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2º CONGRESSO BRASILEIRO DE POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO EM
SAÚDE
UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM PROJETO
POSSÍVEL
Desafios na assistência aos grupos populacionais vulneráveis
Letícia de Lima Trindade
Taiza Dal Pian
Maiara Bordignon
Carine Vendruscolo
Lucimare Ferraz
Ivete Maroso Krauzer
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA
BELO HORIZONTE
2013
Desafios na assistência aos grupos populacionais vulneráveis
Challenges in assistance to vulnerable population groups*
Desafios na assistência aos grupos populacionais vulneráveis
RESUMO: Buscou-se identificar quais são as estratégias/recursos que os profissionais
utilizam para assistir esses grupos e, como o processo de formação tem orientado a prática
profissional dos sujeitos do estudo na assistência aos grupos populacionais vulneráveis. Trata-
se de uma pesquisa descritiva qualitativa, da qual participaram profissionais de saúde de
unidades de Saúde da Família, unidades básicas tradicionais, uma localizada em terra
indígena e um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), buscando-se incluir os diferentes
serviços da Atenção Básica. Participaram enfermeiros, médicos e técnicos de enfermagem
abordados por meio de uma entrevistas semi-estruturadas, as quais foram analisadas com base
na Análise Temática de Bardin (1995). Entre as estratégias que qualificariam a assistência, os
profissionais mencionaram tecnologias materiais e não materiais, com destaque para a
educação em saúde. Observou-se que apesar dos avanços na formação na área de saúde, há
necessidade de maiores subsídios em estratégias de ensino e prática que promovam o cuidado
integral e humanizado, orientado pela epidemiologia e pelos princípios norteadores do
Sistema Único de Saúde.
Palavras-chave: Vulnerabilidade. Atenção Primária à Saúde. Processo de Trabalho em
Saúde. Saúde do Trabalhador.
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
A vulnerabilidade relaciona-se a indivíduos e/ou grupos populacionais que estão mais
expostos a determinados agravos, como exemplo a hipertensão arterial, diabete mellitus, a
fatores de risco como alcoolismo, tabagismo, sedentarismo, entre outros; ou ainda, que vivem
em condições de vulnerabilidade social, como famílias em situação de pobreza extrema, as
quais apresentem a violência como forma de manifestação nas suas relações interpessoais e
com a sociedade, como por exemplo, as gangs juvenis, nos casos de violência doméstica,
entre outros (NETO; CASTRO, 2008).
Estudos sobre o tema identificam que é possível dividir a vulnerabilidade em dois
tipos (BALLANTYNE, 2007): a vulnerabilidade extrínseca – ocasionada por circunstâncias
externas, como falta de poder socioeconômico, falta de escolaridade ou carência de recursos;
e a vulnerabilidade intrínseca – causada por características que se relacionam com próprios
indivíduos, tais como doença mental, deficiência intelectual, doença grave, os indivíduos em
extremos de idade (crianças e idosos) ou que sofrem discriminação por raça (negro, índio).
Nesse contexto, emergem os seguintes questionamentos: Quais estratégias/ações
podem ser realizadas para amenizar esses problemas e qualificar a assistência prestada? Como
o processo de formação tem orientado a assistência aos grupos populacionais vulneráveis?
A peculiar situação em que vivem tais grupos populacionais, no conjunto da sociedade
brasileira, requer reflexões sobre a aplicação das orientações do Sistema Único de Saúde
(SUS) no contexto do seu quotidiano. A partir de investigações sobre tais temáticas, pretende-
se fornecer subsídios que auxiliem na construção de estratégias que amenizem a situação de
vulnerabilidade desses indivíduos e grupos, com vistas a fortalecer a garantia de benefícios da
seguridade social, da equidade e da universalização do cuidado em saúde, o que também pode
proporcionar mais prazer e minimizar o desgaste dos profissionais de saúde da Atenção
Básica à Saúde (ABS).
OBJETIVOS
Identificar as estratégias/recursos que os profissionais utilizam para assistir os grupos
populacionais considerados vulneráveis, no cotidiano do trabalho a Atenção Básica em Saúde.
Ainda, buscou-se conhecer como o processo de formação tem orientado a prática profissional
dos sujeitos do estudo na assistência a esses grupos populacionais.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, da qual participaram
15 profissionais de saúde, que atuam na Atenção Básica em Saúde (ABS) de um município de
referência para a população do Extremo Oeste de Santa Catarina.
O cenário de pesquisa foi composto por diferentes serviços da ABS, entre eles uma
unidade de Estratégia de Saúde da Família (ESF) do meio urbano, uma do meio rural,
unidades básicas tradicionais urbana (sem a presença da ESF), uma localizada em terra
indígena e um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II).
Como critérios de seleção dos profissionais foram utilizados: 1) incluir profissionais
de saúde de, no mínimo, uma Unidade Básica Tradicional (UBT), duas unidades de Estratégia
de Saúde da Família (ESF), sendo uma urbana e rural e um Centros de Apoio Psicossocial
(CAPS); 2) incluir profissionais de diferentes categorias, sendo no mínimo um médico, um
enfermeiro e um técnico de enfermagem; 3) fazer parte do quadro funcional do serviço, com
vínculo empregatício; 3) estar atuando no serviço há pelo menos seis meses; 4) concordar em
participar do estudo mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Como critério de seleção das unidades utilizou-se incluir ao menos uma ESF, uma unidade
sem a presença desta modalidade assistencial, um CAPS e a unidade localizada em Terra
Indígena, na sequência o critério de saturação dos dados.
As informações foram coletadas por meio de entrevistas semi-estruturadas com os
participantes. Para coleta dos dados, primeiramente, foram agendadas as entrevistas nas UBS.
Para adequação do instrumento, o mesmo passou por um teste de instrumento, ou seja,
anteriormente a coleta, três profissionais responderam a entrevista. Para a realização da coleta
de dados participaram acadêmicos e pesquisadores do Grupo de Estudos sobre Saúde e
Trabalho.
Para melhor registro dos dados as entrevistas foram gravadas em aparelho digital, com
autorização dos participantes do estudo por meio Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido e do Termo de Consentimento para gravações e posteriormente foram transcritas
na íntegra.
A análise dos dados foi feita mediante Análise Temática de Bardin (1995), a qual se
destaca como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, ou seja, valoriza
qualquer transporte de significações de um emissor para um receptor, analisando o conteúdo
dessas comunicações. Esse tipo de análise busca identificar os núcleos de sentido que
compõem a comunicação e interpretar seus significados. Para tanto, são organizadas
categorias de fragmentação da comunicação, segundo critérios de classificação.
Para a classificação das categorias foram utilizados temas estruturados a partir dos
momentos do processo de trabalho e definidos pela análise dos dados quantitativos, visto que
a estrutura metodológica adotada propõe o formato seqüencial de coleta e análise de dados.
O projeto foi submetido e aprovado pelo ao Comitê da Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC) e atendeu aos requisitos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional
de Saúde que aprovou as diretrizes e normas regulamentadoras das pesquisas envolvendo
seres humanos, sendo aprovado pelo número 149.244/2012.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Dentre o total de profissionais entrevistados, percebeu-se que predominou o sexo
feminino, sendo estes mais da metade de todos os profissionais da saúde entrevistados e da
faixa etária de 40 a 49 anos e em seguida daqueles que estão começando a carreira, com
idades entre 20 e 29 anos.
Quanto ao tempo de formação identificou-se maior incidência dos sujeitos de 1 a 5
anos de atuação e os com mais de 20 anos, ou seja, os extremos, ou seja, profissionais com
pouca e elevada experiência.
O tempo de atuação no cenário investigado dividiu-se em cinco categorias que
variaram de até um ano de atuação no local do serviço há mais de quinze anos de atuação,
sendo que prevaleceram aqueles profissionais que estavam trabalhando até no máximo um
ano no local de serviço.
Nos últimos anos muito tem sido discutido sobre a importância da força de trabalho
em saúde como principal foco a ser contemplado por políticas públicas de qualificação e
processos de educação permanente que “possam produzir novas práticas de trabalho”.
(BRASIL, 2006). Nesse sentido, emerge a importância de conhecer o perfil dos trabalhadores
que atuam no SUS e desse modo melhor compreender suas práticas.
O Ministério da Saúde preconiza que o perfil dos profissionais inclua algumas
características fundamentais para fomento da consolidação do SUS: capacidade de análise
crítica em relação as suas práticas profissionais; que seja um sujeito ativo na organização e
gestão dos processos de trabalho em saúde, entendendo-se como pertencente a uma classe
social; que paute sua atuação no compromisso de construção de uma prática solidária, ética
centrada no vínculo, que implica em uma ligação mais estável e duradoura entre profissionais,
usuários, ações em serviço, retirando a impessoalidade dos espaços públicos (BRASIL, 2006).
Nesse sentido, o tempo de atuação na saúde e, especialmente na AB, aspectos da formação
e especialmente qualidade do vínculo e comprometimento com o modelo assistencial em
atuação se mostram primordiais.
Dentro deste contexto, a pesquisa identificou os sujeitos e grupos sociais que os
profissionais identificam como vulneráveis, sendo mencionados: os idosos, as crianças, a
população “mais carente”, os adolescentes e os indivíduos portadores de algum sofrimento
mental.
Com relação aos idosos, a vulnerabilidade que lhes é atribuída pelos participantes
deste estudo, está relacionada aos déficits cognitivos e motores decorrentes do processo de
envelhecimento, e que os tornam mais dependentes de outras pessoas para desenvolver suas
atividades e necessidades diárias, tornando-se assim, mais expostos aos agravos de saúde.
O conceito de “doença única”, em que um único problema pode explicar todos os
sinais e sintomas, não se aplica às pessoas idosas, pois, essas costumam apresentar um
conjunto de sinais e sintomas, resultado de várias doenças concomitantes, em que a
insuficiência de um sistema pode levar à insuficiência de outro, comumente denominado de
“efeito cascata”. (BRASIL, 2007). Assim, entende-se que a vulnerabilidade está diretamente
ligada aos idosos e a necessidade maior atenção dos profissionais e serviços da ABS.
Entre as crianças, a vulnerabilidade é associada especialmente à configuração familiar,
por ser este um grupo mais dependente de cuidados, podendo ficar mais exposta a fatores
causadores de doenças.
Para Côa e Petengill (2011), no contexto da família, a vulnerabilidade é caracterizada
pelo desequilíbrio em sua envergadura de funcionamento, em que as experiências vividas
anteriormente pela família e o acúmulo de demandas comprometem a capacidade para lidar
com a situação e o despreparo para agir. Os atributos definidores de vulnerabilidade estão
incluídos ao contexto da doença tendo desestrutura, distanciamento, alteração na vida familiar
e conflitos. Nesse sentido, a estrutura familiar e as fragilidades da família têm implicações
diretas na vulnerabilidade das crianças, as quais são totalmente dependentes dos sujeitos que
compõem o núcleo familiar.
Contudo, a sociedade, a escola, os serviços públicos de saúde, entre outros, são
corresponsáveis dos indivíduos na infância, podendo reduzir e/ou amenizar a vulnerabilidade
nessa fase do ciclo vital. Em parte, isso é evidenciados nos diversos programas, ações e
órgãos dedicados a assistência a criança, mas ainda não garantem a promoção de sua saúde de
forma integral.
A vulnerabilidade na adolescência foi associada à sexualidade, especialmente pela
iniciação precoce da vida sexual, que pode resultar, especialmente em gravidez não planejada.
O enfoque de risco, em particular, na adolescência aparece fortemente associado às seguintes
situações: gravidez não planejada, aborto, risco de contrair o HIV e o risco de uso e abuso de
drogas lícitas e ilícitas.
Ayres (2003) classificou a vulnerabilidade em: individual, social e programática. No
adolescente evidencia-se especialmente a dimensão individual da vulnerabilidade, a qual se
refere às condições de ordem cognitiva, comportamental e social, na qual o conhecimento e a
consciência do problema não garantem uma mudança de atitude, é necessário interesse e
habilidade para transformar o comportamento, aspecto muito comum entre os adolescentes,
que possuem dificuldade de tomar consciência de riscos.
Quanto à população considerada de baixo nível socioeconômico, identificada pelos
sujeitos como a “mais carente”, sua vulnerabilidade foi associada à carência de recursos
financeiros, gerada especialmente pela falta de emprego formal, o que representa instabilidade
financeira e exposição social.
O campo de estudo sobre famílias em vulnerabilidade social tem sido bastante
explorado, no entanto, em decorrência da multidisciplinaridade característica desse campo de
atuação e pesquisa, evidencia-se certa imprecisão conceitual na utilização do termo "famílias
em vulnerabilidade social". Frente aos riscos, o sistema familiar pode responder de forma
ineficaz, não tendo condições de reagir funcionalmente e de estabelecer uma base saudável
para seu desenvolvimento. Fontes de recursos estruturais que compõem a rede de apoio social
e afetivo dessas famílias não conseguem mais ser acionadas de forma funcional e responsiva
(PRATI; COUTO; KOLLER, 2009).
Ainda os profissionais de saúde que participaram do estudo resgataram os indivíduos
portadores de algum tipo adoecimento mental, em destaque entre a população comumente
assistida pelas unidades, bem como, resgataram quando mencionados esses indivíduos o
impacto do sofrimento mental na família.
A saúde mental não é ausência de angústia nem constante conforto, mas a esperança
de metas e objetivos que podem ser elaborados. Está relacionada com o campo das relações e
se transforma de acordo com as necessidades dos diferentes atores envolvidos nesse processo
(GLANZNER, OLSCHOWSKY, KANTORSKI, 2011).
A atenção à saúde mental no Brasil estrutura-se atualmente em um modelo substitutivo
a internação em hospital psiquiátrico, para atender os indivíduos portadores de transtornos
mentais graves. A demanda por serviço é grande e diversificada e apontam que a ABS tem
sido desafiada diante da complexidade de cuidados, baixa qualificação das equipes e
complexas situações de vulnerabilidade social impostas pelas doenças mentais. (CAMPOS et
al, 2011).
Neste sentido, Ayres (2002), considera que a vulnerabilidade aponta situações de
iniquidade e desigualdade social relacionada a indivíduos, grupos e coletividade, bem como a
necessidade de seu enfrentamento.
De forma geral, os grupos mais citados como vulneráveis pelos profissionais de saúde
entrevistados, são grupos já caracteristicamente englobados em políticas públicas, tanto da
área da saúde, quanto na área assistencial. Ainda, corrobora-se com Ballantyne (2007),
quando o mesmo ilustra duas óticas da vulnerabilidade, evidenciadas também nesse estudo: a
vulnerabilidade extrínseca – ocasionada por circunstâncias externas, como falta de poder
socioeconômico, falta de escolaridade ou carência de recursos, possíveis de serem
identificadas, especialmente entre trabalhadores e indivíduos em condições socioeconômicas
desfavoráveis, estes podem ainda estar associados a vulnerabilidade social. Ainda, a
vulnerabilidade intrínseca pode ser associada aos idosos, crianças, adolescentes e indivíduos
em adoecimento mental, em que características dos próprios indivíduos, como doença grave
ou crônica, os extremos de idade e o adoecimento mental tem implicações no processo saúde
e doença, sendo esta agregada à vulnerabilidade individual.
Estratégias/recursos que os profissionais utilizam para assistir os grupos populacionais
considerados vulneráveis, no cotidiano do trabalho a Atenção Básica em Saúde
Com o passar dos anos a busca pela inovação tecnológica aumentou
consideravelmente nas diferentes áreas e especialidades do setor saúde, seja em termos de
disponibilidade de equipamentos ou nas novas técnicas voltadas a assistência. Desta forma, a
inovação tecnológica, caracterizada como mudanças, para ruptura estrutural ou introdução de
melhorias (LORENZETTI, 2012) adentrou dentre outros setores, na Atenção Primária a
Saúde, diversificando o atendimento e promovendo a qualidade no cuidado (BRASIL, 2010).
Portanto, segundo Lorenzetti (2012, p.435) “as novas tecnologias compreendem as
máquinas, os equipamentos, os diversos instrumentos, o modelo de organização das empresas
e de organização do trabalho [...] a relação com o nível social e com as políticas de Estado
vigentes nas diferentes sociedades históricas”.
Ao abordar as tecnologias identificam-se as tecnologias materiais e não-materiais
(PAIM, 2005), sendo que as primeiras referem-se aos produtos e materiais para satisfação das
necessidades e as segundas são associadas aos artefatos não-materiais, incluindo saberes
constituídos para a geração de produtos, processos e relações de trabalho (BARRA et al.,
2006).
Partindo desse referencial teórico, os sujeitos do estudo foram questionados acerca
das estratégias, ferramentas e recursos que utilizam para assistir os grupos populacionais
vulneráveis. As respostas foram identificadas e analisadas enquanto tecnologias materiais e
não-materiais em saúde (PAIM, 2005).
Identificou-se que dentre as tecnologias materiais utilizadas para assistência aos
grupos populacionais vulneráveis, os profissionais de saúde destacaram como recursos
comuns do cotidiano das equipes da ABS: o recurso de imagem por meio dos exames
laboratoriais, especialmente de sangue e urina, os aparelhos clínicos, entre eles as balanças,
estetoscópios, entre outros equipamentos. Ainda, são utilizados como recursos de orientação
de mídia, os folders, banners e impressos em geral, com informações especialmente sobre
doenças e formas de prevenção das mesmas, geralmente fornecidos pelo MS e Secretaria de
Saúde que ilustram as situações de adoecimento e de prevenção dos agravos à saúde.
Dentre as tecnologias não-materiais de uso dos profissionais de saúde, para assistir
indivíduos e populações vulneráveis, destacaram-se: a consulta médica, a comunicação
verbal, atividades em grupo, as visitas domiciliares, o acolhimento e, marcadamente
mencionada a educação em saúde.
Percebeu-se que os profissionais da ABS buscam atividade de promoção da saúde,
contudo permanecem fortemente organizados a partir do modelo biomédico de atenção e
possuem dificuldade de operacionalizar atividades diferencias com foco nas especificidades
de cada grupo populacional.
No âmbito do SUS as estratégias de promoção da saúde são retomadas como
possibilidade de enfocar os aspectos que determinam o processo saúde- adoecimento dos
brasileiros, como por exemplo: violência, desemprego, subemprego, falta de saneamento
básico, habitação inadequada e/ou ausente, dificuldade de acesso à educação, fome,
urbanização desordenada, qualidade do ar e da água ameaçada, deteriorada; e potencializar
formas mais amplas de intervir em saúde (BRASIL, 2008). Desse modo, as ações dos
profissionais devem conferir visibilidade aos fatores que colocam a saúde da população em
risco e às diferenças entre necessidades, territórios e culturas presentes no nosso país e nas
diferenças de cada região/território, visando à criação de mecanismos que reduzam as
situações de vulnerabilidade, consonantes com a equidade, participação e controle sociais na
gestão das políticas públicas (BRASIL, 2008).
Percebeu-se, a escassez e a dificuldade na obtenção de equipamentos entre outras
tecnologias materiais, a carência de habilidades dinâmicas e de verbalização para atuar com
as populações vulneráveis, o que denota fragilidades no processo de formação acadêmica e
permanente dos profissionais de saúde que atuam com indivíduos e grupos em situações de
vulnerabilidade.
Fica evidente que investimentos, em prol da inovação das tecnologias em saúde, para
assistir indivíduos e populações vulneráveis, se mostram cada vez mais necessários. Estes
podem dar maior suporte aos profissionais da saúde na assistência cotidiana aos usuários e
famílias, o que pode conferir maior qualidade à atenção prestada e mais resolutividade a estes
serviços.
Nesse sentido, vale destacar a importância das tecnologias não-materiais no contexto
da ABS e como fomentadoras da Promoção da Saúde, especialmente identificada na prática
do acolhimento e do vínculo.
Acolhimento e vínculo, enquanto tecnologias não-materiais, supõem troca de saberes
(incluindo os dos usuários e familiares), diálogo entre os trabalhadores e trabalho em equipe,
ou seja, requer a produção de uma grupalidade, a qual envolve usuários, trabalhadores,
gestores, familiares, entre outros sujeitos que estabelecem conexão para as construções
coletivas, que suponha mudança pelos encontros entre seus componentes (COELHO,
JORGE, 2009). Estas podem estar fortalecidas pelas visitas domiciliares e atividades em
grupo mencionadas pelos participantes, as quais sinalizam para reorganização do modelo
assistencial da ABS.
Vários estudos (FRANCO, MERHY, 2003; TEXEIRA, 2007; NASCIMENTO,
TESSER, POLI NETO, 2008; SOUZA, VILAR, ROCHA, UCHOA, ROCHA, 2008;
COELHO, JORGE, 2009) enfatizam e identificam o acolhimento como dispositivo
potencializador das práticas inovadoras e como ferramenta de trabalho dos profissionais de
saúde que fortalece e diferencia o cuidado prestado. Este é reconhecido como promotor da
integralidade, qualifica as atividades de educação em saúde, aumentando a adesão terapêutica
e a inclusão social. Contudo, exigem uma mudança global das práticas, não pode ser
realizado na sala de “triagem”, deve fazer parte de todo o processo de trabalho e instrumento
de trabalho de todos os profissionais que compõem a equipe de saúde.
O acolhimento requer um projeto permanentemente estimulado como estratégia de
gestão, por meio da educação permanente, melhoria nas condições de trabalho, adequação
dos equipamentos de saúde, debate e apoio dos conselhos locais e municipais, ou seja, exige
ação reflexiva, abertura, postura ética e solidária, bem como abertura para o diálogo e para a
escuta, o que define uma reorientação na produção dos cuidados contribuindo para
construção e consolidação dos princípios do SUS.
Contudo, frequentemente, a AB se orienta pelo modelo biomédico, orientada pelos
modos de atenção baseados apenas na relação queixa-conduta. Pesquisadores (COELHO,
JORGE, 2009) lembram que esse modo de assistir torna o atendimento automático, leva ao
distanciamento entre trabalhadores e usuários e fortalecendo a valorização somente na
doença, o que fragiliza o estabelecimento do vínculo com acolhimento, tão fundamental e
que permite, efetivamente, a responsabilidade pelas nossas ações de saúde.
Um estudo recente, em diferentes modelos assistencias presentes na ABS, revela que
a incorporação das inovações tecnológicas implica em mudanças estruturais e que o processo
de inovação não substitui de pronto o antigo modo de fazer. Contudo, a adoção da inovação
racionaliza os processos e diminuiu o desgaste dos profissionais de saúde na ABS, bem como
traz benefícios para os usuários (TRINDADE; PIRES, 2013).
Compreende-se que a escassez de recursos, tanto materiais quanto não-materiais para
prática profissional, interfere também no trabalho das equipes da AB, desfavorece o melhor
preparo para lidar com as questões sociais e subjetivas presentes nas práticas da ABS,
especialmente, naquelas UBS que assistem populações mais vulneráveis, em que se
necessitam mais do que comumente os serviços podem oferecer para dar conta das amplas,
complexas e crescentes necessidades de saúde desses indivíduos e grupos populacionais.
O processo de formação como orientador da prática profissional
Dentre os profissionais de saúde entrevistados, 60% do grupo afirma ter sido
trabalhado em sua formação a temática da vulnerabilidade. Entretanto, outros 33% afirmam
não ter sido abordada a vulnerabilidade ao longo de seu processo formativo.
Segundo a Política Nacional de Promoção a Saúde, nas últimas décadas, tornou-se
mais importante cuidar da vida de modo que se reduzisse a vulnerabilidade ao adoecer e as
chances de que ele seja produtor de incapacidade, de sofrimento crônico e de morte prematura
de indivíduos e grupos sociais.
Na base do processo de criação do SUS encontram-se: o conceito ampliado de saúde, a
necessidade de criar políticas públicas para promovê-la, o imperativo da participação social na
construção do sistema e das políticas de saúde e a impossibilidade do setor sanitário responder
sozinho à transformação dos determinantes e condicionantes para garantir opções saudáveis
para a população. Nesse sentido, o SUS, como política do Estado brasileiro pela melhoria da
qualidade de vida e pela afirmação do direito à vida e à saúde, dialoga com as reflexões e os
movimentos no âmbito da promoção da saúde e deve ser o orientador da formação dos
profissionais de saúde.
Identificou-se que aqueles profissionais que trabalharam a vulnerabilidade em sua
formação tiveram o tema abordado de majoritariamente de forma teórica.
Compreende-se que o enfoque sob o qual a vulnerabilidade deve ser trabalhada na
formação dos profissionais deve envolver a discussão sobre prevenção de doenças e
promoção da saúde, com base na realidade dos sujeitos e com a aproximação dos profissionais
desses indivíduos, em seu contexto socioeconômico e cultural.
Dentro deste contexto, os processos de saúde e doença são a síntese do conjunto de
determinações que acabam por resultar em vulnerabilidades ou potencialidades diferenciadas.
O conceito de vulnerabilidade que lhe é associado trabalha com a ideia de que fatores
interdependentes e interatuantes estão mesclados e ativos em cada indivíduo, ou grupo de
indivíduos o tempo todo, não sendo possível separá-los (GUERRIERO, 2001).
A associação entre as concepções de vulnerabilidades sociais e necessidades de saúde,
no sentido coletivo é socialmente determinado e modulado, por condicionantes de ordem
biológica, psicológica, cultural, econômica e politica considerando a saúde e a doença,
fenômenos complexos vinculados às formas de inserção dos grupos sociais no mundo do
trabalho, não sendo restringida a susceptibilidades individuais referentes ao plano coletivo nas
praticas de saúde, caracterizadas pela necessidade de estratégias passiveis de saúde
(NAKAMURA et al, 2009).
Uma pequena parcela dos entrevistados (13%) refere que em sua formação o enfoque
predominante na área hospitalar, tendo sida a temática da vulnerabilidade associada
exclusivamente a ABS. Com isso, observa-se a associação da vulnerabilidade à ABS
revelando a fragilidade da compreensão da temática pelos profissionais.
Quando indagados sobre a qualidade na sua formação profissional, foi registrada
maior parcela de profissionais de saúde que demonstra uma percepção positiva sobre as
contribuições da formação para melhor assistência aos grupos vulneráveis. Contudo, os
sujeitos entram em convergência quanto as limitações da formação frente a realidade
apresentada no cotidiano do trabalho das equipes, sendo a vivência profissional a melhor
orientadora da prática.
A literatura registra que para que ocorra a qualificação dos profissionais de saúde do
SUS, faz-se necessário ainda a educação permanente. A viabilização de uma Política de
Educação Permanente se torna essencial, fazendo-se necessário criar compromissos entre o
Setor Saúde e o Setor Educação. O desenrolar dessa Política se dá, primeiramente, com o
entendimento de que os profissionais de saúde que já estão trabalhando não são os únicos
envolvidos. É relevante que haja uma articulação entre o Ministério da Educação e Cultura
(MEC), instituições de ensino superior e escolas técnicas, promovendo a integração entre
pesquisadores, professores e estudantes e abrindo caminhos para a formação de novos
profissionais de saúde (BATISTA; GONÇALVES, 2011).
A escolha de novos padrões e táticas de capacitação relacionadas ao contexto de
trabalho pode servir para diminuir o vazio na formação de profissionais frente ao
enfrentamento de situações complexas no cotidiano dos serviços de saúde, levando em conta a
distribuição dos espaços e relações existentes entre a variedade de profissionais e usuários
(FEUERWERKER, 2000).
A maioria dos entrevistados demonstrou uma percepção positiva quando questionados
sobre a qualidade de sua formação profissional para assistir os grupos populacionais
vulneráveis, porém apesar dos avanços na formação na área de saúde, há necessidade de
maiores subsídios em estratégias de ensino e prática que promovam o cuidado integral e
humanizado, orientado pela epidemiologia e pelos princípios norteadores do SUS.
Aproximar o meio acadêmico da comunidade pode ser uma das formas de
identificação dos sujeitos em situação vulnerável, além da avaliação das necessidades sociais
e das formas de orientação, atuação e melhoramento da visão futura como profissional.
Neste contexto, também como um modo de aperfeiçoamento das equipes, mostram-se
como ferramentas as capacitações destinadas aos profissionais de saúde, que visam aprimorar
e elevar o grau de conhecimento dos mesmos, qualificando a assistência prestada à população.
Nesse sentido, entre as estratégias que qualificariam a assistência os profissionais
mencionaram marcadamente a educação permanente e continuada em saúde. Entretanto,
muitos profissionais encontram dificuldades em participar de capacitações que ocorrem além
do âmbito do local de serviço, pelo fato de não haver profissionais que supervisionem e
assumam as atividades, ou seja, a falta de recursos humanos em número adequado, acaba se
sendo um empecilho para que o trabalhador, pois o impossibilita muitas vezes a participar das
atividades educativas.
Ressalta-se que é fundamental que as atividades de qualificação dos profissionais
devem ocorrer periodicamente, por meio de métodos de reflexão e participação ativa, gerando
maior qualificação, motivação, bem como expectativa para contribuir com tomada de decisões
e nos resultados da unidade; e deste modo fazer o uso de todas as habilidades e potencial dos
profissionais da equipe (FERREIRA; KURCGANT, 2009).
Para tanto, se faz essencial identificar as necessidades desse profissional, para saber
qual o tema, metodologia e objetivo, entre outros aspectos, devem orientar a capacitação, com
foco neste último e adequado ao perfil dos profissionais e condizentes com as necessidades
dos usuários dos serviços.
Ainda, na perspectiva de qualificar a assistência aos grupos populacionais vulneráveis
os profissionais sugeriram uma diversidade de recursos e estratégias que poderiam ser
implantadas nos cenários investigados, os quais são ilustrados na Figura I.
FIGURA I: Ações /recursos para qualificar a assistência mencionados pelos sujeitos
Fonte: Os autores, 2013.
Quando questionados sobre as ações e/ou recursos que podem qualificar a assistência
aos grupos populacionais considerados vulneráveis, a educação continuada e permanente,
através de capacitações e oficinas para a equipe foram as ações mais citadas pelos
profissionais, seguida da quantidade suficiente de profissionais, materiais e recursos
suficientes para o trabalho e ampliação da equipe, com ações multiprofissionais.
Além desses recursos apareceram: reconhecimento do ser humano/do trabalhador,
valorização do profissional, equiparação salarial, permanência/cobertura do profissional na
Unidade, resgate de valores, melhorais nas condições de trabalho e na estrutura física,
implantação de protocolos, melhor relação entre Secretaria de Educação e Saúde, entre outros.
As transformações que se tem observado a todo instante, decorrentes do fenômeno da
globalização, requerem dos profissionais constante atualização, desenvolvimento de
habilidades crítico-reflexivas e uso de tecnologias adequadas a realidade, em prol de
mudanças na prática dos serviços de saúde e melhoria na qualidade do cuidado prestado. É
neste contexto que a educação continuada e permanente, vem a auxiliar a compreensão dos
processos sociais, do mundo no qual o indivíduo está inserido (GUIMARÃES; MARTIM;
RABELO, 2010) e qualificar para linhas de cuidado voltadas a grupos populacionais
específicos, incluindo as populações vulneráveis.
Pinto e Teixeira (2011) trazem também os recursos humanos como importantes no
processo de mudança da gestão e atenção à saúde. A escassez no quadro de profissionais
tende a acarretar na precarização das relações de trabalho e falta de compromisso por parte
dos profissionais da saúde, repercutindo na assistência dispendida aos diferentes grupos e no
processo de consolidação do Sistema.
Da mesma forma, das “novas possibilidades de organização dos processos de trabalho,
emergem novas formas de relação entre os trabalhadores, inclusive a necessidade de se
trabalhar numa perspectiva interdisciplinar” (GUIMARÃES; JORGE; ASSIS, 2011, p. 2146).
O trabalho em saúde é ou deveria ser um trabalho coletivo, pois acontece através da atuação
de diversos profissionais da saúde e trabalhadores capacitados, permitindo por meio da
execução das diversas atividades a manutenção da estrutura institucional (LEOPARDI et al,
1999).
Os profissionais julgam que as ações são viáveis, muitas de baixo custo e poderiam
melhorar a qualidade da assistência, bem como trazer maior satisfação profissional.
Ressalta-se que a vulnerabilidade está associada a fatores diversos e complexos,
contudo as questões sociais, políticas e gerenciais emergem como decisivas, especialmente no
campo de seu enfrentamento.
Nesse sentido, o reconhecimento da vulnerabilidade na perspectiva dos profissionais,
estratégias e recursos de enfrentamento da mesma, bem como aspectos da formação dos
atores que “fazem” o SUS emergem como primordiais para melhor compreensão da temática
e de como manejá-la, especialmente no contexto da ABS. Enquanto objeto desse estudo, a
vulnerabilidade mostrou-se complexa e latente no contexto da pesquisa, que apesar das
limitações, indicia aspectos relevantes acerca dos grupos populacionais vulneráveis e de como
a rede básica de saúde tem acolhido suas necessidades e singularidades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os achados do estudo reforçam a importância fortalecer o diálogo entre as instituições
inseridas no cotidiano dos grupos intrinsecamente e extrinsecamente vulneráveis, para que
seja possível ampliar a consciência acerca da vulnerabilidade, bem como fortalecimento da
intersetorialidade e trabalho em equipe na atenção a estes indivíduos e grupos sociais.
Analisa-se que a associação do conceito de vulnerabilidade está diretamente ligada com as
situações de risco dos planos individual e social. A vulnerabilidade programática também está
identificada como agravante das fragilidades do cuidado/assistência relacionando com a falta
de políticas públicas eficientes, o que retoma a importância da sensibilização dos profissionais
de saúde e sociedade sobre as diferentes vulnerabilidades, numa perspectiva de prevenção de
agravos e promoção do bem-estar desses grupos populacionais.
Observou-se a falta ou dificuldades na obtenção de materiais e/ou equipamentos e a
carência de habilidades dinâmicas e de verbalização para atuar com as populações
vulneráveis, desta forma, percebe-se que investimentos nas tecnologias em saúde se mostram
cada vez mais necessários, as quais podem dar maior suporte na assistência cotidiana dos
profissionais aos usuários e famílias, o que pode conferir maior qualidade à atenção prestada
aos os grupos populacionais vulneráveis e maior resolutividade aos serviços da ABS.
Assim, as diferentes concepções de acesso, acolhimento e vínculo no processo de
construção da saúde para os trabalhadores e usuários podem proporcionar o estabelecimento
de estratégias com vistas a aprimorar as ações de saúde na ABS, para fazer valer os princípios
do SUS. Para tanto, faz-se necessário a implementação do espaço físico, do ponto de vista da
ambiência, na perspectiva de promover um ambiente acolhedor. Sugere-se ainda a
qualificação dos trabalhadores com foco na humanização da assistência, promovendo o
acolhimento e o uso das tecnologias das relações, para o fortalecimento da satisfação dos
trabalhadores da saúde e redução da vulnerabilidade dos indivíduos e grupos sociais.
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