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Gabinete Desembargadora Marli Mosimann Vargas Recurso Em Sentido Estrito n. 0043432-35.2015.8.24.0023, da Capital Relatora: Desembargadora Marli Mosimann Vargas RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INSURGÊNCIA DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE REVOGAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA EM RAZÃO DE NÃO TEREM SIDO ANALISADOS OS REQUERIMENTOS DE PROVAS FORMULADOS NA PETIÇÃO DE RESPOSTA À ACUSAÇÃO. EVENTUAL OMISSÃO DO MAGISTRADO SINGULAR QUE DEVERIA TER SIDO IMPUGNADA POR MEIO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. REVOGAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DO CARGO DE VEREADOR. ALEGADO EXCESSO DE PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CABIMENTO. AFASTAMENTO QUE DURA APROXIMADAMENTE 1 (UM) ANO E 2 (DOIS) MESES, SEM PERSPECTIVA DE ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. MANDATO ELETIVO QUE FINDAR-SE-Á EM 31 DE DEZEMBRO DE 2016. POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DE UMA EVENTUAL SENTENÇA CONDENATÓRIA. REVOGAÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito n. 0043432-35.2015.8.24.0023 , da comarca da Capital Unidade de Apuração de Crimes Praticados por Organizações Criminosas em que é recorrente Cesar Luiz Belloni Faria e recorrido Ministério Público do Estado de Santa Catarina. A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime,

Decisão sobre o Vereador Cesar Faria

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Gabinete Desembargadora Marli Mosimann Vargas

Recurso Em Sentido Estrito n. 0043432-35.2015.8.24.0023, da CapitalRelatora: Desembargadora Marli Mosimann Vargas

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INSURGÊNCIA DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE REVOGAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS.

ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA EM RAZÃO DE NÃO TEREM SIDO ANALISADOS OS REQUERIMENTOS DE PROVAS FORMULADOS NA PETIÇÃO DE RESPOSTA À ACUSAÇÃO. EVENTUAL OMISSÃO DO MAGISTRADO SINGULAR QUE DEVERIA TER SIDO IMPUGNADA POR MEIO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO.

REVOGAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR DE SUSPENSÃO DO CARGO DE VEREADOR. ALEGADO EXCESSO DE PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CABIMENTO. AFASTAMENTO QUE DURA APROXIMADAMENTE 1 (UM) ANO E 2 (DOIS) MESES, SEM PERSPECTIVA DE ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. MANDATO ELETIVO QUE FINDAR-SE-Á EM 31 DE DEZEMBRO DE 2016. POSSIBILIDADE DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DE UMA EVENTUAL SENTENÇA CONDENATÓRIA. REVOGAÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR QUE SE IMPÕE.

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito n. 0043432-35.2015.8.24.0023, da comarca da Capital Unidade de Apuração de Crimes Praticados por Organizações Criminosas em que é recorrente Cesar Luiz Belloni Faria e recorrido Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime,

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conhecer em parte do recurso e dar-lhe provimento para revogar as medidas cautelares impostas ao recorrente, quais sejam, (a) compromisso de comparecer a todos os atos processuais e manter o endereço atualizado nos autos; (b) proibição de se ausentar da Comarca em que reside por prazo superior a 8 dias sem autorização judicial; (c) proibição de se ausentar do país por qualquer período e entregar seus passaportes em juízo; (d) comparecimento mensal em juízo para informar e justificar suas atividades; (e) proibição de acesso a qualquer prédio onde funcione órgão da administração direta ou indireta do Município de Florianópolis, seja do Poder Executivo ou do Poder Legislativo; (f) proibição de manterem contato entre si ou com os demais réus, assim como qualquer servidor do IPUF; e, inclusive, (g) suspensão do exercício da função pública de vereador. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Paulo Roberto Sartorato e Carlos Alberto Civiski.

Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça participou o Exmo. Sr.

Procurador Carlos Eduardo Abreu Sá Fortes.

Florianópolis, 16 de fevereiro de 2016.

Desembargadora Marli Mosimann VargasPRESIDENTE E RELATORA

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RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por César Luiz

Belloni Faria contra decisão do Juízo da Unidade de Apuração de Crimes

Praticados por Organizações Criminosas da comarca da Capital, que indeferiu o

pedido de revogação da medida cautelar, mantendo-as pelo prazo de 180 (cento

e oitenta) dias.

Sustenta a defesa que há excesso de prazo na medida cautelar

imposta, pois o recorrente se encontra afastado da função pública de vereador

desde 12-12-2014, ou seja, quase 25% do mandato.

Aduz que houve cerceamento de defesa, pois não foram analisados

os requerimentos de provas formulados na petição de resposta em 19-6-2015.

Desta feita, requer a retorno ao exercício do mandato de vereador à

Câmara Municipal de Florianópolis, nos termos do art. 5º, XXXV, LIV e LV, bem

como seja determinada a realização das provas especificadas, a tempo e modo,

inclusive, aquelas constantes da resposta (fls. 1-42).

Em contrarrazões, requereu o Ministério Público o não

conhecimento do recurso por ser intempestivo, por ausência de pressuposto de

admissibilidade objetivo de cabimento, seja pela atipicidade recursal, seja pela

inadequação da via eleita e, caso não seja esse o entendimento, o não

provimento do recurso (fls. 264-307).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo.

Sr. Dr. Gercino Gerson Gomes Neto, manifestando-se pelo não conhecimento,

mas se conhecido, pelo desprovimento do recurso (fls. 7-19).

Este é o relatório.

VOTO

De início, oportuno esclarecer, muito embora o Ministério Público e

a Procuradoria-Geral de Justiça tenham se manifestado pelo não conhecimento

do recurso, ao argumento de que não está inserido nas hipóteses previstas

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expressamente no rol taxativo de seu cabimento, é possível a sua admissão por

meio de interpretação extensiva, haja vista que a decisão que determina ou

revoga a substituição de medidas cautelares diversas da prisão tem similitude

com a hipótese descrita no art. 581, V, do Código de Processo Penal, a qual

prevê que caberá o recurso em comento contra decisão que indeferir

requerimento de prisão preventiva.

A respeito, extrai-se da lição de Renato Brasileiro de Lima:Segundo o art. 581, V, do CPP, também caberá RESE contra a decisão

que indeferir requerimento de prisão preventiva. Na medida em que a lei admite a interposição de recurso em sentido estrito contra a decisão que indeferir requerimento de prisão preventiva, também deve ser admitido RESE contra a decisão que indefere requerimento de decretação de prisão temporária e/ou medida cautelar diversa da prisão, ou que revoga e/ou determina a substituição de quaisquer das medidas cautelares de natureza pessoal. É bem verdade que as Leis 7.960/1989 e 12.403/2011 silenciaram acerca dos recursos cabíveis quando houver o indeferimento de prisão temporária e de decretação de medidas cautelares diversas da prisão, assim como sua revogação e/ou substituição. A despeito do silêncio do legislador, pensamos ser possível interpretar-se extensivamente o cabimento do recurso em sentido estrito em tais hipóteses [...] (Manual de Processo Penal, v. II, Niterói: Impetus, p. 933).

No mesmo sentido, tem-se precedente do Superior Tribunal de

Justiça:[...] o cabimento do recurso em sentido estrito não corresponde a

"numerus clausus" se submetendo, por isso, à interpretação extensiva e à integração por analogia, desde que a situação a que se busca enquadrar tenha similitude com as hipóteses do art. 581 do CPP" (RESP 197.661/PR, rel. Ministra Maria Thereza de Assis, Sexta Turma, j. 1º-12-2008) (Resp 1179202/SP, rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. 6-9-2011).

Esta Corte de Justiça não destoa:RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO

PÚBLICO CONTRA DECISÃO QUE SUBSTITUIU AS MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO ANTERIORMENTE IMPOSTAS APENAS PELA PROIBIÇÃO DE CONTATO COM TESTEMUNHAS. MEDIDAS INTRODUZIDAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PELA LEI 12.403/2011, A QUAL SILENCIOU ACERCA DO RECURSO CABÍVEL. EMBORA NÃO PREVISTA NO ROL TAXATIVO DO ART. 581 DO CPP, A HIPÓTESE GUARDA SIMILITUDE COM O INDEFERIMENTO OU REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA, PREVISTA NO INCISO V DA NORMA. PECULIARIDADES DO CASO QUE PERMITEM A ADMISSÃO DO RECURSO POR INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA [...] (Recurso Criminal n. 2014.057266-9, de Armazém, rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 31-03-2015).

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Nesse âmbito, colhe-se julgado do Tribunal do Rio Grande do Sul:APELAÇÃO CRIME RECEBIDA COMO RECURSO EM SENTIDO

ESTRITO. PEDIDO DE CONCESSÃO DE CAUTELAR PARA A SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ECONÔMICA. INDEFERIMENTO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.

1- O recurso cabível para a hipótese de indeferimento de medida cautelar diversa da prisão é o recurso em sentido estrito, por interpretação extensiva do artigo 581, inciso V, do CPP.

2- Inviável, na espécie - que versa sobre a contravenção de exploração de jogo de azar - a imposição de medida cautelar de suspensão de atividade econômica como forma de evitar a prática de infrações penais, com fundamento no art. 282, inc. I, in fine, do CPP, haja vista a ausência de previsão legal. RECURSO IMPRÓVIDO (Recurso Crime n. 71004109989, rel: Cristina Pereira Gonzales, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, j. 25-2-2013).

Do mesmo modo, em que pese o douto Promotor de Justiça

suscitar que o recurso é intempestivo, constata-se por meio da certidão juntada à

fl. 263, que houve instabilidade do peticionamento eletrônico no SAJ, no dia

3-11-2015, justamente o último dia do prazo de interposição do recurso.

Assim, considerando que a decisão foi publicada no dia 27-10-2015

(fls. 5.788-5790 do processo principal), o prazo teve início no dia 28-10-2015 (por

força da Resolução n. 35/2015 do TJSC) e encerrou-se no dia 4-11-2015, visto

que no dia 1º-11-2015 era domingo, no dia 2-11-2015 era feriado nacional e no

dia 3-11-2015 houve prorrogação do prazo devido a instabilidade do

peticionamento eletrônico.

Portanto, trata-se de recurso tempestivo.

Entretanto, no que diz respeito ao cerceamento de defesa, por não

terem sido analisados os requerimentos de provas formulados na petição de

resposta à acusação, como bem salientou o douto Parecerista (fl. 10 deste

autos): "no caso de decisão omissa, deveria a defesa opor embargos de

declaração, conforme dispõe o art. 382 do CPP", de modo que inviável o

conhecimento do recurso no ponto.

Ademais, constata-se que o magistrado singular manifestou-se

acerca dos requerimentos de provas postulados, conforme se observa no

decisum de fls. 4.472-4489, note-se:

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[...] 2.2.2 - Degravação parcial das interceptações telefônicasO réu César Luiz Belloni Faria aduz, ainda em sede de preliminar, a

necessidade de degravação integral das interceptações telefônicas, a ser realizada pelo IGP.

Igualmente não merece prosperar tal pedido, uma vez que de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, não é necessária a degravação integral dos diálogos telefônicos interceptados, mormente daqueles que em nada se referem aos fatos, porquanto a Lei n. 9.296/1996 não faz nenhuma exigência nesse sentido. É necessário, a fim de que sejam observadas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, que se transcrevam, de forma satisfatória, aqueles trechos que serviram de base para o oferecimento da denúncia e que se permita às partes o acesso aos diálogos captados. Precedentes. (...) Não se mostra razoável exigir, sempre e de modo irrestrito, a degravação integral das escutas telefônicas, haja vista o prazo de duração da interceptação e o tempo razoável para dar-se início à instrução criminal, porquanto há diversos casos em que, ante a complexidade dos fatos investigados, existem mais de mil horas de gravações (STJ, HC n. 278794/SP, Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta turma, julgado em 07/10/2014). (grifei)

Diante dessas considerações e dos argumentos já expressos no item n. 2.1.3, rechaço a prefacial arguida pelo acusado.

2.2.3 Conforme certidão de p. 4444 a Polícia Federal já entregou em juízo os documentos apreendidos, o que torna prejudicado o requerimento de p. 2526.

2.2.4 Oficie-se à Prefeitura Municipal na forma requerida nos itens "vi" e "vii" (p. 2526/2527), com prazo de 15 dias para resposta [...].

Desta feita, eventual insatisfação do recorrente quanto às provas

produzidas durante a instrução poderá ser manifestada na fase do art. 402 do

Código de Processo Penal.

De outro norte, concernente ao pedido de revogação da medida

cautelar de suspensão do exercício da função pública de vereador, em

decorrência do excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal, vê-

se que razão assiste à defesa.

Consta dos autos, que o recorrente foi denunciado pelo Ministério

Público, juntamente com outros indivíduos, pela suposta prática dos crimes

descritos no art. 2º, caput, § 3º e 4º, II, da Lei n. 12.850/2013, art. 317, caput e §

1º, por diversas vezes, na forma do art. 71, caput, todos do Código Penal, art. 90

da Lei n. 8.666/1993; e art. 312, caput, (segunda parte), c/c art. 327, § 2º, todos

do Código Penal.

O Ministério Público paralelamente requereu a decretação da prisão

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preventiva do recorrente, contudo, o magistrado indeferiu o pleito, sob a

imposição de medidas cautelares alternativas, dentre elas, a suspensão do

exercício da função pública de vereador do município de Florianópolis, consoante

se observa na decisão de fls. 719-731.

Da referida decisão, o acusado interpôs recurso em sentido estrito

n. 2015.016558-4, alegando não existir indícios na interpretação do art. 239 do

Código de Processo Penal que autorizem o afastamento deste do exercício do

mandato de vereador, todavia, esta Colenda Câmara Criminal, conheceu do

recurso e negou-lhe provimento.

Posteriormente, o acusado requereu, mais uma vez, ao magistrado

singular a revogação das medidas cautelares impostas ao acusado, o que foi

indeferido, prorrogando-as, inclusive, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias

(decisão de fls. 5.762-5.777), motivo pelo qual interpôs o presente recurso em

sentido estrito, objetivando a revogação da medida cautelar consistente no

afastamento da função pública de vereador.

Vale ressaltar, na mesma decisão em que foi indeferido o pedido de

revogação das medidas cautelares, o magistrado singular designou audiência de

instrução para o dia 16-11-2015.

Contudo, apesar de realizada a referida audiência, o magistrado a

quo "considerando a necessidade de designar nova data para as testemunhas

faltantes, e a pedido das Defesas, por conta das eleições na OAB/SC, o MM.

Juiz deliberou em dar continuidade à audiência de oitiva de testemunhas

arroladas pela acusação em nova data". Assim, designou o dia 15-2-2016 para a

continuidade da audiência (fls. 5.857-5.858).

Dessa forma, verifica-se que desde a imposição das referidas

medidas ao recorrente – 12-12-2014 – até os dias atuais, transcorreram

aproximadamente 1 (um) ano e 2 (dois) meses, sendo que até o momento

ocorreu somente o primeira audiência de instrução, sem perspectiva de

encerramento da instrução criminal, tampouco de retorno ao cargo de vereador

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para o qual fora legitimamente eleito.

Destaca-se, embora o Juízo singular tenha prorrogado a medida

pelo período de 180 (cento oitenta) dias, deixou claro que findo o prazo, o

afastamento será reavaliado, isto é, pode ser estendido mais uma vez, tornando

o afastamento do cargo eletivo de forma indefinida, o que afronta à natureza

transitória e precária da medida cautelar.

O egrégio Superior Tribunal de Justiça tem o entendimento de não

ser razoável a medida cautelar de afastamento dos agentes detentores de cargo

público por mais de 180 (cento e oitenta) dias, por configurar a cassação indireta

do mandato conferido ao acusado pelas urnas populares, conforme se verifica:PEDIDO DE SUSPENSÃO DE MEDIDA LIMINAR. AFASTAMENTO DO

CARGO DE VEREADOR. LESÃO À ORDEM PÚBLICA. A norma do art. 20, parágrafo único, da lei n. 8.429, de 1992, que prevê o

afastamento cautelar do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa, só pode ser aplicada se presente o respectivo pressuposto, qual seja, a existência de risco à instrução processual. Hipótese em que a medida foi fundamentada em elementos concretos a evidenciar que a permanência no cargo representa risco efetivo à instrução processual. Agravo regimental não provido.

[...] Nessa linha, o pedido de suspensão de liminar foi deferido, em parte, apenas para limitar os efeitos da decisão que afastou os vereadores dos seus cargos eletivos até 180 (cento e oitenta) dias contados do decisum ora agravado à vista do tempo já decorrido (AgRg na SLS 1.500/MG, rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, j. 6-6-2012, grifo nosso)

Bem como em:PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS ORIGINÁRIO. PREFEITO

MUNICIPAL. AFASTAMENTO CAUTELAR DO CARGO. APLICAÇÃO DAS MEDIDAS DO ART. 319 DO CPP. POSSIBILIDADE. LEI POSTERIOR. DECISÃO DE AFASTAMENTO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. EXCESSO DE PRAZO. OCORRÊNCIA. AFASTAMENTO QUE DURA APROXIMADAMENTE 1 (UM) ANO. INQUÉRITO NÃO CONCLUÍDO.INEXISTÊNCIA DE OFERECIMENTO DE DENÚNCIA.

1. Aplica-se aos detentores de mandato eletivo a possibilidade de fixação das medidas alternativas à prisão preventiva previstas no art. 319 do CPP, por tratar-se de norma posterior que afasta,tacitamente, a incidência da lei anterior.

2. A decisão de afastamento do mandatário municipal está devidamente fundamentada com a demonstração de suas necessidade e utilidade a partir dos elementos concretos colhidos dos autos.

3. A Constituição Federal garante aos litigantes a duração razoável do

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processo conjugado com o princípio da presunção de não culpabilidade. 4. Configura excesso de prazo a investigação criminal que dura mais de 1

(um) ano sem que se tenha concluído o inquérito policial, muito menos oferecida a Denúncia em desfavor do paciente.

5. In casu, o paciente já está afastado do cargo há cerca de um ano,o que corresponde a 1/4 (um quarto) do mandato, podendo caracterizar verdadeira cassação indireta, papel para o qual o Poder Judiciário não foi investido na jurisdição que ora se exercita. [...] (Habeas Corpus n. 228023/SC, rel. Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do tj/rj), Quinta Turma, j. 19-6-2012, grifo nosso)

Do corpo do supramencionado acórdão, ainda se extrai: Acerca do afastamento dos agentes detentores de Cargo Público, a

jurisprudência desta Corte está firmada no entendimento de que o prazo do afastamento não deve ser superior a 180 (cento e oitenta) dias por configurar cassação indireta do mandato conferido ao investigado pelas urnas populares.[...] (grifo nosso).

No mesmo sentido, é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:Verifico que as decisões proferidas determinam o afastamento do cargo

eletivo de forma indefinida, em total contrariedade à natureza transitória e precária da medida cautelar.

Nesse sentido, em uma análise perfunctória dos fatos, típica das medidas liminares, entendo que o requerente logrou êxito em demonstrar o risco de grave lesão à ordem pública.

De fato, o art. 20 da Lei 8.429/92 determina que “a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória”. Por sua vez, o parágrafo único do referido dispositivo legal estabelece que “a autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual”.

Destaco, todavia, que são admissíveis as medidas cautelares de afastamento de acusados que exerçam cargo público quando existente prova inequívoca dos fatos, aptas a sustentá-las.

Observo, ademais, que as medidas cautelares de afastamento de acusados que exerçam cargo público são excepcionais, não se podendo utilizá-las de forma subversiva que resulte na deturpação da essência de seu propósito processual. A despeito do caráter da medida, que visa preservar a ordem pública e a segurança jurídica, muitas vezes sua aplicação se distancia de seu propósito, especialmente quando constatada a possibilidade de a medida cautelar apresentar duração excessiva, inclusive por não se poder assegurar quanto tempo irá durar a instrução processual. Aplica-se, neste caso, a percuciente ilação de Rui Barbosa de que “jamais se podem eternizar medidas restritivas de direitos, porque sempre estão sujeitas a condições clausulares dispostas em lei e a limitações no tempo” (grifo nosso).

In casu, verifica-se que o recorrente encontra-se afastado do seu

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cargo eletivo por período que corresponde há mais de 1/4 (um quarto) do tempo

do seu mandato, o que poderia caracterizar verdadeira cassação indireta do

mandato eletivo.

Ressalta-se, ainda, que o recorrente foi eleito em 2012, findando

seu mandato em 31-12-2016. Desse modo, desde a imposição da medida

cautelar de afastamento já decorreu mais de 395 (trezentos e noventa e cinco)

dias, restando apenas 319 (trezentos e dezenove) dias do mandato.

Logo, evidente a possibilidade de que o recorrente seja mantido

afastado da função pública de vereador até o encerramento do mandato, sem

que a ação penal chegue ao final, fato que ensejaria antecipação dos efeitos de

uma eventual sentença condenatória.

Em casos semelhantes, de constrangimento ilegal por excesso de

prazo, esta Corte de Justiça assim decidiu:HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. ROUBO

DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE PESSOAS (ARTIGO 157, § 2º, I E II, DO CÓDIGO PENAL). PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. PACIENTE SEGREGADA HÁ MAIS DE CINCO MESES. DEMORA NO TÉRMINO DA INSTRUÇÃO PROVOCADO PELA DEFICIÊNCIA DA MÁQUINA JUDICIÁRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. [...]. ORDEM CONCEDIDA. (Habeas Corpus n. 2013.042043-9, de Laguna, rel. Des. Newton Varella Júnior, Quarta Câmara Criminal, j. 1º-8-2013)

Mais:HABEAS CORPUS. PRISÕES EM FLAGRANTE. TRÁFICO DE

ENTORPECENTE. ARGUIÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA. PACIENTES PRESOS HÁ MAIS DE 7 (SETE) MESES. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO QUE SEQUER FOI DESIGNADA, NADA OBSTANTE A AUSÊNCIA DE EXPEDIENTES PROTELATÓRIOS DA DEFESA OU OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS JUSTIFICADORAS DA DEMORA. MAGISTRADO QUE NÃO PRESTOU AS INFORMAÇÕES SOLICITADAS. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA CARACTERIZADO. ORDEM CONCEDIDA. (Habeas Corpus n. 2010.011801-6, de Biguaçu, rel. Des. Túlio Pinheiro, Segunda Câmara Criminal, j. 25-5-2010).

Assim, configurado o excesso de prazo para a formação da culpa,

não resta outra alternativa à esta relatora senão dar provimento ao recurso, a fim

de revogar as medidas cautelares impostas ao recorrente, quais sejam, (a)

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compromisso de comparecer a todos os atos processuais e manter o endereço

atualizado nos autos; (b) proibição de se ausentar da Comarca em que reside

por prazo superior a 8 dias sem autorização judicial; (c) proibição de se ausentar

do país por qualquer período e entregar seus passaportes em juízo; (d)

comparecimento mensal em juízo para informar e justificar suas atividades; (e)

proibição de acesso a qualquer prédio onde funcione órgão da administração

direta ou indireta do Município de Florianópolis, seja do Poder Executivo ou do

Poder Legislativo; (f) proibição de manterem contato entre si ou com os demais

réus, assim como qualquer servidor do IPUF; e, inclusive, (g) suspensão do

exercício da função pública de vereador.

Comunique-se ao Magistrado de primeiro grau.

Este é o voto.