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Ano Letivo de 2011/2012 Introdução ao Direito (Licenciatura em Contabilidade e Auditoria)

Aplicação das leis no tempo

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Trabalho Universitário

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Page 1: Aplicação das leis no tempo

Ano Letivo de 2011/2012

Introdução ao Direito

(Licenciatura em Contabilidade e Auditoria)

Trabalho de Grupo

Barcarena, 23 de Junho de 2012

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

Aplicação das leis no tempo

(Código Civil Artº12 e Artº 13)

Trabalho de Grupo

Discentes:

Liliana Sofia Rosa Fernandes – 20111511;

Maria José Rato Rodrigues – 20111514;

Dora Rosa – 20111499

Regente: Prof.ª Doutora Anja Bothe

Barcarena

23 de Junho de 2012

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

Resumo

Aplicação das leis no tempo - Código Civil, Artº12º e Artº 13º

O principal objetivo deste nosso trabalho foi abordar o mais exaustivamente possível a

temática da “Aplicação das leis no tempo”, tendo como base os Artºs 12º e 13º do

Código Civil.

Tratando-se de um trabalho essencialmente de pesquisa, recolhemos o máximo de

informação publicada e procedemos à sua análise, dando exemplos elucidativos das

variadíssimas componentes de que se reveste esta matéria.

Pretendemos, desta forma, poder contribuir com a nossa opinião sobre o que nos foi

lecionado, dando prova dos conhecimentos adquiridos tanto em aula como em pesquisas

efetuadas pelo nosso grupo de trabalho.

Palavras-chave: Código Civil, Constituição da República Portuguesa, Aplicação das leis

no tempo, retroatividade das leis.

Abstract

Application of laws in time - Civil Code, 12th and 13th Articles

The main objective of our work was to make an approach, as comprehensively as

possible, to the theme “Application of laws in time”, having based our criteria on the

Portuguese Civil Code, 12th and 13th Articles.

Dealing with a complex area of law, mainly based on research, we have gathered as

much published information as possible, we did its analysis and we gave some possible

examples showing the complexity of it.

With this work we want to contribute with our opinion on this subject and show all we

have learned and the enriched knowledge we were taught in class.

Keywords: Portuguese Civil Code, Portuguese Constitution of the Republic,

Application of laws in time, law retroactivity

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

Índice

Resumo..............................................................................................................................3

Aplicação das leis no tempo - Código Civil, Artº12º e Artº 13º...................................3

Abstract..............................................................................................................................3

Application of laws in time - Civil Code, 12th and 13th Articles...................................3

1. Introdução......................................................................................................................5

2. Aplicação das leis no tempo..........................................................................................6

2.1. Factos e Relações Jurídicas....................................................................................8

2.2. O que se entende por validade ou elemento substancial no contexto do anteriormente preceituado?.........................................................................................11

2.3. “Alteração de prazos”...........................................................................................14

2.4. Leis interpretativas...............................................................................................15

2.5. Excepções ao Principio da não retroatividade......................................................17

2.6. Disposições Transitórias.......................................................................................18

3. Conflito de leis no tempo............................................................................................18

4. A não retroatividade da lei..........................................................................................19

5. Graus de retroatividade das leis...................................................................................20

6. Resolução de caso prático...........................................................................................22

7. Conclusão....................................................................................................................24

BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................26

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

1. Introdução

O principal objetivo deste nosso trabalho é abordar o mais exaustivamente possível a

temática da “Aplicação das leis no tempo”, tendo como base, principalmente os Artºs

12º e 13º do Código civil.

Tratando-se de um trabalho essencialmente de pesquisa, procedemos à recolha do

máximo de informação publicada, procedemos à sua análise, dando exemplos

elucidativos das variadíssimas componentes de que se reveste esta matéria com maior

enfoque sobre a sua vertente jurídica, com o fim de ilustrarmos a verdadeira

complexidade deste tema, como tantos outros em matéria de Direito,

Pretendemos, desta forma, poder contribuir com a nossa opinião sobre o que nos foi

lecionado, dando prova dos conhecimentos adquiridos tanto em aula como em

pesquisas efetuadas pelo nosso grupo de trabalho e tendo sempre em mente:

“Assim, a investigação científica do jurista há-de fazer-se por meio de três

dimensões:

interpretativa,

sistemática e

crítica.”

(Germano Marques da Silva, Introdução ao Estudo do Direito, Universidade Católica

Editora, 2009, p. 20)

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2. Aplicação das leis no tempo

Como tudo, desde tempos imemoráveis,

também o Direito tem um conteúdo variável

no tempo e no espaço e, por isso, é constante

e universal mas, não é uniforme.

Sendo o Código Civil um decreto-lei que, pela sua natureza, integra uma faculdade do

Governo conferida pela Constituição da República Portuguesa, importa, antes de

abordarmos propriamente o tema principal do nosso trabalho de grupo, fazer um

enquadramento deste mesmo Código Civil que é o diploma fundamental do Direito

Civil, retendo a ideia de que, Código é a designação dada a uma lei que reúne toda a

regulamentação de um certo ramo de direito ou parte importante deste.

Segundo a Constituição da República Portuguesa, que enquadra os valores

fundamentais da nossa ordem jurídica (de acordo com a redação dada pela Lei

Constitucional 1/2005, de 12 de Agosto), em texto aprovado na Assembleia da

República em 22 de Junho de 2005, na Parte III – Organização do Poder Político, no seu

“Artigo 112º - Actos normativos, nº. 1 – São actos legislativos as leis, os decretos-leis e

os decretos legislativos regionais; nº. 2 – As leis e os decretos-leis têm igual valor, …

dos regimes jurídicos”. (CRP – Parte III – Artº. 112º)

Atento o parágrafo anterior temos que o Código Civil é uma fonte de direito (direito

objetivo, direito positivo), por oposição, por exemplo, ao estipulado no artigo 161º

alínea d) da Constituição da República Portuguesa em que é a Assembleia da República

que confere ao Governo autorizações legislativas, originando leis meramente formais e

que não são consideradas diretamente fontes de direito.

Então, o Código Civil, pode considerar-se, enquanto Decreto-Lei, igualmente uma lei

em sentido material e, hierarquicamente, uma norma de direito universal, dentro das

normas jurídicas estaduais.

Reportando-nos, ainda, à parte III da Constituição da Republica Portuguesa que diz

respeito à Organização do Poder Político podemos, novamente, constatar que, pela

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“Competência Legislativa” do Governo que, em termos de hierarquia se encontra no

topo da Administração, dispondo, por isso, de poder de direção, no Artigo 198º, alínea

a), compete ao Governo “fazer decretos-leis em matérias não reservadas à Assembleia

da República”. (Constituição da República Portuguesa – Parte III – Artº. 198º, alínea a)

Está, no entanto, o Governo, nesta matéria, condicionado pelo estabelecido no Artigo

277º, nº. 1 da Constituição da República Portuguesa que diz: “São inconstitucionais as

normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”.

(Constituição da República Portuguesa – Artº. 277º, nº. 1)

Passando então ao tema principal do nosso trabalho de grupo, vamos tentar analisar ao

pormenor os artigos 12º e 13º do Código Civil, que damos aqui por transcritos:

“ARTIGO 12.º

Aplicação das leis no tempo. Princípio geral

1 - A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva,

presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se

destina a regular.

2 - Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de

quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os

factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações

jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange

as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

ARTIGO 13.º

Aplicação das leis no tempo. Leis interpretativas

1 - A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos

já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por

transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza.

2 - A desistência e a confissão não homologadas pelo tribunal podem ser revogadas

pelo desistente ou confitente a quem a lei interpretativa for favorável.”

(Fonte: Código Civil, 2ª Ed. – Códigos Universitários), Edições Almedina, Setembro 2011)

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Comecemos, então, por fazer uma abordagem mais teórica, “escalpelizando” os

referidos artigos nos termos/palavras usados na sua redação.

2.1. Factos e Relações Jurídicas

Factos: são acontecimentos, afirmações descritivas com caracter de relevância para o

Direito, como, por exemplo: a celebração de um contrato.

Relações jurídicas: é o resultado dos factos, e algo que liga duas pessoas, e em que

uma delas é o titular do direito e outra tem a obrigação de satisfazer o titular, como

quando, por exemplo, um empregador celebra um contrato de trabalho com um

trabalhador: se esse trabalhador foi contratado tem de exercer as funções dadas pelo

empregador, tomando por princípio que esse mesmo contrato não viola qualquer tipo de

lei ou regulamentação em termos de prejuízo para o trabalhador.

O princípio geral do Art.º 12 do Código Civil diz-nos no seu ponto 1. que: “A lei só

dispõe para o futuro,…”, ou seja, mesmo que a lei tenha eficácia retroativa, ficam

ressalvados os “assuntos já arrumados”, sendo que esses não são afetados pela mesma.

Temos como exemplos: os salários já pagos aos colaboradores de uma empresa ou,

também, o pagamento já efetuado de juros vencidos em relação a uma conta poupança a

render no banco.

No ponto 2. do mesmo artigo do Código Civil deduz-se que, quando a lei versa sobre as

condições de validade de factos ou seus efeitos no que diga respeito a lei já existente, ou

antiga, em caso de dúvida pressupõe-se que essa lei afete apenas novos factos. No

entanto, quando essa mesma lei versar quanto ao futuro, ou seja, disser respeito a uma

nova lei que venha a ser aplicada em termos de conteúdo, sem levar em conta os factos

que estiveram na sua origem, essa mesma lei (lei nova) abrangerá as próprias relações já

constituídas, que não sejam ainda “assuntos arrumados” à data da respetiva entrada em

vigor.

Teremos ainda de levar em consideração a “Teoria” das situações jurídicas, ou seja:

tratando-se de uma situação objetiva: a lei é que estabelece os pormenores da relação

jurídica, aplicando-se aqui a lei nova. Exemplo: temos os direitos e deveres dos

cidadãos.

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Tratando-se de uma Situação subjetiva: as partes envolvidas fixam livremente entre si

a resolução da situação, o legislador não intervém, neste caso não se aplica a lei nova.

Exemplo: Fazemos um contrato de empréstimo com o banco “X”; em termos de juros, é

a lei que regula as taxas de juro mas, em termos de prazos e modalidades de pagamento,

vigorará o acordo celebrado entre ambas as partes.

Mas, como em tudo, temos o outro lado da moeda e esta norma não é exceção, temos,

então, na Constituição da Republica Portuguesa o Art.º29 que “amplia”, de certa forma,

o sentido de retroatividade apenas em relação ao Direito Penal.

Em Direito Penal em caso de situação de dúvida na aplicação da lei no tempo é sempre

aplicada a situação mais favorável ao arguido independentemente da lei que vigore à

data da verificação da condenação, mesmo até que a sentença já tenha transitado em

julgado.

Podemos dar como exemplo uma pessoa que conduzisse com o grau de alcoolémia de

3mg, sendo que, na altura da verificação do ilícito, o máximo que seria permitido por lei

seria de 2mg, essa pessoa é mandada parar numa “operação stop” e, após fazer prova do

seu grau de alcoolémia o agente da Polícia de Trânsito levanta-lhe um auto de

contraordenação por condução perigosa, constituindo, perante o Código da Estrada, uma

infração grave, que tem como sanção adicional a cassação da permissão de conduzir por

um determinado período de tempo.

Ora, enquanto essa pessoa se encontra a aguardar julgamento entra em vigor uma lei

que revoga a anterior e que determina que o máximo da taxa de alcoolémia permitida

por lei passa de 2mg para 3mg.

Apesar da situação de ilícito que deu origem à contraordenação por condução perigosa,

ter data anterior à da entrada em vigor da lei de substituição, o arguido irá ser julgado

pela nova lei, que neste caso é a mais favorável, ou seja, deixará de estar abrangido pela

lei antiga e a contraordenação que lhe foi levantada deixará de produzir efeitos.

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Analisando, ainda, os princípios a verificar na aplicação da nova lei, temos que:

a nova lei é superior

Para segurança e estabilidade das situações constituídas não pode haver

alterações em demasia.

deve ter unicamente em conta o bem comum por via do interesse público.

Deve merecer a confiança dos sujeitos.

A aplicação da lei no tempo, tem regras e as mesmas visam conciliar as funções, por um

lado estabilizadoras e por outro lado, dinamizadoras para a sociedade, o que só por si,

como se poderá depreender, se torna bastante difícil de gerir.

Tendo em conta o preceituado na primeira parte do nº. 1 do Artigo 12º do Código Civil,

temos o princípio de “a lei só dispõe para o futuro, não tendo eficácia retroactiva”, o

que quer dizer que a regra da não retroatividade obriga o executor da lei, não sujeitando

o legislador, que em princípio pode fazer leis retractivas, mas tem de ter em conta os

efeitos já produzidos e aceitá-los.

Já na segunda parte do mesmo nº. 1 do referido Artigo 12º do Código Civil, temos que o

legislador quando faz uma lei retroativa depreende-se que a mesma venha a produzir os

seus efeitos única e exclusivamente a factos e efeitos pendentes e futuros, não

abrangendo os factos e efeitos passados.

Casos ou efeitos futuros é o que acontece depois da entrada da lei em vigor, casos

pendentes podemos considerar, por exemplo, que tal se verifica quando estamos a

trabalhar para uma empresa já há 10 anos e em que no nosso contrato de trabalho está

estipulado receber 4.50 € de subsídio de alimentação, mas, posteriormente a esse

contrato de trabalho, produz-se uma mudança na lei que estipula que o mínimo a pagar

pela entidade empregadora a um trabalhador como de subsídio de alimentação passa a

ser de 6.00€ logo, quando a lei entrar em vigor, a entidade patronal deixará de pagar

4.50€ e passará a pagar 6.00€

Passamos agora a analisar a primeira parte do nº. 2 do Artigo 12º. Do Código Civil,

“quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de

quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os

factos novos; …”.

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2.2. O que se entende por validade ou elemento substancial no contexto do anteriormente preceituado?

Por exemplo se houver um ato jurídico que seja um facto passado, a sua validade

substancial ou fornal (uma nova exigência), o mesmo não é obrigado a executar algo

que obrigue uma nova lei, visto o mesmo ser passado ou seja anterior à entrada da lei

em vigor.

Para ilustrar de uma forma mais entendível poderemos dar o exemplo de um indivíduo

que seja menor de idade, só atingindo a maioridade aos 18 anos, conforme o Artigo

122º do Código Civil que diz que “É menor quem não tiver ainda completado dezoito

anos de idade.” (redacção dada pelo Decreto-Lei nº. 496/77, de 25-11). (Fonte: Código

Civil, Almedina, 2ª Edição, 2011). Se entretanto a lei alterar, passando a considerar a

maioridade aos 16 anos, a esse indivíduo, por força do “elemento substancial”, aplicar-

se-á a “lei antiga”.

Analisando agora sob o ponto de vista do “elemento formal” temos que se aplicará

igualmente a “lei antiga”. Vejamos, por exemplo, a compra de uma mota: no dia 20 de

Janeiro de 2012 a Joana compra uma mota, celebrando um contrato simples de compra e

venda, único documento exigido pela lei vigente na altura da compra da mota como

válido para o registo da mesma em nome da Joana.

No dia 15 de Março de 2012 entra em vigor uma lei que diz que a partir daquela data a

compra de todos os veículos (carros, motas, etc.) tem de ser registada em notário. No

caso da Joana, não é necessário, pois é um facto passado, ou seja, a compra da mota foi

feita em data anterior à publicação da lei nova que estipula uma norma diferente da

existente à data em que a Joana adquiriu a mota.

Já na segunda parte do nº. 2 do mesmo Artigo 12º. Do Código Civil que diz “…mas,

quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo

dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações

já constituídas, que subsistam à data da entrada em vigor.”, aplica-se a lei nova, ou

seja, é o conteúdo da relação que vai alterar afetando, assim, situações pendentes e

relações passadas, caso o legislador não determine nada de específico em contrário. Por

exemplo, seguindo o pensamento de Galvão Telles, “quando se trate de uma relação ou

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situação duradoura, oriunda de facto anterior à lei nova, a lei nova aplica-se a tal

relação ou situação, na sua existência futura.” (Fonte: slides visionados em aula).

Por exemplo, mesmo sendo norma desde há muito tempo receber-se anualmente, por

contratação laboral, subsídio de férias e subsídio de Natal, saindo lei que disponha que a

partir da sua entrada em vigor se extingue o direito a tais subsídios, os subsídios já

recebidos em anos anteriores não terão de ser devolvidos mas, a partir da entrada em

vigor da nova lei passam os trabalhadores a não os receber, não podendo ser

considerados legalmente como direitos adquiridos.

Galvão Telles, perante a necessidade de fazer a distinção em relação às situações

pendentes, faz ainda a distinção entre:

- situações jurídicas de execução duradoura, ou seja, situações em que a sua execução se

opera de forma continuada ou periodicamente, por exemplo, os deveres que temos para

com o nosso carro (conteúdo da relação jurídica), ou o arrendamento na nossa casa, em

que é sempre aplicada a lei nova, e

- situações jurídicas de execução instantânea, ou seja, situações resolúveis num dado

momento e que se esgotam nesse mesmo momento, não perdurando para o futuro, por

exemplo, a compra de um objeto, em que se aplica a lei antiga.

Num exemplo acima referido falámos em direitos adquiridos, importa agora falarmos

um pouco sobre este tema.

Seguindo a doutrina dos direitos adquiridos a lei deve respeitar os direitos adquiridos,

ou seja, os direitos que podem ser exercidos, mas não as expectativas de direitos, nem

os direitos subjetivos, sendo que a distinção a fazer entre ambos seja difícil.

Poderemos exemplificar, grosso modo, o que se entende dos conceitos acima, no caso

de um testamento:

- após a abertura de um testamento existirá, porventura, um direito do herdeiro;

- antes da abertura de um testamento existirá., apenas, uma expectativa do herdeiro em

vir a herdar algo.

Dado o exposto pode concluir-se a a mera expectativa do indivíduo vir a ser herdeiro

não lhe confere o direito a ser herdeiro de facto uma vez que a condição de herdeiro ou

não, só produzirá efeitos após a abertura do testamento.

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Feita esta primeira análise verificamos que:

Por mais que pensemos que as leis, se vão manter, isso não é verdade, elas

mudam muito rapidamente embora o que se pretende é que sejam intemporais e

eternas.

É necessário adaptar as leis às sociedades, pois as mesmas encontram-se em

mudança constante.

O tempo que medeia entre a origem e o aparecimento da prescrição e

caducidade produzem efeitos que são situações jurídicas importantes.

Segundo Germano Marques da Silva (2009): “A regra é a de que a lei só dispõe para o

futuro (art.12º nº1,do CC), mas o certo é que a entrada em vigor de uma nova lei não

provoca um corte radical na vida social. Há factos e situações que tendo ocorrido antes

de entrada em vigor de uma nova lei tendem a continuar no futuro ou a projectar-se

nele”.

Por exemplo: Uma empresa abre em 2005, para poder laborar contratou pessoal. Todas

as pessoas contratadas assinaram contrato com a empresa, e em 2006 é alterado o

Código de trabalho. Os contratos assinados pelos colaboradores não ficam sem efeito.

Não nos permitimos avançar sem antes abordarmos ainda, de uma forma ligeira, a teoria

das situações jurídicas objetivas e subjetivas e o Artigo 297º, nºs. 1 e 2 do Código Civil

que versa sobre a “Alteração de prazos” e que integra o “Capítulo III – O tempo e a sua

repercussão nas relações jurídicas”

Quanto à teoria das situações jurídicas objetivas e subjetivas temos que:

- integradas nas normas injuntivas, pode considerar-se uma situação objetiva aquela em

que o seu conteúdo tenha sido fixado imperativamente pela lei, aplicando-se, neste caso,

a lei nova, por exemplo: os direitos e deveres dos indivíduos enquanto proprietários;

- integradas nas normas disponíveis, pode considerar-se uma situação subjetiva aquela

em que as partes podem determinar livremente sobre o conteúdo da mesma, não se

aplicando a lei nova, ou seja, por exemplo, num contrato de empréstimo, a taxa de juro

(com exceção do que for limitado por lei), os prazos e os modos de liquidação podem

ser contratados livremente entre as partes.

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2.3. “Alteração de prazos”

Passando agora ao Artigo 297º, nºs. 1 e 2 do Código Civil que embora não faça

diretamente parte do tema do nosso trabalho, não pode ser dissociado do mesmo uma

vez que dispõe sobre “Alteração de prazos” e está intimamente relacionado com a

alteração das leis no tempo.

Temos, então, no nº 1 do referido Artigo 297º:

Prazo mais curto - quando a lei nova estabelecer um prazo mais curto do que o

aplicado pela lei antiga, tem de aplicá-lo também nos prazos que já estiverem em

curso, isto é, a lei nova só se aplica quando o total dos dias no fim do prazo é inferior

ao que estava previsto pela lei antiga. E, quando se aplica a nova lei, a contagem é

feita a partir da sua data da entrada em vigor. Por exemplo: a lei antiga estipulava um

prazo de 30 dias e a lei nova passa a estipular um prazo de 15 dias. Neste caso, se à

data da entrada em vigor da lei nova tivessem passado 7 dias aplicar-se-ia a lei nova,

contando-se 15 dias após a sua entrada em vigor, sendo assim no final teríamos um

prazo mais curto tal como se quer, em vez de 30 dias passaríamos a ter 22 dias no

total.

E no nº 2. do referido Artigo 297º:

Prazo mais longo - se a lei nova estabelecer um prazo mais longo que o

aplicado pela lei antiga, é o prazo da nova lei que se aplica, isto é, aplica-se sempre a

nova lei, mas neste caso contam-se os dias que já passaram. Por exemplo: a lei antiga

previa um prazo de 15 dias e a lei nova passa a prever um prazo de 30 dias. Neste

caso se à data da entrada em vigor da nova lei tivessem passado 7 dias aplicar-se-ia a

lei nova, mas contar-se-ia o tempo já passado enquanto estava ainda em vigor a lei

antiga, sendo assim, no final teríamos um prazo mais longo como se quer, em vez de

termos 15 dias passaríamos a ter 23 dias no total.

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2.4. Leis interpretativas

Passando agora a abordar o Artigo 13º do Código Civil “Aplicação das leis no tempo.

Leis interpretativas”, no seu nº. 1., não podemos deixar de explorar, em pormenor, o

significado do que é a lei interpretativa uma vez que, pela sua natureza, reveste-se de

carácter retroativo. Ou seja, por exemplo:

em 2008 é promulgada uma lei (a que vamos chamar de lei antiga – LA), que dispõe um

certo prazo para um qualquer conceito, posteriormente, em 2009 em tribunal uma

sentença transita em julgado, por força da aplicação de um prazo qualquer. Em 2010 é

promulgada uma lei interpretativa (por uma fonte hierarquicamente superior à que

promulgou a LA) que vem explicar o conceito de prazo da LA. Então a lei interpretativa

e a lei interpretada ficam a constituir um todo, ou seja, passam a ter força de lei única

com data da LA e, nos “assuntos encerrados” já não há direito a recurso.

Segundo a Profª. Doutora Anja Bothe: “Interpretação autêntica é a que é realizada por

uma fonte que não é hierarquicamente inferior às fontes interpretativas. As leis

interpretativas são por sua própria natureza retroactivas”. Ou seja, a lei interpretativa

vem explicar uma dúvida que surgiu em relação à lei antiga, e as duas juntas fazem um

todo único. A lei interpretativa é retroativa porque entra em vigor no dia em que entrou

a lei antiga apesar de ter sido promulgada posteriormente.

Segundo Germano Marques da Silva (2009): “Nas leis interpretativas não vigora o

princípio da não retroactividade, porque não se trata de estabelecer um novo regime,

mas tão só de clarificar o sentido da lei anterior. Para que uma lei seja realmente

interpretativa são necessários dois requisitos: 1º Que a solução de direito anterior seja

controvertida; 2º Que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da

controvérsia”.

Ainda, segundo Germano Marques da Silva (2009): “Diz-se muitas vezes que a lei clara

não necessita de interpretação (in claris non fit interpretatio), mas não é verdade. Por

mais clara que seja a lei, é sempre necessária alguma interpretação, tanto mais que a

clareza pode ser enganosa”.

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Na nossa perspetiva achamos que cada um tem uma maneira diferente de interpretar

seja o que for, tem a haver com o interior de cada um de nós, e aquilo em que

acreditamos ou não, tudo isso faz com que cada um interprete à sua maneira, de uma

forma subjetiva.

Logo, cada pessoa vai interpretar de maneira diferente a lei, daí ser necessário uma

interpretação clara, sem riscos e sem dúvidas. Quando houver dúvidas deve tentar

esclarecer-se com alguém conhecedor das mesmas.

Ao fazer a análise de qualquer caso prático que nos seja apresentado, não nos podemos

escusar de efetuar as diversas interpretações possíveis e adaptáveis a cada caso, por

forma a podermos, com um mínimo de risco, chegarmos a uma conclusão, senão única,

pelo menos ideal.

As várias interpretações possíveis são:

Interpretação Autentica: a pessoa que cria a lei tem aptidões para interpretar,

modificar, suspender ou revogar a lei que o próprio criou, e assim em caso de dúvidas,

poder alterar-lhe o sentido através de uma nova lei, chamada de lei interpretativa.

Interpretação Doutrinal: é quando a pessoa se mune de todos os elementos

interpretativos de maneira a que consiga descobrir o sentido da lei até alcançar o

pensamento legislativo.

Interpretação Oficial: “É a que é feita em lei de valor inferior à norma aplicada”.

Temos, por exemplo, os despachos feitos pelos ministros para as escolas, onde

descrevem a informação da organização do ano letivo a que se destina.

Interpretação Judicial: “É a que é feita pelos tribunais num processo e, salvo os casos

de decisões de uniformização de jurisprudência, só tem valor vinculativo no processo

em que foi feita”. Os tribunais são livres para tomar decisões, e só se encontram

vinculados às leis.

Interpretação Particular: não se enquadra nas outras hipóteses. Como exemplo temos

uma jurista de uma empresa, numa situação de litígio da empresa, faz a interpretação

mais favorável para a empresa para quem trabalha.

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

2.5. Excepções ao Principio da não retroatividade

A lei interpretativa conjuga-se na lei interpretada, para poderem formar um todo. Assim

como consequência a lei quando é interpretada é como se tivesse sido publicada nessa

altura, ou seja é aplicada aos factos mesmo antes de entrar em vigor.

A lei interpretativa tem eficácia retroativa mas por acordo dos interessados ou decisão

judicial, previne futuras responsabilidades aos direitos já fixados como definitivos.

A Constituição da Republica Portuguesa em casos excecionais não proíbe a aplicação

retroativa da lei. São válidos por meio de ressalva os efeitos já produzidos pelos factos

que a nova lei aplica sobre os factos passados.

A Constituição da Republica Portuguesa atribui exceção retroativa aos seguintes

artigos:

Art.18º, nº3 – “As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de

revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem

diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos

constitucionais”. –

Art.29º, nº4 – “Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves

do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação

dos respectivos pressupostos, aplicando-se retroactivamente as leis penais de

conteúdo mais favorável ao arguido.”

Art.103º, nº3 – “Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam

sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou

cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”.

(Fonte: Constituição da Republica Portuguesa 2010)

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

2.6. Disposições Transitórias

Quando duas leis se sucedem ao mesmo tempo, dá-se o mesmo problema – o que fazer

com os factos e situações jurídicas passadas, que ocorreram ao abrigo de leis anteriores?

Acontece inúmeras vezes, a nova lei resolve por si mesmo os problemas suscitados pela

sucessão das leis, mediante as disposições transitórias.

Estas disposições transitórias podem ter carácter formal e/ou material.

O Direito transitório formal: ato que determina qual das leis melhor se adapta em

determinada situação. Ou seja, o direito transitório formal apenas indica se vamos

utilizar a lei antiga ou a lei nova numa determinada situação.

O Direito transitório material: ato que estabelece uma regulamentação própria. Com o

objectivo da adaptação no momento da entrada da lei em vigor a situações já existentes.

Isto é, o direito transitório material consiste num conteúdo próprio para uma fase

transitória, diz como funciona. E tem regras.

Apesar de o Direito pretender perdurar no tempo não deixa de ser um fenómeno que vai

sofrendo mutações e se vai adaptando às mentalidades e condições existentes em cada

sociedade.

3. Conflito de leis no tempo

Quando poderemos dizer que há conflito de leis no tempo?

Quando, por exemplo, em virtude do tempo, há dúvidas em relação a qual lei deva ser

aplicada em determinada situação. A dúvida instala-se pois o facto jurídico ocorreu

numa data “X”, quando uma dada lei estava vigente, mas, depois, essa lei é revogada,

dando origem a uma nova lei que regulamenta a situação em análise.

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

Nessa altura poderá haver conflito ou dúvida entre qual das leis deverá ser aplicada

sobre um facto que ocorreu na vigência de uma lei revogada. Ou então quando é

aplicada uma lei que não é a mais adequada e se chega ao ponto em que essa mesma lei

contraria uma outra, nessa situação o que deverá ser feito, é a interpretação de cada uma

das leis em contradição, para aferir qual delas é a mais adequada à situação em análise.

As regras nos conflitos de normas são que a lei de nível superior derroga as leis

inferiores, na outra vertente a lei do mesmo nível revoga a lei anterior nunca

esquecendo que a lei especial prevalece em relação à lei geral.

4. A não retroatividade da lei

A lei altera situações futuras, situações passadas são respeitadas e não são alteradas, ou

caso sejam, vem determinada a sua alteração pois são verificadas as situações passadas

antes da entrada em vigor da nova lei.

Dado que as leis têm, em cada momento, a pretensão de seja feita justiça, quando uma

nova lei altera uma lei anterior fá-lo no intuito de melhor realizar os fins que o Direito

admite.

É pensando que o Direito novo é melhor que o Direito antigo que se admite a aplicação

da retroatividade das leis.

É de salientar que há imensas situações jurídicas que se prolongam no tempo e, quando

tal acontece, a regra diz que, quando a nova lei dispuser sobre o conteúdo das situações

jurídicas vindas do passado e se mantiverem além da entrada em vigor da nova lei, essas

situações ficarão abrangidas, no seu conteúdo, pela lei nova, conforme se pode deduzir

da segunda parte do n.º 2 do Artigoº 12º do Código Civil. Para melhor compreensão

podemos dar como exemplo os contratos de arrendamento antigos, sendo que os

mesmos não vão sofrer alteração na sua forma (continuarão a ter validade enquanto

contrato celebrado entre duas ou mais partes intervenientes no negócio) mas, no entanto,

no seu conteúdo, ou seja, nas regras que foram aplicadas à data da sua celebração (renda

a pagar por exemplo e aumentos de rendas), vão passar a ser sujeitos à lei nova. Quer

isto dizer que, pela tendência ao nivelamento e critério de harmonização entre todos os

contratos de arrendamento, quer sejam os mais antigos, quer sejam os que vão ser

celebrados a partir da entrada em vigor da lei nova, vai haver um período de

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“adaptação” tendente a que, no futuro, todos os contratos de arrendamento de análogo

conteúdo sejam “iguais”.

No entanto, se a nova lei dispuser sobre situações de validade substancial e/ou formal de

quaisquer factos e seus efeitos, só têm efeito aquando a entrada em vigor da nova lei, ou

seja, vigorará a lei antiga, como se pode inferir da primeira parte do Artigo 12º do

Código Civil. Neste caso podemos ilustrar esta situação igualmente com contratos

celebrados, desta feita, por exemplo, na compra de uma casa e, aqui, contemplará não

somente o explicitado neste parágrafo como o que foi dito no parágrafo anterior. Ou

seja, ao comprar uma casa é feito um contrato entre o comprador e o vendedor. Ora, este

contrato, na sua forma, ou seja, nos procedimentos a promover para que o negócio fosse

válido, passou a ser necessário efetuar-se escritura notarial, aplicando-se a lei nova

apenas para os contratos a celebrar a partir da data da entrada em vigor da lei nova. No

que diz respeito ao seu conteúdo se, por exemplo, for requerido um empréstimo

bancário que exige uma escritura por mútuo com o banco credor, de entre as condições

estabelecidas, fará parte o cálculo de juros a pagar, ora, esses juros serão passíveis de

ajustes ao longo do tempo da vigência do contrato, constituindo uma alteração de

conteúdo do aludido contrato por mútuo e, aqui, verifica-se a aplicação da lei nova

sobre os contratos antigos.

Segundo Germano Marques da Silva (2009): “A regra é que quando a nova lei dispuser

sobre o conteúdo das situações jurídicas que vindas do passado se mantêm para além

da entrada em vigor da nova lei, abrange o conteúdo dessas situações”. É o que está

presente no nº. 2. do Artigo 12º do Código Civil.

5. Graus de retroatividade das leis

Existem diversos graus de retroatividade, sendo eles:

Retroatividade Ordinária ou Normal: este grau de retroatividade verifica-se quando a

lei vem regular situações jurídicas passadas, respeitando os efeitos já produzidos ao

abrigo da lei antiga. Sendo que este grau de retroatividade é o que é empregue com

maior frequência.

Retroatividade Agravada: este grau de retroatividade verifica-se quando a lei nova

vem abranger situações geradas no passado, ressalvando, contudo, os efeitos já

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produzidos por decisões transitadas em julgado, ou seja, as obrigações/deveres já

cumpridos (vulgo “assuntos arrumados”).

Retroatividade Extrema: a lei só tem por limite o respeito pelo caso julgado. Ou seja,

apenas os efeitos jurídicos protegidos por caso julgado ficarão a salvo da aplicação da

lei nova.

Retroatividade Extrema ou de grau máximo: verifica se sempre que a lei nova se

aplica retroativamente sem qualquer limite, nem sequer o do caso julgado. De modo

idêntico são também de grau máximo as situações de aplicação retractiva da lei que,

pelos seus condicionalismos concretos, se revelem irrazoáveis, intoleráveis ou

manifestamente imprevisíveis.

De todos estes graus de retroatividade, o de retroatividade extrema ou de grau máximo é

o incompatível com a nossa Constituição, sendo mesmo inconstitucional ao abrigo da

Constituição da República Portuguesa, no seu Artigo 282º nº. 3 que, em traços gerais,

vem declarar que para efeitos de declaração de inconstitucionalidade ficam ressalvados

os casos julgados, ou seja, os casos transitados em julgado e que, por tal facto, tiveram a

sua conclusão, excluindo, contudo, as decisões proferidas em contrário pelo Tribunal

Constitucional sempre que a lei respeitar ao domínio do foro penal, disciplinar e seja,

por isso, desfavorável ao arguido.

Atenta a Constituição da República Portuguesa, no seu Artigo 111º, nº. 1 este grau de

retroatividade viola, assim, não só o princípio da separação de poderes que devem ser

observados pelos órgãos de soberania (ao permitir uma imposição legislativa de

possibilidade de revisão de decisões que já se haviam consolidado como casos julgados

pelos Tribunais), como também o princípio do Estado de Direito (ao introduzir uma

imprevisibilidade intolerável no mundo jurídico, gravemente lesiva dos interesses dos

cidadãos que necessitam de segurança e certeza jurídica).

É necessário salientar que, em alguns ramos do nosso Direito, existem normas

Constitucionais que disciplinam, de modo especial, a questão da aplicação da lei no

tempo.

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Exemplos do indicado no parágrafo anterior são alguns artigos da Constituição da

República Portuguesa que a seguir se identificam.

No que respeita à organização do poder político:

Artigo 103.º, nº. 3, segunda parte – Sistema fiscal: que refere que ninguém pode ser

obrigado a pagar impostos que tenham natureza retractiva.

No que respeita aos direitos e deveres fundamentais:

Artigo 29.º, nº. 1 – Aplicação da lei criminal: neste ponto deste artigo o arguido só

poderá ser alvo de sentença criminal ou ser sujeito a medidas de segurança quando

aplicada lei anterior que puna a ação ou omissão praticada pelo arguido.

Já na segunda parte do ponto 4 do mesmo Artigo 29º. se refere que é aplicada ao

arguido, com efeito retroativo, as leis penais que lhe sejam mais favoráveis.

Embora parecendo, à primeira vista, que os dois pontos referidos do Artigo 29º da CRP

são contraditórios isso não é verdade porque ambos concorrem para o favorecimento do

arguido, seja pela aplicação da lei antiga, seja pela aplicação da lei nova.

Artigo 18.º, nº. 3 – Força jurídica: na segunda parte deste número está patente que as

leis restritivas indicadas na primeira parte deste mesmo número não podem ter efeito

retroativo.

No caso particular do Direito Penal existe ainda a particularidade de se estabelecer o

Princípio da aplicação retroativa in mitius da lei penal. Ou seja, existe uma obrigação

Constitucional de aplicação da lei penal mais favorável ao arguido, retroativamente.

6. Resolução de caso prático

Deixamos aqui a resolução de um caso prático com recurso à matéria abordada neste

nosso trabalho:

“Devido a uma grave crise económica, o Parlamento aprovou uma lei que agravava a

pena do crime de especulação — que era de prisão até 3 anos — para prisão de 7 a 10

anos. Por outro lado, aquela lei fixava o seu próprio período de vigência entre 1 de

Janeiro e 31 de Julho de 2004. Devido às críticas que se fizeram ouvir, no sentido da

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

demasiada severidade de tal regime, o Parlamento aprovou, no dia 1 de Fevereiro de

2004, uma nova lei, que também limitava a respectiva vigência até ao dia 31 de Julho

de 2004, onde se baixava a sanção para prisão de 3 a 5 anos. De novo se fez sentir a

crítica, agora em sentido inverso, falando-se da insuficiente severidade desta última

disciplina. E no dia 1 de Março de 2004 entra em vigor um novo regime, cuja vigência

se continuava a limitar até ao dia 31 de Julho de 2004, que estabelecia para a

especulação a pena de prisão de 5 a 7 anos. Após o dia 31 de Julho de 2004 tornou a

vigorar o regime anterior ao dia 1 de Janeiro de 2004.

a) Supondo que A praticou um crime de especulação no dia 10 de Dezembro de 2003,

se a condenação ocorrer no dia 11 de Junho de 2004, qual a lei aplicável? Justifique.

(https://www.google.pt/#hl=pt-PT&gs_nf=1&cp=48&gs_id=8&xhr=t&q=https%3A%2F%2Fwoc.uc.pt%2Ffduc%2FgetFile.do%3Ftipo%3D2%26id%3D8401&pf=p&output=search&sclient=psy-ab&oq=https://woc.uc.pt/fduc/getFile.do%3Ftipo%3D2%26id%3D8401&aq=f&aqi=&aql=&gs_l=&pbx=1&bav=o s.d.)

a) Vejamos: à data em que A pratica o crime de especulação (10 de Dezembro de 2003)

está em vigor uma lei que pune esse crime com pena de prisão até 3 anos. À data em

que A é condenado, ou seja, em que a sentença transita em julgado, supondo-se que

dessa condenação já não haverá lugar a recurso, (11 de Junho de 2004) a pena a aplicar

a esse mesmo tipo de crime era de prisão de 5 a 7 anos.

Qualquer uma das leis referidas no primeiro parágrafo da análise deste caso vamos

tomar como premissa que todas as leis, à luz da interpretação autêntica, são leis

interpretativas, que diferem apenas no seu conteúdo (estabelecimento de diferentes

penas para o mesmo tipo de crime) o que as torna, por isso mesmo, em leis retroativas,

conforme o preceituado no Artigo 13º. no seu nº. 1, excetuando-se dessa retroatividade

os efeitos já produzidos por sentença passada em julgado.

No entanto, faça-se a abordagem que se fizer, em nosso entender, integrando este caso

matéria do foro penal, que implica uma aplicação da lei criminal, temos que obedecer ao

preceituado no Artigo 29º., nº. 1, da Constituição da República Portuguesa, que refere

que ninguém pode ser sentenciado criminalmente a não ser que o seja por lei anterior ao

delito cometido (neste caso com uma moldura penal de 3 anos de prisão). Acresce,

ainda, o facto de no mesmo Artigo 29º, na segunda parte do seu nº. 4 se dispor que se

aplicarão retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido.

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

Dado o exposto verifica-se, sem sombra de dúvida, que a lei a aplicar ao arguido A é a

lei antiga em vigor à data do delito praticado, ou seja, o crime de especulação, que é a

pena de prisão até 3 anos.

b) E se B cometer um crime de especulação no dia 15 de Janeiro de 2004 e a

condenação se verificar no dia 20 de Outubro de 2004? Justifique.”

b) Pelas mesmas razões expostas no caso anterior, em relação ao arguido A, dado que o

arguido B, comete o crime no dia 15 de Janeiro de 2004, enquanto vigora, para esse tipo

de crime, a lei que tem como moldura penal a pena de prisão de 7 a 10 anos e partindo

do pressuposto de que a sentença transita em julgado no dia 20 de Outubro de 2004,

data em que passa a vigorar a lei antiga, ou seja, em que volta a vigorar a pena de prisão

até 3 anos, ou seja, o regime anterior ao dia 1 de Janeiro de 2004, ao arguido será

aplicada essa pena de prisão até 3 anos por força do Artigo 29º, da Constituição da

República Portuguesa, na segunda parte do seu nº. 4 que dispõe que se aplicarão as leis

penais de conteúdo mais favorável ao arguido. Assim, contrariamente ao sucedido com

o arguido A, é aplicada, neste caso, a lei nova que lhe é a mais favorável.

7. Conclusão

Artigo 12º n.º 1 do Código Civil

O facto jurídico em si é regulado pela lei vigente no momento da sua verificação. A lei

nova deve regular apenas os factos ocorridos após a sua entrada em vigor, deixando

para a lei antiga a disciplina dos factos ocorridos no tempo da sua vigência, ainda que os

seus efeitos perdurem no tempo;

A lei antiga aplica-se ainda aos efeitos jurídicos de factos passados. Os efeitos presentes

e futuros de factos passados serão regulados ainda pela lei antiga, a lei nova regula os

efeitos presentes e futuros de factos passados quando isso não implicar uma

reapreciação destes.

Artigo 12º n.º 2 do Código Civil

Sempre que a lei nova dispuser sobre as condições de validade formal ou material de

quaisquer factos, tem-se por aplicável a lei antiga, evitando assim a sua reapreciação.

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Se o objeto da regulação da lei nova for o conteúdo de certa relação jurídica, aplica-se a

lei nova, quando se concluir que o legislador pretendeu abstrair-se na nova regulação

dos factos que deram origem à relação jurídica em causa.

Se o objeto da regulação da lei nova for o conteúdo de certa relação jurídica, aplica-se a

lei antiga, quando se concluir que o legislador não pretendeu abstrair-se na nova

regulação dos factos que deram origem à relação jurídica em causa.

Sucessão no tempo de leis sobre prazos, existe uma regra especial no art.º 297.º do

Código Civil.

Se a lei nova vem estabelecer um prazo mais curto, aplicar-se-á aos prazos já em curso,

embora se conte o prazo desde a data da sua entrada em vigor, com a ressalva de faltar

menos tempo pela, lei antiga, para que o prazo se complete.

Se a lei nova fixa um prazo mais longo, aplicar-se-á aos prazos em curso, mas computa-

se neles todo o tempo já decorrido desde que se iniciara a contagem.

Advirta-se que também neste caso (leis sobre prazos) há que atender à natureza dos

prazos em questão. Ou seja, apenas os prazos que sejam factos constitutivos,

modificativos ou extintivos de situações jurídicas caem no âmbito de aplicação da

norma do art.º 297.º do Código Civil.

Artigo 13º do Código Civil

A lei interpretativa tem por finalidade a interpretação retroativa de uma lei anterior de

significado interpretativo e controverso.

Por se considerar que a lei interpretativa não constitui uma nova e distinta manifestação

da vontade do legislador, o Código Civil prevê no art.º 13.ºque a lei interpretativa se

considera, para efeitos da sua aplicação integrada na lei interpretada, do que resulta o

reconhecimento de eficácia retroativa à lei interpretativa

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica

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Código Civil Artº12 e Artº13 (Aplicação das leis no tempo) – Licenciatura em Contabilidade e Auditoria

BIBLIOGRAFIA

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Magalhães, David. Noções Fundamentais de Direito. Coimbra: Coimbra Editora.

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Telles, Inocêncio Galvão. Introdução ao Estudo do Direito. 11ª Edição. Vol. I. Coimbra: Coimbra Editora.

Liliana Sofia Rosa Fernandes, Maria José Rodrigues, Dora Rosa – Junho 2012 – Universidade Atlântica