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Investigação científica Alterações climáticas Biodiversidade Só a democracia permite que haja recursos para a próxima geração NICOLAU FERREIRA 27/06/2014 - 08:02 Estudo mostra que maioria das pessoas está disposta a sacrificar recursos para si em prol das gerações futuras, mas para que a minoria egoísta não os esgote é necessário haver uma votação universal. Se o mundo coubesse num jardim de um hectare, que dentada é que a humanidade já lhe teria dado? E o jardim que sobraria seria capaz de se regenerar e receber os nossos filhos, netos e gerações vindouras? As duas questões são metafóricas, mas os recursos que nos permitem viver são terrivelmente concretos. O solo que nos dá comida, a água que bebermos, o ar que respirarmos, tudo tem um fim e nós podemos acelerá-lo. Por isso, uma equipa de investigadores quis perceber qual a disposição das pessoas para avaliarem os recursos que existem e deixarem o suficiente geração após geração. Segundo o trabalho, a maioria está pronta a sacrificar recursos para si em prol do futuro. Mas para que isso acontecesse foi necessário aplicar a votação, conclui um artigo científico publicado na quinta-feira na revista Nature com o título invulgarmente simples e poético “Cooperar com o futuro”. A floresta amazónica simboliza os recursos do planeta que se querem passar às gerações seguintes NELSON GARRIDO (ARQUIVO) TÓPICOS Só a democracia permite que haja recursos para a próxima geração - ... http://www.publico.pt/ciencia/noticia/so-a-democracia-universal-permi... 1 de 7 02-07-2014 03:15

Só a democracia permite que haja recursos para a próxima geração

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Page 1: Só a democracia permite que haja recursos para a próxima geração

Investigação

científica

Alterações

climáticas

Biodiversidade

Só a democracia permite que hajarecursos para a próxima geraçãoNICOLAU FERREIRA 27/06/2014 - 08:02

Estudo mostra que maioria das pessoas está disposta a sacrificar recursos

para si em prol das gerações futuras, mas para que a minoria egoísta não os

esgote é necessário haver uma votação universal.

Se o mundo coubesse num jardim de um hectare, que

dentada é que a humanidade já lhe teria dado? E o

jardim que sobraria seria capaz de se regenerar e receber

os nossos filhos, netos e gerações vindouras? As duas

questões são metafóricas, mas os recursos que nos

permitem viver são terrivelmente concretos. O solo que

nos dá comida, a água que bebermos, o ar que

respirarmos, tudo tem um fim e nós podemos acelerá-lo.

Por isso, uma equipa de investigadores quis perceber

qual a disposição das pessoas para avaliarem os recursos

que existem e deixarem o suficiente geração após

geração. Segundo o trabalho, a maioria está pronta a

sacrificar recursos para si em prol do futuro. Mas para

que isso acontecesse foi necessário aplicar a votação,

conclui um artigo científico publicado na quinta-feira na

revista Nature com o título invulgarmente simples e

poético “Cooperar com o futuro”.

A floresta amazónica simboliza os recursos do planeta que se querem passar às geraçõesseguintes NELSON GARRIDO (ARQUIVO)

TÓPICOS

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"A observação surpreendente é que, apesar de haver

uma minoria de pessoas que não quer cooperar, a

maioria vota altruisticamente”, explica Martin Nowak

num comunicado da Universidade de Harvard, Estados

Unidos. O investigador é um dos líderes da equipa que

conta ainda com cientistas da Universidade de Yale, em

New Haven, EUA. “Essas pessoas não estão a votar para

maximizar os seus próprios benefícios, e é isso que

permite cooperar com o futuro.”

Esta demonstração está de acordo com estudos recentes

em que se mostra que as pessoas são, em geral, altruístas,

contrariando a ideia prévia de que os humanos são

racionais e egoístas nas suas escolhas, principalmente

quando os sacrifícios de hoje só beneficiam as gerações

futuras.

Para chegar a estas conclusões, a equipa fez o Jogo dos

Bens Intergeracionais. Neste jogo, cada grupo de cinco

pessoas representa uma geração. Esta geração tem à sua

disposição um grupo de cem unidades. Cada pessoa de

um grupo de cinco pode tirar entre 0 a 20 unidades. Se

no final desta geração ficarem 50 ou mais unidades,

então, na próxima geração o grupo de 100 unidades

regenera-se. Se ficarem menos de 50 unidades, o grupo

não regenera e a próxima geração de pessoas fica sem

unidades e “morre”. A parcela justa para que tudo corra

bem é se cada um retirar apenas 10 unidades.

Estas unidades não são simbólicas. Os cientistas

colocaram este jogo na plataforma virtual Amazon

Mechanical Turk. Aqui, os participantes dos EUA

puderam inscrever-se no jogo, ganhando

automaticamente meio dólar, e ganhar ainda um bónus

de acordo com as unidades que retiram. Não eram

montantes altos, mas tornaram real as escolhas que

fazem no jogo. Se os grupos que participassem no jogo

não fossem altruístas, a geração seguinte de cinco

pessoas não poderia participar no jogo e ganharia só

meio dólar pela inscrição.

No primeiro jogo, houve 18 partidas iniciais de cinco

jogadores. Cada partida inicial funcionou como a

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primeira geração. Na maioria dos casos, a soma das

unidades retiradas por cada grupo de cinco pessoas era

superior a 50 unidades. Desta forma, o grupo de

unidades não se regenerava para a segunda geração. Dos

18 grupos iniciais, só houve 4 grupos que cooperaram e

deram lugar a uma segunda geração, destes só dois

grupos cooperaram e deram lugar a uma terceira

geração. À terceira geração já ninguém cooperou e não

houve gerações seguintes.

Os limites do mercado livre

Numa primeira avaliação, pode interpretar-se que há

uma falta de cooperação generalizada face ao futuro por

parte dos participantes. Mas os investigadores

verificaram que 68% das pessoas tiraram dez ou menos

unidades. Houve, porém, uma minoria que açambarcou

mais do que dez unidades e impediu a cooperação.

Para contornar esta questão, os cientistas inspiraram-se

nos sistemas democráticos e abriram a decisão do

número de unidades que cada pessoa retiraria à votação

dos participantes de cada grupo. Assim, cada uma

votaria no número de unidades a retirar. No fim, o

programa fazia a mediana desse valor que seria o valor

final que cada um poderia retirar.

Se imaginarmos um grupo de cinco pessoas a votar 10,

10, 10, 10 e 20 unidades, a mediana neste caso é o

terceiro valor em ordem crescente — ou seja, o 10. Por

isso, por decisão democrática, é permitido a cada pessoa

tirar 10. O resultado das cinco pessoas é 50, o suficiente

para haver mais uma geração. A mediana permite, neste

caso, que a escolha da maioria vingue e os recursos se

mantenham.

Nesta versão do jogo, os resultados foram

completamente diferentes: os 20 grupos que iniciaram o

jogo e votaram previamente deixaram sempre recursos

para a próxima geração de pessoas. “Esta votação, que

tem em conta a mediana, acalma os participantes que se

preocupam com as gerações futuras, mas que têm medo

que os outros vão exaurir os recursos: como o resultado

da votação é aplicado a todos os jogadores, toda a gente

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recebe o mesmo e ninguém sente que ficou em

desvantagem”, lê-se no artigo.

Uma terceira versão do jogo deu o voto a três das cinco

pessoas, e as duas restantes poderiam retirar as unidades

que quisessem. Neste caso, com o voto parcial, só uma

pequena percentagem dos grupos é que mantive as

unidades acima da linha de água, servindo a próxima

geração.

Esta versão é semelhante ao acordo de Quioto em que,

apesar de haver uma votação para a redução das

emissões de dióxido de carbono, há nações que não o

ratificaram e por isso não estão obrigadas a nada. “Isto

ilustra por que é que o mercado livre falha em resolver

problemas como as alterações climáticas”, defende

Martin Nowak. “Mesmo que se queira cooperar com o

futuro, isso não se faz porque há o receio de se ser

explorado pelo presente.”

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COMENTÁRIOS

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30/06/2014 10:50

Gonçalo

Misturar ideologia com ecologia é sempre um caminho acidentado. Acomplexidade dos nossos sistemas de organização social é a granderesponsável por nos termos enfiado neste beco de difícil saída, em que nosafastámos dos normais mecanismos de regulação ecológica que permitem àsrestantes espécies do planeta manter um percurso evolutivo "sustentável".Este é portanto apenas mais um exercício teórico, mas pouco significativo. Nocampo do discurso e da teoria política, somos todos muito "verdes" esolidários com as próximas gerações. Mas quando toca à prática, nem épreciso ir buscar Quioto para ver como tudo colapsa. Basta ver ocomportamento diário dos nossos concidadãos. E aí, não vale a pena lançara culpa para cima dessa entidade de ombros largos que é "eles". É mesmonossa.

Responder

27/06/2014 12:28

Proteína

O mundo está habitado por muitos seres vivos incluindo o ser humano. Todosos seres vivos fazem um percurso histórico, evoluem, sublimam,metamorfoseiam, uns extinguem-se outros prolongam o seu ciclo de vida. Ohomem, dada a sua capacidade reflexiva e cognitiva tem conseguido impor-seao meio, mudando-o e impor-se a si mesmo modando-se. A humanidadecomposta por 7 000 milhões de criaturas todas diferentes é heterogénea etem um poder interno diverso e contraditório. Esse poder interno exprime-sepor princípios e regras que se vão adensando a cada síntese de cadacontradição resolvida. Os mais fortes, aptos ou adaptáveis apropriam-se emcada momento do poder esforçando-se por o manter travando os movimentosdos fracos.

Responder

27/06/2014 18:30

Achille Talon

O seu comentário é tão só, a resposta a todas as notíciasque temos vindo aqui a esmiuçar, tentando encontrarexplicações para guerras, crises, corrupção, etc. e está tudoaqui. Muitos recusam-se a ver, por cegueira ideológica,conivência, interesse, desinteresse e muitas vezes maldade.Lamentável.

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27/06/2014 10:22

Rosangela Martins

Se uma pessoa decente estivesse no comando por 100 anos seria muitomelhor do que 20 pessoas de 5 em 5 anos tentando tirar o máximo para si.

Responder

27/06/2014 12:22

Proteína

E quem é a pessoa decente?

27/06/2014 09:55

Eraumavez

Doutorado em virar hamburgueres

È estranho que tenha sido por influencia das democracias que se delapidaramgrande parte dos recursos naturais e a Terra tenha ficado em estado crítico,mas prontos, cada qual vende o peixe que tem e o Snr Nicolau Ferreira está avender uns carapaus que já nem as moscas lhe tocam.

Responder

27/06/2014 11:27

Dfo Dfo

Não me lembro de ter votado para a exploração das minasde volfrâmio. Não me lembro dos brazileiros terem votadopara a continuação da destruição da floresta da Amazónia.Não me lembro dos americanos terem votado para aexploração petrolífera no Alaska. "Influência dasdemocracias", ou abuso de influência dos muitos actoresempresariais do mercado livre?

27/06/2014 12:32

Eraumavez

Doutorado em virar hamburgueres

Snr Dfo Dfo.....quando o Snr vota numa pessoa não faz amínima ideia do que ele vai fazer com o poder que lhe vaiconferir. e nunca algum político sofreu qualquer sanção pornão cumprir as promessas.

27/06/2014 14:48

Dfo Dfo

Então concordamos, correcto? O consumo desenfreado eirresponsável de recursos não provém do sistemademocrático, mas sim da simples corrupção humana. Paísescomo a China ainda não resolveram a questão, e seriam oúltimo sítio em que eu pensaria depois de ouvir"democracia".

Marketing Directo

Sr. Prof. Dr. Mestre Astrólogo Vidente Espirita e Curandeiro

Quando sai o estudo que compara o que se recebia com a reciclagem ha trinta anos atras

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27/06/2014 08:37

com o que se paga hoje pelo mesmo serviço?

Responder

27/06/2014 20:04

Arons Vale E Cunha

Boa questão!

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