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PLANIFICAÇÃO CURRICULAR: REFLEXÃO SOBRE OS INDICADORES DE QUALIDADE DAS PLANIFICAÇÕES CURRICULARES Alexandra Oliveira; Cristina Couto Varela; Helena Tavares; Maria do Céu; Susana Tenreiro & Teresa Mendes Agrupamento de Escolasde Valbom [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected] & [email protected] RESUMO: A necessidade de prestar um serviço público que garanta a aquisição e distribuição equitativa de um “bem comum educativo”, para todas as crianças e jovens, levou o Agrupamento de Escolas de Valbom (AEV) a contratualizar com o Ministério da Educação (ME) um programa de combate ao abandono e melhoria dos resultados escolares, no âmbito do Programa TEIP3. Neste trabalho apresenta-se uma reflexão sobre os indicadores de qualidade presentes nas planificações curriculares para que a escola possa efetivamente prestar um serviço educativo de acordo com princípios fundadores da Escola Pública. 1. Visão de escola/ Currículo/ Professor e Avaliação A escola é uma “organização educativa complexa” em que subsistem duas lógicas paradoxais “Qualidade e a Excelência” e a “Inclusão e Equidade” (Afonso, 2010; Estevão, 2012; Formosinho & Machado, 2008; Sá, 2009). Estas lógicas configuram vários espaços posicionais nas políticas de ensino, concretamente ao nível da organização e gestão escolar, tal como: visão de escola, currículo, papel do professor e da avaliação. No âmbito do TEIP3 a justificação política e a realidade organizacional do agrupamento apontam para a sua compreensão predominantemente como: “escola cidadã”,

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A necessidade de prestar um serviço público que garanta a aquisição e distribuição equitativa de um “bem comum educativo”, para todas as crianças e jovens, levou o Agrupamento de Escolas de Valbom (AEV) a contratualizar com o Ministério da Educação (ME) um programa de combate ao abandono e melhoria dos resultados escolares, no âmbito do Programa TEIP3. Neste trabalho apresenta-se uma reflexão sobre os indicadores de qualidade presentes nas planificações curriculares para que a escola possa efetivamente prestar um serviço educativo de acordo com princípios fundadores da Escola Pública.

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PLANIFICAÇÃO CURRICULAR: REFLEXÃO SOBRE OS INDICADORES DE QUALIDADE DAS PLANIFICAÇÕES CURRICULARES

Alexandra Oliveira; Cristina Couto Varela; Helena Tavares; Maria do Céu; Susana Tenreiro & Teresa Mendes

Agrupamento de Escolasde Valbom

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected] & [email protected]

RESUMO: A necessidade de prestar um serviço público que garanta a aquisição e distribuição equitativa de um “bem comum educativo”, para todas as crianças e jovens, levou o Agrupamento de Escolas de Valbom (AEV) a contratualizar com o Ministério da Educação (ME) um programa de combate ao abandono e melhoria dos resultados escolares, no âmbito do Programa TEIP3.Neste trabalho apresenta-se uma reflexão sobre os indicadores de qualidade presentes nas planificações curriculares para que a escola possa efetivamente prestar um serviço educativo de acordo com princípios fundadores da Escola Pública.

1. Visão de escola/ Currículo/ Professor e Avaliação

A escola é uma “organização educativa complexa” em que subsistem duas lógicas

paradoxais “Qualidade e a Excelência” e a “Inclusão e Equidade” (Afonso, 2010;

Estevão, 2012; Formosinho & Machado, 2008; Sá, 2009). Estas lógicas configuram

vários espaços posicionais nas políticas de ensino, concretamente ao nível da

organização e gestão escolar, tal como: visão de escola, currículo, papel do professor e

da avaliação.

No âmbito do TEIP3 a justificação política e a realidade organizacional do

agrupamento apontam para a sua compreensão predominantemente como: “escola

cidadã”, regulada pelo imperativo da solidariedade, do interesse geral e da cidadania; e

“comunidade educativa”, regida pelo imperativo do amor à criança, da confiança e da

proximidade; e não como: “empresa educativa”, pela invocação da eficácia; ou “escola

S.A./ McEscola”, em nome do imperativo da concorrência; ou “organização polifónica”

(Quadro 1).

O TEIP3 não aceita, com passividade, que alguns grupos de alunos tenham a sua

autoestima e a sua autoconfiança por vezes gravemente afetadas pelo insucesso por

serem reconhecidos como sendo alunos mais fracos e mais problemáticos. Assim,

preconiza uma política educativa orientada para “o bem-estar coletivo” numa conceção

de escola cidadã em que a realidade se apresenta preferencialmente pela lógica do

mundo cívico pela promoção de igualdades e das vertentes democrático-participativas

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e/ou numa conceção de escola como comunidade educativa em que a realidade se

assemelha mais à lógica do mundo doméstico pela maior proximidade relacional dos

atores escolares e por uma pedagogia personalizada (Quadro 1).

Esta conceção de escola só é compatível com a centralização curricular dos

conteúdos nos alunos, o que leva à valorização de atitudes, valores, destrezas sociais,

hábitos de trabalho, e não somente à promoção de competências cognitivas.

Daí que se reclame de igual modo um novo perfil para o professor: não o de

profissionalidade restrita, circunscrito ao âmbito da matéria e da especialidade em que

insere, mas de uma profissionalidade ampla, buscando a colaboração com os

professores e realizando a orientação do aluno, ajudando-o na sua inserção social e

desenvolvimento pessoal (Quadro 1). Assim, no processo de ensino e de aprendizagem

deverão ser desenvolvidas competências cognitivas, mas será também muito valorizado

o desenvolvimento de competências transversais a nível atitudinal, procedimental e

social.

Nesta conformidade, a avaliação não será centrada numa lógica mercantil, num

paradigma de educação contábil que privilegia as competências científicas com um

conceito de avaliação normativa, burocrática, instrumental, com função de medida e de

controlo e consequentemente promotora de punições e recompensas (meritocrática),

mas sim numa lógica de comunidade educativa num paradigma democrático que

privilegia as competências sociais com um conceito de avaliação formativa, através de

reflexões e juízos de valor (Quadro 1).

Quadro 1 - Visão de escola/ Currículo/ Professor e Avaliação

Conceções (imagens) de escola (adaptado de Estevão, 2012)

Conceção de currículo segundo Pacheco (2012)

Papel do professore papel da Avaliação

Empresa educativaMundo industrial: rendimento e racionalização da gestão.

Científico, técnico.

Gestor profissional do currículo.Avaliação sumativa: objetiva, criterial, descritiva.

Escola cidadãMundo cívico, promoção de igualdade e das vertentes democrático-participativas

CríticoConstrutor do currículo. Avaliação formativa: normativa.

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Escola SA/ McEscolaMundo mercantil: concorrência, competitividade e satisfação dos clientes.

NormalizadoExecutor do currículo.Avaliação estandardizada:externa.

Comunidade educativa Mundo doméstico: maior proximidade relacional dos atores escolares.

Flexível e diferenciado

Construtor do currículo com base nos alunos.Avaliação formativa: juízo de valor

Escola PolifónicaMundo mundial ou transnacional, imposição do local.

Transnacional

Executor de macrodecisões.Avaliação transnacional: ex. PISA.

Deste modo, assumimos que a escola é para se aprender a

conhecer, a fazer, a ser e a viver com os outros (Unesco -

Educação para o séc. XXI, 2003).

2. Reflexão sobre os vários elementos/ variáveis que fazem parte do processo

de gestão curricular: articulação curricular vertical; contextualização do currículo e

abertura ao meio; adequação do ensino às capacidades e aos ritmos de aprendizagem

dos alunos; exigência e incentivo à melhoria de desempenhos

O Decreto-Lei n.º 139/20121, de 5 de julho, no seu artigo 2.º, refere que em

conformidade com o constante na Lei de Bases do Sistema Educativo para estes níveis

de ensino, entende-se por currículo o conjunto de conteúdos e objetivos que,

devidamente articulados, constituem a base da organização do ensino e da avaliação do

desempenho dos alunos, assim como outros princípios orientadores que venham a ser

aprovados com o mesmo objetivo.

Esta lógica normativa, reflete-se nas escolas através de um ritual de cumprimento de

macrodecisões que regulam o lado mais substantivo do currículo, isto é, o modo como

está organizado (forma), quais os conhecimentos ensinados (conteúdos) e como deve ser

controlado (avaliação).

1 Diploma que estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão dos currículos dos ensinos básico e secundário, da avaliação dos conhecimentos a adquirir e das capacidades a desenvolver pelos alunos e do processo de desenvolvimento do currículo dos ensinos básico e secundário.

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Assim, perconizamos como indicadores de qualidade das planificações curriculares

de departamento/ grupo disciplinar:

ao nível dos conteúdos

Propor domínios e subdomínios preconizados nas metas curriculares;

Definir conteúdos estruturantes a nível de ano/ciclo;

ao nível das competências/objetivos

Propor objetivos gerais e descritores/objetivos específicos preconizados nas

metas curriculares;

Definir objetivos gerais estruturantes a nível de ano/ciclo;

ao nível das estratégias/atividades

Diversidade e adequação de estratégias centradas no aluno;

Proporcionar uma variedade de atividades práticas (ativas para o aluno);

Proporcionar estratégias/atividades que promovam a contextualização do

currículo e a abertura ao meio;

Propor estratégias/atividades que promovam a articulação vertical;

ao nível dos recursos utilizados

Diversidade e adequação de recursos;

Disponibiliza recursos que promovam a contextualização do currículo e a

abertura ao meio;

ao nível dos critérios de avaliação (com base nos critérios definidos no CP do

Agrupamento)

Diversidade e adequação de instrumentos de recolha de dados;

Propor critérios de avaliação que promovam a articulação vertical;

ao nível da indicação da distribuição dos tempos necessários para as

aprendizagens

Adequação dos tempos (número de aulas) aos subdomínios;

ao nível da distribuição da carga horária semanal

Propor distribuição.

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3. Reflexão sobre os vários elementos/variáveis que fazem parte do processo

de gestão curricular: adequação das orientações curriculares aos contextos

específicos da turma; seleção e sequencialização de conteúdos por áreas curriculares

disciplinares e não disciplinares; articulação e integração curricular horizontal.

A flexibilidade na gestão do currículo vai da simples adaptação dos programas aos

contextos locais até à diferenciação curricular, no sentido de dar respostas diversificadas

às diferentes populações escolares.

O Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, no seu artigo 2.º refere ainda que as

estratégias de concretização e desenvolvimento do currículo são objeto de planos de

atividades, integrados no respetivo projeto educativo, adaptados às características das

turmas, através de programas próprios, a desenvolver pelos professores titulares de

turma, em articulação com o conselho de docentes, ou pelo conselho de turma,

consoante os ciclos.

Assim, entendendo o curriculo como o que é aprendido e ensinado (organização

curricular, conteúdos e objetivos), como é oferecido (metodos de ensino e de

aprendizagem), como é avaliado (critérios e instrumentos de avaliação) e os recursos

utilizados, podemos gerir esta margem de autonomia ao nível da turma e da sala de

aula, consubstanciada no Plano de turma onde podem ser concertadas estratégias

metodológicas, critérios e instrumentos de avaliação e recursos utilizados adaptados à

turma. O Plano de turma parece essencial para concertar também as competências

transversais a nível atitudinal, procedimental e social a desenvolver nos alunos da turma

e mesmo estratégias transversais de motivação e envolvimento dos alunos na escola

concretizadas em atividades integradoras de caráter formal e informal.

Neste contexto, merece especial destaque o papel do diretor de turma como

coordenador do Plano de turma e como líder de gestão intermédia e do trabalho docente

(Roldão, 2008; Sá, 1997).

A flexibilização do currículo numa gestão inovadora ao nível organizacional dos

apoios educativos (assessorias pedagógicas) e a diferenciação e articulação horizontal

do mesmo ao nível do Plano de turma permite à escola a intervenção necessária para dar

as respostas às especificidades dos seus alunos, adequando a ação ao contexto que

envolve a mesma escola.

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Assim, perconizamos como indicadores de qualidade da planificação curriculares de

turma/Plano de turma:

ao nível dos conteúdos

Referência aos domínios e subdomínios passíveis de articulação disciplinar;

Referência a conteúdos de nível transversal (Exemplo: Educação para a

Saúde; Educação para a Cidadania…);

ao nível das competências/objetivos

Referência a descritores/objetivos específicos essenciais/de desenvolvimento

de nível cognitivo, de acordo com a turma;

Referência a competências/objetivos de nível atitudinal e procedimental de

acordo com a turma;

ao nível das estratégias/ atividades

Articulação e adequação de estratégias (mais ativas/passivas para o aluno à

turma);

Referência a atividades integradoras interdisciplinares formais e/ou

informais;

ao nível dos recursos utilizados

Articulação e adequação de recursos;

ao nível dos critérios de avaliação

Articulação, diversidade e adequação de instrumentos de recolha de dados;

Articulação de critérios específicos de avaliação.

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Sá, Virginio (1997). Racionalidades e Práticas na Gestão Pedagógica: O Caso do Diretor de Turma. Portugal: Instituto de Inovação Educacional.  Acesso em de http://area.dgidc.min-edu.pt/inovbasic/biblioteca/cce16/cce16.pdf

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