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Marcela Coral Na primeira visita ao parque das serpentes, quando entramos no parque, não tive uma noção imediata do que seria aquele lugar. O primeiro alerta do diferencial do parque das serpentes veio com o aclive tão acentuado que tive de enfrentar para chegar lá. O carro sofreu. Fato esse que deixou a situação ainda mais interessante, pondo-me a imaginar até onde subiríamos e o que veríamos. Fui ‘seguindo o fluxo’ dos colegas pelo caminho que se oferece à direita. O caminho em si já despertou curiosidade e interesse por um espaço que parecia cheio de atrativos visuais e sentimentais. E aí o caminho terminou quando se abriu uma perspectiva estimulante diante dos olhos. Com uma biblioteca aparentemente fascinante envolta em cores e texturas e figuras. Mas o melhor ainda estava por vir. Aquele visual arrebatador do penhasco foi o que tocou. Poderia ficar por horas sentada na roda de fogo admirando e sentindo a energia daquele lugar. Acredito que o parque tenha o poder de despertar no humano que está ali uma diversidade de emoções. Envolto pela natureza e pela intervenção humana - presente através da arte, da arquitetura, dos mosaicos, das serpentes -, a gente se permite envolver. A luz do sol que penetra nas clareiras entre as árvores, nas aberturas das edificações - como quando tivemos aquela primeira conversa na Casa Loja - traz uma paz de espírito, traz conforto. O lugar é hospitaleiro, faz sentir bem, sentir aconchego. Posso dizer que do que mais gostei no local foi o balanço. Sentada naquele pedaço de madeira suspenso dá pra sentir a brisa, olhar o pôr-do-sol, se perder em pensamentos. A luz do sol penetra sem rodeios, assim como a chuva e o vento. A visibilidade para o penhasco tampouco é perturbada. Não há obstáculos. Ali dá para sentir o abraço e a solidão. O calor e o frio. A terra e o céu. Dá para flutuar olhando a lua, o sol, as estrelas. Dá para fechar os olhos e ouvir os sons da natureza. O parque dá sentido humano ao espaço. A vitalidade dele se faz presente nas relações humanas caracterizadas pelas obras de arte existentes. Ele está de braços abertos esperando seus convidados: as pessoas, os bichos, os elementos. Ele é o grande anfitrião dos indivíduos, de nós, da Cláudia. E a relação entre as pessoas e o lugar é a beleza e a emoção de tudo. Pensamentos iniciais sobre a minha proposta: A grande relação entre o que está dentro e o que está fora, a fluidez do espaço, que tudo seja uma coisa só. A possibilidade de deixar a sua marca naquele lugar, através da arte, faz com que de hóspedes possamos nos tornar parte de um todo. Quero oferecer àquele lugar uma continuidade da proposta existente: que a vegetação e a natureza possam acolher, possibilitando ao humano sentir a chuva, o sol, o cantar dos pássaros; que se possa reunir pessoas; que pessoas possam se encontrar; que seja vivo através da presença e das ações das pessoas. Que seja fluido, aberto, que não deixe o hóspede de fora e sim por dentro, e que o dentro seja também fora. Que o espírito do lugar possa ser visto e sentido por todos os lados. Edificação que possa ser aberta e descoberta. Que seja um passe livre permitindo o ir e vir e o permanecer.

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Marcela Coral Na primeira visita ao parque das serpentes, quando entramos no parque, não

tive uma noção imediata do que seria aquele lugar. O primeiro alerta do diferencial do parque das serpentes veio com o aclive tão acentuado que tive de enfrentar para chegar lá. O carro sofreu. Fato esse que deixou a situação ainda mais interessante, pondo-me a imaginar até onde subiríamos e o que veríamos. Fui ‘seguindo o fluxo’ dos colegas pelo caminho que se oferece à direita. O caminho em si já despertou curiosidade e interesse por um espaço que parecia cheio de atrativos visuais e sentimentais. E aí o caminho terminou quando se abriu uma perspectiva estimulante diante dos olhos. Com uma biblioteca aparentemente fascinante envolta em cores e texturas e figuras. Mas o melhor ainda estava por vir. Aquele visual arrebatador do penhasco foi o que tocou. Poderia ficar por horas sentada na roda de fogo admirando e sentindo a energia daquele lugar.

Acredito que o parque tenha o poder de despertar no humano que está ali uma diversidade de emoções. Envolto pela natureza e pela intervenção humana - presente através da arte, da arquitetura, dos mosaicos, das serpentes -, a gente se permite envolver. A luz do sol que penetra nas clareiras entre as árvores, nas aberturas das edificações - como quando tivemos aquela primeira conversa na Casa Loja - traz uma paz de espírito, traz conforto. O lugar é hospitaleiro, faz sentir bem, sentir aconchego.

Posso dizer que do que mais gostei no local foi o balanço. Sentada naquele pedaço de madeira suspenso dá pra sentir a brisa, olhar o pôr-do-sol, se perder em pensamentos. A luz do sol penetra sem rodeios, assim como a chuva e o vento. A visibilidade para o penhasco tampouco é perturbada. Não há obstáculos. Ali dá para sentir o abraço e a solidão. O calor e o frio. A terra e o céu. Dá para flutuar olhando a lua, o sol, as estrelas. Dá para fechar os olhos e ouvir os sons da natureza.

O parque dá sentido humano ao espaço. A vitalidade dele se faz presente nas relações humanas caracterizadas pelas obras de arte existentes. Ele está de braços abertos esperando seus convidados: as pessoas, os bichos, os elementos. Ele é o grande anfitrião dos indivíduos, de nós, da Cláudia. E a relação entre as pessoas e o lugar é a beleza e a emoção de tudo.

Pensamentos iniciais sobre a minha proposta: A grande relação entre o que está dentro e o que está fora, a fluidez do

espaço, que tudo seja uma coisa só. A possibilidade de deixar a sua marca naquele lugar, através da arte, faz com

que de hóspedes possamos nos tornar parte de um todo. Quero oferecer àquele lugar uma continuidade da proposta existente: que a

vegetação e a natureza possam acolher, possibilitando ao humano sentir a chuva, o sol, o cantar dos pássaros; que se possa reunir pessoas; que pessoas possam se encontrar; que seja vivo através da presença e das ações das pessoas. Que seja fluido, aberto, que não deixe o hóspede de fora e sim por dentro, e que o dentro seja também fora. Que o espírito do lugar possa ser visto e sentido por todos os lados.

Edificação que possa ser aberta e descoberta. Que seja um passe livre permitindo o ir e vir e o permanecer.

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Marcos Ogata Quando me deparei pela primeira vez com o Caminho das Serpentes, a

primeira sensação que eu tive foi de tranquilidade, como se eu me refugiasse do estresse e poluição da cidade grande e aproveitasse a calmaria e as vistas incríveis que o lugar proporciona: tanto as que se tem do precipício, quanto às voltadas para o próprio parque. Além disso, a forma com que os objetos compõem o espaço contribui para que, a cada passo que é dado, tem-se uma nova percepção do lugar, uma nova experiência, seja com as obras de arte que se encontram pelo parque, seja pelo próprio parque. A natureza que ali se manifesta, com seu jogo de luz e sombra e seu diálogo com os diversos elementos arquitetônicos, é responsável por causar essas diversas reações emocionais no ser humano.

O local evidencia de maneira bastante clara que a arquitetura está diretamente vinculada não somente ao lado técnico e construtivo, mas ao lado humano e filosófico. A arquitetura como um todo se volta ao plano do acolhimento e da hospitalidade, não só pelas configurações espaciais, mas pelas pessoas, e a forma com que elas interagem umas com as outras, pois quem faz o lugar não é o espaço, são as pessoas que dão sentido a ele. Percebe-se também que as construções e painéis na borda “abraçam” o terreno, levando atenção para o que acontece no meio do lote.

Serpentes, símbolo da regeneração e imortalidade, é um dos temas predominantes nos mosaicos do parque em estudo, junto com os corações e as borboletas. A concepção do espaço se baseia na expressão da artista, com caminhos sinuosos (referência ao movimento das serpentes) que dão movimento ao local, não o deixando monótono. Mesmo quando vamos mais de uma vez ao caminho das serpentes, sempre há algo que não reparamos na visita anterior, o que torna o espaço ainda mais interessante. Evidentemente, o parque tem como fundamento base o conceito do mosaico, ou seja, um conjunto de fragmentos que em conjunto formam uma união coerente e sólida. Aliás, o próprio parque é um mosaico, ou seja, um conjunto de diversos momentos e sentimentos que juntos formam um ambiente de acolhimento.

Concomitantemente a essa análise, há de considerar o paradoxo entre o

espaço público e privado, uma vez que o primeiro cresce entorno do segundo, tendo como consequência a mistura dos dois. As pessoas que visitam o parque querem conhecer a artista responsável pelas obras do mesmo, porém a questão é que a artista não está incluída no turismo à área. Outro caso envolve a educação das pessoas, como já aconteceu com os estudantes que fizeram a artista chegar ao limiar da tolerância.

Quanto às potencialidades da área, a proposta é trabalhar um projeto de

atelier integrado com área de exposições e um pequeno refeitório para auxiliar economicamente, além de um tratamento paisagístico, que possa complementar a estrutura (não somente econômica como também conceitual) do parque. O local de intervenção seria a borda superior do terreno, que propicia dois jogos de perspectivas: de um lado, a vista mais fechada para o parque; e de outro, uma vista aérea. Qualquer intervenção que se faça na área tem que ser pensada de forma que não desestruture a linguagem heterogênea do mosaico e da xilogravura.

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Samuel Jachetti No terreno do parque Caminho da Serpente, o papel do homem no terreno faz

o contraste entre a fragmentação das obras revestidas em mosaico e a uniformidade das curvas sinuosamente naturais.

Em todo espaço há distrações: serpentes, borboletas, árvores, os pisos coloridos em pequenos pedaços de cores que te induzem a percorrer todo o terreno, ou até mesmo o chão de terra coberto de folhas amarelas. Não há uma definição para lá, pois cada indivíduo vai ser distraído por pontos diferentes, tornando aquele lugar um pouco seu, fazendo com que algo remeta a sua personalidade. O que me distraiu foi a vertigem. A experiência de ficar no alto, de ver tudo de cima.

Não há como privatizar mais aquela vista. Não gosto da ideia de fragmenta-la, torna-la mais um mosaico. Prefiro deixa-la inteira. Quero explorar o espaço sem perder o que já existe.

Eleazar Santini Comoreto O sítio é para o arquiteto, assim como o paciente para o médico, os tecidos

para o costureiro ou ainda, os ingredientes para o cozinheiro. Todos esse profissionais precisam antes de qualquer coisa, conhecer muito bem aquilo com o que estão lidando, precisam antes de qualquer intervenção, conhecer muito bem o seu objeto-alvo, obter o maior número possível de informações e anseios que nós é passado, direta ou indiretamente.

Pois bem, eis a minha análise do sitio. Estamos no topo, no limiar entre fascínio e tragédia. Olhamos toda aquela

paisagem a nossa frente, deslumbramo-nos, é incrível. Mas precisamos atentar para que não nos deixemos embriagar pela beleza da paisagem e da natureza, pois o penhasco está ali, como um animal faminto, com sua bocarra aberta. Qualquer dose a mais pode nos transformar em ‘comida de monstro’. E encontramos assim a tragédia.

Enfim. Não caímos ali de paraquedas, ou nos materializamos no ar. Essa paisagem é o auge de uma aventura por entre serpentes, seres negros riscados de branco, de uma floresta que nos provoca, nos instiga e nos faz explorar os recantos dela, quer que cheguemos lá em cima, mas ao mesmo tempo nos faz explorar esses recantos, cada um adornado com uma ‘sobremesa’ para os olhos: esculturas, mosaicos, um tronco tomado por um veludo verdíssimo ou simplesmente um azulejo providencialmente repousado compondo o cenário.

Subimos, finalmente. A pé, ou de táxi, como preferirem. Encontramos pelo caminho borboletas, mais serpentes, mais beleza, mais

natureza. Pode tudo estar em repouso, não necessariamente em harmonia, porém, se interviemos de maneira incauta, descuidada, os resultados podem soar como uma nota mal arranjada em um concerto.

Porém, como estamos permeáveis e dispostos a receber e ouvir o que o sítio nos diz, creio que as intervenções propostas se somarão ao conjunto de obras de forma, pelo menos, amistosa.

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André Fauri Acolhimento em Morro Reuter Começo o texto acolhendo a ideia de dirigir-me a um espaço pelo qual fui

acolhido em um receptivo abraço de boas vindas. Espaço que requer uma atenção muito especial, seja pelo programa acadêmico, seja pela capacidade de abrir-se aos que chegam com gratuidade. Entrar no Caminho das Serpentes possibilita sensibilizarmos pela arte, a arte que Cláudia Sperb – mediadora deste Encontro – quer apresentar. E o que Cláudia quer apresentar aos visitantes?

A experiência de visitante me diz que os mosaicos apresentados por sua criadora/mediadora - que faz questão de salientar a autoria plural dos mesmos – querem dizer mais do que simplesmente agrupamento de peças, mas a comunhão das diferenças. Tanto as palavras ditas por Cláudia, quanto o lugar e as obras de arte dizem isso. Como intervenção no espaço penso que essa celebração das diferenças e os seus encontros deve ser um dos, senão o principal foco, visto que o espaço recebe visitas constantes de muitas pessoas diferentes e que chegam até lá justamente para conhecer. Há muitas chegadas de estranhos que se tornam conhecidos, errantes que após inserirem-se no esperante, tornam-se amigos, e dessa amizade floresce o mosaico.

Prazeroso foi o caminho que percorri ao me encontrar com o Caminho das Serpentes, após isolar-me do meio de costume, a capital com toda a sua velocidade barulhenta, fui convidado a entrar no vagaroso silêncio que a natureza do lugar propicia, e assim, desacelerar-me. Penso que essa desaceleração, ou em mais abrangente definição, sintonização rítmica é um dos fatores mais importantes para a troca, e como projetista o desafio talvez seja maior ainda. Adentrei o terreno e aproveitei a oportunidade fornecida de desvendar o lugar por mim mesmo, andando por onde a intuição me levasse. O caminho de mosaico, apresentou-se então como expressão do ideal por sua autora, conduzindo de forma sinuosa um contorno por uma grande área arborizada. Logo se vê os painéis de mosaico como que substituindo muros e apresentando opção artística de delimitação territorial. Não que essa delimitação seja necessária, pois o terreno está totalmente isolado de outras ocupações humanas, e nem que a mesma seja, ao menos conscientemente, a vontade de Cláudia, mas talvez por querer esconder as telas que lembram essa dura demarcação, ou até mesmo de ocupar as extremidades. Como a experiência do local foi até agora diurna, o começo do caminho é feito à sombra, guarnecido por grandes árvores. Subindo o terreno vemos a primeira casa intervinda pela arte, tijolos que servem de pano de fundo para decorações em pedras coloridas. A luz do sol começa a expressar-se com mais força através de aberturas que vão se tornando maiores na medida em que se sobe.

Olhando em frente, na continuação do caminho de mosaico, a luz convida a chegar a parte mais alta do lugar, em uma área com muito menos vegetação e mais intervenção construtiva humana. Chega-se em um grande espaço aberto, provido de pavimentação, onde é fornecido em maior escala o encontro entre as pessoas. Dali ramifica-se os trajetos e vontades. Em primeira ocasião, segui em direção ao outro extremo do terreno, queria experimentar a maravilhosa vista que já de antemão eu imaginava. O caminho que em início de declive apresenta-se novamente mais orgânico, com pedras e mosaicos, leva ao mirante e à toda a região mais aberta do terreno, com pouca vegetação e generosa e longa visão.

Lá se encontram vários objetos, grandes e pequenos, muitos deles aparentemente sem sentido, mas que parecem olhar para o horizonte, indicando a atividade mais comumente aproveitada ali. O Borboletário aparece mais abaixo, de

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singela e doce aparência, mostrando-se como um pequeno universo a quem sobe e desfruta o apreço por uma coleção incontável de borboletas cobrindo cadeiras favoráveis à conversa. Descendo desta pequena cabana, voltei ao ponto alto do terreno para uma agradável roda de chá, onde todos novamente se encontraram para a troca. Mesa tão legal aquela, dizendo-nos que a refeição é a bonita oportunidade das aproximações. Logo ao lado está a biblioteca, abraçando um mundo de palavras. Palavras que estão plenamente visíveis aos grandes vidros. Nada se pode esconder ali, mesmo porque é justamente o contrário que se quer: convida-se à leitura.

Muito me é desconhecido neste lugar, esta deve ser a sensação sentida pela maioria das pessoas que têm o prazer de conhecê-lo, mas aprecio este mistério como o convite constante à nova visita, e em meio a tantos convites e trocas que fazemos parte deste mosaico do Caminho das Serpentes.

Patrícia Fernandes Segundo o texto “Derrida e Arquitetura”, existe uma forte relação entre a

arquitetura e a hospitalidade, esta podendo ser compreendida como a inclusão do outro dentro da pratica disciplinar do projeto arquitetônico. Sendo assim, o sentido verdadeiro da arquitetura não estaria no espaço ou na arquitetura em si, mas nas próprias pessoas e em suas ligações afetivas. Seria como dar lugar ao lugar, pois o lugar nada é se não houver o encontro daquele que espera e com o que vai chegar. Foi mencionada, ainda, a similaridade existente entre a collage e a hospitalidade/acolhimento. Ambos representam um encontro. No caso da collage/mosaico, o recortar/colar presume um momento posterior ao recorte e anterior a cola, no qual um fragmento de figura espera outro e, após o teste de varias possibilidades, a aproximação deles formará uma nova figura, diferente da anterior.

Atualmente, percebe-se um isolamento demasiado, motivado pela violência, que faz com que nos fechemos cada vez mais às diferenças e não nos permitamos trocar. Certamente essa troca seria enriquecedora não só das relações afetivas das pessoas, como também da arquitetura. Trata-se da importância da relação entre o exterior e o interior, através da abertura, esta não somente relacionada a portas e janelas, mas a abertura com que um aguarda a chegada do outro e o permite entrar. Na verdade, falar-se em exterior e interior é bastante complexo e relativo, pois como já vimos em aula, aquele que está “fora” de um lugar, pode ser visto dentro de outro e vice-versa, bastando mudarmos de perspectiva. O texto cita como exemplo a sacada, que ao mesmo tempo é interior e exterior, dependendo de quem a analisa, podendo ser externa para aquele que se encontra dentro da construção e interna para aquele que se encontra fora da mesma. Ainda, é importante ressaltar que esta sensação de acolhimento não depende só do lugar (mais uma vez, este sozinho nada é), mas das pessoas e do momento, podendo, por exemplo, no verão ser mais acolhedora a sacada, e no inverno ser mais a sala.

Partindo dos conceitos e observações acima expostos, percebe-se a importância da hospitalidade e desse acolhimento por parte não só do lugar, mas também do hospedeiro. Percebi esse acolhimento desde que estive no lugar pela primeira vez. O encontro está presente por todo lado, representado pelos mosaicos e também por construções tão singulares que poderiam, se fossem somente imaginadas, parecer não combinar. Mas surpreendentemente sim, as diferenças

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unidas acabaram por formar um só lugar, singular e uniforme ao mesmo tempo, gerando uma sensação de puro aconchego. Percebi, ainda, uma forte relação entre o interior e o exterior, seja pelas transparências e possibilidade de olhar “de dentro para fora”, seja pela dificuldade de definir se estamos dentro ou fora, pois estar fora das construções, significa estar dentro do parque, um espaço privativo. Este lugar proporciona um sentimento de liberdade, é como se estivéssemos fora da realidade da cidade, “livre” dos perigos e em contato com a natureza. Esse aconchego e a receptividade do hospedeiro faz com que nos sintamos convidados a entrar.

A partir das conversas com a artista plástica Cláudia e da necessidade de sustentação do parque, acredito que a necessidade imediata seria a criação de mais dois aposentos para a pousada. A partir daí, poder-se-ia criar, ainda, uma estar de convivência, com lareira, criando o aconchego que ainda falta nos dias frios. O lugar por mim escolhido é o próximo ao penhasco, devido à vista que pode ser de grande proveito com a utilização de materiais translúcidos como o vidro. Imaginei ainda, uma edificação aproveitando o desnível do terreno, tendo-se a entrada no segundo piso e um subsolo que permitiria aberturas para o lado do penhasco.

Daniela Yoshimoto O que me chama atenção no Parque Caminho das Serpentes é o

MOVIMENTO HARMONIOSO que ele transmite. Para se chegar ao Parque é preciso percorrer um primeiro grande caminho sinuoso. Ao chegar lá, ainda meio tonto com o trajeto, percebe-se um terreno bastante irregular, e a partir daí há uma ironia: sinto-me totalmente presa ao chão, talvez pela numerosa presença de árvores ali, sinto uma segurança, estabilidade. E, ao mesmo tempo, percebe-se o dinamismo e o movimento, dado pela disposição dos elementos no Parque, que nos fazem percorrer, novamente, por um caminho sinuoso – dessa vez mais segura e tranquila, beirando a arte e a natureza. Dois lugares me chamaram a atenção: a plenitude e o infinito do PENHASCO e o MISTÉRIO e a penumbra das árvores. Sinto a parte do penhasco tão completa por si só que tenho receio de interferir na beleza da paisagem. Na verdade, o parque todo parece tão completo, tão harmonioso em si só... Mas como “o ser humano tem muito mais desejos do que necessidades”, tenho como vontade revelar os mistérios da área entre as árvores, a fim de tornar físico o desejo da Cláudia de espaço de devaneio, um lugar para se CRIARTE. Minha referência encontra-se no próprio parque: A SERPENTE. A serpente na qual, além de trazer lembranças se sua avó, sua cabeça retoma a ideia de coração, na qual representa o encontro entre razão e emoção. A meu ver, as curvas da serpente se encaixam por entre a região do MISTÉRIO, nas quais as concavidades quase que tocam as árvores. Poderia ser uma alternativa de percurso do Parque, também. Localizado no coração, no ponto mais central e protegido do ambiente externo, sugiro um espaço no qual a Cláudia seria HÓSPEDE. A curva representa uma alternativa de acolhimento, um passeio que nos torna parte do que é apresentado. Com a curva, posso recriar uma nova borda, na qual ao mesmo tempo em que é borda, é também acolhimento e sinal de segurança. Por fim, sugiro um jogo de luz e sombra, dado pela própria natureza em conjunto do uso de vidro colorido, que reflete o contraste DENTRO X FORA. E aí está a CASA DE VIDRO ATELIER.

“No vazio, eu vejo a curva”

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Nathana Parise A implantação acima localiza-se na cidade de Morro Reuter, e representa o

terreno onde a artista plástica Cláudia Sperb escolheu para viver. Ali foram construídas várias edificações, entre elas pousadas, banheiro externo, biblioteca e a casa da própria artista. O local foi todo pensado e trabalhando por Cláudia, desde o piso até as áreas mais elevadas, tanto interior quanto exterior, com o mosaico sempre presente. O terreno fica à beira de um penhasco, de onde se consegue ver toda Morro Reuter, além de cidades vizinhas, como mostra a terceira foto acima. Observando essa magnífica paisagem natural, podemos entender de onde Cláudia tira tanta inspiração para seus trabalhos.

Foi pensando nisso que escolhi um ponto específico entre os vários locais possíveis para inserir o projeto que irei elaborar durante o semestre.

Entre as várias visitas que fizemos ao terreno, apesar da correria, pudemos apreciar a beleza e a sensação de estar em casa que o local nos passa. Onde eu mais senti isso foi na parte mais externa do lote, próximo ao mirante, e foi este o local onde decidi implantar a nova edificação.

Baseando-me nos depoimentos da Cláudia, e no que eu pude ver e sentir no local, pensei em criar um atelier onde a artista pudesse trabalhar e ao mesmo tempo ensinar e aprender com alunos e visitantes que por ali passam. Um atelier que fosse um local não apenas para trabalho, mas para troca de ideias e de informações entre pessoas que estejam dispostas a ouvir e serem ouvidas. A localização privilegiada, na parte mais alta de um morro com uma paisagem exuberante, também serviria para completar esse clima de criatividade e serenidade. Acredito que esta vista de dentro para fora do atelier passe uma sensação de estar livre, em contato com a natureza, bastante diferente da vida de trabalho em um escritório fechado, onde muitas vezes não se sabe se é dia ou noite, se o dia está chuvoso ou ensolarado, onde as pessoas ao invés de estarem sentindo prazer ao fazer seu trabalho, acabam ficando cada vez mais estressadas.

Após um estudo melhor das variações do terreno, se for possível, pensei em fazer esse projeto com dois andares, sendo o pavimento superior uma pousada, porém, um pouco diferente das já existentes. As atuais pousadas, todas muito bonitas e aconchegantes, parecem ter um clima mais romântico, para se passar um final de semana a dois. A minha proposta seria uma pousada para grupos maiores, de amigos, de artistas, de estudantes, que pudessem passar o dia produzindo e aprendendo no atelier, e à noite pudessem continuar o diálogo e a interação entre todos.

O desafio será elaborar melhor essas ideias de modo que esta nova peça do mosaico Caminho das Serpentes não atrapalhe as já existentes. Estando a localização escolhida em declive e mais retirada, isso já ajuda a solucionar o problema, mas é preciso encontrar um jeito de ter um atelier acolhedor sem que seja preciso bloquear o maravilhoso plano visual que as outras edificações já possuem. Assim, apesar da mudança, o equilíbrio e o respeito entre os seres permanecerá.

Mariana Mincarone

Eu conheci o Parque das Serpentes antes de visitá-lo. Desde a primeira vaga descrição do lugar – “é um parque em Morro Reuter, que é cheio de

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mosaicos” – ele já começou a existir na minha imaginação.

“Uma figura se desilude ao não encontrar aquilo que esperava e isto é o que faz nascer a novidade”.

Que novidade seria se ele fosse exatamente como eu imaginava? Algumas fotos na internet ajudaram a construir a imagem mental do

lugar, mas sempre ficava algo incompreendido. “Bom, quando eu visitar acho que vou entender melhor.” Mas chegando lá, segui sem entender bem do que se tratava. “Talvez depois do levantamento...” E de novo, ainda sinto que não consegui captar tudo que existe lá. Tem algo que, mesmo após 3 ou 4 visitas, ainda está presente na minha concepção do lugar: a aura misteriosa, aquela sensação de que eu nunca vou conhecê-lo inteiro; de que é impossível, com a minha percepção humana e limitada, compreender toda a vastidão daquele penhasco, toda minúcia de cada caco de mosaico, de cada universo dos formigueiros escondidos debaixo das pedras. Mesmo com tantas informações, o visitante não fica, de modo algum, passivo diante de toda a arte. É ele quem decide o percurso, se vai seguir reto pelo caminho principal ou se pega um “encumpridalho” pelo caminho sinuoso no meio da mata. Seja por um ou seja por outro, ele vai desvendando o lugar. A mata cumpre bem seu papel de ir revelando aos poucos: é quase impossível enxergar muito além. Bom, pelo menos é assim... até o penhasco. De repente, saímos da estreiteza que é o caminhar por entre as árvores e nos damos de cara com uma imensidão. “acreditam na arquitetura por ela mesmo e de seu oficio de construção, mas se esquecem que o verdadeiro objeto da arquitetura é o humano que se esconde nela” Portanto, mais que um objeto arquitetônico, quero criar um espaço de recolhimento ou de convívio, de contemplação da natureza ou de si mesmo, de introspecção ou de extroversão.

Carol Vasques Ao chegar pela primeira vez no parque das serpentes, senti uma necessidade

enorme em entender. Entender o porquê dos mosaicos, o porquê das serpentes, o porquê do lugar. Entender, basicamente, os porquês da Claudia.

Durante o meu trajeto dividi mentalmente o parque em 3 grandes zonas: o começo (zona da mata), o meio (zona focal) e o fim do terreno (zona do barranco). Agrupei esses lugares distintos em zonas, pois eles me abrigavam de formas parecidas. O começo me inquietava, me deixava curiosa, ao chegar no “meio” eu me surpreendia com tudo, nada era bem como eu tinha pensado e, finalmente, ao chegar no final eu me surpreendia e muito, mas principalmente, eu me enchia de uma sensação de liberdade dada por aquele lugar com pouquíssimas barreiras visuais. Essa última zona seria o meu espaço gerador de ideias, questionamentos, reflexões. O descampado era um abrigo aberto, o abrigo que traz liberdade e não enclausura. Para mim, a arquitetura como abrigo não deve praticar o sufocamento

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das vontades, e sim a libertação das mesmas. A vontade de ir e vir deve permanecer. O lugar é como um amigo: está sempre ali para te acolher, mas não te possui. Em um de nossos encontros lembro da Claudia comentar que as vezes queria se mudar do parque, que a sua presença no local não seria eterna. A Claudia demonstra essa liberdade interior, a capacidade de ir e vir e o gosto por mudanças. Entretanto, mesmo que ela se mude futuramente, a sua marca já está no terreno. A natureza abriga a sua arte e a sua arte abriga o espírito de quem a visita. O terreno era a exteriorização da Claudia, a exteriorização, para mim, de como são e de como eu espero que continuem a ser os nossos encontros. Os primeiros encontros eram ainda um terreno desconhecido para ambos os lados, eram de curiosidade e de inquietação por não saber exatamente o que estava por vir. Os encontros que estamos realizando agora (meio do semestre) são de surpresa gerada essencialmente através da apresentação de nossas primeiras ideias. Os últimos encontros eu quero que sejam de frutificação, LIBERTAÇÃO das ideias e vontades de ambos os lados. Essa possibilidade de ir e vir, essa LIBERDADE que devemos ter dentro de nós mesmos, muitas vezes, nos dá medo. Medo das possibilidades. Medo da escolha de que caminhos nós trilharemos. Vertigem, sentimos vertigem em relação ao que virá. Entretanto, após superá-la e a vencermos, o que nos espera é uma sensação de recompensa e de surpresa, chegamos onde várias pessoas não conseguem. Nos permitimos chegar lá. Quero que a minha arquitetura seja também um abrigo aberto, um abrigo que lembre a Claudia que aquilo que ela tem de mais importante não é o parque das Serpentes e sim a sua arte. Um local que acolha as obras da Claudia e que automaticamente acolha o seu espírito. O que faz o lugar são as pessoas e não o próprio lugar em si. O parque das serpentes na verdade se encontra dentro da Claudia e não fora dela. Lembro também da Claudia ter nos dito uma vez que a serpente é o símbolo da mudança/transformação, pois se ela não mudar a sua pele ela acaba por morrer sufocada. Essa muda(nça) pode ser simbolizada pela pele que a serpente deixou para trás, mas que ainda a representa. Quero uma arquitetura que atue como a muda de uma serpente, uma arquitetura que lembre a todos a Claudia e os seus porquês mesmo que algum dia ela não queira estar mais lá.

Marina Orlandi Goulart MAPA (senti)MENTAL do Caminho das Serpentes

Partindo do impacto inicial que o local causa, consegue-se compreender parte

do universo que a artista vive. As cores vivas, o som, o abraço ao entrar faz parte do acolhimento e do convite à reflexão que o espaço proporciona. Os caminhos são os vícios criados, logo ao entrar se encontra a primeira escolha... Certamente que o caminho do mosaico é o primeiro caminho alternativo oferecido e que mais chama atenção e a curiosidade.

Mas antes de passearmos pelos caminhos, dividi o local em zonas, que

mesmo após o levantamento se mantiveram como a primeira impressão. Estas se caracterizam como personagens que fazem parte do local e de Claudia Sperb.

A Curiosidade, A Descoberta, A Transição, O Centralizador, O Reflexivo, O Limite/ou expansão, O Descentralizador, O Lúdico, O Desconhecido, O Adeus.

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A Curiosidade: O grande mosaico da entrada clama por olhares e impulsiona a conhecer o local.

A Descoberta: Momento em que se estabelece a primeira conversa entre local com o indivíduo. O final do primeiro caminho de mosaico, a biblioteca e os caminhos desenhados pela cobra de mosaico me instigaram a estagnar e me fazer transitar na mente. A quantidade de informações oferecida neste ponto me dificultou prosseguir com a caminhada, pela compreensão do caráter do território e, também, porque se encerra na próxima zona...

O Centralizador: O espaço de maior convívio. É a área que nega individualismo. Deduzo que isso seja resultado as condições de local mais alto e maior permeabilidade visual. Nesta zona, abrigam-se as conversas e discussões.

O Reflexivo: O caminho subsequente - também por curiosidade - leva ao Solário que proporciona a vista agradável de Morro Reuter. O local pede para pausar e refletir. Particularmente, é o momento mais paradoxal do trajeto, por estar numa situação bastante característica: observar de cima. Como num filme, é possível perceber os momentos mais frágeis quando a posição do observador está acima da cena, mesmo que a vista seja a mais admirável possível.

O Descentralizador: Voltando no trajeto, existe uma zona que encaminha para os outros rastros. Classifico desta forma, pois é uma zona de passagem, independente do movimento constante.

O Lúdico: Área de grande interação com os equipamentos e obras. Bastante nostálgico e agradável de transitar.

O Desconhecido: A copa fechada, juntamente com o declive, cria o cenário mais “sombrio” do local, mas não menos agradável. Incrivelmente, mesmo conhecendo a zona, sempre fica um silêncio sobre o local.

O Adeus: A última zona é um adeus repleto de reticências. As obras inacabadas deixam esclarecido que o passeio é inacabado. Ela pergunta e relata a espera para uma nova visita.

Os caminhos: Classifiquei os caminhos como Via Expressa e Alternativos. Via expressa,

pois é o caminho mais curto que atravessa o parque, que leva da entrada aO Centralizador, mas que não transparece a sensibilidade do local. Os alternativos são, em contraponto, trajetos que levam aos locais interessantes. Em alguns momentos as próprias obras se transformam em trajetos e quando se da conta, a via alternativa te leva a outros caminhos que saem de sua rota física.

primeira ideia: Num conceito geral do espaço, o Caminho das Serpentes - que faz jus ao

nome - é caracterizado por rastros e mudanças. Disso, surge a ideia de fazer um grande corredor em forma de rastro de cobra que desvia a vegetação pré-existente e define mais uma trajetória.

A forma é definida por caixas de madeira com articulações em vidro. Estas articulações são feixes de luz que direcionam a caminhada neste grande corredor. Embora não tenha sua função definida, encaixou-se em algumas opções:

- A Casa Monstro (de uma forma distinta ao pensamento da Claudia); - Corredor de exposição de xilogravura; - Corredor de exposição de outras obras. - Simples passagem; Existem dois espaços que possuem “vazios” artesanais. Os clarões dA

Descoberta/Transição e o escondido Desconhecido. No primeiro, faz-se interessante por desviar a rota da via expressa, mas o trajeto é facilmente direcionado para O

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Centralizador. Já no segundo, ao implantar algo nesta área o seu significado como “lado B” do Caminho das Serpentes pode se transfigurar e , assim como em todo o indivíduo e em todo o roteiro, esta característica faz-se necessária.

Vitória Spohr A poesia é, entre outras ínfimas possibilidades, a tradução do sentir. Do sentir

fervoroso ou insosso do poeta. Por vezes, é a individualidade do autor sangrando entre as palavras.

Mas ela ultrapassa o limite do que chamamos de pessoal: se a poesia toca, se a poesia TROCA, ela torna-se de duas pessoas no momento em que corremos os olhos sobre as palavras. Nesse instante, a poesia se torna nossa, só nossa. E mesmo assim ela é de outro também.

Sinto que há um gesto entre quem envia e quem recebe. Parece confidência. É isso que busco. Que seja minha poesia, mas que seja a poesia dos outros.

Busco a arquitetura do gesto, da troca. INTERAÇÃO. Eu espero essa troca. E desejo que o outro a aceite.

De outro lado, o meu olhar escoa sobre o terreno, as obras, a casa. Vejo tudo. Mas nada me chama mais atenção do que a sombra e a textura da luz criada pelas árvores úmidas. Capto delas o mistério. Para mim, é isso o que o lugar transmite e o que o lugar pede: MISTÉRIO.

Um novo pequeno enigma. Não um enigma que ofusque o fantástico da natureza, mas um que adicione e o complemente. Se os dois mistérios se chocarem no começo, não importa, desde que se cutuquem um pouco e depois andem juntos.

Espero um ambiente onde o mistério inspire a curiosidade. Onde haja o envolvimento de quem o vive. Para que haja a troca, a reciprocidade.

O meu poema é o mistério, a complementariedade com a natureza instigante. O meu poema é meu e, sobretudo, nosso. Camila Alberti

Logo que cheguei ao Caminho das Serpentes, a primeira questão que se

levantou foi por onde passaria a serpente e por onde eu passaria. Há o caminho ortogonal à estrada, que é o mais íngreme e conduz a uma casa; há o caminho por entre as árvores, que não tem caminho definido. E há o caminho à direita, que começa paralelo à estrada e, mais adiante, faz uma curva - parece que fui diretamente conduzida a ele. O caminho de mosaicos é diferente, é algo desconhecido que atrai por sua cor, disposição, dimensão e estranhamento. Ele é uma ponte entre o início (a entrada, penumbra) e o fim (pavimentação, casas, abrigo, familiaridade, luz). Ele é o primeiro meio de ligação do universo de outrem ao universo de cada um, é transição. Que pena entrar de carro no Caminho das Serpentes.

Todo o parque é cheio de surpresas. Parece que o terreno, como plano de fundo, é capaz de acolher e ser acolhido pelos mais diversos elementos, como obras de arte, construções, plantas, animais e pessoas, que também se acolhem entre si. Cada qual com sua essência, eles formam juntos o todo, mutável a cada novo encontro - seja ele perfeito ou não. Assim se forma o cenário físico e, de certo modo, imaginário que servirá às relações dos indivíduos, à alma do lugar.

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O ambiente do parque semelha ser hospitalar, visto que sua aura parece cuidar do indivíduo. Há pontos, contudo, que não me tocaram exatamente dessa maneira, pontos que eu senti um certo abandono, talvez proposital, como o bosque, a área em baixo da varanda da casa de hóspedes e o limite posterior esquerdo. Como pontos de acolhimento, tiveram especial efeito em mim a mesa redonda, a cobra de fogo, o jardim de esculturas e outros lugares de abraço. Inclusive a Cláudia, que com um carinho singular recebe o hóspede desconhecido, abre o seu universo – ela mesma e o seu parque - ao universo do outro.

A relação hospedeira/hóspede, no entanto, não é sempre equilibrada. Como ela disse, há pessoas que pensam que a artista está inclusa no pacote turístico e, por isso, não respeitam a sua privacidade, ou são mal-educadas, como aconteceu com um grupo de adolescentes. Em casos como esses, parece que o acolhimento não é possível, de modo a dar lugar à tolerância ou, até mesmo, à intolerância, ao impedimento. Como tudo mais, ela é hospedeira quando o hóspede é hóspede, e isso não acontece simultânea nem obrigatoriamente quando alguém reserva um quarto da pousada.

Se cada indivíduo é um universo, e se cada universo tem uma realidade diferente, então a percepção de cada espaço deve ser única para cada realidade, universo, indivíduo. A partir disso, quando penso em que tipo de intervenção eu faria no local, é natural que eu não tente impor diretamente o meu universo ao parque, mas que confluam as ideias que eu tenho sobre ele e sobre a Cláudia com as ideias dela, da artista, da hospedeira que poderá ser hospedada. Assim, acredito que as duas áreas em que isso poderia ser melhor traduzido são o bosque, por apresentar um potencial misterioso e por ainda não ter sofrido interferência, e o limite posterior do terreno, por sua vista maravilhosa, pela presença dos elementos terra, ar e água e, principalmente, pelo fato de ser limítrofe, ser início e ser final. Hoje, meu desejo aponta para a segunda opção e se expressa singelamente em:

Algo que não agrida a beleza natural do sítio, mas que se relacione intimamente com a terra e o barranco, com o verde e o azul. Modo de ponderar equilíbrio e tensão - estender, alargar, esticar, prolongar. Dar continuidade à natureza. Sensação de penetração na rocha e suspensão no céu, da tensão do escuro profundo enraizado à tensão da claridade que ilumina o vale. Da terra ao ar. À sensação de queda. Dentro ou fora do recinto? O reflexo, o outro no limiar, dentro e fora de si, abraçando tudo e sendo abraçado pelo todo. Um lugar que receba tudo e todos, que se transforme e transforme o outro. Outra forma de imaginar a imagem dos dois lados da borda.

Renata Saffer É um clichê dizer que o objetivo maior da arquitetura é abrigar o ser humano,

mas de fato é. Além disso, a arquitetura embeleza, emociona, acolhe. O ser humano acolhe

o outro no seu abrigo. No Parque das Serpentes a primeira coisa que ganhei foi um abraço. E ao

longo do tempo fui percebendo que o Parque, na verdade, é o abirgo da Cláudia. E que o abraço na entrada é a forma que a Cláudia demonstra que aquele local pode nos acolher.

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Ao entrar no Parque, a quantitade de árvores é imensa e tornam o lugar super aconchegante e convidativo. E a primeira impressão é que todo o Parque tem esse clima.

Porém,na verdade, ao caminhar pelo local, percebi que ele me trouxe muitas sensações e que ele tem espaços que trazem sentimentos muito diferentes.

Existe, também, a região do precipício, que traz sensações de liberdade e imensidão, quase o oposto do que ocorre quando estamos no meio das árvores.

Confesso que no início a imensidão me chamou mais atenção e não conseguia pensar em outro lugar para o projeto.

Mas, em uma das vezes que fui ao Parque, me surpreendi com um lugar. ele é uma mistura de imensidão, liberdade, acolhimento e paz. Para cada edificão ou ponto focal do parque, existe um caminho, feito com lindos mosaicos que nos enchem de alegria. para esse local, ainda não existem caminhos delimitados. Deve ser por isso que demorei para encontrá-lo.

Zona de Intervenção: Encontrei um local, lindo. Nele existem, hoje em dia, fragentos. Fragmentos

de troncos de árvore, de folhas, de ajulejos, de pedra... Todos eles formam esse lugar ideal.

Assim como o Parque das Serpentes é feito com os mosaicos da Cláudia e da natureza e de sentimentos, minha intervernção no parque também vai tentar se unir a esse mosaico, formando uma união de peças e fragmentos.

Para isso, vou fazer uma colagem de prismas, que são fragmentos de um outro prisma.

Um Espaço de “estar” Senti que no parque falta um espaço de “estar”, um lugar para reunião de

pessoas, de opiniões, de sentimentos e até mesmo de silêncio. Um lugar ideal para um lanche prazeroso, para ler um livro ou mesmo para

pensar na vida. Essa é a função do pequeno edifício que estou criando. é ser um local de relaxamento, abstração dos sentidos. São essas as vontades que eu sinto quando estou lá. Dai surge a ideia de criar um espaço acolhedor em meio delas. Elas dão vida ao local e não gostaria que essa sensação se perdesse.