A leitura sem prazer. O espetacular avanço tecnológico que envolve a sociedade contemporânea...

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A leitura sem prazer

O espetacular avanço tecnológico que envolve a sociedade contemporânea ainda não foi capaz de substituir a importância da leitura no desenvolvimento cultural e existencial do ser humano.

Por maior que seja o arsenal de recursos audiovisuais à nossa disposição, o secular hábito de ler continua sendo fundamental para a multiplicação do conhecimento, o enriquecimento do vocabulário e a interpretação da vida e do mundo.

Televisão, cinema, rádio, computador e internet, assim como os demais meios de comunicação, são hoje fontes de consulta indispensáveis,

mas fornecem conteúdos rápidos, fragmentado e, com freqüência, sem qualquer contextualização. Nesse ambiente, os livros seguem insubstituíveis como provedores de informação completa e confiável.

Conscientes desse fato, os educadores lutam para desenvolver o gosto pela leitura entre os jovens. A tarefa, porém, tem se revelado inglória: a gurizada quer distância cada vez maior dos livros.

Existem exceções, é claro, mas apenas para confirmar a regra que leva o adolescente a considerar a leitura coisa chata, enfadonha e desnecessária.

A rejeição, obviamente, tem múltiplas causas, mas não tenho dúvida de que, apesar da boa vontade em ajudar, boa dose de culpa é da escola, dos professores e das sumidades que, em plano superior, determinam o que deve ser lido pelos estudantes.

O primeiro erro está na exclusão da leitura da rotina escolar. Sabendo que os alunos não gostam de ler e para não entrar na rota de colisão com eles, os docentes optam pelo cômodo caminho do ensino por meio das apostilas que preparam.

Preferem dar a matéria mastigada em vez de traçar linhas gerais e incentivar a turma a ampliar o conhecimento na biblioteca.

Ao longo do ano, a atividade de leitura fica restrita às disciplinas de língua portuguesa e literatura, quando um segundo erro é cometido.

Como é difícil convencer o jovem da necessidade de ler, o mestre substitui a tática do convencimento por mecanismos de pressão.

O mais comum é anunciar que a tarefa vale nota e que perderá pontos quem deixar de cumpri-la. No caso do Ensino Médio, outro argumento recorrente é a advertência de que o conteúdo do livro será matéria do vestibular.

Ora, nem adulto “devorador” de livros gosta de leituras impostas.

As pessoas querem ter o direito de ler o que lhes interessa ou é agradável.

Claro que indivíduos maduros compreendem melhor a presença de textos de abordagem compulsória no currículo de seus cursos.

Juntos aos jovens, no entanto, a imposição não dá certo. Poucos são os que, mesmo contrariados, procuram ler a obra indicada com a devida atenção.

A maioria o faz de má vontade, de forma dispersiva, para captar o mínimo de conteúdos necessário para garantir nota.

Pouco, quase nada, é efetivamente assimilado. Isso quando a leitura acontece, pois é grande o número de alunos que, espertamente, apela para resumos prontos, disponíveis aos lotes na internet.

Além do escasso manuseio de livros no dia-a-dia escolar e das tarefas impostas, um terceiro ponto é decisivo para afugentar as novas gerações da literatura: o tipo de leitura determinado pelos acadêmicos e autoridades que definem os currículos escolares.

Exigir que meninos e meninas do século 21, cercados por variados e atraentes apelos de lazer, entretenimentos e informações, passem horas lendo clássicos de linguagem difícil e enfadonho é um erro que só faz aumentar o abismo que separa a garotada do hábito de ler.

O aluno só deveria ser apresentado à obra de Machado de Assis, Graciliano Ramos, Eça de Queiroz, José de Alencar e outros grandes mestres da literatura brasileira depois de passar por autores mais atuais.

Existem outros livros e autores bons e agradáveis que podem servir de porta de entrada para o mundo dos clássicos.

Se passar primeiro por uma leitura mais prazerosa, o jovem tem muito mais chances de pegar gosto pela leitura e, assim, poder tirar real proveito da herança dos grandes mestres.

Para aproximar a juventude das letras, clássicos não pode ser ponto de partida. Precisa ser a linha de chegada.

Antonio Carlo Macedo Jornalista- Radio Gaucha