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PERSEGUIÇÃO AOS CRISTÃO NOS SECULOS I E II DA ERA CRISTÃ WERKSON DA SILVA AZEREDO 1 WERKSON DA SILVA AZEREDO 2 Curso Pós-Graduação Especialização em Ciências da Religião FANAN – Faculdade de Nanuque RESUMO Na visão Paulina o nascimento de Cristo ocorreu em momento oportuno “Plenitude dos tempos” que viria a favorecer a propagação da Fé cristã, porém Jesus foi uma figura controversa em seu contexto amado pelas massas, mas em constante conflito com os líderes Judaicos o que culminará na sua crucificação e morte de Jesus, evento relatado nos quatro evangelhos (Mt. 27.45-56; Mc. 15.33-41; Jo 19.28-30), contudo Jesus Ressuscita provando ser o messias, ressuscitando vencera a morte, sendo agora capaz de conceder a vida que antes havia prometido (Jo 10.10 b), comissiona os apóstolos a irem por todo mundo pregando o Evangelho (Mc 16.15) e assim o fizeram começando no dia de Pentecostes. A partir deste momento começam as oposições aos Cristãos (neste momento não eram vistos como uma nova religião, mas uma seita dentro do judaísmo “Os do Caminho”), que a princípio partiram dos Judeus, em seguida Imperadores como Nero, Domiciano, Trajano e Marco Aurélio, darão início a Politica imperial das Perseguições. 1. INTRODUÇÃO “Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” Mateus 16:18, Jesus diz que edificaria a sua Igreja e que as oposições “as portas do inferno” não seriam capazes de paralisá-la, o que realmente irá acontecer, o Cristianismo consegue em pouco mais de 250 anos emergir de um movimento marginalizado, para religião oficial do Império Romano, tal movimento tem seu início no dia de Pentecostes (Pentecostes uma das principais festa do calendário judaico é celebrado 50 dias depois do domingo de Páscoa) neste dia o apostolo Pedro toma a palavra e ousadamente anuncia o primeiro sermão

Perseguição aos cristãos no sec. i e ii

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PERSEGUIÇÃO AOS CRISTÃO NOS SECULOS I E II DA ERA CRISTÃ

WERKSON DA SILVA AZEREDO 1

WERKSON DA SILVA AZEREDO2

Curso Pós-GraduaçãoEspecialização em Ciências da Religião

FANAN – Faculdade de NanuqueRESUMO

Na visão Paulina o nascimento de Cristo ocorreu em momento oportuno “Plenitude dos

tempos” que viria a favorecer a propagação da Fé cristã, porém Jesus foi uma figura

controversa em seu contexto amado pelas massas, mas em constante conflito com os

líderes Judaicos o que culminará na sua crucificação e morte de Jesus, evento relatado nos

quatro evangelhos (Mt. 27.45-56; Mc. 15.33-41; Jo 19.28-30), contudo Jesus Ressuscita

provando ser o messias, ressuscitando vencera a morte, sendo agora capaz de conceder a

vida que antes havia prometido (Jo 10.10 b), comissiona os apóstolos a irem por todo

mundo pregando o Evangelho (Mc 16.15) e assim o fizeram começando no dia de

Pentecostes. A partir deste momento começam as oposições aos Cristãos (neste momento

não eram vistos como uma nova religião, mas uma seita dentro do judaísmo “Os do

Caminho”), que a princípio partiram dos Judeus, em seguida Imperadores como Nero,

Domiciano, Trajano e Marco Aurélio, darão início a Politica imperial das Perseguições.

1. INTRODUÇÃO

“Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha

igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” Mateus 16:18, Jesus diz

que edificaria a sua Igreja e que as oposições “as portas do inferno” não seriam

capazes de paralisá-la, o que realmente irá acontecer, o Cristianismo consegue em

pouco mais de 250 anos emergir de um movimento marginalizado, para religião

oficial do Império Romano, tal movimento tem seu início no dia de Pentecostes

(Pentecostes uma das principais festa do calendário judaico é celebrado 50 dias

depois do domingo de Páscoa) neste dia o apostolo Pedro toma a palavra e

ousadamente anuncia o primeiro sermão cristão da história da igreja, tendo grande

aceitação, porém o teor da mensagem, certamente traria problemas “Saiba pois com

certeza toda a casa de Israel que a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o fez

Senhor e Cristo”. Atos 2:36, claramente Pedro coloca sobe responsabilidade dos

líderes judaicos a morte de Cristo, por isso, futuramente, será preso, mas o discurso

de Gamaliel encontra eco entre o Sinédrio e após serem açoitados são libertos

“Mas, levantando-se no conselho um certo fariseu, chamado Gamaliel, doutor da lei,

venerado por todo o povo, mandou que por um pouco levassem para fora os

apóstolos; Atos 5:34 e noutra ocasião por meio de um milagre é liberto “E eis que

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sobreveio o anjo do Senhor, e resplandeceu uma luz na prisão; e, tocando a Pedro

na ilharga, o despertou, dizendo: Levanta-te depressa. E caíram-lhe das mãos as

cadeias. Atos 12:7, esses episódios já revelação como será a relação entre Cristão e

líderes Judaicos, além disso não serão apenas os Judeus, os Romanos também irão

perseguir, aprisionar e “condená-los à pena capital”

______________________ Aluno do Curso de Pós Graduação- Especialização em Ciências da Religião - Lato – Sensu- Faculdade Vale do Cricaré.2 Graduado em Teologia.

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2 – VIDA DE CRISTO E FORMAÇÃO DA ECLÉSIA

O apostolo Paulo acreditava que o nascimento de Jesus Cristo aconteceu em

momento oportuno, “Mas, vindo à plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho,

nascido de mulher, nascido sob a lei, para remir os que estavam debaixo da lei, a

fim de recebermos a adoção de filhos” (Gl. 4:4-5), segundo Orígenes citado por

FOSTER (1961, p. 6) aquele momento de estabilidade política propiciava condições

favoráveis a divulgação do evangelho:

O Mestre disse: "Ide e fazei discípulos de todas as nações." Ora, é certo

que Jesus nasceu no reinado de Augusto (31 A.C.-14A.D.) o qual, por assim

dizer, fundiu em um só império tantas populações do mundo. Se tivesse

havido muitos reinos por toda parte, os homens estariam lutando

guerreando cada um por sua terra natal, e isso teria impedido a

disseminação da doutrina de Jesus por toda a terra.

Contudo, nem mesmo tais condições (geopolíticas) impediram que questões de

ordem religiosa conduzissem Jesus ao martírio, os que estavam mais preparados

para compreender sua mensagem tornaram-se seus mais ferrenhos opositores.

Após a crucificação e morte de Jesus, evento relatado nos quatro evangelhos (Mt.

27.45-56; Mc. 15.33-41; Jo 19.28-30), os seus seguidores são tomados por um forte

sentimento de decepção, tudo parecia acabado, mas no primeiro dia da semana,

após a crucificação Jesus aparece a Maria Madalena (Jo 20.14) e ao cair da tarde

aos seus discípulos (Jo 20.19, nvi).

Nisso ela se voltou e viu Jesus ali, em pé, mas não o reconheceu. Disse

ele: "Mulher, por que está chorando? Quem você está procurando? "

Pensando que fosse o jardineiro, ela disse: "Se o senhor o levou embora,

diga-me onde o colocou, e eu o levarei". (Grifo meu) João 20:14-15

Com estas aparições Jesus provara ser o messias, ressuscitando vencera a morte,

sendo agora capaz de conceder a vida que antes havia prometido (Jo 10.10 b, nvi),

então ele os instrui durante quarenta dias que antecederam sua ascensão,

orientando-os a permanecer em Jerusalém para recebem o Espírito Santo - “[...] Não

saiam de Jerusalém, mas esperam pela promessa de meu pai, da qual lhes falei”

(At. 1.4 b, nvi) - antes de atenderem a Grande Comissão (Mc 16.15).

Enfim, era dia de pentecostes, grande numero de Judeus estavam em Jerusalém -

Muitos destes eram prosélitos e Judeus da diáspora, como também judeus

palestinos, o que tornava o momento bem oportuno para a primeira proclamação

publica do evangelho - enquanto isso cerca de 120 discípulos de Jesus estavam

reunidos e perseveravam em oração (At. 1.14). “Todos ficaram cheios do espírito

santo e começaram a falar noutras línguas, conforme o espírito santo os capacitava.

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” (At. 2.4), dos que estavam ali uns ficaram maravilhados (2.13) outros zombavam

(At. 2.13).

A tradição Rabínica acreditava que o dia de pentecostes além de ser uma festa de

ação de Graças marcava também o dia em que Deus entregou a lei a Moisés

(RICHARDS, 2008, p. 253) e assim como o profeta Isaias declara que: “E irão

muitos povos, e dirão: Vinde, subamos ao monte do Senhor, à casa do Deus de

Jacó, para que nos ensine os seus caminhos, e andemos nas suas veredas; porque

de Sião sairá a lei, e de Jerusalém a palavra do Senhor” (Is.2.3) temos assim o

cumprimento da promessa.

Pedro, então toma a palavra e ousadamente anuncia o primeiro sermão cristão da

historia da igreja, demonstrando que o que ali estava acontecendo nada mais era do

que o cumprimento da promessa Divina, tanto do derramamento do Espírito, “nos

últimos dias”, sobre todos os povos (Jl. 2.28-32) quanto sobre a glorificação do

Messias (Sl. 110.1).

Shelley descreve: “O Messias, uma vez crucificado, foi exaltado sobre toda criação.

Sem esse Milagre, disseram os apóstolos, não existe evangelho, nem salvação, nem

igreja. ” (2008, p. 18), Cerca de três mil homens atendem a mensagem, notório é o

fato de o texto dizer que houve um acréscimo, mas, onde? Na igreja – ekklesia -,

aqui tem o inicio da igreja cristã, aquela que Jesus dissera que edificaria (Mt. 16.18),

mesmo que os que dela faziam parte ainda assim não entendiam seu cumprimento

(percebemos isso em At. 3, quando os discípulos estão indo ao templo fazerem suas

orações, muito da verdade é que os primeiros cristãos conhecidos como “os do

caminho” eram tidos como uma seita dentro do judaísmo).

O centro de suas atividades nos primeiros anos era Jerusalém, “As sedes gerais

daquela época eram o cenáculo, no monte Sião, e o pórtico de Salomão, no Templo.

” (HURLBUT, 2007, p. 22) “E em seu nome se pregasse o arrependimento e a

remissão dos pecados, em todas as nações, começando por Jerusalém. ” (Lc.

24.47).

A comunidade ali localizada a principio era constituída por judeus da palestina

(hebreus) e judeus helenistas (desdentes da disperção) e proselitos (renunciantes

do paganismo e convertidos ao judaismo), e dos helenistas são escolhidos sete

homens com a função de supervisionar a distribuição de alimentos, o lider deles era

Estevão, porém, morre como mártir, devido as criticas feitas contra o templo (At. 7),

Estevão parece ser o primeiro a compreender que o Cristianismo não era “O

cumprimento do Judaísmo” (LADD, 2004, 500), em seguida Pedro também toma

contato com gentios e estes também são cheios do espírito e ao que tudo indica

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ocorre ali o fenômeno da glossolalia (At.10.44), Paulo (logo abaixo falaremos mais

sobre ele) desde sua primeira viajem missionária observa como os gentios mais do

que os Judeus abraçam a nova fé, como declara Ladd: “ele recebia, quase que

invariavelmente, oposição por parte dos lideres judeus e pela maioria da sinagoga,

porém encontrava um recepção calorosa pelos gentios que cultuavam nas

sinagogas” ( 2004, p. 501). Essa receptividade por parte dos gentios não era bem

vista por todos, havia os que o apostolo Paulo chamada “os da parte de Tiago” (Gl.

2.12) que acreditavam que para se tornar um cristão antes um gentio deveria iniciar-

se no Judaísmo, tal problemática ficou conhecida como “controvérsia judaizante”

somente no concilio de Jerusalém no 50 d. C com os testemunhos de Pedro, Paulo

e a compreensão que Tiago tem dos acontecimentos, interpretando a profecia bíblia

de Amos 9.11,12 a problemática é teoricamente resolvida. Tudo isso já demonstrava

uma separação entre Judaísmo e Cristianismo, que tem na queda de Jerusalém no

ano 70 d. C o marco definitivo, quando Tito invade Jerusalém, sob ordens de seu pai

o então Imperador Vespasiano.

Os judeus, no ano setenta, cerca de quarenta anos depois da paixão de

Cristo, foram destruídos por Tito e por seu pai Vespasiano (que sucedeu

Nero no império) num total de um milhão e cem mil, sem contar aqueles que

Vespasiano matou ao subjugar a região da Galileia. Dezessete mil foram

vendidos e enviados para o Egito e outras províncias como vis escravos;

dois mil Tito trouxe consigo para a celebração do seu triunfo. Destes, muitos

ele entregou para que fossem devorados por animais selvagens, os

restantes foram assassinados de outras formas cruéis ao extremo (FOXE,

2003).

3. PRIMEIRAS OPOSIÇÕES E INICIO DAS PERSEGUIÇÕES

Anos antes surge Saulo de Tarso, este que fora relevante no que se refere à

perseguição contra os cristãos, tornar-se-ia ainda mais na propagação do kerigma.

As primeiras oposições contra os cristãos advêm dos judeus, o vinho novo e o odre

velho estavam em conflito, como relata o texto bíblico (At. 4; At. 5.17; At. 8):

Enquanto Pedro e João falavam ao povo, chegaram os sacerdotes, o

capitão da guarda do templo e os saduceus. Eles estavam muito

perturbados porque os apóstolos estavam ensinando o povo e proclamando

em Jesus a ressurreição dos mortos. Agarraram Pedro e João e, como já

estava anoitecendo, os colocaram na prisão até o dia seguinte. Atos 4:1-3

Vale ressaltar que os saduceus não criam na ressureição dos mortos “E, chegando-

se alguns dos saduceus, que dizem não haver ressurreição, perguntaram-lhe” (Lc.

20:27).

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A partir de 58 d. C com Nero tem inicio as perseguições por parte do império

romano, conhecido pela crueldade com que tratou os Cristãos e por ter acusado-os

pelo incêndio que destruiu boa parte da cidade Roma o

historiador romano Tácito (56 d.C. – 117 d.C.) registra em seus anais o trato de Nero

para com os Cristão, sendo ele o principal suspeito do incêndio “Nero, para desviar

as suspeitas, procurou culpados, e castigou com as mais terríveis penas a certo

grupo, já odiado por suas abominações, que o vulgo chamava cristãos” (Tácito.

Anais XV. 44,3). Tácito, citado por Silva, fala-nos ainda com mais detalhes como

padeceram os acusados.

“O suplício destes miseráveis foi ainda acompanhado de insultos, porque ou

os cobriam com peles de animais ferozes para serem devorados pelos cães,

ou foram crucificados, ou os queimaram de noite para servirem de archotes

e tochas ao público”. (Tácito. Anais XV. 44,7):

E sobe este mesmo imperador, são martirizados tanto o apostolo Pedro quanto o

apostolo Paulo. O termino desta primeira perseguição e sobe o imperador

Vespasiano.

A primeira das dez perseguições foi desencadeada por Nero por volta do

ano 64 do Senhor. A tirânica fúria desse imperador foi cruel contra os

cristãos, “a ponto de — conforme registra Eusébio — encher cidades de

cadáveres humanos, mostrando velhos jazendo ao lado de jovens e corpos

de mulheres abandonados nus no meio da rua sem respeito algum por seu

sexo. ” Muitos houveram entre os cristãos daqueles dias que, vendo as

obscenas abominações e a intolerável crueldade de Nero, julgaram que ele

era o anticristo. (FOXE, 2003)

Eusébio de Cesareia conhecido como o pai da história da igreja no seu livro História

Eclesiástica faz referência a Nero de maneira crítica e pondera sobre seu

comportamento brutal que não considerou nem mesmo seus familiares

Já que, sendo muitos os que transmitiram em relatos precisos suas

maldades, quem queira poderá aprender destes sobre a grosseira demência

deste homem estranho que, levado por ela e sem a menor reflexão,

produziu a morte de inúmeras pessoas e a tal ponto levou seu afã homicida

que não se deteve nem mesmo ante os mais chegados e queridos, mas que

até a sua mãe, seus irmãos, sua esposa e com eles muitos familiares, fez

perecer com variadas formas de morte, como se fossem adversários e

inimigos. (História Eclesiástica II. XXV, 2)

Domiciano por volta do ano 90 D. c, irmão de Tito continua as perseguições,

orgulhoso institui a adoração de sua pessoa, como deus, o apostolo João e por

Domiciano exilado na Ilha de Patmos sendo posto em liberdade depois da morte de

dele. “Dion Cássio afirma que Domiciano mandou matar aqueles "qui in mores

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Judeorum transierant" (livro -T). Isto e, aqueles que se tornaram cristãos [...]” (A.J.

O'Reilly, 2005) A. Knight e W. Anglin falam também sobre início da perseguição

“Contudo durante esse tempo Domiciano (que podia quase levar a palma a Nero,

quanto à intolerância e crueldade) subiu ao trono; e depois de quatorze anos do seu

reinado, rebentou a perseguição geral (1983, p. 9) “Cerca do ano 90, o cruel e

indigno imperador Domiciano iniciou a segunda perseguição imperial aos cristãos.

Durante esses dias, milhares de cristãos foram mortos, especialmente em Roma e

em toda a Itália. (Hurlbut, 2002). Eusébio fala como procedeu Domiciano tanto a

respeito dos Romanos como aos Cristãos:

Domiciano deu provas de uma grande crueldade para com muitos, dando

morte sem julgamento razoável a não pequeno número de patrícios e de

homens ilustres, e castigando com o desterro fora das fronteiras e confisco

de bens a outras inúmeras personalidades sem causa alguma. Terminou

por constituir a si mesmo sucessor de Nero na animosidade e guerra contra

Deus. Efetivamente ele foi o segundo a promover a perseguição contra nós,

apesar de que seu pai Vespasiano nada de mal planejou contra nós. .

(História Eclesiástica III. XVII, 1)

Toda sorte de maldades eram validas na busca de eliminar estes homens e

mulheres, a incompreensão por parte dos romanos, e as acusações do populacho

só faziam aumentar a desconfiança imperial contra os servos do Cristo, até de

ateísmo estes foram acusados, sua fé subjetiva e desvinculada a imagens e

estatuas, diferiam dos templos pagãos, e toda desgraça que sobrevinha, seja, fome,

peste, tempestade etc. Culpa era daqueles que não se dobravam em adoração aos

deuses ou seja acontecia a quebra da pax deorum “paz dos deus” . Silva citando

CROIX reforça o argumento:

[...] as perseguições aos cristãos se baseavam na recusa deste grupo em

reconhecer os deuses de Roma, o que era visto como um comportamento

perigoso e sedicioso. Afinal, os deuses tradicionais do panteão greco-

romano eram as divindades principais da religião pública de Roma, que se

não fossem cultuadas, mesmo que por apenas uma parcela da população,

poderiam se enraivecer devido à quebra da pax deorum, a “paz dos deuses”

(Ste. CROIX, 1963: 24).

Quando começa a terceira onda de perseguição Trajano é o imperador, deste

período e bem conhecida a Carta de Plínio II ao imperador onde relata como eram

mortos e as mazelas que sofriam os Cristãos.

Entretanto, eis o procedimento que adotei nos casos que me foram

submetidos sob acusação de cristianismo. Aos incriminados pergunto se

são cristãos. Na afirmativa, repito a pergunta segunda e terceira vez,

ameaçando condená-los à pena capital. Se persistirem, condeno-os à

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morte. Não duvido que, seja qual for o crime que confessem, sua pertinácia

e obstinação inflexíveis devem ser punidas. Alguns apresentam indícios de

loucura; tratando-se de cidadãos romanos, separo-os para enviá-los a

Roma. [...] Em determinados dias, costumavam comer antes da alvorada e

rezar responsivamente hinos a Cristo, como a um deus; obrigavam-se por

juramento não a algum crime, mas à abstenção de roubos, rapinas,

adultérios, perjúrios e sonegação de depósitos reclamados pelos donos.

Concluído este rito, costumavam distribuir e comer seu alimento. Este, aliás,

era um alimento comum e inofensivo. 

Outro perseguidor o imperador Marco Aurélio (161 a 180 d. C) filho de Antonino Pio,

trata com rigidez a causa cristã, aqueles que professassem fé no Cristo sofria

duramente, há relatos que Marco Aurélio mandava “decapitar e lançar as feras”, vale

ressaltar o martírio de Policarpo de Esmirna. Nesta perseguição padeceram os

conhecidos mártires de Lyon e Vienne (FOXE, 2003, p. 31)

Desde o reinado de Trajano ao de Antonino Pio (98-161), o Cristianismo não

era reconhecido, mas também não foi perseguido de modo severo. Sob o

governo dos quatro imperadores Nerva, Trajano, Adriano e Antonino Pio (os

quais, com Marco Aurélio, foram conhecidos como os "cinco bons

imperadores"), nenhum cristão podia ser preso sem culpa definida e

comprovada. O espírito da época inclinava-se a ignorar a religião cristã.

Contudo, quando se formulavam acusações e os cristãos se recusavam a

retratar-se, os governantes eram obrigados, contra a própria vontade, a pôr

em vigor a lei e ordenar a execução. (HURLBUT, 2007, p. 62)

É notório que durante os dois primeiros séculos da era cristã as perseguições

ocorriam de forma isoladas e em curtos períodos, não havia uma política Imperial

concernente a perseguição Cristã, a questão política ganha força a partir do século

III com a estruturação culto ao Imperador, o que demonstrava lealdade ao império, o

cristão agora tem que decidir quem deveria ser o seu senhor.

Obviamente estes não queimam incenso a Cesar, nem lhe oferecem culto, não o

bastante estes já estavam sob observação, devido a forma como se reunião (nas

catacumbas) o que gerava certa desconfiança, e diferente dos Judeus grupo com o

qual se identificavam nos primeiros anos ( chegando a ser considerados apenas

uma seita dentro do judaísmo) os cristãos participavam de uma religião de

conversão, o que realizavam com grande sucesso, logo, temos uma formação de um

cenário desfavorável a igreja do Cristo; claramente diziam já possuir um Rei (Jesus),

pertencerem a um Reino ( O corpo de Cristo), defenderem a idéia da igualdade entre

os homens, idéia contraria à mentalidade pagã que possui um visão aristocrática, ou

seja, sua presença e vivencia segundo o populacho quebravam a pax deorum, e sua

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cosmo visão quebravam pax Romana fazendo deste grupo religioso um religio

ilícita.

Nos aproximadamente 250 anos que separam a perseguição posta em

prática pelo imperador Nero (54-68), no ano 64, e o “Edito de Galério”, do

ano 311, o Cristianismo era considerado uma religião ilícita e suspeita, cujos

membros estavam sujeitos ao aprisionamento, à condenação e à pena

capital. (SILVA)

Como já foi dito os primeiros focos de perseguição vieram por parte dos Judeus, os

que eram tidos em baixa estima começaram a incomodar “homens sem letras e

indoutos” Atos 4:13, havia as expectativas judaicas sobre a vinda de um messias,

de fato variadas, dentre essas havia a perspectiva de um Messias Libertador-

Restaurador que restabelecesse o trono de Davi e Libertasse o povo do Império

Romano e nesta perspectiva que Jesus como Messias torna-se um obstáculo na

propagação do Evangelho do lado Judaico, uma vez que, seus seguidores

afirmavam ser ele Senhor ou seja o Cristo (palavra grega para Messias), o que

causava grande escândalo do lado Judaico, ele foi um carpinteiro, iniciou seu

ministério pela galileia – território estigmatizado pelo judaísmo – “Terra de pessoas

impuras e pecadoras é a terra onde Jesus começa seu ministério messiânico, pois,

afinal de contas, ele não veio para chamar justos, mas pecadores (Mc 2,17)”

(Zabatiero, 2013), um Rabino não ordena que por vezes entrava em conflito com o

sacerdócio oficial, que afirma que seu Reino não era deste mundo, e por fim morre

como um maldito “não deixem o corpo no madeiro durante a noite. Enterrem-no

naquele mesmo dia, porque qualquer que for pendurado num madeiro está

debaixo da maldição de Deus. Não contaminem a terra que o Senhor, o seu Deus,

lhes dá por herança” Deuteronômio 21:23.

Além disso, afirmavam no só que Jesus era o Messias, Diziam ser Jesus, Senhor

(Kyrios) que na septuaginta é traduzido do termo hebraico Adonai, assim afirmavam

jesus ser o próprio Deus.

Não o bastante, a eclesiologia cristã descentralizava a experiência religiosa do

templo, agora pensem no que representava o templo para os Judeus, era o centro

da vida religiosa, onde eram oferecidos os sacrifícios e o povo alcançava graça e

purificação ante Javé, havia ali o Santos dos santos lugar da presença viva de seu

Deus (Javé), agora homens com Estevão afirmam que Deus não habita em templos

feitos por mãos humanas "Todavia, o Altíssimo não habita em casas feitas por

homens. Como diz o profeta” Atos 7:48, Paulo a frente fará a mesma afirmação “O

Deus que fez o mundo e tudo o que nele há é o Senhor do céu e da terra, e não

habita em santuários feitos por mãos humanas” Atos 17:24. Assim o templo era

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pequeno demais para ser morada de Deus. Afinal é ele o Aquele que enche céu e

terra “Poderá alguém esconder-se sem que eu o veja? ", pergunta o Senhor. "Não

sou eu aquele que enche os céus e a terra? ", pergunta o Senhor” Jeremias 23:24.

(GREEN, 1984).

4. RELIGIO X SUPERSTITIO

Havia entre os Romanos a distinção entre Religio e Superstitio, Religio seria a

“religião oficial romana; era o vínculo formal entre as pessoas e os deuses” como

afirma Michael Green, Religio seria uma crença mais ampla de cunho nacional,

sendo vistas como emotivas, que ofereciam perspectivas para os menos favorecidos

cujas necessidades não eram satisfeitas “pela dialética do Filósofos” o culto a

Cibele a grande mãe da Ásia Menor, Dionísio da Grécia são exemplos de Superstitio

e nesta categoria enquadrava-se o Judaísmo e o Cristianismo, a religião pagã oficial

era muito mais ritualística e sincrética, muitos descriam no pacto com os deus mas

acreditavam haver a necessidade da manutenção da adoração aos deus que eram

os fornecedores da proteção estatal enquanto ao monarca caberia a

responsabilidade pelos sacrifícios e adoração, parece incoerente a manutenção de

um acordo do qual não se há uma genuína crença, porém não era para o para o

mundo antigo.

As superstitiones não eram proibidas por Roma desde que não fossem ou

produzissem comportamento criminoso e antissocial, Tibério chegou a decretar a

prática de magia negra como crime, logo com a perseguição desencadeada por

Nero em 64 d. c, na qual os cristãos foram acusados de incendiários, criminosos e

antissociais, fazer parte da “Superstitio cristã” era estar ariscando a própria vida e

como diz Green seria “namorar o martírio”.

Além dos fatores citados acima pesavam contra os cristãos acusações variadas a

primeira delas era a de ateísmo, os cristãos eram tidos como ateus, sim, pode

parecer estranho ao um ocidental atual, mas neste contexto sociocultural adorar a

uma divindade, logo o associava a um templo, uma imagem, um ritual, porém os

cristãos, têm uma fé subjetiva, assim como os judeus eram tidos como ateus por

não prestarem culto aos deuses oficiais e por seu Deus não possuir nenhuma

representação material, isso gerava sérios problemas, pois o cristianismo como uma

Superstitio de conversão traria graves problemas a estabilidade do império,

imaginem se gente de todo o império passasse a negar os deus , publicamente, os

provedores da estabilidade o caos se estabeleceria, haveria a quebra da pax

deorum (paz dos deuses). Incesto outra acusação que pesava contra cristãos o

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populacho dizia que os seguidores de Jesus chamavam-se de irmãos, contudo

casavam-se entre si, o nome dado ao culto cristão “reunião ágape” reunião do amor

também era motivos para desconfianças, além desses fatores há ainda acusações

de canibalismo, isto mesmo, nas reuniões do ágape, comia-se a carne e bebia-se o

sangue, assim seriam as ceias cristãs.

A carta a Diogneto (120 d. C.) um dos primeiros documentos que fala a respeito da

vivência da comuna primitiva é uma resposta a um de um cristão anônimo a um

pagão culto, desejoso por conhecer melhor a nova fé cristão. Segue trecho abaixo,

com grifo nos tópicos relevantes às perseguições sofridas por esses homens e

mulheres seguidores do Cristo:

1. Os cristãos não se distinguem dos demais homens, nem pela terra, nem pela

língua, nem pelos costumes. Nem, em parte alguma, habitam cidades peculiares,

nem usam alguma língua distinta, nem vivem uma vida de natureza singular.

2. Nem uma doutrina desta natureza deve a sua descoberta à invenção ou

conjectura de homens de espírito irrequieto, nem defendem, como alguns, uma

doutrina humana.

3. Habitando cidades Gregas e Bárbaras, conforme coube em sorte a cada um, e

seguindo os usos e costumes das regiões, no vestuário, no regime alimentar e no

resto da vida, revelam unanimemente uma maravilhosa e paradoxal constituição no

seu regime de vida político-social.

4. Habitam pátrias próprias, mas como peregrinos: participam de tudo, como

cidadãos, e tudo sofrem como estrangeiros. Toda a terra estrangeira é para eles

uma pátria e toda a pátria uma terra estrangeira.

5. Casam como todos e geram filhos, mas não abandonam à violência os recém-

nascidos. Servem-se da mesma mesa, mas não do mesmo leito.

6. Encontram-se na carne, mas não vivem segundo a carne.

7.Moram na terra e são regidos pelo céu.

8.Obedecem às leis estabelecidas e superam as leis com as próprias vidas.

9. Amam todos e por todos são perseguidos.

10.Não são reconhecidos, mas são condenados à morte;

11. são condenados à morte e ganham a vida.

12. São pobres, mas enriquecem muita gente;

13.de tudo carecem, mas em tudo abundam.

14.São desonrados, e nas desonras são glorificados;

15.injuriados, são também justificados.

16.Insultados, bendizem;

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17.ultrajados, prestam as devidas honras.

18. Fazendo o bem, são punidos como maus; fustigados, alegram-se, como se

recebessem a vida.

19. São hostilizados pelos Judeus como estrangeiros; são perseguidos pelos

Gregos, e os que os odeiam não sabem dizer a causa do ódio.

20. Numa palavra, o que a alma é no corpo, isso são os cristãos no mundo.

21. A alma está em todos os membros do corpo e os cristãos em todas as cidades

do mundo.

22. A alma habita no corpo, não é, contudo, do corpo; também os cristãos, se

habitam no mundo, não são do mundo.

23. A alma invisível vela no corpo visível; Também os cristãos sabe-se que estão

neste mundo, mas a sua religião permanece invisível.

24. A carne odeia a alma, e, apesar de não a ter ofendido em nada, faz-lhe guerra,

só porque se lhe opõe a que se entregue aos prazeres

25. da mesma forma, o mundo odeia os cristãos que não lhe fazem nenhum

mal, porque se opõem aos seus prazeres.

26. A alma ama a carne, que a odeia, e os seus membros; Também os cristãos

amam os que os odeiam.

27. A alma está encerrada no corpo, é todavia ela que sustém o corpo;

28. Também os cristãos se encontram retidos no mundo como em cárcere, mas são

eles que sustêm o mundo.

29. A alma imortal habita numa tenda mortal; Também os cristãos habitam em

tendas mortais, esperando a incorrupção nos céus.

30. Provada pela fome e pela sede, a alma vai-se melhorando; também os

cristãos, fustigados dia-a-dia, mais se vão multiplicando. Deus pô-los numa tal

situação, que lhes não é permitido evadir-se.

É neste contexto que desenvolve-se o Cristianismo, inicia-se na palestina,

desenvolve-se, foi perseguido, porém manteve-se vivo, como se diz na celebre frase

de Tertuliano “O sangue dos mártires é a semente da Igreja” houveram fatores que

favoreceram como salienta Paulo ao dizer que Jesus nasceu “à plenitude dos

tempos” (Gl. 4:4-5) numa conjuntura Geopolítica que favorece a propagação do

Querygma, contundo muitos outros foram contrários, desde os próprios divulgadores

“homens sem letras e indoutos” Atos 4:13, o tema da mensagem (Jesus), sua

cosmo visão (igualitária, contrária à pagã), acusações do populacho (canibalismo,

incesto, imoralidades, nas reuniões do Ágape) etc. Desde Nero (54 a 68 d. C.)

quando os Cristão são acusados pelo incêndio que destrói boa parte de Roma até o

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Imperador Diocleciano (305 a 310), que promoveu a mais dura e sistemática

perseguição contra os cristão, mandando inclusive por meio de um Edito que todos

os exemplares da Bíblia fossem queimados, os cristãos passaram por várias

dificuldades, mas com o Edito de Galério em 311 o Cristianismo passa a ser

tolerado, dois anos depois em 313 Constantino através do Edito de Milão oficializa o

Cristianismo “Por essa lei o Cristianismo foi oficializado, sua adoração tornou-se

legal e cessou a perseguição, para não mais voltar, enquanto durou o Império

Romano.” Finalmente, no ano 380 d.C. o Cristianismo torna-se a religião oficial do

Império Romano, em pouco mais de três séculos o “obscuro e marginal movimento

de Jesus” como afirma Stark sai de seita dentro do Judaísmo a Religião oficial de

todo império Romano e a maior religião do planeta atualmente com mais de bilhões

de seguidores em todo mundo.

REFERENCIAS

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Ed. Rio de Janeiro, CPAD, 2008.

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http:www.bibliaonline.com.br, Acesso em 17 de Junho de 2014. (Todas as citações

bíblicas foram retidas deste site)