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Organização curricular
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Organizao curricular
B512s Martins, GEISSE.
Organizao Curricular , 2015.
32f.
- CONSULCAP CDU - 00000
Direo :
Coordenao Pedaggica:
Administrativo
Superviso :
Gerncia :
SUMRIO CONSTRUO DE UMA NOVA CONCEPO DE CURRCULO ....................................... 5
2- Currculo e Sociedade ......................................................................................................... 6
3- Currculo e Finalidades da Educao ................................................................................ 7
4- Currculo Como Estrutura Narrativa .................................................................................. 11
5- Currculo Como Complexidade .......................................................................................... 13
1- Desenvolvimento no Campo do Currculo ............................................................................ 17
2- Currculo Acadmico X Currculo No Acadmico .......................................................... 19
3- Currculo Por Disciplinas X Currculo Integrado.................................................................. 21
4- Universalismo X Multiculturalismo ...................................................................................... 23
5- Ensino Propedutico X Formao Profissional .................................................................... 25
6- Formao Humana X Competncias.................................................................................. 27
8. Curriculo oculto ................................................................................................................ 29
Como agir em relao aos contedos que so ensinados e aprendidos de forma no
explcita na escola. .............................................................................................................. 29
Concluses ............................................................................................................................. 32
TEXTO I
GIUSTA, Agnella da Silva. Construo de uma nova Concepo de Currculo.
In: Programa decapacitao de Diretores - PROCARD. Secretaria de Estado de Educao
de Minas Gerais, 2000
CONSTRUO DE UMA NOVA CONCEPO DE CURRCULO
1- Por Uma Nova Concepo do Currculo
Quando comeamos a tratar de um assunto, geralmente temos uma necessidade
quase virtual de procurar saber em que consiste, ou qual o conceito do termo que
caracteriza nosso objeto de ateno. Assim, falar de currculo remete-nos ao
mental de entender sobre o que, de fato, estamos falando. Em nosso caso, a
preocupao amplia-se, pois no se trata, apenas, de definir currculo, mas de
sintetizar ou acolher conceituaes que tenham ressonncia no mbito da Educao
Bsica do nosso pas e, mais especialmente, do nosso Estado, da nossa regio e da
nossa escola.
Para satisfazer a necessidade, ou, quem sabe, torn-la ainda mais
desafiadora, propondo que
passemos, pelo menos, por trs nveis de conceituao de currculo:
o que de domnio pblico, acessvel por meio do
dicionrio; o de quem vive o currculo como aluno
e como educador; o daqueles que o elegem
como tema de estudo e pesquisa.
2- Currculo e Sociedade
Em todas as sociedades, especialmente naquelas em que as desigualdades so muito
acentuadas, a distribuio do poder e os mecanismos de controle social esto
refletidos no currculo por meio da elaborao, seleo, distribuio, transmisso e
avaliao do que considerado saber escolar legtimo. A depender da origem social
dos destinatrios, das modalidades de educao oferecidas e dos fins que se tem em
vista, o currculo cumpre, de forma diferenciada, sua funo nessa distribuio de
poder. Assim, h uma ntima ligao entre o currculo e o projeto de socializao,
a ser realizado, o que transparece em seus contedos, no formato e nas prticas que
so criadas e recriadas indefinidamente.
Estamos tentando deixar claro que o currculo no algo abstrato, descolado do
sistema educativo que lhe confere efetividade e que, por sua vez, projeta os valores,
interesses e compromissos da sociedade concebida como entidade neutra.
Nos termos descritos, a relao currculo e sociedade disfarada, o que dificulta a
tomada de conscincia de suas reais vinculaes. O currculo pode, at certo ponto,
explicitar-se, tornar pblicos seus fins sociais e culturais, seus contedos de
diferentes matizes e suas aes para o alcance das finalidades que a sociedade
espera que a escolarizao cumpra, mas tem sempre uma face oculta, que nos ludibria
e nos submete a armadilhas, pelo prprio trabalho de interpretao dessas
finalidades, pelo que realamos e apagamos nesses contedos, pelos rituais,
preconceitos, exigncias e mitos que utilizamos, enfim, pelo que corre, pelo que fui,
pelos cortes e atalhos que fazemos, reportando-nos ao significado da palavra currculo
em sua fonte latina.
Apesar disso, no produtivo fazer o discurso das relaes, ou das contaminaes do
currculo ante as intenes expressas e veladas de uma sociedade de classes, se
no nos interrogarmos sobre a nossa participao nesse jogo e se no procurarmos
outro itinerrio.
Nesse caso, nada mais oportuno que a permanente vigilncia e anlise crtica, no
sentido do desvelamento dos fatores mencionados. Entretanto, s podemos engajar-
nos nessa anlise se acatarmos a definio de escola como organizao social,
caracterizada por contradies, confronto de posies e pela diversidade de
interpretaes da realidade, at mesmo por fora da opo poltica, projetos e
formao acadmica de seus agentes. Assim considerada, a escola constitui uma
sntese original, podendo vir a ser um espao de autonomia inestimvel. Nos ltimos
tempos, essa autonomia tem-se manifestado nos projetos poltico-pedaggicos que
cada escola frmula. Entretanto, se no se investe no planejamento, desenvolvimento
e avaliao do currculo, no podemos consider-lo, de fato, um projeto poltico-
pedaggico. Nesse aspecto, os referidos projetos apresentam-se extremamente
lacunares.
Para dar um passo adiante, vale lembrar, ainda, que o currculo e o
conhecimento no so
criaes definitivas, estticas, mas, sim, produtos de relaes sociais. E, em se
tratando de currculo
escolar, temos mesmo uma grande margem de autonomia para incluir saberes e
prticas mais convenientes aos projetos que formulamos ou elegemos. Se isso
possvel, a escola no pode ser vista somente como instncia reprodutora. Pelas
relaes sociais que nela ocorrem, criam-se e reconstroem- se significados, prticas
pedaggicas; e desempenha-se papel de extrema importncia para a construo
de identidades sociais e individuais de ordem diversa daquela pertinente s foras
conservadoras.
No entanto, para que essa tarefa de transformao tenha mais garantia, penso
ser inadivel a instalao de esferas coletivas de trabalho, nas quais educadores,
alunos e colaboradores tomem para si a incumbncia de configurar e desenvolver o
currculo que lhes convm, que deve ser, em ltima anlise, realizador do projeto
poltico-pedaggico da instituio.
3- Currculo e Finalidades da Educao
medida que o currculo encarado como pea fundamental do projeto poltico-
pedaggico, torna-se imperiosa a retomada de reflexes que constituem o ponto de
partida do projeto: quem somos ns, qual a nossa identidade como instituio,
aonde pretendemos chegar, com que recursos contamos, o que possvel fazer
para potencializar ou obter a base material e humana necessria realizao do
projeto que defendemos? Essas reflexes j foram objeto de ateno, mas, em
nosso caso, preciso frisar uma delas: a que diz respeito s finalidades da
educao que vo nortear o currculo.
Quando se fala em finalidades de educao, vrias so as referncias. Tem-se
desde as representadas pelos documentos oficiais, a exemplo da Constituio da
LDB, do Plano Nacional da Educao e diretrizes curriculares nacionais, at
aquelas providas por ideolgicos e cientistas de diferentes posies. Apesar disso,
possvel encontrar algumas vozes mais consensuais. Uma delas pode ser
identificada com a defesa de finalidades que concorrem para ampliar e aprofundar
as condies de cidadania.
Venho insistentemente comentando que a palavra cidadania tem sido usada
mais como figura de
retrica do que como conceito balizador de aes educacionais.
A cidadania, como a conhecemos hoje, s pode ser entendida como processo
e, mais ainda, como processo de conquistas que encontram inspirao no
movimento Iluminista do sculo XVIII e decorrem da Revoluo Industrial, com seus
desdobramentos polticos e sociais. Logo, trata-se de um processo que no guarda
relao com a cidadania dos gregos e romanos da Antigidade Clssica, na qual,
por fora das organizaes sociais escravistas, ser cidado era privilgio das elites.
As conquistas referidas anteriormente situaram-se, antes de tudo, na esfera civil
da cidadania ou esfera dos direitos individuais (direitos civis, polticos e sociais). Ao
longo do processo, toma corpo uma outra face da cidadania, a mais moderna,
apelidada de face cvica, pela qual o indivduo se eleva ao patamar da cooperao,
da solidariedade, do respeito s diferenas, do compromisso tico com o pblico e
outras condutas do gnero.
Est cada vez mais claro que a sociedade espera da escola a
responsabilidade pelo desenvolvimento de tais condutas desde seus nveis de
atuao mais precoces. Nesse sentido, o fenmeno da globalizao trouxe um
complicador, e reiteradamente tenho-me perguntado: como fica a questo da
cidadania diante dos desdobramentos desse fenmeno?
Proponho, agora, pensarmos juntos sobre isso. Como podemos preservar nossa
identidade, sem
prejuzo do carter cosmopolita necessrio ao viver e conviver em um mundo
globalizado?
CASTELLS, renomado socilogo da era da informao, define identidade como
a fonte de significado e experincia de um povo, cuja construo se vale da
matria-prima fornecida pela histria, geografia, biologia, instituies produtivas e
reprodutivas, pela memria coletiva, por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder
e revelaes de cunho religioso. Acrescenta que todos esses materiais so
processados pelos indivduos, grupos sociais e de sociedades, que reorganizam
seu significado de funo de tendncias sociais e projetos culturais enraizados em
sua estrutura social, bem como em sua viso de tempo/espao (CASTELLS, 199, p.
22).
Retomo, ento, a pergunta que propus anteriormente e gostaria que vocs me
acompanhassem no seguinte raciocnio: falar, hoje, de cidadania muito complexo.
Vivemos a ambigidade de ter uma identidade cultural, circunscrita a um determinado
espao e grupo social, enquanto, ao mesmo tempo, interagimos com outras culturas.
Agora, chegamos mesmo ao ponto de ser pressionados pelo cosmopolitismo, pois,
habitando o ciberespao, somos forados a ser cidados do mundo.
possvel ser cidado do mundo?
Do ponto de vista dos direitos, a cidadania ainda resolvida nos limites nacionais, uma
vez que constituio de cada pas que os garante, mas a face cvica pode dissolver
o problema da restrio. Se conseguirmos formar identidades fortes, sem preconceitos
quanto s prprias razes, se aceitarmos a vida como bem supremo e se praticarmos
a solidariedade, o respeito ao outro e sua identidade cultural e, alm disso,
conduzir-nos tendo como ideal as relaes de troca e o bem comum, ento possvel
continuar falando de cidadania com as janelas abertas para o mundo, conciliando a
dimenso restrita e a dimenso universal, conforme exige a contemporaneidade. Este
um desafio que a escola deve considerar seriamente e que a Escola Sagarana faz
com muita veemncia em seu projeto.
Todavia h uma outra fonte de inspirao atualmente muito citada, quando se fala
em finalidades da educao: o Relatrio da UNESCO, elaborado pela Comisso
Internacional sobre Educao para o Sculo XXI, onde se encontram destacados
quatro pilares tidos como essenciais a um novo conceito de educao: aprender a
conhecer, aprender a conviver, aprender a ser.
a) APRENDER A CONHECER - enfatiza a importncia do domnio dos prprios
instrumentos de conhecimento para compreender o mundo, j que isso necessrio
para viver dignamente. Fundamenta-se no prazer de compreender, de conhecer,
de descobrir. Aponta para a necessidade de a formao inicial fornecer a todos os
alunos instrumentos, conceitos, e referncias resultantes dos avanos das cincias
e dos paradigmas do seu tempo. Preconiza a contemporizao de uma cultura geral
vasta e a possibilidade de trabalhar em profundidade determinado nmero de
assuntos. Supe, sobretudo, aprender a aprender, o que requer a construo de
estratgias de ateno, de memria e de pensamento para beneficiar-se das
oportunidades oferecidas pela educao ao longo da vida.
b) APRENDER A FAZER - parte da pergunta: como a escola pode ajudar o aluno a
preparar- se para a empregabilidade, especialmente em vista das implicaes do
processo de globalizao das atividades produtivas? Considera-se enterrada a
qualificao para o trabalho, nos moldes tradicionais de treinamento para execuo
de tarefas especficas. Enfatiza-se a mobilizao e desenvolvimento de capacidades
como a de adaptar-se a um novo contexto de trabalho mais participativo, de natureza
mais intelectual e que exige uma slida base tecnolgica.
e) APRENDER A CONVIVER - um dos maiores desafios dos educadores. O aumento
da violncia e da capacidade de destruio e a acentuao das desigualdades sociais,
entre outros traos marcantes de desagregao social no decorrer do sculo XX,
impuseram Educao a tarefa urgente de formar o novo homem para fazer frente
existncia de preconceitos de variada natureza a um tipo de atividade econmica que
privilegia a competio e o sucesso individual. Recomenda-se uma educao mais
aberta ao dilogo e ao desenvolvimento do esprito crtico, ao processo de formao de
um homem disposto a viver e trabalhar numa sociedade solidria.
d) APRENDER A SER - recomenda que a educao deva contribuir para o
desenvolvimento total da pessoa - corporeidade, inteligncia, sentido esttico,
responsabilidade pessoal e espiritualidade, no sentido de que o aluno construa
pensamentos autnomos e crticos, e possa formular os seus prprios juzos de valor,
de modo a poder decidir, por si mesmo, como agir ante os diferentes desafios da vida.
Como ltima referncia para se deliberar sobre finalidades da educao, focalizamos
as Diretrizes Curriculares do Ensino Mdio, que bem expressiva das idias
anteriores e que parece haver encontrado boa aceitao. Nelas, proclama-se que
todas as atividades escolares, especialmente as curriculares, devem ser coerentes
com princpios estticos, polticos e ticos, abrangendo:
I - A Esttica da Sensibilidade, que dever substituir a da repetio e
padronizao, pelo
esforo de constituio de identidades capazes de lidar com a incerteza e a
diversidade e de valorizar a
delicadeza, a sutileza, as formas ldicas e alegricas de conhecer o mundo; e de
fazer do lazer, da
sexualidade e da imaginao um exerccio de liberdade responsvel.
II - A Poltica da Igualdade, pautadas nas qualidades da cidadania, visando
constituio de identidades que busquem e pratiquem a igualdade no acesso aos
bens sociais e culturais, o respeito ao bem comum, o protagonismo e a
responsabilidade no mbito pblico e privado, o controle a todas as
formas discriminatrias; e o respeito aos princpios do Estado de Direito, na
forma do sistema
federativo e do regime democrtico e republicano.
III - A tica da Identidade, que busque superar as dicotomias entre o mundo
da moral e o mundo da matria, entre o pblico e o privado, que possa construir
identidades sensveis e igualitrias, praticantes de um humanismo contemporneo,
capazes de reconhecimento, respeito e acolhimento
identidade do outro; e, que incorpore a solidariedade, a responsabilidade e a
reciprocidade na
orientao e no exerccio da vida profissional, social, civil e pessoal.
Para encerrar esta parte, necessrio reconhecer que a realizao do projeto
pedaggico que visa ampliao do dever de educar obriga-nos a fazer uma
converso: sair dos limites da concepo de currculo como seleo e organizao
de contedos intelectuais, ainda que estes abranjam os diversos mbitos das
cincias, das artes e das tecnologias, para vislumbrar outro formato condizente com
as exigncias hodiernas. Para isso, a primeira preocupao do currculo deve ser a
de retomar, criticamente, as finalidades da educao definidas no projeto poltico-
pedaggico da escola.
4- Currculo Como Estrutura Narrativa
O currculo escolar sintetiza metas, objetivos, contedos e maneiras de organiz-
los; atividades de ensino/aprendizagem e de avaliao; indicaes bibliogrficas e
outros recursos. Pode ser consolidado em um documento escrito mais detalhado ou
mais esquemtico; pode apresentar-se mais rico ou mais pobre; mais progressista
ou mais conservador; porm, no deixa de ser um conjunto de prescries.
Por outro lado, ns, que vivemos na escola, somos testemunhas de que o
currculo , sobretudo, uma prxis. isso que pretendemos expressar, quando
usamos a metfora da narrao, ou seja: que o currculo, apesar de todas as
intenes e do planejamento prvio, ao materializar-se, muito diverso de sua forma
idealizada. , de fato, uma estrutura que se vai compondo na prtica; construindo-se
no processo mesmo de sua concretizao; auto-organizando-se medida que as
regulaes se fazem necessrias; portanto, vai tecendo e contando (narrando) a
sua prpria histria. Ns podemos, e legtimo, afirmar o que queremos que o
currculo seja. O que ele ser, porm, no pode ser dito por antecipao, porque vai
depender da dinmica de cada instituio e das experincias nela vividas: ser
diferente de uma escola para outra, de uma cultura para outra, de um ano para
outro, de um grupo social para outro, de uma turma para outra e, assim,
indefinidamente.
Essa caracterstica do currculo pe em xeque, evidentemente, o sentido da ao
de planejar: se o currculo estrutura narrativa, se um processo que se redefine
a cada instante, h sentido em se fazer planejamento curricular?
A capacidade de fazer projees para planejar aes futuras uma caracterstica
exclusiva do ser humano, que o distingue e o torna muito mais poderoso do que
qualquer membro de outra espcie. E, exatamente porque o currculo , por definio,
indeterminvel e imprevisvel, devemos ser rigorosos com o seu planejamento. O
importante no cometermos o engano de pensar que nossos planejamentos so
infalveis, principalmente quando envolvem sistemas altamente complexos, e, por
isso mesmo, surpreendentes, como os que esto implicados na ao educativa.
Portanto, o planejamento curricular, com todos os seus componentes, uma
primeira aposta, um guia para o trabalho e no uma predeterminao das atividades
que sero de fato realizadas. Nem os objetivos, nem os contedos, nem a
metodologia, nem a avaliao, nem mesmo os materiais didticos podem ser
submetidos a determinaes prvias inarredveis.
O que foi dito no novidade para ns. Sabemos que o currculo sintetiza todo
tipo de complexidade, bastando tomar como exemplo o aluno, a quem se objetiva
alcanar. FOERSTER, um ciberneticista e filsofo da cincia dos mais prestigiados,
alerta-nos quanto a isso, ao afirmar que tendemos a encarar o aluno como uma
mquina banal, que opera apenas com uma regra. Da, esperar- mos dele apenas
uma resposta, geralmente a que temos em mente, ou a que desejamos que ele nos
d. No entanto, o que caracteriza o aluno ser uma mquina banal, que opera
com vrias regras e, portanto, com formas de lidar com os objetos de
aprendizagem muito variadas, apresentando-nos respostas muitas vezes
desconcertantes. Apoiando-se em argumentaes desse tipo, FOERSTER afirma,
ento, que "a aprendizagem indeterminvel, imprevisvel e depende da histria."
(Giusta, 1997, p.57).
Assim, a soluo est, na verdade, em nossa capacidade de criar e recriar
situaes de compatibilidade entre o que estabelecemos como desejvel e as
condies de imprevisibilidade e incerteza nas quais o currculo est mergulhado.
Isso leva-nos a relativizar, mas no a negar o planejamento curricular. possvel
e desejvel o estabelecimento de expectativas, porm para que elas tenham mais
probabilidade de sucesso, recomendvel que o currculo, efetivamente, seja tratado
como parte do projeto poltico-pedaggico, como conjunto de decises negociadas
pelo coletivo da escola, considerado, como diria Pierre LVY, "inteligncia coletiva".
Se isso no acontece, corremos o risco de transformar o currculo e o prprio projeto
em letra morta, conduzindo necessidade de uma deciso na qual a posio do
dirigente fundamental: a institucionalizao do coletivo de educadores na
unidade escolar, por sua vez,
pressupe espaos e tempos formais, alm de pautas de reunio para que esse
coletivo possa exercer-
se como tal.
necessrio, ainda, dizer que, definido como estrutura narrativa, o currculo deve
ser visto, tambm, como estrutura relacional, ou seja, como sistema de relaes entre
os diferentes aspectos que o compem: relaes entre agentes sociais, contedos,
prticas, projetos, culturas, e entre tudo isso e as condies de vida e de aprendizagem
do aluno.
5- Currculo Como Complexidade
O currculo complexidade, isto , pressupe uma teia de relaes, o que coloca em
xeque a fragmentao do conhecimento instituda na cincia ocidental a partir de
Descartes. Com ele, teve incio a tentativa de reduzir o conhecimento do conjunto
ao conhecimento das partes, valendo-se da fora alcanada pelo paradigma analtico.
At bem pouco tempo atrs, esse paradigma era tido como nico e incontestvel.
Seguindo sua lgica, um problema complexo pode ser mais facilmente solucionado
quando decomposto em problemas menores. Em contrapartida, com isso perde-se o
que mais importante, ou seja, a viso do conhecimento como sistema: "conjunto
organizado de partes diferenciadas que produz qualidades que no existiriam se
estivessem isoladas uma das outras" (MORIN, 2000, p.13).
Alm disso, o vertiginoso aumento dos conhecimentos, inicialmente circunscritos
filosofia, acabou por precipitar a diviso do trabalho intelectual e a
compartimentalizao desses conhecimentos, sob a forma de disciplinas, foi
considerada inevitvel e irreversvel. A relao saber e poder, evidentemente, estava
a colocada; saber mais e gerar tecnologia para dominar mais.
justo reconhecer que o paradigma analtico e as especializaes disciplinares
trouxeram grandes progressos cincia. No entanto, cada vez mais, h insatisfao
com o isolamento e a insuficincia das abordagens disciplinares para responder
aos desafios da complexidade do mundo atual. Isso tem feito com que se retome
seriamente o discurso acerca da fragmentao do saber e que se procurem meios
para sua superao.
, ento, que a interdisciplinaridade passa a ser proposta. Sua defesa tem sido to
veemente que no h dvida de que ela se transformou numa mstica, principalmente
no campo da educao, em que a idia justificadamente frutificou. Em virtude disso,
vale a pena aprofundar sua conceituao e as condies bsicas de sua prtica.
A primeira informao necessria a de que essa soluo no nega a existncia das
disciplinas, o que est claro no significado do prprio termo (trabalho entre
disciplinas). Ningum contesta a inteireza do real, mas o ponto de vista das cincias
indiscutivelmente particular e restritivo. No cabe, pois, o idealismo de decretar o
fim das disciplinas ou subestimar as conseqncias prprias a elas. O que parece
vivel o emprego de estratgias que conciliem essa competncia prpria dos
diferentes domnios com a necessidade de alianas entre eles, no sentido de produzir
uma viso menos mutiladora do real. Dessa maneira passa a ser interessante um
trabalho de complementaridade, de cooperao, de convergncia de diferentes
pontos de vista para iluminar um problema e encontrar a melhor forma de encaminh-
lo.
As vantagens do trabalho interdisciplinar so praticamente desconhecidas, por falta
de experincias consolidadas. A exigncia interdisciplinar impe a cada especialista
que transcenda sua prpria especialidade, tomando conscincia de seus limites, para
acolher as contribuies de outras disciplinas. Sem falar que, ao pensarmos
interdisciplinarmente, encaramos o problema em suas relaes quase infinitas com o
contexto, a depender do nmero, do nvel e da qualidade das interaes que
consigamos promover.
Quanto ao currculo escolar, a complexidade do processo ensino/aprendizagem, tendo
em vista as finalidades e os valores da educao estabelecidos, reclama a articulao
entre as disciplinas, por fora:
da insuficincia que elas apresentam para lidar com suas prprias questes
internas, o que
conduz aliana com outras reas;
da abrangncia de problemas de pesquisa e da prtica, e de estudos
de temas que
ultrapassam os limites disciplinares.
Esclarecido o conceito de interdisciplinaridade, comeam as verdadeiras dificuldades.
No tarefa fcil a participao numa obra comum, quando os mtodos e as
modalidades de pensamento so to diferenciados. Assim como extremamente
difcil lidar com conceitos de reas diferentes da nossa, tambm difcil sairmos da
lgica de nossos pontos de vista para compreender o do outro e
chegar ao acordo necessrio, ou ao desacordo justificado. Para tanto, preciso ter
clareza acerca do
que se fala, do que cada um faz, do como e do para que o faz.
Depois, vm as vaidades, as disputas, os conflitos de interesses, sem esquecer
que a inrcia e o conservadorismo de certos educadores e alunos so outros tantos
obstculos a enfrentar. freqente constatar que cada disciplina superdimensiona
sua contribuio e seu territrio, julgando-se mais importante do que as demais e
isso, muitas vezes, conta com reforo social. Basta lembrar a diferena de prestgio
entre as vrias reas do conhecimento na sociedade e, logicamente, na escola. E
quando as diferenas e a m vontade no so explicitadas, pior ainda, pois o risco
de sabotagem do esforo interdisciplinar muito maior. Portanto, os projetos
interdisciplinares pressupem relaes maduras entre colegas, que esgotam os
desacordos no espao formal, respeitando as idias do outro, tendo liberdade e
legitimidade para discordar e defender o seu ponto de vista. preciso, tambm,
desenvolver e exercer os princpios da generosidade, cada um abrindo mo da
exclusividade do que sabe, para repartir com o coletivo, tendo a honestidade de no
fazer apropriaes indevidas das idias alheias. S no exerccio da confiana e na
identificao com os objetivos e condutas do grupo de que se participa possvel
realizar um trabalho interdisciplinar.
O que comentamos at aqui aplica-se, com a mesma propriedade, a outras
propostas pedaggicas, com vistas a minorar os resultados insatisfatrios do currculo
por disciplina, a exemplo da transdisciplinaridade e da transversalidade.
PIAGET cunhou o termo transdisciplinaridade, no campo da teoria do
conhecimento, para expressar "uma etapa superior das relaes
interdisciplinares, que no se contentaria em atingir interaes ou reciprocidade
entre pesquisas especializadas, mas que situaria essas ligaes no interior de um
sistema total, sem fronteiras" (Japiassu, 1976, p. 75). Porm, esclareceu em tempo
que se tratava apenas de um sonho, de uma etapa previsvel de associaes mais
do que de uma realidade j presente.
bom lembrar que Piaget era dado a escorreges idealistas e essa sua
utopia da transdiciplinaridade na pesquisa cientfica desconsidera o risco de uma
coordenao geral de todas as disciplinas e interdisciplinas a partir do modelo de
uma rea que seja socialmente mais valorizada. No campo da educao, o maior
problema a identificao da transdiciplinaridade com globalizao do
conhecimento, o que pode significar desenterrar o mito da oniscincia.
O problema da insuficincia do saber disciplinar parece ser mais bem
formulado quando se pergunta como podemos servir-nos da verticalidade dos
conhecimentos especializados e, ao mesmo tempo, libert-los das clausuras
disciplinares. Nessa direo uma soluo que tem sido apresentada a
transversalidade. Por meio dela o saber escolar legitimado pela possibilidade
que oferece para resolver problemas complexos, para compreender a realidade com
base nos mltiplos pontos de vista. Resumidamente, significa abordar um tema, ou
uma questo do cotidiano, no pela lgica das disciplinas isoladas, mas obedecendo
exigncia de um percurso por vrias reas. Mais uma vez, necessrio observar
que os temas transversais no esgotam o conjunto de conceitos e estratgias
fornecido pelas disciplinas e que podemos perder muito abrindo mo deles.
Voltaremos a essa discusso em mais dois momentos deste mdulo, de
maneira que podemos parar por aqui. Todavia queremos compartilhar com voc a
esperana em propostas pedaggicas que permitam o livre transito dos
conhecimentos escolares, quer sob a forma de trabalho interdisciplinar, quer sob
outras formas de colaborao que avaliarmos viveis e frutuosas.
Elas tm, sobretudo, grande poder de resoluo de problemas escolares de
ordem geral, podendo vir a apresentar solues criativas e adequadas a esses
problemas, muitas vezes gerados em contextos bem mais amplos. Afinal, uma
maneira de aglutinar, em torno dos desafios, diversas especialidades e estilos de
pensar.
Finalmente, merece ateno especial o fato de que toda proposta fundada em
articulao de conhecimentos requer estruturas administrativas flexveis, canais
mveis pelos quais as pessoas possam transitar, na busca de adeso para projetos
complexos. Aqui, aparece de toda importncia a funo do dirigente, para no s
garantir novos arranjos de tempos e espaos institucionais como tambm apoiar,
efetivamente, experincias concretas de inovao curricular.
TEXTO II
SANTOS, Luciola L. P. Dilemas e Controvrsias no Campo o Currculo: Programa
de Capacitao de Diretores
- PROCARD. Secretaria de Estado de Minas Gerais, 2000.
DILEMAS E CONTROVRSIAS NO CAMPO DO CURRCULO
1- Desenvolvimento no Campo do Currculo
Diferentes sociedades, nos ltimos sculos, colocaram a escola como lugar central
para socializar as novas geraes nos valores, hbitos, atitudes e conhecimentos
produzidos e acumulados historicamente. Pode-se dizer que, na instituio escolar,
sobretudo por meio do currculo que esse processo se desenvolve.
Ao longo dos ltimos anos, vrios significados foram e so atribudos ao currculo, de
acordo com diferentes concepes sobre o papel da educao escolar. Para alguns,
currculo significa o conjunto de conhecimentos trabalhados pela escola ou sob sua
superviso, enquanto, para outros, o currculo constitui as experincias de
aprendizagem vivenciadas na escola. Pode-se dizer que, no primeiro caso, a nfase
posta em "o que aprender", ou seja, no contedo a ser trabalhado na escola. No
segundo caso, o interesse dos educadores est voltado para a forma como o currculo
deve ser organizado, dando nfase definio das experincias mais significativas a
serem desenvolvidas pela escola. claro que essas duas orientaes representam
apenas diferentes nfases dadas a esses aspectos que se apresentam, geralmente,
interligados.
So tendncias que marcaram o campo do currculo desde sua origem e permanecem
at nossos dias. Nas ltimas dcadas, no entanto, a produo na rea do currculo
vem sofrendo grandes transformaes. No incio da dcada de 70, um grupo de
intelectuais, sobretudo ingleses e americanos, foram responsveis pelas mudanas
no rumo dos estudos e pesquisas sobre currculo. Esses acadmicos, influenciados
pelo marxismo, pelo neomarxismo, pela Fenomenologia, pelo interacionismo
simblico, pela Etnometodologia, pela Psicanlise e, mais recentemente, pelos estudos
culturais e teorias ps-estruturalistas, levantaram algumas questes e
desenvolveram anlises que redirecionaram as preocupaes e interesses nessa
rea. Alguns desses tericos so bastante conhecidos no Brasil e muito citados na
literatura sobre currculo, como, por exemplo, Basil BERNSTEIN e Michael YOUNG
(ingleses) e Henry GIROUX e Michael APPLE (americanos).
A preocupao - de carter prescritivo - com orientaes que facilitassem o desenvolvimento
dos currculos escolares substituda, a partir do trabalho desses grupos, pelo interesse
na compreenso do papel do currculo no processo educacional.
At ento, associava-se o baixo rendimento do aluno a aspectos socioeconmicos e
culturais. Acreditava-se que a idia de que as crianas das camadas populares
apresentavam baixo desempenho escolar por questes ligadas ao seu processo de
socializao: problemas relacionados ao desenvolvimento da linguagem, tipo de
experincias vivenciadas, falta de acesso aos bens culturais, entre outras. Na
Inglaterra, o movimento como Nova Sociologia da Educao volta-se para o estudo
do currculo. Michael YOUNG, em um livro lanado em 1971, intitulado "Conhecimento
e Controle", levanta importantes questes sobre a educao escolar, mostrando a
necessidade de se analisarem os pressupostos que comandam os processos de
seleo e organizao dos conhecimentos trabalhados pela escola. Abre-se, assim,
espao para questionar os estudos que atribuem o rendimento insatisfatrio dos
alunos falta de condies para a aprendizagem. Se as crianas no aprendem o que
a escola ensina, no seria esse fato decorrente da inadequao dos prprios currculos
escolares? Parte dos estudos sobre currculo passa, ento, a discutir a forma como
eles so organizados e trabalhados nas escolas.
As pesquisas e estudos da dcada de 70 mostram, ainda, que o que ensinado
na escola selecionado dentro de um universo amplo de possibilidades. No interior
da cultura, encontram-se o conhecimento cientfico, o conhecimento artstico e literrio,
o conhecimento do senso comum, enfim, diferentes formas de saberes e de saber
fazer. Por que, nesse conjunto de possibilidades, a escola privilegia determinados
tipos de conhecimentos em detrimento de outros? Reconhecendo que o
conhecimento escolar resultado de um processo de seleo, necessrio, ento,
entender-se os critrios que orientam essas escolhas.
Os estudos sobre currculos tm mostrado que os saberes acadmicos tm
mais prestgio na educao escolar do que os saberes prticos. Mostram, tambm,
que a forma como os conhecimentos so selecionados, organizados e trabalhados
nas escolas refletem relaes de poder e interesses de controle social, presentes
na sociedade. Em conseqncia, os currculos escolares, como vm sendo
analisados em diferentes trabalhos sobre guias curriculares, livros didticos ou prticas
de sala de aula, muitas vezes reforam diferenas de classe, gnero e etnia, entre
outras.
Atualmente, os estudos voltam-se para a anlise de como o currculo atua
nos processos de excluso escolar. Investiga-se se ele facilita ou limita as
possibilidades de desenvolvimento do pensamento crtico, do interesse dos alunos
pelos diferentes aspectos da nossa cultura, como desenvolve determinadas formas
de raciocnio, em detrimentos de outras, enfim, como ele est formando ou
conformando a maneira de ser e de agir das pessoas no processo de escolarizao.
Ao lado disso, busca-se discutir propostas alternativas de currculo, que permitam a
incluso dos alunos no sistema escolar. A discusso sobre a construo de uma
proposta curricular que torne a escola realmente democrtica, pela oferta de um
ensino de qualidade, defronta-se com vrios dilemas que sero apresentados a
seguir.
2- Currculo Acadmico X Currculo No Acadmico
As denominaes currculo acadmico e no acadmico representam
polarizaes em torno de dois modelos de currculo que quase nunca aparecem de
forma pura. YOUNG (2000) afirma que o currculo acadmico, centrado nas
disciplinas hierarquicamente organizadas, est associado educao das crianas
consideradas mais hbeis, e caracteriza-se pela nfase na comunicao escrita em
oposio oral, no individualismo, na abstrao e no afastamento da vida diria ou da
experincia comum. Opostamente, o que denominado de currculo no acadmico
so aquelas propostas curriculares que rompem com a estrutura disciplinar e com a
organizao seqencial dos contedos, trabalhando com temas que interagem
diferentes reas do conhecimento, voltando-se para os processos de aquisio, e
no para os processos de transmisso de saberes. valorizada, nessa
abordagem, a experincia de alunos e professores, suas vivncias e insero cultural.
Estudos como os de GOODSON (1998) e de YOUNG (1998) sobre o
denominado currculo acadmico mostram preocupao com a compreenso dos
processos de definio ou de organizao de propostas curriculares. GOODSON
(1998), discutindo alguns aspectos da teoria curricular, demonstra como, na
Inglaterra, na dcada de 40, dois tipos de currculos tornaram-se bem ntidos. De um
lado, um currculo para a classe mdia e para a elite, centrado em um corpo de
conhecimentos a serem transmitidos caracterizados pelo seu carter acadmico,
abstrato e descontextualizado. Segundo diz esse autor, os documentos oficiais no
campo da educao procuravam demonstrar que esse tipo de currculo era
"adequado queles alunos interessados em aprender, capazes de compreender um
argumento ou uma cadeia de raciocnios, interessados em causas e em saber por
que as coisas so como so". Por outro lado, para as crianas da classe operria
era apresentado um currculo voltado "para contextos prticos, com abordagem
pedaggica e relacionado com processos ativos". De acordo com os documentos
oficiais, esse currculo seria mais apropriado para o grupo de crianas que lida
melhor com coisas concretas do que com idias abstratas. Assim as crianas, como
os currculos, eram tratados como acadmicos e no acadmicos.
Analisando as discusses e as propostas curriculares da dcada atual, percebe-
se que a tenso entre currculos acadmicos e no acadmicos continua presente.
Em seu trabalho intitulado "Princpios para uma reflexo sobre currculo", Pierre
BOURDIEU (1998) prope sete princpios, os quais, segundo diz, esto
fundamentados na reestruturao ocorrida na definio das formas de transmisso
de conhecimento, na necessidade de eliminao de noes datadas e na importncia
da introduo, na escola, de novos conhecimentos, provenientes tanto da pesquisa
como das mudanas econmicas, sociais e tcnicas. Esses princpios podem ser
resumidos pelas seguintes proposies:
1. os contedos escolares devem ser constantemente revistos;
2. a educao deve dar prioridade s reas que desenvolvam o pensamento;
3. os currculos devem ser flexveis, mais apresentar conexo vertical e
horizontal entre os
contedos;
4. pelo fato de o currculo ser compulsrio, deve sempre ser considerado a
possibilidade de
transmisso de seus contedos;
5. deve-se procurar melhorar a eficcia do processo de transmisso, pela
diversificao dos
mtodos de ensino;
6. a prtica curricular deve ser direcionada para a integrao do trabalho de
professores de diferentes disciplinas, superando divises existentes antes
entre elas, j superadas pela evoluo das cincias;
7. os currculos escolares devem conciliar o universalismo inerente ao
pensamento cientifico com o relativismo ensinado por meio das cincias
histricas, refletindo a pluralidade de estilos de vida e de tradies culturais.
A proposta de BOURDIEU revela que o autor defende a idia de um currculo
acadmico, modernizado pela introduo de novos conhecimentos e habilidades
necessrias vida contempornea, trazidos pelo desenvolvimento cientifico e
tecnolgico e pelas inovaes produzidas no campo pedaggico.
Os que criticam o currculo acadmico acusam-no de haver sido sempre hostil s
crianas e adolescente das camadas populares. Em sentido contrrio, os que criticam
os currculos no acadmicos argumentam que eles no possibilitam a esses
estudantes o ingresso no mundo das cincias e do conhecimento, deixando-os em
condies de desvantagens perante aqueles que pertencem s elites, cujos pais,
principalmente no que se refere ao ensino mdio. Optam por escolas de currculo mais
acadmico.
No campo do ensino das diferentes disciplinas, tem-se verificado que os currculos
baseados na transmisso de conhecimentos tm obtido baixos resultados.
Atualmente, influenciados pela Psicologia Cognitiva, em suas diferentes matizes, e
ainda pela Psicanlise e pela teoria das representaes sociais, os estudos nesses
campos tm-se preocupado com os processos de aquisio do conhecimento,
considerando aspectos como concepes alternativas, senso comum, experincias
pessoais e coletivas, emoes e desejos como elementos constituintes dos processos
de aprendizagem. Alm disso, tem-se discutido, no campo da produo do
conhecimento escolar, a idia de que a difuso, sobretudo pelos meios de
comunicao digitalizados, est levando ao desenvolvimento de novas capacidades
mentais, cognitivas e afetivas.
Nesse contexto, criticado, hoje, o chamado modelo linear de currculo, que
prescreve uma trajetria de aprendizagem a partir de uma ordenao dos contedos
em uma seqncia definida como a melhor. Opondo-se essa matriz, advoga-se a idia
de que o currculo pode ser concebido a partir da metfora da rede hipertextual, a
qual estabelece um campo de conservao que oferece diferentes possibilidades e
percursos de aprendizagem.
3- Currculo Por Disciplinas X Currculo Integrado
O modelo do currculo difundido ao longo deste sculo tem sido o modelo disciplinar.
Nele, os contedos escolares so considerados, geralmente, como uma transposio
de campos ou disciplinas acadmicas para a escola, sob a forma de reas de estudo,
disciplinas ou matrias escolares. Nessa viso, o conhecimento escolar uma verso
didatizada do conhecimento cientfico, ou seja, mediante princpios pedaggicos, o
conhecimento cientfico adaptado ao nvel e interesse dos alunos, transformando-se
em conhecimento escolar.
Estudos no campo da histria social das disciplinas escolares buscam analisar as
condies de emergncia e desenvolvimento das diferentes disciplinas que integram
os currculos do ensino bsico. Trabalhando nessa rea, Ivor GOODSON demonstra
que as disciplinas escolares so colocadas no currculo de acordo com interesses
prticos. Diante de certas necessidades sociais, diferentes contedos passam a
integrar os currculos escolares, como, por exemplo, a educao sexual, que esta
sendo includa no currculo de muitas escolas devido ao aumento das doenas
sexualmente transmissveis. GOODSON mostra que, no seu processo de evoluo,
visando a alcanar maior prestgio, as disciplinas escolares tornam-se mais
acadmicas, incluindo contedos mais abstratos, de natureza conceituai. Exempio
disso ocorreu com a chamada "cincia das coisas comuns" ensinada, no incio do
sculo XIX, s classes operrias na Inglaterra. Essa disciplina trabalhava com o
conhecimento cientfico de forma contextualizada, partindo da cultura e da experincia
das crianas do povo, estimulando o pensamento, o raciocnio e a compreenso dos
fenmenos estudados. Com o passar dos anos, essa forma de ensinar cincias foi
relegada, e a disciplina "cincia" ensinada na escola passou a constituir um bloco
de conhecimentos abstratos, mais prximo das cincias desenvolvidas nos
laboratrios.
A organizao disciplinar dos saberes escolares tem sido duramente criticada,
uma vez que o currculo acaba por constituir um conjunto de contedos justapostos,
trabalhando-se com o conhecimento de maneira fragmentria e pouco significativa
para as crianas e adolescentes. Esse tipo de currculo coloca a escola de costas
para o mundo, uma vez que no se vincula s experincias concretas dos alunos.
Neste tipo de currculo, h pouco espao para o desenvolvimento, nos estudantes,
do esprito de iniciativa, do pensamento critico e do gosto pela pesquisa autnoma.
Nele, os alunos no captam ligaes que podem ser feitas entre as diferentes
disciplinas, terminando por concentrar seus esforos na memorizao de um volume
grande e desarticulado de informaes.
O currculo integrado busca trabalhar com situaes contextualizadas, integrando
conhecimentos de diferentes reas. Pode se dizer que, desde o comeo do sculo,
esto sendo elaboradas propostas curriculares, como o mtodo de projetos e o ensino
por soluo de problemas, que compartilham dessa viso. Nessas propostas, o
ensino parte de uma situao ou problema prtico no quais os alunos trabalham,
integrando conhecimentos de deferentes reas, para solucion-los.
Os currculos integrados permitem que os estudantes trabalhem com contedos
culturais relevantes, enfrentando a discusso de questes que no podem ser
abordadas nos limites de uma nica disciplina. Nesse tipo de currculo privilegiam-
se um ensino em torno de problemas reais e questes prticas, que estimulem e a
curiosidade dos estudantes, e a formulao de respostas criativas e inovadoras. Os
problemas abordados em um currculo desse tipo so trabalhados levando-se em
considerao fatores de diferentes ordens e preparando melhor os jovens para
vencerem os desafios do mundo contemporneo. H uma similaridade entre a forma
assumida nesse tipo de desenvolvimento curricular e a maneira como
enfrentamos/solucionamos problemas reais de ordem pessoal ou profissional.
Outra vantagem que os currculos integrados apresentam que eles favorecem
a "colegialidade" nas instituies escolares, levando os professores a trabalharem
em equipe e de forma cooperativa, eliminando as hierarquias escolares baseadas
no prestgio diferenciado das diversas disciplinas, e substituindo-as por relaes
mais horizontais, em que predominam as trocas, o respeito mtuo e o
estabelecimento de objetivos comuns.
No entanto, as escolas continuam a trabalhar com o currculo disciplinar, uma
vez que o currculo integrado supe ruptura com as formas tradicionais de ensino,
exigindo trabalho coletivo e criatividade. Alm disso, os professores - exceto os das
sries ou dos ciclos iniciais-, so formados dentro de uma rea especfica de
conhecimento, a qual buscam preservar, na defesa de seu territrio de trabalho.
Contudo as experincias realizadas e bem sucedidas com currculos integrados
mostram que, para os prprios professores participantes desses projetos, o ensino
passa a ser um campo de realizaes, novas aprendizagens, renovando seu
interesse pelo trabalho, deixando de constituir uma sucesso de tarefas repetitivas,
montonas e cansativas.
4- Universalismo X Multiculturalismo
No Brasil, na dcada de 80, destacaram-se, no campo da pedagogia crtica, duas
tendncias, com concepes prprias a respeito do currculo escolar e de suas
relaes com a cultura do aluno e com a cultura mais ampla. Uma delas ressalta a
necessidade de que a escola socialize os conhecimentos historicamente
acumulados, o que, de certa forma, significa tornar a escola responsvel pela
popularizao do conhecimento cientfico. A outra enfatiza a necessidade de que a
escola trabalhe com a cultura das camadas populares, rompendo a relao existente
entre a cultura escolar e a cultura daqueles que detm o poder na sociedade. A
primeira tendncia denominada "Pedagogia Crtico- Social dos Contedos", enfatiza
que a escola deve trabalhar com a socializao dos conhecimentos que fazem parte
da chamada cultura legtima. A outra, conheciam como "Educao Popular", defende
a valorizao da experincia do aluno como forma de dar voz s culturas silenciadas
pela escola, fortalecendo os grupos que esto em desvantagem social.
A "Pedagogia Crtico-Social dos Contedos" pode ser identificada com o que
chamado, no campo da Sociologia do Currculo, de universalismo e de legitimismo,
enquanto a "Educao Popular" compartilharia das idias do multiculturalismo.
Para a posio universalista, existem saberes, conhecimento e valores que
so universais e transculturais, os quais fazem parte do patrimnio cultural da
Humanidade e devem ser socializados pela escola. Entende-se que existe uma
cultura legtima, cujo acesso condio necessria para uma integrao e uma
participao efetiva do sujeito no mundo social.
Para os que apiam o multiculturalismo, a escola trabalha apenas com uma parcela
restrita da experincia humana, ou seja, com os saberes, valores e atitudes que fazem
parte do que denominada verso autorizada ou legtima da cultura. Nesse
processo, a cultura dos diversos grupos sociais marginalizada no processo de
escolarizao e, mais do que isso, essa cultura vista como algo a ser eliminado
pela escola, devendo ser substituda pela verso autorizada da cultura, a qual tem
estado presente, geralmente, em todas as tarefas do sistema de ensino.
Para o multiculturalismo, o currculo escolar deve-se englobar as experincias
culturais dos diferentes grupos que integram a sociedade. Refuta-se a idia de que
existam conhecimentos universais, uma vez que se designam como tais os
conhecimentos que fazem parte da cultura de um grupo social especfico. Assim, o
currculo escolar deve privilegiar a diversidade cultural, organizando a partir das
mltiplas experincias e significados produzidos pelas diferentes culturas. Da mesma
forma, os chamados multiculturalistas pem em questo a validade ou universalidade
dos contedos cientficos e tericos, alegando que no existe um critrio justo, a partir
do qual se possam considerar algumas obras humanas mais importantes ou
significativas que outras. Para eles, as hierarquias existentes no interior das
manifestaes culturais refletem interesses e relaes de poder presentes na
sociedade.
Por um lado, os que advogam a posio universalista argumentam que a escola o
nico espao que permite s crianas das camadas populares acesso ao
conhecimento cientfico, s obras literrias clssicas, enfim, produo cultural mais
erudita, constituindo importante ferramenta para a participao em todas as esferas
sociais. Por outro lado, os que defendem o multiculturalismo consideram que os
currculos universalistas trabalham com a idia de que as crianas das camadas
populares so carentes culturalmente e que o conhecimento deve suprir o dficit
cultural desses alunos. Afirmam que a posio universalista tende a atribuir um
valor negativo aos saberes, as prticas, aos gostos e ao modo de falar das camadas
populares. Argumentam, ainda, que os currculos universalistas consagram as
hierarquias sociais; valorizam, em suas prticas, o esforo, o amor ao trabalho,
buscando, por meio disso, melhorar as condies sociais dos alunos. Os que colocam
a favor do multiculturalismo argumentam que a falta de compreenso e a
desvalorizao da cultura do aluno tem-se mostrado uma das causas centrais do
fracasso escolar.
Claude GRIGNON, em um artigo intitulado A escola e as culturas populares:
pedaggicas legitimistas e pedaggicas relativistas, publicado na revista Teoria e
Educao n 5, em 1992, afirma que as pedagogias legitimistas, ao c ia em a
iluso de que todas as c ianas tm, em p incpio,
oportunidades de ascenso e mobilidade social, que seria conquistada pela posse da
cultura autorizada, acabam por excluir os alunos das camadas populares, por
desconhecerem o universo material e simblico vivenciado por essas crianas. Da
mesma forma, o autor critica posies relativas (multiculturalistas), que propem,
para as camadas populares, uma educao escolar voltada para o ldico, a
espontaneidade e a criatividade popular, reservado, apenas para as elites, uma
educao que trabalha com abstrao e capacidade de raciocnio. Para ele, esta
uma posio populista, que no sabe fazer uma leitura correta da cultura popular,
atribuindo-lhe valores e significados de vis etnocntrico.
5- Ensino Propedutico X Formao Profissional
Tem sido muito discutido, no campo da educao, como a escola deve
responder as grandes
transformaes ocorridas em todos os setores do mundo contemporneo.
Emile DURKHEIM, em cursos dados na Frana, antes da Primeira Guerra, e,
mais tarde, transformados em livros, traduzido para o portugus, em 1995, intitulado
a Evoluo Pedaggica, j colocava a polmica relativa ao carter do ensino secundrio
- este nvel de ensino deveria ser de carter propedutico ou profissionalizante? O
autor inicia sua anlise mostrando como, desde o comeo do sculo, havia uma
discusso sobre a orientao do currculo do ensino secundrio. Deveria este
contemplar mais os Estudos Clssicos, Histria e Letras, ou deveria voltar-se,
predominantemente, para os estudos das Cincias da Natureza? DURKHEIM
prope a conjugao desses tipos de conhecimentos considerando, no entanto,
a necessidade de os estudos clssicos modernizarem-se, tornando-se um
instrumento para o conhecimento da sociedade e da realidade nas quais os homens
esto inseridos. O autor mostra que o ensino secundrio, naquele perodo, no
oferecia uma formao profissional, posio que ele ratifica. Considera, contudo, que,
nesse nvel de ensino, os alunos devam desenvolver habilidades e competncias
intelectuais, a partir das quais possam ser introduzidos no ensino das diferentes
profisses.
O valor social dos contedos curriculares tem variado ao longo da Histria, ora
dando nfase s disciplinas do campo das Humanidades, ora enfatizando aquelas
disciplinas que integram o campo das Cincias Fsicas, Biolgicas e da
Matemtica. Essas oscilaes esto relacionadas com interesses econmicos,
sociais e culturais. Muitos devem lembrar-se de como o lanamento do
Sputnik desencadeou reformas curriculares voltadas, sobretudo, para o ensino
das Cincias Fsicas e Biolgicas e da Matemtica. Essas reformas foram
iniciadas nos Estados Unidos, e dali se irradiou, chegando at o Brasil. O que a
nao americana propunha era a melhoria do ensino, como uma estratgia para
a formao de cientistas capazes de vencer a antiga Unio Sovitica na corrida
espacial. Nesse quadro, caberia perguntar: atualmente, quais so os
contedos curriculares mais adequados para o ensino, que saberes corresponde
s necessidades e interesses dos estudantes que hoje
freqentam a escola?
Esto em curso, hoje, uma profunda reestruturao produtiva e uma abrangente
reorganizao da sociedade, ancoradas no uso intensivo e em larga escala da
microeletrnica e da eletrnica digital. Com esse arsenal tecnolgico, a produo em
massa substituda pela especializao flexvel. Novas idias podem ser
transformadas em novos produtos, e a produo pode ser feita de acordo com as
demandas do cliente, exigindo percia e flexibilidade, tanto da mquina quanto do
operador.
Essas transformaes, sem dvida, mudam as concepes acerca do perfil do
trabalhador, tendo, conseqentemente, um grande impacto na maneira de conceber
a educao escolar. Em decorrncia disso, assiste-se a uma intensificao das
reformas curriculares, voltadas para o desenvolvimento, no aluno, de habilidades
tais como a criatividade, a autonomia, o desenvolvimento, do pensamento
divergente e a capacidade de comunicao, competncias consideradas
fundamentais para o trabalhador.
A histria do currculo vem sendo marcada pela luta de interesses, muitas vezes
conflitantes e que revelam posturas diferentes quanto educao escolar. Raymond
WILLIAMS, examina as disputas em torno do currculo durante o sculo XIX,
encabeados por trs grupos distintos: os educadores pblicos, os humanistas
tradicionais, e os industrialistas. O primeiro grupo era a favor do ensino pblico de
massa, enquanto o segundo grupo preconizava o ensino em temos de uma cultura
mais desinteressada, desvalorizando os saberes cientficos e tcnicos. J o terceiro
grupo lutava por um currculo de carter mais utilitarista voltado para as necessidades
do mundo do trabalho.
At hoje, tais disputas continuam presentes no campo do currculo. Em sntese,
pode-se dizer que os educadores consideram a educao como um processo de
formao humana, enquanto grupos que consideram a educao de um ponto de
vista mais instrumental tende-se a relacionar o currculo com as demandas
econmicas, ligada ao mercado de trabalho.
Pode-se argumentar que o currculo que permita o desenvolvimento do
pensamento divergente, do pensamento reflexivo e crtico, e oferea formas e
materiais de ensino diversificado possibilitam o desenvolvimento de diferentes
habilidades intelectuais e de vivncias de prticas variadas. um tipo de currculo
que prepara o aluno tanto para a soluo de seus problemas de vida como para um
melhor desempenho profissional.
6- Formao Humana X Competncias
Hoje, grande parte das propostas curriculares coloca as "competncias", a serem
desenvolvidas no interior de um curso, de um ciclo de ensino ou de uma disciplina
como parte integrante e fundamental do currculo. Essas competncias correspondem,
pois, aos objetivos de serem alcanados naquela etapa do ensino ou naquele curso.
Segundo lembra PERRENOUD (2000), competncia pode ser considerada como
a "capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situao, apoiando-
se em conhecimentos, mais sem limitar-se a eles." A competncia, afirma esse
autor, no consiste na aplicao pura e simples de conhecimentos, modelos de
ao ou procedimentos; inclui conhecimentos tericos ou metodolgicos, formas de
atuar e atitudes. Para defini-las, preciso relacion-las a um conjunto de problemas
ou tarefas e identificar a natureza dos esquemas de pensamentos ou de recursos
cognitivos que sero mobilizados nessas situaes.
So consideradas competentes as pessoas que, diante de uma situao
indita e complexa, resolvem-na com segurana e rapidez e de forma mais adequada
do que uma outra pessoa, que tivesse o mesmo grau de conhecimento da primeira,
mais no soube mobilizar esses conhecimentos de forma to eficaz. que a
competncia, segundo diz PERRENOUD, baseia-se no apenas em conhecimentos,
mais em esquemas heursticos ou anlogos prprios de um campo e tambm em
processos intuitivos.
Alm disso, supe atitudes e posturas mentais, curiosidades, paixo, busca de
significado e a conjugao de intuio com a razo e da cautela com a audcia,
que so desenvolvidas tanto em processo de formao, bem como mediante a
experincia.
A definio das competncias consiste, pois, em colocar de forma operacional, e no
genrica, os objetivos do ensino. PERRENOUD lembra que, quando se define de
forma geral ou de maneira abstrata, o que se espera de um profissional, no fica
claro como ele desenvolver suas aes. Dessa forma, a definio da competncia
explicita a orientao que assumira a prtica ou atividade desenvolvida.
Uma competncia mais geral ou mais abrangente inclui uma srie de outras
competncias mais especficas que podem ser consideradas como componentes da
primeira. Para o desenvolvimento de competncias,
PERRENOUD, recomenda um ensino baseado na soluo de problemas, no
desenvolvimento de projetos e a adoo de um contrato didtico em que o professor
valorize a cooperao entre os alunos, aceite os erros como parte do processo de
aprendizagem e incentive a experimentao, para trabalhar nessa perspectiva o
professor deve adotar um planejamento flexvel, uma vez que para desenvolver
competncias, o mais importante trabalhar com um pequeno nmero de situaes
fecundas, do que abordar de forma superficial, um grande nmero de assuntos, com a
preocupao de vencer os programas escolares.
Como pode ser visto o ensino por competncias, est bem prximo ao ensino por
objetivos, preconizado nas dcadas de 60 e 70, como uma maneira de tornar o ensino
mais eficiente. A diferena est em que os objetivos educacionais estavam mais
voltados para a aquisio de conhecimentos e de habilidades cognitivas e, por isso,
estavam mais relacionados a um desenvolvimento mais rgido e sistemtico do
currculo escolar. De forma diferente, as competncias se voltam mais para aes, que
envolvam conhecimentos tericos e prticos, habilidades e atitudes relacionadas
atuao em situaes definidas. Por exemplo, hoje se fala muito em competncia em
saber utilizar novas tecnologias em determinadas tarefas ou atividades.
Pode-se dizer que o ensino por competncia representa um avano em relao ao
ensino por objetivos, sobre tudo por reconhecer que as competncias no resultam
apenas da aplicao de conhecimentos para a soluo de problemas, mais que
envolvem uma srie de outros tipos de saberes, como o saber prtico e tambm
atitudes e valores morais.
O que tem sido criticado, em relao ao ensino por competncias, o carter
instrumental que acaba assumindo a educao, quando passa a coloc-las como
objeto central no processo ensino- aprendizagem. Quando se pensa na educao
em termos de formao humana, no possvel reduzi- la, apenas, a posse de uma
srie de competncias. Se os valores ticos, a sensibilidade, a criatividade, o esprito
crtico esto, de alguma forma, para autores como PERRENOUD, implicados no
desenvolvimento das competncias, no so eles, nesta abordagem, os objetivos finais
da educao.
Alguns crticos do ensino por competncias relacionam a emergncia desse
movimento, que, alis, vem ocorrendo em vrios pases do mundo, ao crescimento do
controle sobre o ensino, realizado por meio dos grandes testes nacionais, como
ocorre no chamado "provo" realizados nos cursos superiores, ou sistema de
Avaliao de Educao Bsica (SAEB), que buscam aferir os resultados do ensino,
em um determinado nvel ou curso. A preocupao dos educadores, que se posicionam
contra esse tipo de avaliao, que se organize e desenvolva o ensino, em funo
desses instrumentos passando a predominar a preocupao com o produto, e no
com o processo de aprendizagem. Alem disso, tais testes exigem que o currculo tenha
um determinado percurso, dificultando o atendimento s diferenas regionais e locais,
bem como as particularidades de cada estabelecimento de ensino, de cada sala de
aula e dos diferentes alunos.
Os educadores crticos defendem a idia de que os alunos devem adquirir
conhecimentos e desenvolver diferentes habilidades intelectuais, valores morais e
atitudes em relao aos diferentes problemas da realidade. Da mesma forma,
consideram que seja importante que os estudantes sejam "competentes" para lidar
com problemas da vida prtica e do mundo do trabalho. Para isso, defendem um
currculo em que os estudantes vivenciam situaes diversificadas, ricas em desafios
intelectuais e realidade cultural, tornando os processos de aprendizagem significativo
e dinmico. Em sntese, a resistncia que existe em relao ao ensino por
competncia tem origem no temor de que prevaleam, na educao, interesses
instrumentais, voltado mais para a eficincia do ensino que para o processo de
formao do cidado crtico, que deve ser o objetivo central da educao escolar.
8. Curriculo oculto
COMO AGIR EM RELAO AOS CONTEDOS QUE SO ENSINADOS E APRENDIDOS DE FORMA NO
EXPLCITA NA ESCOLA.
orientao educacional tem o compromisso de auxiliar a escola em sua funo
socializadora, criando ou reformulando aes pedaggico-educacionais e favorecendo
a articulao de valores que resultem em atitudes ticas no mbito do convvio social.
Ainda que a instituio no conte com um cargo especfico para essa funo, suas
atribuies precisam ser realizadas no dia a dia.
Como esse campo se ocupa em desenvolver estratgias para a aprendizagem dos
contedos atitudinais, um dos papis mais importantes do orientador gerenciar o
currculo oculto. A maior parte dos problemas tradicionalmente enviados para a sala dele
(excluso de sala de aula, furto, briga, bullying, mau uso dos espaos coletivos, cola em
provas, plgio de trabalho, atitude de desrespeito ao professor) est vinculada a esses
"contedos" que so ensinados e aprendidos de forma no explcita nas relaes
interpessoais que se constroem na escola.
Trata-se de um equvoco acreditar que esse educador deva se ocupar exclusivamente
dos alunos (em especial os tidos como indisciplinados e os que tm baixo rendimento)
e de suas famlias. Infelizmente, ainda existem escolas que trabalham nessa perspectiva
antiquada e "psicologizante", que posiciona o orientador educacional como algum
destinado a abafar (e no resolver) os conf litos na base da mediao com estudantes,
pais e professores. Esse modo de atuar, eticamente ineficaz, faz com que esse
profissional muitas vezes se sinta como um bombeiro, que todos os dias apaga incndios
e deixa brasas pelo caminho. Fechado numa sala geralmente distante dos espaos onde
o currculo oculto se manifesta, ele acaba brincando de investigador de polcia, juiz ou
psiclogo clnico. Alguns ficam constrangidos por terem de atuar assim. Mas h os que
exercitam com satisfao esses pequenos poderes.
Uma abordagem contempornea do trabalho compreende outras competncias para o
orientador educacional. Ele deve ter certo distanciamento da demanda aparente (queixa)
para promover uma escuta analtica que o leve a identificar os agentes, os valores e os
conf litos nela envolvidos. Tambm est sob sua responsabilidade desencadear aes
que ampliem o dilogo e a compreenso entre os protagonistas da comunidade, sem
jamais negar a natureza dos conf litos. O exerccio dessas competncias s possvel
quando o orientador educacional deixa a rotina de sua sala e se insere em outros
espaos para procurar e explicitar os elementos do currculo oculto. As aes sero
eficazes quando contriburem para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem,
o que requer a interlocuo com a equipe docente e o entendimento do sujeito como um
ser histrico, crtico e social. Embora o orientador educacional no seja um especialista
nas didticas - essa a especialidade do coordenador pedaggico -, ele deve ser capaz
de identificar se a ao docente est de acordo com os princpios que norteiam o projeto
pedaggico da escola.
imprescindvel sua participao nos momentos de formao dos professores,
desenvolvendo estratgias para problematizar o convvio e as relaes entre as
pessoas. Trata-se de promover coletivamente o abandono do discurso pessimista e
paralisador do fracasso da escola e do aluno e debruar-se sobre os obstculos que
precisam ser superados. Existem diversos aspectos que compem uma boa parceria
entre o educacional e o pedaggico. A seguir, alguns exemplos:
Compartilhar as observaes do cotidiano escolar que ajudem a descobrir os aspectos
do currculo oculto.
Problematizar temas relacionados qualidade do convvio, tais como valores, uso do
espao coletivo, furtos, violncia, questes de gnero, preconceito etc.
Refletir sobre a formao tica do sujeito social por meio da anlise dos temas
transversais nas diversas disciplinas e da seleo dos temas sociais complexos e o
momento mais apropriado para introduzi- los em situaes de aprendizagem.
Investigar a escola sob novos paradigmas, entrando em contato com a produo de
tericos da cincia, da sociologia e da psicologia da Educao.
Compreender as caractersticas da diversidade da famlia moderna e seus impactos
na Educao.
Informar-se sobre as principais caractersticas dos alunos com necessidades
educativas especiais e como garantir a socializao e a aprendizagem.
Construir acordos educativos coletivos que comuniquem o resultado da reflexo da
instituio sobre as prticas e sirvam de parmetros para futuras aes.
A integrao do educacional com o pedaggico s funciona nas escolas que acreditam
e apostam na troca de experincias e saberes, com o apoio institucional necessrio e a
adeso de gestores e docentes que no temem buscar oportunidades para propiciar o
desenvolvimento de suas competncias profissionais.
Texto de : CATARINA IAVELBERG assessora psicoeducacional especializada em
Psicologia da Educao.
Disponvel em : http://gestaoescolar.abril.com.br/formacao/curriculo-oculto-
759406.shtml
Concluses
Em primeiro lugar, importante destacar que o currculo, como um campo de
produo de significados, no apenas socializa os estudos nos conhecimentos
trabalhados nas diversas disciplinas, mas tambm forma personalidades e
subjetividades, ao criar predisposies, sensibilidades e formas de raciocnio.
necessrio, ento, considerar que os contedos e mtodos de ensino, ao trabalharem
com determinados vieses, privilegiados certos tipos de conhecimentos e formas de
ensinar, acabam por reproduzir as estruturas da vida social, com suas assimetrias, e
desigualdades. Nesse contexto. Ao invs de programas abarrotados de contedos, a
escola precisa selecionar temas relevantes, articulados com as experincias das
crianas e dos adolescentes, contendo-o com a vida e com a realidade social. Assim,
no currculo escolar, no deve ser apenas valorizando o domnio de conhecimentos,
mas, acima de tudo, importante que ele esteja voltado para formao de
habilidades intelectuais, valores e atitudes que garantam a formao dos estudantes
como pessoas bem equipadas para resolverem seus problemas pessoais e os da
comunidade em que vivem.
Em segundo lugar, preciso reforar a idia de que a construo do currculo
constitui um processo de seleo no interior da cultura, processo esse que, como
foi visto, implica incluses e excluses. As incluses legitimam conhecimentos,
valores, formas de pensamentos e conduta, da mesma forma que as excluses
podem significar desqualificaes e marginalizao de determinados saberes, que
produzem e ampliam as desvantagens de determinados grupos sociais e culturais.
Em terceiro lugar necessrio que a escola esteja sempre acompanhando
e analisando as transformaes econmicas, sociais e culturais que vem ocorrendo
na sociedade. Merecem destaque, no novo cenrio mundial, as novas tecnologias do
texto, da imagem e do som, ou seja, uma penetrao crescente da mdia eletrnica
em todos os espaos da vida social. Nesse contexto importante que uma proposta
curricular conseqente considere a emergncia de um novo tipo de aluno, com
diferentes interesses, capacidades e necessidades, importante ainda, que a escola
estabelea relaes com a cultura da informao, de tal maneira que a pedagogia
se fortalea, garantindo processos de escolarizao mais compatveis com a
realidade e com o jovem do mundo contemporneo.
O currculo, assim construdo, proporciona aos estudantes contatos com diferentes
elementos da produo cultural humana, o que significa a incluso dos saberes
prticos, da produo cientfica, dos produtos da mdia e da informtica, dos filmes,
das peas de teatro, das obras literrias, bem como dos diferentes artefatos e da
produo artstica das mais diferentes culturas. Abrange, ainda, a formao de valores
ticos, de pensamentos crticos e de senso prtico, da capacidade de resolver
problemas, participar da vida social e poltica, encontrar formas de realizao pessoal
no mundo do trabalho e no lazer, alm da conscincia do prprio corpo. Um currculo
no poder estar organizado, exclusivamente, ao redor das disciplinas tradicionais,
mas dever incluir outras experincias da cultura humana, desenvolvidas mediante
atividades bem planejadas, que privilegiem a produo e a criatividade do estudante.
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