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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL O SISTEMA DE ATENDIMENTO ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DA CASA-ABRIGO PROFESSORA NÚBIA MARQUES São CristóvãoSE 2010/1

Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Trabalho de Conclusão de Curso da acadêmica em Serviço Social Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira.

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Page 1: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

O SISTEMA DE ATENDIMENTO ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA DA CASA-ABRIGO PROFESSORA NÚBIA MARQUES

São Cristóvão–SE

2010/1

Page 2: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

Departamento de Serviço Social da Universidade

Federal de Sergipe como requisito parcial à

obtenção do título de Bacharel em Serviço

Social.

ORIENTADORA: Prof.ª Dr.ª Maria Helena

Santana Cruz

São Cristóvão-SE

2010/1

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

O48s

Oliveira, Monique Elen Rodrigues de Araújo

O sistema de atendimento às vítimas de violência doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques / Monique Elen Rodrigues de Araújo. – São Cristóvão, 2010.

106 f.: il.

Monografia (Bacharelado em Serviço Social) – Departamento de Serviço Social, Centro de Ciências Sociais e Aplicadas, Universidade Federal de Sergipe, 2010.

Orientador: Profª Drª Maria Helena Santana Cruz.

1. Violência contra as mulheres. 2. Mulheres – Assistência em Instituições. 3. Casa-Abrigo Professora Núbia Marques (SE). I. Título.

CDU 364.63-027.553(813.7)

Page 4: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira

O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica

da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques

Aprovada em 09/07/2010

___________________________________________

Orientadora: Professora Doutora Maria Helena Santana Cruz

Universidade Federal de Sergipe

___________________________________________

Examinadora: Professora Doutora Maria da Conceição Vasconcelos Gonçalves

Universidade Federal de Sergipe

____________________________________________

Examinadora: Doutoranda Maria Aparecida Souza Couto

Universidade Federal de Sergipe

São Cristóvão-SE

2010/1

Page 5: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

Dedico este trabalho à minha querida mãe

Silvia e ao meu esposo Tarcísio, que

estiveram sempre presentes em todos os

momentos desta trajetória.

Page 6: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

AGRADECIMENTOS

O desejo de vitória é uma necessidade que se faz presente em muitos momentos de

nossa vida, principalmente quando almejamos algo que parece ser tão difícil. O caminho é

árduo, cheio de situações inesperadas que trazem o sentimento de medo, ansiedade e

impotência, mas que aos poucos vão desaparecendo e dando lugar ao prazer do dever

cumprido.

Agora posso dizer que venci mais uma etapa e faço o seguinte desabafo: o percurso

rumo à realização de um sonho não é fácil, mas os bons resultados são obtidos a partir da

paciência e compressão, não adianta ter pressa. Tudo tem o seu devido tempo, não adianta

querer burlar as etapas. Durante o meu percurso acadêmico passei por inúmeros obstáculos e

até pensei que não conseguiria chegar até o fim, mas me surpreendi. Então, estou aqui para

agradecer aos que se fizeram presentes nessa longa caminhada.

Primeiramente a Deus, meu fiel escudeiro que sempre me deu forças para alcançar os

meus objetivos, sem Ele eu não teria conseguido superar os obstáculos durante toda formação

acadêmica.

A minha avó Ercília, exemplo de vida. Obrigada pelos momentos de felicidades! A

Carmem e Tânia, que me adotaram como neta, obrigada pela torcida por minha vitória, vocês

são um presente de Deus em minha vida!

A minha mãe Silvia, que me deu o dom da vida. É o exemplo de uma mulher de força

e coragem, que não mediu esforços para me educar. Representa para mim algo

incomensurável, não só por sua honestidade, mas também pela bravura em desempenhar o

papel de mãe e pai. Nunca deixou de ser presente em minha vida, serei eternamente grata!

Ao meu irmão Thiago, que hoje representa um laço de amizade. Tudo o que fiz foi

para o seu bem. TE AMO!

Ao meu esposo Tarcísio, que é um presente dado por Deus. Peço-te desculpas pelos

momentos de ausência e aproveito o ensejo para agradecer o seu apoio, principalmente pela

paciência em me conduzir todos os dias para a UFS. Essa conquista é nossa, TE AMO!

Aos meus familiares que se fizeram presentes durante essa etapa, em especial aos

meus padrinhos: Vera Lúcia e Aroaldo. E aos meus primos: Jozias, Patrícia, Andréa, Augusto

e Mariana, vocês moram no meu coração!

A minha família do coração: Rosa, Edson, Lilian, Liliane e Leilane. Obrigada pela

acolhida, vocês são muito importantes para mim!

Page 7: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

As minhas irmãs do coração: Ceiça e Maria, pela compreensão nos momentos de

ausência, vocês são inesquecíveis!

Aos professores Marcelo e Marilene, que desempenharam um papel muito importante

na minha vida. Galguei mais esse espaço por causa do empenho e compromisso despendido

por vocês durante a minha formação educacional. Os ensinamentos vêm da base!

A orientadora, Prof.ª Drª. Maria Helena Santana Cruz, que humildemente

compartilhou seu vasto conhecimento acerca do tema. Obrigada pela compreensão,

entusiasmo e apoio na elaboração desse trabalho.

Aos professores que foram responsáveis pela minha formação acadêmica, em especial

aos do Departamento de Serviço Social.

As minhas amizades constituídas no espaço universitário, Renata e Silvaneide: Muito

obrigada pela força!

Aos estagiários e profissionais do Núcleo Psicossocial da Vara de Execuções

Criminais de Sergipe, pela contribuição para o meu crescimento pessoal e profissional.

A todos da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania-SEMASC e da

Casa-Abrigo Professora Núbia Marques, pela oportunidade ímpar de realizar esse trabalho,

em especial a Assistente Social Magna, que tanto torceu por mim. Não poderia deixar de

esquecer as amigas: Luzia, Clésia e Edileuza, com as quais compartilhei meus anseios e

dificuldades.

E por fim, aos profissionais e usuárias que foram entrevistados. Agradeço pela

receptividade e confiança em expor suas representações acerca do tema pesquisado. Destarte

contribuíram imensamente para a minha formação profissional.

Finalizo brindando com todos o sabor doce da VITÓRIA!

Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira

Page 8: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

Não existe mulher que gosta de apanhar, o

que existe é uma mulher humilhada demais

para denunciar, machucada demais para

reagir e pobre demais para ir embora.

(Autor desconhecido)

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LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS

Gráficos

Gráfico 1- Distribuição geográfica das DEAM‘S por Regiões Brasil 2008 ........................... 36

Gráfico 2- Fluxograma de Atendimento 01 ............................................................................. 43

Gráfico 3- Fluxograma de Atendimento 02 ............................................................................. 44

Gráfico 4- Fluxograma de Atendimento 03 ............................................................................. 45

Gráfico 5- Origem das usuárias ............................................................................................... 57

Gráfico 6- Cor/raça das usuárias ............................................................................................. 59

Gráfico 7- Número de filhos das usuárias ............................................................................... 60

Gráfico 8- Nível de escolaridade das usuárias ......................................................................... 61

Gráfico 9- Condições de moradia das usuárias ....................................................................... 63

Gráfico 10- Profissão/Origem da renda das usuárias ............................................................. 64

Gráfico 11- Faixa etária das usuárias ...................................................................................... 65

Gráfico 12- Estado civil das usuárias ..................................................................................... 66

Gráfico 13- Tempo de convivência com o agressor ............................................................... 66

Gráfico 14- Tipo de violência ................................................................................................. 67

Gráfico 15- Tempo de permanência no abrigo ....................................................................... 68

Gráfico 16- Usuárias de substâncias psicoativas/envolvimento com o tráfico ....................... 69

Gráfico 17- Nível de escolaridade do agressor ....................................................................... 70

Gráfico 18- Estado civil do agressor ...................................................................................... 71

Gráfico 19- Cor/raça do agressor ............................................................................................ 72

Gráfico 20- Profissão ou origem da renda do agressor ........................................................... 72

Gráfico 21- Faixa etária do agressor ....................................................................................... 73

Gráfico 22- Agressores usuários de substâncias psicoativas .................................................. 73

Tabelas

Tabela 1- Serviços de Atendimento à Mulher em Sergipe ..................................................... 38

Tabela 2- Número de denúncias na DEAM ............................................................................ 39

Tabela 3- Número de abrigados .............................................................................................. 55

Tabela 4- Origem das usuárias ............................................................................................... 56

Page 10: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

RELAÇÃO DE SIGLAS E ABREVIATURAS

B.O.- Boletim de Ocorrência

CAPS- Centro de Apoio Psicossocial

COHRE- Centro pelo direito à moradia contra despejos

CPPM-Coordenadoria de Políticas Públicas para a Mulher

CRAS- Centro de Referência da Assistência Social

CREAS- Centro de Referência Especializado da Assistência Social

DEAM- Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher

DAGV- Departamento de Atendimento à Grupos Vulneráveis

IML- Instituto Médico Legal

NOB/RH/SUAS- Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de

Assistência Social

OEA- Organização dos Estados Americanos

ONG- Organização Não Governamental

ONU- Organização das Nações Unidas

PPCAM- Programa de Proteção a Criança e ao Adolescente Ameaçados de Morte

SEMASC- Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania

SGD- Sistema de Garantia dos Direitos

SUAS- Sistema Único da Assistência Social

UBM- União Brasileira de Mulheres

UBS- Unidade Básica de Saúde

Page 11: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

RESUMO

OLIVEIRA, Monique Elen Rodrigues de Araújo. O Sistema de Atendimento às Vítimas de

Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques. Trabalho de Conclusão

de Curso de Serviço Social: Universidade Federal de Sergipe. São Cristóvão/SE, 2010.

O presente estudo objetivou analisar os episódios de violência doméstica vivenciados por

usuárias da Casa-Abrigo Profª Núbia Marques no Estado de Sergipe. Coerente com os

objetivos a opção metodológica recaiu sobre a pesquisa qualitativa por meio do Estudo de

caso organizacional realizado na referida instituição que acolhe mulheres em situação de

violência doméstica e que estão sob ameaça de morte. Desta maneira a coleta de dados se deu

por várias fontes: a análise documental da instituição do período de fevereiro de 2003 a

setembro de 2009; análise de estatísticas obtidas em sites de institutos de pesquisa e na

própria instituição. Neste contexto, priorizou-se a realização de oito entrevistas

semiestruturadas com cinco usuárias e três profissionais. Os resultados informam que a

violência física é predominante entre as vítimas de cor parda, com faixa etária entre 20 e 25

anos e ensino fundamental incompleto. Em geral, as vítimas exercem apenas atividades

domésticas, convivem com o agressor e residem em sua maioria no Bairro Santa Maria em

Aracaju/SE. O agressor possui baixa escolaridade, apresentado pelo grau de ensino

fundamental incompleto, é desempregado, de cor parda, possui faixa etária entre 26 e 30 anos

e convive com a vítima. As usuárias/respondentes revelam que a resistência em denunciar o

agressor provém do medo de represália após o registro do boletim de ocorrência, por isso que

a Casa-Abrigo é um local que representa a ruptura com os episódios de violência. Apesar de

algumas falhas na rede de atendimento, os serviços oferecidos pela instituição para as

respondentes têm atendido às suas principais demandas. Entretanto considera-se que é

necessário um suporte maior na efetivação da Lei Maria da Penha e nas políticas setoriais para

fortalecer as ações no enfrentamento à violência doméstica.

PALAVRAS-CHAVE: Casa-Abrigo, Violência Doméstica, Gênero, Cidadania, Direitos.

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ABSTRACT

The present study aimed examine episodes of domestic violence experienced by users of the

Shelter House Prof. Marques Núbia in the State of Sergipe. Consistent with the objectives of

the methodological choice fell, this work on the qualitative research through case study

organizational conducted at that institution that welcomes women in situations of domestic

violence and who are under threat of death. Thus the collection of data was from several

sources: a documentary analysis of the institution from February 2003 to September 2009;

analysis of statistics obtained on websites of research institutes and the institution itself. In

this context, the priority is the completion of eight semi-structured interviews with five users

and three professionals. The results report that physical violence is prevalent among victims

of brown, aged between 20-25 years and in primary school level of education. In general,

victims are engaged only in domestic activities and are cohabiting with the offender. They are

predominantly residents of the Barrio Santa Maria in Aracaju/SE. The aggressor has low

education, presented by the degree of grade school, is unemployed, brown-skinned, aged 26-

30 years and living with the victim. Those of the users/ respondents indicate that resistance to

denounce the aggressor comes from the fear of reprisals after the record of the police report,

why the Shelter House is a place that represents a break with the episodes of violence. Despite

some flaws in the service network, the services offered by the institution for the respondents

have met their main demands. However it is necessary to consider great support to the

application of Law Maria da Penha and to the police concerned in order to strengthen the

actions in dealing with domestic violence.

KEYWORDS: Shelter House, Domestic Violence, Gender, Citizenship, Rights.

Page 13: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 13

CAPÍTULO I

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ........................................................................................ 27

1.1-Evolução da política contra a violência doméstica ...................................................... 32

CAPÍTULO II

A CASA-ABRIGO PROFª NÚBIA MARQUES ................................................................. 41

2.1-Fluxograma de atendimento ........................................................................................ 43

2.2-Transporte e acolhimento à vitima ............................................................................... 46

2.3-Equipe profissional ...................................................................................................... 47

2.4-Encaminhamentos realizados ...................................................................................... 48

2.5-Instrumentais de trabalho ............................................................................................ 49

2.6-Atribuições do Assistente Social ................................................................................. 50

CAPÍTULO III

PERFIL DAS USUÁRIAS E DOS AGRESSORES ........................................................... 54

3.1-Caracterização do perfil das usuárias .......................................................................... 54

3.2-Caracterização do perfil dos agressores ...................................................................... 70

CAPÍTULO IV

A ÓPTICA DOS AGENTES ENVOLVIDOS NO SISTEMA DE ATENDIMENTO ÀS

VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ....................................................................... 75

4.1-A óptica dos profissionais ........................................................................................... 75

4.2-A óptica das usuárias ................................................................................................... 83

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 88

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 91

ANEXOS ................................................................................................................................ 95

APÊNDICES ........................................................................................................................ 103

Page 14: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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INTRODUÇÃO

O interesse pelo estudo do tema: O Sistema de Atendimento às Vítimas de

Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques1 - deveu-se ao fato de ser

considerado como uma proposta inédita ao campo da pesquisa, pela escassez de estudos

desenvolvidos em tal direcionamento, particularmente pela possibilidade obtida com a

liberação do meu acesso à instituição como estagiária. Nesta oportunidade, mediante

observações exploratórias realizadas com as vítimas/usuárias dos serviços oferecidos pela

instituição, emergiu o interesse pelo objeto deste estudo de forma mais aprofundada.

A conjuntura em que vivemos tem mostrado cada vez mais o crescimento de episódios

de violência. O respeito ao próximo parece não mais existir, presenciamos atos de extrema

crueldade tanto pelos meios de comunicação quanto em nosso cotidiano.

A violência se caracteriza de várias formas, seja ela social em seu sentido amplo ou

aplicada em alguns segmentos da sociedade, como é o caso da violência doméstica contra a

mulher, que vem se perpetuando por vários anos, demarcando um histórico de desigualdade

nas relações de gênero entre o homem e a mulher, que no Brasil é disseminada desde quando

éramos Colônia de Portugal, ou seja, desde o início do processo de povoamento do solo

brasileiro, pelos europeus.

Conforme Vinagre (1992), a expressão violência contra a mulher é geralmente

associada à ocorrência de agressões físicas ou sexuais. Cabe lembrar, porém, que essas

violências explícitas traduzem atitudes e comportamentos de caráter mais permanente que

mesmo com ausência do ato agressivo propriamente dito, estão impregnados de conteúdo

violento, de caráter simbólico, que vão desde a educação diferenciada, a toda uma cultura sutil

de depreciação da mulher.

Outra abordagem é citada pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (2003), em seu

ensaio A dominação masculina, no qual o autor discute a violência sob uma visão

androcêntrica da sociedade, classificando-a como violência simbólica, suave, imperceptíveis

às suas próprias vítimas, que no caso são as mulheres. O autor explora o discurso fazendo

uma crítica ao conformismo que a sociedade reproduz ao achar normal todo tipo de violência

empregado na sociedade, é algo naturalizado, isto é, banalizado, uma vez que prevalece a

relação de dominação, no caso em questão, do homem em detrimento à mulher.

1 Professora Núbia Marques foi poeta, ficcionista, membro da Academia Sergipana de Letras e Professora do

Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe. Nasceu na cidade de Aracaju em

21.12.1927 e faleceu em 26.08.1999. Atuava nos estudos de comunidades, de mulheres trabalhadoras e da

igualdade de gênero. Foi exemplo de força através da realização de denúncias e organização de movimentos pela

Anistia em Sergipe na época da Ditadura Militar.

Page 15: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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A postura violenta arraigada nos relacionamentos entre homens e mulheres sempre

esteve presente na cultura machista2 desde os primórdios da sociedade, tendo como base as

contribuições de Blay (2003), em seu artigo Violência contra a mulher e políticas públicas,

no qual discute a evolução da mulher perante a família. A autora explora o fator

discriminatório do trabalho feminino, que na época era visto como motivo desagregador

familiar, uma vez que a mulher deixava em segundo plano os afazeres domésticos. Por isso a

mulher era subjugada à ordem do marido, não podendo jamais trabalhar fora de casa sem a

devida autorização deste - ato respaldado pelo Código Civil de 1916.

Em termos do relacionamento fora do casamento, a mulher era vista como adúltera e o

homem apenas era rotulado por manter uma relação de concubinato. Os crimes passionais

eram explicados pela defesa da honra, ocasionando o femicídio3, que foi amplamente

contestado pelo movimento feminista.

A situação de violência vivenciada pelas mulheres passou despercebida por muitos

anos, visto que o ato estava ligado à família, lócus considerado privado, sobre o qual ninguém

tinha o direito de opinar ou interferir. Entretanto, com a luta do movimento feminista, o

quadro foi sendo mudado, uma vez que os direitos humanos estavam sendo violados;

A luta pelo reconhecimento dos direitos femininos e a denúncia de sua

violação foram empreendidas por mulheres do mundo inteiro, destacando-se

o esforço dos movimentos feministas, de outros movimentos e organizações,

para colocar a violência de gênero na agenda política, no âmbito dos

organismos internacionais e dos diversos países. (ROCHA, 2007, p.18-19)

Segundo Rocha (2007), os movimentos feministas explicitaram lacunas e omissões

das políticas com relação aos direitos humanos que não eram efetivados para as mulheres.

Foram solicitadas na década da redemocratização, nos meados de 1980, algumas medidas que

incluíam a alteração do Código Penal, criação de Conselhos Estaduais da Condição Feminina,

do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, de Delegacias Especializadas de Defesa da

Mulher, de Centros de Atendimento Integral, de abrigos para as mulheres em situação de

violência doméstica e de serviços específicos no Instituto Médico Legal. Após várias

solicitações feministas foi modificado o artigo 233 da Lei 4.121/1962 (Estatuto da Mulher

2 Segundo Azevedo (1985), o machismo pode de ser definido como a ideologia do sexo, ou seja, como um

sistema de idéias e valores legitimador de um padrão não-igualitário de relações entre homens e mulheres: o

padrão da dominação do homem sobre a mulher. 3Neologismo que começou a ser utilizado nos meados da década de 1970 por escritoras norte-americanas

(Russel, 1992), como alternativa ao termo homicídio para designar o assassinato de mulheres por homens por

razões de gênero, tendo sido introduzida no Brasil por Almeida (1998), ao analisar processos de homicídios

conjugais e observar a relação desses crimes com a exacerbação da violência de gênero. (ROCHA, 2007 p. 51)

Page 16: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Casada), que privilegiava os homens acerca do pátrio poder, reconhecendo-o como chefe de

família e provedor do lar.

Com a destituição do poder nas mãos dos homens, as mulheres puderam questionar os

casos de violência doméstica, evidenciando o problema como algo público que requeria

serviços voltados para as mulheres violentadas, no sentido de apoiá-las no processo de ruptura

com as agressões, a exemplo dos serviços especializados de atendimento à mulher destacando

a implantação de Casas-Abrigos, que visam acolher mulheres em situação de urgência,

proporcionando segurança e tempo necessário para recuperação física e psicológica.

A partir da luta iniciada pelo movimento feminista, a violência tornou-se uma questão

pública e passou a ser estudada nas últimas décadas, constituindo-se em um território

estratégico para muitos discursos contemporâneos com diferentes análises, envolvendo uma

gama de disciplinas e divulgação de casos nos meios de comunicação- sem deixar de citar as

próprias políticas direcionadas à causa em detrimento da responsabilização do Estado para

minorar os casos de violência e nas universidades a partir da produção científica- conforme as

idéias de Araújo (2008).

A violência doméstica deixou de ser assunto privado, abrangeu os espaços públicos

com as campanhas de conscientização acerca do reconhecimento que a sua prática é uma

violação dos direitos humanos, tornando-se parte do arcabouço dos problemas sociais,

encadeando o questionamento das idéias da sociedade patriarcal4, e machista.

Apesar de a violência acontecer em vários espaços, destaca-se a realizada no lar com

pessoas que fazem parte dos vínculos sociais e afetivos da vítima, principalmente nos

relacionamentos conjugais. Toledo (2007), em seu artigo Violência Doméstica e Familiar:

uma demanda a ser enfrentada, explica que o motivo está diretamente vinculado ao espaço

privado, o qual media as relações de violência, atrelado a inúmeros fatores: a divisão sexual

do trabalho, a referência simbólica do lugar da mulher na família, pela ordem patriarcal da

mulher ser preservadora da família e dos vínculos afetivos, tudo em nome da

indissolubilidade da família e da relação conjugal.

A violência doméstica é um problema que atinge as mulheres independentemente da

idade, orientação sexual e condições financeiras. A sua consequência é, sobretudo, social e

psicológica, visto que afeta a segurança, o bem-estar, a educação, o desenvolvimento pessoal

e principalmente a autoestima das vítimas e dos de seus dependentes.

4 A designação patriarcal está relacionada ao patriarcalismo, que segundo Saffioti (1987, p. 50), ―não se resume a

um sistema de dominação, modelado pela ideologia machista. Mais do que isto, ele também é um sistema de

exploração.

Page 17: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Diante dessa reflexão fica explícita a problemática atrelada à continuidade da mulher

numa relação de violência, uma vez que há reflexos na dinâmica familiar que devem ser

considerados, sobretudo no desenvolvimento da postura agressiva dos pais na presença dos

filhos menores, que pode ocasionar problemas na educação infantil, principalmente no que

tange a reprodução da conduta violenta.

Com a necessidade de compreender a dimensão do problema social ocasionado pela

violência doméstica contra a mulher, procurou-se analisar suas múltiplas formas, tendo em

vista ser uma das mais graves expressões da questão social5 relacionadas à cidadania e aos

direitos das mulheres na crise da modernidade. Com base no problema em questão, foram

adotados os seguintes questionamentos: Qual o perfil das usuárias e dos agressores? Onde

procurar ajuda? Quais são as condicionalidades para o acesso de vítimas de violência

doméstica ao serviço de abrigamento6? Como é realizado o atendimento na Casa-Abrigo?

Qual o tipo de violência que predomina entre as mulheres acolhidas? Quais os

encaminhamentos realizados? Qual o impacto dos episódios de violência na subjetividade das

vítimas?

Sob esse aspecto, a pesquisa nada mais é que um subsídio ao enfrentamento a

violência doméstica perpetrada contra a mulher, tendo em vista um aprofundamento da

questão de gênero no que concerne ao melhor entendimento sobre a dinâmica que engendra

tais processos, proporcionando à sociedade, aos técnicos que trabalham com a questão e ao

meio acadêmico, conhecimentos atualizados da particularidade do estudo, tendo em vista o

desenvolvimento de políticas para a redução e combate a violência doméstica contra a mulher.

Para o entendimento da violência doméstica e suas consequências, a pesquisa foi

orientada por meio do objetivo geral:

Analisar episódios de violência doméstica vivenciados por usuárias da Casa-

Abrigo Professora Núbia Marques, com vistas a contribuir para um melhor

entendimento sobre seu funcionamento, proporcionando à sociedade e ao meio

acadêmico mais uma forma de combate à violência doméstica contra a mulher.

Quanto aos objetivos específicos têm-se:

Caracterizar a Rede de Proteção Social ligada ao combate da violência doméstica

contra a mulher em Aracaju;

5 Segundo Iamamoto é apreendida como ―conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista

madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da

sociedade‖. (IAMAMOTO, 2007, grifos da autora p.27) 6 Ação protetiva que tem por objetivo resguardar os usuários de situações de risco circunstancial, conjuntural,

geológico e/ou geotécnico, oferecendo moradia temporária. (Dicionário de termo técnicos da Assistência Social,

BH 2007).

Page 18: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Traçar o perfil das vítimas atendidas e dos agressores;

Mapear os episódios de violência cometidos contra a mulher, sob a ótica das

usuárias e profissionais da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques;

Analisar o impacto dos episódios de violência na subjetividade das vítimas;

Identificar quais as condicionalidades para a solicitação de abrigamento;

Identificar quais os encaminhamentos realizados pelos técnicos da instituição.

Neste sentido, a justificativa para a realização deste estudo provém da sua relevância

social e científica, tendo em vista a inexistência de pesquisas realizadas no espaço da Casa-

Abrigo Professora Núbia Marques, vinculada a Secretaria Municipal de Assistência Social e

Cidadania-SEMASC, sendo este um equipamento que acolhe mulheres em situação de

violência doméstica e que estão sob ameaça de morte. A Casa-Abrigo possui endereço

sigiloso e acesso restrito para maior segurança das mulheres abrigadas.

O estudo também apresenta relevância social por disponibilizar novos conhecimentos

de como acessar os serviços das medidas protetivas7, contribuindo para a qualidade dos

serviços prestados pelos profissionais que atuam na área. Por meio deste estudo foi possível a

divulgação dos procedimentos e encaminhamentos utilizados pela instituição, possibilitando a

apreensão de métodos de atuação para os profissionais que não conhecem a dinâmica

institucional.

Sob essa reflexão, espera-se contribuir com o maior entendimento do funcionamento

da Rede Socioassistencial8 que subsidia o combate à violência doméstica contra a mulher,

possibilitando um aprofundamento de conhecimentos dos pesquisadores da temática em

pauta. Ademais, no campo científico os resultados do estudo da Casa-Abrigo em Sergipe,

permitem o aprimoramento de trabalhos futuros, no sentido da expansão de conhecimento das

refrações da questão social, sendo a violência doméstica perpetrada contra a mulher, um

assunto corrente em toda sociedade.

É importante destacar que no campo do Serviço Social o Assistente Social está

incluído na divisão sócio técnica do trabalho, e dele é exigida a compreensão das causas e

consequências dos problemas societários. Ele é cada vez mais cobrado a responder às

necessidades da classe trabalhadora e do sistema capitalista.

7Conjunto de medidas que asseguram a integridade física e psíquica da mulher, que garante o direito de ir e vir,

de continuar trabalhando, de permanência no lar, inclusão em programas do governo e a garantia de manutenção

de vínculo trabalhista até seis meses, caso seja necessário o afastamento da vítima do trabalho. 8Conjunto integrado de ações, da iniciativa pública e da sociedade, que ofertam e operam benefícios, serviços,

programas e projetos, o que supõe a articulação entre todas essas unidades de provisão de proteção social, sob a

hierarquia de básica e especial, e ainda por níveis de complexidade. (BRASIL. NOB, 2005, p. 19)

Page 19: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

18

A violência doméstica é mais uma das expressões da questão social, a qual deve ser

abordada pelo Assistente Social de maneira minuciosa, não só pela escassez de trabalhos

desenvolvidos nesta área, mas também pelo papel desse profissional em promover o acesso a

cidadania de seus usuários, que se dá pelo processo de esclarecimento dos direitos inerentes a

cada público. No caso em questão o Assistente Social contribuirá ao enfrentamento a

violência doméstica contra a mulher a partir da promoção do empoderamento das vítimas, por

meio de informações e encaminhamentos, fomentando um espaço de conquista da autonomia

feminina.

Nessa linha de pensamento, é necessário que o Assistente Social compreenda a

conjuntura em que vivemos e associá-la ao processo de reflexão na intervenção profissional,

em face ao projeto político neoliberal que acirra as refrações da questão social, naturalizando-

a e causando o desmonte das políticas sociais. Em decorrência dos fatos abordados, pode-se

observar;

O caráter do projeto neoliberal se expressa, de um lado, na naturalização do

ordenamento capitalista e das desigualdades sociais coletivas e suas lutas na

construção da história; e, de outro lado, em um retrocesso histórico

condensado no desmonte das conquistas sociais acumuladas, resultantes de

embates históricos das classes trabalhadoras, consubstanciadas nos direitos

sociais universais de cidadania, que têm no Estado uma mediação

fundamental. (MOTA et. al.; 2006, p. 163)

Para a superação da naturalização da questão social, mais especificamente da violência

doméstica, é preciso que o Assistente Social tenha a competência para propor, negociar e

articular, isto é, buscar mecanismos que viabilizem os direitos sociais das mulheres atendidas,

que necessitam de um acolhimento direcionado e sem julgamentos. É necessário entender a

história de vida de cada usuária e utilizar as estratégias apreendidas pela categoria mediação9

como campo reflexivo, que qualifica o profissional de modo que a cada caso atendido seja

gerada a instrumentalidade necessária que decorre do acúmulo de experiências e leitura da

realidade.

A partir daí o Assistente Social poderá instigar as usuárias vítimas de violência

doméstica a fazer uma reflexão sobre a realidade em que estão enquadradas, principalmente

no fomento de estratégias para a ruptura com os relacionamentos conflituosos, sob os ditames

de uma cultura machista, que destitui o direito a cidadania e a liberdade de pensamento.

O atendimento social deve está vinculado ao compromisso de orientação dos direitos

pertinentes a cada usuária. É relevante mencionar que a partir do esclarecimento o Assistente

Social abre um leque de possibilidades para o enfrentamento a violência, como por exemplo,

9 De acordo com Pontes (2000), as mediações significam, no plano metodológico, a captura das articulações e

passagens vivas que se processaram entre as instâncias envolvidas na trama histórica.

Page 20: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

19

a identificação da vítima não como sujeito passivo, mas como sujeito agente e ativo, que pode

mudar a situação de vulnerabilidade em que se encontra.

Uma resposta mais geral sobre as razões pelas quais ocorre discriminação e violência

contra a mulher é a persistência de uma mentalidade patriarcal e machista, que continua

enraizada nas mentes dos homens e, também, de muitas mulheres, apesar das transformações

socioculturais nas formas de sexualidade, nas relações afetivas, nas estruturas e convivências

familiares.

Compreende-se que a violência doméstica contra a mulher pode manifestar-se das

mais diversas formas, seja ela física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial caracterizada

pela exposição da mulher a situações humilhantes e constrangedoras, sendo mais comuns em

relações com grau de parentesco, onde predomina condutas negativas dirigidas à vítima por

subordinar-se ao agressor, desestabilizando-a em seu convívio familiar. É um aspecto

conotativo atribuído ao papel do homem como ―dono‖, ―chefe de família‖, ou seja, ―o todo

poderoso‖, em que a mulher passa a ficar sob seu domínio, numa relação de propriedade. A

partir desta situação, o homem passa a justificar que na relação conjugal todo ato em nome da

honra passa a ser aceitável.

É importante destacar que os padrões patriarcais vigentes integram a moldura de

sociabilidade na sociedade brasileira e sergipana, condicionando a emergência de conflitos no

cotidiano das mulheres abrigadas em situação de violência doméstica. Compreende-se que o

conflito pode ser positivo para a socialização, pois ele não tem somente como versão aquela

que acabamos de mencionar. Segundo Nunes,

O conflito pode ser destruidor, mas também pode ser construtivo. Quais

seriam essas dinâmicas diferentes? Para que o conflito seja positivo é

necessário que os interlocutores possam expressar e defender ―suas

verdades‖, ou seja, que a polaridade seja reconhecida como possível.

(NUNES, 2006 [página desconhecida])

Contudo, as vítimas da violência doméstica em geral, não têm oportunidade de

defender seus pontos de vista e suas verdades, isto é, elas não têm chances de desenvolver

argumentos elucidativos com os agressores, tendo em vista a falta de diálogo. As relações são

pautadas na punição física, o que destitui o direito da mulher em falar e expor suas indagações

e idéias. Conforme Cruz adverte, as tensões vividas por mulheres em situação de violência

doméstica não se reduzem ao campo econômico obviamente, mas a essas formas de

desigualdade de reconhecimento. Igualmente, pouco se reflete sobre a mudança social que

ocorre quando os atores que não tinham vozes legítimas passam a ser considerados como

atores na relação de conflito em seu sentido construtivo. Isto é, quando se passa de uma

Page 21: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

20

violência para um conflito, este é o primeiro passo para o reconhecimento do outro, e também

o passo necessário para a mudança social. A culpa da má-adaptação é sempre colocada nos

sujeitos ou nas instituições, mas essas adaptações não colocam em xeque a reprodução das

instituições, mesmo se elas adoecem ou se adoecem o sujeito. Parece que não haveria outra

saída a não ser uma adaptação dolorosa ou uma vivência de conflitos de natureza violenta.

(CRUZ, 2009).

Segundo Nunes (2006), nas relações de violência, o outro não é reconhecido. Para que

um sujeito se reconheça na polaridade do conflito, é necessário o seu autorreconhecimento.

Entretanto, isso não quer dizer que depende somente de sua pretensão, mas também do

reconhecimento dos outros, não como um ser diferente e sim como alguém que tem direito à

sua diferença.

Nessa reflexão é possível dizer que as mulheres em situação de violência em várias

ocasiões deixam de ser reconhecidas como sujeito. Segundo Silveira,

As mulheres desempenha(ra)m na História papéis de considerável

importância, mesmo quando ainda restritas ao espaço privado, como esteio

da reprodução familiar. Com a conquista do espaço público, ampliaram a sua

atuação e hoje exercem as mais diversas profissões, inclusive aquelas que,

durante muito tempo, eram consideradas masculinas. De dirigidas, passaram

a dirigentes, tanto chefiando famílias quanto empresas e instituições

políticas. Apesar de todo o avanço da questão feminista, sobretudo a partir

da 2ª metade do século XX, ainda é bastante forte a discriminação e a

violência praticadas contra as mulheres, nas mais diversas sociedades, nelas

incluída a brasileira [e a sergipana]. Agressões, assédio sexual,

espancamentos, estupros, assassinatos, violência simbólica, são algumas das

formas de violação de direitos, embutidos na violência contra as mulheres,

presentes na vida cotidiana, de forma explícita ou muitas vezes silenciadas.

Afora a antiga e persistente mercantilização do corpo (a prostituição), a que

muitas mulheres se submetem para sobreviver, agora é também atualizada

pelo turismo sexual. (SILVEIRA, 1998)

O Brasil, mais precisamente o Nordeste, concentra a cultura patriarcal, em especial nas

camadas familiares de baixa renda, em que a regra básica consiste na submissão da mulher em

relação ao homem, dos filhos diante do pai e/ou mãe e dos mais novos frente aos mais velhos.

Na cultura patriarcal tudo que está relacionado ao mundo doméstico é feminino, e,

portanto deve ser assumido pela mulher, entretanto os assuntos direcionados à rua, pertencem

ao universo masculino e deve ser assumido pelo homem, ou seja, a ele cabe a posição de

provedor e a mulher a de dona de casa.

Contudo, vale ressaltar que diante desta reflexão as relações entre o homem e a

mulher, é sempre pautada na subordinação, em que a mulher deve obedecer aos mandos e

desmandos do marido, atitude que legitima a violência física ou simbólica contra a mulher.

Page 22: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

21

Da Mata, diz que a família em sua versão patriarcal10

significa um valor e uma forma

ideológica básica para toda a sociedade brasileira. Para o referido autor, a família para os

brasileiros não é apenas uma possibilidade de resolver a questão sexual ou uma operadora da

reprodução física do sistema:

Ela é também banco e escola, agência de Serviço Social e igreja,

consultório médico e partido político, máquina de controlar o tempo e lugar

onde temos cidadania perpétua, restaurante de luxo e local onde sabemos

ser amados incondicionalmente. (DA MATA, 1987, p. 136).

Para Almeida (1987, p. 63), o modelo patriarcal gilbertiano é um referencial, faz parte

da formação brasileira e é este modelo que se ―casa‖ posteriormente com o modelo da família

nuclear burguesa, “que será reapropriado e adaptado pela mentalidade da família

patriarcal”. Segundo Roberto da Matta, entende-se por modelo patriarcal brasileiro:

A parentela de mais de duas gerações, com agregados, que age de modo

corporado quando em crise e possui uma chefia indiscutível, bem como

recursos de poder que o grupo cuida de manter e distribuir com cuidado e

decisão, o que faz também com que esses grupos possam eventualmente

chegar ao poder por meio do uso de relações pessoais. (DA MATTA, 1987,

p.119 -120).

Para Da Matta (1987), tal modelo é estruturador de toda uma concepção hierárquica de

formas de famílias, completas umas e incompletas outras. A incompletude (famílias

monoparentais, famílias sem agregados) das periféricas se deve à sua função de ―sustentar‖ e

―servir‖ às primeiras. O autor vai além, entende que no Brasil o valor da família como

prestígio se estende por toda a sociedade11

.

O valor da família gira em torno do valor metafórico da ―casa‖ e que chega a

se constituir em um princípio ordenador quase cosmológico: o ―mundo da

casa‖ que é percebido como distinto, muitas vezes oposto ao ―mundo da

rua‖, mundo da universalidade de direitos, mas também da impessoalidade.

(DA MATTA, 1987 p.125).

Ainda é corriqueiro que boa parte da sociedade continue com padrões masculinizantes

de interpretar o mundo e exercer as práticas sociais, principalmente em enxergar o outro com

preconceito, desqualificando e julgando de acordo com princípios moralistas, por este (ser

10

Historiadores, sociólogos e antropólogos brasileiros já destacaram a importância da ―família patriarcal‖ tal

como caracterizada por Gilberto Freire em Casa-Grande & Senzala (2002, p. 97), para a construção social de

um tipo de modelo familiar que fez efeito em toda a sociedade colonial, mas também no período da

Independência, da República até a contemporaneidade, senão para impor uma mesma forma de família, mas para

instaurá-la como modelo referencial. 11

“Quem não tem família já desperta pena antes de começar o entrecho dramático; e quem renega sua família

tem, de saída, a nossa mais franca antipatia‖ (Da MATTA, 1987, p. 125).

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humano) não pensar e agir do mesmo modo que ela pensa e age, especialmente em torno

dessa problemática espinhosa que é o relacionamento de gênero.

No Brasil, ainda são escassos os estudos que se propõem a investigar o fenômeno da

violência doméstica relacionando-o às questões de gênero, no que se refere à violência e sua

incidência nas famílias contemporâneas12

. Contudo, nas cidades, nas famílias, no interior dos

lares, no campo, nos hospitais, nas favelas, nos bancos escolares, nas empresas e em cada

parte da nossa sociedade, as mulheres são discriminadas.

Considerou-se que a formulação de hipóteses, no processo de investigação científica, é

precisamente a segunda parte deste modo de operar inaugurado pela formulação de um

problema. Antes de tudo, a hipótese corresponde a uma resposta possível ao problema

formulado — a uma suposição ou solução provisória mediante a qual a imaginação se

antecipa ao conhecimento, e que se destina a ser ulteriormente verificada (para ser confirmada

ou rejeitada). A hipótese é na verdade um recurso de que se vale o raciocínio humano diante

da necessidade de superar o impasse produzido pela formulação de um problema e diante do

interesse em adquirir um conhecimento que ainda não se tem. É um fio condutor para o

pensamento, através do qual se busca encontrar uma solução adequada, ao mesmo tempo em

que são descartadas progressivamente as soluções inadequadas para o problema que se quer

resolver. (BARROS, 2008).

Neste sentido, para este estudo, foram antecipadas algumas hipóteses:

A violência doméstica perpetrada contra a mulher é gerada pela desestruturação

familiar, ocasionada pela utilização de substâncias psicoativas dos agressores;

Dentre alguns aspectos, a mulher em situação de violência apresenta um nível de

escolaridade e qualificação profissional aquém do exigido no mercado de trabalho;

As mulheres em situação de violência doméstica frequentemente possuem o perfil

de dependência econômica e emocional do parceiro;

Nessa linha de reflexão foi indispensável a utilização de uma metodologia capaz de

dar suporte ao tema em questão, no que concerniu ao entendimento e desenvolvimento dos

mecanismos da leitura imbricada na realidade.

O campo empírico da pesquisa foi a Casa-Abrigo Professora Núbia Marques criada em

dezembro de 2002 e inaugurada em fevereiro de 2003, a partir de convênio entre a Prefeitura

12

Cf. os trabalhos de Minayo (2003), Ibias e Grossi (2001), Menezes (1999), Souza (1998) et al., Figueiredo

(1998).

Page 24: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

23

Municipal de Aracaju, através da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania-

SEMASC e a União Brasileira de Mulheres do Estado de Sergipe-UBM.

A pesquisa foi realizada com base no materialismo histórico-dialético que;

É uma categoria que indica a realidade objetiva dada ao homem por meio de

suas sensações e que existe independente dele. [...] a dialética está vinculada

ao processo dialógico de debate entre posições contrárias, e baseada no uso

de refutações ao argumento por redução ao absurdo à verdade.

(RICHARDSON, 2007, p. 44-45)

O materialismo histórico dialético foi utilizado para o entendimento da dinâmica

social envolvida pela violência perpetrada contra a mulher, tendo em vista ser a corrente

filosófica que mais se enquadrava na busca do estudo contínuo dos acontecimentos. Dessa

forma procurou-se o entendimento da contradição gerada pela violência doméstica na

abordagem de gênero, visto que esta é resultante de um processo histórico e dinâmico

engendrado na sociedade. Por exemplo, a violência doméstica é também resultado da

conjuntura da sociedade brasileira na qual o desemprego, o trabalho precário integram grande

segmento da população de agressores e vítimas da violência doméstica. Nesta conjuntura com

frequência, as vítimas tornam-se dependentes do agressor e ficam presas nos grilhões da

violência.

Com base nas características do objeto, a opção metodológica recaiu sob o Estudo de

caso organizacional, que para Gil (1991, p.58), ―é caracterizado pelo estudo profundo e

exaustivo de poucos objetos, de maneira que permita o seu amplo e detalhado conhecimento‖,

seguindo a definição criada por Yong, à qual Gil adere, que diz:

[...] um conjunto de dados que descrevem uma fase ou a totalidade do

processo social de uma unidade, em suas várias relações internas e nas suas

fixações culturais, quer seja essa unidade uma pessoa, uma família, um

profissional, uma instituição social, uma comunidade ou uma nação.

(YOUNG, 1960 apud GIL, 1991, p. 59)

Para complemento da investigação, também foi utilizada a pesquisa exploratória, que

segundo Gil;

[...] têm como finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e

idéias, tendo em vista, a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses

pesquisáveis para estudos posteriores. Habitualmente envolvem

levantamento bibliográfico e documental, entrevistas não padronizadas e

estudos de caso. (GIL, 2006, p.43)

A Pesquisa exploratória, segundo Gil (1991, p.45), ―têm como objetivo proporcionar

maior familiaridade com problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir

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hipóteses‖. Foram considerados na pesquisa os dados qualitativos e quantitativos das usuárias

acolhidas entre janeiro de 2006 a setembro de 2009, tendo em vista que os dados anteriores ao

referido período encontravam-se incompletos para a análise da pesquisa. O trabalho de campo

ocorreu a partir da dinâmica diária da instituição em questão.

Foram utilizadas diferentes fontes de coleta de dados, dentre elas:

a) Análise documental13

existente na instituição no período de fevereiro de 2003 a

setembro de 2009, no qual foram analisados os documentos que possuíam dados

relevantes para o maior entendimento do funcionamento: os instrumentais de

trabalho, tabelas, formulários e etc., com vistas a clarificar a dinâmica dos serviços

oferecidos. Já para o perfil das usuárias e agressores foram verificados os

documentos compreendidos entre janeiro de 2006 a setembro de 2009.

b) Dados Estatísticos extraídos do site do Observatório da Lei Maria da Penha, criado

pela iniciativa da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da República,

iniciado em setembro de 2007 e de outros sites especializados no tema;

c) Entrevistas14

semiestruturadas com cinco usuárias e três profissionais da

instituição, escolhidos intencionalmente. A entrevista semiestruturada segundo

Richardson (2007), visa responder a alternativas pré-formuladas, para obter do

entrevistado o que ele considera mais relevante nos aspectos de determinado

problema.

Após a coleta dos dados, realizou-se a organização, de modo que, a compreensão do

cotidiano institucional fosse de fácil entendimento. Foi utilizada a análise de conteúdo que

conforme Bardin (2007, p.27), ―é um conjunto de técnicas de análise das comunicações‖ O

autor destaca que ―não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com

maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e

adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações‖.

Conforme Richardson,

A análise de conteúdo deve ser eficaz, rigorosa e precisa. Trata-se de

compreender melhor um discurso, de aprofundar suas características

(gramaticais, fonológicas, cognitivas, ideológicas etc.) e extrair os momentos

mais importantes. Portanto, deve basear-se em teorias relevantes que sirvam

13

Envolve diversos procedimentos: codificação das respostas, tabulação dos dados e cálculos estatísticos. Após,

ou juntamente com a análise, pode ocorrer também a interpretação dos dados, que consiste, fundamentalmente,

em estabelecer a ligação entre os resultados obtidos com outros já conhecidos, quer sejam derivados de teorias,

quer sejam de estudos realizados anteriormente. (GIL, 1991, p. 102) 14

A entrevista é uma técnica importante que permite o desenvolvimento de uma estreita relação entre as pessoas.

É um modo de comunicação no qual determinada informação é transmitida de uma pessoa A a uma pessoa B.

(RICHARDSON, 2007, p. 207)

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25

de marco de explicação para as descobertas do pesquisador.

(RICHARDSON, 2007, p.224)

Com a análise dos dados serão expostos os perfis das usuárias e dos agressores,

permitindo o acesso aos fatos no sentido de desvelar as causas da violência doméstica,

indicando se esta é resultante da condição da vida familiar das vítimas.

A pesquisa foi sistematizada em quatro capítulos:

Na Introdução serão abordados os pontos norteadores da pesquisa, direcionada pela

delimitação do tema, com uma breve apresentação do assunto, além das técnicas utilizadas

durante a pesquisa, como: questionamentos, justificativa, objetivos, hipóteses e metodologia.

No Capítulo I, haverá a abordagem da fundamentação teórica, com aprofundamento

do conhecimento sobre a violência em seu sentido geral e sua dimensão voltada para o âmbito

doméstico e familiar. A conceituação da violência doméstica e de gênero, a origem de

submissão da mulher para com o homem sob a ótica de poder e do estigma atribuído desde o

primórdio da sociedade, principalmente nas justificativas bíblicas, o preconceito social frente

às ações femininas que divergem do manual de ―boas convenções‖ e a evolução da política de

violência doméstica, evidenciando como os casos eram tratados, bem como se caracterizavam

os episódios. Em seguida será analisada a restrição da mulher como sujeito de direitos, visto

que os mesmos eram constantemente violados com a negação de liberdade de pensamento e

ação. Serão postas as reivindicações do movimento feminista, com a proposta políticas de

enfrentamento à violência doméstica. A partir desse momento haverá a análise das mudanças

atribuídas ao modo de se lidar com a violência e a intervenção do Estado frente aos casos até

os dias atuais com a identificação da rede de proteção social responsável por atender as

vítimas.

No Capítulo II, será focalizado o atendimento realizado pela Casa-Abrigo Professora

Núbia Marques, com vistas a divulgar os serviços disponibilizados pela instituição, bem como

a dinâmica que tal equipamento proporciona à rede de atendimento às vítimas de violência

doméstica em todo o Estado.

No Capítulo III, realizar-se-á um apanhado geral sobre o perfil das usuárias da Casa-

Abrigo e seus agressores, tendo em vista o conhecimento mais aprofundado da causa da

violência doméstica, no sentido de desvelar a realidade de acordo com algumas variáveis

consideradas importantes na pesquisa.

No Capítulo IV, haverá o relato sobre a óptica dos agentes envolvidos no sistema de

atendimento da Casa-Abrigo, momento crucial da pesquisa, considerando a importância da

Page 27: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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autonomia dos profissionais e usuárias, buscando a priorização de suas falas e idéias a

respeito da violência doméstica em seu sentido amplo, como também na dinâmica da Casa-

Abrigo, apontando as dificuldades e sugerindo mudanças para uma melhor prática no

atendimento às mulheres em situação de violência.

E por fim nas Considerações Finais, com a reflexão do resultado da pesquisa através

da refutação ou confirmação das hipóteses geradas no princípio do estudo, bem como da

realidade atrelada à violência doméstica e suas consequências.

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CAPÍTULO I

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A violência vem sendo estudada cada vez mais no decorrer das últimas décadas, por

causa da presença de vários episódios tristes que se proliferam na sociedade. De acordo com

Minayo (1998), a violência não é objeto específico da medicina, mas também social, que

muitas vezes está embutida em aspectos da política e sociologia,

Segundo Azevedo:

Violência é toda iniciativa que procura coação sobre a liberdade de alguém,

que tenta impedir-lhe a liberdade de reflexão, de julgamento, de decisão e

que termina por rebaixar alguém ao nível de meio ou instrumento num

projeto, que o absorve e engloba, sem tratá-lo como parceiro livre e igual. A

violência é uma tentativa de diminuir alguém a renegar-se a si mesmo, a

resignar-se à situação que lhe é proposta, a renunciar a luta, a abdicar de si.

(VILELA, 1977 apud AZEVEDO, 1985, p. 19)

É pertinente dizer que muitos atos de violência são resultantes de acúmulos

deficitários de uma ordem social, os quais desestruturam famílias e acabam dilacerando a

saúde de seus integrantes. A principal vítima ainda é a mulher, que pelo seu histórico

permanece como alvo das agressões.

Para Rocha,

A violência doméstica é constitutiva de uma ordem social androcêntrica,

caracterizada pelas relações de dominação, exploração, hieraquia e

assimetria entre os gêneros. Seu alvo principal são as mulheres, de diferentes

faixas etárias, condição social e pertencimento étnico/racial. (ROCHA, 2007,

p. 29)

Segundo Saffioti (2001), a violência doméstica é um conceito mais amplo, que

abrange não só as mulheres, como também crianças e adolescentes de ambos os sexos, dentro

de relações com pessoas do convívio familiar. É importante destacar que a autora explora o

estudo da sociedade sob o exercício da função patriarcal15

, cujos homens detêm o poder de

determinar a conduta dos ―submissos‖.

Nesse sentido, pode-se dizer que os homens possuem a autorização e a tolerância por

parte da sociedade para punir o que se lhes apresenta como desvio, o que ratifica a garantia de

obediência das vítimas aos ditames do patriarca, tendo em vista o uso da força e da coerção.

15

De acordo com Pana (1981), o patriarcalismo tem como característica o estabelecimento do poder masculino

nas relações como resultado de um processo histórico que pressupõe condições ideológicas para o seu

estabelecimento e manutenção, dentre eles a idéia que o masculino é superior ao feminino.

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A violência de gênero está ligada à forma desigual à que a mulher é submetida, através da

ideologia do ―sexo forte‖, que pode fazer tudo, e do sexo frágil que nada é permitido. É uma

questão cultural, pode-se notar que em vários países desde muitos séculos as mulheres têm sido

tratadas com diferença por serem responsáveis por algumas mazelas que acontecem na sociedade,

como na antiga Grécia, por exemplo.

Os mitos contavam que, devido à curiosidade própria de seu sexo, Pandora

tinha aberto a caixa de todos os males do mundo e, em conseqüência, as

mulheres eram responsáveis por haver desencadeado todo o tipo de desgraça.

A religião é outro dos discursos de legitimação mais importantes. As grandes

religiões têm justificado ao longo dos tempos os âmbitos e condutas próprias

de cada sexo. (PULEO, 2004, p. 13)

O Cristianismo através de escrita registrada na passagem da Bíblia afirma que a

mulher foi a responsável pelo pecado transmitido ao homem, por meio de sua desobediência e

sedução para o errado, o que acarretou na perda do paraíso e condenação de toda humanidade.

De acordo com Dias (2005), em seu artigo Violência doméstica contra a mulher –um

apanhado histórico, a mulher desde os tempos bíblicos sofre com a violação de direitos mais

essenciais, como direito à vida, à liberdade de pensamento e até mesmo do próprio corpo.

Na introdução do livro A mulher na língua do povo, lançado em 2007 pela editora

Achiamé, a autora faz a seguinte abordagem;

A narrativa bíblica da criação da mulher a partir de uma costela de Adão é a

responsável pela mais antiga queixa feminina contra a sociedade patriarcal.

Até hoje, o mito da natural dependência do segundo sexo em relação ao

homem tem-se perpetuado. Entretanto, sabemos que cada cultura oferece à

mulher uma visão dela mesma, um estereótipo. (LEITÃO, 2007, p. 11)

Na antiga Grécia a mulher ocupava posição equivalente à dos escravos no sentido de

que tão-somente estes executavam trabalhos manuais, extremamente desvalorizados pelo

homem livre. Em Atenas ser livre era, primeiramente, ser homem e não mulher, ser ateniense

e não estrangeiro, ser livre e não escravo. Há uma tradição na relação de poder do homem

sobre a mulher, de longos anos, nas culturas e civilizações passadas. Entretanto, algumas

ações não mudaram, até hoje ainda é corriqueiro o comportamento preconceituoso até no

campo da educação no que diz respeito à aprendizagem infantil, onde se nota a discriminação

entre menino e menina, uma vez que ocorre a segregação embutida na separação de

atividades, comportamento, vestimentas etc, trazendo à tona a questão do machismo e valores

cultivados pela religião.

Saffioti (1987), caracteriza a violência de gênero como tudo que tira os direitos

humanos na perspectiva da manutenção das desigualdades hierárquicas existentes para

garantir a obediência, a submissão de um sexo a outro. A autora destaca que gênero parte de

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uma cultura arcaica que afirma ser o homem superior a mulher, que muitas vezes é reafirmado

pelas mulheres que se submetem a posição de inferioridade.

Araújo (2008), em seu artigo Gênero e violência contra a mulher: o perigoso jogo de

poder e dominação, faz a seguinte indagação: Por que essas mulheres permanecem na relação

abusiva? A resposta da mesma se respalda na ideologia de gênero, que segundo a autora é um

dos principais fatores que levam as mulheres a permanecerem em uma relação como esta, já

que muitas delas interiorizam e naturalizam a situação de violência em que vivem. Além da

ideologia de gênero, também aparece como motivo, a dependência emocional e econômica, a

valorização da família e idealização do amor, assim como o casamento até que a morte os

separe.

São inúmeros fatores que inibem a denúncia da mulher, seja pelo medo de represália

ou pelo conformismo adquirido culturalmente, com a idéia de que o sexo feminino é frágil e

que necessita de cuidados, a exemplo da descrição elucidada abaixo;

[...] a idéia que prevaleceu foi a transmitida pelo romantismo da cavalaria:

uma mulher frágil e indolente, entretida em bordados e bandolins, à espera

de seu cavaleiro andante. Esta imagem, que por um lado exclui a grande

massa de mulheres até de uma representação simbólica, por outro reflete

uma visão distorcida. Existe assim, uma defasagem entre a posição concreta

da mulher na vida cotidiana e a representação simbólica de seu papel.

(ALVES, 2007, p. 19-20)

Desta forma também é perceptível que muitos homens e algumas mulheres ainda

reproduzem e têm como referência o conceito da mulher dona de casa, que cuida dos filhos e

do marido. Outra característica bastante usual é a passividade que a mulher deve ter segundo

Leitão (1981), que debate sobre a posição da mulher como inferior, sem poder de iniciativa e

nivelada à condição de propriedade, o que destitui a humanização e identidade feminina,

como se fosse nada mais que um mero objeto.

É uma relação de posse: o sexo feminino é subjugado à concepção de simples objeto,

além do estereótipo criado pela sociedade, em que a aparência é muito mais valorizada do que

a capacidade intelectual. Diz Leitão (1981, p. 23), ―basta ser bonita para ter um lugar

assegurado dentro da sociedade, que a estereotipa como sendo aquele ente que não precisa ser

culto, nem inteligente e, até mesmo, em alguns casos, esses predicados assustam o homem‖.

Para não ser rechaçada, as mulheres se submetem à busca de uma beleza física, como

algo integrante de sua vida, só para atender aos requisitos da preferência masculina e social.

Desde pequena é educada com traços de dependência, com a super proteção. A mãe sempre

deve zelar pela reputação da filha, ensinar-lhe a se comportar perante a sociedade, algo

Page 31: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

30

dificilmente realizado pelo pai, a ele cabe o papel de fiscalizar, julgar e punir as atitudes que

por ventura quebrem as convenções da sociedade machista.

Na infância os presentes das meninas são relacionados com as atividades domésticas e

com a função de mãe, a exemplo das bonecas, casinhas, vassouras, panelas. É totalmente

questionável quando uma mulher resolve não casar e ter filhos. É como se ela estivesse

negando a natureza a que foi destinada, contrariando a vontade divina, e por isso nunca será

completa, abrirá espaço para a mulher estigmatizada como mal amada e seca.

Há vários manuais de conduta feminina para gerar a ordem da sociedade que, no

entanto, nega o direito de ir e vir, da liberdade de pensamento. Normas que compõem os

direitos humanos são interpretadas, na maioria dos casos, para os homens e não para a

população em geral. A mulher também faz parte do universo humano, não está à parte, e por

isso merece ser tratada como sujeito de direitos, como cidadã.

É uma constante a violência enfrentada pelas mulheres, até mesmo nas palavras

utilizadas para designar relações e atos. O homem que namora várias mulheres é chamado de

garanhão, gostosão, Dom Juan. A mulher que porventura realize a mesma atitude é

considerada como galinha, assanhada, sem-vergonha etc.

Situações mínimas, mas que são retratadas no cotidiano vivido pelas mulheres,

perpassando pela infância, adolescência, juventude e velhice, mostram o preconceito velado

nas relações sociais em geral, desde a educação até o almejo de uma carreira profissional com

sucesso. Para que as mulheres alcancem uma posição de respeito e poder é necessário o

esforço maior que o desempenhado pelo homem, porque a mulher desempenha a função de

mãe, esposa, estudante, profissional etc., porém, em contrapartida, os homens possuem uma

carga menor com relação às atividades diárias desenvolvidas pela mulher.

Segundo Gomes (2008), em seu artigo A dimensão Simbólica da Violência de Gênero:

uma discussão introdutória, o modelo da masculinidade com o poder em seu eixo, é

justificado pela idéia de que o masculino é superior ao feminino, o que contribui para o

comportamento de dominação do homem sobre a mulher, fazendo com que elas sejam

excluídas dos momentos decisórios.

Isto revela o motivo de as mulheres serem subjugadas à violência simbólica que de

acordo com Bourdieu é entendida como;

[...] violência suave, insensível, invisível às suas próprias vítimas, que se

exerce essencialmente pelas vias puramente simbólicas da comunicação e do

conhecimento, ou, mais precisamente, do desconhecimento, do

reconhecimento ou, em última instância, do sentimento. (BOURDIEU, 2003,

p. 7-8)

Page 32: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

31

As vítimas não reconhecem o processo da subordinação, acham natural a posição à

qual são alocadas, seja pelo desconhecimento ou pelo entendimento cultural de subordinação.

Outra justificativa é atribuída a dependência emocional da vítima do agressor. Sob essa

dinâmica, acabam de maneira indireta e geralmente inconsciente reproduzindo o ciclo de

violência e preconceito contra o universo feminino, respaldando os relacionamentos

conflituosos.

As mulheres em situação de violência geralmente apresentam a idéia de mantenedoras

da ordem familiar, ou seja, são incapazes de reivindicar e denunciar a violência sofrida para

não destruir a imagem sagrada que a sociedade impõe, uma vez que tudo que acontece dentro

de casa é para ser mantido em sigilo. Essa atitude apresenta da idéia patriarcal do espaço

privado, onde ninguém pode intervir. Sobre o assunto, destaca Rocha:

[...] é caracterizada como uma questão relativa estritamente à esfera privada,

encoberta também pela ideologia que apresenta a família como uma

instituição natural, sagrada, na qual se desenvolvem apenas relações de

afeto, amor, proteção, a ser preservada pela sociedade. (ROCHA, 2007,

p.29)

É a manifestação da cultura androcêntrica, em que a mulher é um ser inferior, cuja

conceituação atravessou séculos e perdura até os dias atuais, resultante de uma visão

equivocada que atribui maior ou menor valor ao ser humano através da diferença entre os

sexos. Dessa forma, a mulher deve desenvolver atividades do lar, cuidar do marido e dos

filhos. Strey; Cabeda (1998, p.15 grifos originais) destacam: ―As representações da mulher

atravessam os tempos e estabeleceram o pensamento simbólico da diferença entre os sexos: a

mãe, a esposa, a ‗a rainha do lar‘, digna de ser louvada e santificada, uma mulher sublimada‖.

Tais concepções confinam as mulheres ao papel de mãe, esposa e ―dona do lar‖,

somente no sentido de execução dos afazes domésticos e não na autonomia das ações e no

poder de decisão, desmerecendo a sabedoria feminina para ocupar posições na sociedade e

gerando a discussão da categoria gênero.

Como defendem Strey; Cabeda (1998, p.28), ―Gênero tem sido o termo utilizado para

teorizar a questão da diferença sexual, questionando os papéis sociais destinados às mulheres

e aos homens‖. A questão de gênero segundo as autoras é resultante da dinâmica social e não

da natureza, da biologia e muito menos do sexo.

A dinâmica do gênero foi construída pela sociedade na relação entre os sexos, fator

que engendrou a constante indagação e discussão sobre as atividades atribuídas às mulheres.

Para melhor compreender o processo será evidenciada a evolução da política e luta feminina.

Page 33: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

32

1.1-Evolução da Política contra a violência doméstica

A violência doméstica perpetrada contra a mulher data de tempos remotos, resultante

de uma sociedade machista, de sobreposição de poder do homem sobre a mulher. A

desigualdade de gênero sempre esteve presente, a exemplo do que diz Azevedo (1985), a

Idade Média foi uma época violenta, os castigos físicos, a flagelação e tortura eram

legitimadas pelos poderes civis e eclesiásticos. Até então, quase não se questionava o direito

que os homens teriam de agredir suas mulheres, direito esse reconhecido e sancionado por

tribunais civis e religiosos.

A mulher tinha seus direitos restritos, era educada desde pequena para os serviços

domésticos e consequentemente para o casamento. Para ser uma boa mulher deveria possuir

um perfil meigo, prestativo e, além de tudo, nunca poderia contestar as ordens do marido. A

classe feminina não possuía liberdade de expressão; as mulheres eram constantemente

violentadas e isso era aceito como um ato natural aos olhos da sociedade.

A liberdade de pensamento e expressão é um direito fundamental do ser humano.

Nesse sentido violência é sempre uma violação do direito de ir e vir, ou seja, de ser sujeito

constituinte de sua própria história.

Após anos de martírios a mulher nos meados do século XIX, passou a ter direito a não

se submeter às agressões de seus maridos;

[...] A segunda metade do século XX e mais especificamente data dos anos

60, quando o movimento feminista rompeu o silêncio que até então cercava a

questão. A partir de então começam a surgir pesquisa-denúncia e

alternativas de solução. Sob a égide de abordagem feminista o

espancamento de mulheres passa a ser percebido como um problema social,

não apenas por suas proporções quantitativas, mas também pela gravidade

de suas conseqüências. (AZEVEDO, 1985, p. 27, grifos da autora)

Com a liberdade, a mulher galgou o direito ao divórcio que lhe era cerceado, a fim de

se cumprir os ditames religiosos, como o de que o casamento deveria ser até a morte. É

perceptível que a própria religião induz no ser humano que o homem é superior. A

confirmação de tal afirmação pode ser lida em várias partes da Bíblia, a exemplo da passagem

do Novo Testamento (I Pedro 3) expressa bem essa condição quando diz: ―Esposas, sujeitai-

vos a vossos maridos‖.

De acordo com Tânia Pinafi (2007), em seu artigo, Violência Contra a Mulher:

políticas públicas e medidas protetivas na contemporaneidade, a Organização das Nações

Unidas-ONU, iniciou a discussão da defesa dos direitos das mulheres desde 1950 com a

criação da Comissão de Status da Mulher, que formulou vários tratados baseados em

Page 34: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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provisões da Carta das Nações Unidas- que expressava a questão da igualdade de direitos

entre homens e mulheres e na Declaração Universal dos Direitos Humanos- que diz que todos

os direitos e liberdades humanos devem ser aplicados igualmente a homens e mulheres, sem

distinção de qualquer natureza.

A partir de então vários protestos e ações foram realizados para a promoção dos

direitos das mulheres. Por volta de 1970, as mulheres se reuniram com o objetivo de que a

violência doméstica contra a mulher saísse do espaço privado e passasse a ser tratada como

um problema social, uma questão de caráter público, com políticas direcionadas a esse

segmento.

Segundo um artigo da Biblioteca Virtual da Mulher, organizado pelo Conselho

Estadual dos Direitos da Mulher do Estado do Rio de Janeiro, que trata sobre a violência

doméstica e familiar contra esse público, o movimento feminista desmitificou a instituição

familiar, através do repúdio a não divulgação dos atos de violência dentro da família, uma vez

que nada a esse respeito podia ser divulgado para não deturpar a sua imagem, isso porque os

conservadores não aceitavam que nada abalasse a estrutura familiar.

Para Tânia Pinafi (2007), a política que reinava no Brasil por volta de 1970, era sexista

e deixava a desejar no que diz respeito à impunidade da violência contra a mulher, já que o

homem podia matar a mulher com o argumento de legítima defesa da honra, como pode ser

ilustrado no caso do assassinato brutal em 1976 da ex-esposa de Raul Fernando do Amaral

Street (Doca), que não se conformou com o rompimento da relação e simplesmente

descarregou um revólver contra o rosto e crânio de Ângela Maria Fernandes Diniz, sob o

pretexto de defender a honra, constituindo essa alegação o álibi para sua absolvição no

julgamento.

O caso supracitado foi de grande revolta para as mulheres da época, que criaram

vários movimentos para o combate da violência e da impunidade vigentes. Em 1981, na

cidade do Rio de Janeiro, foi criado o SOS Mulher, com o objetivo de atender as mulheres em

situação de violência, idéia que foi expandida para outros Estados, como São Paulo e Porto

Alegre.

Com a infindável luta do movimento feminista, as mulheres conseguiram o direito de

voz, com a promulgação da Constituição de 1988, em seu artigo 226, §8º, em que o Estado

passa a assegurar assistência à pessoa vítima de violência, criando mecanismos para coibir a

violência no âmbito das relações. A partir daí houve a preocupação de uma política pública

voltada para a classe feminina em diversos espaços, ou seja, a violência passou a ser tratada

como um problema social.

Page 35: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

34

Os direitos das mulheres foram instituídos no que se refere ao artigo 5º, inciso I da

Carta Magna, no qual homens e mulheres passam a ser iguais em direito e obrigações. A

década de 1980 foi o grande marco para a criação das Delegacias Especializadas de

Atendimento à Mulher (DEAM‘s), que se efetivaram com o compromisso de atuar contra a

violência doméstica. A partir dessa década houve maior visibilidade da problemática em

pauta.

Em 1993, com a Declaração de Viena, a violência doméstica passou para o cenário

internacional, pois nesse documento foram considerados os vários graus e manifestações de

violência. Após um ano, em 06 de junho, a Assembléia Geral da Organização dos Estados

Americanos – OEA, aprovou a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a

Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará, que foi ratificada

pelo Brasil em 1995.

O percurso até os dias atuais foi bastante árduo. Atualmente com a Lei 11.340/2006 de

nome Maria da Penha16

, tem-se apresentado um avanço muito importante, o que não significa

que esteja tudo resolvido. É preciso avançar muito mais. O combate à violência doméstica

deve ser mais intensificado e aderido por toda sociedade.

A Lei Maria da Penha em seu Capítulo II, artigo 7º, apresenta as formas de violência

doméstica e familiar aplicadas contra a mulher;

I-A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua

integridade ou saúde corporal;

II- A violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause

dano emocional e diminuição da auto-estima ou que prejudique e perturbe o

pleno desenvolvimento ou vise a degradar ou controlar suas ações,

comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,

humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição

contumaz, insulto, chantagem, ridicularizarão, exploração e limitação do

direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde

psicológica e à autodeterminação;

III- A violência sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a

presenciar, a manter ou participar de relação sexual não desejada, mediante

intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar

ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que impeça de usar

qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao

aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou

manipulação; ou que limite ou anule o exercício dos seus direitos sexuais e

reprodutivos;

IV- A violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que

configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,

instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou

recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

16

Maria da Penha Maia Fernandes biofarmacêutica que lutou para que seu agressor viesse a ser condenado. Com

60 anos e três filhas, hoje ela é líder de movimentos de defesa dos direitos das mulheres, vítima emblemática da

violência doméstica.

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V- A violência moral, entendida como qualquer conduta que configure

calúnia, difamação ou injúria. (p. 31-32)

A violência praticada contra a mulher não é apenas física, mas sexual, psicológica,

patrimonial e moral. Apesar de a física ser mais frequente e visível, as outras causam enormes

consequências como traumas que desencadeiam problemas comportamentais difíceis de

superar. Quando o agressor violenta sua vítima, ele procura a melhor forma para não deixar

marcas, como cita Vinagre (1992, p. 59), ―[...] alguns agressores preferem atingir regiões que

não deixam marcas visíveis, como a cabeça, cujos sinais são ocultados pelo cabelo‖.

A criação da Casa-Abrigo foi um grande avanço para o apoio às vítimas de violência,

que esteve em pauta nas Declarações, Conferências, Planos e etc. Necessidade defendida

pelos movimentos feministas na década de 1980, concretizou-se a partir de um projeto muito

importante para a sociedade e para a vida das mulheres vítimas que lhes designou a

construção de um local de acolhimento e segurança. A Casa-Abrigo é uma instituição que

deverá ser acionada quando a mulher não possuir um lugar seguro após sofrer agressão física,

psíquica, sexual, dentre outras, a fim de receber a proteção e os cuidados necessários.

As redes de Casas-Abrigos em todo o Brasil vêm crescendo após várias divulgações.

Dentre elas, a do Protocolo de Orientações e Estratégias para Implementação das Casas-

Abrigos (Brasília, 2005), que diz:

As Casas-Abrigos constituem locais seguros para o atendimento às mulheres

em situação de risco de vida iminente, em razão da violência doméstica.

Trata-se de um serviço de caráter sigiloso e temporário, onde as usuárias

poderão permanecer por um período determinado, após o qual deverão reunir

condições necessárias para retomar o curso de suas vidas. (BRASIL, p. 55)

De acordo com o mesmo termo de referência o objetivo geral das Casas-Abrigos é

garantir a integridade física e/ou psicológica de mulheres em risco de vida e de seus filhos de

menor idade – crianças e/ou adolescentes, favorecendo o exercício de sua condição cidadã e

de seu valor de pessoa sabedora de que nenhuma vida humana pode ser violentada.

Como mecanismo de combate à violência, o Governo Federal por meio da Secretaria

Especial de Políticas Públicas para as Mulheres, instituída em 2004, estabeleceu no I Plano

Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres a expansão das Delegacias Especializadas de

Atendimento à Mulher-DEAM, em todo território nacional, ao qual foi aderido por Aracaju

em 2005.

Segundo o Relatório final do site Observatório da Lei Maria da Penha, a Delegacia

Especializada de Atendimento a Mulher possui papel estratégico no campo jurídico, visto que

desempenha funções para a resolução dos casos de violência exercidos contra as mulheres,

Page 37: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

36

com a garantia do zelo pela integridade física das mesmas e de seus filhos, a qual realiza o

registro da ocorrência, instauração de inquérito, encaminhamento ao Instituto Médico Legal-

IML e aos serviços de medidas protetivas de urgência e transporta a ofendida e seus

dependentes para abrigo ou local seguro, quando há risco de morte, além de acompanhar a

vítima até a residência para retirar os pertences pessoais.

O gráfico abaixo mostra o percentual de DEAM‘S nas regiões do Brasil, sendo que o

nordeste apresenta (15,9%) de delegacias, o que ainda é um número ínfimo comparado ao

número de violência perpetrada contra a mulher.

O gráfico 1 exemplifica o número percentual de DEAM‘s no Brasil, localizadas nas

regiões. Apesar do avanço de implementação de delegacias, o número ainda é pequeno,

levando-se em conta que o Nordeste dispõe de apenas (9,8%), o que significa uma rede ainda

pequena para o combate das expressões da violência doméstica.

Em Aracaju existe o Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis-DAGV,

que é um órgão da Polícia Federal, composto pelas unidades de Atendimento a Mulher,

Delegacia de Atendimento a Criança e Adolescente-Vítimas. Compete a esta instituição o

atendimento especializado, na capital, de indivíduos vulneráveis sempre que vitimados em

razão da condição de vulnerabilidade.

O DAGV é um parceiro da Casa-Abrigo no enfrentamento da violência doméstica

contra a mulher, visto apresentar uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher-

DEAM, situada à Avenida Augusto Maynard, 247 Bairro São José. A DEAM é responsável

pela investigação e acompanhamento de crimes praticados contra esse segmento, como

também na apuração dos casos de violência doméstica e ainda pelos crimes sexuais

praticados, consoante uma relação de hipossuficiência, baseada no gênero.

Page 38: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

37

A DEAM emite o boletim de ocorrência através de profissionais qualificados para um

atendimento direcionado e diferenciado, sem realizar questionamentos sobre a conduta da

ofendida e muito menos na culpabilização da mesma pela causa da agressão, fator bastante

corriqueiro em algumas delegacias não especializadas, o que gera revitimação da violentada.

A especializada ainda tem por incumbência, segundo a Lei 11.340/2006 em seu

capítulo III (artigos 10, 11 e 12), estabelecer procedimentos policiais como: registro de

ocorrência; instauração de inquérito policial; coleta de provas; solicitação de exames médicos

e perícias legais. É de sua responsabilidade a realização de prisões em flagrantes; buscas e

apreensões de arma de fogo, como também o encaminhamento ao pedido de medidas proteção

de urgência, no qual se enquadra a Casa-Abrigo Professora Núbia Marques.

Segundo o Mapeamento das Delegacias da Mulher no Brasil (2008, p. 23), ―[...] Na

maior parte dos estados [...] as unidades não contam com policiais suficientes para manter

mais de uma ou duas equipes no atendimento‖.

No mesmo mapeamento é colocada a rede mínima para atendimento à mulher, que

deve haver na área de segurança, com as delegacias da mulher além de incluir os órgãos da

Polícia Militar e Corpo de Bombeiros, da justiça com Defensorias Públicas e Juizados

Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, com base na Lei 11.340/2006.

Na saúde com postos de saúde e serviços para atendimento de mulheres vítimas de violência

sexual e de abortamento legal, no campo social e psicológico com centros de referência e

Casas-Abrigos para mulheres em situação de risco, e por fim com na área da articulação

política, através dos Conselhos Estaduais e Municipais de Direitos das Mulheres,

Coordenadorias de Políticas para as Mulheres com o apoio dos Conselhos Tutelares, Varas de

Família e Varas da Criança e do Adolescente, caso haja algum caso envolvendo crianças e

adolescentes.

A tabela a seguir indica os serviços de atendimento à mulher no Estado de Sergipe;

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TABELA Nº 01

Dentre as entidades que fazem parte da rede de proteção à mulher em Aracaju,

destacamos um Centro de Referência da Mulher, uma Delegacia Especializada, duas

Organizações Governamentais de Políticas para as Mulheres, uma Casa-Abrigo (que atende

outros municípios do Estado de Sergipe), uma unidade de Serviço de Atendimento as

Mulheres Vítimas de Violência Sexual, três conselhos de Direitos da Mulher, uma ONG e

uma Vara Especializada.

A 11ª Vara Criminal da Comarca de Aracaju (Vara de atendimento a Grupos

Vulneráveis) foi criada pela Lei Complementar nº 145 de 13 de novembro de 2007, para

desenvolver as funções inerentes ao Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar

contra a Mulher, processar e julgar causas relacionadas à apuração de crimes contra a mulher,

crianças, adolescentes e idosos.

A rede de proteção em Sergipe compactua com alguns dispositivos legais de

enfrentamento à violência doméstica, a exemplo da Lei nº 5.494 de 23 de dezembro de 2004,

alterada pela Lei Complementar 104 de abril de 2005, que trata sobre a notificação

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compulsória da violência contra a mulher atendida em serviços de urgência e emergência

públicos e privados no Estado de Sergipe, através do preenchimento de formulário por

qualquer profissional de saúde que detecte que a mulher atendida tenha sofrido violência.

Apesar da existência da rede de enfrentamento à violência doméstica, em Sergipe é

frequente o número de mulheres que omitem seu sofrimento ou desistem do processo,

deixando impunes atos de extrema crueldade.

Segundo dados do ―Jornal CINFORM, Cadernos 1 p. 6 de 19 a 25 de abril de

2010”, no período de janeiro a 12 de abril de 2010, de 888 mulheres que prestaram queixa na

Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher de Aracaju, entretanto somente 156

optaram por inquéritos policiais, o que mostra uma desistência significativa por parte das

vítimas. Analisando os dados dos boletins de ocorrências efetuados em ano anteriores:

TABELA Nº 02

.

Pode-se visualizar que o número de inquéritos policiais é desproporcional ao número

de denúncias efetuadas. Infere-se que mais da metade das mulheres que desistem do processo

continuam a viver sob a violência doméstica. A causa do grande número de desistentes vai

além do jargão ―ela está com ele [o agressor] por que gosta de apanhar‖. Sob este aspecto

deve-se analisar a realidade apresentada em cada caso diante da complexidade de

sobrevivência e fragilidade emocional.

Além dos aspectos elencados, se faz pertinente voltar o olhar para o alto custo que a

violência doméstica tem gerado ao Estado e contribuintes. Segundo pesquisa publicada pelo

Instituto Patrícia Galvão, retirada do Jornal O Estado de São Paulo- 04/07/2010 em dez anos,

dez mulheres foram assassinadas por dia no Brasil, geralmente o crime é efetuado por motivo

passional. De acordo com os números assinalados os assassinatos no Brasil são considerados

como umas das mais altas taxas do que os números dos países europeus, cujos índices não

ultrapassam 0,5 caso por 100 mil habitantes, mas ficam abaixo de nações que lideram a lista,

NÚMERO DE DENÚNCIAS NA DEAM

BOLETINS DE OCORRÊNCIA INQUÉRITOS POLICIAIS

2006 1923 71 2007 2006 248 2008 2377 462 2009 2548 491 2010* 888 156

* atendimentos realizados até 12 de abril

Fonte: Jornal Cinfome (Caderno 1 p.6), 2010

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como África do Sul (25 por 100 mil habitantes) e Colômbia (7,8 por 100 mil). (INSTITUTO

PATRÍCIA GALVÃO, 2010).

Segundo dados de outra pesquisa17

realizada pela ONG-Centro pelo direito à moradia

contra despejos (COHRE), indica que a cada 15 segundos uma mulher é atacada no Brasil, e

que uma em cada quatro brasileiras sofrem com a violência doméstica, os motivos elencados

por 24% das entrevistadas retratam a dependência econômica como impedimento para

denunciar seus algozes. A pesquisa evidencia ainda que 70% das vítimas de violência no

Brasil foram agredidas em casa, sendo que em 40% dos casos houve lesão grave.

Diante dos dados, é perceptível a magnitude que as consequências da violência

doméstica vem ocasionando as vítimas e a sociedade como um todo, visto o alto custeio

gerado a partir de consultas médicas e psicológicas, atendimento em pronto-socorro e

procedimentos judiciais para investigação dos casos, bem como na manutenção dos

agressores em prisões. Nessa linha de reflexão, a violência não é algo unicamente privado,

mas público e por isso requer que todos se responsabilizem em combater tal crime,

principalmente pela via da denúncia.

17

Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI4570241-EI306,00.html. Acesso em 11 de julho

de 2010.

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41

CAPÍTULO II

A CASA-ABRIGO PROFESSORA NÚBIA MARQUES

Para falar sobre a Casa-Abrigo, se faz necessária uma breve discrição do

desenvolvimento da Política direcionada à mulher. No âmbito estadual a sua prática está

vinculada a Coordenadoria de Políticas Públicas para a Mulher-CPPM, que tem o papel de

incentivar o debate entre as mulheres sobre os seus direitos e deveres, principalmente na

prevenção da violência doméstica, com a aplicação de eventos para divulgação da Lei Maria

da Penha e de trabalhos científicos, cujo principal objetivo é fortalecer a rede de atendimento

a mulher, bem como oferecer a interlocução entre os pesquisadores da área e a sociedade.

Em Aracaju as ações estão articuladas entre o Conselho Municipal dos Direitos da

Mulher e a Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania-SEMASC. A principal

atribuição do Conselho é promover políticas que visem à eliminação da discriminação da

mulher, com o princípio de liberdade e igualdade de direitos que são difundidos em atividades

políticas, econômicas e culturais do município junto às comunidades.

Destacando o lado operacional ao combate da violência doméstica há a Casa-Abrigo é

uma instituição pública municipal que dispõe de serviços especializados, com base em

medidas protetivas. Possui endereço sigiloso, cujo objetivo é acolher mulheres em situação de

violência doméstica e que estão sob ameaça de morte, juntamente com filhos/as de menor

idade, durante um período máximo de até três meses18

.

Antes da inauguração da Casa-Abrigo, as mulheres eram encaminhadas a outros

abrigos públicos, cujo serviço não era especializado, ou seja, não abrangia o perfil adequado.

A criação da instituição data a partir de dezembro de 2002, entretanto foi inaugurada

em fevereiro de 2003, através de convênio firmado entre a Prefeitura Municipal de Aracaju,

representada pela SEMASC e a União Brasileira de Mulheres de Sergipe-UBM. A partir de

janeiro de 2008, a Casa Abrigo passou a ser administrada pela Secretaria Municipal de

Assistência Social com recursos do Governo Federal, tendo em vista o fim do convênio com a

UBM.

O sigilo de localização é uma norma da Secretaria Especial de Políticas para as

Mulheres-SPM, posta como condição de funcionamento, constituindo cláusula do convênio.

Essa prática reside na garantia da segurança das abrigadas e da equipe de profissionais, visto

18 A caracterização das ações desenvolvidas no local foi retirada por meio de informações dos profissionais da

instituição e da análise documental, efetuada com a plena autorização da coordenação, que abriu espaço para a

coleta de dados.

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que a proteção é indispensável para o funcionamento da instituição. Para a manutenção do

sigilo é tomada a precaução da não divulgação de endereço em listas telefônicas ou outros

meios de comunicação social, como também a mudança de endereço a cada um ano.

A porta de entrada para a Casa-Abrigo é o Centro de Referência Especializado de

Assistência Social-CREAS São João de Deus, situado a Rua São João S/N Bairro: Santo

Antônio, integrante do Sistema Único da Assistência Social-SUAS, que se constitui em uma

unidade pública municipal de serviços especializados e continuados de proteção à família e

aos indivíduos que têm seus direitos violados.

No CREAS são ofertados serviços de média complexidade e feitos os

encaminhamentos para serviços de alta complexidade19

, articulados com a rede de Proteção

Social Especial, instituições que compõem o Sistema de Garantia dos Direitos-SGD e demais

políticas públicas.

O abrigo em sua estrutura física apresenta: uma sala para coordenação e

administração, uma sala e antessala, uma cozinha, um almoxarifado, área de serviço, uma

biblioteca, uma área de ventilação, cinco banheiros, um quarto na parte superior, no qual

ficam as abrigadas e dois quartos na parte inferior, um utilizado pelas funcionárias

plantonistas e outro pelas usuárias que possuam alguma dificuldade de deslocamento ou que

não possam fazer esforço físico, por causa da idade avançada ou por escoriações, gravidez,

deficiência física ou visual. A instituição tem a capacidade de acolher vinte pessoas incluindo

mulheres e crianças.

A rotina do abrigo é semelhante a uma residência convencional, na qual as usuárias

desenvolvem atividades domésticas e cuidam dos filhos, tal procedimento é realizado para

que elas se adaptem à instituição e se sintam como se estivessem em casa. É importante

ressaltar que além das atividades restritas ao âmbito doméstico, há a realização de oficinas

sobre a Lei Maria de Penha e Políticas para a Mulher, como também a apresentação de vídeo,

que ressaltam aspectos da autoestima e família. O espaço da Casa-Abrigo disponibiliza

biblioteca com livros direcionados para as usuárias, na qual há um acervo que fomenta várias

discussões sobre a mulher. Para as crianças há livros educativos que estimulam a boa

convivência, brinquedos e material para pintura.

19

Prioriza a construção de novos modelos de atenção e/ou, abrigamento dos indivíduos que não dispõem da

proteção e do cuidado de suas famílias.

Page 44: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

43

2.1- Fluxograma de Atendimento

O fluxograma de atendimento é a forma pela qual é acessado o serviço de

abrigamento, com a trajetória e portas de entrada para o atendimento. O contato com a rede de

proteção pode ser realizado de três formas. Para melhor ilustrar, segue abaixo o gráfico.

FLUXOGRAMA DE ATENDIMENTO Nº 0120

A primeira ocorre quando a vítima procura a delegacia, seja ela especializada ou não, e

efetua o boletim de ocorrência, que por sua vez aciona o CREAS São João de Deus para que

seja realizado o acolhimento. Caso a vítima possua um lugar seguro para ficar, o abrigamento

não é realizado. Entretanto a usuária passa por atendimento psicossocial do CREAS São João

de Deus que emite o encaminhamento da mesma ao Centro de Referência de Assistência

Social- CRAS de abrangência, até que não exista mais risco de morte ou de agressão. É

importante salientar que o processo é continuado por meio da comunicação entre a vítima e a

delegacia.

Se após o acolhimento a equipe do CREAS São João de Deus diagnosticar a

necessidade de risco de morte e violência, caso a vítima não tenha um local seguro para ficar,

é acionada a Casa-Abrigo Professora Núbia Marques, que ficará responsável pela integridade

física e psíquica da vítima.

Após o abrigamento é realizado o exame de corpo de delito21

e/ou conjunção carnal22

,

emitido pelo Instituto Médico Legal-IML, com o acompanhamento da coordenadora,

20 Gráfico 2- Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009 21

O corpo de delito é, em essência, o próprio fato criminal, sobre cuja análise é realizada a perícia criminal a fim

de determinar fatores como autoria, temporalidade, extensão de danos. Disponível em:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Corpo_de_delito. 22

O exame de conjunção carnal é realizado para atestar a relação sexual.

Page 45: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

44

Assistente Social ou estagiária em Serviço Social. Depois de tomadas as medidas cabíveis, é

efetuado o desligamanto do abrigo com o encaminhamento para o CRAS de referência, isto é,

o que abrange o território ao qual a vítima reside.

FLUXOGRAMA DE ATENDIMENTO Nº 0223

A segunda forma do fluxograma consiste quando a vítima procura o CRAS, CREAS,

Conselho Tutelar ou UBS, e é encaminhada para o CREAS de referência para ser acolhida.

Ao ser constatada a agressão, a mulher é dirigida à Delegacia para realizar o boletim de

ocorrência. Caso não exista um local seguro para ficar, é encaminhada a Casa-Abrigo, que

ficará responsável pelo acompanhamento do caso, viabilizando os atendimentos psicológicos,

sociais e jurídicos, bem como o exame de corpo de delito. Após serem tomadas as medidas

cabíveis é realizado o desligamento da vítima, que é encaminhada ao CRAS de abrangência

para prosseguimento do atendimento.

Se for constatado no CREAS que a vítima tem possibilidade de retornar para a

residência, é acionada a polícia para o afastamento do agressor do lar. Não sendo viável esta

ação, há a investigação se a usuária possui familiares que possam disponibilizar um local

seguro, em caso positivo, é encaminhada a este. Entretanto, deverá prestar o boletim de

ocorrência para prosseguimento do caso. Neste período a usuária será acompanhada pela

equipe do CREAS que fará os atendimentos cabíveis. Após o encerramento do risco de morte,

a usuária é encaminhada ao CRAS de abrangência.

23 Gráfico 3- Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 46: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

45

FLUXOGRAMA DE ATENDIMENTO Nº 0324

A terceira forma de atendimento à vítima de violência ocorre quando esta por

demanda espontânea procura o CREAS e é acolhida pela equipe, que a encaminha à

Delegacia para realizar o boletim de ocorrência. Caso seja constatada a necessidade da vítima

ser abrigada, é providenciada a transferência para a Casa-Abrigo, até que seja realizado o

devido encaminhamento. Após as providências é efetuado o desligamento do abrigo com o

encaminhamento da vítima ao CRAS de abrangência.

Caso a usuária, ao realizar o boletim de ocorrência, possua local seguro para ficar, é

providenciado o encaminhamento da mesma ao local devidamente escoltada pela polícia. A

partir desse contexto o agressor é afastado do lar, através de medidas protetivas de urgências

solicitadas na 11ª Vara no Fórum Gumersindo Bessa. Entretanto, o vínculo com o CREAS

não é perdido, a mulher é acompanhada pela equipe que ao diagnosticar o fim do risco de

morte e de outras agressões a encaminha ao CRAS de abrangência, que deverá acompanhar o

caso através de visitas domiciliares.

De acordo com o fluxograma a mulher em situação de violência possui várias

maneiras para acionar o serviço de abrigamento, seja pelo CRAS, CREAS, Unidades Básicas

de Saúde, Conselhos, dentre outros. Entretanto é importante salientar que independente da

porta de entrada da vítima ao serviço, é necessário que antes seja prestado o Boletim de

Ocorrência, visto que é uma condicionalidade para o acesso à Casa-Abrigo Professora Núbia

Marques.

24

Gráfico 4- Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 47: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

46

Fora do fluxograma apresentado , a Casa-Abrigo também recebe usuárias provenientes

de outros Estados e Cidades, bem como realiza a transferência de usuárias para outra Casa-

Abrigo no território nacional ou para residência de familiares, que é um procedimento

utilizado quando a vítima já não possui condições de permanecer no Estado de origem.

2.2-Transporte e Acolhimento à Vítima

Após ser constatada que a mulher em situação de violência doméstica não possui lugar

seguro para se resguardar, a Casa-Abrigo é acionada. O transporte da vítima até o abrigo é

realizado por veículo próprio da instituição, que é adaptado para que as mulheres não

visualizem o trajeto até o abrigo, tendo em vista resguardar o sigilo do endereço.

Ao chegar ao abrigo a mulher é apresentada a equipe de plantão, momento em que

conhece a estrutura física da instituição e normas a serem respeitadas. Após concordar com

todas elas, assina o termo de responsabilidade.

Dentre as regras, destaca-se a não utilização de aparelhos celulares e objetos cortantes

no abrigo. Caso no acolhimento seja constatada a posse destes objetos, a usuária deverá

entregar à coordenação para somente serem devolvidos no dia do desligamento. O aparelho

celular é mantido desligado para evitar o atendimento de ligações indesejáveis,

principalmente de ameaças do agressor.

No acolhimento é assinado o documento de solicitação de abrigamento apresentada

pela instituição à vítima, no qual são respondidas as perguntas do formulário de atendimento,

em que a vítima informa alguns dados. A documentação é importante para a identificação do

perfil de cada usuária.

O documento de desligamento é assinado pela vítima no dia do abrigamento, tendo em

vista que alguns casos são resolvidos em pouco espaço de tempo, como os de vítimas que são

transferidas para outro Estado, ou para aquelas que só pernoitam na instituição, o que, se fosse

feito em outro momento, dificultaria a agilidade dos serviços, com a morosidade da parte

administrativa.

Page 48: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

47

2.3-Equipe Profissional

De acordo com o Protocolo de Orientações e Estratégias para Implementação das

Casas-Abrigos (Brasília, 2005), diz que;

A equipe interdisciplinar permanente é constituída de profissionais de nível

superior que atendam às áreas de saúde física, mental e promoção de

cidadania. Acrescenta-se a necessidade de uma coordenadora para a Casa

Abrigo. Estes profissionais devem estar lotados na Casa-Abrigo e fazer parte

da equipe permanente. (BRASIL, p. 61)

É sugerido pelo protocolo que a equipe permanente tenha pelo menos um assistente

social e um psicólogo em seu quadro mínimo. A Casa-Abrigo possui em seu quadro de

funcionários a equipe de profissionais direcionada ao atendimento social, psicológico e

jurídico, que é cedida pelo CREAS São João de Deus, que são acionados de acordo com a

demanda do abrigo.

O trabalho desenvolvido consiste em assegurar uma escuta especializada no sentido de

intervir nas necessidades reais da usuária, uma vez que junto à demanda de violência, a vítima

traz outras questões como autoestima fragilizada, conflito familiar, desinformação acerca dos

direitos, dentre outros.

Os atendimentos realizados podem ser realizados no próprio abrigo ou no CREAS, a

escolha é feita a partir de uma análise realizada pela equipe técnica, que tem por incumbência

identificar o nível de periculosidade do caso ou até mesmo o estado físico e psíquico da

mulher. Caso seja constado risco de morte e lesões mais atenuadas, a mulher é atendida

dentro da instituição, se o caso não apresentar periculosidade, a mulher é atendida

externamente.

Existe também a equipe operacional do abrigo composta por profissionais que

geralmente possuem nível médio e/ou básico, atuam na infraestrutura do abrigo: um auxiliar

administrativo, um motorista, duas plantonistas, quatro apoios auxiliares de apoio

administrativo e duas auxiliares de conservação e limpeza, sob inspeção de uma coordenadora

de projetos, encarregada da administração do abrigo. A atual coordenadora é graduada em

Serviço Social, entretanto qualquer profissional de nível superior pode se candidatar ao cargo,

como psicólogo, pedagogo etc., fazendo parte da exigência da NOB/RH-SUAS25

.

25 Disponível em: www.mds.gov.br/suas/...suas/.../norma_operacional_de_rh_suas.pdf

Page 49: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

48

Dentre as funcionárias permanentes do abrigo, seis são contratadas em regime celetista

através de entidade do terceiro setor e quatro fazem parte do quadro de funcionárias efetivas,

ou seja, estatutárias da Prefeitura Municipal de Aracaju.

2.4-Encaminhamentos Realizados

No período em que as mulheres em situação de violência doméstica estão abrigadas,

existem os encaminhamentos, que são realizados de acordo com a demanda. As mulheres são

encaminhadas às Delegacias de atendimento especializado, ao Instituto Médico Legal- IML, a

Hospitais, a Unidades Básicas de Saúde, Centro de Apoio Psicossocial-CAPS, Maternidades,

Urgências Médicas, Centro de Referência Especializado da Assistência Social-CREAS,

Centro de Referência da Assistência Social-CRAS, Terminal Rodoviário, Aeroporto, Juizado,

Conselhos, Fóruns, Bancos, Escolas e outros locais a depender da necessidade.

Os encaminhamentos são realizados pela assistente social, que através do estudo do

caso, diagnostica a necessidade de cada usuária. Ao ser encaminhada, a vítima é devidamente

acompanhada por umas das funcionárias do abrigo, para salvaguardar a integridade física e

psíquica da usuária.

Na área jurídica os encaminhamentos são realizados pelo assessor jurídico,

encarregado de realizar os atendimentos, esclarecendo questões a respeito da separação de

corpos, pensão alimentícia, guarda dos filhos, dentre outros. Esse profissional realiza ainda

petições das medidas protetivas de urgência a 11ª Vara Criminal do Fórum Gumersindo Bessa

e o acompanhamento em audiência de mediação de conflito, bem como os procedimentos do

Programa de Proteção a Criança e ao Adolescente Ameaçados de Morte-PPCAAM.

O atendimento jurídico é direcionado de acordo com cada caso. Se houver a

necessidade de solicitação das medidas protetivas de urgência, os documentos são

providenciados em tempo hábil.

As medidas protetivas de urgência consistem em: suspensão da posse ou restrição do

porte de armas; afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

proibição de aproximação da ofendida e de seus familiares e testemunhas, com a

determinação de cem metros de distância; proibição do uso de qualquer meio de comunicação

com a vítima; além da restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores e

freqüentação de lugares afins aonde a vítima costuma ir. É importante ressaltar que mesmo

com as medidas, o agressor deverá assumir as obrigações referentes ao pagamento de pensão

alimentícia aos filhos de menor idade.

Page 50: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

49

A transferência de vítimas por meio do PPCAAM é solicitada quando os responsáveis

pela criança ou adolescente, estão sob ameaça de morte. Tem por objetivo resguardar a

integridade física e psíquica de crianças e adolescentes ameaçados.

A solicitação de inserção no programa deve ser realizada pelo Ministério Público,

Poder Judiciário ou Conselhos Tutelares, entretanto é necessária a realização de relatório

psicossocial minucioso do caso. Diferente das Medidas Protetivas de Urgências que podem

ser solicitadas pela ofendida, o PPCAAM só pode ser encaminhado pelos órgãos acima

citados. Após os procedimentos judiciais, a criança junto à mãe ou responsável é

encaminhada para um local seguro, podendo ser outro Estado ou País, com a proposta de uma

nova vida, inclusive com a mudança de nome e documentação, sendo o procedimento

efetuado pelo órgão competente.

2.5-Instrumentais de trabalho

O principal instrumento de trabalho utilizado é a Lei Maria da Penha, pois por meio

dela são direcionadas todas as ações a respeito do acolhimento das vítimas.

Contudo, além da utilização da referida lei, são utilizados diversos documentos26

para

o pleno funcionamento do abrigo. Um deles é a solicitação de abrigamento, que é apresentada

pela instituição à vítima, a qual deverá assinar para oficializar a sua estada.

Outro é o termo de responsabilidade, no qual a usuária se compromete em obedecer as

normas do abrigo e a não quebrar o sigilo do endereço, caso venha descobri-lo.

Quando a vítima opta pela não continuidade do abrigamento, devido à falta de

adaptação com a dinâmica do abrigo ou por outros motivos, é assinado o termo de saída

voluntária, pelo qual a instituição fica isenta de qualquer ato que venha acontecer com a

usuária, tendo em vista que a mesma declara que estava ciente dos riscos que poderiam surgir

fora do abrigo.

Por conseguinte, há o formulário de atendimento, que é utilizado pela Assistente

Social para preenchimento de alguns dados da vítima, para que assim se efetue a análise do

perfil de cada mulher abrigada.

O demonstrativo mensal de atendimento é mais um documento institucional, que é

preenchido com o nome da usuária, a data de nascimento, a data de abrigamento e de seu

26

Para maior visualização dos instrumentais de trabalho utilizados, verificar os anexos.

Page 51: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

50

desligamento, bem como com o nome e idade das crianças atendidas, nome e idade dos

adolescentes atendidos e por fim com o número de famílias atendidas no mês.

Existe ainda o relatório social com parecer realizado pela Assistente Social para o

estudo de vida e compreensão da situação da usuária, com a utilização de entrevista e

acompanhamento evolucional do caso.

Destaca-se também o relatório mensal de atividade, que é um documento padrão para

todos os equipamentos da SEMASC. O instrumental é preenchido mensalmente com dados

dos atendimentos realizados e após o preenchimento é enviado à equipe de monitoramento

para a avaliação das ações, se estas estão a contento ou precisam de algum ajuste.

Deve-se, por fim, mencionar a agenda mensal de trabalho, que também é padronizada,

a qual é constituída por todas as ações mensais desenvolvidas pela Assistente Social,

Psicóloga, Advogado, Coordenadora e Auxiliar Administrativo. Este documento assim como

o relatório mensal de atividade, constituem-se em ferramentas de avaliação das ações

desenvolvidas em cada equipamento da SEMASC.

2.6-Atribuições do Assistente Social

Além do atendimento social realizado, a Assistente Social é responsável pelo

acompanhamento das mulheres em audiências de mediação de conflito, Fóruns, Hospitais,

Unidades Básicas de Saúde, Terminais Rodoviários, Aeroporto, dentre outros.

A Assistente Social realiza o relatório do caso de cada usuária, bem como o

acompanhamento por meio de visitas domiciliares, momento propício para investigação da

realidade vivenciada pelas usuárias e seus familiares.

As atribuições da Assistente Social vão além do atendimento, visto que ela é

responsável pela análise do caso relacionado com a realidade e suas peculiaridades. É

necessário que o profissional saiba decifrar as demandas que lhes são postas, para que haja a

articulação com as políticas públicas setoriais, isto é, a identificação das possíveis soluções

nas entrelinhas observadas.

A Assistente Social prima pelos direitos das mulheres e articula com a rede de garantia

de direitos, visto que é de sua inteira competência encaminhar e prestar informações corretas

aos seus usuários como preconiza a Lei que regulamenta a profissão, datada de 7 de julho de

1993. Segundo a Lei 8.662; no art.º 4, o Assistente Social tem como competências;

Page 52: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

51

I - elaborar, implementar, executar políticas sociais junto a órgãos da

administração pública, direta ou indireta, empresas, entidades e organizações

populares;

II - elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que

sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com a participação da

sociedade civil;

III - encaminhar providências, e prestar orientação social a indivíduos,

grupos e à população;

IV- (Vetado);

V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos sociais no sentido

de identificar recursos e de fazer uso dos mesmos no atendimento e na

defesa de seus direitos;

VI - planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços Sociais;

VII - planejar, executar e avaliar pesquisas que possam contribuir para a

análise da realidade social e para subsidiar ações profissionais;

VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da administração pública

direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, com relação às

matérias relacionadas no inciso II deste artigo;

IX - prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em matéria

relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis,

políticos e sociais da coletividade;

X - planejamento, organização e administração de Serviços Sociais e de

Unidade de Serviço Social;

XI - realizar estudos sócioeconômicos com os usuários para fins de

benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e

indireta, empresa privadas e outras entidades.

As ações desenvolvidas pela Assistente Social são pautadas de acordo com o Código

de Ética Profissional, visando sempre à melhor qualidade do atendimento prestado.

A partir da visão ampla do Assistente Social adquirida ao longo do seu exercício

profissional, com a capacidade de concretizar os objetivos postos, é garantida a

instrumentalidade, categoria importante no âmbito da leitura do real.

Segundo Guerra (2000), é no trabalho que se tem uma reflexão voltada para o alcance

de finalidades, que dependem da existência, da adequação e da criação dos meios e das

condições objetivas e subjetivas. É a partir do cotidiano que o profissional adquire seus

instrumentos, ou até mesmo, consegue aprimorá-los conforme as necessidades geradas.

No caso específico da instituição, requer-se um profissional que saiba refletir sobre as

expressões da questão social, na medida em que a violência doméstica é resultado de uma

desestruturação social advinda da cultura machista, do desemprego, da fome, da falta de

oportunidade e etc.

A questão social no viés da violência doméstica deve ser analisada em consonância

com a peculiaridade de cada usuária, ou seja, com a verificação da singularidade para depois

compará-la com a universalidade, o que garante o estudo sob um olhar totalizante e não

fragmentado.

Page 53: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

52

É preciso que o profissional de Serviço Social realize suas ações através da rede de

mediações, que são postas na estrutura social, com a priorização da reflexão, posto que ela

está intimamente ligada à instrumentalidade e é com a categoria mediação que são desveladas

as entrelinhas, uma vez que a abordagem investigatória está presente.

A utilização da mediação no campo reflexivo permite que o Assistente Social atue

com mais precisão, como é ilustrado no trecho a seguir;

A mediação como categoria intelectiva permite, mediante um impulso do

real, à razão construir categorias para auxiliar a compreensão e ação

profissionais. Para a superação da dicotomia teoria-prática- tão ao gosto das

formulações positivistas e neopositivistas que ainda encontram amplo

suporte na prática profissional do assistente social, bastando verificar a alta

credibilidade do dito ―a teoria na prática é outra...‖- necessário se faz

retomar, no plano, metodológico da dialética, como se processam as

mediações entre teoria e prática e vice-versa. (PONTES, 2000, p. 165)

É importante ressaltar a importância da superação da dicotomia teoria-prática citada

no trecho acima, visto que a mediação garante ao profissional de Serviço Social um aporte

que o qualifica para identificar as soluções para as demandas surgidas, produzindo

mecanismos de estratégias que entram em cena a todo o momento;

Considerando que a teoria exprime, segundo a tradição crítico-dialética, o

movimento apreendido pela razão das categorias do ser social, é legítimo

inferir que o recurso à categoria de mediação no Serviço Social favoreceu

uma apreensão mais próxima do movimento da totalidade social do objeto de

intervenção profissional. (PONTES, 2000, p. 167)

Com a apreensão da categoria mediação, o ser social pode ser visto com as suas

singularidades, porque inibe o profissional de agir de forma imediata e institucional, isto é,

não buscando a causa do problema, mas sim identificando origens que somente respondem à

instituição na qual trabalha, deixando de aplicar seus próprios instrumentos. É pertinente

dizer;

A demanda institucional aparece ao intelecto do profissional despida de

mediações, parametrada por objetivos técnico-operativos, metas e uma dada

forma de inserção espacial (bairro, município etc.), programática (divisão

por projetos ou áreas de ação) ou populacional (crianças, idosos, migrantes

etc.). Numa palavra, a demanda institucional aparece peiada à

imediaticidade, com um ―fim em si mesmo‖. (PONTES, 2000, p. 168, grifos

do autor)

Para o melhor atendimento ao usuário é necessária uma aproximação da realidade do

objeto de intervenção da profissão, procurando sempre a melhor mediação para articulá-la na

prática. Como diz Pontes;

Page 54: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

53

Sem a apreensão dos sistemas de mediações, torna-se impossível uma

melhor definição teórico-metodológica para o fazer profissional, que pode,

neste caso, descambar para ações que necessariamente se restringirão aos

limites da demanda institucional. (PONTES, 2000, p. 172)

Por tal razão é que Pontes (2000, p. 179, grifos do autor), ratifica que o profissional de

Serviço Social ―[...] não é um mero ‗mediador‘, mas um agente que trabalha com e nas

mediações‖ Segundo o autor o Assistente Social não é uma das mediações ou um mediador,

mas um articulador e potencializador de mediações.

Através de todo aparato em questão, a Casa-Abrigo exige do profissional de Serviço

Social que seja comprometido com o Código de Ética Profissional e que zele pelo sigilo da

instituição, bem como dos casos por ele atendido, tendo em vista o alto grau de complexidade

e risco do serviço prestado.

Page 55: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

54

CAPÍTULO III

PERFIL DAS USUÁRIAS E DOS AGRESSORES

Nesse capítulo ressaltamos alguns aspectos considerados necessários para a melhor

compreensão do perfil das usuárias e dos agressores, para entendimento destes no que se

refere ao programa citado. Para tanto foi realizado um recorte temporal para a análise dos

dados, compreendido entre janeiro de 2006 a setembro de 2009, totalizando 3 anos e 7 meses.

A escolha do período é justificada através da incompletude dos dados, uma vez que

nos anos anteriores não há dados precisos, ou seja, existem algumas lacunas nas variáveis a

serem trabalhadas, inviabilizando o diagnóstico do perfil das usuárias.

3.1-Caracterização do perfil das usuárias

O perfil das usuárias é de grande relevância ao processo de desvelamento da situação,

na qual se encontram as vítimas de violência doméstica e familiar, uma vez que se constitui

em um leque de possibilidades para o estudo da vulnerabilidade e do exercício da cidadania.

O perfil das mulheres atendidas evidencia o seu alto grau de vulnerabilidade,

se confrontado com as definições de Lert (1996), variante que vão definir

uma situação de risco que justifica a necessidade de abrigo. Essa autora

agrega sentido ao conceito de vulnerabilidade definida a partir de noções

epidemiológicas e das ciências sociais. Nesse sentido a vulnerabilidade

individual vai além do risco, constituindo-se a partir de uma situação

complexa que expressa a sucessão de estados e de mudanças a que estão

submetidas essas mulheres. Assim compreendida a ―situação de risco‖ é um

conjunto de vulnerabilidades que constituem, sob o ponto de vista da saúde

pública, os fatos sociais e as relações sociais predisponentes à violência.

Nessa situação, a vulnerabilidade expressa-se nas dificuldades destas

mulheres dentro e fora da casa-abrigo ―em lidar com o individual e o

coletivo‖, ―de romperem com o ciclo de violência‖ (o que as faz permanecer

neste ciclo), com as ―tensões nas relações de poder entre homem e mulher‖,

expressa na violência relacional e ―na violência como única forma de

comunicação‖ entre os sexos. A situação de estarem em um ―aquário‖ (que

possibilita compreender situações para construir novas), as ―negociações de

conflitos‖, a ―convivência sem privacidade‖ etc. A noção de vulnerabilidade,

assim definida, possibilita sair de uma visão simplista e mecanicista da

violência, possibilitando melhor conhecer e compreender as necessidades

para um processo de mudança: ―uma nova mulher‖. (LERT, 1996 apud

ROCHA, 2007, p. 195-196 grifos originais)

Page 56: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

55

Com o objetivo de conhecer o perfil das usuárias e dos agressores, realizamos consulta

dos formulários de atendimento disponibilizados pela instituição, através dos quais foram

esquematizados gráficos e tabelas com destaque nas variáveis indispensáveis à melhor

ilustração da realidade posta. Foram evidenciados os números de pessoas atendidas pela

instituição para apreensão de um número universal como referência para as características de

menor proporção.

Foram traçadas algumas variáveis para caracterização do perfil das usuárias atendidas,

sendo estas vinculadas a: origem da vítima, ou seja, qual a localidade é mais frequente nos

atendimentos solicitados, a cor/raça, o número de filhos, o nível de escolaridade, o quadro

econômico, as condições de moradia, a faixa etária, o estado civil, o tempo de convivência

com o agressor, o tipo de violência mais frequente, o tempo de permanência que predomina

no abrigo, a profissão/origem da renda e por fim a averiguação dos casos em que as mulheres

são usuárias de substâncias psicoativas. As variáveis foram analisadas a fim de constatar ou

não a influência dos indicadores para a situação de vulnerabilidade social, apresentada pela

violência doméstica.

Os números de abrigamentos realizados pela Casa Abrigo Professora Núbia Marques

no período de janeiro de 2006 a setembro de 2009 foram de: 144 mulheres, 193 crianças, 11

adolescentes, sendo dentre o número de mulheres atendidas, 82 com família, ou seja,

acolhidas com seus filhos, e 62 acolhidas sem os filhos, pelo motivo de não os terem ou por

não residirem com as mesmas. O evento pode ser observado na seguinte tabela.

TABELA Nº 0327

No período em que foi realizado o estudo, conforme a tabela nº 03 pode-se visualizar

que nos anos apresentados, o número de mulheres atendidas se manteve estável, sendo que o

número de crianças sempre esteve acima do número de mulheres, tendo em vista a realização

do abrigamento da genitora com seus filhos.

27

Fonte: Casa-Abrigo, 2009

NÚMERO DE ABRIGADOS

2006 2007 2008 2009* TOTAL

MULHERES 38 34 33 39 144

CRIANÇAS 50 50 50 43 193

ADOLESCENTES 4 5 0 2 11

FAMÍLIAS 27 26 4 25 82

*Considerando os atendimentos realizados até o mês de setembro de 2009

Page 57: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

56

Os dados confirmam a origem da violência doméstica em famílias com número

significativo de crianças, que são atingidas pela fragilidade da base familiar, realidade

atribuída à organização social de gênero, na qual há a superioridade masculina em detrimento

da feminina. As relações são configuradas pela desigualdade e hierarquia.

O abrigo é uma medida protetiva de caráter temporário, estabelecido por lei para atuar

em casos de extrema necessidade, nos quais fica configurado o rompimento dos laços

afetivos, fator que evidencia a vulnerabilidade social.

No caso em questão, é o momento em que a mulher em situação de violência pode ter

um local seguro, longe das agressões. A partir da ruptura da violência proporcionada pelo

abrigo é assegurado um momento de reflexão para que a vítima possa se restabelecer e

direcionar um novo rumo para a vida.

A violência doméstica afeta todas as classes sociais, entretanto a maior visibilidade é

direcionada para áreas de menor poder aquisitivo, haja vista os casos denunciados na

Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher-DEAM. Tal interpretação provém dos

boletins de ocorrências emitidos pela instituição. Consequentemente, constata-se que as

mulheres que são atendidas pela Casa-Abrigo apresentam diagnósticos bem semelhantes, após

realização do boletim de ocorrência, antes de serem abrigadas. É notório na tabela nº 04 que

as usuárias são predominantemente de áreas vulneráveis, nas quais os índices de violência são

altos.

TABELA Nº 0428

ORIGEM DAS USUÁRIAS AEROPORTO 02 1,38% GRAGERU 01 0,69% PONTO NOVO 02 1,38%

AMÉRICA 01 0,69% GETÚLIO VARGAS 03 2,08% PORTO DANTAS 02 1,38%

ATALAIA 01 0,69% INDUSTRIAL 06 4,16% PROPRIÁ 01 0,69%

ARAUÁ 01 0,69% INÁCIO BARBOSA 02 1,38% RIO DE JANEIRO 01 0,69%

AUGUSTO

FRANCO

05 3,47% JAPÃOZINHO 01 0,69% SALVADOR 01 0,69%

BAHIA 01 0,69% LAGARTO 01 0,69% SANTA MARIA 31 21,52%

BARRA DOS

COQUEIROS

02

1,38%

LAMARÃO

01

0,69%

SANTOS DUMONT

09

6,25%

BUGIO 04 2,77% LARANJEIRAS 01 0,69% SÃO CARLOS 02 1,38%

CASTELO

BRANCO

02 1,38% LUZIA 01 0,69% SÃO CONRADO 07 4,86%

CAPUCHO 01 0,69% MARUIM 01 0,69% SÃO CRISTÓVÃO 05 3,47%

CIDADE

NOVA

02 1,38% MATO GROSSO DO SUL 02 1,38% SIQUEIRA CAMPOS 04 2,77%

CIRURGIA 02 1,38% MOSQUEIRO 01 0,69% SOLEDADE 02 1,38%

CENTRO 04 2,77% NOSSA SRª DA GLÓRIA 01 0,69% SUÍSSA 02 1,38%

COROA DO

MEIO

03 2,08% NOSSA SRª DO SOCORRO 08 5,55% VENEZA I 01 0,69%

COQUEIRAL 04 2,77% NOVO PARAÍSO 01 0,69% SEM ENDEREÇO 01 0,69%

18 DO FORTE 01 0,69% OLARIA 02 1,38%

ESTÂNCIA 01 0,69% PALESTINA 01 0,69%

28

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 58: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

57

As localidades em azul foram destacadas de maneira didática para a melhor

identificação das Cidades e Estados que são atendidos pelo abrigo, mas que não fazem parte

da área de abrangência, ou seja, de Aracaju, já que o abrigo é administrado pela Prefeitura

Municipal de Aracaju e SEMASC. Entretanto, por entender a necessidade do enfrentamento

da violência doméstica, a Casa-Abrigo recebe mulheres do interior do Estado de Sergipe e da

Grande Aracaju, levando-se em conta a não existência de uma instituição do Governo

Estadual voltado para esse trabalho.

Através do gráfico 05, pode-se visualizar a predominância da violência doméstica nas

quatro primeiras localidades das usuárias atendidas, que apresentam maior índice.

GRÁFICO Nº 0529

As usuárias atendidas pela Casa Abrigo são provenientes de várias localidades, dentre

elas de Aracaju, Grande Aracaju, cidades do interior do Estado, assim como de outras

Cidades e Estados do território nacional.

Com base nos dados dos atendimentos realizados no período de janeiro de 2006 a

setembro de 2009, foram contabilizadas 144 mulheres vítimas, sendo a localidade de maior

fluxo o Bairro Santa Maria, que se destaca com 21,52% das atendidas. Em seguida vem o

Bairro Santos Dumont com 6,25% e, na terceira posição, a Cidade de Nossa Senhora do

Socorro com 5,55% dos casos. O Bairro São Conrado aparece com 4,86%, ocupando quarto

lugar.

29

Fonte de dados : Casa Abrigo, 2009

Page 59: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

58

São áreas com índices de violência significativos, sobretudo no Bairro Santa Maria,

que ainda necessita de um olhar diferenciado, não só pelo crescimento desordenado de

ocupações irregulares30

, mas também por seu histórico de privação, exclusão social e elevado

número de pessoas envolvidas com uso de drogas ilícitas e tráfico de entorpecentes, o que

dificulta ainda mais a manutenção das relações familiares.

A questão racial também é um indicador presente na violência doméstica perpetrada

contra a mulher. É notório que os episódios de violência são atribuídos à raça parda e

subsequente à negra, atestando os resquícios do racismo inerente ao período colonial

brasileiro. Na concepção de Jaccoud (2008, p. 46), “racismo é amplamente reconhecido como

princípio ativo do processo de colonização‖.

Com base nas idéias da mesma autora, houve uma formulação e posteriormente a

consolidação de uma ideologia racista que abriu portas à naturalização das desigualdades

raciais, estas reproduzidas pela sociedade no âmbito cultural e religioso, residindo na

afirmação de que as raças eram separadas por ―desigualdades naturais‖.

Assim como a violência doméstica, o racismo é remoto, tratado como estereótipo, no

qual há a postulação de superioridade de um indivíduo em detrimento do outro, destituindo a

cidadania dos subjugados.

Para Jaccoud,

[...] a discriminação racial é um fenômeno presente na dinâmica social

brasileira. Operando na ordem da distribuição do prestígio e privilégios

sociais, os mecanismos raciais de discriminação atuam mesmo nos espaços

sociais e econômicos mais modernos da sociedade. Esses mecanismos não

apenas influenciam na distribuição de lugares e oportunidades. Reforçados

pela própria composição racial da pobreza, eles atuam naturalizando a

surpreendente desigualdade social deste país. (JACCOUD, 2008 p. 55-56)

Nessa linha de reflexão é oportuno enquadrar a violência doméstica contra as mulheres

no processo de discriminação, uma vez que a população feminina da raça negra e parda tem

maior probabilidade de sofrer agressões, em face do histórico de desigualdade gerado pelo

cerceamento da garantia de direitos como educação, saúde, trabalho e habitação. Sob esse

aspecto, analisemos o gráfico.

30

Cf. Política Nacional de Habitação 2004.

Page 60: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

59

GRÁFICO Nº 0631

O gráfico nº 06 mostra que a predominância da mulher em situação de violência é a de

cor parda abrangendo 59,02% das atendidas. Em segundo lugar vêm as que se declararam

negras com 23,61%. As brancas aparecem com 15,97% e as não declarantes com 1,38%. É

importante ressaltar que a identificação por cor/raça é realizada pela Casa-Abrigo através dos

boletins de ocorrências expedidos pelas delegacias. Quando não é possível a identificação, a

própria usuária se autodenomina de acordo com o formulário de atendimento da instituição.

De acordo com Saffioti,

[...] todos os tipos de discriminação favorecem a maior exploração por parte

dos empregadores. Isso pode ser observado não apenas no que tange ao

preconceito do sexo, mas também no que diz respeito às discriminações

raciais. (SAFFIOTI, 1987, p. 51)

É pertinente dizer que a maioria das usuárias negras se denomina como parda. Tal

comportamento é percebido no momento do acolhimento, realizado quando a mulher é

abrigada. Essa resistência pela não aceitação da raça ocorre não apenas pelo preconceito das

pessoas do convívio familiar e da sociedade, mas também pelo autopreconceito gerado nas

vítimas.

Nos casos em que a mulher sofre com a violência moral e psicológica é marcante a

discriminação racial intrínseca por parte do companheiro/marido. Atingindo diretamente na

autoestima da usuária, que paulatinamente desenvolve problemas psicológicos.

Os registros de violência contra as mulheres de raça negra são predominantes,

levando-se em conta a realidade apresentada, já que a condição de ser mulher, negra e sem

31

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 61: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

60

boas condições econômicas contribui para a revitimização em vários espaços da sociedade e

até mesmo dentro do próprio seio familiar, o que comprova um racismo desenfreado.

De acordo com Cruz,

O patriarcalismo e o racismo constituem antigas formas de legitimação da

discriminação social, integradas no capitalismo. A partir dessa simbiose, são

estabelecidas formas de exploração/dominação mais intensas sobre as

mulheres. (CRUZ, 2005 p. 39)

A situação torna-se mais complicada quando a usuária possui filhos com o agressor, na

medida em que há a reprodução da idéia patriarcal de que a mulher ao se separar acaba

destruindo a família. Com base neste pensamento, a vítima acaba omitindo as agressões para

não ver os filhos criados sem pai, sobretudo pela não aceitação da denominação de ―mãe

solteira‖.

GRÁFICO Nº 0732

Segundo o gráfico nº 07 o número de filhos apresentado pelas usuárias atendidas foi:

dois filhos, representando 27,77%, três filhos 21,52% e, na terceira posição, apenas um filho

19,44%. Isso demonstra que a natalidade entre elas, de certa forma, se mantém controlada.

Entretanto é imprescindível analisar que a dificuldade financeira e o número de filhos influem

sobre a permanência da mulher na relação de violência, haja vista a dependência econômica

gerada pela sua exclusão do mercado de trabalho.

É importante dizer que as usuárias atendidas geralmente são mães muito jovens, o que

dificulta a continuidade dos estudos, tendo como justificativa os cuidados requeridos por uma

32

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 62: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

61

criança. A partir do nascimento do filho, há uma mudança significativa na vida da mulher. Ao

desempenhar a função de mãe, fazendo com que abdique da formação, sem ao menos

completar o ensino básico (fundamental e médio).

Na concepção de Cruz (2005, p. 151), ―o número de filhos e a idade influenciam

diretamente na participação da mulher no mercado de trabalho, sobretudo das mais jovens, no

tocante à conciliação do trabalho com a família‖.

Devido à dificuldade de conciliação há uma ruptura com o processo de qualificação

para assumir o posto de guardiã e educadora. A educação fica estagnada e com ela a

possibilidade de mobilidade social e emancipação feminina, com vistas à ocupação de bons

empregos e salários compensatórios.

Segundo Cruz,

A educação é um princípio que está presente em diferentes visões históricas

do feminismo, ora dirigido às reivindicações de escolarização, de

qualificação pessoal e profissional com vistas à mobilidade social e à

conquista do poder, ora como demandas específicas que atendam às

mulheres [...]. (CRUZ, 2000, p. 22)

Sem o nível de escolarização exigido pelo mercado de trabalho, a mulher permanece

sem poder, já que está submissa às decisões do companheiro/marido devido ao fato de não

possuir autonomia financeira para a própria subsistência.

Segundo Cruz (2005, p. 22), a educação é um meio de equiparação de poder entre a

relação de gênero, visto que as diferenças entre homens e mulheres são minoradas, sobretudo

no que diz respeito ao cumprimento da cidadania.

GRÁFICO Nº 0833

33

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 63: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

62

O gráfico nº 08 mostra que o nível de escolaridade predominante das mulheres

acolhidas foi o Ensino Fundamental Incompleto 68,05%, seguido pelo Ensino Médio

Incompleto e pelo Ensino Médio Completo que apresentam o mesmo percentual 10,41%.

Com a análise dos dados, pode-se dizer que o nível de escolaridade das usuárias é

aquém do requerido pelo mercado de trabalho, para garantir uma vaga de emprego, já que as

mesmas passam pelo processo de abandono dos estudos, seja pelo motivo de gestação,

problemática já citada anteriormente, seja para ajudar os pais na renda familiar, ou a pedido

do companheiro/marido.

É peculiar a manipulação do homem sobre a mulher nas relações conjugais, cultura

arragaida na moral e nos bons costumes. Comportamento vinculado ao patriarcalismo, que

atualmente ainda traz seus resquícios. De acordo com Bassanazi,

[...] O marido é considerado o ―chefe da casa‖ [...], enquanto a esposa se

ocupa das tarefas domésticas, dos cuidados com os filhos e da atenção ao

esposo. [...] O casamento define atribuições e direitos distintos para homens

e mulheres traduzidos frequentemente em desigualdades e dominação do

feminino pelo masculino. [...] As mulheres são caracterizadas e passam a ser

avaliadas principalmente por sua condição de procriadoras e pela fidelidade,

exclusividade sexual [...]. (BASSANEZI, 1996 p. 255-256 grifos

originais)

O texto da autora mostra as normas às quais as mulheres casadas devem se submeter,

sempre desenvolver atividades direcionadas ao lar, o que dificulta a qualificação da mulher

para o mercado de trabalho. Kliksberg (2002, p. 30), enfatiza a importância de uma educação

diferente e afirma que ―a possibilidade de contar com uma educação de qualidade razoável

surge, nos atuais cenários econômicos, como um pré-requisito central para uma inserção

produtiva estável‖. Ressalta ainda que ―no nível pessoal e familiar, a educação é vista como

um dos maiores canais de mobilidade social‖. ―[...] concebe-se normalmente a educação como

uma estratégia central para diminuir as desigualdades‖ (ibid, p. 50).

Diante do exposto é pertinente dizer que a falta de escolaridade e qualificação

profissional contribuem para a submissão da mulher para com o homem, fator principal da

vulnerabilidade frente ao divórcio, sobretudo nos casos em que não possuem um local para

residir.

A condição de habitação é, sem dúvidas, um ponto crucial para a indicação de melhor

qualidade de vida. Embora a habitação seja garantida na Constituição Federal de 1988, existe

um número exorbitante de pessoas que não possuem moradia ou que residem em más

condições e situações ilegais, ou seja, em ocupações irregulares.

Page 64: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Constituindo uma preocupação, a habitação entre as mulheres atendidas pela Casa-

Abrigo, foi analisada por entender que esta contribui diretamente na apreensão da realidade

familiar das usuárias.

GRÁFICO Nº 0934

Com relação a situação de moradia o gráfico nº 09 mostra que 43,05% das usuárias

vivem em casa alugada. As que possuem moradia própria representam 34,72%. Diante dos

dados podemos analisar a realidade da exclusão social vivida pelas usuárias, a de não

possuírem o direito a moradia.

Segundo Cordeiro; Gonçalves apud Véras,

A exclusão social vem apresentando novos contornos no contexto

contemporâneo, no qual favelas, loteamentos clandestinos, entre outras

habitações populares subnormais, como os assentamentos urbanos, aparecem

como testemunhas dessa dinâmica excludente [...]. (CORDEIRO;

GONÇALVES apud VÉRAS, 1999)

A realidade apresentada pelas usuárias está atrelada à subalternidade intrínseca do

processo da exclusão social ao sistema capitalista, uma vez que as condições de moradia estão

diretamente ligadas à capacidade financeira de arcar com os custos de vida.

Entretanto, na população investigada é predominante residente em casas alugadas, o

que se reflete o déficit econômico familiar, visto que o número de usuárias com renda é

ínfimo, comparando-se com os dados das que se ocupam com afazeres domésticos.

Com essa situação os companheiros/maridos comprometem a maior parte de sua renda

mensal para ter o direito à moradia, afetando a própria subsistência e dos seus ―dependentes‖.

34

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 65: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

64

Fato que acaba dificultando a dinâmica dos relacionamentos conjugais, por meio dos

desentendimentos e possíveis agressões.

GRÁFICO Nº 1035

No quesito profissão ou origem da renda, o gráfico nº 10 apresenta a predominância

de mulheres que desenvolvem ações voltadas para o lar 57,63% possuindo o perfil de

dependência econômica com relação aos companheiros/maridos. Um dos motivos de as

usuárias não conseguirem emprego é a falta de qualificação profissional e nível de instrução

educacional ínfimo, se comparando à exigência do mercado.

Algumas mulheres apresentam a justificativa que não tiveram oportunidade de estudar,

visto que casaram ou engravidaram muito cedo, e outras por decisão própria interromperam

tal período. É posta também a questão do impedimento por parte do companheiro/marido, que

não permite que a mulher estude, seja por motivo de ciúmes ou outros externos.

A faixa etária das usuárias atendidas também é um dado importante, na medida em

que a periodização é apresentada as incidências da prática de violência, tomando por base,

além da dependência econômica, a emocional, uma vez que em determinadas fases da vida a

mulher se submete a situações degradantes, seja pela inexperiência ou idade avançada.

Quando estão em plena juventude, às vezes não sabem que decisão tomar e na idade avançada

por se considerar tarde demais para tomar alguma decisão, esperam que o

companheiro/marido possa mudar de atitude.

35

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 66: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Diante dos fatos apresentados, é pertinente dizer que em determinadas fases da vida, a

mulher recai na manutenção da violência doméstica, por causa de questões subjetivas que são

apresentadas em seu cotidiano.

GRÁFICO Nº 1136

No gráfico 11, verifica-se que a faixa etária das mulheres atendidas pela Casa-Abrigo

é entre 20 e 25 anos, correspondendo a 30,55%, seguida pela que vai dos 26 aos 30 anos, o

que implica dizer que as mulheres em situação de violência são jovens que estão em idade

apta para o mercado de trabalho. Entretanto existem outras variáveis que implicam na sua

participação, desde o estado emocional, como também a realidade de vida de cada usuária. É

importante ressaltar que a não participação dessas mulheres na população economicamente

ativa se dá por motivos já mencionados na pesquisa, dentre eles: o baixo nível de

escolaridade, falta de qualificação profissional e a necessidade de cuidar dos filhos, do marido

e do lar.

Ainda com base na análise dos gráficos é importante atribuir o vínculo que a usuária

mantinha com o agressor no momento da violência, visto que a identificação se faz necessária

para o direcionamento de políticas de reeducação e acompanhamento para o público que mais

desenvolve a postura violenta.

É comum que boa parte da sociedade atribua os episódios de violência as relações

conjugais, entretanto não podemos desconsiderar os casos desenvolvidos em relações de outra

origem, principalmente as que fazem parte do convívio comunitário, ou seja, entre pessoas

que possuem um relacionamento apenas convencional, como por exemplo, o contato com

vizinhos. O gráfico demonstra a relação mantida entre a usuária e agressor, seja através do

relacionamento conjugal ou por pessoas de vínculo social e comunitário das vítimas.

36 Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 67: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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GRAFÍCO Nº 1237

O gráfico 12 mostra que o estado civil das vítimas é predominantemente o convivente

68,80%, no qual há o relacionamento marital sem a existência de trâmite judicial. Tal situação

traz como resultado a não complicação com a justiça no caso de separação, o que explica a

não aceitação do casamento formal, seja pela imposição de condições que este requer, seja por

não se considerar importante esse procedimento.

Dentre as vítimas de violência doméstica, destacamos as categorias viúva, divorciada e

a solteira, que não provêm necessariamente de relações conjugais, mas de pessoas de seu

convívio seja familiar ou não, dentre eles: vizinhos, cunhados, netos, filhos e outros.

Para consolidar a relação agressor/vítima é primordial a identificação de tempo de

convivência.

GRÁFICO Nº 1338

37

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009 38

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 68: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

67

O gráfico nº 13 indica que o percentual correspondente ao tempo de convivência foi de

32,60%, para o relacionamento que perdura entre 1 e 5 anos, seguido pelo de 29,80%,

representando de 6 a 10 anos de convivência. O período é razoável, o que desmitifica que as

agressões são provenientes de relações efêmeras, em que a vítima não conhecia bem o

agressor.

Já na caracterização da violência sofrida é comum que sejam predominantes os dados

relacionados à violência física, tendo em vista a maior visibilidade em termos técnicos, ou

seja, é observável, não dá para esconder, diferente da psicológica, que apesar de ocasionar

consequências devastadoras, é mais subjetiva, uma vez que seu diagnóstico pode passar

despercebido por muito tempo, só se revelando em quadro bastante avançado.

GRÁFICO Nº 1439

De acordo com o gráfico nº 14 a violência mais evidenciada foi a física, com 48,61%.

Em seguida aparece a física e psicológica com 19,44%. É importante ressaltar que os números

mostram que as relações, sejam elas conjugais ou não, são permeadas pelo uso da força, ou

seja, está relacionada ao uso do poder, sobretudo do homem para com a mulher.

Seguindo essa reflexão é pertinente dizer que a falta de diálogo é a peça chave para as

vias de fato, os agressores utilizam a violência física como um ponto final para ratificar suas

decisões, para mostrar quem manda e demarcar seu espaço. Outro ponto a ser destacado é a

utilização de substâncias psicoativas que reduzem as possibilidades de um diálogo, de um

raciocínio lógico.

Sobre o tempo de permanência no abrigo, analisemos o seguinte gráfico:

39

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

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GRÁFICO Nº 1540

O gráfico nº 15 demonstra que a permanência no abrigo apresentada pelas mulheres

atendidas entre 1 e 5 dias corresponde a 46,52%, seguida pela de 6 e 10 dias, correspondendo

34,72%. O resultado se dá pelos encaminhamentos realizados pela rede de proteção social,

desempenhada pela DEAM e Casa-Abrigo.

Esse procedimento é feito pela DEAM ao emitir o boletim de ocorrência com a data da

audiência, momento em que a mulher opta pela permanência com o relacionamento ou pela

separação. É importante ressaltar que algumas usuárias voltam a conviver com o agressor por

acreditar que após o registro do boletim de ocorrência, os episódios de violência serão

inibidos.

Por conseguinte cabe à Casa-Abrigo, por meio da SEMASC, arcar com os custos

financeiros para a realização de transferência das usuárias para outro Estado ou Cidade. Mais

um ponto a se destacar é que para o menor tempo de abrigamento é importante o apoio

familiar, constituindo um suporte na tramitação do caso, tendo em vista o momento de

fragilidade emocional vivenciado pela mulher em situação de violência.

As usuárias que permanecem por mais tempo no abrigo geralmente não têm apoio

familiar, dependem financeiramente do agressor, ou estão por aguardar os trâmites legais da

justiça envolvendo pedido de guarda, pensão e divórcio.

Outra categoria a ser destacada foi relacionada às abrigadas usuárias de substâncias

psicoativas ou com envolvimento com o tráfico.

40

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 70: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

69

GRÁFICO Nº 1641

Segundo os dados do gráfico nº 16, dentre as 144 mulheres atendidas, 14 apresentaram

o perfil de utilização de substâncias psicoativas ou envolvimentos com tráfico, totalizando

9,07%. Dentro do universo posto, o número das usuárias que utilizam substâncias psicoativas

é pequeno, entretanto não podemos descartar a interferência ocasionada na dinâmica familiar

onde estão inseridas, principalmente as que utilizam a bebida alcoólica, visto que não há

restrições para venda, o que provoca o uso indiscriminado pelos dependentes químicos.

De acordo com Balbach (2006:22), ―é bebendo ‗um pouquinho‘ que os grandes

alcoolistas iniciaram sua carreira degradante‖. É um processo que vai tomando grandes

proporções paulatinamente. A droga utilizada pelas mulheres acolhidas pela Casa-Abrigo é

justificada pelo complemento da renda familiar ou para próprio uso.

Como defende Balbach,

A falsa sensação de bem-estar produzida pela absorção de bebidas contribui

poderosamente para a gênese do vício. Quem hoje ingere alguns goles de

cachaça e se sente alegre, experimentando uma euforia, é naturalmente

tentando beber outra vez amanhã, para experimentar a mesma euforia, a

mesma sensação de bem-estar. E a vítima se esquece de duas coisas: 1) que o

sentimento agradável é puramente enganoso, sendo produzido pelo fato de

que o sistema nervoso se acha entorpecido; 2) e que essa falsa sensação não

pode ser experimentada dia após dia sem aumentar-se gradualmente a dose,

o que aumenta continuamente o perigo em que a vítima se encontra.

(BALBACH, 2006, p. 30)

O mesmo acontece com a pessoa sob o efeito das drogas ilícitas, sendo a mais

utilizada o crack, substância que vem causando graves consequências na sociedade, sobretudo

41

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 71: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

70

no seio familiar. Com objetivo de desvelar as possíveis causas da violência doméstica foi

realizado o seguinte procedimento:

Analisamos o perfil dos agressores das usuárias atendidas pela Casa-Abrigo, com

vistas a conhecer melhor a situação dos casos apresentados. Na coleta foram utilizados os

dados dos formulários de atendimento efetuados no ato do abrigamento da vítima, sem deixar

de considerar os aspectos dos boletins de ocorrências emitidos pela Delegacia Especializada

de Atendimento à Mulher-DEAM de Aracaju e de outras especializadas integrantes da Grande

Aracaju e interior de Sergipe, bem como dos dados provenientes de usuárias de outros

Estados.

3.2- Caracterização do perfil dos agressores

Na análise foram ponderadas algumas variáveis, dentre as quais destacamos: o nível de

escolaridade, o estado civil, raça/cor, profissão, faixa etária e por fim os agressores que

utilizam ou estão envolvidos com substâncias psicoativas. Para melhor ilustração foram

criados algumas tabelas e gráficos, visando a maior compreensão da realidade.

Como já mencionado, a educação é base para o desenvolvimento do indivíduo,

constituindo a mobilidade social que vise à ocupação de melhores cargos e consequentemente

a aquisição de salários mais elevados. Para compreender o nível de instrução dos agressores,

foram detectados os seguintes números:

GRÁFICO Nº 1742

42 Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 72: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

71

Os dados do gráfico nº 17 apontam que o nível de escolaridade apresentado pelos

agressores é de 37,50% no tocante ao percentual que corresponde ao Ensino Fundamental

Incompleto, seguido pelo de 34,02% para aqueles cujo nível não foi informado, devido ao

desconhecimento por parte das companheiras/esposas do grau de instrução dos mesmos.

Comparando a porcentagem entre o nível de escolaridade dos agressores com os das usuárias

é evidente que o grau de instrução corresponde predominantemente ao ensino fundamental

incompleto, totalizando 37,50% para os agressores e 68,05% para as usuárias, confirmando

uma das hipóteses desta pesquisa, que é o baixo nível de escolarização das vítimas.

O estado civil dos agressores é outro dado que constitui uma variável importante para

a análise da realidade da questão de gênero entre as acolhidas pela Casa-Abrigo, já que

através da informação do mesmo há a possibilidade de traçar o perfil dos agressores no que

diz respeito ao grau de relacionamento familiar e social.

GRÁFICO Nº 1843

De acordo com dados do gráfico nº 18 o estado civil dos agressores é em regime de

concubinato, ou seja, sem trâmites legais, representando 67,36% dos casos atendidos.

Demonstra-se assim que a violência se faz presente no seio familiar, constituindo um

problema para a sociedade, enquanto as consequências se alastram através da desestruturação

de todos os elementos, seja sobre as crianças por meio do processo de bloqueio de

socialização e de reprodução da violência, sobretudo no espaço das escolas, seja sobre as

mulheres com grandes sequelas físicas e psicológicas e até sobre o próprio agressor ao se

deparar com o enquadramento na Lei. Acrescentam-se a isso os altos encargos financeiros

gerados ao Estado, tendo em vista o número crescente de atendimento médico e jurídico às

vítimas, bem como as faltas destas aos postos de trabalho.

43

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 73: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Retomando a categorização do perfil do agressor, foi analisada cor/raça, com vistas a

averiguar em que segmento a prática da violência é mais frequente.

GRÁFICO Nº 1944

De acordo com o gráfico 19 a cor/raça predominante é a parda 40,97%, seguida pela

dos não declarados 22,91%. A partir dos dados foi atestada que a violência se faz presente

entre os de cor/raça parda, os agressores com 40, 97% e as usuárias com 59, 02%. Entretanto

a porcentagem mostra que as vítimas são em número maior, o que leva a inferir que a causa

da violência pode está atrelada à cor da pele, uma vez que não só o companheiro/marido é

protagonista nos episódios de preconceito, como também a família do mesmo, desde as

famílias dos que se consideram de origem branca às daqueles da própria raça negra e parda,

reforçando a negação de identidade racial.

GRÁFICO Nº 2045

44

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 74: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Os dados apontam que o índice de desemprego entre os agressores é de 24,30%, um

fator gerador de violência dentro dos lares, porque eles não possuem meios para arcar com as

despesas da casa, realidade que contradiz a convenção social que o homem é o provedor da

casa. Sem a garantia de uma renda, há desencadeamento de uma série de consequências,

dentre elas o envolvimento com drogas e bebidas alcoólicas, utilizadas como subterfúgios

para a resolução dos problemas.

GRÁFICO Nº 2146

Os dados referentes à faixa etária é de 40, 97% para os casos sem informação, tendo

em vista que na prestação do boletim de ocorrência, a vítima não tem conhecimento da data

de nascimento dos seus agressores, seja pelo fato de não querer informar ou pelo bloqueio

psicológico vivenciado por elas, devido às ameaças e espancamentos. Com 16,66% vem a

faixa etária entre 26 e 30 anos.

GRÁFICO Nº 2247

46

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009 47

Fonte de dados: Casa Abrigo, 2009

Page 75: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Dentre os casos atendidos é relevante o uso de substâncias psicoativas entre os

agressores, perfazendo um índice total de 59,72%, isto é, de 144 casos 86 têm o registro da

utilização de drogas e álcool ou do próprio envolvimento com tráfico de drogas. A maconha

foi a mais utilizada no período de janeiro de 2006 a setembro de 2009, com 17,36% e em

seguida o crack com 15,97%.

O índice demonstra a realidade vivenciada nas relações das mulheres atendidas, tendo

em vista o efeito das substâncias psicoativas nos agressores. Ainda com as idéias de Balbach,

podemos dizer que o homem sob o uso das drogas pode apresentar vários sentimentos e

comportamentos;

[...] desperta-se a vaidade, o orgulho, o egoísmo, o ciúme, a inveja, o ódio, as

más paixões, e todos os demais sentimentos baixos que jazem no porão da

mente carnal [...], e, não podendo ser reprimidos por sua consciência

entorpecida e insensibilizada, não podendo ser domados por sua força de

vontade grandemente amesquinhada, se desenvolvem e produzem, para a

desonra própria, da família e da sociedade [...]. (BALBACH, 2006 p. 91)

São sentimentos que abrem espaços para os comportamentos repudiados pela

sociedade e principalmente pela família, ocasionando uma vida de sofrimento para o próprio

usuário da substância, seja ela a maconha, o crack ou até mesmo o álcool.

As assistidas pela Casa-Abrigo são vitimizadas duplamente, além de sofrerem por

causa da cultura machista de submissão, são diretamente atingidas pelas consequências da

vida desregrada de seus companheiros/maridos, visto que a utilização de substâncias

psicoativas paulatinamente contribui para um comportamento agressivo e descompromissado

dos mesmos, fator que contribui para a ratificação dos episódios de violência, perda de

emprego ou até mesmo na dificuldade em consegui-lo. Entretanto, as usuárias preferem omitir

o histórico da utilização das substâncias psicoativas, geralmente temem que a situação se

complique ainda mais por denunciar o envolvimento do agressor com algo ilícito.

É uma realidade bastante complexa que traz consigo diferentes atitudes, dentre elas a

omissão da vítima, que busca minorar a situação por meio da naturalização dos fatos,

omitindo muitas vezes a dimensão do problema ou passa a se culpabilizar pelas agressões,

justificam que a violência só acontece por causa da utilização das substâncias psicoativas,

visto que sem elas, o agressor é um homem bom.

Page 76: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

75

CAPITULO IV

A ÓPTICA DOS AGENTES ENVOLVIDOS NO SISTEMA DE ATENDIMENTO ÀS

VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

O presente capítulo tem por finalidade analisar os dados qualitativos obtidos mediante

as entrevistas semiestruturadas, no que se refere ao conhecimento dos agentes envolvidos no

exercício profissional (Advogado, Assistente Social, Psicóloga48

e Coordenadora) e das

usuárias do Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo

Professora Núbia Marques.

As entrevistas com os profissionais foram realizadas individualmente no abrigo

(Coordenadora) e no CREAS São João de Deus (Assistente Social e Advogado), com

autorização para gravação de voz. O período da aplicação foi do mês de janeiro a fevereiro de

2010, tempo oportuno para a coleta de dados, já que os mesmos estariam em remanejamento

no mês de abril do mesmo ano, por motivo de realização de concurso público promovido pela

Prefeitura Municipal de Aracaju.

Considerando as experiências adquiridas no exercício profissional, as entrevistas

foram priorizadas para esse período, a fim de se conhecer e explorar as idéias da equipe

profissional que estava há mais tempo no desenvolvimento das atividades inerentes ao

enfrentamento da violência doméstica.

Sob esse aspecto, analisamos o perfil de cada profissional, sendo Coordenadora da

Casa-Abrigo graduada em Serviço Social, atuante na área desde 2005, a Assistente Social e o

Advogado desde janeiro de 2008.

4.1-A óptica dos profissionais

Para o entendimento da rede de proteção social, foram questionados sobre a percepção

da capacitação dos profissionais da equipe técnica (Coordenadora, Assistente Social e

Advogado) para lidar com a questão da violência doméstica, foram exemplificados alguns

depoimentos:

48 A entrevista com a psicóloga não foi realizada, visto que já não fazia mais parte do quadro de profissionais da

equipe técnica no período da coleta.

Page 77: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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A questão da violência doméstica é delicada, então essas capacitações têm

que acontecer sempre, de forma continuada, não de forma esporádica,

porque é uma questão muito complicada [...] trabalhar direitos violados,

então essas capacitações [...] acontecem, mas [...] poderiam acontecer de

forma mais contínua. (Coordenadora)

Eu estou na secretaria desde 2008 e nos anos de 2008 e 2009 a Secretaria [de

Assistência Social] ofereceu um número até razoável de capacitações para

todos profissionais, tanto Assistentes Sociais, Psicólogos, como eu

Advogado, sobre o tema, então eu avalio como bom o oferecimento de

capacitação dos profissionais para lidar com a violência doméstica.

(Advogado).

Eu estou há dois anos e um mês aqui no CREAS fazendo acompanhamento

às vítimas de violência na Casa-Abrigo e houve algumas capacitações pela

Secretaria, que foram muito importantes porque a gente conseguiu [...] fazer

essa relação [da teoria com a prática], mas de um tempo pra cá do que sinto

falta é a questão da continuidade dessas capacitações, porque a última

capacitação relacionada à violência doméstica de que eu participei foi em

fevereiro de 2009, então de lá pra cá a gente precisa renovar, reciclar os

conhecimentos. (Assistente Social)

É perceptível no depoimento dos profissionais que a Secretaria de Assistência Social e

Cidadania-SEMASC tem desenvolvido capacitações, contudo estas precisam ser realizadas

com mais frequência, uma vez que o processo de conhecimento das técnicas para lidar com a

violência doméstica deve ser contínuo, sobretudo pela magnitude que o tema representa na

sociedade, nas consequências direcionadas à família, à economia e outros setores. Na fala dos

profissionais, é notório o reconhecimento da dificuldade em trabalhar direitos violados e a

importância da realização de capacitações para lidar com mulheres em situação de violência.

Com relação à opinião dos profissionais sobre a contribuição da Casa-Abrigo ao apoio

oferecido às vítimas de violência, foram observadas as seguintes respostas:

A principal contribuição é a segurança, essas mulheres procuram a Casa-

Abrigo, porque estão ameaçadas de morte. Então precisam de um local

seguro pra ficar, a Casa-Abrigo oferece essa segurança, serviço muito

discreto, uma ouvida qualificada, no momento em que a mulher chega,

chora, fala suas mágoas. Então é um local em que ela pode ficar muito à

vontade colocando todas as suas [...] mágoas, suas revoltas e de que ninguém

sabe a nossa localização. Por isso que a segurança é o nosso maior objetivo.

(Coordenadora).

A Casa-Abrigo é um local essencial pra garantir a segurança física e

emocional, tanto da mulher vítima quanto dos seus filhos, uma vez que,

mesmo que a lei determine o afastamento do agressor do lar, a gente sabe

que na prática fica complicado socorrer e, mesmo quando ocorre, a polícia

não pode estar em vários lugares ao mesmo tempo. Então mesmo tendo uma

Page 78: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

77

ordem de afastamento, uma medida protetiva, o agressor pode se aproximar

da vítima. [Portanto] a Casa-Abrigo é importante para resguardar a

segurança da vítima. (Advogado).

A violência é um fenômeno multicultural, então por conta disso no momento

[em] que a violência é identificada pelo sistema de garantia a Casa-Abrigo

vai servir como uma referência de apoio, [...] não somente de reclusão, mas

também de proteção e segurança que naquele momento em que ela precisa

de que os seus direitos sejam garantidos, ela tenha efetivamente isso na sua

vida, e aí eu acredito que a proteção [...] de garantir essa [segurança] a

mulher no momento mais delicado que ela vive. (Assistente Social)

De acordo com os depoimentos, a segurança é a maior contribuição da Casa-Abrigo na

vida das mulheres que estão fragilizadas, devido à violência, seja ela física, psicológica,

sexual, moral, dentre outras. A Casa-Abrigo é destacada pela segurança, como um local de

refúgio para a vítima, de reflexão e principalmente como instituição interlocutora no processo

de fortalecimento dos vínculos afetivos rompidos e direitos violados.

Questionados se a rede de proteção tem garantido o apoio para as demandas e

encaminhamentos, os profissionais/respondentes expressaram suas representações:

Tem garantido sim essas demandas, porém eu percebo que a rede de

proteção deveria saber mais sobre a Casa-Abrigo, das nossas necessidades e

aí priorizar esses atendimentos, porque muitas vezes nós ficamos expostas[a

muitas horas de espera], quer seja na delegacia, no IML, no posto de saúde.

(Coordenadora)

Eu penso que tem garantido, porque a garantia entre a delegacia e Casa-

Abrigo ainda é muito bem feita, mas quando a gente passa pra outros órgãos

como encaminhamento para a Defensoria Pública ou até mesmo [para o]

judiciário a gente vê uma demora muito grande na solução dos casos, o que

passa uma sensação de impunidade [do] agressor. Nesse ponto eu acho que a

rede de proteção é falha, na parte tanto do judiciário quanto da Defensoria

Pública pra resolver o problema da vítima. (Advogado)

A rede ainda é um pouco assim, bem fragilizada, vamos dizer assim. Existe

uma rede de proteção à mulher vítima de violência, mas que ainda há os seus

gargalos, [...] os seus furos que muitas vezes quando a mulher sai da Casa-

Abrigo ainda há uma dificuldade da continuidade no acompanhamento dessa

mulher, porque na verdade [...] ela ainda vai precisar tanto do

acompanhamento aqui do próprio CREAS que acaba não tendo força

suficiente pra poder acompanhar, como posteriormente dos CRAS que é

localizado no território que essa mulher mora. Em relação à assistência,

porque em relação aos outros, às outras políticas [...] a política de saúde que

precisaria também ter esse acompanhamento, a política de segurança pública

e de justiça deveria também ter esse acompanhamento e aí eu acho que tem

muito a caminhar. (Assistente Social)

Page 79: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Diante das respostas é notório que os profissionais enxergam a rede de proteção sob

vários ângulos, que vai desde o atendimento direto às usuárias, ao processo de morosidade da

justiça e da continuidade dos serviços não efetuados após o desligamento das mesmas. Então

é consensual entre os profissionais que a rede tem garantido o apoio às usuárias, mas existem

avanços a serem conquistados.

A respeito dos encaminhamentos mais usuais e entraves encontrados para a sua

realização, os profissionais evidenciaram:

Os encaminhamentos mais usuais são Unidade Básica de Saúde, IML e

delegacia. Os entraves: a demora no atendimento dessas vítimas.

(Coordenadora)

O encaminhamento que eu mais faço particularmente é encaminhamento à

Defensoria Pública pra dissolução de casamentos ou então de união estável,

divórcio e separação [a ver com] a questão de alimentos. Outros maiores

entraves que a gente encontra é realmente a falta [...] de profissionais da

Defensoria Pública , a demanda deles é muito grande, a gente vê que falta

uma atenção maior pra todos [...]. (Advogado)

É relacionado à questão da saúde, quando ela precisa ter cuidados médicos

tem a questão da delegacia, dos exames de corpo de delito [...] tem também

quando ela precisa de alguma necessidade com relação à Assistência, dos

benefícios eventuais como: cesta básica ou outro tipo de benefício.

(Assistente Social)

Sobre os entraves encontrados a Assistente Social destacou:

[...] à questão da violência quando é identificada implica uma relação com

Sistema de Justiça, com sistema de garantia de direitos, então quando a

justiça não determina, não aplica as medidas de urgência que têm na lei, fica

muito difícil porque muitas vezes é a mulher que acaba sendo de uma certa

forma punida porque sai de sua casa, de seu convívio [familiar] e vai para

um ambiente que vai oferecer proteção, mas ao mesmo tempo é recluso e

não tem as medidas de urgência efetivadas pra garantir que ela possa viver

normalmente. Então acredito que há muitos entraves nessas questões

relacionadas ao sistema de garantia bem mais [pertinentes à] justiça.

(Assistente Social)

Nos depoimentos da Coordenadora e da Assistente Social pode-se visualizar que os

procedimentos realizados nos encaminhamentos são semelhantes. Entretanto a Coordenadora

destaca a problemática institucional das redes de atendimento, tendo em vista a demora no

acolhimento das usuárias. Já a Assistente Social destaca que o entrave reside na fragilidade

das medidas protetivas, uma vez que sem elas as usuárias acabam sendo ―punidas‖, devido à

falta de um aparato legal para resguardá-las contra novas agressões.

Page 80: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Diferente das opiniões da Coordenadora e da Assistente Social, o Advogado enxerga

um lado mais técnico, uma vez que o entrave encontrado em seus encaminhamentos reside na

falta de profissionais para dar conta dos processos existentes.

Com relação a algumas dificuldades para o exercício profissional na Casa-Abrigo,

destacaram-se:

Dificuldades nós temos, como toda instituição tem, na receptividade dos

equipamentos porque muitas vezes eles não conhecem o serviço da Casa-

Abrigo, então essas mulheres ficam expostas esperando longamente nas

filas. Nós lidamos com profissionais não qualificados que insistem em saber

a nossa localização [da Casa Abrigo], nós não temos no quadro de

profissional [...] alguém da área da saúde, porque muitas vezes nós

necessitamos. (Coordenadora)

Bem eu acho que temos duas dificuldades primordiais: a primeira realmente

é a morosidade e a burocracia judiciária pra a concessão de medidas

protetivas e resolução dos casos das vítimas. A segunda [tem realmente] a

ver com a estrutura da casa no sentido de que por ser um local muito

fechado, mais parece uma prisão pros usuários, não deixa eles tão à vontade,

fica um clima muito tenso... Então eu acho que a gente precisaria de um

local mais adequado, mais amplo, com jardim, quintal, brinquedos. Enfim

um local que não tenha jeito e cara de prisão como tem hoje. (Advogado)

Bom, eu acredito que uma das dificuldades é a questão da estrutura. A

estrutura da Casa-Abrigo, ela não é adequada para uma casa que garanta a

proteção à mulher vítima. Outra dificuldade que eu sinto é em relação a algo

que já foi falado, do posterior, de como vai se dar o acompanhamento dessa

mulher posterior a saída da Casa-Abrigo [...]. Então por eu trabalhar na

Casa-Abrigo e no CREAS eu sinto essa dificuldade que a gente não tem [...]

como deveria ser feito o acompanhamento dessa mulher, e até quando

encaminha para o CRAS não há um acompanhamento de fato e é em relação

à resolutividade dos próprios conflitos dessa mulher que muitas vezes ela

acaba tendo uma reincidência de como vítima de violência, acaba

acontecendo novamente e voltando para a Casa-Abrigo, porque na verdade o

que a gente quer é que essa situação seja interrompida e que ela restabeleça

sua vida, mas há essa descontinuidade das ações. E essa é uma das grandes

dificuldades. (Assistente Social)

As repostas são bem pontuais, porém é importante destacar o depoimento realizado

pelo Advogado e Assistente social que apontam a estrutura do abrigo como uma dificuldade

para o exercício profissional, no sentido da preocupação com o bem-estar das usuárias no

período em que estão abrigadas e após o desligamento, com a efetivação dos

encaminhamentos para garantia de uma ruptura com os laços de violência.

Sobre a dificuldade que predomina entre as mulheres atendidas com relação à

superação do ciclo de violência, apontaram:

Page 81: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Superar a violência é uma questão muito difícil, romper com essa barreira

também nossas mulheres geralmente têm uma dependência financeira e é

isso que faz com que elas fiquem apegadas a esses maridos, elas não

estudam porque eles forçaram ou solicitaram, não trabalham, dependem

exclusivamente desse marido, geralmente têm muitos filhos, não tem apoio

da família, muitas vezes a família [...] orienta que elas continuem com esse

companheiro, mesmo sabendo que ela é violentada, então a mulher não

consegue um respaldo da família pra romper esse ciclo por isso que muitas

vezes acabam voltando pra esse agressor. (Coordenadora)

A grande maioria das mulheres atendidas não têm renda própria, não têm

emprego, não têm como se sustentar, então a gente vê que fica difícil para

elas superar a violência, primeiro a dependência financeira do agressor,

segundo que por causa dessa dependência financeira criam as outras

dependências, um vínculo emocional [...] também uma sensação de

abandono [...] a gente ver também muitas, algumas delas que não tiveram em

casa durante sua criação um ambiente saudável. (Advogado)

Está relacionada à condição de sobrevivência, eu acredito existe uma

situação, uma condição de afetividade, de dependência afetiva, mas isso não

é o predominante, há uma predominância da condição de sobrevivência,

muitas vezes a mulher que sofre a violência ela não tem perspectiva de vida,

de sobrevivência, de futuro, muitas vezes não teve nem tem a oportunidade

de uma escolaridade, de ter uma profissão, de ter um curso profissionalizante

e acaba não tendo condições de poder ser inserida no mercado de trabalho e

aí acaba se submetendo novamente a essas situações por conta da falta de

recursos. (Assistente Social)

Os depoimentos revelam as causas de aceitação do vínculo de violência por parte das

usuárias, uma vez que não possuem perspectivas para uma vida independente. É uma

realidade que, para ser transformada, exige além da vontade de querer mudar de vida, consiste

em uma mudança cultural e suporte das políticas direcionadas à questão de gênero

Indagados se é realizado o trabalho interdisciplinar entre os profissionais para a

resolução dos casos, eles responderam:

O trabalho interdisciplinar tem que acontecer [...] muitas vezes nos juntamos

com Assistente Social e o Advogado pra saber quais os encaminhamentos,

como nós vamos solucionar esse problema, dessa usuária.

Também estamos lidando com olhares diferentes o Advogado tem um olhar,

a Assistente Social tem um outro e aí é bem interessante esse trabalho

interdisciplinar que só faz fortalecer o resultado final [...] para se dar o

desligamento dessa usuária. (Coordenadora)

Com certeza é realizado o trabalho interdisciplinar, acontece da seguinte

forma: geralmente os casos são depois do abrigamento, do acolhimento, são

discutidos entre mim, o Advogado, a Psicóloga que atende e a Assistente

Social, a gente senta pra discutir qual o melhor caminho que tomar, a melhor

decisão a tomar em cada caso. (Advogado)

Page 82: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Como a psicóloga que acompanhava as mulheres da Casa-Abrigo, deixou a

gente há quatro ou cinco meses, então hoje a gente só tem como

profissionais no caso: o Advogado, a Coordenadora da Casa Abrigo, que

também tem a formação de Assistente Social e eu enquanto Assistente

Social. Então eu acredito que [...] eu sinto falta desse olhar profissional do

Psicólogo porque [...] acho que o Psicólogo dá um apoio muito grande nesse

momento muito delicado da mulher, da questão da superação da violência,

de fortalecer a auto-estemas, então nesse momento eu sinto falta da presença

do Psicólogo no acompanhamento dos casos. (Assistente Social)

Só a Assistente Social foi perguntado se havia divergência com a área jurídica:

Não, eu acredito assim, cada área tem o seu saber e que não é uma

divergência conflitante, há uma divergência que é comum em qualquer área,

mas por conta de seguir até mesmo o que diz a lei, o que diz a política de

assistência social, o que diz a conduta da política nacional de política para as

mulheres, [...]. Eu acredito que pode haver divergência no sentido de

opiniões, mas o que vai ser [...] decido no momento é aquilo que é melhor

para a mulher e o que está baseado na lei. (Assistente Social)

O trabalho interdisciplinar entre os profissionais é entendido como um momento de

interlocução de conhecimentos e ações com finalidade de discutir os encaminhamentos que

serão dados. É pertinente dizer que é um momento de troca de saberes que proporciona o

complemento de uma profissão para com a outra.

Sobre as dificuldades percebidas no exercício do trabalho interdisciplinar, destacaram:

Como cada área tem um olhar focado pra um determinador, muitas vezes nós

entramos em atrito porque nem sempre o que eu penso o Advogado pensa,

nem sempre o que o Advogado pensa a Assistente Social pensa, mas aí nós

conseguimos chegar a um denominador comum porque na verdade o que nos

interessa naquele momento é o bem-estar da usuária, tudo em nome do

usuário e a gente consegue sim [...] focar o nosso olhar, nossa visão pra um

determinador que abranja os três olhares. (Coordenadora)

Bom, a dificuldade no trabalho interdisciplinar que eu vejo é muito pequena,

é mais na questão de interpretação de cada caso, que vai da formação

profissional de cada um, a Assistente Social e a Psicóloga, às vezes tem uma

visão mais humana [...] mais de proteção à vítima, enquanto eu consigo

enxergar um lado mais jurídico técnico, então a dificuldade é mínima, é só

realmente de formação profissional de cada um [...] conceito pessoal.

(Advogado)

Não, nesse momento não. Como eu lhe falei, eu sinto a falta do psicólogo, da

presença do psicólogo, mas nesse momento eu acho que assim, o Advogado

faz o seu papel, a Coordenação da Casa-Abrigo faz o seu papel, eu, enquanto

Assistente Social, tento fazer o meu papel e eu acredito que assim as

opiniões se somam, se acrescentam. (Assistente Social)

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É perceptível que os profissionais envolvidos possuem algumas divergências

relacionadas à ótica que está implícita na formação acadêmica, entretanto é constatado que o

atendimento não é prejudicado, uma vez que possuem como prioridade a boa resolutividade

dos casos e a postura de que as áreas de atuação necessitam uma das outra. Neste processo é

descartada a sobreposição de um profissional em detrimento do outro, não existindo uma

relação de hierarquização das ações e sim o respeito à linha de reflexão de cada um.

Sobre que sugestão eles dariam para a melhoria das ações vinculadas ao combate à

violência doméstica, destacaram:

Violência doméstica é algo que acontece há séculos, então seria primordial

que houvesse essa mudança de mentalidade, de que mulher não é objeto, não

é saco de pancada, então teria ações mais concretas como campanhas

frequentes de mobilização dos conselhos, das comunidades, de todos os

sujeitos da sociedade pra acabar com essa violência e a punição de forma

mais severa a esses agressores porque a gente percebe que a Lei Maria da

Penha não está sendo cumprida como deveria ser, a gente sabe que hoje não

é permitido pagar fiança e continua-se pagando fiança.O agressor é preso no

outro dia o agressor está solto. Então ações mais concretas, mais voltadas

para o público, para as comunidades mais carentes que é onde a violência

mais acontece [...] que as pessoas vissem realmente que nós estamos na luta

contra o direito dessas mulheres violentadas e que a lei precisa ser

concretizada de forma mais efetiva. (Coordenadora)

Bem, a Lei Maria da Penha foi um grande avanço no combate à violência

doméstica, então a gente tem que cobrar uma melhor aplicação, mais célere

como também um acompanhamento pós-abrigamento, seria importante

também uma tentativa de recolocação profissional, já que maioria delas,

[...], não têm uma renda própria é importante, uma estrutura melhor física da

Casa-Abrigo, um local mais amplo, arejado, que possa contribuir também

para diminuir o trauma psicológico da vítima e de seus familiares [...], seus

filhos no caso. (Advogado)

Eu acredito que é preciso no município de Aracaju, começarem-se a

intensificar as campanhas porque a gente tem essa rede, mesmo fragilizada,

mas tem a rede. a Casa-Abrigo atende a todo Estado, e aí quando identifica

uma situação de violência, a mulher é abrigada, é dada a queixa, é indo ao

IML [...] aos cuidados médicos, mas é preciso trabalhar também com a

prevenção. Eu acho que nesse ponto ainda é muito fraco, é preciso

desenvolver mais ações relacionadas à campanha de violência contra a

mulher que atinge aquela mulher que tá naquela zona de miséria, de situação

de risco, de pobreza, que possa ela [possa] perceber que [...] sofrendo

violência, que muitas vezes a mulher não percebe, que paralelo a isso, eu

acredito também, que a Coordenadoria de Políticas Públicas das Mulheres

deveria criar, incentivar cursos ou uma rede de cursos profissionalizantes pra

a entrada dessa mulher ao mercado de trabalho, porque uma das dificuldades

pra que essa violência seja cessada, seja acabada, pelo menos reduzida, é

essa questão do acesso ao mercado de trabalho, ela não ter nem condições de

acessar porque ela está [inapta] por conta de sua condição de escolaridade

baixa. (Assistente Social)

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83

A partir dos depoimentos são evidenciadas as necessidades sob a ótica dos

profissionais que lidam diariamente com as usuárias. É através do exercício profissional que

são detectadas as falhas e também os avanços. É fato que a Lei Maria de Penha foi um

avanço, mas ainda existem pontos fragilizados, como a própria efetivação da lei, sobre a

permissão de pagamento de fiança e a prestação de penas pecuniárias.

Segundo os profissionais para melhor condução das ações no enfrentamento à

violência doméstica é necessária a prevenção da violência doméstica, sobretudo nas camadas

mais pobres, visto que o índice se concentra nas áreas de grande vulnerabilidade social, bem

como políticas voltadas a qualificação das usuárias.

4.2-A óptica das usuárias

A coleta de dados referente às usuárias foi realizada em suas residências, através de

entrevistas com gravação de voz. O período de realização foi de janeiro a fevereiro de 2010,

com pequena mostra constituída por cinco usuárias escolhidas de forma intencional, com base

nos dados dos formulários de atendimento da Casa Abrigo.

Após a coleta das informações, foi realizado o contato telefônico, entretanto vários

dados já não correspondiam, estavam desatualizados, por isso consultamos o acervo do

CREAS São João de Deus, a fim de localizar endereços mais recentes.

Outra dificuldade encontrada após a obtenção dos dados foi a questão da reconciliação

da ex-abrigada com o agressor, constituindo um obstáculo para o contato com a mesma, haja

vista o não consentimento do companheiro ou marido para realizar o procedimento, por isso

que as entrevistas realizadas foram com as usuárias que já haviam rompido os vínculos

afetivos com o agressor.

Quanto ao perfil das entrevistadas em relação ao estado civil, quatro (4) declararam

que são solteiras e uma (1) divorciada. Com relação ao grau de instrução, foram três (3) com

ensino fundamental incompleto, uma (1) com ensino fundamental completo e apenas (1) com

ensino médio completo. O número de filhos apresentado foi de duas (2) com dois (2) filhos,

duas (2) com três (3) filhos e uma (1) com seis (6) filhos. Das cinco (5) entrevistadas quatro

(4) declararam que desenvolvem atividades domésticas e uma (1), trabalho sem carteira

assinada e por fim a faixa etária de 31 a 47 anos.

Page 85: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

84

Para sistematizar a identificação das interlocuções das usuárias durante a análise das

entrevistas foram adotados os nomes fictícios, correspondentes a Ana, Ângela, Cristina,

Vera e Vânia.

Constituindo mais uma etapa da pesquisa, a análise da ótica das usuárias relacionada à

Casa-Abrigo desvelou que os serviços oferecidos pela instituição é desconhecido, visto que a

maior parte das entrevistadas declarou que nunca tinha ouvido falar do equipamento, só

tomaram ciência após atendimento efetuado pela Delegacia Especializada de Atendimento a

Mulher-DEAM, local sempre procurado pelas mulheres em situação de violência.

Apesar de o CREAS São João de Deus ser a porta de entrada para os serviços da Casa

Abrigo é constatado pelos depoimentos que o órgão tem aparecido com participação

secundária, já que as usuárias possuem como referência o contato com a Polícia Militar, que

sempre as encaminha à delegacia.

Eu prestei queixa e até encerrar o B.O., aí quando encerrou, ela [a delegada]

falou: vá pra casa arrume a sua roupa, a roupa dos seus filhos e tal hora vai

um carro te pegar. Aí eu vim, quando foi antes de cinco da manhã veio um

carro e me levou de novo pra mesma delegacia, de lá veio outro carro que

era o da Casa Abrigo, aí me levaram pra lá, eu não vi nada, não sabia de

nada, até aí eu não sabia de nada da Casa-Abrigo, [...] (Vera, 37 anos)

Eu fui prestar queixa quando eu cheguei lá o policial [da delegacia do bairro

em que morava] disse: oi eu vou levar você na delegacia das mulheres.

Chegando lá, a delegada me informou, eu disse a ela que eu tava sendo

ameaçada de morte, então ela disse: tem um lugar que eu possa colocar

você, que os seus familiares não possa saber onde é, e eu vou encaminhar

você pra lá [...].(Vânia, 34 anos)

Nos relacionamentos conjugais é constante o número de mulheres que sofrem com a

violência doméstica. É observável que os relacionamentos com mais tempo de convivência

são os que apresentam mais problemas, estes decorrentes da falta de respeito com usos

constantes de impropérios que resultam em luta corporal.

A predominância de violência entre as entrevistadas é a física, entretanto são presentes

a psicológica, sobretudo a moral e em relacionamentos consideráveis estáveis, ―Eu tive todos

os tipos de violência possível, psicológica, física, racial e quem mesmo foi meu ex-

companheiro, por sete anos‖. (Ana, 35 anos).

O mesmo foi observado com outra respondente,

O agressor foi o [meu] ex-marido, na forma de tapa na cara, pontapé,

humilhação, me xingando na frente dos meninos, então isso aí durou foi na

faixa de dez anos. [...] eu resolvi dar um basta. (Vânia, 34 anos)

Page 86: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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Após anos de submissão, as entrevistadas conseguiram romper com o vínculo de

violência. Dando prosseguimento em suas vidas, principalmente as que contaram com o apoio

familiar, ―A família é a base pra que a gente crie coragem realmente, e se afaste do agressor [...]‖.

(Ana, 35 anos)

Minha mãe começou a me ajudar depois que eu saí da Casa-Abrigo, então

ela arrumou um emprego pra mim e até hoje eu tô trabalhando. Só a família

vai erguer essa pessoa, dando conselho, dizendo: não vá atrás dele que você

vai ter uma vida melhor, [...] se você for atrás dele não vai dar nada bom, e

eu tomei muito os conselhos de minha mãe. (Vânia, 34 anos)

Entretanto, ainda é presente o comportamento de omissão por parte de algumas

mulheres que resistem durante muitos anos até tomar a decisão de denunciar o agressor, até

pelo o motivo de não querer envolver a família na situação, ―[...] eu nunca participei do que

tava acontecendo à minha família e sim à dele, pra aconselhar não levar ele pra delegacia, mas

ele não quis acordo, aí eu fui obrigada‖. (Cristina, 47 anos)

A resistência em denunciar o agressor provém do medo de represália após o registro

do boletim de ocorrência, por isso que a Casa-Abrigo é um local que representa a ruptura com

os episódios de violência. A contribuição da instituição é revelada em seus depoimentos:

É um refúgio porque sempre o ex-companheiro vai perseguir, [...] vai

procurar e só vai descansar quando encontrar. É muito importante porque

aqui a gente se sente segura e protegida. (Ana, 35 anos)

Olhe, no meu ponto de vista é muito bom, mas desde quando a mulher se der

o valor, porque ele [o abrigo] ajuda. Vocês estão aí para ajudar, mas quando

a pessoa também quer ajuda, porque vocês fazem a parte de vocês de

acolher, de guardar a pessoa, depois ela volta pra aquela vidinha, não

adianta, vai ficar sempre na rotina e isso aí é o pior, desgasta. (Angela, 31

anos)

Eu achei bem melhor pra resolver a situação, se eu não tivesse procurado a

Casa-Abrigo ainda hoje eu tava sofrendo [...] pra mim tudo de bom porque

resolvi as coisas com maior facilidade. (Cristina, 47 anos)

Sem palavras, a Casa-Abrigo é a única força, abaixo de Deus. É a única

força que uma mulher da forma que eu e muitas outras se encontra. Hoje

graças a Deus, já superei tudo, mas quem passar pelo o que eu passei, sem

dúvidas, a Casa-Abrigo é a única solução é uma coisa assim que chega na

sua vida, que lhe dá muita força, lhe dá muita energia positiva, é uma coisa

ótima, sem palavras.(Vera, 37 anos)

Diante dos depoimentos é incontestável o reconhecimento da importância da Casa-

Abrigo para as mulheres que não possuem um local seguro para ficar logo após a denúncia de

agressão.

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Apesar de não estarem em suas próprias casas, as usuárias demonstram que o período

em que ficaram abrigadas foi importante para seu equilíbrio emocional:

Ah! ótimo, meus filhos adoraram porque só brincavam o dia todo e assistia

[à] televisão, era só isso que faziam, porque certas coisas não podiam fazer

Me adaptei a todas[regras], principalmente meu vício... que eu fumava muito

e lá não fumei nada, e aí até recebi orientações que deixasse de fumar,

depois passou um tempo, parei.(Ângela, 31 anos)

Ah!, é nota dez, é uma coisa assim, o atendimento é dez, é tudo muito legal,

não tenho nem palavras. [...] eles ficam ali com a gente, sempre

conversando, sempre aconselhando, sempre dando força, [...] sempre dez

mesmo. (Vera, 37 anos)

Eu achei a atividade boa, nós ―estudava‖ lá e ―conversava‖ bastante, não

tinha brincadeiras, mas assistia [à] filme , aí a pessoa vai distraindo a mente.

[...] O serviço lá é como eu tivesse em minha casa porque tinha que manter o

ambiente limpo [...], eu achava isso normal. (Vânia, 34 anos)

A partir da fala das usuárias é notório que a Casa-Abrigo tem cumprido o seu papel em

resguardar a integridade física e psíquica das acolhidas, principalmente no respeito e bem-

estar proporcionado pelos profissionais da instituição, e de forma especial na intervenção

direcionada e leitura das entrelinhas, visto que cada usuária apresenta uma necessidade a ser

suprida pela instituição. Por isso a Casa-Abrigo proporcionou um impacto positivo na vida de

cada uma respondente.

Foi um fato muito importante, eu acho que vai ficar marcado pra sempre,

porque daqui agora que eu comecei a pensar e enxergar que eu tenho

perspectiva de uma nova vida, que eu posso retomar minha vida, posso

trabalhar, posso criar meus filhos, posso voltar a estudar, eu posso me tornar

uma pessoa que eu sempre quis ser. (Ana, 35 anos)

Assim, eu nunca pensei de chegar a um ponto desse, de ter que me esconder

de uma pessoa, mas analisando foi boa, deu pra refletir melhor sobre minha

vida, o que eu quero da vida porque uma mulher viver com uma pessoa pra

viver espancada, não tem estímulo nenhum de vida.(Ângela, 31 anos)

Me deu muita força, muita coragem porque eu ficava muito amedrontada,

mas ao mesmo tempo eu sabia que eu estava guardada, sabia que eu estava

ali protegida, abaixo de Deus eu estaria ali bem protegida mesmo. (Vera, 37

anos)

A pessoa toma o desejo de ter outra vida, quando passa lá é como se fosse

um alicerço, levantando tudo de novo pra começar tudo [...] porque a vida

que você tava vivendo antes não era um alicerço, era uma vida de tragédia,

de perturbação, então lá é como se fosse uma casa pra descansar, passar os

dias, tirar, pensar toda atribulação da mente e depois seguir em frente

(Vânia, 34 anos).

Page 88: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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As respondentes evidenciaram que após a saída da Casa-Abrigo puderam enxergar

outros horizontes, dentre eles a aspiração por uma vaga de trabalho visando gerar renda que

lhes possibilite criar os filhos e viver em paz sem depender financeiramente do apoio do

companheiro. A partir dos depoimentos pode-se concluir que o impacto dos episódios de

violência na subjetividade das usuárias fomentou a necessidade de uma vida melhor, sem a

prisão nos grilhões dos maus tratos, sobretudo na independência econômica.

É evidente que os depoimentos afirmaram a condição de inúmeras mulheres que

sofrem em relacionamentos agressivos, principalmente nos aspectos intrínsecos à

subjetividade das vítimas. Há a exposição da situação dos motivos que permeia a prática da

violência, como o excesso de ciúmes e a correlação de poder. Entretanto a trajetória de vida

de cada usuária demonstra que a violência pode ser combatida, e para que isso aconteça, é

necessário que a vítima tome o primeiro passo: a denúncia. Só assim a rede de proteção

poderá tomar as providências cabíveis.

Page 89: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência doméstica contra a mulher não é algo recente, vem ultrapassando várias

décadas, sob relações de poder do homem sobre a mulher. É um fenômeno cultural que nos

tempos atuais ainda viola alguns direitos considerados inalienáveis ao ser humano, como o

respeito à dignidade e à vida.

A violência não escolhe classe social e raça, pois está presente em todas elas.

Entretanto, as classes menos favorecidas possuem uma tendência ao fato, tendo em vista a

realidade de subalternidade vivenciada e as expressões da questão social.

Depois de anos de obscuridade, diante da falta de lei que respaldasse o combate à

violência doméstica, a Lei Maria da Penha foi um avanço em seu enfrentamento, por legitimar

as medidas protetivas de urgência, que visam resguardar a integridade física e psíquica das

mulheres em situação de violência doméstica.

Todavia cabem algumas observações que incorrem na fragilidade da aplicação, como a

inclusão da mulher em risco iminente, em programas assistenciais nas três esferas do governo,

a garantia da punição do agressor, principalmente na extinção da penas pecuniárias como o

pagamento de fiança e cestas básicas.

São gargalos que desestruturam a rede de atendimento, porque sem a efetivação do

que está posto na lei, os demais encaminhamentos ficam comprometidos. Para que a área da

Assistência Social possa acompanhar os casos é necessário que a área jurídica já tenha dado

respaldo aos primeiros encaminhamentos, dentre eles a prisão do agressor e averiguação do

fato.

Há uma gama de intervenções que primam pela prestação de um serviço de qualidade

para as usuárias que denunciam a violência. Porém a expressão de violência cometida contra a

mulher ainda não tem um número definido, visto que muitas mulheres ainda camuflam os

fatos ocorridos, seja por medo do agressor, por vergonha da sociedade e até mesmo para não

expor a família.

Se todos os casos fossem denunciados, seria mais fácil registrar a real magnitude que

as lesões corporais, psicológicas e outras ocasionam em todo o Brasil. Sem a denúncia os

agressores reafirmam a impunidade, se aproveitam da fragilidade e silêncio da vítima.

A partir da análise realizada por este estudo constatou-se que o perfil das usuárias da

Casa-Abrigo é de mulheres com origem humilde, que residem em casas de aluguel 43,05% e

em bairros de alta vulnerabilidade social, destacando o Santa Maria, que se destaca com

21,52%. A exclusão social foi evidenciada pelo baixo nível de escolaridade correspondente ao

Page 90: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

89

Ensino Fundamental Incompleto 68,05% e pela predominância de usuárias com a cor da pela

parda 59,02% e sobre as de cor negra 23,61%

A faixa etária predominante 30,55% das mulheres que varia entre 20 e 25 anos, com

relacionamento caracterizado pela convivência 68, 80%, ou seja, sem oficialização jurídica. A

duração dos relacionamentos das mesmas 32,60% oscila entre 1 e 5 anos.

A maioria depende econômica e exclusivamente dos agressores, tendo em vista que

57,63 das usuárias desenvolvem ações voltadas para o lar, reafirmando a submissão por causa

da própria subsistência, das quais 48,61% são vítimas da violência física. Além da

dependência econômica o número e a idade dos filhos também constituem obstáculos para o

rompimento do vínculo afetivo com agressor, o número entre elas é de 27,77% com dois

filhos e 21,52% com três filhos.

As respondentes evidenciaram que após a saída da Casa-Abrigo puderam enxergar

outros horizontes. Dentre elas, uma que começou a aspirar por vaga de trabalho visando gerar

renda que lhe possibilite criar os filhos e viver em paz sem depender da presença masculina.

Nesse sentido, emergem demandas por formação/capacitação profissional além do apoio

emocional para as mulheres atendidas na Casa-Abrigo.

Os agressores apresentam a faixa etária de 26 a 30 anos, sendo a maioria conviventes

67,36%, com baixo nível de escolaridade 37,50%, percentual que corresponde ao Ensino

Fundamental Incompleto, realidade que dificulta a obtenção de uma vaga de emprego,

perfazendo 24,30% de desempregados.

O desemprego faz com que muitos agressores sobrevivam de trabalhos informais ou

até mesmo por meio de atos ilícitos, como o tráfico de drogas e a utilização de substâncias

psicoativas, representado por 59,72%, fator que influencia diretamente no comportamento do

agressor e prejudica paulatinamente a convivência familiar.

Os objetivos desse estudo foram obtidos, visto que ao analisar os episódios de

violência doméstica das vítimas atendidas pela Casa-Abrigo, foi evidenciada a rede de

proteção social e como acessá-la, bem como nos aspectos ligados ao perfil das vítimas e

agressores. As hipóteses geradas inicialmente foram confirmadas, ou seja, a violência

doméstica tem como fator potencializador a desestruturação familiar proveniente da utilização

de substâncias psicoativas pelo agressor, há a concentração do baixo nível de escolaridade e

falta de qualificação profissional das vítimas e a dependência econômica do agressor.

No que se refere à ótica das respondentes ex-abrigadas e profissionais da instituição,

conclui-se que a Casa-Abrigo tem dado suporte às mulheres em situação de violência no

momento da acolhida, resguardando a sua integridade física e psíquica. Todavia, na visão dos

profissionais é necessário que a Casa-Abrigo disponibilize uma estrutura física mais ampla e

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arejada, já que no período de abrigamento as usuárias ficam restritas às normas da instituição,

situação que pode gerar a sensação de prisão, que na verdade deveria ser do agressor.

Com os resultados da pesquisa não há dúvidas que o enfrentamento à violência

doméstica ainda tem muito que avançar, principalmente no acompanhamento das usuárias

após o desligamento dos serviços do abrigo, visto que parte das usuárias volta a conviver com

os agressores por não ter outra alternativa, devido à dependência econômica enfrentada por

elas.

Esse é um problema que vai além do fazer institucional, uma vez que os profissionais

da Casa-Abrigo necessitam de suporte das políticas públicas e das políticas setoriais,

constituídas pela saúde, assistência, educação, trabalho e a área jurídica, para fortalecer a rede

de atendimento, principalmente na execução dos encaminhamentos. É necessário que a

articulação entre as políticas seja capaz de garantir uma atividade que gere renda para as

usuárias logo após o desligamento do abrigo. A partir do fortalecimento da rede de

atendimento a Casa-Abrigo poderá responder melhor as necessidades das usuárias e para que

isso possa acontecer é indispensável o investimento contínuo tanto na questão da estruturação

das Casas-Abrigos pelo Brasil, quanto na capacitação dos profissionais que trabalham na área.

Page 92: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

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ANEXOS

Page 97: Monografia "O Sistema de Atendimento às Vítimas de Violência Doméstica da Casa-Abrigo Professora Núbia Marques"

ANEXO-1

LOGOMARCA DA INSTITUIÇÃO

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ANEXO-2

PREFEITURA MUNICIPAL DE ARACAJU

SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA – SEMASC

COORDENADORIA DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

SERVIÇO DE ALTA COMPLEXIDADE

CASA ABRIGO PROFª NÚBIA MARQUES

SOLICITAÇÃO DE ABRIGAMENTO

Data______/______/______

Eu, _________________________________________________________________

CI_______________________________, solicito os serviços da equipe da Casa Abrigo até

que a situação de violência por que estou passando seja resolvida pela justiça.

__________________________________________________

Solicitante

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ANEXO-3

PREFEITURA MUNICIPAL DE ARACAJU

SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA – SEMASC

COORDENADORIA DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

SERVIÇO DE ALTA COMPLEXIDADE

CASA ABRIGO PROFª NÚBIA MARQUES

TERMO DE RESPONSABILIDADE

Eu, _________________________________________________________________,

CI_____________________ declaro conhecer e concordar com os termos de funcionamento

da Casa Abrigo, comprometendo-me em zelar pela ordem do recinto, bem como guardar

sigilo absoluto de sua localização, caso venha a ter conhecimento deste endereço, sob pena de

perder totalmente o direito de recorrer outra vez a esta organização.

Aracaju, _____/____________/_______.

_______________________________________________

Assinatura da abrigada

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ANEXO-4

PREFEITURA MUNICIPAL DE ARACAJU

SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA – SEMASC

COORDENADORIA DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

SERVIÇO DE ALTA COMPLEXIDADE

CASA ABRIGO PROFª NÚBIA MARQUES

TERMO DE DESLIGAMENTO

A coordenação da Casa Abrigo Profª Núbia Marques, desliga dos serviços de

abrigamento a Srª ___________________________________, após tomadas as devidas

providências para que o caso de violência contra a mesma fosse resolvido de acordo com a lei.

Aracaju, ______/_____________/________.

_____________________________________________

Coordenação da Casa Abrigo

______________________________________________

Abrigada

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ANEXO-5

PREFEITURA MUNICIPAL DE ARACAJU

SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA – SEMASC

COORDENADORIA DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

SERVIÇO DE ALTA COMPLEXIDADE

CASA ABRIGO PROFª NÚBIA MARQUES

FORMULÁRIO DE ATENDIMENTO

1. Nome completo ________________________________________________________

2. Apelido _______________________________________ Não tem apelido ( )

3. Endereço (rua, avenida, praça)

_____________________________________________________________________

Nº ________ Bairro: _______________________________________________________

CEP _______________________ Município_________________________ UF________

4. Tipo de moradia

( ) Casa Própria ( ) Alugada ( ) Cedida ( ) Ocupação irregular ( ) Outros ________

5. Zona onde reside: ( ) Urbana ( ) Rural

6. Idade _____________

7. Nacionalidade: ( ) Brasileira ( ) Estrangeira

8. Estado Civil: ( ) Casada ( ) Solteira ( ) Conivente ( ) Divorciada

9. Local de Nascimento:

Município________________________________UF______________

10. Data de Nascimento: _________/________/_________

11. Documentos: RG___________________ SSP/_______ original ( ) 2ª via ( )

CPF____________________

12. Qual a sua cor/raça? ( ) negra ( ) branca ( ) amarela ( ) indígena ( ) parda ( ) não

declarada

Outras ___________________

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13. Filiação: Mãe _________________________________________________

14. Pai __________________________________________________

15. Endereço dos pais:

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

16. Filhos: ( ) não tenho ( ) tenho Quantos? __________________

17. É portadora de alguma necessidade especial? ( ) sim ( ) não

18. Toma alguma medicação controlada? ( ) não ( ) sim qual? ________________________

19. Você está estudando? ( ) sim ( ) não

20. Que curso você freqüenta? ( ) fundamental ( ) médio ( ) superior ( ) supletivo ( )

educação de adultos ( ) outros

21. Em que escola você estuda? ________________________________________________

22. Turno ( ) manhã ( ) tarde ( ) noite

23. Caso não estude, há quanto tempo parou de estudar?

( ) menos de 1 ano ( ) de 1 a 2 anos ( ) de 3 a 4 anos

( ) 5 ou mais anos ( ) nunca estudei ( ) não lembro

24. Que curso freqüentou? ( ) fundamental ( ) médio ( ) supletivo ( ) superior ( ) não

estudei ( ) não lembro ( ) outro _______________________

25. Com que idade parou de estudar? ______________________________

26. Por que parou de estudar? ( ) para trabalhar ( ) não tinha vaga na escola ( ) casei

( ) fui reprovada ( ) não gosto de estudar ( ) fiquei doente Outros especificar ___________

27. Com quem você mora (múltipla escolha)? ( ) marido ( ) companheiro ( ) irmãos

Nome dos Filhos Data de Nascimento Situação escolar

1-

2-

3-

4-

5-

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( ) pai ( ) mãe ( ) filhos ( ) amigos ( ) outros

28. Quantas pessoas trabalham na sua casa? (múltipla escola)

29. ( ) marido ( ) companheiro ( ) pai ( ) mãe ( ) filhos ( ) amigos ( ) irmãos ( ) outros

30. Renda familiar

( ) até meio salário mínimo ( ) de meio até 1 salário mínimo

( ) de 1 a 2 salários mínimos ( ) mais de 2 até 3 salários mínimos

( ) mais de 3 a 5 salários mínimos ( ) mais de 5 salários mínimos

( ) não tenho renda

31. Está trabalhando atualmente? ( ) sim ( ) não

32. Se está trabalhando, que trabalho faz? _______________________________________

33. É empregada

( ) com carteira assinada ( ) sem carteira assinada ( ) autônoma ( ) só trabalha de vez em

quando ( ) faz biscates

34. É beneficiária do Programa Bolsa Família?

( ) Sim ( ) Não

Caso não receba o benefício, justificar o motivo:

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

35. Dados do companheiro/marido:

Nome _______________________________________________________________

Data de nascimento _____/______/_______ Cor/raça_________________________

Grau de escolaridade ___________________ Tempo de convivência ____________

Trabalha? ( ) sim ( ) não Estado Civil __________________________

Endereço do trabalho _____________________________________________________

Telefone do trabalho ___________________ Celular ___________________________

É usuário de alguma substância psicoativa? ( ) Não ( ) Sim Qual? _______________

36. Procurou os Serviços disponibilizados pelo CREAS São João de Deus?

( ) Sim ( ) Não

Por que?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

37. Caracterização da agressão

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

38. Encaminhamento

________________________________________________________________________

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APÊNDICES

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ROTEIRO DE ENTREVISTA

PROFISSIONAIS

(Advogado, Assistente Social, Psicóloga e Coordenadora)

1- Como avalia a capacitação dos profissionais da equipe técnica (Assistente Social,

Psicólogo e Advogado) para lidar com a questão da violência doméstica?

2- Em sua opinião qual a principal contribuição da Casa-Abrigo ao apoio oferecido às

vítimas de violência?

3- A rede de proteção tem garantido o apoio para as demandas e encaminhamentos?

4- Quais os encaminhamentos mais usuais e entraves encontrados para a sua realização?

5- Destaque algumas dificuldades para o exercício profissional na Casa-Abrigo?

6- Qual a dificuldade que predomina entre as mulheres atendidas com relação à superação do

ciclo de violência?

7- É realizado o trabalho interdisciplinar entre os profissionais para a resolução dos casos?

Em caso positivo – como ocorre tal procedimento?

8- Quais as dificuldades percebidas no exercício do trabalho interdisciplinar?

9- Que sugestão você daria para a melhoria das ações vinculadas ao combate à violência

doméstica?

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ROTEIRO DE ENTREVISTA

USUÁRIAS

Iniciais:

Idade:

Estado civil:

Número de filhos:

Profissão/situação de trabalho:

Escolaridade:

1- Como foi realizado o contato com a Casa-Abrigo? (Foi por meio do CREAS São João de

Deus ou pela Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher?)

2- A senhora já sabia da existência da Casa-Abrigo para acolher mulheres vítimas de

violência doméstica?

3- Qual a violência sofrida? Quem foi agressor e por quanto tempo foi vítima desta?

4- Atualmente qual o vínculo que mantém com o agressor?

5- A situação de violência doméstica foi rompida?

6- Como avalia o apoio de familiares frente aos episódios de violência?

7- Em sua opinião qual a importância e contribuição do abrigo na vida das mulheres

vítimas que precisam de um local seguro para ficar?

8- Como a senhora descreve as avalia as atividades desenvolvidas no período em que ficou

abrigada?

9- Qual o impacto da passagem pela Casa-Abrigo na sua vida? (Aspectos de positividade e

negatividade)

10- Quais suas expectativas/projetos de vida e trabalho?