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1 A economia brasileira está em “trajetória gradual de aceleração”, definiu o ministro Guido Mantega em audiência na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Sena- do. Ainda que seja positiva, não é uma qualificação empolgante acerca do estado atual da economia brasileira. 2 A cautela do ministro é compatível com a situação econômica do País, a qual carac- teriza-se, em linhas gerais, pela combinação de crescimento baixo e inflação alta. A trajetória, daqui para frente, como apontou o ministro, parece ser moderadamente po- sitiva, ao menos para 2013 e 2014. Mas há preocupações consistentes a respeito do que ocorrerá mais adiante, tendo em vista o acúmulo de distorções macroeconômicas, espe- cialmente no campo fiscal. 3 Além de a conjuntura econômica não ser especialmente auspiciosa, são crescentes, em amplitude e intensidade, as críticas à política econômica. Elas se concentram na área fiscal, censurada duramente até mesmo por Delfim Netto, defensor declarado do go- verno Dilma, mas se estendem também às políticas cambial e monetária. Isto é, alcançam a Fazenda e o Banco Central (BC). 4 Se a economia não vai bem, diz a regra de ouro da relação entre economia e políti- ca, a opinião pública repudia o governante. Não é, entretanto, o que está ocorrendo atualmente no Brasil. A pesquisa CNI-Ibope, divulgada na última terça-feira, mostrou que a maioria dos brasileiros está bastante satisfeita com o governo Dilma Rousseff, aprovado por 63% dos entrevistados, patamar recorde desde que ela assumiu o poder. Mais do que isso. Melhorou a avaliação popular a respeito da condução da criticada política econômi- ca. 5 De dezembro a março, a diferença entre aprovação e desaprovação subiu de -5 para 1, no caso do “combate à inflação”, e de 15 para 17 para “combate ao desemprego”. Já quanto a “impostos” e “taxa de juros”, embora as avaliações apresentem saldos negativos, isto é, exista mais gente que desaprova do que aprova a ação governamental, o desconten- tamento diminuiu, pois a diferença caiu de -35 para -24 e de –10 para -8, respectivamente. O destaque é a aprovação ao “combate ao desemprego”, elemento que explica, em grande parte, a popularidade do Governo, a despeito dos percalços da economia. O risco de administrar a economia com olho (só) na política Brasília, 25 de março de 2013. Nº 179 No próximo sábado sai a coluna da senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, na Folha de S. Paulo, no caderno B - Mercado. Vamos conferir!

Boletim macroeconomia CNA nº179

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1 A economia brasileira está em “trajetória gradual de aceleração”, defi niu o ministro Guido Mantega em audiência na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Sena-

do. Ainda que seja positiva, não é uma qualifi cação empolgante acerca do estado atual da economia brasileira.

2 A cautela do ministro é compatível com a situação econômica do País, a qual carac-teriza-se, em linhas gerais, pela combinação de crescimento baixo e infl ação alta.

A trajetória, daqui para frente, como apontou o ministro, parece ser moderadamente po-sitiva, ao menos para 2013 e 2014. Mas há preocupações consistentes a respeito do que ocorrerá mais adiante, tendo em vista o acúmulo de distorções macroeconômicas, espe-cialmente no campo fi scal.

3 Além de a conjuntura econômica não ser especialmente auspiciosa, são crescentes, em amplitude e intensidade, as críticas à política econômica. Elas se concentram na

área fi scal, censurada duramente até mesmo por Delfi m Netto, defensor declarado do go-verno Dilma, mas se estendem também às políticas cambial e monetária. Isto é, alcançam a Fazenda e o Banco Central (BC).

4 Se a economia não vai bem, diz a regra de ouro da relação entre economia e políti-ca, a opinião pública repudia o governante. Não é, entretanto, o que está ocorrendo

atualmente no Brasil. A pesquisa CNI-Ibope, divulgada na última terça-feira, mostrou que a maioria dos brasileiros está bastante satisfeita com o governo Dilma Rousseff, aprovado por 63% dos entrevistados, patamar recorde desde que ela assumiu o poder. Mais do que isso. Melhorou a avaliação popular a respeito da condução da criticada política econômi-ca.

5 De dezembro a março, a diferença entre aprovação e desaprovação subiu de -5 para 1, no caso do “combate à infl ação”, e de 15 para 17 para “combate ao desemprego”. Já

quanto a “impostos” e “taxa de juros”, embora as avaliações apresentem saldos negativos, isto é, exista mais gente que desaprova do que aprova a ação governamental, o desconten-tamento diminuiu, pois a diferença caiu de -35 para -24 e de –10 para -8, respectivamente. O destaque é a aprovação ao “combate ao desemprego”, elemento que explica, em grande parte, a popularidade do Governo, a despeito dos percalços da economia.

O risco de administrar a economiacom olho (só) na política

Brasília, 25 de março de 2013. Nº 179

No próximo sábado sai a coluna da senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, na Folha de S. Paulo,

no caderno B - Mercado.

Vamos conferir!

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6 Naturalmente, a elevada popularidade reforça o cenário de favoritismo de Dilma Rousseff para a disputa presidencial de 2014. Caso seja reeleita, Dilma ganhará

tempo para tentar destravar a economia e colocá-la na rota de crescimento mais acelerado e mais equilibrado. A aposta do Governo é que isso ocorrerá por conta das medidas, algu-mas delas certamente corretas, que tem adotado para destravar o investimento e melhorar a produtividade da economia. Apesar do excessivo ceticismo de muitos analistas, não é possível decretar, desde já, que a aposta do Governo esteja fadada ao insucesso.

7 Contudo, se os críticos estiverem corretos e se as distorções e desequilíbrios que estão se acumulando prevalecerem sobre as medidas favoráveis ao investimento e à

produtividade, a bomba pode estourar no colo da própria presidente Dilma. É possível que Aécio Neves, Eduardo Campos e, talvez, até Marina Silva estejam vislumbrando tal cenário. Todos eles sabem que Dilma é favorita para 2014. Porém, provavelmente, não recuarão na intenção de enfrentá-la, porque enxergam a possibilidade de a economia degringolar a par-tir de 2014, o que os deixaria em boa situação para tentar desalojar o PT do Governo federal em 2018. Nesse cenário, especialmente para Aécio e Campos, a eleição de 2014 servirá para torná-los conhecidos nacionalmente. Será uma preparação para 2018. Além disso, sempre há a chance de os ventos mudarem e o favoritismo de Dilma se esvanecer daqui até 2014.

8 Para evitar surpresas no próximo ano, Dilma está fortalecendo os laços com os par-tidos aliados, principal objetivo da reforma ministerial ainda em andamento. No

campo econômico, por sua vez, ataca a infl ação – ou pelo menos os índices de infl ação – via desonerações fi scais e administração de preços chave da economia (transportes e combus-tíveis), pois a alta dos preços parece ser o único fator econômico com potencial de colocar em risco a reeleição de Dilma.

9 Tal convicção justifi ca, também do ponto de vista político, a aposta de que o Banco Central aumentará a taxa Selic ainda neste ano, de modo a reduzir a probabilidade

de a infl ação se acelerar em 2014. Mas o aperto monetário não pode ser muito forte. Caso contrário, comprometerá a “trajetória gradual de aceleração” citada por Mantega.

10 Essas são as conexões de momento entre a economia e a política no Brasil, as quais, aqui e alhures, caminham juntas. Isto é especialmente verdade nos perío-

dos préeleitorais como vivenciamos atualmente no País, no qual todos os pré-candidatos já estão em campo, armando-se da melhor maneira possível para enfrentar a disputa de 2014.

11 Administrar a economia de olho na política é uma das armas do governo. Pode-se dizer que, ao misturar as duas coisas, o Governo corre o risco de derrapar no

campo econômico. Mas é ingenuidade pensar que governantes conduzem a economia sem mirar também para a política. Os mais responsáveis cuidam para evitar que os interesses políticos subvertam certos limites da lógica econômica. Os mais incautos os atropelam. Dilma está no primeiro grupo, mas parece fl ertar com o segundo.

Brasília, 25 de março de 2013. Nº 179