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Dos Templos as Ruas: A tragetória das Prostitutas na Antiguidade Ocidental. Wallace Melo G. Barbosa Elas estão presentes em todos os períodos da história. Elogiadas por poetas, filósofos, artístas, nobres e até mesmo por grandes imperadores romanos, as prostitutas do mundo antigo, também eram vistas com muita hostilidade e muitas vezes, condenadas por vários segmentos. E é nessa conjuntura, que pretendemos compreender um pouco sobre o mundo da prostituição na antiguidade, levando em conta, os diferentes julgamentos morais que foram impostos as famosas profissionais do sexo nas sociedades primitivas. Não é por acaso que atribuímos às mulheres de virtude facil, o título de uma das mais antigas profissões do mundo. Isso se dá, devido ao fato de que a prostituição era uma instituição bastante notável no mundo antigo. As prostitutas se manifestavam em diversas ocasiões, desde os cultos promovidos pelos templos sagrados na forma de ritos sexuais até os famosos bordéis e teatros romanos. Assim, os encontros entre homens e mulheres, atrás de experiências sexuais extra-conjugais, nos templos, tabernas e bordéis, ocorríam por meio de variadas motivações e contribuíam para consolidar também, uma série de julgamentos morais, a respeito da conduta ideal das mulheres diante do convívio social. Uma vez que, a medida que a prática da prostituição ia se cristalizando ao longo das sociedades, também iam se propagando, uma série de concepções éticas a respeito da conduta da "boa" e da "má" mulher. Diante disso, podemos assim dizer que, um ponto de singular grandeza presente nesse breve estudo, se encontra no fato de se analisar a prostituição no mundo antigo, como uma prática, não tão marginalizada, como concebe as concepções contemporâneas. Uma vez que, quando adentramos na história da prostituição, precisamos nos desprender a uma série de valores morais e estudarmos essa prática, segundo o contexto histórico que a ela está inserido. E nessa conjuntura, é válido afirmar que , em muitos casos, vamos constatar a atribuição de posições sociais privilegiadas para as prostitutas das sociedades antigas.

Dos templos às Ruas: A Prostituição no Mundo Antigo

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Historia da Prostituição no Mundo Antigo.

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Dos Templos as Ruas:

A tragetória das Prostitutas na Antiguidade Ocidental.

Wallace Melo G. Barbosa

Elas estão presentes em todos os períodos da história. Elogiadas por poetas,

filósofos, artístas, nobres e até mesmo por grandes imperadores romanos, as prostitutas

do mundo antigo, também eram vistas com muita hostilidade e muitas vezes, condenadas

por vários segmentos. E é nessa conjuntura, que pretendemos compreender um pouco

sobre o mundo da prostituição na antiguidade, levando em conta, os diferentes

julgamentos morais que foram impostos as famosas profissionais do sexo nas sociedades

primitivas.

Não é por acaso que atribuímos às mulheres de virtude facil, o título de uma das

mais antigas profissões do mundo. Isso se dá, devido ao fato de que a prostituição era

uma instituição bastante notável no mundo antigo. As prostitutas se manifestavam em

diversas ocasiões, desde os cultos promovidos pelos templos sagrados na forma de ritos

sexuais até os famosos bordéis e teatros romanos.

Assim, os encontros entre homens e mulheres, atrás de experiências sexuais

extra-conjugais, nos templos, tabernas e bordéis, ocorríam por meio de variadas

motivações e contribuíam para consolidar também, uma série de julgamentos morais, a

respeito da conduta ideal das mulheres diante do convívio social. Uma vez que, a medida

que a prática da prostituição ia se cristalizando ao longo das sociedades, também iam se

propagando, uma série de concepções éticas a respeito da conduta da "boa" e da "má"

mulher.

Diante disso, podemos assim dizer que, um ponto de singular grandeza presente

nesse breve estudo, se encontra no fato de se analisar a prostituição no mundo antigo,

como uma prática, não tão marginalizada, como concebe as concepções

contemporâneas. Uma vez que, quando adentramos na história da prostituição,

precisamos nos desprender a uma série de valores morais e estudarmos essa prática,

segundo o contexto histórico que a ela está inserido. E nessa conjuntura, é válido afirmar

que , em muitos casos, vamos constatar a atribuição de posições sociais privilegiadas

para as prostitutas das sociedades antigas.

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No entanto, a medida que as culturas e as práticas patriarcais vão se consolidando

nessas primeiras sociedades, a marginalização das profissionais do sexo vai se tornando

uma constante, ocorrendo assim, um gradual rebaixamento social, não somente das

prostitutas, mas de todo o gênero feminino.

Pois bem, dando continuidade ao raciocício central desse estudo, podemos assim

afirmar que, a origem das primeiras profissionais do sexo tem ligações históricas com as

primeiras sociedades de cunho matriarcal presentes no período pré-histórico. Uma vez

que, diante das primeiras explicações míticas a respeito das diversas incógnitas

formuladas pelos homens, diante do mundo natural, os grupos humanos, passam a

atribuir em seu gradual processo de produção cultural, uma notória sacralidade na figura

da mulher. Esse fato, pode ser explicado, devido a capacidade única que as mulheres

detém, por meio de seus próprios corpos, a geração da vida.

A gestação era vista como um elemento sagrado para as culturas primitivas. E é a

partir daí, que podemos encontrar os subsídios principais para justificar a criação de

deuses personificados na forma feminina. A idéia de uma"deusa-mãe" está presente em

quase todas as religiões primitivas e da antiguidade. Sua força só será reduzida, a medida

que as sociedades vão adquirindo um teor mais patriarcal, e essa relação de gênero,

também sera identificada na esfera do mundo sagrado.

E foram nos templos construídos para as deusas, que encontramos suas

sacerdotisas, que lideravam os rituais, que, entre tantos, destacavam-se os ritos sexuais.

Diante disso, muitos homens fiéis as deusas, procuravam os locais sagrados de

adoração, e junto as mulheres que pertencíam a esses locais, realizavam ritos, por meio

de relações sexuais, para assim, ter maior contato com os prazeres proporcionados pela

divindade. E diante dessas práticas, grandes oferendas eram devotadas aos templos.

Podemos fazer referência as deusas Ishtar e Ísis, como divindades de destaques do

mundo mesopotâmico e egípcio, respectivamente.

É na seara da sacralidade que encontramos o princípio da prostituição no mundo, e

nesse campo, onde o sagrado e o profano estão totalmente amalgamados que podemos

afirmar que, a medida que os ritos sexuais se difundiam nessas socieadades, as famosas

sacerdotisas, também conhecidas como entu e naditu, passavam a ganhar um grande

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lugar de destaque na hierarquia social. No entanto, foram as harimtus, as mulheres

(geralmente escravas doadas aos templos) que praticavam as relações sexuais nos

rituais sagrados, que enriquecíam os templos, por meio das ricas oferendas.

Seriam as harimtus mulheres pertencentes aos templos sagrados que praticavam

rituais sexuais as primeiras prostitutas da história? Bem, de uma certa forma, sim.

Logicamente que os julgamentos morais inclusos nesses ofícios não são semelhantes aos

que são utilizados na contemporaneidade. No entanto, as prostitutas dessas primeiras

sociedades tribais, tinham um ofício caracterizado por uma espécie de fusão entre a

busca pelo sagrado com a busca pelo prazer sexual, sabendo que o próprio prazer, era

algo considerado sagrado. Após esses "rituais", o homem deixava de lado a sua

bestialidade natural e tinha um maior contato com a esfera extra-humana. Essa espécie

de prostituição sagrada era um elemento importante para essas sociedades tribais do

mundo antigo, e tudo leva a crer que foi por meio dela, que surgiu a prostituição das ruas.

Posteriormente, no mundo racional dos gregos, também constatamos a presença

de prostitutas nas diversas polis. Nesse período, ja estava bastante diferenciada as

motivações da prostituição sagrada com a prostituição individual, haja vista, a existência

de ordenamentos políticos com finalidade de controlar essas atividades, a presença de

bordéis públicos, como também, bórdéis privados e a existência de prostitutas "de luxo"

que orbitavam entre os vários círculos sociais dos eupátridas. Além disso, também

constatamos os cultos a famosa deusa Afrodite, deusa grega da beleza, do amor e da

procriação.

Pois bem, enquanto que nas tribos primitivas a prostituição estava bastante ligada

a questões religiosas, no mundo grego, era uma atividade global e empreendedora.Toda

racionalidade do mundo grego, impulsionou também uma profunda libertação sexual, os

homens mais ricos, tinham acesso a uma grande diversidade de atrações sexuais, nos

templos e bordéis espalhados pelas cidades-estados. E diante de uma cultura, onde a

sexualidade não era, de forma alguma, censurada, a prostituição viu na Grécia Antiga um

terreno bastante fértil para o seu desenvolvimento.

Ao lado das tão famosas, mulheres de Atenas, existiam as prostitutas gregas, que

era o outro lado da moralidade ateniense. Enquanto a vida social era privada as esposas

da Grécia, a libertação sexual era o que movia, as mulheres que partiam para uma outra

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forma de enxergar o amor. Deixavam de lado toda educação doméstica, atribuída as

"boas" mulheres gregas e partíam para uma vida ligada à voluptuosidade. Solón, famoso

legislador ateniense atribuía as mulheres, apenas dois destinos: o de esposa ou de

prostituta.

Um ponto curioso na história sexual da cultura grega, era a presença de bórdeis

públicos, organizados pelo próprio Estado ateniense, que garantia grandes lucros para a

polis. Nesses estabelecimentos públicos, trabalhavam as deikteriades, como eram

chamadas as prostitutas/escravas que tinham a função de enriquecer a arrecadação

financeira do Estado, por meio das inúmeras relações sexuais.

Entretanto, além dos prostíbulos estatais, também existiam a prostituição privada,

que, mesmo proibida pelas leis atenienses, pois, nitidamente atrapalhava a arrecadação

da máquina pública, existíam nas sociedades gregas. E em muitos casos, essa forma

privada de comércio sexual era feita de forma coletiva, onde várias meretrizes se

organizavam e suas atividades eram organizadas por uma espécie de "cafetina" ou

também chamadas de "madames", ficando muito claro que havia diferentes formas de

prostituição na Grécia.

Também é válido mencionar a presença de mais de mil prostitutas no templo da

deusa Afrodite, principal divindade grega, que proporcionava aos seus fiéis, todos os

prazeres em seus rituais sexuais. Esses templos também vivíam de doações de cidadãos

ricos para a deusa. Era muito comum a doação de escravas para o templo, para que

assim, os rituais sagrados fossem preservados.

E por fim, também, encontramos a presença das famosas prostitutas de "luxo" que

encantavam os cidadãos ricos, não somente por suas formas e beleza, mas também pela

intelectualidade e habilidades artísticas, as hetairae, como eram conhecidas, faziam com

que seus "amantes" alimentassem grandes paixões, contribuindo cada vez mais para os

seus nagócios e lucratividade. Haviam famosas hetairae em toda Grécia. O mais curioso

era que, antes de tornarem-se hetairae, essas mulheres passavam por uma grande

preparação física e intelectual. Era no gynaceum que elas moravam e se preparavam

para cumprir o seu ofício, estudavam sobre os gêneros literários, filósóficos, além disso,

buscavam aprender sobre novas formas de posições sexuais, danças, vestimentas e

também a retórica, tornando-se assim, eximias acompanhantes da elite ateniense. Outro

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grupo conhecido pelos homens gregos era o das auletrides, que também se destacavam

como prostitutas de luxo. Eram atrizes e dançarinas que encantavam os homens, por

meio de suas apresentações sensuais, tornando-se, junto as hetairae famosas cortesãs

da sociedade helenica.

Como podemos ver, os prazeres sexuais do mundo antigo, tinham na prostituição,

como uma prática cotidiana. Tanto na Grécia, civilização onde floresceu a democracia e a

filosofia, quanto no grande império romano, que por sua vez, essa prática encontrou um

cenário bastante propício, haja vista, as tantas perversões eróticas da elite romana.

E nessa perspectiva, ao adentrarmos na história de Roma, vamos encontrar,

literalmente, um circo de grandes perversões sexuais encrustadas na história política da

cidade que tornou-se o maior império do mundo ocidental. Assim, relatos de perversões

sexuais, prostituição e orgias também faziam parte das polêmicas e das conspirações

presentes ao longo da história das instituições políticas romanas. De Otávio Augusto ao

imperador Rômulo, o culto a sexualidade era instituído na cultura latina de diversas

maneiras.

Entretanto, a prostituição religiosa não era o principal fator para que as

profissionais do sexo atuassem pelos prostíbulos e palácios romanos. O culto a deusa

Afrodite pode ser um elemento a mais nessa história, mas o que podemos afirmar, de

fato, é que a prostituição é fruto dos devaneios sexuais presentes na cultura romana. O

imperador Comodus é um bom exemplo dessa perversão, uma vez que, o mesmo

transformou praticamente o seu palácio em um grande bordel que circulavam um número

superior a 300 moças e rapazes., Assim como Calígula e Nero, Comodus também

praticou incesto com a sua irmã.

E foi nesse cenário que a prostituição passou a ser instituída como uma prática

cotidiana a todas as classes sociais romanas, dos plebeus aos patrícios, encontramos as

messalinas que promoviam prazer em troca de recompensas. O termo Messalina é uma

alusão a esposa do imperador Cláudio, que tinha esse nome. A imperatriz saía pelas

noites, vendendo o seu corpo pelas ruas romanas, como uma prostituta qualquer, por

pura fantasia e luxuria.

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A prostituição era instituída e Roma, e em muitos casos como uma forma de

proteger o casamento, segregando as "boas" e as "más" mulheres, umas tinham a função

específica de ser esposa, enquanto outras, alegravam as noites nos bordéis com danças,

orgias e perversões. É válido ressaltar que dentro da organização jurídica de Roma, havia

espaço para as prostitutas, que eram denominadas de Meretrices, quando registradas

oficialmente, por desempenhar tal função e a Prostibulae, definição das mulheres que não

eram registradas. Esse registro era uma forma de mapear as prostitutas de classes mais

baixas e assim o Estado ter um controle sobre essa atividade econômica. E devido a

esses registros, haviam várias denominações de prostitutas, como as Dórides, que eram

mulheres que se exibiam em suas próprias casas, nas varandas ou jardins. As Lupaes,

mulheres que atraíam seus clientes com uívos semehante ao dos lupinos. As Aelicariae,

mulheres que vendiam pequenos doces em forma de órgãos sexuais, como oferenda a

deusa Vênus e ao deus Priapo (deus fálico). As Bostuariae, também comnhecidas como

as prostitutas que faziam programas nos cemintários, sobre as sepulturas. as Scortas

Erraticas, as mulheres que se prostituíam nas ruas. As Blitidae, prostitudas de bares e

tavernas. As Copaes, garçonetes que também trabalhavam de forma paralela como

profissionais do sexo. As Gallinaes, associavam a prostituição com furtos. As Forariaes,

Prostitutas das áreas rurais de Roma. E por fim, as Diabolares e as Quadrantariae, que

ficavam na parte mais baixa da hierarquia das prostitutas romanas.

Eis o circo romano, onde a prostituição se manifestava em todas as classes

sociais, ou seja, não era apenas algo ligado a elite patrícia, mas também, os plebeus

convivíam cotidianamente com essas mulheres de virtude fácil, que fazíam parte dos

devaneios sexuais dos romanos. Assim como na Grécia, essas mulheres encantavam as

fantasias dos imperadores, senadores, escritores e cidadãos comuns. Algumas eram

atrizes ou dançarinas, outras, somente prostitutas. O ambiente era bastante diversificado

e sofria notória segregação social, como as Delicataes e as Famosaes, como eram

conhecidas as prostitutas da elite romana, no entanto, a prática perdurou por todo o

império, de forma notável, fazendo de Roma, uma cidade, onde a política e a justiça

convivíam constantemente com a prostituição regrada pela pederastia, poligamia, incesto,

homossexualismo, sadomasoquismo etc.

Diferente dos cultos sexuais feitos nos templos sagrados, a prostituição romana,

mesmo ligada aos cultos a deusa Venus, era algo, ligado muito mais aos valores sexuais

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da cultura romana, do que as tradições religiosas. No entanto, essas libertinagens sexuais

vão sofrer maior repressão, com a ascenção do cristianismo e a instituição de uma nova

noção sobre a conduta dos homens em sociedade. A ética cristã, favoreceu uma

marginalização dessa prática, assim como uma demonização da figura feminina, fator

esse que vai prevalecer por todo o periodo medieval.

Enfim, foram essas mulheres, que a outrora eram conhecidas como sacerdotisas da

Deusa-Mãe Ishtar e que também encantaram os poetas e escritores gregos, assim como

os imperadores romanos, em torno do erotismo. Demonstrando que a sexualidade era

aceita na vida cotidiana do mundo antigo de uma maneira diferente das nossas atuais

concepções judaico-cristã.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BURNS, Edward. História da Civilização Ocidental. 2ªed. São Paulo: Globo

ROBERTS, Nickie. As Prostitutas na História. Rio de Janeiro: Record: Rosas dos Tempos, 1998.

VEYNE, Paul. História da Vida Privada: Do Império Romano ao Ano Mil. São Paulo: Companhia das Letras,

2009.