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A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: A METODOLOGIA APAC COMO

PROPOSTA DE HUMANIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DE PENA

FROES, Bárbara AnicetoSENA, Haissa Nogueira

VELOSO, Cynara Silde Mesquita

Resumo: A presente pesquisa estuda o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro, com enfoque específico para o método de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) na execução da pena privativa de liberdade. A questão norteadora desta pesquisa é: a metodologia APAC, no contexto do atual sistema prisional brasileiro, apresenta resultados satisfatórios na efetivação dos direitos fundamentais do preso? Parte-se da hipótese de que a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais assegurados pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e pela Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal) são basilares para a aplicação do método APAC na recuperação do apenado e em sua reinserção no convívio social. A metodologia apaqueana contribui para a humanização da vida carcerária na medida em que busca resgatar a dignidade do preso, por meio de estratégias, como a participação da comunidade, a preservação dos elos afetivos, a assunção de responsabilidades por parte do condenado, a necessidade de ter uma orientação de cunho espiritual, entre outros princípios. Em termos metodológicos, trata-se de um estudo exploratório realizado através de pesquisa bibliográfica e documental, com o propósito de ampliar a compreensão da temática abordada e facilitar posicionamentos frente às diversas vertentes teóricas. Esta pesquisa apontou que, embora no método APAC a recuperação e ressocialização não ocorram em sua totalidade, o índice de reincidência nesse modelo é bem menor em relação ao sistema comum, fato que o coloca como uma alternativa viável, mais eficiente e menos onerosa para melhoria do desgastado sistema prisional brasileiro.

Palavras-chave: Direito Penal. Dignidade da Pessoa Humana. APAC.

Abstract: This research studies the principle of human dignity and fundamental rights in the Brazilian prison system, with a specific focus for the Protection Association method and Assistance to Convicts (APAC) in the execution of the sentence of imprisonment. The main question of this research is: APAC methodology in the context of the current Brazilian prison system shows satisfactory results in the realization of the fundamental rights of the prisoner? It started from the hypothesis that the human dignity and fundamental rights guaranteed by the Constitution of the Federative Republic of Brazil in 1988 and by Law n. 7210 of 11 July 1984 (Law of Penal Execution) are fundamental to the implementation of the APAC method in the recovery of the convict and their reintegration into social life. The apaqueana methodology contributes to the humanization of prison life as to rescue the dignity of the prisoner, through strategies such as community participation, preservation of affective links, the assumption of responsibility by the convict, the need for have an orientation of spiritual nature, among other principles. In methodological terms, this is an exploratory study through bibliographical and documentary research, in order to broaden the understanding of the selected theme and facilitate positioning across the various

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theoretical perspectives. This research pointed out that although the APAC method recovery and rehabilitation do not occur at all, the recurrence rate in this model is much smaller in relation to the common system, a fact that makes it a viable alternative, more efficient and less costly for improvement the worn Brazilian prison system.

Keywords: Criminal Law. Dignity of human person. APAC.

INTRODUÇÃO

A Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC), entidade jurídica, criada em 1974 por um grupo de cristãos liderado pelo advogado Dr. Mario Ottoboni, é um órgão parceiro da justiça na execução penal, que dispõe de “um método de valorização humana, portanto, de evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar-se e com o propósito de proteger a sociedade, socorrer as vítimas e promover a justiça” (OTTOBONI, 2006, p. 29).

A metodologia APAC, em virtude dos resultados positivos observados após sua implantação, passou a ser adotada em diversos países do mundo, como Alemanha, Cingapura, Chile, Costa Rica, Equador, México, Noruega, Nova Zelândia, entre outros (GUIMARÃES JUNIOR, 2005).

Um dos princípios que norteia as políticas públicas voltadas para a segurança, e nesse caso específico a metodologia APAC, é a dignidade da pessoa humana. Acerca desse princípio constitucional são feitas as seguintes considerações:

Qualidade intrínseca e distintiva reconhecida a cada ser humano que o faz merecedor do respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando nesse sentido um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida (SARLETE, 2001, p.60).

As APAC’s também se organizam a partir do respeito aos direitos fundamentais, entendidos como “direitos relacionados às pessoas, inscritos em textos normativos de cada Estado. São direitos que vigoram numa determinada ordem jurídica, sendo, por isso, garantidos e limitados no espaço e no tempo” (PAULO; ALEXANDRINO, 2013, p.99-100).

Partindo dessas considerações prévias, este estudo tem como objetivo estudar o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro, com enfoque específico para o método de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) na execução da pena privativa de liberdade.

METODOLOGIA

O método de abordagem adotado no presente estudo é o método dedutivo, uma vez que se parte

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da análise de alguns dos fundamentos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e dos direitos fundamentais constantes na Lei 7.210 de 1984 (Lei de Execução Penal) na aplicabilidade do método APAC. Como método de procedimento utilizado, optou-se pelo comparativo, uma vez que se busca contrapor o sistema prisional tradicional e o método APAC, tendo como norteadores os princípios da dignidade da pessoa humana e o princípio da igualdade. Realizou-se um estudo exploratório por meio de pesquisas bibliográfica e documental relativas ao método APAC, consultas à legislação vigente, entre outras obras doutrinárias e legislativas.

REVISÃO DA LITERATURA

O sistema prisional brasileiro submete o condenado e o internado a uma sanção que ultrapassa os limites impostos pela sentença condenatória. Os termos da condenação, ou seja, a pena privativa de liberdade, devem limitar-se tão somente a liberdade de locomoção, permanecendo intactos tantos outros direitos. A inobservância desses direitos significaria a imposição de uma pena adicional não prevista em lei.

A forma como as sanções penais vêm sendo executadas transformaram as prisões em máquinas de deteriorar. O preso é ferido em sua dignidade pelas condições deficientes de quase todas as prisões: lotação incompatível com sua capacidade, alimentação insuficiente, falta de higiene e assistência sanitária, falta de estrutura para as atividades de trabalho, educação e lazer, entre outras.

A Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984, (Lei de Execução Penal) é considerada um dos mais adequados instrumentos legislativos mundiais, no que se refere à preservação dos direitos individuais do apenado. No entanto, sabe-se que o investimento nas unidades prisionais não corresponde a realidade do sistema prisional brasileiro, o que torna deficiente a eficácia dos dispositivos legais. Nesse sentido, é possível observar que

[...] Na maior parte dos sistemas penitenciários podem ser encontradas as seguintes deficiências: 1º Falta de orçamento. Infelizmente, nos orçamentos públicos, o financiamento do sistema penitenciário não é considerado necessidade prioritária, salvo quando acabam de ocorrer graves motins carcerários. 2ª) Pessoal técnico despreparado. Em muitos países a situação se agrava porque o pessoal não tem garantia de emprego ou não tem uma carreira organizada, predominando a improvisação e o empirismo. Nessas condições é impossível desenvolver um bom relacionamento com os internos. 3ª) Nas prisões predomina a ociosidade e não há um programa de tratamento que permita pensar na possibilidade de o interno ser efetivamente ressocializado (BITENCOURT, 2011, p. 230).

Nos argumentos apresentados acima, notam-se as deficiências do sistema penitenciário brasileiro, sobretudo no que tange ao investimento financeiro, à formação insuficiente dos profissionais vinculados ao sistema e a ausência de programas que permitam a efetiva ressocialização do preso.

No tocante à efetivação do processo de ressocialização preconizado pela Lei de Execução penal (LEP), são oportunas as seguintes considerações:

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Não há investimentos no Brasil para a reabilitação de prisioneiros. O prognóstico que se pode ter, no início das sentenças privativas de liberdade, é o do aprofundamento dos compromissos infracionais e o desenvolvimento de comportamentos antissociais. A ideia da ressocialização que inspirou a Lei de Execução Penal (LEP) nunca se transformou em política pública, de modo que boas práticas de trabalho prisional são, na experiência brasileira, exceções periféricas dependentes, na maioria das vezes, de esforços extraordinários e da determinação de algumas poucas pessoas (ROLIM, 2006, p. 214).

Os argumentos de Rolim (2006) são corroborados a seguir, na medida em que se demostra que a prisão, além de ser um espaço deteriorante, submerge o condenado a uma “subcultura” carcerária, como se expõe a seguir:

Esta “imersão cultural” não pode ser interpretada como uma tentativa de reeducação ou algo parecido ou sequer aproxima-se do postulado da “ideologia do tratamento”; suas formas de realização são totalmente opostas a este discurso, cujo caráter escamoteador é percebido até pelos menos avisados (ZAFFARONI, 1999, p. 136).

Critica-se o distanciamento entre o que preconiza a lei e o que efetivamente se pratica no âmbito do sistema carcerário brasileiro. A esse respeito, a própria Lei de Execução Penal (LEP), em sua exposição de motivos, assinala que:

é comum, no cumprimento das penas privativas de liberdade, a privação ou limitação de direitos inerentes ao patrimônio jurídico do homem e não alcançados pela sentença condenatória. Essa hipertrofia da punição não só viola a medida de proporcionalidade como se transforma em poderoso fator de reincidência, pela formação de focos criminógenos que propicia (BRASIL, 1984).

Não se deve esquecer que a relação jurídica de sujeição especial criada pela sentença transitada em julgado não retira do condenado sua condição de sujeito de direitos, atribuindo à administração penitenciária o dever de zelar pela pessoa humana do preso, seus direitos e interesses jurídicos não prejudicados pela condenação. Nesse âmbito, o condenado conserva todos os direitos reconhecidos aos cidadãos pelas normas jurídicas vigentes, ressalvados, obviamente, aqueles cuja privação ou limitação constituem o conteúdo da pena imposta.

É importante salientar que “a humanização da execução inicia-se pela regra da não-privação dos direitos do preso que não forem atingidos pela decisão judicial ou pela lei e deriva diretamente do sistema jurídico institucional dos países civilizados (MIRABETE, 2000, p. 38).

O art. 38 do Código Penal e o art. 3º da Lei de Execução Penal, que asseguram aos condenados e aos internados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei, são corolários da Constituição Federal. Esta determina, em seu art. 5º, incisos III e XLIX, que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante, bem como ser assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.

Levando em conta que a luta contra os efeitos nocivos da prisionalização é inútil sem que se estabeleçam as garantias jurídicas dos direitos dos condenados, a LEP define, no art. 41, os direitos

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do preso: I – alimentação suficiente e vestuário; II – atribuição de trabalho e sua remuneração; III – previdência social; IV – constituição de pecúlio; V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado; X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI – chamamento nominal; XII – igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV – representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes; XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente (BRASIL, 1984).

Além dos direitos mencionados expressamente na LEP, são assegurados aos presos e internados aqueles direitos implícitos e decorrentes do regime e dos princípios que a Constituição Federal de 1988 adota, bem como dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte.

Apesar desse aparato legal, os direitos da população carcerária brasileira ainda não são plenamente atendidos. Em relatório de inspeção elaborado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, realizado em 25 e 26 de abril de 2013, em quatro estabelecimentos prisionais da região metropolitana de Belo horizonte, ficou demonstrado, pelo seu resultado, a dissociação entre o previsto na norma e o efetivamente encontrado nos estabelecimentos prisionais. (ARAGÃO et al., 2015).

O relatório avaliou critérios quanto ao estabelecimento penal, como administração; características do estabelecimento, das pessoas presas, das pessoas presas em cumprimento de medida de segurança; características dos funcionários em exercício no estabelecimento; condições materiais; alimentação; rotina padrão; assistência à saúde, jurídica, laboral, educacional, desportiva, cultural e de lazer, religiosa e social; segurança disciplina e ocorrências; visitas; relatos de pessoas presas ou de funcionários; inspeções; questões diversas e avaliações sobre os itens inspecionados (ARAGÃO et al., 2015).

Entre os critérios avaliados, destaca-se o resultado no que se refere às reclamações das pessoas presas e às inspeções, em especial as realizadas pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos ou Comitê Estadual de Combate à Tortura, bem como a Comissão de Direitos Humanos da OAB. Dos quatro estabelecimentos submetidos às inspeções, em nenhum se verificou inspeção realizada por algum desses órgãos.

As reclamações citadas no relatório foram sobre instalações, assistência jurídica, à saúde, educacional, social, esportivas, lazer, visita, maus-tratos e irregularidade no banho de sol. O Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto foi o único a apresentar reclamações apenas quanto à assistência jurídica e à saúde. Nos outros estabelecimentos penais, houve reclamação quanto a todos os quesitos.

Sob a perspectiva de dar efetivo cumprimento ao disposto na LEP, especialmente quanto ao respeito aos direitos fundamentais do preso e à priorização da função ressocializadora da pena, criou-se o método APAC, o qual apresenta características que o diferenciam substancialmente do sistema

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carcerário comum. A APAC é uma prisão gerida pelos próprios recuperandos, não existem policiais e tampouco

armas. Os próprios presos possuem as chaves das celas e da prisão. A segurança e a disciplina do presídio são asseguradas com a colaboração dos recuperandos, tendo como suporte funcionários, voluntários e diretores da entidade. Nesse modelo, o índice de reincidência é de apenas 15% aproximadamente, enquanto no sistema comum gira em torno de 70%. Além disso, todos têm acesso à assistência médica e odontológica. Por esses aspectos apontados, percebe-se uma notável diferença quando se compara as APACS ao sistema carcerário comum adotado no Brasil (SOARES, 2011).

A APAC é um método de recuperação de presos que propõe matar o criminoso e salvar o homem. A valorização humana é base do método APAC, por isso objetiva “colocar em primeiro lugar o ser humano, e nesse sentido todo o trabalho deve ser voltado para reformular a auto-imagem do homem que errou” (OTTOBONI, 2006, p. 29).

O objetivo da Apac é promover a humanização das prisões, sem que se desconsiderada a finalidade punitiva da pena. Busca evitar a reincidência e oferecer alternativas para o condenado se recuperar (TJMG, 2011).

No método APAC, o indivíduo é convidado a experimentar um processo de transformação baseado no resgate de vínculos familiares e reinserção no mercado de trabalho, propiciando, assim a (re) construção de um projeto de vida (MIRANDA, 2015).

No contexto da APAC, o vínculo estabelecido entre o recuperando e os voluntários/membros adquire uma importância crucial para a efetivação da proposta de recuperação do sujeito. O condenado é acolhido como se encontra naquele momento, independentemente do crime cometido, sendo-lhe assegurado e valorizado seu potencial de mudança e de novas perspectivas para o futuro (MIRANDA, 2015).

Segundo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o método APAC possui 12 elementos que são considerados fundamentais. São eles: 1) Participação da comunidade; 2) recuperando ajudando o recuperando; 3) o trabalho; 4) a religião; 5) a assistência jurídica; 6) assistência à saúde; 7) valorização humana; 8) a família; 9) o voluntário e sua formação; 10) o centro de reintegração social – CRS; 11) mérito; e 12) a jornada de libertação com Cristo (TJMG, 2011).

Ao comparar os modelos de APAC adotados no Brasil e na França, Soares (2011) destaca o fato de a experiência francesa não adotar os fundamentos relacionados à religião. Nesse caso, salienta-se o respeito aos direitos fundamentais do preso, inclusive não os forçando a rezar e seguir um determinado credo religioso. O que garante um baixo nível de reincidência na APAC francesa talvez seja o tratamento humanizado, a garantia do respeito aos direitos humanos, que é responsabilidade do Estado (SOARES, 2011).

É importante salientar que, embora o método APAC apresente alguns avanços quando comparado ao modelo carcerário comum, também demonstra limitações (MIRANDA, 2015). Nesse sentido,

A ressocialização tentada pela APAC jamais ocorreu da forma como se pretendia. Sem dúvida, os presos preferiam estar na APAC e consideravam que ali era um local propício para abandonar a “vida do crime”. Mas como esse abandono implicava na transformação de forças macrossociais que estavam fora de um raio de ação da entidade, não havia condições para que ele de fato se

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desse (MASSOLA, 2005, p. 380).

O modelo APAC, quando comparado ao sistema penitenciário comum, apresenta resultados satisfatórios. A metodologia é voltada para a garantia dos direitos do preso, ao passo que as demais prisões brasileiras “são insalubres, corrompidas, superlotadas, esquecidas. A maioria de seus habitantes não exerce o direito de defesa. Milhares de condenados cumprem pena em locais impróprios” (CARVALHO, 2002, p. 10).

Para Foucault (1987), a prisão representa um fracasso do sistema de execução penal. Teoricamente, o cárcere se insere nas sociedades contemporâneas como a forma mais acentuada de castigo do indivíduo que não respeita as leis e normas vigentes. Assim, justifica-se sua privação de liberdade como meio de recuperá-lo e, posteriormente, reintegrá-lo socialmente. Na prática, o que se observa são homens e mulheres submetidos a sofrimentos físicos e psíquicos decorrentes das condições degradantes que o ambiente prisional e o isolamento social lhes proporcionam.

Assim, verifica-se que o método APAC ilustra a importância da humanização da execução penal como forma de efetivar o princípio da dignidade da pessoa humana e recuperar o apenado para reinseri-lo ao convívio social, reduzindo as possibilidades de reincidência criminal e, consequentemente, melhorando as estatísticas relativas à segurança pública.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio desta discussão proposta, foi possível verificar que, em resposta ao questionamento proposto para esta investigação, a metodologia APAC apresenta resultados satisfatórios na efetivação dos direitos fundamentais do preso.

Por ser um método baseado na valorização do homem e respeito aos direitos humanos, todo o trabalho desenvolvido é baseado em estratégias para devolver a integridade e a dignidade do indivíduo em processo de recuperação. Parte-se do princípio de que a pena atribuída ao condenado limita-se à privação da liberdade, devendo, portanto, serem assegurados os outros direitos fundamentais.

O método APAC representa um avanço no âmbito do respeito aos direitos do condenado previstos na Lei de Execução Penal, principalmente no que tange à assistência social, jurídica e à saúde. É importante, salientar, porém, que a metodologia APAC apresenta limitações no que se refere à recuperação e ressocialização, as quais não ocorrem em sua totalidade, embora o índice de reincidência nesse modelo seja bem menor em relação ao sistema comum.

Considerando os resultados positivos obtidos com a aplicação do método APAC no Brasil e em muitos países do exterior, tornam-se oportunos novos estudos que possam contribuir para ampliar conhecimento sobre sua metodologia e as possibilidades de sua aplicação na recuperação de apenados, tornando o sistema carcerário menos oneroso e mais efetivo quanto à sua finalidade de promover a ressocialização e recuperação dos indivíduos que cumprem penas nas unidades prisionais brasileiras.

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