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Artigo Regionalizacao F T S

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Artigo sobre o tema da regionalização, trazendo a análise histórica desse processo em Portugal. Publicado em 2008 na revista Sociedade & Território.

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DOSSIER

INTRODUÇÃO

Portugal passou os últimos trinta anos com aquestão da regionalização literalmente entalada naConstituição Portuguesa e na agenda política, semconseguir resolver decididamente essa questão decomo organizar e governar o território, numa pers-pectiva de poderes e competências intermédias,entre o Estado central e os Municípios. Vários con-textos marcados por instabilidade política, pornecessidades de maior centralismo ou por geome-trias político-partidárias, ao longo das três décadasacabaram por condicionar a não regionalizaçãopolitica do país, ainda que o nível regional e respec-tivas instituições tenham ganho crescente poder,recursos (técnicos, financeiros) e capacidades parapromover o desenvolvimento regional. A integraçãoeuropeia e as políticas de coesão com os seus instru-mentos financeiros transformaram profundamente osterritórios e promoveram as Regiões a protagonistasinternacionais. Se no passado as Regiões erammeras escalas territoriais com poucas capacidades ecompetências, na actualidade as Regiões são força-das a ser cada vez mais empreendedoras, activas nadefesa dos seus interesses, catalizadoras de relaçõessócio-económicas, assumindo-se como líderes dosseus processos de desenvolvimento. No entanto, emPortugal o arrastar da questão da regionalização e oestigma enraizado após uma década decorrida sobre

o referendo, tem condicionado uma reflexão maisampla sobre o papel das regiões portuguesas, inde-pendentemente do nível de autonomia política.Perante este cenário, o presente artigo estrutura-seem três partes:

– Na primeira parte «Região empreendedora: deescala territorial a agente global» pretende-sereflectir sobre o actual papel da Região no con-texto da globalização e da integração euro-peia, mostrando que há uma tendência deaumento do poder e do protagonismo a estenível. As Regiões têm cada vez maior autono-mia, capacidades e recursos que lhes permitemliderar os seus processos de desenvolvimento eaté mesmo actuar internacionalmente numcontexto de forte competição entre territórios.

– Na segunda parte pretende-se discutir «Oestigma da regionalização em Portugal», ondese procura fazer uma leitura evolutiva sobre otema, onde se identificam e caracterizamquatro períodos distintos desde o lançamentoda política regional em Portugal, no âmbitodo III Plano de Fomento, até à actualidade(2007) onde o assunto volta a ganhar media-tismo. Procura-se nesta parte compreender deforma mais estruturada uma questão quedurante trinta anos atravessou ciclicamente arealidade política nacional.

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* Doutorando FCT/UNL

Regiões e regionalização em Portugal: do estigma entaladoao empreendedorismo forçadoFernando Teigão dos Santos*

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PARTE II – DESAFIO: CIDADÃOS

– Na terceira parte considera-se que perante oressurgir do debate sobre a questão da regio-nalização em Portugal há a necessidade depromover um enquadramento da discussão,que considere o contexto regionalismo dinâ-mico que se vai afirmando no âmbito euro-peu. Apontam-se nesta parte algumas linhasde discussão que poderão ser pertinentes paraesse debate emergente, que mais do que dizersim ou não, deve gerar contributos sobre quemodelo de organização e governação territo-rial que se quer, no sentido das Regiões pode-rem contribuir para um desenvolvimento sus-tentável do território nacional.

1. A REGIÃO EMPREENDEDORA: DE ESCALATERRITORIAL A AGENTE GLOBAL

Há um crescente aumento do poder e do prota-gonismo das Regiões, enquanto agentes cada vezmais autónomos na liderança e gestão dos seusprocessos de desenvolvimento. O processo de inte-gração Europeia tem aumentado a importância dasRegiões, dando-lhes cada vez maiores capacida-des, instrumentos e meios de intervenção. Há umcontexto de competição à escala global entre terri-tórios, regiões, cidades, que obriga a novas formasde encarar os processos de desenvolvimento.

As dinâmicas associadas à globalização têm con-tribuído para uma erosão das capacidades dos Esta-dos na gestão de múltiplos processos, diminuindo oseu poder individual de actuação em diversas áreas(economia, ambiente, saúde, migrações, etc.), obri-gando-os a cooperarem internacionalmente sob insti-tuições e abordagens transnacionais, enquanto quepor outro lado dá maior autonomia a outras escalasadministrativas e territoriais como as Regiões, ascidades e as áreas metropolitanas. Estas geografias depoderes com os seus agentes e instituições procuramcapacitar-se para um contexto de maior competiçãoglobal por recursos, mercados, investidores, media-tismo, visitantes, capital humano e criativo, projectosestruturantes, entre outros objectivos. Regiões comoa Emilia-Romagna, West Midlands, Rhone Alps,Valencia, Lisboa, Twente, Estocolmo, Olomouc,Thessalia, entre muitas outras, partilham o desafio dese afirmarem neste contexto.

A politica europeia de desenvolvimento regio-nal tem vindo a assumir-se como uma das priorida-des de topo de uma União Europeia em progressivoalargamento, mobilizando crescentes recursosfinanceiros, envolvendo um maior número de inter-venientes (desde a escala local à escala supra-nacional), sendo uma política altamente transversalque cruza diversas dimensões territoriais e secto-riais, que reflecte o principio da subsidiaridade eque mais visível se vem tornando junto dos cida-dãos europeus. Esta política de coesão, que nascecom o objectivo principal de reduzir as assimetriasde desenvolvimento entre os territórios, tem sido oprincipal catalizador do crescente poder e protago-nismo das regiões europeias e assume-se cada vezmais como uma política de competitividade regio-nal. O aprofundamento destas tendências torna-seainda mais evidente aquando do inicio de um novoperíodo de programação comunitária para 2007-2013, ganhando maior poder político e financeiro ecentrando-se cada vez mais numa perspectiva deconstrução de capacidades regionais e na apostanos conceitos da Estratégia de Lisboa renovada parao crescimento económico e o emprego. Há umaEuropa de Regiões que gradualmente vai vingando,que por um lado é altamente heterogénea mas quepor outro lado contribuiu para o afirmar dasRegiões enquanto agentes globais de desenvolvi-mento mais preparados para o contexto de compe-tição internacional, sendo que esse crescente poderse pode observar a diversos níveis:

a) O reforço do protagonismo dos órgãos repre-sentativos e consultivos das Regiões Euro-peias nomeadamente a crescente importân-cia do Comité das Regiões (CoR) instituídoem 1994, a afirmação da Assembleia dasRegiões Europeias – ARE (criada em 1985tendo como objectivos promover o conceitode democracia regional na Europa e o papeldas regiões no processo político), o crescentepoder reivindicativo da Conference of Presi-dents of Regions with Legislative Power –RegLeg (tem como objectivo um papel maisactivo das regiões Europeias com capacidadelegislativa) e da Conference of Presidents ofEuropean Legislative Assemblies – CALRE(tem como objectivo evitar que o deficit

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democrático afecte as regiões e garantir o prin-cípio da subsidiariedade, pretendendo actuarcomo porta-voz do parlamentarismo regionalna Europa). Estes órgãos procuram uma maiorinstitucionalização dos regionalismos europeuse mostram a crescente capacidade de mobili-zação transnacional das regiões.

b) A criação de gabinetes representativos dasregiões em Bruxelas que assumem um papelde promoção externa, que exercem funçõesde lobby institucional, representação, reco-lha e transmissão de informação, angariaçãode projectos, organização de iniciativas, par-ticipação em eventos formais e informais,etc. Aumentam a proximidade das Regiõesaos centros de decisão e funcionam umpouco como antenas de diplomacia econó-mica regional. São cada vez mais as regiõesrepresentadas em Bruxelas, com melhoresinstalações e mais recursos humanos, commaior esforço de promoção e marketing,reflectindo um crescente investimento nestasabordagens.

c) A criação de associações, parcerias e consór-cios temáticos entre Regiões que surgem comobjectivos de cooperação económica, parti-lha de experiências, ganhos de escala e poderde pressão política, entre outros, funcionandonormalmente em rede e possuindo uma estru-tura logística de carácter executivo, tendouma agenda política própria, que ao contrárioda abordagem dos órgãos representativos nãoassenta tanto num regionalismo reivindica-tivo. São exemplos a CRPM – Conference ofPeripheral Maritime Regions of Europe, aERIK – European Regions Knowledge basedInnovation Network, a Sustainable EuropeanRegions Network, a Association of Regions ofIndustrial Technology, ou ainda parceriascomo a Four Motors of Europe.

d) O envolvimento em redes de projectos e ini-ciativas transnacionais, que se distingue doponto anterior por ter um carácter mais pon-tual, por ser menos duradoiro no tempo(decorre durante o tempo do projecto e atépodem ser gerados por um consórcio maisformalizado de regiões) e por ter uma agendapolítica menos relevante e permanente. Este

é normalmente o caso de projectos noâmbito da iniciativa comunitária Interreg.

e) A criação de Euro-regiões que tendem a sercada vez mais estratégias avançadas de coo-peração transfronteiriça, envolvem por vezesa criação de um novo conceito de região quese sobrepõem e articula com o de cadaregião, tenta valorizar os pontos fortes con-juntos e dar escala, dimensão e visibilidadeinternacional aos territórios envolvidos.

É através destas formas de cooperação transna-cional activa que as Regiões se vão posicionandofora dos seus limites geográficos, contando muitasdas vezes com o apoio e incentivo por parte dosEstados. Há um pragmatismo económico cres-cente, as questões políticas e as implicações aonível da erosão da soberania tornam-se secundá-rias e o que interessa é conseguir espaço nos mer-cados e nas agendas mediáticas globais. Apesar deno âmbito das questões internas de cada Estado osaspectos mais formais associados aos processos deregionalização continuarem a ter importância, noâmbito transnacional estes aspectos vão sendosecundarizados. Quando se constroem euro-regiões e se partilha nesse contexto poder, projec-tos e protagonismos, é porque se acredita numageografia de regiões com vantagens que derivamdessas partilhas, sendo cada vez menor a margempara se ficar refém de posições e reivindicaçõesinternas. As conflituosidades que existem em prati-camente todos os países sobre questões de apro-fundamento das autonomias políticas tendem anão limitar as intervenções de índole internacionaldas regiões. Os países entendem que podem nãosaber internamente como solucionar certos proble-mas mas também sabem que não podem desperdi-çar tempo e oportunidades de posicionamentointernacional. Estas realidades são em grandemedida um produto de uma política europeia dedesenvolvimento regional, mediatizada por polí-tica de coesão, que ao longo das ultimas duasdécadas funcionou como um catalizador do regio-nalismo europeu e que cada vez mais é a políticaque promove a capacidade e a competitividadedas regiões no contexto global.

A Europa das Regiões é acima de tudo umametáfora que representa uma geografia de poderes

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emergentes, com protagonistas regionais muitodiversos, que procuram através de uma actuaçãoconjunta mas ainda pouco institucionalizada,ganhar autonomia e espaço política numa Europade Estados em erosão. Há uma grande heterogenei-dade de realidades em termos de modelos de orga-nização, bem como de situações diversas dentrodos próprios Estados. De facto se há alguma coisaque une todas as regiões e realidades é a expressão«unidade na diversidade», que representa umadimensão de Europa com protagonistas muito dife-rentes. As Regiões diferem em termos de tamanho,de população, de poder económico, de grau deautonomia política e administrativa, até mesmo emtermos de designação, não sendo fácil de encontraruma designação que satisfaça os vários níveis deaprofundamento regional, ainda que do ponto devista administrativo se considere normalmente onível NUTS2. De acordo com a Declaração Regio-nalismo na Europa da Assembleia das Regiões Euro-peias, «uma Região é um corpo territorial de nívelabaixo do Estado e provido de governo próprio,reconhecido pela Constituição nacional e por legis-lação que garanta a sua autonomia, identidade,poderes e estrutura organizacional». Esta é apenasuma de várias definições, num contexto em quemuitos outros territórios e entidades, que apesar denão cumprirem esses critérios também se designamde regiões, o que reflecte a grande heterogeneidadee adaptabilidade do conceito. Nos últimos anosvários Estados Europeus têm vindo a promoverreformas constitucionais ou administrativas queresultaram na criação de novos órgãos regionais ouno reforço dos existentes. O objectivo principal temsido o de inverter a lógica administrativa, permi-tindo às administrações regionais definir os seusobjectivos de desenvolvimento com base nas con-dições locais e expectativas das populações.

Os actuais paradigmas do desenvolvimentoregional tendem a considerar a Região um agenteglobal de desenvolvimento e não um mero espaçode implementação de políticas e projectos ao nívelintermédio, ou seja, a Região deixa de ser oobjecto para passar a ser o sujeito activo dos pro-cessos de desenvolvimento. Esta visão implica queo território não seja visto apenas como um espaçoou localização para passar a ser encarado comouma rede de relações entre agentes económicos,

sociais, culturais, etc. que fazem de cada regiãouma entidade com uma personalidade institucionalprópria e distinta. Há todo um contexto que justi-fica e projecta o pensamento em torno dasRegiões, sua evolução e desafios, tendo emergidomesmo um conceito de novo regionalismo, quetende a reflectir e a sistematizar o pensamentosobre estas realidades. Para diversos autores onovo regionalismo assenta numa perspectiva maispragmática de encarar o desenvolvimento regional,com objectivos mais socioeconómicos e menospolítico-culturais, sendo que a cultura e a identi-dade regional devem ser entendidos como veículosde mobilização para o processo de desenvolvi-mento da região e maior envolvimento das comu-nidades em detrimento de uma perspectiva maisestática e reivindicativa das raízes culturais; aregião deve-se procurar afirmar-se via bottom-up enão tanto reclamar um estatuto político via top-down; a região deve de actuar cada vez mais aonível internacional reforçando os laços de coope-ração noutros países; a comunicação e o marketingregional tornam-se instrumentos fundamentaisperante a arena mediática global; em suma hápapel de Região Empreendedora enquanto prota-gonista que transvaza claramente a perspectivaestática de nível intermédio entre o Estado Centrale os municípios, o que acarreta novos desafios enovas perspectivas de encarar os territórios e osprocessos de desenvolvimento.

2. O ESTIGMA DAS REGIÕES EM PORTUGAL

O nível regional em Portugal tem sido historica-mente menosprezado e nas últimas três décadasregistou-se mesmo a consolidação de um estigmaneste domínio. Um olhar sobre a história maisantiga da administração do território português,desde a formação da Nação até quase à actuali-dade, mostra tendências de 1) um forte centralismoadministrativo com vagas esporádicas de descen-tralização, especialmente nos períodos mais recen-tes; 2) indefinição de limites e de figuras adminis-trativas, com uma alternância entre Províncias,Comarcas e mais recentemente Distritos, que cons-tantemente sofriam alterações geográficas; 3) gran-des dificuldades em definir e consolidar um nível

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administrativo intermédio entre o central e o muni-cipal, sendo que em vários séculos as Provínciaseram consideradas muito vastas e noutros asComarcas eram consideradas muitas e fragmenta-das; 4) reduzida passagem de competências e demeios para os níveis administrativos criados; 5)forte dependência política dos nomeados paraesses cargos que eram considerados de confiançapolítica; 6) instabilidade política após a Revoluçãoliberal fez com que muitas reformas estivessem aser constantemente propostas sem terem sucesso,acabando por ter pouco tempo para serem impos-tas quando chegavam a ser aprovadas conduzindoa que o modelo de organização territorial doEstado estivesse permanentemente a mudar; 7)níveis reduzidos de reivindicação de maior auto-nomia e poder por parte das Províncias, que apesarda existência de regionalismos sólidos acabavampor não se conseguir impor a um forte poder cen-tral. Apesar de ser um país com fronteiras geográfi-cas bem definidas e consolidadas desde muitocedo, que reflectem também uma forte coesão eidentidade nacional (perante um vizinho grande epoderoso com tendências expansionistas), interna-mente nunca houve uma visão e uma estruturamuito clara e douradora sobre a administração doterritório nacional, sendo que o dilema esteve sem-pre entre o nível central e o nível municipal. Algu-mas destas características persistiram até à actuali-dade e há uma relação de dependência com a his-tória que não se apaga e que vai persistindo aindaque em diferentes moldes, dada a maior complexi-dade da realidade contemporânea.

Já nas décadas mais recentes, nos anos 1950/1960 entra-se numa nova fase onde começam asurgir as bases das políticas contemporâneas dedesenvolvimento regional, com estratégias e instru-mentos que visam reduzir as assimetrias de desen-volvimento internas que se vão acentuando. Aperspectiva histórica mostra que até aqui a admi-nistração do território à escala regional (Províncias,Comarcas) consistia na delimitação geográfica edefinição dos órgãos administrativos, numa pers-pectiva mais representativa do que interventiva,num país mais homogeneamente pobre e menosdiferenciado, onde os governantes tinham poucaspreocupações e capacidades para gerir as diferen-tes tendências que se verificavam. A partir desta

fase dão-se os primeiros passos na definição depolíticas e instrumentos de desenvolvimento regio-nal, sendo o III Plano de Fomento o principalmarco neste domínio. As influências europeiascomeçam-se a fazer sentir e tentam-se implementarno país algumas novas políticas.

A elaboração e publicação do III Plano deFomento 1968-1973 viria a lançar as primeirasbases de uma política nacional de desenvolvi-mento regional, dando seguimento a trabalhosanteriores. O III Plano de Fomento apresentava trêsgrandes objectivos: 1) A aceleração do ritmo deacréscimo do produto nacional; 2) A repartiçãomais equitativa dos rendimentos; e 3) A correcçãoprogressiva dos desequilíbrios regionais de desen-volvimento. Reconhecia-se assim no terceirogrande objectivo, a necessidade de contrariar oagravamento das assimetrias regionais dada «anecessidade de acelerar os ritmos de desenvolvi-mento nas regiões menos favorecidas» perante «aexistência de vastas áreas com taxas de cresci-mento muito baixas ou mesmo negativas».

Foram lançadas nesta fase as bases de umaorgânica regional assente na «descentralização edivisão do território em regiões económicas paraplaneamento e fomento» propondo-se para cadauma «órgãos consultivos e de coordenação servi-dos por departamentos técnicos de planeamento».Apesar dos avanços e recuos, foram criadosembriões de estruturas de governação regional,ainda que nesta altura com um nível muito redu-zido de competências, sendo pouco mais do queuma estrutura de representatividade do Governona região. Foram criadas então em 1969 quatroRegiões-plano no Continente (Norte, Centro, Lis-boa e Sul) e respectivas Comissões de PlaneamentoRegional com a finalidade de «coordenar a expres-são dos elementos representativos da região»,«colaborar na preparação dos respectivos planosde desenvolvimento e no acompanhamento da suaexecução» e «promover a coordenação, para osmesmos efeitos, dos meios de acção regional».Assumiam basicamente funções consultivas, semgrandes meios e poderes, com grande dificuldadeem desempenhar as funções atribuídas nos territó-rios sob sua responsabilidade.

Em traços gerais entre o final dos anos 50 e mea-dos dos anos 70, período de sensivelmente 15 anos,

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salientam-se aspectos como 1) o reconhecimento daexistência de assimetrias internas de desenvolvi-mento que se vinham agravando fortemente e quecareciam de intervenção publica; 2) influênciaexterna das ideias das políticas de desenvolvimentoregional que se iam desenvolvendo noutros países,nomeadamente no que diz respeito à política indus-trial; 3) introdução nos grandes exercícios de plani-ficação económico da problemática «desenvolvi-mento regional», significando o lançamento destaspolíticas em moldes mais contemporâneos em Por-tugal; 4) orientações de política regional associadasa política industrial, pólos de crescimento, consoli-dação de centros urbanos, implementação de cimapara baixo; 5) tentativa de delimitação do territórionacional de acordo com critérios de planeamento;6) criação de uma orgânica de planeamento regio-nal (ex. Comissões de Planeamento). Ficaram entãolançadas as bases do que é hoje a estrutura de pla-neamento regional portuguesa.

Democracia, regionalização e ciclos deevolução

Após o primeiro período de lançamento e imple-mentação da política regional em Portugal, quedurou sensivelmente cerca de 5 anos entre 1969 e1974, deu-se o 25 de Abril e veio um novo períodopolítico marcado pela instauração da democracia,que se foi consolidando até aos dias de hoje. É nestaaltura que surge a questão da regionalização políticado território nacional (criação de órgãos e centrosde poder regional), dado que até então o centra-lismo autocrático impedia veleidades a este nível.No que toca a esta temática ligada à regionalizaçãoe modelo de organização foi-se registando uma evo-lução que se pode descrever e caracterizar generica-mente em 4 fases distintas ao longo destes cerca de30 anos, entre 1974 e 2007, em função do níveldebate publico e actuação política nesta matéria.

Fase 1 – 1974-1985 – Regionalização enquantoobjectivo de democratização condenado pela insta-bilidade política

Nesta primeira fase que se sucede ao 25 deAbril de 1974 e que vai até meados dos anos 80, a

questão da regionalização assumia uma grandeimportância política para os vários Partidos, sendoencarada como um objectivo de democratizaçãodo país e inscrito na Constituição Portuguesa de1976, que levaria à criação das Regiões Autóno-mas da Madeira e dos Açores, resultando na regio-nalização assimétrica do país que se regista naactualidade. Em relação ao Continente, no iníciodos anos 80, decorreu mesmo um alargado pro-cesso de discussão sobre o assunto e até a publica-ção de um Livro Branco sobre a Regionalização(MAI, 1980). A orgânica regional foi reestruturada,foram produzidos ajustamentos geográficos, ascinco actuais Comissões de Coordenação Regionalforam criadas, substituindo as Comissões de Pla-neamento Regional. Este período de cerca de 10anos foi marcado por uma profunda instabilidadepolítica (o país teve 15 Governos, 6 Provisórios e 9Constitucionais), em que o objectivo da regionali-zação esteve inscrito em diversos Programas deGoverno, nunca chegando a ter condições deimplementação, apesar de alguns aprofundamen-tos registados e de ter sido um período extrema-mente dinâmico nestas matérias. Entretanto oPlano de Médio Prazo 1977-80 inscrevia grandeslinhas de correcção de desequilíbrios que se iamregistando, mostrando uma faceta de políticaregional nacional que se ia mantendo.

Fase 2 – 1985-1995 – Centralismo e «europei-zação» de políticas regionais num país em conver-gência e capacitação

Esta fase que durou sensivelmente uma décadacorresponde ao ciclo de governação do país peloPartido Social Democrata, sob liderança do Prof.Aníbal Cavaco Silva. Esta foi uma década marcadapela entrada do país na Comunidade EconómicaEuropeia, numa fase em que a prioridade era fazercrescer a economia e aproveitar as condições deacesso a elevados montantes de fundos comunitá-rios para infra-estruturar e capacitar o país. Haviauma exigência de estabilidade nas estruturas dosEstado e de evitar grandes roturas, que o debate daregionalização poderia arrastar, tendo centralismodo Estado sido acentuado. As Regiões no territórionacional mantiveram-se como longos braços daadministração central, com algumas competências

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mais operacionais em matéria de planeamento,mas sem um grande poder e autonomia. Por outrolado, a entrada na CEE e os processos de integra-ção nas várias políticas europeias, acabariam por irtrazendo uma política regional europeia, que se iatornando cada vez mais importante, robusta e efi-caz, que em Portugal acabaria por substituir a polí-tica regional nacional, reduzida quase à utilizaçãodos instrumentos financeiros comunitários (ex.FEDER, Fundo de Coesão) e à elaboração dos Pla-nos de Desenvolvimento Regional (PDR). Ao longodos anos a economia foi crescendo, o país foificando mais capacitado e diferenciado, começa-ram a ser novamente levantadas questões ligadasàs assimetrias de desenvolvimento verificadas nopaís, bem como questões de escala e eficiência naadministração do território. Este ciclo de governa-ção acaba por chegar ao fim marcado por fortedesgaste político, tendo Portugal encontrado osnovos caminhos das políticas regionais europeias,com as velhas estruturas de governação nacionais,ainda que se tivessem verificados alterações, aper-feiçoamentos e construção de capacidades, resul-tante das experiências acumuladas.

Fase 3 – 1995-1998 – Regionalização enquantoprojecto fracassado pela delimitação administrativaapresentada e bipolarização política

O Partido Socialista liderado pelo Eng. AntónioGuterres chega ao poder em 1995 e tem comouma das principais bandeiras políticas a questãoda regionalização. O modelo de Regiões propostopelo PS em acordo com o PCP em que se dividia oContinente em 8 Regiões não recolheu consensopolítico, o PSD colocou-se contra, houve entendi-mento para a realização de um referendo nacionalocorrido em 1998, onde o NÃO saiu claramentevencedor (64%) e a questão da regionalizaçãoficou novamente suspensa, deixando para trás umdebate altamente fracturante na sociedade portu-guesa e estereótipos muito negativos enraizados. Oconteúdo deste debate é bem mais pobre, demagó-gico e politicamente carregado do que o debatedos anos 1980-82, sobressaindo as guerras e osinteresses partidários. Foi também claro que o queesteve em causa foi mais uma negação ao modeloproposto do que ao principio da regionalização em

si. Ficou o estigma da regionalização que repre-senta a incapacidade dos principais blocos políti-cos resolverem a questão, após terem extremadoposições, ficando para trás uma política da terraqueimada em relação a este debate. O PartidoSocialista ficaria no poder até 2002, sem ter vol-tado a ter condições para equacionar um novocenário de regionalização. Com o passar destesanos, foi-se aprofundando ainda mais a integraçãoeuropeia e as 5 Regiões do Continente correspon-dendo ao nível administrativo NUTS2 e às Comis-sões de Coordenação Regional, que foram aumen-tando as suas competências e capacidades, o que aprazo enterra o modelo da proposta socialista decriar 8 Regiões administrativas.

Fase 4 – 1998-2009 – Descentralização e regio-nalização progressiva perante uma sociedadeestigmatizada sobre o tema das Regiões

Quando o PSD volta ao Governo em 2002 como Dr. Durão Barroso, foram definidas orientação nosentido da descentralização do aparelho do Estado,sem que tal significasse desenrolar o processo deregionalização. A estratégia seguida passou porreforçar as competências do nível regional, tendo as5 Regiões (Algarve, Alentejo, LVT, Centro e Norte)visto aumentadas as suas capacidades após a fusãodas Comissões de Coordenação Regional (CCR)com a Direcções Regionais de Ambiente e Ordena-mento do Território (DRAOT), sendo criadas asComissões de Coordenação e DesenvolvimentoRegional (CCDR) pelo Decreto-Lei nº 104/2003, de23 de Maio. Por outro lado, outra estratégia seguidavisou dar mais poder, autonomia e estatuto à escalasub-regional / supramunicipal, correspondendo àsassociações de municípios, tendo sido lançadalegislação que visava criar Grandes Áreas Metropo-litanas, Comunidades Urbanas e ComunidadesIntermunicipais, num esforço experimentalista queteve poucos resultados e acabou por se tornarnuma iniciativa inconsequente, dado que o PSDacabaria por estar pouco tempo no Governo.

Em 2005 o Partido Socialista liderado pelo Eng.José Sócrates voltava ao poder com maioria abso-luta, anunciando que nesse mandato a questão daregionalização não seria levantada, o que nãoimpediu que algumas reformas fossem feitas em

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matéria de reestruturação da administração centraldesconcentrada. Este novo período governativonacional iniciou-se numa fase de reformulação dapolítica regional europeia, preparando-se operíodo de programação comunitária de 2007-2013, que requeria cada vez mais uma visão estra-tégia sobre o papel das Regiões no contexto nacio-nal e europeu. Tornou-se mais evidente e relevanteo envolvimento das CCDR neste processo de pla-neamento estratégico, estando também estas maiscapacitadas para o poderem fazer do ponto devista técnico-administrativo. Em 27 de Abril de2007, é publicado o Decreto-Lei nº 134/2007 de27 de Abril que define as atribuições, competên-cias e recursos das CCDR, reflectindo poderes ecapacidades cada vez mais amplas e relevantespara a administração dos territórios e condução deprocessos de desenvolvimento ao nível regional.

Sinais de uma nova fase

Em síntese, no contexto de gradual aumento dopoder, do protagonismo e da autonomia de muitasregiões europeias, Portugal foi assistindo também aum aprofundamento das políticas regionais e a umreforço das capacidades do nível administrativoregional, ainda que sem grande autonomia políticae sem grande consciência ao nível da opiniãopublica. Em 2007, passados 20 anos sobre a adesãode Portugal à CEE, o país possui uma regionaliza-ção assimétrica (Regiões Autónomas dos Açores eda Madeira), persistindo um estigma na sociedadeportuguesa sobre o papel das Regiões. Ao nívelpolítico permanece o receio de que esta questão seassuma fracturante como no passado, pelo que odebate sobre a governação do território nacionaltem sido incipiente, camuflado e acima de tudoadiado. No entanto há sinais que evidenciam umressurgir do debate pelo que é necessário planear aforma como o assunto deve ser encarado.

3. REGIONALIZAÇÃO: UM NOVO DEBATE PARAUMA VELHA QUESTÃO

Uma década após o referendo que deixou oassunto em stand by, foram surgindo diversos

sinais que evidenciam o regresso do assunto àagenda política passada uma década, ainda que doponto de vista governativo não sejam previsíveisiniciativas até ao final de 2009. Porém, ao nívelregional e local a questão vai assumindo protago-nismo e destaque, sendo fácil de encontrar sinais eexpectativas nesse sentido. Ao nível nacional foimesmo lançado em Abril de 2007 o MovimentoRegiões Sim com o objectivo de promover a dis-cussão pública do assunto e recolher as assinaturasnecessárias para levar a Assembleia da Republica adiscutir a realização de um novo referendo. O con-texto em que o próximo debate se irá realizarpoderá ser uma boa oportunidade para discutir opapel do Estado e das Regiões nos processos dedesenvolvimento, sendo certo que podem haverdiferenças significativas em relação ao debate dosanos 90. Como foi visto na Parte 1 deste artigo, aEuropa conta actualmente com 27 países e 268Regiões (onde Portugal não é um país pequeno etem um número de regiões médias, de tamanhomédio), há um ganho de poder, protagonismo ecapacidades por parte das Regiões, que no períodode programação 2007-2013 vêem reforçada a suaimportância, pelo que é necessário considerar todoeste contexto externo em vez de um foco de puradelimitação interna. Além disso há mais algumasrealidades sobre as quais importa reflectir:

1. Modelo de cinco Regiões consolidado terri-torialmente e «consensualizável» politicamente

O mapa de Regiões que estará em discussãocorrespondente ao nível NUTS2 sob o actualdomínio das Comissões de Coordenação e Desen-volvimento Regional, que ao longo dos últimosanos se tem afirmado e consolidado, leva a que omodelo de 8 Regiões proposto no referendo de1998 esteja praticamente enterrado. Perante ocenário de cinco Regiões é expectável em termospolíticos um posicionamento favorável do PartidoSocialista e do Partido Comunista, enquanto queno lado do Partido Social Democrata a questãotambém possa recolher um amplo acolhimento(apesar de não existir uma visível posição oficialsobre o assunto são certamente muitos os apoian-tes da regionalização sobretudo ao nível das bases)dado que o que PSD (e o país) recusou foi o

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modelo de 8 Regiões e não a regionalização em si.Em síntese, se as geometrias políticos-partidárias decurto prazo não levarem a actuações surpresa éexpectável um consenso relativamente amplosobre a matéria, o que poderá permitir que a dis-cussão se centre mais no conteúdo do que naforma. Mesmo a questão destabilizadora da locali-zação da «capital» tenderá a estar resolvida à par-tida tendo em conta a sede dos serviços centraisdas CCDR, que até têm vindo a procurar encontrarabordagens de descentralização de serviços.

2. País mais diferenciado internamente com asRegiões a necessitarem de estratégias adequadosàs suas realidades territoriais

Um estudo de referência publicado em final de2005 intitulado «Competitividade territorial e coe-são económica e social» (elaborado pelo consórcioAugusto Mateus e Associados; CEPREDE; GEOI-DEIA; CIRIUS) apresentava uma realidade nacionalrelativamente diferenciada, em que as regiõesNorte e Centro, por um lado, apresentam umanítida especialização produtiva na indústria, asregiões do Algarve, Madeira e Lisboa e Vale doTejo, por outro lado, uma especialização centradanos serviços, enquanto que no Alentejo e nos Aço-res a agricultura permanece com um peso signifi-cativo. No que toca às condições da competitivi-dade e da coesão evidencia-se numa posição clarade liderança, a região de Lisboa e Vale do Tejo,mais forte nas condições de competitividade doque nas condições de coesão, enquanto que asassimetrias são marcadas, no pólo oposto, peladebilidade das condições de coesão evidenciadapela região dos Açores e pelo posicionamentodesequilibrado da região do Algarve, oscilando,num contraste extremado, entre a partilha da lide-rança nas condições de coesão e o último lugarnas condições de competitividade. As conclusõesdesse estudo apontam ainda que para responder àpressão de uma concorrência internacional acres-cida, e em matéria de renovação dos modelos eformas de promoção da coesão social e territorial,importa consagrar definitivamente uma lógica deespecialização, rede e serviços na expansão e ges-tão das infra-estruturas e equipamentos colectivos.Em suma são necessárias estratégias e abordagens

no sentido de actuações regionais adaptativas ediferenciadas. A regionalização por si só não reduzassimetrias de desenvolvimento como por vezes seprocura fazer entender mas permite que as regiõestenham maior autonomia para liderarem os seusprocessos de desenvolvimento, o que em segundocaso se poderá depois vir a traduzir em melhoresperformances ao nível dos vários indicadores.

3. Maior eficiência e articulação dos modelosde governança metropolitana e supramunicipal

Para além do papel das Regiões, existem todoum conjunto de problemas a resolver ao nível dagovernança sub-regional, supramunicipal oumetropolitano, onde durante bastante tempo impe-rou a falta de eficiência de instituições como asÁreas Metropolitanas (e respectivos órgãos comdestaque para as Juntas Metropolitanas) e no pano-rama das Associações de Municípios onde seencontra um pouco de tudo no que toca a actua-ções intermunicipais, de exemplos bastante positi-vos a casos de franco insucesso. Num momentoem que a governança multiníveis e o trabalho emrede é fundamental, torna-se necessário que exis-tiam instituições capacitadas para dinamizar terri-tórios, articular competências e intervenções,desenvolver projectos conjuntos e estimular a coo-peração É também importante ter em consideraçãoque no caso de Lisboa ou Algarve, a Área Metro-politana se sobrepõem em parte ou totalmente noque toca a território e a âmbitos de intervenção dasRegiões. O sucesso destas em termos operacionaispoderá depender em parte da forma do relaciona-mento com os níveis inferiores e da capacidadeinstitucional desses agentes.

4. Evolução de regionalismo provinciano aregionalismo dinâmico

Ao nível das próprias Regiões é necessário quehaja uma reflexão sobre quais os impactos de umaregionalização e sobre o papel dos agentes regio-nais. O que está em causa é uma postura maisactiva em relação ao desenvolvimento e ao encon-trar soluções de base regional e não tanto actua-ções reivindicativas em que se exige mundos efundos, ainda que com mais ou menos razão,

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PARTE II – DESAFIO: CIDADÃOS

tendo na mira um inimigo que por norma é oGoverno Central. Há neste campo um EfeitoAlberto João Jardim que tem contribuído para adesconfiança generalizada dos cidadãos em rela-ção às Regiões e a governantes a esta escala, queem parte deriva do actual modelo de regionaliza-ção assimétrica. Num cenário de regionalizaçãointegral é de esperar um maior equilíbrio políticoentre territórios e também comportamentos maisde acordo com um regionalismo dinâmico. Certa-mente que a criação de órgãos políticos regionaisirá trazer mudanças à organização dos Partidosque continuam a funcionar numa lógica de distri-tos e que acabarão por ver aparecer uma nova«classe» de políticos. Por outro lado há que criaroportunidades para que movimentos de cidadãos eoutros projectos políticos fora do «mainstream»tenham condições de participação. Os valores dacultura e da identidade regional, caso existam,devem ser valorizados numa perspectiva positivade mobilização dos agentes e sociedades regionaise não tanto numa lógica de exigência provinciana.

5. Comunicação, transparência e participaçãonum debate «bicéfalo»

Os defensores da regionalização deverão saberexplicar aos cidadãos para que é que as regiõesprecisam de maior poder e autonomia política, oque requer comunicação clara, curta, concisa ecriativa (os famosos 4C’s do jornalismo) a que sedevem juntar os princípios da transparência e res-ponsabilidade. O debate que irá emergir será cen-trado por um lado na esfera política nacional (queimplicações terá para o país como um todo) e poroutro lado na esfera de cada região onde os diver-sos agentes deverão proporcionar condições dedebate que permitam reflexões produtivas e organi-zadas sobre a matéria. Mais do que argumentos afavor de sim ou não importa discutir as problemáti-cas do desenvolvimento regional numa lógica maisampla e construtiva. Há aqui uma dose considerá-vel de responsabilidade que recai sobre a comuni-cação social, que no espectro nacional tende aprestar muita atenção a questões de carácter mais«macro» bem como a questões de carácter emi-nentemente local onde transpareça o sangue, suore lágrimas, ou ainda a questões altamente polariza-

das politicamente. As questões de carácter maisestratégico e estrutural neste debate necessitam demaior destaque, pelo que se requer encontrar pro-cessos comunicativos e participativos que vão paraalém do conjuntural e superficial, o que é funda-mental para evitar a polarização do debate sim-plesmente em volta do sim ou não. Uma forma deenquadrar o debate e estimular uma ampla discus-são pode ser através do lançamento de um novo«Livro Branco sobre a Regionalização em Portu-gal», que para além de permitir uma sistematiza-ção da discussão sobre dimensões chave, pode ser-vir de comparação com o processo realizado noinicio da década de 80.

6. As questões formais e habituais à volta daregionalização

O dossier regionalização levanta todo um con-junto de questões de carácter técnico, administra-tivo, legal e processual que ao longo dos anosforam sendo respondidas ou enquadradas mas quecarecem de concertação e adaptação (ou atémesmo inovação) em função da realidade actual.O modelo atribuições e competências; as finançasregionais; a estrutura de funcionamento; os órgãospolíticos que a Constituição define nomeadamentea Assembleia Regional (órgão deliberativo) e aJunta Regional (órgão Executivo); os processoseleitorais; são alguns aspectos que fazem parte deum vasto e complexo processo com fortes implica-ções no funcionamento e organização do país.Torna-se necessário interligar a questão da regio-nalização com os objectivos de uma de políticanacional de Regiões que vá para lá dos objectivose dos instrumentos da política comunitária. Porexemplo é necessário definir estratégias e actua-ções que reforcem a actividade internacional dasRegiões portuguesas no contexto europeu, queserão provavelmente das menos representadas emBruxelas, quando a maior parte dos países pos-suem representações das suas regiões a actuaremna perspectiva que foi exposta na Parte 1 desteartigo. Há todo um conjunto de «velhas» e«novas» questões à volta do tema regiões e regio-nalização que fazem com que o debate do séculoXXI seja realmente diferente dos ocorridos noséculo passado!

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DOSSIER

CONCLUSÃO

Este artigo chama a atenção para crescenteimportância das Regiões no contexto da globaliza-ção e da integração europeia, para o actual papelda Região Empreendedora que não é mais umamera escala territorial, pelo que nesta perspectivaa regionalização não pode ser um fim em simesmo, mas sim um processo que permita encon-trar melhores soluções para a gestão do territórionacional. Da leitura histórica efectuada é evidenteo estigma enraizado no país em relação à figuraregional, sendo que nos últimos trinta anos asituação permaneceu «entalada» do ponto de vistapolítico e constitucional, ainda que as instituições

ao nível regional tenham crescido em competên-cias e capacidades. No entanto, e passada umadécada sobre o não no referendo, a questão voltaa levantar-se num cenário bastante diferente, querequer um enquadramento de discussão tambémdiferente. A última parte deste artigo procuroureflectir sobre esse enquadramento deixando aideia de que poderão estar criadas as condiçõespara que a situação evolua do ponto de vista daautonomia política. Importa pois criar condiçõespara que a reflexão pública associada seja cons-trutiva quer para o todo nacional, quer para aspróprias Regiões, seus agentes e populações per-ceberem as oportunidades e dificuldades quepoderão existir.

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