

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vida das pessoas da terceira idade, através de um questionário baseado no instrumento WHOQOL-BREF;

d) “Um modelo tutorial para cursos de graduação”: o objetivo é construir e implementar um modelotutorial para atender às expectativas de docentes, discentes e à consecução do perfil profissionaldelineado no Projeto Político-Pedagógico do curso de Enfermagem da UPF.

As pesquisas descritas são desenvolvidas por professores de vários grupos de pesquisacadastrados no CNPq, dos quais também faço parte. Entre os vários grupos, destaco os seguintes:

a) “Vivencer”: existe a necessidade de ampliar e aprofundar os conhecimentos sobre o processo daeducação formal e informal na construção da identidade existencial na terceira idade e sobre asformas institucionais na constituição de finalidades e experiências que propiciam padrões dedesenvolvimento satisfatórios antes que o ser humano atinja sua última fase da vida adulta e,nesta fase, possa apoiar-se em internalizações anteriores e instituições que concedamoportunidades de educação permanente. Dessa maneira, acredita-se que o Estado, a universidadee outras instâncias da sociedade civil são concedentes de identidade pela constituição defunções, tarefas e representações em torno dos mais velhos. A universidade tem aresponsabilidade de promover estudos sobre as questões sociais emergentes, sendo a pesquisafundamental para desvelar o potencial biopsicossocial dos mais velhos e das condições culturaispromotoras de eventos favoráveis ao desenvolvimento tardio. A educação para o envelhecimentoe a velhice necessita amparar-se na construção de conhecimentos educacionais facilitadores paraa longevidade humana que está sendo conquistada nas áreas biopsicossociais. O segmento dapopulação idosa traz consigo características diferenciadas e, de diversas formas, sente-seagredido com as relações de violência social e evidentes traços de exclusão. O grupo “Vivencer”pretende atuar nas linhas de pesquisa “aspectos biopsicossociais do envelhecer”, “educação,política e inserção social” e “saúde e longevidade”.

b) “EDUCARE - Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Cuidado de Enfermagem”: no grupoEDUCARE, aglutinam-se pesquisadores envolvidos com a geração de conhecimentos na linha da“Educação e Cuidado em Enfermagem” voltada à qualificação e revitalização do processoeducativo. Buscam contribuir para a formação de profissionais com perfil condizente com as novastendências psicoafetivas de convivência humana requerida para a construção e implementaçãodos projetos político-pedagógicos dos cursos de graduação em enfermagem. A produção científicagerada no grupo tem a intenção de ser compartilhada com a comunidade científica e acadêmica,possibilitando uma ação pedagógica inovadora na formação de profissionais comprometidos com aintegralidade do ser humano, indissociando a competência técnica do exercício da cidadania e dasrelações interpessoais. O grupo articula os profissionais dos diversos campos de atuação deenfermagem, promovendo a interdisciplinaridade e interinstitucionalidade na produção doconhecimento, com repercussões diretas na qualidade de vida do aluno, no processo ensino-aprendizagem, na melhoria das relações interpessoais estabelecidas no âmbito acadêmico e sociale na qualificação profissional e científica.

c) “Grupo de Educação à Distância”: o grupo direciona seus projetos para o estudo e utilização dasnovas tecnologias Web, na disponibilização aos usuários da UPF, das instituições de ensino daregião de Passo Fundo e da comunidade em geral, de modo eqüitativo e econômico, dos váriosserviços de formação e educação continuada e formação de um fórum de discussão sobrequestões ligadas à educação, à educação permanente, à formação do professor e ao papel daescola em face de proliferação de mídias cada vez mais modernas em sala de aula. Nos trabalhosdo grupo destaca-se a construção de ambientes de ensino na internet e sua utilização em sala deaula, tanto em cursos de graduação como nos de pós-graduação. Esses trabalhos possibilitaramabrir um vasto campo de observações na aplicação da informática em sala de aula. Destacam-setambém as pesquisas que envolvem a integração de tecnologias na Web e sua aplicação naeducação.

A proposta para o doutorado

Tenho interesse em desenvolver meu doutorado, caso seja classificado, na linha depesquisas “Ambientes Informatizados de Ensino-Aprendizagem”. O título poderia ser algo do tipo

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“Diagnóstico institucional: experimentação de ambiente virtual para a melhoria da qualidade de vida”.O termo “diagnóstico” é fundamental, pois pretendo, por meio de técnicas estatísticas, avaliar aqualidade de vida das pessoas da terceira idade que utilizam um ambiente de ensino-aprendizagem nainternet. Para isso, três etapas deverão ser desenvolvidas: a) propor um modelo para o ambiente; b)implementar o ambiente; c) realizar a avaliação de desempenho.

Minha hipótese é que o ensino-aprendizagem não ocorre, mesmo com professoresconsiderados ótimos ou com metodologias descritas como inovadoras, se não for levada em conta aqualidade de vida dos sujeitos envolvidos, no caso pessoas da terceira idade, bem como suasinterações no ambiente, pois isso, segundo Piaget (1973, p. 114) resulta em troca de valores quemodificam o indivíduo de uma maneira durável. A qualidade de vida e as interações entre os sujeitosenvolvidos são fatores importantes que interferem no processo educacional.

Na educação formal (presencial), a qualidade de vida de um aluno pode ser facilmentemedida. Para isso, basta o professor ter um referencial teórico que indique o que é uma “boa” ou uma“péssima” qualidade de vida, mensurando o quanto a qualidade de vida afeta o seu desenvolvimentocognitivo. Obviamente, isso não é tão simples quando se trata de ambientes informatizados deensino-aprendizagem. Como fazer para medir essa qualidade de vida em ambiente na internet? Comomensurar as interações entre os sujeitos, fato importante no processo educacional? O objetivo éidentificar de que forma e com que intensidade um ambiente de EAD pode propiciar uma melhorqualidade de vida para as pessoas da terceira idade. Para isso, propõe-se um ambiente de ensino-aprendizagem na Web.

Como problema da pesquisa, verificar-se-á se o ambiente de ensino-aprendizagem propostopara a educação permanente, tendo como mídia a internet, possibilita uma melhor qualidade de vidaàs pessoas da terceira idade, se comparado com um grupo que não teve acesso a esse ambiente.

Como mecanismo de verificação da melhoria da qualidade de vida serão utilizadosquestionários, os quais identificarão os domínios e as facetas representativas da qualidade de vidadas pessoas da terceira idade. A análise dos dados da utilização do ambiente poderá indicar quaisatitudes pessoais e condutas facilitadoras no cuidado da saúde física, emocional e ambiental deverãoser desenvolvidas para propiciar uma melhor qualidade de vida para as pessoas da terceira idade.

Referências

BOAVENTURA, E. M. Memorial. 1995. Disponível em: <http://www.edivaldo.pro.br/ memorial.html>.Acesso em: 12 fev. 2003.

MORAES, I. N. Memorial: síntese. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1992. Documentoapresentado à Faculdade de Medicina para o Concurso de Professor Titular do Departamento deCirurgia – Disciplina de Cirurgia Vascular Periférica.

PIAGET, J. Estudos Sociológicos. Rio de Janeiro: Forense, 1973.

[1] O município de Boqueirão do Leão emancipou-se de Lajeado, tendo sido criado pelo processo nº

7.531/87-7, em projeto nº 8.458, de 8 de dezembro de 1987. A instalação do município deu-se em1º de janeiro de 1989. <http://www.riogrande.com.br/ bancos_historia.html>

[2] Sarandi é uma cidade que fica a 330 km de Porto Alegre; localiza-se no norte do estado do Rio

Grande do Sul, na região do Alto Uruguai, às margens da BR 386 - Rodovia da Produção. Pelodesenvolvimento alcançado ao longo dos anos, a cidade é considerada "Pólo Industrial da Região".<http://www.pmsarandi.rs.gov.br/historia.htm>

[3] Reconhecida por meio do decreto nº 62.835 de 6 de junho de 1968. Sediada em Passo Fundo,

cidade que dista, aproximadamente, 300 km de Porto Alegre. Foi declarada de utilidade públicamunicipal pelo decreto 7/67 de 3/7/1967, estadual pelo decreto 18.679 de 16/10/1967 e federalpelo decreto 62.575 de 22/4/1968.

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[4] Hoje Vildomar leciona Matemática e Física em escolas do município de Marau/RS; além disso,

ministra na UPF a disciplina de Cálculo.

[5] O prof. Fábio, nessa época, lecionava Física na UPF; hoje é professor na Universidade Federal de

Santa Maria.

[6] Empregamos a investigação-ação como forma crítica que o professor-pesquisador poderia utilizar

para mudar as suas práticas educacionais. O propósito era desenvolver sistematicamente oconhecimento dentro de uma comunidade autocrítica, o que implicava um processo participativo ecolaborativo de auto-reflexão, que se materializava nas comunidades autocríticas de investigação.

[7] Em inúmeras dessas pesquisas, publicadas em vários eventos de iniciação entre 1995 e 1997, fiz

parte como co-autor ou como orientador.

[8] O Intercampus, atualmente chamado de Programa de Cooperação Interuniversitária para a

América Latina, é um programa promovido pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional(AECI) e pelo Instituto de Cooperação Ibero-Americana para estudantes que estão cursando oúltimo ano de graduação ou pós-graduação, professores e administradores universitários. Esseprograma possibilita uma maior integração entre as instituições de ensino superior da Espanha e daAmérica Latina, pois, os participantes se integram nas universidades receptoras e colaboram comos professores dessas organizações com atividades docentes e de pesquisa com o objetivo deapontar seus conhecimentos e experiências.

[9] Neste texto a expressão “ensino-aprendizagem” significa as intercorrelações entre aquele que

aprende e aquele que ensina, abrangendo, nesse caso, também o contexto social no qual estãoinseridos.

[10] A partir de junho de 2002, fui enquadrado no cargo de Professor Iniciante II nos termos do artigo

20 do Regulamento de Administração de Pessoal Docente, aprovado pelo Conselho Universitário(CONSUN) em 21/05/2002 e homologado pelo Conselho Diretor em 03/06/2002. Hoje, devido aotempo de UPF e aos trabalhos publicados, já estou enquadrado na categoria de ProfessorAssistente III.

[11] A Unitrabalho é uma rede universitária nacional que agrega, atualmente, 84 universidades e

instituições de ensino superior do Brasil. Criada em 1995, sua missão é contribuir para o resgate dadívida social que as universidades brasileiras têm para com os trabalhadores, concretizada por meioda parceria em projetos de estudos, pesquisas e capacitação. <http://www.unitrabalho.org.br>