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O mundo da arquitetura vive a febre Zaha Hadid.
Esta iraquiana que vive em Londres e tem em seu ofí-
cio uma ideologia de vida nunca esteve tão em voga.
Não é para menos. Zaha criou uma linguagem peculiar,
re co nhecida por sua vertente conceitual e pelas linhas
es cultóricas. Desconstruir padrões sem perder um dos
mais importantes legados da arquitetura – a funciona -
li dade – tem sido o principal mote de seu trabalho.
Mais de uma centena de projetos, entre edifícios, pla-
nos urbanísticos e objetos de design, revelam um estilo
con siderado inovador, experimental e visionário.
Primeira mulher a ganhar o prêmio Pritzker, o No bel
da arquitetura, em 2004, Zaha vive atualmente a ma tu -
ridade em sua carreira, coroada por premiações e dis tin -
ções. Em 2010, a arquiteta integrou o prestigiado ranking
da revista norte-americana TIME das cem pessoas mais
in fluentes do mundo. Ela também recebeu o prê mio
Women at the Top, concedido pelo jornal Fi nan cial Times
às mulheres líderes no mundo dos negócios.
INCOMUM01
OS PROJETOS DE ZAHA HADID, COMO O MUSEU MAXXI (ACIMA), NA ITÁLIA, AS ESTAÇÕES NORDPARKRAILWAY (ABAIXO), NA ÁUSTRIA, E A ESCOLA EVELYN GRACE ACADEMY (NA PÁGINA AO LADO), EMLONDRES, SÃO MARCADOS PELA OUSADIA DAS FORMAS E PELO ASPECTO FUTURISTA
PENSADORA da arquitetura
TEXTO Alessandra Simões
Incensada pela crítica e vencedora de diversos prêmios
e concursos internacionais, Zaha Hadid arrebata
olhares pelo mundo com sua obra visionária
linguagens inovadoras
A preocupação de Zaha com a investigação técnica e formal
vem de influências do início de sua carreira, no final dos anos
1970, quando ela atuou no escritório de arquitetura Office for
Metropolitan Architecture (OMA), sediado em Roterdã, na
Holanda, onde trabalhou com seu antigo professor, Rem
Koolhaas, autor de obras célebres, como a Biblioteca Central de
Seattle, uma enorme caixa de vidro e aço com a fachada comple-
tamente desestruturada, composta por plataformas em formatos
de desenhos geométricos variados.
Koolhaas é um dos mais importantes representantes da corren-
te pós-modernista em arquitetura. Zaha adotou uma linhagem seme-
lhante, chamada de desconstrutivista. Um dos projetos recentes da
arquiteta, a escola de ensino fundamental e médio Evelyn Grace
Academy, inaugurada em outubro de 2010, para comunidades caren-
tes, em Londres, apresenta este estilo inconfundível: grandes curvas,
espaços contínuos em desníveis, fachadas sobrepostas.
INCOMUM01
O reconhecimento que Zaha vem recebendo é merecido não
só pela qualidade de sua obra, mas também pela quantidade signi-
ficativa de projetos que marcam as paisagens de Londres, Nova
York, Tóquio, Singapura e Istambul, para citar apenas algumas
cidades. Entre todos, há em comum a combinação entre linhas
curvas, materiais hightech, contrastes e assimetrias. O portfólio de
Zaha é marcado pela diversidade. Suas criações vão de projetos de
grande porte, como museus, estádios e escolas, até pequenos obje-
tos de design, passando por planos urbanísticos complexos, sofás
elegantíssimos, carros movidos a hidrogênio e sandálias da moda.
Entre seus projetos mais recentes, está o MAXXI - National
Museum of 21st Century Art, em Roma. O grandioso museu, em
formato de L, atravessa vários quarteirões da cidade e funciona
como articulador urbano. Foi considerado o prédio do ano, em
2010, pelo World Architecture Festival, um dos principais eventos
da arquitetura internacional, realizado anualmente em Barcelona.
O júri o comparou ao mais famoso museu dos últimos tempos, o
Guggenheim, em Bilbao, de Frank O. Gehry. O MAXXI está
composto por confluências entre os espaços interiores e exterio-
res, sobrepostos e interconectados, promovendo a sensação de
continuidade entre os espaços.
Este projeto de Zaha também recebeu, em outubro de 2010,
o prêmio do Royal Institute of British Architects (RIBA), que
considerou a obra mais madura da arquiteta, sua “quintessência”.
O reconhecimento deste trabalho elevou Zaha ao status de líder
global na pesquisa pioneira de inovação em arquitetura e design.
Seu escritório, sediado em Londres e que leva seu nome, procura
estabelecer o intercâmbio intenso com artistas, designers, enge-
nheiros e fornecedores, sempre resultando em projetos com tec-
nologias de ponta e estéticas revolucionárias. São conhecimentos
que ela faz questão de repassar às novas gerações, nas aulas que dá
em diversas universidades.
NESTA PÁGINA, A EVELYN GRACE ACADEMY, INAUGURADA EM 2010 PARAATENDER COMUNIDADES CARENTES DE LONDRES. NA PÁGINA AO LADO,DETALHES DO INTERIOR DO MUSEU MAXXI, CUJA ARQUITETURA TEM SIDOCOMPARADA A DO FAMOSO MUSEU GUGGEINHEIM BILBAO, NA ESPANHA
fotos C
ALÉ
Desconstruir padrões sem perder a funcionalidade é o foco do trabalho de Zaha
çado ainda pelo contraste entre a cor prata do aço e o fundo preto
das paredes e do chão.
Na lista de projetos de grande porte assinados por Zaha que
estão em construção atualmente está o Aquatics Centre, criado
para as Olimpíadas de 2012, em Londres, e para outros usos futu-
ros. Inspirado nas ondulações da água, o teto principal da cons-
trução, em aço, tem formato de uma onda gigantesca, em aço.
Lembra a forma de uma arraia e foi considerado um ato de heroís-
mo da engenharia por sua ousadia.
O projeto das Nordpark Railway Stations, em Innsbruck, na
Áustria, concluído em 2007, virou referência turística pelo arrebata-
mento provocado nos visitantes. São quatro estações ao longo da
estrada de ferro que leva às montanhas do norte da região.
Inspiradas nos formatos das conchas, as coberturas das estações
exprimem uma beleza única, resultado da forma orgânica, da leveza
dos contornos, do brilho do aço. Parecem grandes volumes de neve
flutuando sobre a base das estações edificadas em concreto aparen-
te, harmonizando-se com a paisagem glacial. Apesar dessa aparência
orgânica, sua estética é uma reminiscência de peças de desenho
industrial em estilo futurista, como aeroplanos, carros e iates.
Zaha mantém a ousadia de sua linguagem arquitetônica
mesmo em projetos temporários, como o Burnham Pavilions, em
Chicago, que recebeu em 2010 o Best Small Project Award, da
Structural Engineers Association of Illinois (SEAO), por sua ambi-
ciosa e inusitada estrutura. Construído em homenagem ao centená-
rio do plano urbanístico da região metropolitana de Chicago, o
projeto encabeçado por Daniel Burnham combina aço e alumínio
para compor o formato de um casulo com aspecto futurista. Com
apenas 120 metros quadrados, foi utilizado para a projeção de fil-
mes em seu interior. Sua forma de montagem é ágil e prática, e, dife-
rentemente de muitas edificações temporárias, a estrutura do pavi-
lhão permite que seja reinstalada novamente, em outro local.
Outro importante projeto temporário de Zaha foi o JS Bach
Chamber Music Hall, em Manchester, na Inglaterra. Construído
em 2009 para o Manchester International Festival, foi criado
especialmente para receber performances solo de músicas de
Johann Sebastian Bach. Deveria ser acolhedor e com acústica
adequada. A solução foi a montagem de uma longa faixa suspen-
sa por estruturas de aço. Ela serpenteia a sala do teto ao chão,
entrelaçando-se e compondo um aspecto visual escultórico, real-
INCOMUM01
CONSTRUÍDO EM HOMENAGEM AO CENTENÁRIO DO PLANO URBANÍSTICO DA REGIÃOMETROPOLITANA DE CHICAGO, NOS ESTADOS UNIDOS, O PROJETO TEMPORÁRIOBURNHAM PAVILION COMBINA AÇO E ALUMÍNIO EM SUA COMPOSIÇÃO
NO ALTO, O INTERIOR DO JS BACH CHAMBER MUSIC HALL, NA INGLATERRA, QUE GANHOUUMA LONGA FAIXA SUSPENSA POR ESTRUTURAS DE FERRO. ACIMA E ABAIXO, IMAGENS DOLONDRINO AQUATICS CENTRE, PROJETO EM ANDAMENTO PARA AS OLIMPÍADAS DE 2012
A arquiteta foi a primeira mulher a ganhar o prêmio Pritzker, em 2004
d
grandes detalhes
As referências históricas também delineiam o design de
objetos e de interiores de Zaha. Alguns móveis e ambientes, mar-
cados por elementos psicodélicos e futuristas, lembram o clima
dos desenhos dos Jetsons. A arquiteta vem criando peças escultu-
rais, como a mesa e escrivaninha Seoul. Estes móveis exploram a
transição entre o horizontal e o vertical, mesclando seus elemen-
tos estruturais em uma formação final equilibrada. Construídas
com um complexo sistema técnico para a utilização da fibra de
carbono, a mesma empregada no corpo dos carros de Fórmula 1,
as mesas apresentam brilho extremo e força em sua estrutura.
Para a marca italiana B&B, Zaha criou o MOON System, um
sofá feito com sistema modular que pode ser re con figurado pela rota-
ção de suas peças, sem perder a ele gân cia em função da integração
entre as partes. Sua forma con tínua desfigura a tipologia dos sofás tra-
dicionais. Com complexas formas geométricas, traz uma variedade
de usos. Feito com poliuretano, apresenta uma textura brilhante.
INCOMUM01
formas lineares
Nos projetos da década de 1990, Zaha ainda não utilizava
muitas curvas, mas já criava propostas ousadas, como a IBA
Housing, em Berlim, Alemanha. O prédio, de uso comercial e
residencial, tem sua fachada toda revestida em aço. Seu contorno,
marcado por recortes geométricos e assimétricos, rompe com o
padrão de linearidade dos prédios.
As formas retilíneas também foram a base para o projeto
Spittelau Viaducts Housing, em Viena, na Áustria. Inaugurado em
2005, tornou-se referência na carreira de Zaha por sua complexi-
dade e suntuosidade. O complexo, que reúne apartamentos, escri-
tórios, entre outros, foi erguido sobre um viaduto em arcos no rio
Danúbio, proporcionando grandes áreas ao ar livre em conexão
com espaços internos. O contraste entre a arquitetura em arcos e o
grande prédio branco produz um efeito fantástico. O prédio ser-
penteia uma ampla área, dividindo-se em vários blocos em desní-
vel, e está assentado sobre enormes pilotis, pilastras de origem
modernista que, no desenho de Zaha, foram instaladas de forma
inclinada. O conjunto parece compor uma paródia ao racionalis-
mo da primeira fase da arquitetura de início do século 20.
Objetos de design e peças de mobiliário também fazem parte da criação de Zaha
ACIMA, DETALHE DA ESTAÇÃO NORDPARK RAILWAY, INSPIRADA NOS FORMATOS DAS CONCHAS.ABAIXO, O AUSTRÍACO SPITTELAU VIADUCTS HOUSING, COMPLEXO QUE REÚNE ESCRITÓRIOS,APARTAMENTOS E ESPAÇOS PARA LAZER. NA PÁGINA AO LADO, O SOFÁ MOON SYSTEM E AMAÇANETA DA SÉRIE ZH DOOR HANDLES: PEÇAS FUNCIONAIS E CHEIAS DE PERSONALIDADE
fotos D
IVULGAÇÃO
O design da arquiteta pode ser visto ainda em detalhes
como a maçaneta da série ZH Door Handles. Seu formato
apresenta be leza comum ao próprio trabalho arquitetônico de
Zaha, com formas dinâmicas e sensuais. Foi criado inicialmen-
te para os espaços pro jetados por ela para o Puerta America
Hotel, em Madri, e re ve la uma característica única em seu tra-
balho: a combinação de ma teriais altamente hightech com for-
mas mais curvilíneas.
Quando foi escolhida entre as cem pessoas mais influentes
do mun do pela Time, Zaha foi nomeada na categoria “Thinkers”
(pen sa dores). As outras três eram: “Leaders” (líderes), “Artists”
(ar tis tas) e “Heroes” (heróis). Como “pensadora” da arquitetura,
ela tem cum pri do a missão de criar obras conceituais, porém com
ape lo so cial e funcional, como ela mesma faz questão de de cla rar
pu bli camente. Esta preocupação em adequar a escala artística e
mo nu men tal à necessidade humana real tem feito de sua arquitetu-
ra compromisso por um mundo urbano melhor.