3
A ECONOMIA VERDE NA RIO +20 E NA CÚPULA DOS POVOS ALGUMAS QUESTÕES PARA O DEBATE "A natureza pode suprir todas as necessidades do homem, menos a sua ganância”. Mahatma Gandhi A Rio +20 que ocorreu de 13 a 22 de junho foi um evento que além de marcar os vinte anos de realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) e propagandear a suposta contribuição para a definição de uma agenda do desenvolvimento sustentável para as próximas décadas, mobilizou os holofotes midiáticos e trouxe representações de muitos países que em grande parte, composta efetivamente, não pelos chefes de Estado, mas por suas representações e assessorias. Além de ter sido um espaço marcado pelo formalismo, artificialidade, excessiva ostentação de aparatos militares, altos gastos de recursos públicos e falta de comprometimento político para discussão das diretrizes do desenvolvimento sustentável dos países para os próximos anos, também foi um espaço que buscou assentar as bases do que se chama “capitalismo verde”. Outra presença e influência marcante na Rio +20 foram as instituições financeiras multilaterais (BIRD e Banco Mundial) e das agências multilaterais do sistema ONU (em especial a FAO, UNESCO e PNUMA). Um dos desdobramentos disso, foi o conteúdo aprovado na carta final da Conferência que além de retroceder nos direitos das mulheres, não deixou claro: quais os mecanismos de sustentação e manutenção desse desenvolvimento sustentável que dizem querer; não sinaliza quais as possíveis ações a serem tomadas em relação às mudanças climáticas; garantias do direito universal a água; entre outros temas considerados fundamentais para os direitos humanos e o desenvolvimento socioambiental para os próximos anos 1 . Junto ou em contraposição a Rio +20 ocorreu no Aterro do Flamengo e em diversos pontos do Rio de Janeiro a Cúpula dos povos entre os dias 15 e 23 de junho. Na Cúpula muitos movimentos sociais e populares, sindicatos, povos, organizações da sociedade civil e ambientalistas de vários países estavam presentes e construindo atividades como: os acampamentos, as mobilizações massivas 2 , debates, definindo estratégias de mobilização e proposição de outro projeto de sociedade e relação socioambiental. A tônica da maioria dessas atividades era questionar, resistir e propor questões e pautas em oposição ao desenvolvimento sustentável e a economia verde que são uma das vertentes atuais do 1 O documento final da Conferência está disponível, em inglês, para consulta na URL: http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-queremos/ . 2 Destaque para as mobilizações da Marcha Mundial das Mulheres e a Marcha dos Povos que somadas levaram 80 mil pessoas as ruas do Rio de Janeiro.

Rio +20 e economia verde

Embed Size (px)

Citation preview

A ECONOMIA VERDE NA RIO +20 E NA CÚPULA DOS POVOS

ALGUMAS QUESTÕES PARA O DEBATE

"A natureza pode suprir todas as necessidades do homem, menos a sua ganância”.

Mahatma Gandhi

A Rio +20 que ocorreu de 13 a 22 de junho foi um evento que além de marcar os vinte anos

de realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92)

e propagandear a suposta contribuição para a definição de uma agenda do desenvolvimento

sustentável para as próximas décadas, mobilizou os holofotes midiáticos e trouxe representações de

muitos países que em grande parte, composta efetivamente, não pelos chefes de Estado, mas por

suas representações e assessorias.

Além de ter sido um espaço marcado pelo formalismo, artificialidade, excessiva ostentação

de aparatos militares, altos gastos de recursos públicos e falta de comprometimento político para

discussão das diretrizes do desenvolvimento sustentável dos países para os próximos anos, também

foi um espaço que buscou assentar as bases do que se chama “capitalismo verde”. Outra presença e

influência marcante na Rio +20 foram as instituições financeiras multilaterais (BIRD e Banco

Mundial) e das agências multilaterais do sistema ONU (em especial a FAO, UNESCO e PNUMA).

Um dos desdobramentos disso, foi o conteúdo aprovado na carta final da Conferência que além de

retroceder nos direitos das mulheres, não deixou claro: quais os mecanismos de sustentação e

manutenção desse desenvolvimento sustentável que dizem querer; não sinaliza quais as possíveis

ações a serem tomadas em relação às mudanças climáticas; garantias do direito universal a água;

entre outros temas considerados fundamentais para os direitos humanos e o desenvolvimento

socioambiental para os próximos anos1.

Junto ou em contraposição a Rio +20 ocorreu no Aterro do Flamengo e em diversos pontos

do Rio de Janeiro a Cúpula dos povos entre os dias 15 e 23 de junho. Na Cúpula muitos

movimentos sociais e populares, sindicatos, povos, organizações da sociedade civil e ambientalistas

de vários países estavam presentes e construindo atividades como: os acampamentos, as

mobilizações massivas2, debates, definindo estratégias de mobilização e proposição de outro projeto

de sociedade e relação socioambiental.

A tônica da maioria dessas atividades era questionar, resistir e propor questões e pautas em

oposição ao desenvolvimento sustentável e a economia verde que são uma das vertentes atuais do

1 O documento final da Conferência está disponível, em inglês, para consulta na URL:

http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-queremos/. 2 Destaque para as mobilizações da Marcha Mundial das Mulheres e a Marcha dos Povos que somadas levaram 80 mil

pessoas as ruas do Rio de Janeiro.

ciclo histórico capitalista. Entretanto, nem todas as organizações e movimentos sociais que atuaram

na Cúpula estavam com esta posição, pois muitas atuavam como apoio ou suporte de ações

socioambientais depredatórias e corporações financeiras, exemplo disso, no caso do Brasil, foram às

presenças do movimento “Belo Monte Sim” e dos estandes e promoção de ações pela Companhia

Vale, Confederação Nacional da Agricultura, Fundação Ford, entre outros.

Nesse sentido, é possível perceber que muito falou-se nos últimos tempos, inclusive nesses

dois eventos, sobre o tema da Economia Verde, seja a favor da mesma, ou não. Desse modo,

também cabe explicitar e provocar, mesmo que de forma breve, algumas questões em relação ao

que seria essa economia, quem atua em prol dela e quais os interesses em jogo.

Para o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA, a economia

verde pode ser definida como “Uma economia que resulta em melhoria do bem-estar da

humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz, significativamente, riscos

ambientais e escassez ecológica". Para que ocorra essa economia verde, o aumento da renda e das

vagas de trabalho deve ser estimulado por investimentos públicos e privados que diminuam a

poluição, aumentem a eficiência energética e previnam perdas de biodiversidade. Nesse tipo de

economia, anuncia-se que o desenvolvimento deve manter, aprimorar e reconstruir bens naturais,

vendo-os como um bem econômico e como uma fonte de benefícios, principalmente para a

população de baixa renda, cujo sustento depende da natureza. Consideram que o conceito

de economia verde não substitui o conceito de desenvolvimento sustentável, mas que para a

sustentabilidade acontecer é necessário desenvolver um modelo certo de economia (PNUMA,

2011)3.

Contudo, cabe alertar, que em todo texto há um contexto, e em meio a esse discurso

“sustentável” permeado por malabarismos semânticos, há um conjunto de interesses vinculados ao

atendimento exclusivo ou em grande parte de criar novos nichos de mercado capitalista, valoração

de recursos naturais ainda não capitalizados, explorar indiscriminadamente os ecossistemas e as

experiências socioambientais dos diversos povos. Assim, a partir dessa proposta há uma grande

tendência em colocar na lógica capitalista e tornar passíveis de lucro todos os bens até então

considerados comuns a humanidade.

Desse modo, uma das questões que pairam sobre a economia verde e que pode ser

considerada uma das suas contradições centrais é que a mesma é propagandeada como algo em que

todos vão ganhar, mas ao mesmo tempo não se propõe, por exemplo, a superar a desigualdade

social, promover reforma agrária, ou realizar investimentos em tecnologias sociais, experiências

agroecológicas, captação de energia eólica e solar, entre outras. Exemplo disso é o conjunto de

3 Maiores informações e mais documentos do PNUMA que expressam essas ideias, podem ser acessados na íntegra pelo

site: http://www.pnuma.org.br/publicacoes.php.

interesses políticos e econômicos que permeiam a construção das grandes hidrelétricas, que

supostamente são uma fonte limpa de energia, mas que na realidade causam grandes impactos

socioambientais e atendem em sua maioria interesses das empreiteiras e dos grandes

empreendimentos privados que necessitam de energia elétrica, como as mineradoras e refinarias. A

atual e grande expressão disso é o exemplo da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte4.

Em meio ao contexto dos altos índices de pobreza e êxodo rural que afetam às populações do

meio rural e da floresta, em especial aos/às jovens, a partir dessa contribuição, além de expor um

ponto de vista sobre esse tema, a ideia foi elencar algumas questões que auxiliem nos debates e na

elaboração de outras questões junto a PJR, em relação aos temas da: economia verde, do

desenvolvimento sustentável e os desafios da construção de um projeto de desenvolvimento rural

para o Brasil com bases na agroecologia.

CONSULTAS BIBLIOGRÁFICAS

PNUMA. Caminhos para o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza – Síntese

para Tomadores de Decisão, 2011. Acessado em: 29/06/12. Disponível em:

http://www.pnuma.org.br/admin/publicacoes/texto/1101-GREENECONOMY-

synthesis_PT_online.pdf.

4 É possível uma maior compreensão e esclarecimento sobre a Hidrelétrica de Belo Monte no Documentário “Belo

Monte – Anúncio de uma Guerra”. O Filme pode ser acessado na URL:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=091GM9g2jGk .