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A REPERCUSSÃO DA SÍNDROME DE BURNOUT NAS RELAÇÕES DE
TRABALHO CONTEMPORÂNEAS
Diogo Oliveira Muniz Caldas
Luciana Ferreira Fonseca Janolio
Universidade Veiga de Almeida
lucijanolio97@gmail.com
INTRODUÇÃO
Desde o surgimento das primeiras civilizações o trabalho é um fenômeno social
através do qual o homem vive para garantir a sua subsistência. Ao longo das décadas a
população humana se desenvolveu de acordo com as necessidades de cada época,
aprimorando as técnicas de produção com o consequente aumento da capacidade
produtiva e promovendo o estreitamento das relações entre diferentes grupos sociais.
Com o surgimento da figura do patrão e do funcionário, identificados com o
período de transição do homem do campo para as cidades com o aparecimento das
indústrias, também se desenvolveram as práticas comerciais e consequentes relações
hierárquicas de trabalho. Essa mudança de cenário foi marcada pela inexistência de
direitos protetivos dos trabalhadores, que passaram a demonstrar sua insatisfação com as
condições de trabalho às quais eram submetidos.
Nesse sentido, começaram a surgir diversos movimentos sociais que pleiteavam
condições de trabalho mais dignas e direitos a serem respeitados, o que culminou no
surgimento de diversos princípios e direitos trabalhistas. Embora existam normas e
preceitos a serem observados, ainda nos dias de hoje muitos trabalhadores são submetidos
a péssimas condições de trabalho, em ambientes insalubres e jornadas excessivas.
Verifica-se então a necessidade de compreender a importância das alterações
sofridas pela humanidade para o surgimento dos direitos em prol do trabalhador e seus
princípios norteadores. Além disso, também deve-se analisar que muitas dessas relações
de trabalho violam direitos fundamentais inerentes aos seres humanos e afetam
diretamente a saúde psíquica principalmente do empregado, lado mais fraco da relação.
A presente pesquisa objetiva, portanto, realizar uma análise completa, mas não
exaustiva, da chamada Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional,
uma das doenças ocupacionais que possui causa diretamente relacionada com o exercício
profissional e que está acometendo um número cada vez maior de funcionários.
UNIDADADE 1 - ASPECTOS GERAIS DAS RELAÇÕES DE TRABALHO
A palavra trabalho tem origem no termo latim tripalium, que advém da junção de
“tri” (três) e “palum” (madeira), que era um instrumento com três pedaços de madeira
pontiagudos utilizados pelos agricultores nas lavouras para rasgar e esfiapar o trigo e o
milho e pelos soldados durante o Império Romano para subjugar animais e forçar escravos
a aumentar a produção, sendo então associado à tortura. (CRUZ, 2017, pp. 30 - 31)
Nas primeiras civilizações o trabalho era apenas um meio de produção de
alimentos e bens que visava atender às necessidades de consumo, inexistindo busca por
bens materiais e riquezas. O comércio, durante esse período, era realizado através da
prática do escambo, que consistia na troca de mercadorias sem envolver nenhum tipo de
pagamento em dinheiro, variando de acordo com a localidade em que a troca era
realizada, sendo geralmente utilizados o gado, sal, açúcar, tecidos e peças de metal.
Quando o homem passou a desenvolver novos meios de subsistência, deixou de
depender da produção no campo e começou a se deslocar para centros urbanos, ensejando
no surgimento das primeiras cidades. Nesse momento as relações de comércio se
intensificaram e o escambo foi substituído pela invenção das primeiras moedas.
A Revolução Industrial, que ocorreu entre os séculos XVIII e XIX na Europa,
impulsionou o surgimento das fábricas e impulsionou o desenvolvimento do capitalismo,
sistema econômico que vigora até os dias atuais e que tem por base a propriedade privada,
trabalho assalariado e acumulação de capital.
Com a chegada dos europeus em novos continentes através da expansão marítima,
novos recursos naturais passaram a ser explorados e iniciou-se o processo de colonização
dos povos africanos, que eram escolhidos prioritariamente por características físicas de
força e trazidos compulsoriamente como mão-de-obra barata para trabalharem nas
lavouras, especialmente de cana de açúcar e café.
Quando o fim da escravidão foi assinado em 1888, através da Lei Áurea, muitos
ex-escravos não tinham para onde ir, pois não possuíam acesso à propriedade. Sendo
assim, muitos continuaram trabalhando nas terras de seus senhores para obterem moradia
e alimento e os demais migraram para centros urbanos, impulsionando o desenvolvimento
de subempregos e da economia informal. (JACCOUD et al., 2009, pp. 26-28)
1.1 SURGIMENTO DOS DIREITOS TRABALHISTAS
A Inglaterra foi pioneira em editar leis em prol dos trabalhadores, tendo como
principais a Lei de Peel, editada em 1802, que limitou a jornada de menores de idade em
12 horas e a Factory Act (“Lei das Fábricas”), em 1833, que proibiu o trabalho para
menores de 09 anos e o trabalho noturno. (BIGNAMI, 2017, pp. 286-287)
Após o fim da Primeira Guerra Mundial, em 1919, as potências europeias
assinaram o Tratado de Versalhes, que instituiu a criação da Organização Internacional
do Trabalho (OIT), organização responsável pela emissão de normas referentes ao
trabalho no âmbito internacional que deliberou sobre a jornada de 8 horas diárias,
descanso remunerado, salário mínimo e igualdade salarial.
Outro documento importante é a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
assinada em 1948, que trata sobre a igualdade de direito ao trabalho, livre escolha e
organização sindical, proteção ao desemprego e de remuneração que assegure a dignidade
humana do trabalhador e sua família. (DELGADO, 2011, p. 69)
Durante o período colonial no Brasil foram editadas leis de supra importância para
a liberdade dos escravos, tais como a Lei Eusébio de Queirós, de 1850, que proibia o
tráfico negreiro, a Lei do Ventre Livre, de 1871, que declarava a liberdade dos filhos de
escravos que viessem a nascer, a Lei dos Sexagenários, de 1885, que declarava a mesma
liberdade para escravos com idade superior a 60 anos, e a Lei Áurea, de 1888, que
determinou o efetivo fim da escravidão.
O Decreto nº 1.313, de 1891, foi a primeira legislação brasileira a tratar de direitos
trabalhistas, regulamentando a idade mínima de 12 (doze) anos para poder trabalhar nas
minas. A primeira constituição brasileira a contemplar em seu texto direitos inerentes ao
trabalho foi a promulgada em 1934, que tratou da jornada de trabalho de 8 horas, salário
mínimo, férias anuais remuneradas, indenização por dispensa sem justa causa e
assistência a maternidade, invalidez e acidente de trabalho. (FRANCO FILHO, 2013)
A atual Constituição Federal (CF), promulgada em 1988, acrescentou, ainda, a
proporcionalidade do piso salarial, 13º salário, adicional de hora extra de 50%, licença
paternidade, disposições sobre atividades insalubres e perigosas, garantia de acesso ao
emprego para portadores de deficiência, entre outros. (FRANCO FILHO, 2013)
A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) foi editada em 1943 através do
Decreto nº 5.452, consolidando todas as legislações nacionais existentes acerca do direito
do trabalho, se tornando sua principal fonte. A importância da CLT está na busca pela
efetiva proteção dos trabalhadores, deliberando sobre contratos individuais e coletivos,
fiscalização, processo na justiça do trabalho, segurança e medicina do trabalho, e outros.
UNIDADE 2 – DOENÇAS DERIVADAS DO TRABALHO
A precariedade das condições de trabalho sempre existiu na história, mas como a
massa trabalhadora era de escravos e pessoas consideradas socialmente inferiores, os
respectivos patrões não davam a devida importância para as condições que essas pessoas
estavam submetidas, nem para as consequências que geravam.
Por muitos anos inexistiram legislações sobre direitos trabalhistas e muito menos
que protegessem os danos causados à saúde dos empregados. Após anos de reivindicações
foi que esse tema começou a ser debatido, surgindo as chamadas doenças ocupacionais,
que é como se designam as doenças diretamente ligadas à atividade profissional ou às
condições de trabalho, de acordo com o artigo 20, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91.
Ainda de acordo com o artigo acima, essas doenças são subdivididas entre
profissionais, ou típicas, que são inerentes à atividade desenvolvida, e do trabalho, ou
atípicas, que não possuem nexo causal na atividade, mas em situações alheias a esta.
Analisando também o §1º deste artigo, é possível concluir que a característica marcante
dessas doenças é gerar consequência de incapacidade parcial ou total, temporária ou
definitiva para o trabalho. (REDAÇÃO JORNAL CONTÁBIL, 2018)
Outro ponto que ainda merece destaque neste artigo é que as doenças ocupacionais
estão inseridas dentro do conceito de acidente de trabalho, o que na prática serve para
equiparar o trabalhador que se encontre nessas situações, inclusive no que tange aos
benefícios de suspensão do contrato de trabalho, auxílio-acidentário, estabilidade
provisória por prazo mínimo de 12 meses, aposentadoria por invalidez ou, se for o caso,
pensão por morte para os dependentes. (REDAÇÃO JORNAL CONTÁBIL, 2018)
2.1. SÍNDROME DE BURNOUT
A Lista B do Anexo II do Decreto nº 3.048/99 traz um extenso rol de doenças
relacionadas ao trabalho e seus agentes ou fatores de risco. Dentre elas está a Síndrome
de Burnout, também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional ou Estafa
Profissional, que está enquadrada dentro de “Transtornos mentais e do comportamento
relacionadas com o trabalho” tendo como causas o “ritmo de trabalho penoso” e “outras
dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho”. (BRASIL, 1999)
A origem da palavra burnout está na expressão to burn out, que significa esgotar
ou queimar, parar de funcionar, termo utilizado pela primeira vez pelo psicólogo Herbert
J. Freudenberger, em 1974, ao verificar que os funcionários da clínica onde trabalhava
estavam sofrendo um quadro de exaustão emocional (MOREIRA et al., 2009, p. 1559).
Nos dias de hoje, a crescente demanda de produção faz com que os empregados
sejam incessantemente cobrados com excesso de atividades que, quando acrescidos de
exigências contraditórias, má gestão e falta de incentivo, se tornam fatores que
contribuem para uma vida profissional sobrecarregada e desgastante. (SANTOS, 2018)
Muitos profissionais também sofrem com cobranças pessoais, como é o caso
daqueles que se dedicam tanto à vida profissional que acabam abdicando do tempo de
lazer, o que muitas vezes acaba desencadeando em um sentimento de frustação por falta
de reconhecimento. Outras potenciais vítimas dessa síndrome são as pessoas que possuem
jornada dupla de trabalho que, geralmente por necessidades financeiras, possuem dois ou
mais empregos e precisam conciliar os horários e atividades e ficam sobrecarregadas.
Devido a esses e outros fatores relacionados ao trabalho, profissionais da área
médica indicam que as circunstâncias trabalhistas que cercam essa doença fazem com
que esta seja considerada uma das principais doenças do século XXI. (GOMES, 2014)
A grande problemática nessa questão é a dificuldade que as vítimas possuem de
perceber que se encontram numa situação de esgotamento mental e físico, que muitas
vezes é confundido com uma situação pontual de estresse ou com depressão, o que
dificulta a identificação da presença da síndrome e a busca por tratamento.
Apesar da dificuldade de distinção entre os sintomas, Síndrome de Burnout,
estresse e depressão não se confundem. Embora o estresse seja considerado um dos
principais sintomas da síndrome, distingue-se desta por se verificar em acontecimentos
pontuais que tendem a desaparecer tão logo também desapareça a situação que lhe
desencadeou. Com relação à síndrome, o estresse passa a ser um sintoma constante do
qual a vítima não consegue se desvencilhar.
Já em relação à depressão, a correlação entre os sintomas existe pois ambas são
caracterizadas com desânimo e redução no desempenho pessoal e profissional.
Entretanto, distinguem-se pelo fato da síndrome ser relacionada a questões envolvendo a
vida profissional, podendo ter como consequência reflexos em relações fora do trabalho,
enquanto a depressão pode ter origem em qualquer área da vida pessoal do indivíduo.
(SANTOS, 2018)
Embora sejam problemas diferentes e que devem ser tratados de formas distintas,
o estresse, mesmo que manifestado em diferentes níveis, pode se tornar a causa do
desenvolvimento da Síndrome de Burnout que, por sua vez, pode desencadear um quadro
de depressão.
Outras também podem ser as consequências geradas pela Síndrome de Burnout,
tais como repentinas alterações de humor, falta de concentração, sentimentos de
incompetência e inferioridade. Além disso, também pode gerar mal-estar, dores
musculares, má alimentação e distúrbios no sono. (PÊGO; PÊGO, 2015)
Em alguns casos também são verificados sintomas mais graves, como pressão
alta, depressão, ansiedade, problemas digestivos, úlceras e gastrite, hipertensão arterial e
alterações cardiorrespiratórias. (PÊGO; PÊGO, 2015)
Interessante destacar que no Japão, país considerado o com a população mais
estressada do mundo, existe um quadro clínico muito similar à Síndrome de Burnout, que
é o denominado de Karoshi. Esse termo tem origem na junção das palavras “karo”, que
significa excesso de trabalho, e “shi”, que significa morte. (CARREIRO, 2007, p. 131)
No Brasil, dentre os principais motivos apontados como causa desse estresse, de
acordo com Gericó (2017), o trabalho está presente na resposta de 69% das pessoas
entrevistadas, que relataram casos de longas jornadas de trabalho, excesso de atividades
e tensão no ambiente corporativo.
UNIDADE 3 - QUALIDADE DE VIDA x SÍNDROME DE BURNOUT
Tendo em vista que cada vez mais se discute acerca das condições de trabalho na
sociedade contemporânea, o termo Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) surgiu a partir
da ideia de que o bem-estar do trabalhador influencia diretamente na produtividade, pois
o indivíduo fica mais motivado a produzir e buscar resultados positivos. (LOBO, 2016)
A Síndrome do Esgotamento Profissional, embora tenha alcance individual, deve
ser tratada como um problema social, tendo em vista que se manifesta por um distúrbio
proveniente de fatores externos ao indivíduo. É de extrema importância, portanto, que
empregado e empregador estejam atentos para as causas e sinais dessa síndrome.
Quando a preocupação em relação ao seu bem-estar parte do próprio empregado,
ele se torna responsável por manter uma rotina que vise cuidar de sua saúde, mantendo
um equilíbrio entre sua vida profissional e pessoal. Possuir um sono regular e uma boa
alimentação são medidas que apenas o próprio indivíduo tem controle e que são essenciais
para o bom funcionamento do organismo humano.
Além das mencionadas acima, também são medidas de extrema importância
realizar pausas regulares e programadas ao longo do dia para descansar e remover a
sobrecarga, manter laços sociais ativos com amigos e familiares em momentos de lazer e
praticar atividades físicas para auxiliar no alívio do estresse. (“BURNOUT”..., 2018)
Tendo em vista as obrigações assumidas pelo empregado e empregador quando
firmam um contrato de trabalho, o empregador também se torna responsável por garantir
os direitos fundamentais daquele que lhe presta serviço, respeitando principalmente os
fundamentos e princípios do direito do trabalho e do direito civil, tais como o melhor
interesse do empregado e a dignidade humana, o direito à saúde e à integridade física.
Sendo assim, alguns legisladores entendem que existe um padrão de conduta que
a pessoa do empregador, aqui se tratando tanto de pessoa física quanto jurídica, deve
adotar visando promover o bem-estar ocupacional, concomitantemente com a proteção
dos direitos já acima mencionados.
Para tanto, também a figura do empregador deve ser reconhecida de forma ampla,
ou seja, na pessoa tanto do patrão, na visão de empregador final, quanto do gestor que,
embora também seja funcionário, assume posição de chefia sobre uma equipe.
Dentre as medidas que podem ser adotadas para manter um ambiente corporativo
saudável podem ser indicadas a reorganização das atividades dentro da equipe, conversas
construtivas entre gestores e funcionários, a existência de regras de segurança, a
permanência de um médico do trabalho, entre outras. (“BURNOUT”..., 2018)
Entretanto, a grande problemática se encontra quando há o diagnóstico da doença,
pois nesse patamar as medidas preventivas já não são mais úteis, tendo em vista que o
empregado já está acometido pelos sintomas. Nesses casos devem ser observadas as
orientações médicas para o tratamento adequado de acordo com cada caso em particular.
É necessário que o diagnóstico da Síndrome do Esgotamento Profissional seja
proferido por um médico especializado na área, tendo em vistas as semelhanças já
apresentadas entre essa síndrome e outras doenças. O primeiro passo, quando verificada
a presença dos sintomas da síndrome, é identificar o nexo causal, como por exemplo a
relação entre membros da equipe, picos de estresse muito intensos ou o cumprimento de
demandas extravagantes.
Posteriormente, as orientações mais recomendadas implicam na melhoria das
circunstâncias que contribuíram para o surgimento dos sintomas, tal como a
reorganização de tarefas, pelo encaminhamento do profissional para tratamento ou, ainda,
pelo afastamento temporário ou definitivo do local de trabalho. (“BURNOUT”..., 2018)
3.1. OS TIPOS DE DANOS NO ÂMBITO DAS RELAÇÕES
TRABALHISTAS E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR
Os danos causados podem atingir diversas proporções, gerando danos de natureza
física, moral e psicológica, que podem ser moral, material e existencial. A fundamentação
desses danos como ato ilícito e consequente reparação está nos artigos 186, 187 e 927,
caput, do Código Civil Brasileiro (CC):
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social,
pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
(...) (BRASIL, 2002)
Além disso, o artigo 7º, XXVIII, da CF trata da reparação dos danos causados por
acidente de trabalho a empregados urbanos e rurais a, que fica a cargo do empregador:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem
excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou
culpa.
(...)
(BRASIL, 1988)
A CLT também passou a tratar do assunto quando a Lei nº 13.467 de 2017,
também conhecida como Lei da Reforma Trabalhista, adotou os artigos 223-B, 223-C e
223-E, que tratam da conceituação de dano extrapatrimonial (que pode ser moral ou
existencial), os direitos por ele atingidos e a consequente possibilidade de reparação:
Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que
ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são
as titulares exclusivas do direito à reparação.
Art. 223-C. A honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a
autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens
juridicamente tutelados inerentes à pessoa física.
Art. 223-E. São responsáveis pelo dano extrapatrimonial todos os que tenham
colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da
omissão.
(BRASIL, 1943)
A caracterização do dano moral está associada à ideia de ofensa ou violação de
direitos morais inerentes à existência do ser humano, tais como à saúde física e mental,
honra e imagem, liberdade e dignidade. Nas relações trabalhistas, o dano moral pode ficar
configurado quando o empregado é exposto de forma vexatória, pela discriminação de
qualquer espécie entre os funcionários, descumprimento das obrigações trabalhistas,
acidentes de trabalho, dispensa imotivada, entre outros.
A problemática que versa sobre o dano moral é que, por ser um dano
exclusivamente de caráter psicológico, não é possível ser mensurado e, muitas vezes,
reparado. Dessa forma, a sua reparação possui um caráter muito mais disciplinar, como
uma sanção pelas ações cometidas pelo empregador, do que reparatório. (JUNIOR, 2016)
Já o dano material, também chamado de dano patrimonial, é configurado quando
verificada a existência de prejuízo físico ou financeiro que acarreta na redução total ou
parcial do patrimônio do indivíduo, estando regulamentado no artigo 402 do CC:
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos
devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que
razoavelmente deixou de lucrar.
(BRASIL, 2002)
No âmbito das relações trabalhistas esse dano pode ser configurado por acidentes
de trabalho, tendo em vista que esses implicam na suspensão do contrato de trabalho e
eventuais desligamentos forçados devido à incapacidade laborativa, ou quando, através
do nexo de causalidade apresentado no diagnóstico da doença ocupacional, o empregado
precisa entrar em tratamento e ter gastos com medicamentos e consultas médicas.
Por fim, existe a figura do dano existencial que, embora também seja classificado
como dano extrapatrimonial, se difere do dano moral. Enquanto este último atinge
aspectos inerentes à personalidade do indivíduo, o primeiro, conforme será exposto a
seguir, decorre de situações que restringem a realização pessoal do trabalhador.
O dano existencial está associado aos danos sofridos pelos trabalhadores que não
possuem respeitados seus direitos e pelas consequências deste fato, sendo considerado
também, para o Direito do Trabalho, como dano à existência do trabalhador. Sua
caracterização está, portanto, na violação de preceitos básicos de dignidade do empregado
quando o empregador, ainda que de forma indireta, faz com que os períodos de descanso
do indivíduo sejam reduzidos pelo excesso de trabalho ou que o mesmo se submeta a
condições degradantes contrárias às suas vontades. (FILHO; DE ALVARENGA, S.d)
Em muitos casos, em especial nos que desencadeiam o afastamento do
profissional, o diagnóstico da Síndrome de Burnout se torna objeto de diversas ações
trabalhistas que buscam tutelar seus direitos através de indenizações com o intuito de
suprir os danos sofridos por aquele indivíduo. (REDAÇÃO JORNAL CONTÁBIL, 2018)
A possibilidade de cumulação de pedidos que versem sobre a requisição de
reparação por danos morais, materiais e existenciais sofridos no âmbito das relações
trabalhistas está prevista no artigo 114 da CF que, com o advento da Emenda
Constitucional nº 45/2004, passou a constar da seguinte maneira:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito
público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
(...)
VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da
relação de trabalho;
(...) (BRASIL, 1988)
O ordenamento jurídico brasileiro adota a teoria da responsabilidade subjetiva,
que depende da configuração de dolo ou culpa do causador do dano, fundamentada no
artigo 7º, XXVIII, da Constituição e artigos 186 e 927, caput, do CC, supracitados. Tendo
em vista as obrigações assumidas pelo empregador no momento de firmar um contrato de
trabalho, é de se constatar que este deve ser responsabilizado em caso de quebra de
qualquer disposição contratual por sua parte, devendo apenas ser verificado o nexo de
causalidade entre o dano sofrido com aspectos trabalhistas.
Para alguns casos, por outro lado, existe a previsão no parágrafo único do artigo
927 do CC de ser aplicada a teoria da responsabilidade objetiva que, ao contrário da
subjetiva, independe da comprovação de culpa daquele que gerou o dano. De acordo com
esse dispositivo, essa teoria pode ser aplicada quando a atividade profissional
desenvolvida por si só já implique na ocorrência de riscos para quem a exercer.
(REDAÇÃO JORNAL CONTÁBIL, 2018)
Tendo por base a mensuração subjetiva dos danos de natureza extrapatrimonial,
levando em consideração a avaliação realizada e o pedido formulado, o juiz irá determinar
por deliberação livre o quantum indenizatório aplicável a cada caso concreto.
Nos casos em que tiverem ocorrido o afastamento da vítima da Síndrome de
Burnout, durante o julgamento também deve ser observada a coexistência harmônica
entre o princípio da manutenção do contrato de trabalho e o do melhor interesse do
empregado, que são princípios basilares do Direito do Trabalho.
CONCLUSÃO
A Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Esgotamento Profissional tem sua causa
relacionada exclusivamente em aspectos relacionados ao trabalho, podendo surgir pelo
excesso de atividades, demandas extravagantes, cobranças indevidas e recorrentes
situações de estresse. A configuração dessa síndrome como doença ocupacional é
importante devido aos reflexos que produz em relação à vítima, como o recebimento de
benefícios e a aplicação do princípio da manutenção do contrato de trabalho.
Ao longo da pesquisa foi possível ainda compreender que essa síndrome
proporciona sintomas não só emocionais, como desgaste, exaustão e sentimento de
incompetência, mas também sintomas físicos como dores musculares e mal-estar,
podendo ainda causar problemas mais graves como alterações cardiorrespiratórias e
problemas digestivos. Entretanto, é importante destacar que a grande problemática que
rodeia essa doença é o fato de seus sintomas serem facilmente confundidos com meras
situações de estresse e acabarem sendo ignorados pelos seus portadores, o que
compromete sua prevenção e tratamento.
A extensão dos danos causados, contudo, pode ser de natureza mais leve,
causando afastamento temporário do empregado, ou ainda pode atingir níveis tão intensos
que podem se tornar irreversíveis, com consequente afastamento definitivo por
incapacidade laborativa.
Ademais, outro ponto apresentado que merece destaque é a possibilidade da
vítima requerer a reparação pelos danos sofridos perante a Justiça do Trabalho, que é a
responsável por processar e julgar ações que versem sobre dano moral ou patrimonial,
decorrentes da relação de trabalho. O empregador, na forma que é regido o ordenamento
jurídico brasileiro, será responsabilizado, em regra, pelo dano causado aos seus
empregados com base na teoria da responsabilidade subjetiva.
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