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O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO José Carlos de Araújo Almeida Filho 2004

O direito como sistema autopoietico

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O Direito como Sistema Autopoiético.Resumo da obra de Teubner

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O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO

José Carlos de Araújo Almeida Filho

2004

Page 2: O direito como sistema autopoietico

José Carlos de Araújo Almeida Filho

O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO

Seminário apresentado para a Cadeira TEORIA DO DIREITO, no Mestrado em Direito da Universidade Gama Filho - RJ

Orientador

Profa. Dra. HILDA BENTES

RIO DE JANEIRO

RIO DE JANEIRO - BRASIL

2004

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A Niklas Luhmann;

DEDICO

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AGRADECIMENTOS

É preciso ser grande para lecionar. Mas é preciso ser maior para provocar

modificações no pensamento. Como dizia Montesquieu, “não é preciso fazer ler. É

preciso fazer pensar.”

Diante, pois, desta constatação, resta-me agradecer a três Professoras, das quais

orgulho-me se ser eterno estudante:

Hilda Bentes, por ter proporcionado um alargamento no meu entendimento sobre

Direito;

Margarida Maria Lacombe Camargo, pela orientação sempre tão dedicada e

altruísta; e,

Juliana N. Magalhães, pela belíssima forma como apresenta e desmitifica

Luhmann.

Aos meus colegas de turma, pela companhia durante os meses de estudo.

Com fraternal admiração, agradeço, em muito, a ajuda a mim prestada pelos

colegas de além-mar, Manuel David Masseno, José Engrácia Antunes e Paulo Ferreira

da Cunha, pela inestimável contribuição à consecução deste trabalho.

SUMÁRIO

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AGRADECIMENTOS........................................................................................................ 4

RESUMO............................................................................................................................ v

ABSTRACT....................................................................................................................... vi

1INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1

2O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO ........................................................ 3

3.1DEFININDO AUTOPOIESE ........................................................................................ 4

3.2DIREITO POSITIVO x POSITIVISMO CIENTÍFICO ................................................ 6

3.3O DIREITO POSITIVO E A QUEBRA DE PARADIGMA......................................... 8

4 AUTOPOIESE NO DIREITO – UMA QUEBRA DE PARADIGMA ......................... 12

4.1OS PARADOXOS DA AUTO-REFERÊNCIA .......................................................... 12

4.1.1GERIR O PARADOXO............................................................................................ 14

4.1.1.1DES-CONSTRUÇÃO DA DOUTRINA JURÍDICA ............................................ 14

4.1.2ELABORAR DISTINÇÕES..................................................................................... 15

4.1.3Transferência do paradoxo do mundo do pensamento sobre o direito para o mundo

da realidade social do direito (circularidade) .................................................................... 17

4.2PARADOXOS REAIS E MORFOGÉNESE ATRAVÉS DE VALORES PRÓPRIOS17

A NOVA AUTO-REFERENCIALIDADE ..................................................................... 20

4.3SISTEMAS FECHADOS, SISTEMAS ABERTOS, SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS20

4.4O FENÔMENO DA AUTO-REFERÊNCIA: A “GALÁXIA AUTO” ....................... 21

4.4.1.1Sistema auto-organizado ........................................................................................ 22

4.4.1.2Sistema auto-produtivo .......................................................................................... 22

4.4.1.3Sistema auto-subsistente ........................................................................................ 22

4.4.1.4Sistema auto-referencial......................................................................................... 22

4.5DIMENSÕES DA AUTO-REFERÊNCIA .................................................................. 23

4.5.1.1AUTO-OBSERVAÇÃO ........................................................................................ 23

4.5.1.2AUTO-DESCRIÇÃO............................................................................................. 23

4.5.1.3AUTO-ORGANIZAÇÃO ...................................................................................... 24

4.5.2AUTO-PRODUÇÃO ................................................................................................ 24

O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO?........................................................ 25

4.6O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO: ALGUMAS CRÍTICAS

HABITUAIS ..................................................................................................................... 25

4.7A AUTOPOIESIS DO SOCIAL: CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS....................... 26

4.8AUTOPOIESIS JURÍDICA: A AUTONOMIA DO DIREITO COMO REALIDADE

GRADATIVA................................................................................................................... 26

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4.9A AUTONOMIA DO DIREITO E SEUS ESTÁDIOS ............................................... 27

DIREITO SOCIALMENTE DIFUSO .............................................................................. 29

DIREITO SEMI-AUTÔNOMO ....................................................................................... 29

AUTOPOIESIS JURÍDICA.............................................................................................. 30

5CONCLUSÕES .............................................................................................................. 31

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................. 32

ANEXOS DE TABELAS ................................................................................................. 33

ADENDO.......................................................................................................................... 35

ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PORTUGAL ................... 35

ENTREVISTA A ISTO É................................................................................................. 38

ANEXOS DE FIGURAS .................................................................................................. 43

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RESUMO

ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO. RIO DE JANEIRO: UGF, 2004.

O presente trabalho tem por objetivo analisar o Direito como Sistema Autopoiético, diante da visão sociológica de Teubner e Luhmann. Trata-se de tema novo e de grande relevância para o estudo do Direito, sendo a base da teoria da autopoiese a Teoria dos Sistemas de Luhmann, vista, agora, sob a perspectiva de Teubner.

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ABSTRACT

ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO. RIO DE JANEIRO: UGF, 2004.

The present work has for objective to analyze the Right as Autopoiesys System, ahead of the sociological vision of Teubner and Luhmann. That´s a new subject and to be a great relevance for the study of the Right, being the base of the theory of autopoiese the Theory of the Systems of Luhmann, sight, now, under the perspective of Teubner.

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1 INTRODUÇÃO

O estudo do direito como sistema autopoiético, como nos afirma José Engrácia

Antunes1, responsável pela tradução da obra de Gunther Teubner, “dificilmente

encontrará um modelo de pesquisa teorético que tenha granjeado maior repercussão

interdisciplinar e haja despertado maior polémica do que a denominada teoria da

autopoiesis.” Segundo o autor, a teoria percorrer as mais diversas áreas do

conhecimento humano.

A fim de definir, pois, o que venha a ser o sistema autopoiético, Antunes afirma que o

mesmo “constitui um sistema auto-referencial no sentido de que os respectivos

elementos são produzidos e reproduzidos pelo próprio sistema graças a uma sequência

de interacção circular e fechada.”2

Adotar o direito como sistema autopoiético, através de uma concepção sociológica de

Niklas Luhman, não repele o positivismo jurídico na Teoria Pura do Direito, de Kelsen,

mas pode apontar um corte hermenêutico onde os sistemas se aproximam e, ainda, onde

se repelem.

João Maurício Adeodato3 apresenta uma comparação entre os sistemas tradicionais e os

modernos, sendo estes últimos destacados por Luhmann:

Teorias pré-modernas ou tradicionais soberania divina

legalismo 1 ANTUNES, José Engrácia. A Hipótese Autopoiética, in Revista Júris et de Jure, Universidade Católica Portuguesa: Porto, 1998, pp. 1269 a 1290 2 Op.cit., p. 1276 3 ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica; para uma teoria dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 55

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2

Teorias modernas e contemporâneas normativismo

Boaventura de Sousa Santos4 aponta a importância desta ruptura de paradigma, quando

afirma:

“A formulação mais ampla e mais bem articulada deste programa de investigação é a concepção do direito como sistema autopoiético (Luhmann, 1984, 1986, 1988a, 1988b; Teubner (org.), 1988, 1989, 1991, 1992).

“O direito é um desses sub-sistemas, um sistema de comunicações jurídicas que funciona com o seu próprio código binário: legal/ilegal. O direito só se regula a si próprio. O direito é um ambiente que rodeia os outros sub-sistemas sociais tal como este são o meio ambiente do direito. Mas, seja quais forem as “vibrações” ou “perturbações” que um dado sistema, em consequência da sua interdependência funcional ou coexistência, possa “causar” noutro sistema, elas terão irrelevantes se não forem convertidas em respostas ou reacções autopoiéticas.”

“No que respeita ao direito, esta versão radical de autopoiese jurídica dada por Luhmann foi, entretanto, relativamente alterada Teubner (1989, 1991).”

E será diante desta vertente radical, de quebra de paradigma, que o presente trabalho irá

se desenvolver.

4 SANTOS, Boaventura de Sousa. A Crítica da Razão Indolente – contra o desperdício da experiência; 4.ed. São Paulo: Cortez Editora, 2000, p. 159

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2 O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO

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4

3

3.1 DEFININDO AUTOPOIESE

Antes de adentrarmos na análise do Direito como Sistema Autopoiético, segundo a

visão de Teubner, modificando, radicalmente, a posição de Niklas Luhmann, é

necessário conceituar autopoiese5.

“AUTOPOIESIS (de Auto: a sí mismo; y Poiesis: en griego, creación, fabricación, construcción). Literalmente, autopoiesis significa auto-organización. Concepto que nace en la biologia de la mano de los chilenos Humberto Maturana y Francisco Varela, y que designa un proceso mediante el cual un sistema (por ejemplo, una célula, un ser vivo o una organización) se genera a sí mismo a través de la interacción con su medio. Un sistema autopoiético es operacionalmente cerrado y determinado estructuralmente. Característica definitoria de los seres vivos. Una aplicación del concepto, en la sociología, esta en la teoria de sistemas de Niklas Luhmann.”

Assim, ainda que em fase conceitual, é importante uma pequena análise do sistema

proposto por Luhmann, já que o objeto do presente trabalho é a análise da obra de

Teubner.

E será Teubner a fazer, desde o início de sua obra, O Direito como Sistema

Autopoiético, referência à teoria de Luhmann6:

“O Direito retira a sua própria validade dessa auto-referência pura, pela qual qualquer operação jurídica reenvia para o resultado de operações jurídicas. Significa isto que a validade do Direito não pode ser importada do exterior do sistema jurídico, mas apenas obtida a partir do seu interior. Nas palavras de LUHMANN, “não existe direito fora do direito, pelo que sua relação com o sistema social, o sistema jurídico, não gera nem inputs nem outputs.”

5 Cf. Wikpedia, Enciclopédia Virtual, obtido por meio eletrônico, em <http//:www.wikpedia.org/wiki/Autopoiesis>, acessada em 11 jun. 04. 6 TEUBNER, Gunther. O Direito como Sistema Autopoiético; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989, p.2

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5

Analisando a teoria de Luhmann, em breves linhas traçadas por Teubner, se verifica que

a Teoria dos Sistemas é binária e o direito existe por si, ou seja, a partir do momento em

que não gera inputs nem outputs, está ele girando em torno e por si mesmo.

Assim, se poderá compreender que a Teoria dos Sistemas de Luhmann se desenvolve

para a Teoria da Autopoiese no Direito, ainda que o sistema de Luhmann seja tratado

como binário e nos pareça bem próximo dos sistemas cibernéticos, quando trata de

inputs e outputs.

Em sua obra Sociologia do Direito, Luhmann7 assevera que “o homem vive em um

mundo constituído sensorialmente, cuja relevância não é inequivocamente definida

através do seu organismo. Desta forma o mundo apresenta ao homem uma

multiplicidade de possíveis experiências e ações, em contraposição ao seu limitado

potencial em termos de percepção, assimilação de informação, e ação atual e

consciente.”

Assusta-nos a idéia de um sistema auto-reprodutivo, ou de um mundo constituído

sensorialmente. E é por esta razão a importância de entendermos o que se entende por

direito positivo. Assim se afirma porque tratamos de giros hermenêuticos e uma grande

preocupação que possa incutir idéias de alternatividade na aplicação do direito.

3.2 DIREITO POSITIVO X POSITIVISMO CIENTÍFICO

Há uma grande confusão quando se trata do positivismo jurídico e do positivismo

filosófico. Em muitos casos, notadamente pela inserção do positivismo de Augusto

7 LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito. Vol I. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro: 1983, p. 45

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Comte no Brasil, trazido por Benjamin Constant, há uma certa aversão ao termo

positivista – que chega a possuir em nosso país uma igreja.

O Prof. Tércio Sampaio Ferraz Jr.8 traz bem esta idéia:

“O termo positivismo não é, sabidamente, unívoco. Este designa tanto a doutrina de Augusto Comte, como também aquelas que se ligam à sua doutrina ou a ela se assemelham.

...

Daí a luta, na segunda metade do séc. XIX, contra a teleologia nas ciências da natureza e, mais tarde, com Kelsen na Ciência do Direito; daí o determinismo e a negação da liberdade da vontade.”

Assim é que não podemos atribuir um aspecto negativo ao direito positivo, mas

entendermos a positivação do direito, nos termos apontados pelo Prof. Tércio9. Por esta

razão é importante apontarmos, ainda que de forma sucinta, alguns períodos históricos

do direito, que caminharam ao que entendemos por Direito Positivo:

⇒ Sécs

Fases do Direito ⇒ Séc. XIX – positivismo comteano

⇒ Séc. XIX – legalismo – direito positivo

Para o Prof. Tércio10, “positivação e decisão são termos correlatos. Decisão é termo

que tomamos num sentido lato, que ultrapassa os limites da decisão legislativa,

abarcando, também, entre outras, a decisão judiciária, à medida que esta pode ter

também qualidade positivante, quando, por exemplo, decide sobre regras costumeiras.”

A idéia da positivação jurídica, que se repete hodiernamente, visava à garantia dos

burgueses, no movimento do Séc. XVIII e, posteriormente, se verifica a Era dos

8 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 2.ed.; São Paulo, Atlas, 1980, p. 31.

9 Op.cit. p.41 10 Idem

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7

Códigos. E o tema abordado pelo Prof. português Paulo Ferreira da Cunha11 é de grande

propriedade:

“Para o positivismo jurídico imperante, que acredita que o Direito é o que a lei manda, e que julga que a lei pode ordenar tudo o que aprouver um ditador, ou, na melhor das hipóteses, a um governo com uma maioria parlamentar, os direitos sociais não serão certamente motivo de espanto. Corresponderiam, de alguma maneira, ao meter na Constituição o programa dos partidos socialistas, ou, em geral, de esquerda, para glosar uma observação de Ripert, tal como os direitos, liberdades e garantias seriam meter na Constituição as idéias dos partidos liberais.”

É certo, assim, que havia uma imutabilidade em termos do Direito Natural, pelos

jusnaturalistas. Uma quebra de paradigma se apresenta com o positivismo jurídico do

Séc. XIX e, agora, nos dizeres de Prof. José Engrácia Antunes12, “a importância

assumida pela hipótese autopoética para NIKLAS LUHMANN foi expressa e

repetidamente confessada pelo próprio autor, que, em sua obra de referência não

hesita em augurar para tal teoria o papel de responsável por uma radical <<alteração

de paradigma>> no domínio das ciências sociais em geral.”

3.3 O DIREITO POSITIVO E A QUEBRA DE PARADIGMA

Não nos seria possível entender toda a sistemática desenvolvida por Luhmann e

Teubner, sem a existência do direito positivo. Se por um lado o jusnaturalismo é

exacerbadamente dogmático, não admitindo posição diversa, a normatividade pode

trazer-nos idéias de sistemas autoritários.

O Prof. Tércio Sampaio13 trata, pois, da idéia da legalidade, como “tentativa de sanar

ambas as deficiências de um ponto de vista novo, sem cair na ingenuidade empiristica

11 CUNHA, Paulo Ferreira da. Miragens do Direito – O Direito, as Instituições e o Politicamente Correto. Campinas: Millenium, 2003, p. 84.

12 ANTUNES, José Engrácia. Revista Juris et de Jures, nos 20 anos da Faculdade de Direito da UCP - Porto; Porto:[SI], 1998, p. 1279 13 Op.cit., p. 59

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8

do contratualismo do jusnaturalismo clássico, para justificar a dominação política e a

necessidade de legitimação.”

E, como acrescenta o professor, a normatividade, segundo a idéia legalista, esgotaria

toda a gênese do direito.

Desta forma, os conceitos de direito e política se encontram intimamente ligados,

porque toda força do direito nasce do legislador.

Contudo, nem sempre o direito posto pelo legislador será suficientemente justo ou

correto. A fim de concluir esta primeira parte, transcrevemos dois textos: um sobre o

positivismo clássico, filosófico e imperativo; o outro é um interessante diálogo entre

Sófocles e Péricles.

Segundo o texto positivista, podemos compreender o desapego ao direito humano e,

sem dúvida alguma, choca-nos o positivismo arraigado no texto:

“O "direitodohomismo"

A religião dos direitos do homem trabalha precisamente neste sentido. Tem a vantagem de se basear em duas abstrações e, por consequência, não ser responsável perante qualquer realidade.

A noção de direito só tem validade numa determinada sociedade e circunstâncias históricas, geográficas e étnicas, pois um direito é necessariamente estabelecido, ou pelo menos reconhecido, por alguém. A definição do Robert esclarece a questão: «O que é exigível, o que é permitido numa colectividade humana». Fora de uma determinada colectividade, a noção de direito perde o seu sentido. Recordemos que a declaração dos insignes antepassados se chama «Declaração dos direitos do homem e do cidadão».

A noção de homem também é abstracta. Não há na terra um único homem que não tenha nascido de determinados pais, não pertença a determinada raça, clima e cultura. Um aborígene australiano do século XX não e um grego do século de Péricles.

Oh! Bem se vê a grandeza da ideia segundo a qual os aborígenes da Austrália e os atenienses do século V têm algo em comum: a natureza humana - nós, os cristãos, diríamos a semelhança com Deus. Adiantarei mesmo que não se trata de uma ideia, mas de uma evidência. E também se vê a grandeza de outra ideia, segundo a qual todos os homens devem ser tratados de uma forma que, para abreviar, qualificamos de humana. Mas isso é um dever do homem: tratar os

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seus semelhantes como eles devem ser tratados. Fazer disto um direito é pôr a carroça à frente dos bois. Quanto chego diante de um semáforo vermelho tenho o dever de parar. Seria ridículo dizer que quem chega diante do seu semáforo verde tem o direito de me ver parar diante do meu semáforo vermelho.

Mas não esqueçamos que generalizar, isto é, estender ao mundo inteiro, uma religião universal baseada em abstracções tem evidentes vantagens para o produtor de alimentos que sejam consumíveis tanto pelos Aleutas como pelos Bretões. E o mesmo se dirá para o desinformador ávido de difundir as suas patranhas pelo mundo inteiro.”14

Mas desde a Grécia Antiga a norma positivada e extraída de um tirano, não poderia ser

considerada uma lei:

14 VOLKOFF, Vladimir. Pequena História da Desinformação. Curitiba, Vila do Príncipe: 2004

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10

“— Diz-me, Péricles, podes ensinar-me o que é uma lei?

— Naturalmente — respondeu Péricles.

— Ensina-me então, em nome dos deuses — tornou Alcibíades.

Pois ouço elogiarem certos homens por seu respeito às leis e me parece que sem saber o que seja uma lei jamais se poderia merecer tal encómio.

— Se é isso o que desejas saber, fácil é satisfazer-te, Alcibíades — disse Péricles —: Chama-se lei toda deliberação em virtude da qual o povo reunido decreta o que se deve fazer ou não.

— E que ordena ele que se faça, o bem ou o mal?

— O bem, rapaz, por Júpiter! e nunca o mal.

— E quando, em lugar do povo, é, como numa oligarquia, uma reunião de algumas pessoas que decreta o que se deva fazer, como se chama isso?

— Tudo o que após deliberação ordena o poder que dirige um Estado se chama lei.

— Mas se um tirano que governa um Estado ordena aos cidadãos fazer tal ou qual coisa, trata-se ainda de lei?

— Sim, tudo o que ordena um tirano que detém o poder se chama lei.

— Que é então, Péricles, a violência e a ilegalidade? Não é o ato pelo qual o mais forte, em vez de persuadir o mais fraco, constrange-o a fazer o que lhe apraz?

— Essa a minha opinião — conveio Péricles.

— Portanto, toda vez que, em lugar de usar da persuasão, um tirano força os cidadãos por um decreto, será ilegalidade?

— Assim o creio. Errei, pois, dizendo sejam leis as ordens de um tirano que não emprega a persuasão.

— E quando a minoria não usa da persuasão junto à multidão, mas abusa de seu poder para forjar decretos, chamaremos a isso violência ou não?

— Tudo o que se exige de alguém sem empregar a persuasão, trate-se ou não de um decreto, parece-me antes violência que lei.

— E tudo o que, exercendo o poder, impuser a multidão aos riscos sem o emprego da persuasão será ainda antes violência que lei?

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— Bravos! Alcibíades! — exclamou Péricles. — Nós também, na tua idade, éramos hábeis em semelhantes matérias. Tomávamo-las por tema de declarações e argumentações, tal como presentemente fazes comigo.”15

15 PESSANHA, José Américo Motta. Sócrates – Vida e Obra. São Paulo, Nova Cultural: 1999

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4 AUTOPOIESE NO DIREITO – UMA QUEBRA DE PARADIGMA

As linhas que antecederam o presente capítulo se fizeram necessárias a fim de

entendermos a frase contida na página 02, da obra de Teubner16:

“O Direito determina-se a ele mesmo por auto-referência, baseando-se na sua própria positividade.”

É que segundo Luhmann, citado por Teubner, não existe o direito fora do direito.

Segundo as idéias de Luhmann, que, de certa maneira, revolucionaram toda uma

estrutura sociológica do direito, através de sua Teoria dos Sistemas, ainda que haja o

não direito, este será direito.

O sistema de Luhmann é binário e mescla a positividade com a negatividade, assim, por

exemplo:

Direito/Não Direito

+ -

Mas este não direito também é direito, uma vez que ele se auto-referencia. Teubner

afirma que “o Direito retira a sua própria validade dessa auto-referência pura, pela qual

qualquer operação jurídica reenvia para o resultado de operações jurídicas”.

4.1 OS PARADOXOS DA AUTO-REFERÊNCIA

Não nos basta um sistema hierarquizado a fim de poder aplicar o Direito. Se estamos

diante de situações que demandem aplicação dos princípios e os colocamos em

determinados pontos de relevância e importância, nem sempre a solução será a melhor. 16 TEUBNER, Gunther. O Direito como Sistema Autopoiético; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.

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13

Lembremo-nos do texto acerca da discussão entre Péricles e Sófocles. O que é, pois,

este Direito hierarquizado?

Imaginemos, somente para efeitos de entendimento dos paradoxos da auto-referência,

uma situação concreta nos dias de hoje. Em texto lançado no Jornal do Commercio de

13 de junho de 2004, a Desembargadora Áurea Pimentel Pereira trata da questão da

violência dos jovens e admite que não mais subsiste a questão da exclusão social,

porque estes jovens são de classe média alta.

A partir de uma sistematização, teremos proteção/impunidade, ou seja, um positivo e

um negativo. Contudo, a proteção dada aos jovens, muitas vezes concorrerá para uma

impunidade. Se a Constituição prevê o direito à vida como sendo fundamental e, ainda,

a proteção ao menor, estamos diante de situações complexas, porque a norma maior

repete-se na norma menor.

Dentro de um sistema hierarquizado e normativo, como proceder diante de tamanha

calamidade, se estamos diante de dois direitos garantidos constitucionalmente. Não

existem influxos externos (outputs), nem internos (inputs). O que existe é uma crise

moral que o Direito não consegue resolver a não ser diante de uma auto-referência. Para

a Desembargadora, a solução é alterar a norma jurídica e, diante deste ponto,

encontraremos novamente situações que nos levarão a crer que a positividade do Séc.

XIX é a única forma de solucionar as questões havidas dentro da sociedade.

Contudo, a auto-referência poderá criar problemas, ao identificar o que é legal ou ilegal

ou, ainda, ou que é ilegal e legal. Criaríamos um sistema legal/ilegal/legal. Esta auto-

referência poderia acabar por coibir a força da decisão.

Sem dúvida alguma, é paradoxal o ensaio da Desembargadora Áurea Pimentel, porque

diante de um sistema auto-referencial e de pensamento cartesiano, poderíamos afirmar,

sem qualquer medo de errar, que a crise da violência é a exclusão social. Contudo, um

paradoxo se pode imaginar dentro deste sistema: se há necessidade de uma inclusão

social, onde os parâmetros de uma vida rica, com viagens etc. são a forma mais correta

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de se viver, é certo, ou pelo menos dedutível, que os pais não tenham tempo para seus

filhos e, com isto, se provoca uma exclusão dentro do próprio sistema. Inclui-se, em

sociedade, uma imagem de perfeição e, por outro lado, exclui-se da mesma sociedade as

regras comezinhas de um bem viver familiar e de toda uma idéia de inclusão social

acaba por inserir os jovens na marginalidade.

4.1.1 GERIR O PARADOXO

Teubner identifica três formas de se gerir o paradoxo, contrariando as idéias

acomodadas de que não se deve deixar de lado esta realidade.

São elas:

⇒ Des-construção da doutrina jurídica

⇒ Elaboração de distinções

⇒ Transferência do paradoxo do mundo do pensamento sobre o

direito para o mundo da realidade social do direito (circularidade)

4.1.1.1 DES-CONSTRUÇÃO DA DOUTRINA JURÍDICA

Teubner afirma que a idéia da des-construção de uma doutrina jurídica nasce de uma

corrente radical americana protagonizada pelo critical legal studies movement. Tal

corrente também é adotada na Inglaterra.

Segundo Teubner17, “o seu ponto de partida é a descoberta, no seio da doutrina do

contrato, das contradições entre aspectos formais e substanciais, bem como entre

individualismo e altruísmo; dos aspectos desintegradores e das instabilidades inerentes

a um direito político-finalisticamente instrumentalizado, próprio do moderno Estado-

Providência; ou, enfim, da verificação da circunstância paradoxal de que cada regra

17 Op.cit. p.11

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15

conhece a sua contra-regra e de que a proposição da doutrina jurídica pode, partindo-

se da própria doutrina, conhecer proposição exactamente oposta.”

Contudo, trata-se de posição tão acirradamente dogmática quanto o próprio positivismo

imutável. E a idéia por Sófocles, em debate entre Antígona e Créon, traduz a utilização

do código jurídico ao próprio código jurídico. Teubner reproduz o paradoxo:

“Créon: Desafias tão flagrantemente minh

Antígona: Naturalmente! Pois que não foi Zeus quem a promulgou, nem encontrarás tal lei imposta pela Justiça aos homens. Nunca acreditei que os teus éditos tivessem força tal que pudessem anular as leis do céu, as quais, não escritas nem proclamadas, têm uma duração eterna e uma origem para além do nascimento do homem.”

Depreende-se uma severa discussão entre o jusnaturalismo e o direito posto. Não se

pode atribuir, dentro das antinomias havidas no Direito, como forma de repelir a uma ou

outra norma, em uma total des-construção dele mesmo. O Direito não admite, assim,

esta des-construção ou uma re-construção. Admitindo as idéias de Luhmann, o sistema

é auto-referencial e, assim, se poderá, à frente, finalmente, compreender o Direito como

sistema autopoiético.

4.1.2 ELABORAR DISTINÇÕES

Não se apresenta de todo correta a idéia de uma criação elaborativa de distinções, uma

vez ser o direito envolto em suas antinomias e, assim, não se chegaria a conclusões.

Ao citar Hart, Teubner afirma que “embora tal técnica contenha uma clara referência à

teoria dos tipos, acentue-se que existem outras soluções que perseguem o mesmo

objectivo de evitar o paradoxo da auto-referência no direito.”

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16

+

Analisando o quadro acima, a fim de entendermos uma auto-referência no sistema,

certamente se chegaria à conclusão que novas antinomias seriam geradas dentro do

próprio sistema. Não basta, apenas, atribuir normas maiores ou menores, em um sistema

hierarquizado. A conclusão seria a própria antinomia criada dentro do sistema.

Como diria José Engrácia Antunes, ao final de seu artigo publicado na Revista de

Direito da Universidade Católica Portuguesa, resta-nos afirmar – ou perguntar: “Pouco?

Sem dúvida. Mas honestamente não vemos o que possa existir mais.”

4.1.3 TRANSFERÊNCIA DO PARADOXO DO MUNDO DO PENSAMENTO SOBRE O DIREITO PARA O MUNDO DA REALIDADE SOCIAL DO DIREITO (CIRCULARIDADE)

O direito se encontra auto-referenciado, ou seja, existe dependendo de uma

circularidade, notadamente na praxis jurídica. Trata-se de ações, normas, processos,

identidades etc.

NORMAS SUPERIORES

NORMAS INFERIORES

NORMAS INFERIORES

SISTEMAJURÍDICO

Page 25: O direito como sistema autopoietico

17

Quando analisamos o direito sob este prisma, não podemos deixar de pensar,

notadamente no Brasil, na questão da súmula vinculante que se pretende instalar.

Se é certo que o sistema processual brasileiro já se encontra provido de uma súmula

impeditiva, a exemplo do art. 557 do CPC, estaremos diante de um sistema totalmente

impeditivo de circularidade. A norma contida no art. 126 do CPC, que se apresenta de

grande importância no cenário jurídico, pereceria diante de uma vinculação a decisões

anteriormente proferidas. Inexistência de circularidade, certamente, implicará em

cerceamento do próprio Direito.

É preferível deixar a pergunta, sem pretender responde-la de forma categórica, posto

que o trabalho, sem dúvida alguma, conduzirá à sua própria resposta.

4.2 PARADOXOS REAIS E MORFOGÉNESE ATRAVÉS DE VALORES PRÓPRIOS

Segundo Teubner é exatamente neste tópico que se pode entender a riqueza da auto-

referência e da autopoiesis. “Trata-se de descobrir lacunas ou ´espaços em branco` no

mapa dos fenómenos sociais e jurídicos, através da identificação das relações

circulares internas do direito e da sociedade, bem como do estudo das respectivas

interacções externas”, afirma Teubner18.

Novamente é importante trazer à baila o art. 12619 do Código de Processo Civil

Brasileiro, a fim de entendermos como o sistema pode ser bem aplicado em nosso

direito. Neste ponto, ao contrário do que muitos possam imaginar, o Direito Processual

é mais aberto que o direito material. E será ele quem irá aplicar os princípios gerais do

direito.

18 Op.cit., p. 21. 19 Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.

Page 26: O direito como sistema autopoietico

18

Ainda que de difícil definição, conforme afirma Jean-Louis Bergel20, é possível

estabelecer um quadro sistemático, ainda que diante de uma concepção hierárquica no

direito francês21:

Constituição e texto com valor constitucional

princípios fundamentais

(Constituição e Preâmbulo e normas às quais ele remete, leis orgânicas)

princípios e regras com valor constitucional

Tratados e acordos internacionais

Leis e textos com valor legislativo (leis ordinárias; decretos ratificados art. 38; decisões art. 16 em matéria legislativa)

princípios gerais simples Costume e Jurisprudência

Regulamentações

Segundo Teubner diversos já são os métodos e tentativas existentes em nosso sistema

para trabalhar os paradoxos, como a hermenêutica e, na Teoria do Direito, análise da

estrutura auto-referencial das normas jurídicas (Hart e Ross) e, inversamente, a

metodologia do direito e a argumentação jurídica.

Assim, a teoria da autopoiese analisa todos estes fenômenos como meras ilustrações e

oferece uma análise de soluções da prática jurídica para o problema da indeterminação

do direito, conjugando-se os seguintes elementos:

⇒ Auto-referência

⇒ Paradoxo

⇒ Indeterminação

⇒ Estabilidade de valores próprios

A teoria apresenta por Teubner sempre nos conduzirá à idéia da concepção de

Luhmann, acerca de sua Teoria dos Sistemas, onde o que impera é o sistema binário, ou

20 BERGEL, Jean-Louis. Teoria Geral do Direito. São Paulo: Malheiros, 2004 21 Op.cit. p.130.

Page 27: O direito como sistema autopoietico

19

atribuir positivo e negativo. Desta forma, o sistema jurídico se constrói a si mesmo,

sendo auto-referencial. Contudo, conforme assevera Teubner22, a auto-referencialidade

conduz a paradoxos e a chave para a solução dos paradoxos será exatamente a

“desparadoxização dos paradoxos”. A proposta de Luhmann, pois, é reinterpretar os

paradoxos através de ocultação e neutralização dos mesmos.

Para Teubner não se apresenta esta concepção como sendo a mais coerente,

posto que o que se oculta ou neutraliza, está sempre latente: “a hierarquia das fontes do

direito, cujo cume permanece escondido na penumbra do direito natural, ou divino,

constitui, de resto, um bom símbolo desta latência: escondida embora por momentos, a

auto-referência não deixará jamais de ameaçar com sua aparição.”23

A NOVA AUTO-REFERENCIALIDADE

4.3 SISTEMAS FECHADOS, SISTEMAS ABERTOS, SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS

O Direito não pode ser visto como algo imutável e, por esta razão, a partir do momento

em que se admite o sistema autopoiético, se pode conceber uma interação dos sistemas.

Assim, quanto mais flexível se apresentar o sistema, mais fácil será sua adaptação.

Assim também podemos afirmar que o meio, notadamente o sistema político, recebe

influência direta do direito.

22 Op.cit.p. 24 23 Idem, p. 26

Page 28: O direito como sistema autopoietico

20

Segundo Teubner24, “ a distinção crucial entre sistema e meio envolvente – que

constitui a característica central dos sistemas abertos (o que encontra uma réplica, no

seio destes mesmos, no fenómeno da auto-diferenciação sistémica) – conduz-no a

centrar a atenção sobre conceitos tais como relação input-output, capacidade de

adaptação sistémica ao respectivo meio envolvente, restabelecimento do equilíbrio

sistémico através da intervenção regulatória, e organização “racional” e

finalisticamente orientada. Racionalidade finalística, intervenção, organização,

adaptação, manutenção do equilíbrio sistémico constituem conceitos-chave de

estratégias políticas intervencionistas, endereçadas a produzir alterações específicas

em vários domínios sociais servindo-se do direito.”

A afirmação acima exposta apresenta de forma clara um sistema aberto, onde diversas

variantes e condições externas influenciarão o direito e nem sempre da melhor forma. O

poder econômico poderia, de certo, interferir no direito. A este respeito, Luhmann

trataria da questão heterárquica, onde os sistemas são iguais, inexistindo sobreposição

entre eles – político, jurídico, econômico etc.

A abertura dos sistemas, sem dúvida alguma, se apresenta suscetível a interações outras

que não as do próprio direito, ao passo em que, apesar de se entender os sistemas

fechados como uma forma ultrapassada, a teoria da autopoiese passa a ser de grande

interesse, valendo-se da auto-organização, ou seja, sem inputs ou outputs.

A dinâmica do sistema autopoiético, pois, é circular e pressupõe, diante de sua

complexidade e auto-referencialidade, que há possibilidade de modificação interna e

sistêmica.

A idéia, assim, conduz a uma questão de fundo complexa, mas de grande alcance.

Somente em sistemas internos se poderá entender seu funcionamento e, com isto, a

possibilidade de auto-referência para se estabilizar. A questão, então, em torno do

sistema autopoiético, assim como funciona com as células, é a capacidade auto-

reprodutiva através de sua própria referência.

24 Op.cit. p.29

Page 29: O direito como sistema autopoietico

21

4.4 O FENÔMENO DA AUTO-REFERÊNCIA: A “GALÁXIA AUTO”

A idéia de auto-referência não pode ser confundida com a própria idéia de autopoiesis.

Os termos, diante da idéia de um sistema fechado, geralmente se confundem, mas é

necessária uma distinção, porque os próprios descobridores do sistema biológico da

autopoiese – Maturana e Varella – segundo Teubner, muitas vezes se confundem quanto

à precisão conceitual.

Vejamos, pois, as formas auto no sistema:

⇒ auto-organização

⇒ auto-produção

⇒ auto-subsistência

⇒ auto-referencialidade

4.4.1.1 Sistema auto-organizado

O sistema será auto-organizado quando seus elementos possuírem uma característica tal

que lhes permita, espontaneamente, criar e assumir um determinado estado de ordem.25

4.4.1.2 Sistema auto-produtivo

A auto-produção sistêmica resulta da articulação cíclica dos processos de auto-

organização entre si.26

4.4.1.3 Sistema auto-subsistente

“A auto-subsistência (enquanto preservação da identidade do sistema, manutenção dos

seus limites e fonte energética) deve ser adicionada à auto-produção, de molde que a

25 TEUBNER, p. 37 26 Idem

Page 30: O direito como sistema autopoietico

22

autopoiesis de um sistema (no sentido de auto-reprodução dos elementos sistémicos

usado por MATURANA) se torne possível”27.

Há, pois, auto-subsistência quando os elementos interagem de forma cíclica, mas não se

auto-reproduzem.

4.4.1.4 Sistema auto-referencial

Segundo Teubner, nem mesmo Luhmann conseguiu fazer uma distinção clara acerca

dos sistemas descritos nos parágrafos anteriores. Sem dúvida, se analisarmos a questão

da autopoiese, como forma de auto-circularidade e, por esta razão, tendente a não

permitir inputs ou outputs, toda uma dissociação dos mais diversos sistemas fica

sobremaneira difícil de se entender.

Para Teubner será, exatamente, na auto-referência que se conseguirá um conceito mais

geral e abrangente. E, ainda, o sistema poderá ser auto-referencial sem que se adote

qualquer dos outros sistemas e, ainda, a própria autopoiese.

Mister analisarmos as Dimensões da Auto-Referência.

4.5 DIMENSÕES DA AUTO-REFERÊNCIA

A fim de simplificar a apresentação deste trabalho, que não pretende esgotar o tema,

apresentaremos, segundo as concepções de Teubner, as dimensões da auto-referência,

conforme descritas em sua obra.

4.5.1.1 AUTO-OBSERVAÇÃO

27 Ibidem, p. 37

Page 31: O direito como sistema autopoietico

23

A partir do momento em que o sistema passa a influenciar suas próprias operações e não

apenas repeti-las, se está diante de um sistema de auto-observação.

4.5.1.2 AUTO-DESCRIÇÃO

Ocorrerá exatamente na medida em que o sistema de auto-observação adquirir

continuidade temporal como base da criação de uma ordem sistêmica.

Na auto-descrição o que se produzirá é um efeito secundário, ou seja, não se está diante

de uma produção do direito, mas das operações que dele resultam.

4.5.1.3 AUTO-ORGANIZAÇÃO

Trata-se da auto-estruturação do sistema. Ou melhor, o sistema tem condições de se

estruturar espontaneamente. Inexiste input, posto que sua organização se dá

internamente.

A partir do momento em que se misturam os sistemas da auto-regulação com auto-

descrição, o sistema passa a ser auto-reflexivo.

4.5.2 AUTO-PRODUÇÃO

Segundo Teubner, “um sistema diz-se auto-produzido quando produz os seus próprios

elementos.”

A idéia de auto-produção, notadamente no campo do direito, faz com que muitos

sociólogos afastem a idéia do sistema autopoiético, porque se apresenta difícil

conceituar um sistema auto-produtivo no direito quando ele pode sofrer influências das

mais diversas, como políticas, econômicas etc.

Page 32: O direito como sistema autopoietico

24

Desta forma, a se entender o sistema autopoiético e, neste ponto, residem grandes

críticas, a auto-produção e, posteriormente, o sistema como um todo, receberia

influências externas. Contudo, essas influências não repelem a teoria, mas nela se inclui,

pela forma como o direito trata cada um destes fatores, ou seja, o direito abrange todas

as questões que o envolvem e as influências nada mais são do que repercussão dentro do

sistema.

Assim, conjugando-se auto-produção, de todos os componentes do sistema, auto-

manutenção dos ciclos de auto-produção através de uma articulação hipercíclica e auto-

descrição como regulação da auto-reprodução, teremos um conceito de autopoiesis

completo.

4.6 O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO?

4.7 O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO: ALGUMAS CRÍTICAS HABITUAIS

Teubner28 afirma que “o Direito constitui um sistema autopoiético de segundo grau,

autonomizando-se em face da sociedade, enquanto sistema autopoiético de primeiro

grau, graças à constituição auto-referencial dos seus próprios componentes sistémicos

e à articulação de um hiperciclo.”

Contudo, há críticas desde a não aceitação total da teoria como a visão cética dos

próprios criadores do sistema na biologia.

Sem dúvida, desde que se entenda a criação da teoria dentro das ciências biológicas, no

Direito não se poderia aceitar um sistema isento de interferências externas. A mesma

crítica é feita por alguns sociólogos do Direito.

28 p.53

Page 33: O direito como sistema autopoietico

25

E a grande crítica que se faz em torno do sistema autopoiético no Direito é em não

admiti-lo como um sistema fechado, mas aberto e, portanto, como dito, sujeito aos

inputs.

O que se pode afirmar é que o Direito, como afirma Teubner ao início de seu capítulo

sobre o Direito como Sistema Autopiético, não restam dúvidas de que seja assim

mesmo. Há uma hipercircularidade, ou seja, o Direito atua como em hiperciclo.

Desta forma, deixando de lado as diferenças naturais entre a biologia e o Direito, é

indubitável que o Direito pode ser um sistema autopoiético.

4.8 A AUTOPOIESIS DO SOCIAL: CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS

Não nos cabendo transcrever os embates entre os defensores da impossibilidade de se

criar um sistema autopoiético, em sua consideração hierárquica proposta por Maturana,

Luhmann29 afirma que a “autopoiesis social deve ser concebida como sendo

independente da autopoiesis dos organismos vivos”. Segundo os sociólogos, os sistemas

sociais podem ser considerados sistemas autopoiéticos stricto sensu, já que produzem

espontaneamente uma ordem.

Assim sendo, não há como se admitir o sistema autopoiético no Direito como

concepção alternativa, mas, efetivamente, um sistema como tal, dada a auto-reprodução

e por meio das comunicações entre os indivíduos. A grande polêmica ficaria com os

biólogos, não aceitando a inserção do sistema.

4.9 AUTOPOIESIS JURÍDICA: A AUTONOMIA DO DIREITO COMO REALIDADE GRADATIVA

29 Apud Teubner, op.cit., p. 64

Page 34: O direito como sistema autopoietico

26

No que diz respeito ao Direito, pois, sendo certo existir como sistema autopoiético,

assim somente poderemos admitir se se tratar de grau superior. O sistema jurídico deve

estar constituído de seus próprios elementos.

Se não se puder assim admitir, é certo que estaríamos diante de um Big Ben, o que seria

absurdo admitir. Por esta razão, a se adotar e admitir o Direito como sistema

autopoiético, devemos ter em mente que todos os liames do sistema jurídico estejam

presentes e que se articulam entre si.

Para Luhmann, não se pode admitir que um sistema possa ser parte uma coisa e parte

outra. Assim, a autonomia do Direito se constitui de forma gradativa. Um sistema

adquire, pois, auto-referencialidade quando sofre as seguintes modificações30:

⇒ maior feedback entre os seus componentes

⇒ variabilidade da intensidade da articulação entre os componentes

⇒ Constituição de novos componentes dentro da rede de componentes

Dentro de toda sistemática desenvolvida na teoria da autopoiese, o resultado

depende, sempre da linguagem própria do sistema.

Assim, a fim de entendermos melhor o que propôs Luhmann, podemos admitir

seu sistema binário como as hipóteses de legal/ilegal. Como admitir, por exemplo, em

dias de hoje, o chamado poder paralelo do tráfico?

Não seria, pois, um legal/ilegal, dentro de concepções entre positivo/negativo? O

que existe de direito para a sociedade é o não direito para a favela e, via inversa, o

direito da favela será o não direito da sociedade. Mas se analisarmos sob o enfoque do

que venha a ser direito, estamos tratando, sempre, de direito.

30 Teubner, p. 67

Page 35: O direito como sistema autopoietico

27

O Direito se autodetermina. Mas é preciso que fique claro que esta

autodeterminação somente se pode conceber dentro de estruturas já concebidas, onde o

sistema jurídico existe, desde os atos a um sistema processual apto a julgá-los.

4.10 A AUTONOMIA DO DIREITO E SEUS ESTÁDIOS

A fim de bem demonstrar a autonomia jurídica, independentemente das críticas sofridas,

mister a transcrição do gráfico como se apresenta na obra de Teubner31:

31 p. 78

Page 36: O direito como sistema autopoietico

28

Mister o entendimento de cada tópico acima descrito, ou seja:

⇒ Direito Socialmente Difuso

⇒ Direito Semi-Autônomo

⇒ Direito Autopoiético

DIREITO SOCIALMENTE DIFUSO

Page 37: O direito como sistema autopoietico

29

A concepção trazida por Teubner, em verdade, não se apresenta de fácil

assimilação, porquanto não admite ele que a resolução de conflitos possa ser confundida

ou reconduzida ao direito. Assim, o direito socialmente difuso estaria inserido nas

normas.

Quando afirmamos que a idéia de Teubner nos parece de difícil alcance é porque

nem mesmo a transação seria admitida como uma forma jurídica de resolução de

conflitos. À luz do processo civil, notadamente nesta especialidade, sem dúvida, há uma

grande polêmica.

Contudo, admite que se possa falar em direito elementar acaso se torne

imperiosa uma decisão em caso de conflitos ou que estes conflitos sejam resolvidos na

base legal/ilegal (sistema binário de Luhmann).

Para Teubner a solução dos conflitos se apresenta como forma heteroproduzida,

através de fatores externos. Mas, a fim de entender o Direito como Sistema

Autopoiético é necessária a análise de outros elementos e formas de conceber o direito,

por mais que entendamos que o socialmente difuso não excluiria a idéia de Direito,

mesmo diante de solução de conflitos.

DIREITO SEMI-AUTÔNOMO

A fim de bem entender o direito semi-autônomo, a nota de rodapé constante na

obra de Teubner, como tradução do Prof. Dr. José Engrácia Antunes, irá bem definir o

que venha a ser, ou seja, “o coração do sistema jurídico reside na estrutura resultante

da combinação de dois tipos de normas: as normas primárias de obrigação e as

normas secundárias de identificação, modificação e atribuição.32”

32 P.81, em tradução da expressão adotada por Hart, in The Concept of Law

Page 38: O direito como sistema autopoietico

30

Assim sendo, as normas secundárias constituem apenas um dos círculos auto-

referenciais do sistema jurídico, não se podendo, ainda, falar em direito autopoiético.

Pode-se destacar uma idéia do que se pretenda ao se fazer uma distinção entre a

doutrina acadêmica e a praxis jurisprudencial e legislativa.

AUTOPOIESIS JURÍDICA

Somente se poderá admitir o direito como sistema autopoiético a partir do

momento em que haja referências operacionais jurídicas endógenas.

Assim, Teubner admite um moderno positivismo, onde a própria sistemática do

common law, do direito anglo-saxão, poderá ser compreendido como autopoiético,

porque gerado dentro do próprio sistema.

A fim de compreendermos o que se pretende afirmar, é prudente esclarecer que

o ato jurídico deve ser constitutivo e não apenas declaratório.

Analisando o quadro apresentado anteriormente, se poderá concluir que o

sistema autopoiético somente será concebido como tal a partir do momento em que haja

uma perfeita interação entre as formas jurídicas e sociais, se auto-produzindo e sem

interações externas.

Page 39: O direito como sistema autopoietico

31

5 CONCLUSÕES

Antes de concluirmos o presente trabalho, é importante destacar que esta idéia

da autopoiese não abandona o indivíduo. E se assim se admitisse, estaríamos distante de

um sistema calcado em idéias de sociologia do direito.

Conforme afirmaria Teubner em sua obra, aqui resumida e comentada, pelo

menos em seus três primeiros capítulos, a autopoiese trará ao indivíduo uma nova

realidade.

É importante que repensemos o Direito e que criemos quebras de paradigmas.

As quebras de paradigmas, contudo, serão sempre – pelo menos diante de uma inovação

e vista superficialmente – difíceis de serem assimiladas, ou, ainda, aceitas.

A idéia da autopoiese implicaria, sob uma visão holística do Direito, em uma

fonte inesgotável de riqueza jurídica, mas não podemos deixar de lado a certeza de que

o próprio sistema no impulsiona à geração de conflitos e, estes, por sua vez, deverão ser

solucionados.

Diante de toda uma construção autopoiética, teremos a certeza, pelo menos

teórica, da impossibilidade de aplicação de uma súmula vinculante em nosso sistema

judicial, como ora se apresenta, diante das reformas do Judiciário. A autopoiese não

admite o sistema estanque, mas em constante modificação.

E que esta modificação provoque, ao menos, pensamentos a fim de construirmos

uma sociedade justa. Esta a idéia de qualquer jurista.

Page 40: O direito como sistema autopoietico

32

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BOUCAULT, Carlos E. de Abreu et al. Hermenêutica Plural; São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 2.ed.; São Paulo, Atlas, 1980.

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GURVITCH, Georges. Elementos de Sociología Jurídica. Granada, Comares: 2002

LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito. Vols. I e II. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro: 1983

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TEUBNER, Gunther. O Direito como Sistema Autopoiético; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.

VOLKOFF, Vladimir. Pequena História da Desinformação. Curitiba, Vila do Príncipe: 2004

Page 41: O direito como sistema autopoietico

33

ANEXOS DE TABELAS AGRADECIMENTOS........................................................................................................ 4

RESUMO............................................................................................................................ v

ABSTRACT....................................................................................................................... vi

1INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1

2O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO ........................................................ 3

3.1DEFININDO AUTOPOIESE ........................................................................................ 4

3.2DIREITO POSITIVO x POSITIVISMO CIENTÍFICO ................................................ 6

3.3O DIREITO POSITIVO E A QUEBRA DE PARADIGMA......................................... 8

4 AUTOPOIESE NO DIREITO – UMA QUEBRA DE PARADIGMA ......................... 12

4.1OS PARADOXOS DA AUTO-REFERÊNCIA .......................................................... 12

4.1.1GERIR O PARADOXO............................................................................................ 14

4.1.1.1DES-CONSTRUÇÃO DA DOUTRINA JURÍDICA ............................................ 14

4.1.2ELABORAR DISTINÇÕES..................................................................................... 15

4.1.3Transferência do paradoxo do mundo do pensamento sobre o direito para o mundo

da realidade social do direito (circularidade) .................................................................... 17

4.2PARADOXOS REAIS E MORFOGÉNESE ATRAVÉS DE VALORES PRÓPRIOS17

A NOVA AUTO-REFERENCIALIDADE ..................................................................... 20

4.3SISTEMAS FECHADOS, SISTEMAS ABERTOS, SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS20

4.4O FENÔMENO DA AUTO-REFERÊNCIA: A “GALÁXIA AUTO” ....................... 21

4.4.1.1Sistema auto-organizado ........................................................................................ 22

4.4.1.2Sistema auto-produtivo .......................................................................................... 22

4.4.1.3Sistema auto-subsistente ........................................................................................ 22

4.4.1.4Sistema auto-referencial......................................................................................... 22

4.5DIMENSÕES DA AUTO-REFERÊNCIA .................................................................. 23

4.5.1.1AUTO-OBSERVAÇÃO ........................................................................................ 23

4.5.1.2AUTO-DESCRIÇÃO............................................................................................. 23

4.5.1.3AUTO-ORGANIZAÇÃO ...................................................................................... 24

4.5.2AUTO-PRODUÇÃO ................................................................................................ 24

O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO?........................................................ 25

4.6O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO: ALGUMAS CRÍTICAS

HABITUAIS ..................................................................................................................... 25

Page 42: O direito como sistema autopoietico

34

4.7A AUTOPOIESIS DO SOCIAL: CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS....................... 26

4.8AUTOPOIESIS JURÍDICA: A AUTONOMIA DO DIREITO COMO REALIDADE

GRADATIVA................................................................................................................... 26

4.9A AUTONOMIA DO DIREITO E SEUS ESTÁDIOS ............................................... 27

DIREITO SOCIALMENTE DIFUSO .............................................................................. 29

DIREITO SEMI-AUTÔNOMO ....................................................................................... 29

AUTOPOIESIS JURÍDICA.............................................................................................. 30

5CONCLUSÕES .............................................................................................................. 31

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................. 32

ANEXOS DE TABELAS ................................................................................................. 33

ADENDO.......................................................................................................................... 35

ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PORTUGAL ................... 35

ENTREVISTA A ISTO É................................................................................................. 38

ANEXOS DE FIGURAS .................................................................................................. 43

FIGURA 1 - Imagem obtida na Internet, relacionada aos sistemas cibernéticos. ............. 45

FIGURA 2 - Concepção Autopoiética .............................................................................. 46

FIGURA 3 - Simbolização da Autopoiese........................................................................ 47

Page 43: O direito como sistema autopoietico

35

ADENDO

ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PORTUGAL

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Processo: [Moldura1] Nº Convencional: JSTJ00013283 Relator: MANSO PRETO Descritores: CONSTITUCIONALIDADE

REFORMA DA DECISÃO INTEGRAÇÃO DAS LACUNAS DA LEI PODERES DA RELAÇÃO MATERIA DE FACTO TRIBUNAL COLECTIVO

Nº do Documento: SJ199201220414193 Data do Acordão: 22/01/92 Votação: UNANIMIDADE Referência de Publicação:

BMJ N413 ANO1992 PAG119

Texto Integral: S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL. Decisão: REFORMADO O ACORDÃO. Área Temática: DIR PROC PENAL - RECURSOS.

DIR CONST - DIR FUND. Legislação Nacional:

CONST82 ART32 N1. CPP29 ART665.

Jurisprudência Nacional:

ASS STJ DE 1934/06/29.

Page 44: O direito como sistema autopoietico

36

Sumário : I - Quando o Tribunal Constitucional discorda do juizo deconstitucionalidade de uma norma emitido pelo SupremoTribunal de Justiça e revoga o acordão por este proferido, compete ao Supremo julgar novamente e de direito,determinando, interpretando e aplicando a norma juridicapertinente - norma que não sofra da inconstitucionalidade reconhecida pelo Tribunal Constitucional (ou de qualquer outra). II - Tendo o Tribunal Constitucional decidido que o artigo665 do Codigo de Processo Penal de 1929, na interpretaçãoque lhe foi dada pelo Assento de 29 de Junho de 1934, einconstitucional por não constituir garantia suficiente dosdireitos da defesa a que alude o n. 1 do artigo 32 daConstituição, e entendendo o Supremo Tribunal de Justiça,ao reformar a decisão, que o referido artigo, mesmo sem asobreposição daquele Assento, e inconstitucional, cabe-lhe a ele proprio determinar a norma juridica aplicavel, criando-a, para integrar a lacuna, se for caso disso, como se houvessede legislar dentro do espirito do sistema (n. 3 do artigo 10 do Codigo Civil). III - Aqui, o sistema que interessa e fundamentalmente constituido pelos principios da chamada "constituição processual criminal" contidos no artigo 32 da Constituiçãoda Republica, pelas normas pertinentes do Codigo deProcesso Penal de 1929 e do novo Codigo de Processo Penalde 1987.

Page 45: O direito como sistema autopoietico

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Decisão TextoIntegral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - O Tribunal Constitucional, pelo acordão de folhas 825-829, deu provimento ao recurso interposto pelo reu A doacordão deste Supremo, a folhas 754 e seguintes, emobediencia ao acordão daquele mesmo Tribunal, tirado emplenario (Acordão n . 340/90, D.R., I serie, de 19 de Março de 1991), que entendeu que o artigo 665 do Codigo deProcesso Penal de 1929, na interpretação que lhe foi dadapelo Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junhode 1934, e inconstitucional por não constituir garantia suficiente dos direitos da defesa a que alude o n. 1 do artigo32 da Constituição, sendo certo que a prova produzidaperante o tribunal colectivo não e reduzida a escrito (artigo466) e as respostas aos quesitos não são fundamentadas(artigo 469). Em consequencia, o Tribunal Constitucional revogou oacordão deste Supremo para ser reformado de acordo com oJuizo que proferiu sobre a questão da inconstitucionalidade. II - Conhecendo e decidindo: 1 - O artigo 665 do Codigo de Processo Penal, aprovado pelo Decreto n. 16489, de 15 de Fevereiro de 1929, dizia nasua redacção originaria: "As Relações conhecerão de facto e de direito nas causasque julguem em 1 instancia e nos recursos interpostos dasdecisões proferidas pelos juizes de 1 instancia, e conhecerão so de direito nos recursos interpostos das decisões finais dostribunais colectivos e das proferidas nos processos em queintervenha o juri, salvo o disposto no artigo 517. Em 1931, por efeito do Decreto n. 20147, de 1 de Agosto de1931, a redacção do artigo passou a ser a seguinte: "As Relações conhecerão de facto e de direito nas causasque julguem em 1 instancia, nos recursos interpostos dasdecisões proferidas pelos juizes de 1 instancia, das decisõesfinais dos tribunais colectivos e das proferidas nos processos em que intervenha o juri, baseando-se para isso, nos dois ultimos casos, nos documentos, respostas aos quesitos e emquaisquer outros elementos constantes dos autos". Tendo surgido duvidas no seio da jurisprudencia sobre oambito dos poderes das Relações quanto a apreciação damateria de facto acolhida nas decisões dos tribunaiscolectivos, veio a ser proferido o Assento de 29 de Junho de 1934, nos seguintes termos: "O art 665 do C.P.P., modificado pelo dec n. 20147, de01.08.1931, relativamente a competencia das Relações em materia de facto, tem de entender-se no sentido de as mesmas so poderem alterar decisões dos Trib. colectivos da1 Inst. em face dos elementos do processo que não fossemcontrariados pela prova apreciada no julgamento e que haja

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ENTREVISTA A ISTO É David Diniz Dantas

A humanização da Justiça Juiz federal inova com decisões baseadas nas condições sociais, e não apenas no que diz o texto das leis: “Só princípios não são suficientes” Luiza Pastor e Mário Chimanovitch

Uma verdadeira revolução, ainda silenciosa, vem sendo alimentada na Justiça Federal. Um dos expoentes desse movimento é o juiz David Diniz Dantas, de Ribeirão Preto, 47 anos, que tem dedicado seu tempo a fazer o que o comum dos mortais nunca imaginou ser possível: tornar a Justiça mais humana. Os que estão acostumados à inevitabilidade do ditado “dura lex sed lex” (a lei é dura, mas é a lei, em latim), hoje respiram aliviados com decisões que estabeleceram uma nova visão do que deve ser a Justiça: uma defensora dos princípios morais que a Constituição e o bom senso determinaram como parâmetros para a vida.

Um exemplo do tipo de sentença do juiz aconteceu com M, menina de um ano e meio, que sofre de doença raríssima e que, sem um remédio importado não disponível na rede pública, morreria. Pelo que estabelece a lei, a criança não teria direito ao medicamento gratuito – mas decisão da Justiça Federal a contemplou com o que, em essência, foi considerado direito à vida. Uma decisão que, no seu parecer, incluiu a subjetivíssima declaração do juiz Dantas, de que a demanda fazia “partir o coração”. Nada mais distante do positivismo e da tradição iluminista que norteiam a aplicação das leis no Brasil desde o século XIX.

Outro caso, foi o do funcionário do extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC) em Beirute, que teve sua casa destruída por uma bomba na guerra civil do Líbano. Pela lei brasileira, por não se tratar de ato sofrido em território nacional, o funcionário não teria direito a indenização. Invocado o princípio da solidariedade, obrigou-se a União a pagar pelos danos. Afinal, se o País se beneficiava dos frutos do trabalho do funcionário também deveria ser solidário com ele nos prejuízos. Dantas deu entrevista a ISTOÉ na semana em que lançava o livro Interpretação constitucional no pós-positivismo.

ISTOÉ – Como foi que o sr. começou a julgar dentro dessa ótica mais humanista? David Diniz Dantas – A partir da constatação da insuficiência de um modelo que é a perspectiva positivista, formalista. Vemos diariamente insuficiências da lei na sua literalidade para solucionar os casos judiciais. Casos rotineiros, como os da Previdência Social, de ações de simples despejo, para as quais o texto da lei dá solução inadequada se levarmos em conta as concepções de Justiça que se tem na sociedade. Como o despejo de um senhor de 90 anos de idade. Realmente, ele não pagara o aluguel, e todos os requisitos legais para ele ser despejado estavam presentes. Mas pergunta-se: será que o juiz precisa mesmo determinar o despejo? Temos princípios morais que protegem esse senhor, que são a proteção ao idoso, o direito à moradia. Portanto, o julgador pode analisar essa questão à luz desses princípios morais para fazer um julgamento que tenha muito maior poder de persuasão e aceitação pela sociedade do que a aplicação do rigor.

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ISTOÉ – Há mais magistrados tomando decisões com base nesses princípios? Seria uma tendência? Dantas – Eu não diria que é tendência, mas sim uma verdadeira necessidade atual, de o Direito, a Justiça, o Judiciário responderem a questões de complexidade social. Temos uma complexidade social que não se adequa ao nosso sistema de leis estratificado. Os casos não conseguem receber uma decisão social adequada. Então, ocorre que os juízes federais, que são os que aplicam eminentemente a Constituição – que incorpora princípios morais, como o de igualdade, de solidariedade, etc –, tendem a encarar os casos sob o aspecto principiológico.

ISTOÉ – E qual é a diferença entre o princípio e a regra escrita? Dantas – A regra, o texto da lei, por exemplo, diz que o limite mínimo de idade para a aposentadoria é 65 anos, mas o demandante tem 59 anos, então ele não tem direito. Já o princípio permite fazer essa ponderação, um balanceamento da situação à luz dos princípios, em oposição à norma do tudo ou nada da lei. Tenho um arsenal argumentativo muito maior com os princípios. Os juízes federais são os que atualmente mais têm usado essas possibilidades de completar o direito com amplitude.

ISTOÉ – Como as instâncias superiores recebem essas decisões? Dantas – Estão sendo aceitas. Várias decisões embasadas em princípios morais têm sido acatadas e o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) se mostra sensível a isso. Hoje, inclusive, há uma experiência pioneira na Escola de Magistratura Federal aqui de São Paulo, que é o curso de filosofia para juízes. O tema do curso é o melhor possível: Justiça. Segundo um autor americano, a filosofia é o prólogo de todas as decisões judiciais. Por mais singela que uma decisão judicial seja, há uma concepção filosófica por trás dela. Seja uma concepção conservadora, formalista, seja uma concepção progressista, democrática que vai ser apresentada. Enfim, sem uma concepção filosófica não temos decisões judiciais efetivamente justas.

ISTOÉ – Por que a filosofia? Dantas – Porque ela me permite discutir o que é importante no caso que tenho diante de mim. O que o Direito exige de mim nesse caso? Eu não tenho que saber, para julgar, só o que o texto da lei estabelece, mas algo acima disso: o que o Direito exige? O caso que eu tenho de julgar precisa corresponder a uma concepção de justiça minha, subjetiva, individual, ser algo que a sociedade olhe e compreenda.

ISTOÉ – Nos 20 anos de magistratura que o sr. tem, o que o despertou para esse enfoque? Dantas – As injustiças da lei. Casos como aquele em que a lei diz que para a pessoa ter um benefício previdenciário tem que ter ou mais de 65 anos de idade ou ser inválido. Houve o caso de uma pessoa que sempre trabalhou no campo, desde os sete anos, sem carteira assinada, e que aos 59 anos veio requerer a aposentadoria. Era tecnicamente idoso, visivelmente idoso, e o princípio que devia estar por trás da decisão é a proteção ao idoso. Ora, se eu aplicasse a lei, julgaria improcedente o pedido de um homem de 60 anos, que aparentava mais de 80 e vivia da pensão da mãe, de 94. A lei me impede de julgar esses casos com justiça. Casos como o do ancião ameaçado de despejo, mostraram a insuficiência e a incompletude do modelo legal. Tudo isso nos leva à conclusão de que as pessoas têm direitos morais que precisam ser considerados pelos nossos governos.

ISTOÉ – Mas os governos sempre dizem que têm as mãos atadas pelas leis... Dantas – Mas se os governos não consideram os direitos morais das pessoas, os juízes federais, sobretudo, têm o dever de reconhecê-los. Isso leva a duas situações na hora de aplicar os direitos morais: uma situação em que eu não tenho a lei, ou em que a solução que a lei mostra vai se chocar com algumas idéias de justiça, como solidariedade, proteção aos pobres ou desigualdade social.

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ISTOÉ – O sr. já julgou algum caso na área criminal? Dantas – Sim. Uma professora da Universidade de São Paulo acusada de falsidade ideológica. Ela não poderia ter recebido uma bolsa para a qual se habilitara – uma questão envolvendo a burocracia da USP, especificamente um problema no preenchimento de formulários. Um professor da universidade encaminhou ao Ministério Público Federal cópia do processo, e o Ministério, tecnicamente, denunciou criminalmente a professora por crimes federais. A USP tratou o caso como mera questão burocrática; o Ministério Público, como uma questão legal do ponto de vista formal. O que a Justiça Federal pôde fazer a essa professora foi tratar seu assunto como uma questão de Justiça. Porque é assim que entendo o Direito.

ISTOÉ – E o que aconteceu com ela? Dantas – A partir da constatação de que o Direito é uma mediação entre o poder e a cidadania, funcionando como amortecedor, eu absolvi a professora por falta de crime. Uma absolvição muito forte, não aquela coisa morna de falta de provas.

ISTOÉ – Se a lei não resolve os problemas, não seria o caso de mudar a lei? Dantas – Sempre vai ser necessário julgar de olho nos princípios, pois a legislação não consegue acompanhar a complexidade social. Os princípios sempre vão ter que iluminar a legislação. Mesmo uma lei nova tem que se submeter aos princípios morais e constitucionais. É importante ressaltar, ainda, a necessidade da legitimação política da Justiça.

ISTOÉ – O que seria essa legitimação? Dantas – A idéia é que nós só construímos uma nação se tivermos uma comunidade de princípios. É diferente da comunidade ocasional, circunstancial, em que cada um procura o bem para si mesmo e oportunamente se alia a outros. Como nós, juízes, podemos contribuir para essa comunidade de princípios? Exatamente trazendo para o discurso judicial essas questões. Assumo então a postura de levar a sério o texto constitucional. Não adianta incluir na Constituição princípios lindos de justiça social, dignidade da pessoa humana, proteção aos pobres, solidariedade, se eu não os concretizo, se não os trago para o discurso judicial, se continuo aplicando o legalismo formal. À medida que trago ao discurso judicial essas questões e as enfrento, e a sociedade percebe que os juízes julgam seus processos a partir de valores que ela compartilha, aumenta a legitimação política do Judiciário, que é um poder carente, já que não foi escolhido pela maioria, democraticamente. Essa legitimação vem do exercício, da atuação.

ISTOÉ – O sr. fala muito da concepção moral. De que moral estamos falando? Dantas – Quando falo na concepção do Direito conectado a uma concepção moral, me refiro não àquela moral que inibe o lado lúdico da sociedade, que inibe as pessoas do prazer sexual, por exemplo. Nem na moral de uma dimensão sobre-humana, formada por princípios só possíveis aos santos e aos grandes heróis. A moral, aqui, está ligada ao ponto de vista, ao outro, à consideração de outros interesses que não os meus. Se eu tenho um caso para julgar, o ponto de vista moral me faz considerar todos os interesses relevantes naquele caso, mesmo que não sejam os meus, e às vezes nem os das partes envolvidas diretamente no processo

ISTOÉ – O sr. poderia exemplificar? Dantas – Vamos considerar uma questão que envolva o aborto. Ela jamais poderá ser analisada exclusivamente pelo ponto de vista legal. A lei prevê que é crime, pronto. Ora, qual é o ponto de vista moral? É a necessidade de considerar a questão dentro de uma grande amplitude de interesses: o que as mulheres pensam sobre o assunto? O que os religiosos em suas diversas visões pensam? O que a Saúde vai me dizer sobre isso? O ponto de vista moral exige um leque de abertura ao diálogo multidisciplinar e que não se dê ao ponto de vista do Direito um locus privilegiado, de impor e dizer: a solução é essa. Isso não satisfaz.

ISTOÉ – O sr. acha que essas mudanças que beneficiam a sociedade são percebidas pela população?

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Dantas – Se você perguntar às pessoas em geral o que o prefeito deve fazer, o que o presidente pode fazer, elas vão dizer que ele podia fazer uma lei para isso, outra para melhorar aquilo, que deveria fazer mais escolas, etc. Se perguntar a elas o que os juízes devem fazer, vai pairar uma incógnita. Ninguém sabe. No máximo, vão falar que a Justiça deveria ser mais rápida, o que é apenas funcional.

ISTOÉ – Existe uma forma de acabar com esse distanciamento entre a sociedade e o Judiciário? Dantas – Quando se fala em reformar o Judiciário, há propostas interessantes, de procedimentos mais rápidos e tal, mas há outro lado interessante de que pouco se fala, que é sobre a natureza das decisões. Precisamos de decisões que façam sentido ao cidadão. As pessoas em sua vida privada normalmente cumprem seus deveres, mas percebemos, principalmente em campanhas políticas, que se prometem coisas que não se cumprem. Há um duplo padrão ético. No momento em que nós juízes decidirmos questões por uma pauta de postura ética, por valores e teorias políticas e morais, nos aproximaremos da sociedade. Temos que ter uma Justiça rápida, democrática e com justificações aceitas pela sociedade como razoáveis. Caso contrário, vem aquela imagem do juiz que pega a solução em um cesto, num varal. Quando julgamos um caso como esse do ancião despejado ou do que pedia uma pensão, precisamos aplicar o construtivismo ético. Ou seja: a decisão não está pronta no texto da lei, eu vou construir essa decisão. O texto da lei é só meu ponto de partida.

ISTOÉ – Mas essa decisão não corre o risco de ser considerada política? Dantas – Tenho uma tese de que a Constituição é a teoria moral e política que sustenta o texto constitucional, não um mero pedaço de papel. Não adianta falar em igualdade, sem uma teoria sobre o que é a igualdade. Isso serve para todos os preceitos. O sustentáculo da Constituição é uma teoria moral e política, porque impõe uma dinâmica que se adapta à questão das leis. O juiz tem que ter, sim, uma atuação política, mas política em que sentido? Não no sentido partidário, mas no de alcance das decisões. Quando, num caso envolvendo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) sobre a abrangência da tarifa social, concedi uma liminar, ela beneficiou milhões de pessoas que precisavam dessa tarifa social. Nesse caso, o alcance político dessas decisões é o que aparece.

"Isto é" de 05 de maio

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ANEXOS DE FIGURAS AGRADECIMENTOS........................................................................................................ 4

RESUMO............................................................................................................................ v

ABSTRACT....................................................................................................................... vi

1INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1

2O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO ........................................................ 3

3.1DEFININDO AUTOPOIESE ........................................................................................ 4

3.2DIREITO POSITIVO x POSITIVISMO CIENTÍFICO ................................................ 6

3.3O DIREITO POSITIVO E A QUEBRA DE PARADIGMA......................................... 8

4 AUTOPOIESE NO DIREITO – UMA QUEBRA DE PARADIGMA ......................... 12

4.1OS PARADOXOS DA AUTO-REFERÊNCIA .......................................................... 12

4.1.1GERIR O PARADOXO............................................................................................ 14

4.1.1.1DES-CONSTRUÇÃO DA DOUTRINA JURÍDICA ............................................ 14

4.1.2ELABORAR DISTINÇÕES..................................................................................... 15

4.1.3Transferência do paradoxo do mundo do pensamento sobre o direito para o mundo

da realidade social do direito (circularidade) .................................................................... 17

4.2PARADOXOS REAIS E MORFOGÉNESE ATRAVÉS DE VALORES PRÓPRIOS17

A NOVA AUTO-REFERENCIALIDADE ..................................................................... 20

4.3SISTEMAS FECHADOS, SISTEMAS ABERTOS, SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS20

4.4O FENÔMENO DA AUTO-REFERÊNCIA: A “GALÁXIA AUTO” ....................... 21

4.4.1.1Sistema auto-organizado ........................................................................................ 22

4.4.1.2Sistema auto-produtivo .......................................................................................... 22

4.4.1.3Sistema auto-subsistente ........................................................................................ 22

4.4.1.4Sistema auto-referencial......................................................................................... 22

4.5DIMENSÕES DA AUTO-REFERÊNCIA .................................................................. 23

4.5.1.1AUTO-OBSERVAÇÃO ........................................................................................ 23

4.5.1.2AUTO-DESCRIÇÃO............................................................................................. 23

4.5.1.3AUTO-ORGANIZAÇÃO ...................................................................................... 24

4.5.2AUTO-PRODUÇÃO ................................................................................................ 24

O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO?........................................................ 25

4.6O DIREITO COMO SISTEMA AUTOPOIÉTICO: ALGUMAS CRÍTICAS

HABITUAIS ..................................................................................................................... 25

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4.7A AUTOPOIESIS DO SOCIAL: CONCEPÇÕES ALTERNATIVAS....................... 26

4.8AUTOPOIESIS JURÍDICA: A AUTONOMIA DO DIREITO COMO REALIDADE

GRADATIVA................................................................................................................... 26

4.9A AUTONOMIA DO DIREITO E SEUS ESTÁDIOS ............................................... 27

DIREITO SOCIALMENTE DIFUSO .............................................................................. 29

DIREITO SEMI-AUTÔNOMO ....................................................................................... 29

AUTOPOIESIS JURÍDICA.............................................................................................. 30

5CONCLUSÕES .............................................................................................................. 31

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................. 32

ANEXOS DE TABELAS ................................................................................................. 33

ADENDO.......................................................................................................................... 35

ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PORTUGAL ................... 35

ENTREVISTA A ISTO É................................................................................................. 38

ANEXOS DE FIGURAS .................................................................................................. 43

FIGURA 1 - Imagem obtida na Internet, relacionada aos sistemas cibernéticos. ............. 45

FIGURA 2 - Concepção Autopoiética .............................................................................. 46

FIGURA 3 - Simbolização da Autopoiese........................................................................ 47

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FIGURA 1 - Imagem obtida na Internet, relacionada aos sistemas cibernéticos33.

33 <http://www.paris.siggraph.org/ASTI2001/ASTIACTES/ACTES07/Image14.jpg>,

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FIGURA 2 - Concepção Autopoiética34

34 http://www.ulme-mini-verlag.de/reflect-Dateien/image009.jpg

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FIGURA 3 - Simbolização da Autopoiese35

35 http://www.ulme-mini-verlag.de/reflect-Dateien/image007.jpg