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PLATÃO & KANT O cão é um verdadeiro filósofo, o jornalista deveria sê-lo Por Iracema Torquato em 08/11/2011 na edição 667 O presente estudo tem como objetivo refletir como Platão coloca as questões sobre o conceito de Justiça, a formação de um Estado ideal e o conceito sobre arte – em A República, Diálogos III (1996) – e como se distancia de Kant sobre o papel do artista como gênio. Como procedimento metodológico, partiremos, em primeiro lugar, da leitura das obras: Diálogos III, A República; Kant, Os Pensadores (1999); Espírito e Imaginação, Benedito Nunes; Analítica do Belo, (In: Crítica do Juízo, parágrafos, 1-22); Platão, As artimanhas do fingimento, Ferraz (1999) [cf: Diálogos III, A República; Trad. Leonel Vallandro, 23 ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996; KANT, Os Pensadores, São Paulo, Nova Cultural, 1999, p. 31 - 139; Analítica do Belo, (In: Crítica do Juízo, parágrafos 1 – 22). Trad. de Rubens Rodrigues Torres Filho; Filosofia da Arte; Espírito e Imaginação, (In: Introdução à Filosofia da Arte, Benedito Nunes, capítulo 6, p. 46 -53. FERRAZ, Maria Cristina F. Platão, As Artimanhas do Fingimento. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999]. Num segundo momento, faremos o recorte dos diálogos que se referem ao nosso propósito: a justiça realizada pelo banimento dos poetas da República, o não aceite do gênio Homero e dos poetas, essa visão política vai nos distanciar das teorias de Kant sobre a arte e o gênio. Depois da leitura e delimitação do corpus, passaremos a análise dos textos e a aplicação da teoria kantiana sobre o estudo da Filosofia da Arte. O problema relevante dos Diálogos III é a Justiça, não a Arte, mas seria justo ao entendimento dos leitores do nosso século o que nos diz Platão sobre a última? Os que Kant responderia se pudessem dialogar? Sabemos que esse simulacro é inverossímil e não é a nossa intenção promover essa hiper- realidade, mas somente analisar o que nos ensinam esses dois filósofos e as suas concepções sobre o Conhecimento da Justiça e das Artes. A inteligência e o saber Partindo do tema Justiça, Platão nos insere na estrutura de um Estado que, segundo ele, seria o ideal de uma república grega. Nos diálogos, busca soluções para os problemas políticos de uma república, sempre ironizando os interlocutores. Por meio de seguidas arguições, Platão constrói uma narrativa em que os argumentos apresentados pelos interlocutores vão sendo postos à prova para serem habilmente destruídos. Assim, Platão se instaura como juiz imparcial, embora essa pretensa imparcialidade seja apenas superficialmente estabelecida, não resistindo a uma análise discursiva em profundidade na qual percebemos as manipulações por intimidação utilizadas. Platão percebe as inseguranças dos oponentes e se aproveita delas. Embora, como veremos a seguir, pareça querer ajudar os interlocutores a descobrirem a verdade, esta é sempre alcançada com a sanção negativa do discurso do oponente, que fatalmente acaba convencido da sabedoria socrática. À que Platão aspira? Ao conceito de Justiça e à formação de um Estado ideal. Os chefes da república ideal precisam de uma educação especial que atenda aos fins políticos platônicos: o bem-estar de todos depende que o Estado seja soberano e que tudo se faça, na república, em nome da comunidade, em que o querer e o saber individuais não têm lugar. Na Callipolis (Cidade Bela) as formas de eugenia serão incentivadas, assim evitando-se casamentos entre as pessoas desiguais e a família não deverá se incumbir da educação das crianças. Aos jovens será concedida uma educação, segundo suas potencialidades, mas é necessário que cada um adira apenas as suas habilidades de modo que a mobilização social, de uma classe a outra, seja reprimida. Em outras palavras, cada um deverá estar atento a uma “técnica de fabricação” (ou thechnai). Por exemplo, um guardião será preparado só para uma techne e necessariamente será feliz com essa condição, porque é dela que dependerá a segurança da pólis e nada poderá perturbar a ordem e a Justiça que serão, então, consequências naturais dos fenômenos políticos adotados adequadamente. Platão, desse modo, propõe um modelo aristocrático de poder. A República não comportaria uma aristocracia baseada na riqueza, mas o poder é confiado aos melhores em relação à inteligência e o saber de cada cidadão, ou seja, uma forma de sofocracia. DIRETÓRIO ACADÊMICO Recomendar 5 pessoas recomendaram isso. Seja o primeiro entre seus amigos. Tweet 0 Curtir 5 0 O CRESCIMENTO DA VIOLÊNCIA 05-11-2013 M USEU DA IM PRENSA 05-11-2013 PROGRAMA 2187 >>O brasileiro desconfiado >>Ainda as diferenças sociais 06/11/2013 PROGRAMA 2186 >>A fraternidade da violência >>Massa e rebanho 05/11/2013 PROGRAMA 2185 >>A polícia sem controle >>Racismo e violência 04/11/2013 PROGRAMA 2184 >>Lustrando os cassetetes >>A tribo dos nem-nem 01/11/2013 TODOS PROGRAM AS

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Quinta-feira, 07 de Novembro de 2013 | ISSN 1519-7670 - Ano 17 - nº 771

PLATÃO & KANT

O cão é um verdadeiro filósofo, o jornalistadeveria sê-loPor Iracema Torquato em 08/11/2011 na edição 667

O presente estudo tem como objetivo refletir como Platão coloca as questões sobre o conceito de Justiça,

a formação de um Estado ideal e o conceito sobre arte – em A República, Diálogos III (1996) – e como se

distancia de Kant sobre o papel do artista como gênio. Como procedimento metodológico, partiremos, em

primeiro lugar, da leitura das obras: Diálogos III, A República; Kant, Os Pensadores (1999); Espírito e

Imaginação, Benedito Nunes; Analítica do Belo, (In: Crítica do Juízo, parágrafos, 1-22); Platão, As

artimanhas do fingimento, Ferraz (1999) [cf: Diálogos III, A República; Trad. Leonel Vallandro, 23 ed. Rio de

Janeiro: Ediouro, 1996; KANT, Os Pensadores, São Paulo, Nova Cultural, 1999, p. 31 - 139; Analítica do Belo,

(In: Crítica do Juízo, parágrafos 1 – 22). Trad. de Rubens Rodrigues Torres Filho; Filosofia da Arte; Espírito e

Imaginação, (In: Introdução à Filosofia da Arte, Benedito Nunes, capítulo 6, p. 46 -53. FERRAZ, Maria Cristina

F. Platão, As Artimanhas do Fingimento. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999]. Num segundo momento,

faremos o recorte dos diálogos que se referem ao nosso propósito: a justiça realizada pelo banimento dos

poetas da República, o não aceite do gênio Homero e dos poetas, essa visão política vai nos distanciar das

teorias de Kant sobre a arte e o gênio. Depois da leitura e delimitação do corpus, passaremos a análise

dos textos e a aplicação da teoria kantiana sobre o estudo da Filosofia da Arte.

O problema relevante dos Diálogos III é a Justiça, não a Arte, mas seria justo ao entendimento dos

leitores do nosso século o que nos diz Platão sobre a última? Os que Kant responderia se pudessem

dialogar? Sabemos que esse simulacro é inverossímil e não é a nossa intenção promover essa hiper-

realidade, mas somente analisar o que nos ensinam esses dois filósofos e as suas concepções sobre o

Conhecimento da Justiça e das Artes.

A inteligência e o saber

Partindo do tema Justiça, Platão nos insere na estrutura de um Estado que, segundo ele, seria o ideal de

uma república grega. Nos diálogos, busca soluções para os problemas políticos de uma república, sempre

ironizando os interlocutores. Por meio de seguidas arguições, Platão constrói uma narrativa em que os

argumentos apresentados pelos interlocutores vão sendo postos à prova para serem habilmente

destruídos. Assim, Platão se instaura como juiz imparcial, embora essa pretensa imparcialidade seja

apenas superficialmente estabelecida, não resistindo a uma análise discursiva em profundidade na qual

percebemos as manipulações por intimidação utilizadas. Platão percebe as inseguranças dos oponentes e

se aproveita delas. Embora, como veremos a seguir, pareça querer ajudar os interlocutores a descobrirem

a verdade, esta é sempre alcançada com a sanção negativa do discurso do oponente, que fatalmente

acaba convencido da sabedoria socrática.

À que Platão aspira? Ao conceito de Justiça e à formação de um Estado ideal. Os chefes da república ideal

precisam de uma educação especial que atenda aos fins políticos platônicos: o bem-estar de todos

depende que o Estado seja soberano e que tudo se faça, na república, em nome da comunidade, em que

o querer e o saber individuais não têm lugar. Na Callipolis (Cidade Bela) as formas de eugenia serão

incentivadas, assim evitando-se casamentos entre as pessoas desiguais e a família não deverá se

incumbir da educação das crianças. Aos jovens será concedida uma educação, segundo suas

potencialidades, mas é necessário que cada um adira apenas as suas habilidades de modo que a

mobilização social, de uma classe a outra, seja reprimida. Em outras palavras, cada um deverá estar

atento a uma “técnica de fabricação” (ou thechnai). Por exemplo, um guardião será preparado só para

uma techne e necessariamente será feliz com essa condição, porque é dela que dependerá a segurança

da pólis e nada poderá perturbar a ordem e a Justiça que serão, então, consequências naturais dos

fenômenos políticos adotados adequadamente.

Platão, desse modo, propõe um modelo aristocrático de poder. A República não comportaria uma

aristocracia baseada na riqueza, mas o poder é confiado aos melhores em relação à inteligência e o saber

de cada cidadão, ou seja, uma forma de sofocracia.

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Separação difícil, mas necessária

Em relação às artes, de um modo geral, o que a primeira vista está em jogo é a mimesis, como uma cópia

imperfeita do mundo inteligível, cópia esta de terceira categoria, que vai ser colocada em xeque pela

ridicularização de Íon, (rapsodo que tentava defender a arte da declamação e da poesia). Segundo Ferraz

[cf. O poeta, como o sofista: um fingidor, op.cit, 1999, p.33]. Como se sabe o rapsodo recitava poemas sem

acompanhamento de lira, distinguindo-se do poeta épico que costumava declamar seus próprios versos.

Os rapsodos espalharem-se por todo mundo grego e já no século VI a.C., segundo Diógenes Laércio, a

cidade de Atenas conhecia as atuações desses declamadores, que iam de cidade em cidade, recitando e

explicando os poetas, principalmente Homero.

Para Platão, a educação dos guerreiros deveria estar subordinada à technai Ginástica, considerada como

uma arte como o era, por exemplo, a Construção Naval. A Música serviria para o fortalecimento do caráter,

porém nem todos os ritmos e harmonias seriam aceitos, conforme veremos adiante. Como os poetas, os

músicos também teriam que ser censurados; previamente receberiam todos os louvores dos habitantes

da república, mas, em seguida, seriam convidados a deixarem a pólis, caso não se adaptassem aos ideais

políticos platônicos.

Em a Justificação perante os poetas [in: Lire X, op. cit. p. 227], Platão expõe-nos, finalmente, a sua

fascinação pelos poetas, inclusive Homero. Embora comente que entre a Filosofia e a Poesia sempre

houve discórdia e rivalidades, inclina-se a perdoar e permitir aos poetas exilados que regressem à pólis,

dando-lhes uma segunda oportunidade, bem como aos amigos da poesia, desde que os primeiros façam a

sua defesa em versos líricos ou em outro metro qualquer; e os segundos, em prosa. Se estivessem

dispostos a tornarem suas poesias politicamente úteis à cidade seriam aceitos, porque a arte seria,

então, deleitável e útil. Porém, se persistissem em serem apenas agradáveis, seriam afastados. Declara

ainda que fosse difícil essa separação, mas necessária, tanto quanto o é a separação de dois amantes,

quando o amor se torna prejudicial, “ainda que não sem luta”.

Um péssimo exemplo

Como seriam as Artes concebidas, nesta república? Este é o tema principal que nos interessa no presente

trabalho e que passaremos a analisar; a seguir, por meio de excertos selecionados. Ao mesmo tempo,

tentaremos dialeticamente expor as concepções de Kant sobre a arte do gênio que, como veremos, não

tem lugar na república de Platão. Todos os demais temas de A República giram em torno do eixo principal,

que é a Justiça, desse modo, Arte e Justiça serão analisadas sempre com o intuito de fazer prevalecer

politicamente o interesse comunitário sobre o que é justo politicamente, segundo Platão. Em sua

república, a Arte será concebida como um instrumento político a serviço do bem- estar de todos os que

vivem na pólis. Nesse sentido, vejamos um diálogo entre Cliofonte, Trasímaco e Sócrates que está no Livro

I [ler: op.cit. p. 17 a 19].

Logo no início dos diálogos, temos referência sobre a arte da Música, aliada ao pensamento: “A justiça

não pode produzir injustiça” (no diálogo entre Trasímaco e Sócrates). E os homens, ao serem

prejudicados, não se tornarão piores no que toca à virtude humana?/ Sem dúvida./-E essa virtude

humana não é a justiça?/-Necessário é, pois, meu caro, que os homens a quem prejudicamos se tornem

injustos./-Indubitavelmente./ [...] Nem tampouco o justo com a justiça, pode tornar alguém injusto (...). E

o justo é o bom? Logo, não é obra própria do justo o causar dano a um amigo ou a qualquer outro, e sim,

do seu contrário, o injusto.

Platão considera a música como uma virtude e o artista um amigo virtuoso, ambos – música e músico-

sendo a primeira apropriada e o segundo, justo, fariam do guardiães bons cidadãos. Hoje o mesmo

deveria ser objetivo de qualquer jornalista: guardiães de bons cidadãos, maestros na arte da palavra.

Para Platão, um Juízo sobre um determinado objeto pode ser inteiramente desinteressado e “muito

interessante”. Será interessante, quando atender aos objetivos políticos da república, mas será também

desinteressado o artista que apenas procura mimeticamente sua techne, que não chegará a ser uma

technai na pólis platônica. Desse modo, na república platônica, o juízo-de-gosto Kantiano não fundaria, em

si mesmo, uma technai e, nesse sentido não seria interessante ter gosto na república, por isso os poetas

que falassem das fraquezas humanas e das dos deuses não seriam admitidos na pólis, sobretudo porque

seriam de péssimo exemplo para as crianças.

O eixo condutor

Segundo Kant, embora os juízos-de-gosto não fundam interesses político-sociais e nem artísticos (em si

mesmos), tornam-se aos homens interessantes por ser um modo de apreensão sensível que lhes causa

satisfação. Para um jornalismo atuante juízos de gosto são para poucos, já que há manuais e editores

conservadores e apegados ao sensacionalismo do momento: como por exemplo, a importância dos

doentes que são celebridades. Estes causam-nos piedades. São motivos para orações pelos seus

seguidores. E os que não são célebres, viram suítes? Raramente. Cobra-se das autoridades, que dizem,

não raro, as providências que serão tomadas. Ficamos, nós, cidadãos depois sem saber se as ditas

providências foram realmente tomadas. Falta sensibilidade ou algo como comprometimento? Sabemos

quantos quilos tais e quais celebridades perderam, mas ficamos sem saber quantos hospitais foram

equipados. Idem para as escolas públicas de educação básica.

Para melhor compreensão, tomaremos as explicações dadas no texto de Nunes [in: Introdução à Filosofia

da Arte, capítulo 6, p. 47]: “São duas as fontes do conhecimento: a sensibilidade e o entendimento”. Por

meio da primeira intuímos os objetos através das nossas percepções, que são representadas no espaço e

no tempo (formas a priori de conhecimentos), que - segundo Kant, prescindem da experiência do sujeito.

Assim, “a função do entendimento é sintetizar em conceitos as intuições da sensibilidade. Mas assim como

há formas de sentir, há também formas de pensar, pois que o entendimento é a própria faculdade de

produzir conceitos” [ idem]. Portanto, não conhecemos as coisas-em-si mesmas (numenalmente), isto é,

independentemente das formas pelas quais as representamos, ou seja, na sua essência. Conhecemos as

Reportagens, vídeos e outros conteúdos do site indicados porseus amigos na rede social.

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coisas como fenomenais, isto é, enquanto objeto das nossas representações, condicionadas pela

Sensibilidade e pelo Entendimento. Em relação ao Juízo estético, cabe aqui salientar que o entendimento

e a imaginação forneceriam as ideias e não o conceito de belo/justo, porque este, segundo Kant “é aquilo

que, sem conceitos, é representado como objeto de uma satisfação universal” [in: Analítica do Belo, p.215].

De modo geral, Kant questiona, na Crítica da Razão Pura, se é possível existir uma razão que seja pura

em si mesma, ou seja, independente de qualquer empirismo. Vem daí a razão de seu método ser

conhecido como criticismo. Assim a razão será “julgada” para se saber que tipo de conhecimento não tem

fundamento. Pretende com isso superar a dicotomia entre racionalismo e empirismo. Ensina-nos, em A

Analítica do Belo o que podemos conhecer pela sensibilidade, pelo entendimento e pela imaginação.

Ressalta que o conhecimento é constituído de matéria e forma. A primeira são as próprias coisas, são os

materiais mesmo do nosso conhecimento empírico, enquanto que as formas, que organizam as nossas

sensibilidades, são a priori, ou seja, anteriores a qualquer experiência sensível (mas condição da nossa

própria experiência). Para conhecer qualquer coisa, temos de organizá-la a partir de uma estrutura

apriorística que é a forma do espírito e organizá-la com as formas de conhecimento adquiridos, a priori

também, do tempo e do espaço. Assim, para Kant, o tempo e o espaço não existem como realidade

externa, são formas que o sujeito põe nas coisas. Percebemos pelos sentidos, mas é como se algo

escapasse pelos sentidos, isto é, as categorias de substância, de causalidade, de existência (entre

outras). Essas categorias não são dadas somente pela experiência, mas postas e relacionadas pelo

próprio sujeito.

Não há um conhecimento puro e nem uma crítica que seja pura. Qualquer novidade artística, e nesta

incluímos o jornalismo, portanto, não é um dado exterior ao qual o intelecto deve se conformar, mas, ao

contrário, o mundo dos fenômenos só existe na aparência, na forma pelo qual o apreendemos e o

representamos a nós, portanto, participamos da construção dos conhecimentos. Kant. Pela análise da

moralidade (na Crítica da Razão Prática) tenta o filósofo recuperar a metafísica, que foi destruída por ele,

enquanto agnóstico (a razão não é capaz de afirmar ou negar o conhecimento de Deus), o eixo condutor

da perspectiva moral é a Liberdade; para Platão é a Justiça. Para o jornalista, ambas.

Erro e falsidade

A moral para Kant fundamenta-se no princípio racional do Dever, esteio da ordem dos fins (que seria a

Justiça platônica): na qualidade de elemento ético, o dever prescinde do determinismo da Natureza

(instintos irascíveis, segundo Platão). Nessa ordem, Kant estabelece não o real, mas o ideal que é sempre

uma visada aos fins morais (e, esse aspecto, o aproxima de Platão, embora a moral kantiana pressuponha

liberdade para a ação) sendo esta considerada como instituidora de uma esfera superior do

entendimento, ou da liberdade, que assim concebida participaria, aí sim, da coisa-em-si e, portanto, do

espírito (das essências). Como vimos, a moral platônica é sempre uma visada política que consiste na

fabricação de técnicas (jornalismo é arte/ técnica), a nosso ver, a serviço da comunidade, sendo a Arte

apenas uma delas.

Na Crítica da Razão Pura, segundo Nunes [cf. op. cit. p.48], a realidade é concebida por Kant como natureza

(causalidade natural); na Razão Prática, como Espírito (o domínio da Liberdade). Ora, nos diria Nunes,

traduzindo Kant [partimos do pressuposto que o entendimento de Nunes corresponda ao nosso aqui

exposto, apoiados pelo método dedutivo: se. então...]: Os fenômenos e suas relações se situam no

espaço e no tempo, são tudo que podemos conhecer. Determinados uns pelos outros, eles obedecem à lei

universal de causa e efeito, que é um dos moldes mentais que o Entendimento lhes impõe, e sem o qual

não seria concebível aquilo que chamamos Natureza.

Logo, tudo que podemos conhecer segundo Kant, nos limites da experiência organizada é, tão somente, o

reino da causalidade e tendo o conhecimento como apropriado e adequado à experiência. Isto vem a ser

o reducionismo de Husserl e objeto da consciência transcendental existencialista. Segundo Chauí [ler:

Convite à Filosofia, Capítulo 3, p. 104. As comparações propostas entre Kant e Husserl por Chauí não é

objeto do presente trabalho, ficando apenas uma tentativa de elucidar tais conceitos]: “Kant usa duas

palavras gregas para referir-se à realidade: a palavra noumenon, que significa a realidade em si, racional

em si, inteligível em si”. Esta realidade para Platão, só seria possível no mundo inteligível das idéias;

nesse mundo [em que vivemos], só podemos ter cópias imperfeitas dos objetos, inclusive das artes em

geral; e a palavra phainomenon (fenômenon) que significa a realidade tal como se mostra ou se manifesta

para nossa razão ou para nossa consciência.

Para o existencialismo de Husserl é a própria consciência que se manifesta. Desse modo, conhecer os

fenômenos, conhecer a estrutura e o funcionamento da consciência é a mesma coisa. São a própria

consciência que constitui os fenômenos, dando sentido as coisas. Para Husserl, conhecer é conhecer os

sentidos ou a significação das coisas O sentido é que se constitui como a essência das coisas. Segundo

Kant, a “verdade” será o encadeamento, ou o relacionamento rigoroso das ideias e dos conceitos. Para

ambos, é no realismo que se encontram o erro e a falsidade, isto é, na suposição de que os conceitos ou

as significações se refiram a uma realidade em si, independente do sujeito do conhecimento. A esse erro

de concepção Husserl denominou de tese natural do mundo ou como atitude natural e Kant denominaram

como dogmatismo.

Música é transitória, como o jornal de cada dia

A música, então, seria bela? Sendo expressão do belo é uma virtude. Vejamos como Platão e Kant

relacionam o conhecimento da Arte e da Música. Sendo virtude, a música participaria da educação dos

guardiões da república platônica. Partiremos, agora, da própria concepção kantiana a esse respeito. Para

Kant, “é belo o que é reconhecido sem conceito, como objeto de uma satisfação universal” [esta é uma

das definições da Crítica do Juízo Estético. Cf. Nunes, Opp. cit. p. 48]. Como vimos, sendo a satisfação do

belo universal isso ocorre porque se produziria necessariamente por meio de condições pessoais

(empíricas) – variáveis de indivíduo para indivíduo – de modo a permitir o livre julgamento do

contemplador, sendo por isso uma satisfação estética, isto é, uma conquista da consciência que possibilita

a universalização do juízo de gosto [cf.: ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia, São Paulo: Mestre Jou,

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1970. P.976. “Para Kant o gosto é uma espécie de senso comum é assim o senso comum no seu

significado mais exato porque se pode definir como a faculdade de julgar aquilo que se torna

universalmente comunicável, sem a mediação de um conceito (Crítica do Juízo, parágrafo 40). Portanto a

universalidade do juízo de gosto não é aquela do juízo intelectual porque não se baseia no objeto, mas

na possibilidade da comunicação com os outros. Em outros termos, o juízo de gosto somente é universal

porque se funda na comunicabilidade do sentimento (Crítica do Juízo, parágrafo 39). Kant distinguira ainda

o gosto como a faculdade de julgar do gênio, como uma faculdade produtiva (Ibidem, parágrafo 48). Como

já nos referimos a Husserl, para ele o Juízo é visto como noesis, que é o julgar e noema que é o julgado,

isto é, juízo formulado que torna possível a consideração lógico-formal do próprio juízo. Ambos os

aspectos são fornecidos na experiência vivida do Julgar. (Cf. ABBAGNANO, N. op. cit. p. 976)].

Em Kant, um mero som (a diferença de um barulho, o som das palavras), como de um v é belo em si,

enquanto mera sensação agradável, somente na medida em que seja um som puro, o que já é uma

representação que diz respeito à forma. Os sons e as cores não podem se misturar. As cores mistas, bem

como sons, são tidas como belos quando de nenhum modo são pensados como perfeição de um objeto,

como finalidade pretensamente formal, mas conforme a unanimidade, do jogo dos poderes da mente, em

que tudo nela só pode ser sentido (sem dogma imposto), segundo sua proporção ao sujeito e o seu

sentimento interno, e, aliás, na medida em que esse juízo é possível, segundo uma regra universal [para

maior compreensão, ler o parágrafo 15, Analítica do Belo, p. 229]. Em outras palavras, o apelo à forma

impede a pureza do juízo de gosto, bem como a instituição de uma finalidade para o objeto, porque “não

pode haver nenhuma regra de gosto objetiva que determine por meio de conceitos o que é belo” [idem].

Entretanto, a arte jornalística, a nosso ver, não sendo natureza, mas cultura, deve se parecer com a

natureza, porque livre de todas as regras e coações, deve se parecer a um produto natural. Muito

diferente é a concepção platônica.

Para Kant, toda arte deve ao gênio a sua origem, como veremos mais adiante. A poesia ocuparia o

primeiro lugar, o lugar mais alto entre as belas-artes, porque fortalece a mente, ao fazê-la sentir-se livre,

independente de limitações naturais; jogando com a aparência, com as ideias, sem, entretanto, enganar

com isso. Já a eloquência, a quem Kant também denomina por arte, seria menor que a arte poética porque

sua finalidade é persuadir, ludibriar pela bela aparência. Depois dessas duas, Kant colocaria a arte do

som, ou Música; como, entre todas as artes, a menor, pois ela fala por puras sensações e, diferentemente

da poesia, (pois esta sempre deixa algo para a meditação), enquanto que a música é transitória, como é o

jornal de cada dia.

Verdadeiro amor

A música, portanto tem menos valor, pois não suporta repetições reiteradas sem causar fastio. A forma

(melodia, harmonia) serve somente para exprimir, como forma de linguagem, sons que repousam sobre a

proporção do número das vibrações do ar, ao mesmo tempo, ou também sucessivamente. Pode ser, por

isso, matematicamente concebida sobre certas regras, para Kant, somente essa forma matemática

poderia prender a satisfação, embora não representada por conceitos determinados. No atrativo e no

movimento que a música sugere essa matemática não tem a mínima participação, segundo Kant, mas

proporciona fruição agradável por si mesma à mente.

As artes para Platão, em A República, serão sempre utilitárias, como podemos ver no excerto que

apresentamos a seguir. Nos Diálogos III, dialogando com Gláucon, Sócrates condena as melodias Jônias e

Lídia (chamadas frouxas) que deveriam ser banidas da república por não serem apropriadas nem para as

mulheres, “quanto mais para os homens”, por serem melodias plangentes ou lamuriosas, não teriam

utilidade para um público de guerreiros. Sobre a melodia ou harmonia, diz-nos Sócrates [cf. Livro III. A

República, p.64]: Quero uma (referindo-se à melodia) que seja capaz de imitar devidamente a voz e os

acentos de um herói na hora do perigo da austera resolução, ou quando sofre um revés, um ferimento, a

morte ou qualquer infortúnio semelhante, e em tais crises enfrenta os golpes da sorte a pé firmes e com

ânimo indomável. E outra que possa usar em tempo de paz, quando em plena liberdade de agir e sem

sentir a pressão da necessidade, procura convencer a outrem de alguma coisa, com preces, se é um deus

ou com advertências e admoestações se se trata de um homem; ou, quando, pelo contrário, exibe sua

disposição de ceder às súplicas, lições e persuasões de outro, e tendo logrado, pela sua conduta

prudente, aquilo que tinha em mira, não se envaidece, mas em todos os momentos age com sensatez e

moderação e se mostra satisfeito com a sua sorte. Essas duas harmonias são as que deves deixar: a voz

da necessidade e a da liberdade, os acentos dos homens infortunados e os do homem feliz, o canto da

coragem e o da temperança.

A emoção do herói expressa por uma melodia, perante a morte, ou qualquer outro infortúnio, crises; ou a

felicidade representada num canto de coragem, para Kant, não se fundaria num juízo de gosto, pois este

deve ser puro, isto é, independente de atrativo ou emoção. Desse modo, tais juízos, quando contenta ou

dói, não podem ter nenhuma pretensão à satisfação universalmente válida. O gosto será sempre bárbaro

quando precisa da mistura de atrativos e emoções para qualquer finalidade ou satisfação, e chega mesmo

a fazer destas o critério de sua aprovação.

Para Platão, as únicas melodias aceitas em sua república seriam respectivamente a Dórica e a Frígia,

porque para executá-las não seria necessária uma escala panorâmica com multiplicidade de sons.

Somente a lira e a cítara seriam instrumentos úteis na cidade e; no campo, seria permitida a flauta

pastoril.

Pretende expurgar a cidade de todo o luxo, purificando-a. A harmonia está na simplicidade das formas,

assim uma bela alma se harmonizará com uma bela forma e somente os mais belos elementos formais,

tanto de espírito como na alma, merecerão ser amados. O verdadeiro e belo amor é moderado e

harmonioso, isento de sensualidade e grosseria, porém é necessário separar dele o prazer entre os

amantes, porque este levaria à loucura ou à incontinência.

Para Kant, há uma crítica do belo e não uma ciência deste, mas somente belas-artes. Se o belo fosse

objeto de uma ciência, o juízo de beleza não seria um juízo- de- gosto. Se alguém perguntasse por uma

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Ciência do Belo e pelos seus fundamentos e demonstrações, seria despedido com sentenças de bom

gosto. Ao contrário de Platão, que abole o prazer do belo, Kant teria outro diálogo com Gláucon. O diálogo

que ora propomos tem unicamente uma função didática e não serve à ficção, enquanto entendida como

entretenimento, mas, ao contrário, trata-se de um esforço a uma possível intertextualidade. Vejamos [in:

Analítica do Belo, parágrafo 9: Investigação da questão: se no juízo-de-gosto, o sentimento de prazer precede o

julgamento do belo, ou este precede aquele, p. 219- 221]: “O prazer é necessário à arte, ou é um

conhecimento que se executa efetivamente?” – perguntaria Glauco: - Se a arte, [entre estas o jornalismo]

adequada ao conhecimento de um objeto possível, executa, meramente para torná-lo efetivo, as ações

requeridas para isso, ela é mecânica; se, porém, tem o sentimento de prazer como propósito imediato,

chama-se arte estética. Essa é agradável, ou bela-arte [idem].

Jornalismo e pintura editada

Segundo Ferraz [cf. Platão, as artimanhas do fingimento, p. 74-75], a Pintura, no Livro X, serve como modelo

para a condenação da Poesia por ser enganadora, Kosmetike (maquilagem), apta a produzir ilusões e

seduzir pelas suas cores. Serão desqualificadas, na república, todas as técnicas de fabricação, technai,

ligadas às maquilagens, como: pintura, tintura, ornamentos. A Arte Pintura é tratada como arte cosmética

em que o artifício exerceria sua sedução em total autonomia em relação à natureza e ao real, porque

apenas não só modificaria a natureza, mas também enganaria os sentidos, mostrando, através das cores,

uma realidade multicolorida, dissimulada em camadas de tinta. Seria, portanto, como um ornamento

privado (segundo Platão), de qualquer essência (como uma roupa que não se consegue tirar, porque não

há nada além dela). As próprias cores já são um produto de misturas, portanto não em si, isto é, sem

nenhuma essência. É por isso, que pela arte de enganar e seduzir, os pintores, poetas, sofistas,

oradores, músicos [jornalistas] não passam de meros charlatães, salvo (alguns) se aderirem aos ideais

políticos da república e aceitarem adequar suas atividades em nome do bem-estar-social da pólis. Desse

modo, platonicamente, estas artes “não-são” e “nem faz-ser”.

Sobre a Pintura, assim se expressa Kant: “A arte pictórica, como a segunda espécie de artes figurativas (a

primeira se refere à plástica: escultura e arquitetura) que expõe a aparência sensível artisticamente

vinculada com as Idéias, eu dividiria na da bela descrição da natureza, e na da bela composição de seus

produtos” [daarte do Gênio, p.258 In: A Analítica do Belo, p.258]. Kant divide a pintura em: pintura

propriamente dita e jardinagem ornamental (decoração do solo). Em sentido geral, também coloca, como

pintura, a ornamentação dos ambientes com tapeçarias e adereços. Acrescenta que todo o mobiliário e a

arte da indumentária. O luxo das damas, com suas roupas, brincos constituem, para Kant, uma “festa

suntuosa”, uma pintura. A mímica, porque dá à expressão corporal um jogo de fantasia, também seria

uma pintura. Mas a verdadeira bela-arte kantiana é mesmo a arte do Gênio que veremos a seguir.

Para Kant somente um gênio, que já nasce com um dom para sê-lo, poderia dar regras às artes, nesse

caso elas seriam (ao gênio) naturais, isto é, intuídas e inerentes ao gênio e não decorreriam de um

fundamento-de-determinação. Assim se expressa Kant: “Ora, mesmo assim, sem regra prévia, um produto

nunca pode chamar-se arte, é preciso que a natureza, no sujeito (e pela disposição das faculdades do

mesmo), dê à arte a regra, isto é, a bela-arte só é possível como produto de um gênio”.

O gênio não imita, ele mesmo não prescreve regras e nem explica cientificamente como instituiu o seu

produto, porque é a própria natureza que deu-lhe as regras. Newton não é considerado um gênio para

Kant, pois soube ensinar e passar seus conhecimentos científicos, descrevê-los, expor princípios e todos

os que aprenderem seus fundamentos também não podem se denominar gênios, porque o gênio é como

Homero (citado, como exemplo por Kant), não pode indicar como suas originais ideias, repletas de

pensamentos, surgiram em sua mente. Assim, o gênio tem dom natural de dar regras sem seguir

nenhuma consequentemente quem precisa de regras e os as seguem não são gênios. Nesse sentido,

podemos deduzir que mesmo se um gênio pudesse sintetizar as regras que o levaram à genialidade,

outro gênio delas prescindiria, porque já teriam intuídas suas próprias e naturais regras. Assim como o

gênio nasce gênio, curiosa é a analogia que Platão faz do filósofo com um cão. Diz-nos ele, na república,

que o cão é um verdadeiro filósofo. Por quê?, pergunta Garçom/Porque distingue a figura do inimigo da do

amigo pelo simples critério de conhecê-la ou não conhecê-la, responde Platão./E não sentirá desejo de

aprender quem define o familiar e o estranho pelo seu conhecimento ou ignorância de um e de outro? [in

O cão como filósofo DiálogosIII, A República, Livro II p. 45]/Sem dúvida, responde Glauco./E não podemos

admitir confiadamente que o homem, cuja disposição é ser afável para com os amigos e conhecidos, deve

ser filósofo e amigo do saber por natureza [idem]?/Obviamente, conclui Gláucon.

A natureza do necessário

Desse modo, como o gênio kantiano, o filósofo, também é um amigo do saber por natureza Ao que

Gláucon, obviamente concordou, e por ser esse um diálogo virtual, o interlocutor acaba, ao final, se saindo

muito bem.

Vimos o quanto o filosofo ou o gênio o é por natureza, porém nos diz Platão, a própria natureza pode ser

corrompida e é o que vamos explicitar agora. As causas que nos expõe Platão são por todos conhecidas,

porque perduram até os dias atuais. São elas: uma educação de baixa qualidade; as virtudes como a

coragem, a beleza, a força corporal que podem se afastar da Filosofia pelos mercenários. Aqui Platão os

compara aos sofistas (que tudo fazem mediante pagamento). O povo que é comparado a uma grande

besta e, sobretudo, o educador, o jornalista quando agem como sofistas, persuadindo o povo, formando

opinião enganosa, arrastando o mal e, dessa maneira, se comportam como o vulgar povo na acepção

platônica. A própria Ciência, decorrente da má organização política que se prega nos tribunais, nas

assembleias, aos berros, condicionando os discursos, não raro, a outros interesses que não os do poder

de legislar em nome do povo e/ou de promover à ética e a justiça.

Cita-nos Platão, que há uma força maior da qual os sofistas se utilizam para melhor persuadir o povo: a

coação material. Por ela lançam mão os sofistas quando não conseguem persuadir pelas palavras,

ameaçando, punindo com privações de direito, confiscações etc. quem não obedece a eles. Veremos, ao

longo desse artigo, o quanto Platão é realista e atual.

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Motivos pelos quais as naturezas filosófica, jornalística e artística se corrompem com tanta facilidade.

Em primeiro lugar as próprias virtudes – a coragem, a temperança e o resto, pois cada uma dessas

qualidades, tão dignas de louvor, perverte a alma que a possui e a afasta da Filosofia, se usadas visando

interesses escusos. Diante do grande espanto de Gláucon, Platão vai expor que as almas mais dotadas se

tornam as piores quando submetidas a uma má educação. Os grandes crimes e a maldade refinada não

brotam de espíritos inferiores, mas da plenitude de uma natureza corrompida. Para Platão as almas fracas

nunca serão capazes de grandes males e nem de grandes bens. Como exemplo cita os sofistas que são

como as mais daninhas de todas as ervas, a menos que preservem algum poder divino. E, a seguir ataca

o povo [idem]: Pois aqui tens outro ponto em que deverás assentir, diz Platão/ Qual? Pergunta

Glauco./que todos esses indivíduos mercenários a quem a multidão chama sofistas e considera como seus

adversários outra coisa não ensinam senão o que o vulgo expressa em suas reuniões, e é a isso que

chamam de ciência. Poderia compará-los a um homem que estudasse os instintos e humores de algum

grande animal confinado à sua guarda, sabendo por que lado deve aproximar-se dele e onde tocá-lo, em

que ocasiões e por que motivo se torna (grande animal) mais perigoso ou mais manso.

Platão não poupa a ciência sofística, dizendo ainda que o que agrada à grã-besta (o povo) é bom para os

sofistas. Estes, por não poderem dar outras explicações acerca dos termos que discorrem, chamam de

justo e belo ao necessário, mas jamais compreenderam, nem puderam explicar aos outros a natureza do

necessário e do belo e a enorme diferença que os separa.

Conclusão

Ao lermos os Diálogos III de Platão e os conceitos de Kant em A analítica do belo, assistimos, no primeiro, à

desqualificação da mimesis como uma atividade enganadora da essência, constituindo o não-ser, ligada à

aparência, como cópia da natureza, ou cópia de cópias. Em Kant (prescinde dos ideais políticos impostos

por Platão que visava como vimos à formação do guardiães), pudemos ver a consagração da Poesia, como

uma arte maior; o gosto e a satisfação do belo em si mesmo e a liberdade da fruição, que gostaríamos de

ler nos jornais.

Notamos que apesar de Platão condenar as técnicas discursivas dos sofistas, também delas se utiliza

para, tomando a fala de Sócrates, ridicularizar seus oponentes, mostrando-lhes o quanto são fracos seus

argumentos; incorrendo, portanto, no mesmo erro que imputa aos sofistas, ou seja, a arte de manipular o

discurso e persuadir os seus adversários acerca da ignorância deles, que também são técnicas atuais de

muitas revistas que “Isto é ou Isto Naomi” (obviamente são nomes meramente fictícios). Desse modo, faz

sempre prevalecer unicamente uma verdade: a sua própria. Entretanto, em muitos excertos analisados,

constatamos a atualidade do seu discurso político em relação à corrupção a que hoje também assistimos,

não raro, nos nossos tribunais, assembleias, nas redações de muitos jornais. Todavia, não estamos a

generalizar. Sempre há honrosas exceções.

Sobre o gênio kantiano, fica a nossa esperança: que a filosofia possa contribuir, pelo menos, para que os

nossos jornalistas possam aprender, senão uma arte maior (porque não sendo gênios, a isso não teriam

acesso) o belo que só mesmo as artes, entre elas destacamos a arte de escrever jornalisticamente,

podem nos proporcionar. Ao final, só nos resta esperar que a nossa leitura, não sendo por ora mais

abrangente, possa vir a ser, um dia, mais desveladora na medida em que o nosso entendimento se

expanda com a aquisição de novos conhecimentos (que outras leituras e cursos poderão acrescentar), e a

nossa sensibilidade se apure em contato com as belas-artes e com as artes belas, em todos as

instituições comprometidas com ideais de cidadania.

Referências bibliográficas

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia, São Paulo: Martins Fontes, 1998.

BENSE, M. Pequena Estética.São Paulo: Perspectiva, 1975.

BRONOWSKI, J. Arte e Conhecimento.Lisboa: Edições 70, 1983.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 8ª ed. São Paulo: Ática, 1997.

NUNES, B. Introdução à Filosofia da Arte. São Paulo: Ática, 1991.

DARTIGUES, André. O que é a Fenomenologia. 3ª ed. São Paulo: Moraes, 1992.

FERRAZ, Maria Cristina F. Platão, As Artimanhas do Fingimento. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999.

GADAMER, Hans-Georg. La actualidad de lo Bello.Barcelona: Paidós, 1991.

GILES, Thomas R. História do Existencialismo e da Fenomenologia. São Paulo : EPU, 1989.

KANT, Imamnuel. Crítica da faculdade do juízo. Rio/São Paulo: Forense, 1993.

KANT, Immanuel. Kant. Coleção Os Pensadores. Tr. Valério Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo:

Nova Cultural, 1999.

PLATÃO. Diálogos III, A República. Tr. Leonel Vallandro, 23ª ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.

***

[Iracema Torquato é professora DRT em Políticas Públicas e Administração da Educação Brasileira na área

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