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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 1 Aplicação de preference mapping Cláudio Carvalho e Leandra Neto Resumo: Preference mapping é um conjunto de técnicas estatísticas com o objetivo de explicar as preferências do consumidor para um conjunto de produtos, pelos perfis sensoriais obtidos por um painel de avaliadores treinados. É uma técnica que tem sido amplamente utilizada para ajudar investigadores a compreenderem os atributos sensoriais que conduzem à preferência do consumidor. Este procedimento requer uma caracterização objetiva de atributos sensoriais dos utos, obtida através de análise descritiva. Esta é então relacionada com classificações de preferência para o produto obtido a partir de uma amostra representativa dos consumidores. Os resultados podem, por exemplo, ajudar a decidir qual das várias formulações de produtos recém-desenvolvidos devem ir para lançamento no mercado e fornecer informações valiosas sobre o posicionamento da marca e os padrões de segmentação para a categoria de produto em estudo. Neste trabalho apresenta-se uma análise a esta temática que engloba um conjunto de técnicas estatísticas de análise sensorial como o preference mapping interno e externo. Aborda-se também as principais características destas duas dimensões, a sua aplicação, como decorre a análise de resultados e alguns softwares aplicados a esta análise. Alguns exemplos são também apresentados para melhor elucidar e representar estas aplicações. Apesar do aumento de popularidade destas técnicas na área de consumo alimentar, a sua metodologia encontra-se em constante evolução e otimização para que se torne mais simples e exata a sua aplicabilidade. Submetido a 23/04/2014. Os autores são mestrandos das Faculdades de Ciências e de Ciências da Nutrição e Alimentação, Universidade do Porto, Rua do Campo Alegre, 4169-007 Porto. Questões sobre o estudo devem ser remetidas a Cláudio Carvalho ou a Leandra Neto (E-mails respetivamente, [email protected] ou [email protected]).

Aplicação de preference mapping

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Abril de 2014 | “Aplicação de preference mapping“, no âmbito da unidade curricular de Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos do Mestrado em Ciências do Consumo e Nutrição da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e da Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP). Autores: Cláudio Carvalho; Leandra Neto. Avaliação: 18 em 20 valores.

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 1

Aplicação de preference mapping Cláudio Carvalho e Leandra Neto

Resumo: Preference mapping é um conjunto de técnicas estatísticas com o objetivo de explicar

as preferências do consumidor para um conjunto de produtos, pelos perfis sensoriais obtidos

por um painel de avaliadores treinados. É uma técnica que tem sido amplamente utilizada para

ajudar investigadores a compreenderem os atributos sensoriais que conduzem à preferência do

consumidor. Este procedimento requer uma caracterização objetiva de atributos sensoriais dos

utos, obtida através de análise descritiva. Esta é então relacionada com classificações de

preferência para o produto obtido a partir de uma amostra representativa dos consumidores.

Os resultados podem, por exemplo, ajudar a decidir qual das várias formulações de produtos

recém-desenvolvidos devem ir para lançamento no mercado e fornecer informações valiosas

sobre o posicionamento da marca e os padrões de segmentação para a categoria de produto em

estudo.

Neste trabalho apresenta-se uma análise a esta temática que engloba um conjunto de técnicas

estatísticas de análise sensorial como o preference mapping interno e externo. Aborda-se

também as principais características destas duas dimensões, a sua aplicação, como decorre a

análise de resultados e alguns softwares aplicados a esta análise.

Alguns exemplos são também apresentados para melhor elucidar e representar estas aplicações.

Apesar do aumento de popularidade destas técnicas na área de consumo alimentar, a sua

metodologia encontra-se em constante evolução e otimização para que se torne mais simples e

exata a sua aplicabilidade.

Submetido a 23/04/2014. Os autores são mestrandos das Faculdades de Ciências e de Ciências da Nutrição e

Alimentação, Universidade do Porto, Rua do Campo Alegre, 4169-007 Porto. Questões sobre o estudo devem ser

remetidas a Cláudio Carvalho ou a Leandra Neto (E-mails respetivamente, [email protected] ou

[email protected]).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 2

Introdução

A técnica do preference mapping tem como

objetivo alcançar um conhecimento mais

profundo sobre o posicionamento dos

produtos, quer da própria empresa quer das

concorrentes, sendo uma ferramenta

importante para a gestão de portefólio de

produtos (MacFie 2007). Ao nível da gestão

estratégica e do marketing, esta técnica – se

corretamente aplicada - pode, por exemplo,

ajudar a desenvolver o processo de

segmentação do mercado, de forma bem

definida, em grupos de consumidores mais

reduzidos (Helgesen et al. 1997). As valências

desta técnica não se ficam por aqui e podem,

também, auxiliar no desenvolvimento de

novos produtos e na reformulação de produtos

existentes, estando, assim, igualmente

alinhada com a vertente da investigação,

desenvolvimento e inovação (I&D+i) de uma

organização (MacFie 2007).

Esta técnica de estatística multivariada centra-

se na modelação da relação entre as

preferências dos consumidores e os perfis

sensoriais dos diferentes produtos (Tijskens et

al. 2001, Meullenet et al. 2007) e terá tido a

sua génese num artigo de 1972 do matemático

1 Visualizar, como "recomenda" MacFie (2007),

por exemplo, as publicações que constam do

"Journal of Sensory Studies"

(http://onlinelibrary.wiley.com/journal/10.1111/(I

SSN)1745-459X), do "Food Quality and

Preference"

J. D. Carroll: A sua primeira aplicação terá

ocorrido em 1976, no setor alimentar,

nomeadamente em carne (Horsfield e Taylor

1976, MacFie 2007). Desde aí a técnica tem

vindo a ser alvo de interesse e inerente estudo

académico e científico1, mas os grandes

disseminadores dos conceitos aliados a esta

técnica são, essencialmente, os profissionais

ligados ao mercado alimentar europeu e norte-

americano, particularmente investigadores na

área sensorial e de recursos humanos afetos à

realização de estudos de mercado(s) (MacFie

2007).

Apesar da importância da opinião do

consumidor e das inerentes técnicas e

ferramentas de business e consumer

intelligence desenvolvidas pelas organizações

para avaliar o comportamento do consumidor

e, consequentes, políticas de desenvolvimento

de novos produtos, a técnica do preference

mapping toma particular relevo se atentarmos

ao facto de que, apesar dos consumidores

serem clarividentes quanto ao facto de

afiançarem gostar ou não de determinado

produto, não são tão claros em descrever os

motivos associados a tais preferências (van

Kleef et al. 2006).

Desenvolvida que está, ainda que de forma

sumária, a conceptualização temática e a

(http://www.journals.elsevier.com/food-quality-

and-preference/) e do "Journal of Food Science"

(http://onlinelibrary.wiley.com/journal/10.1111/(I

SSN)1750-3841).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 3

contextualização histórica, apresentar-se-ão,

de seguida, descrições mais detalhadas sobre a

técnica em análise, juntamente com extratos

do que consideramos mais relevante de

determinados estudos desenvolvidos, para

facilitar a compreensão sobre o objeto de

estudo. Posteriormente, apresentar-se-á, uma

referência sintética aos softwares utilizados

para efeitos de modelização e, findar-se-á,

com a conclusão da revisão bibliográfica aqui

exposta, assim como das respetivas

referências bibliográficas.

Conceptualização: “Preference

Mapping” Interno e “Preference

Mapping” Externo

Esta técnica pode ser subdividida em duas

categorias: uma análise de cariz interno,

denominada de multidimensional preference

analysis (ou simplesmente, MDPREF) e, outra

de cariz externo, denominada, simplesmente,

por preference mapping (recorrentemente,

aparecendo designada como PREFMAP)

(Helgesen et al. 1997, Yenket et al. 2011).

Quanto a esta segunda categoria, outros

autores preferem denomina-la como

preference mapping externo (Meullenet et al.

2007, Lovely e Meullenet 2009). Ambas as

técnicas são "tipicamente avaliadas com base

em critérios exclusivamente estatísticos" (van

Kleef et al. 2006) e têm objetivos similares, ou

seja, visam analisar as dimensões subjacentes

para analisar as preferências e escolhas dos

consumidores, contudo a opção por uma das

técnicas não é arbitrária, visto que "fornecem

uma perspetiva diferente sobre a mesma

informação" (van Kleef et al. 2006).

Segundo van Kleef et al. (2006), a análise

interna faz prevalecer as preferências dos

consumidores, recorrendo

complementarmente a informações de

perceção. Os mesmos autores, sobre a análise

externa, consideram que esta "dá prioridade à

informação percetual com base em avaliações

de atributos" e só, posteriormente atenta para

as preferências dos consumidores. Neste

sentido, a Tabela 1 descreve as principais

diferenças entre este tipo de análises.

Tabela 1: Visão global das principais diferenças entre a "análise de preferência interna" e a "análise preferência

externa". Fonte: van Kleef et al. (2006).

Análise de preferência interna Análise preferência externa

Primazia da Preferência Perceção

Posições do

produto no mapa

dão relevo à variação na

preferência/gosto

dão relevo à variação na

perceção/similaridade (dados de ordem

sensorial, muitas vezes)

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 4

Primeira

dimensão

explica a variabilidade máxima em

direções preferenciais entre estímulos

ao nível do produto

explica a variabilidade máxima em

direções do foro da perceção (e.g.

sensorial) entre estímulos ao nível do

produto

Informação/Dado

s relativos às

preferências

fomenta a orientação do espaço do

produto

é suplementar/complementar: adaptada

ao espaço da perceção "fixo" do

produto

Informação/Dado

s relativos às

perceções

é usada como fonte de informação

complementar/suplementar: adaptada

ao espaço preferencial "fixo" do

produto

fomenta a orientação do espaço do

produto

De seguida, explorar-se-á, de forma separada,

cada uma destas categorias. Atente-se que uma

das primeiras decisões prévias à aplicação de

qualquer uma das técnicas (interna ou externa)

é se se usam ou não dados normalizados, i.e.

se se usam matrizes de correlações ou de

covariâncias, respetivamente. Tal será

referenciado na secção seguinte.

Preference Mapping Interno

A primeira categoria – i.e. preference mapping

interno ou MDPREF - recorre aos resultados

da avaliação hedónica ou afetiva - ou, vulgo

"gosto" - por parte dos consumidores face a

determinadas características sensoriais de

produtos, possibilitando a representação

multidimensional de produtos e consumidores

num espaço comum (Meullenet et al. 2007).

A representação multidimensional dos

produtos e consumidores pelo preference

mapping interno é obtida através da análise de

componentes principais (ACP), pela

organização de uma matriz de produtos (nas

linhas) e de consumidores (como variáveis ou

colunas), “do mesmo modo que a ACP

identifica a maior fonte de variação e extrai

estas como componentes” (Fernandes et al.

2009). As componentes principais avaliadas

são habitualmente referidas como dimensões

preferenciais e para cada produto (ou

amostras) e consumidor, os dados usados estão

associados aos resultados da avaliação

hedónica supra referidos (Meullenet et al.

2007). Todavia, tipicamente, é utilizada a

matriz de covariância ao invés da matriz de

correlação (matriz não normalizada),

característica da ACP, de acordo com Naes e

Risvik (1996). Em consequência deste

processo de análise, obtém-se um mapa de

amostra ou produto e um mapa de consumidor,

como veremos adiante dois exemplos, com

abordagens diferentes. Naes e Risvik (1996)

referem, ainda, que o resultado desta técnica é

um mapa exemplo, baseado na informação,

providenciada por cada consumidor, de

aceitabilidade de um produto. Em

consequência, poder-se-á realizar análises de

Page 5: Aplicação de preference mapping

2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 5

segmentação dos consumidores e visualizar as

direções das preferências dos consumidores ou

poder-se-á, também, recorrer ao algoritmo de

classificação usando os parâmetros da ACP.

Atente-se que quanto mais complexa é a

estrutura das preferências da população em

análise, maior será o número de componentes

principais necessários para interpretar a

informação, todavia não é recomendável a

utilização de mais do que duas dimensões.

Destaca-se, desta feita, algumas das vantagens

e desvantagens da técnica preference mapping

interno, segundo Naes e Risvik (1996):

Como vantagens:

Mais fácil de usar e entender que o

mapeamento de preferência externo,

pois é semelhante à análise de

componentes principais.

Permite que as dimensões reais de

preferência sejam determinadas, uma

vez que são usados apenas os dados de

aceitação dos consumidores.

Pode ser usado como um

procedimento de triagem sem perfis

sensoriais, para a obtenção de

amostras dignas para o

desenvolvimento de trabalhos a nível

sensorial e de consumidor.

2 Bebida à base de goiaba adoçado com as seguintes

alternativas: Sacarose; Aspartame; mistura

Sacarina + Ciclamato de sódio + Acesulfame-K;

Como desvantagens:

O programa falha quando são usadas

mais de duas dimensões em termos de

interpretação.

A variância percentual representada

pelas diferentes dimensões é

frequentemente baixa.

Atente-se agora para dois exemplos onde esta

técnica foi aplicada.

Estudo-exemplo I: O estudo de Fernandes

et al. (2009) como exemplo

Tome-se como exemplo o que consta do

estudo de Fernandes et al. (2009). Tendo por

base dados obtidos previamente, fruto de

testes de aceitação, em consumidores, de seis

tipos de formulações diferentes de uma

determinada bebida (neste caso de uma bebida

de goiaba)2, foi criado um mapa de preferência

interno face a um determinado atributo em

análise (neste caso que apresentamos como

exemplo, o atributo "sabor"). Como supra

referido, temos um mapa - cujas coordenadas

são as componentes principais e em que a

componente principal 1 explica 70,2% da

variância e a componente principal 2 explica

10,2% - para cada formulação, amostra ou

Estévia; mistura Ciclamato + Sacarina; e,

finalmente, Acesulfame-K.

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 6

produto (vd. figura do lado esquerdo) e

consumidores (vd. figura do lado direito).

Figura 1: Mapa de preferência interno para o atributo sabor de uma bebida de goiaba com a adição de Sacarose;

Aspartame; mistura Sacarina + Ciclamato de sódio + Acesulfame-K; Estévia; mistura Ciclamato + Sacarina;

Acesulfame-K. Fonte: Fernandes et al. (2009).

Observando-se a figura à esquerda, constata-

se a formação de dois grupos, a saber: a)

Sacarose; Aspartame; Sacarina + Ciclamato de

sódio + Acesulfame-K e b) Estévia; Ciclamato

+ Sacarina, sendo que c) Acesulfame-K ficou

isolada. A figura à direita informa-nos,

atentando a que não se registaram pontos (i.e.

provedores) no centro do mapa - ponto

(0,0;0,0) -, que não "todos discriminaram as

amostras em relação ao sabor".

Concomitantemente, constata-se que a

preferência dos consumidores recai

predominantemente para o grupo a) e alguns

consumidores aproximam-se da preferência

por Acesulfame-K (i.e. c)). O mesmo estudo

que estamos a tomar como exemplo faz análise

análoga para o atributo "doçura" e, ainda, faz

uma avaliação global.

Estudo-exemplo II: Meullenet et al. (2007)

como estudo-exemplo

Tomando-se outro exemplo que consta do

estudo de Meullenet et al. (2007),

nomeadamente um mapa de preferência

interno obtido pelos dados de aceitação global

de 80 consumidores relativamente a 11 tipos

de snacks de tortilhas (vd. Figura 2).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 7

Figura 2: Mapa de preferência interno relativos à aceitação global de snacks de tortilhas de milho brancas, com

representação dos diferentes tipos de produtos e dos consumidores. Fonte: Meullenet et al. (2007).

Atente-se às coordenadas: as duas dimensões

preferenciais explicam 42,62% da variância e

se fosse incluída uma terceira dimensão, a

variância dos dados seria explicada em

55,33%. Os pontos são referentes às 11

amostras do produto em causa, as “retas a

tracejado” – denominados no estudo por

vetores - representam a direção de aumento do

gosto ou afeto para cada consumidor e o

tamanho do vetor é diretamente proporcional

à variância explicada pelas dimensões

preferenciais selecionadas para cada

consumidor (Meullenet et al. 2007). Tendo em

conta o exposto, observa-se que a maior parte

dos consumidores prefere o produto

respeitante à SAN (Santita’s), TBS (Tostito’s

bite size) e TRS (Tostito’s restaurant style) e

que há pouca segmentação dos consumidores,

não obstante um dos objetivos principais desta

análise seja “visualizar a segmentação dos

consumidores” (Meullenet et al. 2007). Se os

vetores não estiverem concentrados numa só

direção do mapa – como acontece com a figura

supra disposta -, mas distribuídos pelos quatro

quadrantes, verifica-se a possibilidade de

segmentar o mercado.

Preference Mapping Externo

Neste ponto, debruçar-nos-emos sobre o

preference mapping externo, que pode ser

obtido por intermédio de diversas técnicas

estatísticas disponíveis (Yenket et al. 2011).

De forma simplificada, o preference mapping

externo ou PREFMAP - recorre a

características sensoriais ou a uma

caracterização instrumental de produtos para

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 8

fornecer uma representação multidimensional

de produtos, características sensoriais e/ou

instrumentais e consumidores num mesmo

espaço (Meullenet et al. 2007). Ou seja,

representa-se multidimensionalmente

produtos segundo o seu perfil sensorial ou de

acordo com um conjunto de dados obtidos

instrumentalmente como cor, textura ou sabor.

Considerando o exposto, “a representação é

obtida pela análise de componentes principais

de uma matriz de dados com produtos nas

linhas e dados externos como variáveis ou

colunas” (Meullenet et al. 2007).

Segundo Naes e Risvik (1996), o estudo dos

dados pode simplesmente ser considerada uma

análise estatística de regressão nos dados,

onde as dimensões do perfil do espaço são

variáveis independentes, enquanto a aceitação

são as variáveis dependentes. Na prática,

existem dois tipos de comportamento de

preferência: o que se encaixa numa regressão

linear (modelo vetor) e aquele que se encaixa

numa regressão quadrática (modelo ponto

ideal):

Modelo de vetor

O modelo de vetor (vd. Figura 3) pertence ao

comportamento "quanto mais, melhor" típico

de aceitação o que significa, que não existe

qualquer amostra que é percebida como tendo

muito ou pouco das características que

determinam aceitabilidade. Na prática, a

equação de regressão linear múltipla, é

determinada para cada um dos consumidores,

e a partir deste surge um vetor que descreve a

direção de preferência crescente que pode ser

descrita no espaço de amostragem.

De acordo com Hough e Sanchez (1998), o

algoritmo do preference mapping externo

implica quatro fases, sendo que a quarta é

respeitante à que "implica uma relação direta

entre uma ou mais características que

aumentam ou diminuem ao longo do espaço de

estímulo" (modelo de vetor) e as restantes três

serão descritas mais adiante (vd. modelo de

ponto ideal).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 9

Figura 3: Representação gráfica do modelo de vetor (fase 4). Fonte: Naes e Risvik (1996).

Modelo de ponto ideal

O modelo de ponto ideal pertence também ao

comportamento do tipo aceitação mas já

considera que “uma certa quantidade é ideal".

Basicamente, isto significa que existem

amostras no espaço, que são vistas como tendo

quantidades excessivas ou insuficientes de um

ou mais, dos atributos sensoriais. Subjacente

ao modelo de ponto ideal é a suposição de que

há alguma combinação de atributos que

tornam o produto ideal. No entanto, pode ser

errado assumir que cada consumidor tem

apenas um produto ideal.

Existem três tipos de modelo de ponto ideal,

sendo que quanto menor o número de fase,

mais complexo (e específico) é o modelo:

(i) o modelo de ponto ideal circular

(ou modelo fase 3 ou III) – vd.

Figura 4;

(ii) o modelo de ponto ideal elíptico

(ou modelo fase 2 ou II) – vd.

Figura 5;

(iii) e o modelo de ponto ideal elíptico

com rotação (ou modelo fase 1 ou

I) – vd. Figura 6.

Todos os pontos ideais podem ser positivos ou

negativos. Um ponto ideal positivo representa

um ponto de máxima preferência, enquanto

um ponto ideal negativo é um ponto de

repulsão.

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 10

Figura 4: Representação gráfica do modelo de ponto ideal (fase 3). Fonte: Naes e Risvik (1996).

Figura 5: Representação gráfica do modelo de ponto ideal (fase 2). Fonte: Naes e Risvik (1996).

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Figura 6: Representação gráfica do modelo de ponto ideal (fase 1). Fonte: Naes e Risvik (1996).

Aqui, também segundo os autores Hough e

Sanchez (1998), na fase III existe uma

distância fixa relativamente ao ponto ideal,

pelo que a aceitação é constante

independentemente da direção; na fase II, as

dimensões do espaço de estímulo não

contribuem igualmente para o modelo de

aceitação; e, finalmente, "para a fase I dos

eixos de contorno são rodados entre as

dimensões".

Esta representação, ainda que sendo

provavelmente mais popular que a do

preference mapping interno, é alvo de críticas

por parte de alguns autores, como referem

Meullenet et al. (2007). Tal deve-se ao facto

da representação do preference mapping

externo ser obtida por intermédio de dados

externos isolados sem hierarquização de

preferência dos atributos por parte dos

consumidores e, consequentemente, a

representação obtida pode não ter relevância

para a avaliação da aceitabilidade dos produtos

por parte do consumidor (Meullenet et al.

2007). A senda desta abordagem crítica,

sumaria-se em seguida algumas das vantagens

e desvantagens da técnica preference mapping

externo (Naes e Risvik 1996):

Como vantagens:

Oferece um procedimento direto para

relacionar a informação sensorial e do

consumidor e posterior otimização do

produto.

Ajuda a identificar novos mercados.

Fornece orientação para o

desenvolvimento futuro de produtos.

Fornece informações sobre a

segmentação de mercado, no que diz

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 12

respeito às preferências sensoriais.

Pode identificar a necessidade de

fazer produtos alternativos para

diferentes segmentos de mercado.

Através de amostras de mercado, a

técnica pode ser o primeiro passo na

procura de produtos atualmente

disponíveis para o consumidor, antes

de desenvolver formulações

específicas para um estudo mais

detalhado.

Como desvantagens:

É muitas vezes necessário um número

elevado de amostras (por exemplo,

12-20), para garantir que o mapa de

preferência possa ser realizado com

sucesso.

Cada consumidor deve avaliar todas

as amostras apresentadas para o

julgamento no mesmo momento.

Pode ter custos elevados.

Pode ser difícil a programação do

procedimento devido à complexidade

do programa de mapeamento.

Os dados de preferência nem sempre

são diretamente relacionados com o

mapa de perfil sensorial, devido à

forma como os provadores treinados

têm perceção diferente dos produtos

em relação aos consumidores.

Tende a ser utilizado para a

compreensão e direção, não previsão.

Nem todos os consumidores são bem

representados pelos modelos.

Observem-se mais dois exemplos mas, desta

feita, para a técnica de preference mapping

externo.

Estudo-exemplo III: O estudo de Peçanha

et al. (2006)

Tomando este último estudo referenciado

como meramente ilustrativo, apresenta-se de

seguida uma figura relativa ao mapa externo

da preferência de oito marcas do produto em

estudo (vd. pontos A a H) e apresentando, de

igual forma, os atributos sensoriais3.

3 A saber: Cor Vermelha (codificado como

"CorVerm"); Aparência da superfície de corte

(codificado como "ApSupCor"); Presença de

partículas (codificado como "PresPart"); Brilho;

Aroma de goiabada caseira (codificado como

"ArGdaCas"); Aroma de goiaba verde (codificado

como "ArGVerde"); Sabor de goiaba (codificado

como "SabG"); Sabor de goiabada (codificado

como "SabGda"); Gosto doce (codificado como

"Gdoce"); Acidez; Sabor estranho (codificado

como "SabEstr"); Resistência ao mastigar

(codificado como "ResMast"); Resistência ao corte

(codificado como "RseCort"); Firmeza.

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Figura 7: Mapa de preferência externo representando amostras de oito marcas (pontos A a H) e atributos

sensoriais. Fonte: Peçanha et al. (2006).

Com esta imagem constata-se que as

componentes principais em estudo

contribuíram para 69,8% da variância, sendo

50,1 respeitante à dimensão 1 (agrupamento

de atributos de aparência como a cor, aroma,

sabor e textura) e 19,7% à dimensão 2

(agrupamento de atributos associados à

aparência, como a aparência da superfície de

corte e a presença de partículas) (Peçanha et

al. 2006). Uma outra figura (vd. abaixo) do

mesmo estudo que mostra a “direção da

preferência [de] dois segmentos de

consumidores” – obtido através de análise de

cluster -, demonstra que a amostra da marca F

é a menos preferida face aos dois segmentos

apresentados e, adicionalmente, permite-se

observar que: (i) os consumidores do

segmento 1 preferem as amostras das marcas

E, D, B e A que valorizaram mais os atributos

de “aparência (cor vermelha e brilho), textura

(firmeza, resistência ao corte e resistência ao

mastigar) e sabor (sabor de goiaba e gosto

doce) ” (Peçanha et al. 2006); (ii) os

consumidores do segmento 2 preferem as

amostras das marcas H, G e C, associado a

“atributos de aparência (cor vermelha e

brilho), textura (firmeza, resistência ao corte e

resistência ao mastigar) e sabor (sabor de

goiaba e gosto doce) [ainda que menos

intenso] ” (Peçanha et al. 2006).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 14

Figura 8: Mapa de preferência externo representando amostras de oito marcas (pontos A a H) e a direção da

preferência dos dois segmentos de consumidores identificados. Fonte: Peçanha et al. (2006).

Estudo-exemplo IV: O estudo de Hough e

Sanchez (1998)

Um dos três objetivos traçados por este estudo

escolhido como exemplificativo (i.e. estudo

"Análise descritiva e preference mapping

externo do leite em pó chocolate" referente a

1998) foi de "relacionar o perfil sensorial com

a aceitabilidade do consumidor, recorrendo ao

preference mapping externo" (Hough e

Sanchez 1998).

Na figura abaixo disposta - i.e. Figura 9 -

poder-se-á visualizar um preference map

externo para o ponto ideal circular, ou modelo

fase III, em que são tidas como componentes

principais: a preferência global e a

aparência/textura. Atentando à figura exposta,

observa-se que para a média dos

consumidores, o ponto ideal encontra-se na

região nas amostras 1, 4 e 5 (Hough e Sanchez

1998).

Page 15: Aplicação de preference mapping

2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 15

Figura 9: Preference map externo para o modelo de ponto ideal circular. (Notas: os números representam

amostras; o asterisco representa o consumidor médio para o modelo circular; o triângulo o consumidor médio

para o modelo de ponto ideal elíptico, considerando todos os consumidores; o quadrado considera apenas

consumidores que se adequam ao modelo elíptico). Fonte: Hough e Sanchez (1998).

Todavia, se se atentar ao mapa de uma

dimensão aroma/sabor (vd. Figura 10),

constata-se que se pode desenvolver um

produto que procure alcançar um consumidor

médio ou um grupo de consumidores com

preferências específicas; até porque os adultos

encontram-se menos dispersos nos mapas do

que as crianças (Hough e Sanchez 1998).

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2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 16

Figura 10: Distribuição dos pontos referentes ao consumidor ideal ao longo da componente principal aroma/sabor,

usando modelo de ponto ideal de representação unidimensional. (Nota: os números representam amostras; x

representa a posição do consumidor médio). Fonte: Hough e Sanchez (1998).

Softwares como recursos ao “dispor” do

preference mapping

Como nota final, importa referir brevemente

alguns dos softwares que podem ser utilizados

para criar os diferentes mapas.

Os autores Meullenet al. (2007) destacam que

o preference mapping interno pode ser

desenvolvido com recursos a diversos

programas informáticos, como por exemplo:

SAS, SensGear, Senstools, Systat e MDSX.

Por sua vez, para efeitos da análise na vertente

do preference mapping externo, regista-se o

uso do software XLSTAT-MX, a título

exemplificativo (e.g. ver estudo de Peçanha et

al. (2006)).

Não tendo, este trabalho académico, por

missão, estudar exaustivamente esta matéria,

sugere-se a leitura do estudo de Yenket et al.

(2011) que fazem uma comparação de sete

técnicas de preference mapping usando quatro

programas informáticos diferentes. Referência

para alguns "apontamentos" dignos de

destaque, nomeadamente que "nenhum dos

métodos aplicados providencia uma imagem

completa da interação dos gostos do

consumidor, produtos e características dos

produtos" (Yenket et al. 2011) e que a

interpretação dos mapas não é direta.

Conclusão

Com esta revisão bibliográfica foi possível

perceber em que consiste o preference

Page 17: Aplicação de preference mapping

2014 © Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos 17

mapping e as suas aplicações. Verifica-se que

a capacidade de uma empresa para produzir

um produto que satisfaz as necessidades dos

consumidores, otimização de produtos (em

termos de preferência do consumidor que

consequentemente agradam a um maior leque

de consumidores) passa pela utilização desta

técnica e interpretação dos seus resultados. A

preferência dos consumidores por

determinado alimento depende de fatores

distintos, que podem estar relacionados com o

próprio produto, com o consumidor ou com o

ambiente que o rodeia pelo que é possível

relacionar estes fatores e perceber as

necessidades do consumidor e como colmatá-

las. Através dos estudos apresentados (a título

de exemplo) conhece-se a aplicabilidade desta

técnica. São também abordados em síntese

alguns softwares que são usados para o

processamento de resultados. Estudos mais

aprofundados de preference mapping poderão

contribuir para aumentar o seu uso assim como

a sua versatilidade.

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