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Acordam os Juízes do Tribunal de Contas, em Subsecção da 1.ª Secção:
I – RELATÓRIO
1. O Centro Hospitalar do Baixo Vouga, E.P.E. (doravante CHBV) submeteu a
fiscalização prévia do Tribunal de Contas o contrato de aquisição de serviços de
confeção, fornecimento e distribuição de alimentação aos doentes e funcionários
do CHBV e atribuição da exploração dos refeitórios utilizados pelos seus
colaboradores, celebrado em 15 de abril de 2019 (e parcialmente alterado por
adenda, datada de 20.05.2019, quanto à redação da cláusula 9.ª, respeitante à
designação do gestor do contrato), entre aquele centro hospitalar e ITAU –
Instituto Técnico de Alimentação Humana, S.A., pelo preço contratual de
1.186.983,37 €, acrescido de IVA, para produzir efeitos dez dias após o visto, e para
vigorar pelo prazo de 12 meses.
2. Para melhor instrução do processo, foi o contrato objeto de devolução ao CHBV
para apresentação de documentos e prestação de esclarecimentos adicionais
necessários à tomada de decisão por parte do Tribunal de Contas.
II. FUNDAMENTAÇÃO
– DE FACTO
3. Com relevo para a presente decisão e para além do já mencionado no precedente
relatório, consideram-se como assentes os seguintes factos, evidenciados pelos
documentos constantes do processo:
Secção: 1ª S/SS Data: 10/07/2019 Processo: 1383/2019
NÃO TRANSITADO EM JULGADO
ACÓRDÃO Nº
23
RELATOR: Alziro Antunes Cardoso
2019
2
a) Por deliberação de 24 de janeiro de 2019 o Conselho de Administração do
CHBV aprovou a abertura de concurso público com publicação no JOUE
para a aquisição de serviços de confeção, fornecimento e distribuição de
alimentação aos doentes e funcionários do CHBV e atribuição da exploração
dos refeitórios utilizados pelos seus colaboradores;
b) A adjudicação à ITAU – Instituto Técnico de Alimentação Humana, S.A.,
concorrente que apresentou a única proposta admitida pelo júri, e a minuta
do contrato, foram aprovadas por deliberação do Conselho de
Administração do CHBV de 28 de março de 2019;
c) Em 31 de março de 2019 o prazo médio de pagamento a fornecedores do
CHBV era de 356 dias;
d) Entre outros esclarecimentos e documentos, foi solicitado ao CHBV que:
(i) justificasse a ausência de identificação do número sequencial de
compromisso no contrato;
(ii) demonstrasse documentalmente, que a outorga do contrato foi
precedida de verificação e registo do necessário compromisso orçamental e
por fundos disponíveis, pelo orçamento de 2019;
(iii) remetesse informação de compromisso orçamental, pela totalidade do
encargo a suportar em 2019, nos termos da Resolução do Tribunal de
Contas n.º 14/2011, de 16 de agosto; comprovativo, extraído do sistema
informático de apoio à execução orçamental, do registo do compromisso
pela totalidade do valor a pagar em 2019, com evidência da respetiva
numeração e data de registo; extrato da conta corrente dos fundos
disponíveis extraídos da aplicação informática e contabilística em vigor
nessa entidade donde conste a informação de saldo de fundos disponíveis
antes e após o respetivo compromisso; mapa de fundos disponíveis
extraídos do sistema informático da DGO, demonstrativo de que havia
fundos disponíveis à data da assunção do compromisso, nos termos da Lei
n.º 8/2012, de 21 de fevereiro; informação prestada de acordo com o mapa
anexo II à Resolução do Tribunal de Contas n.º 14/2011, de 16 de agosto; e
informação de controlo dos fundos disponíveis, demonstrativa de que o
3
compromisso assumido não ultrapassou os fundos disponíveis, referente
ao mês da sua inscrição, de acordo com o mapa da DGO, contendo a
informação constante no modelo reproduzido no pedido de
esclarecimentos e remessa de documentação financeira.
e) O CHBV não remeteu a documentação solicitada, tendo respondido o
seguinte:
«No âmbito do procedimento CP/0100002/2019, que deu origem ao
contrato em apreciação, nos termos do disposto na cláusula 1ª, n.º 1e 3, e
cláusula 3ª do caderno de encargos, que constitui parte integrante do
contrato celebrado, o contrato tem por objeto a aquisição de serviços de
confeção, fornecimento e distribuição de alimentação aos doentes e
colaboradores do Centro Hospitalar do Baixo Vouga E.P.E., a prestar nas
três Unidades que o constituem (Águeda, de Aveiro e de Estarreja), pelo
preço de 1.186.983,37€, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, e por um
período de 12 (doze) meses, conforme cláusulas 2ª e 3ª do contrato.
Conforme previsto no ponto 3 da cláusula 5ª do caderno de encargos, as
quantidades constantes do Anexo VI são meramente estimativas, tendo por
base os consumos médios anuais verificados, pelo que as quantidades reais
objeto da prestação dos serviços poderão ser diferentes das indicadas.
De acordo com o disposto na cláusula 7ª do caderno de encargos, a
faturação deverá ser processada mensalmente e apresentada de modo a
identificar, por Unidade (Águeda, Aveiro e Estarreja) e respetivo serviço
requisitante e o número de refeições por tipo de dieta efetivamente
fornecidas aos serviços, conforme modelo do Anexo IX.
De acordo com a frequência da aquisição dos bens, o contrato em apreço
subsume-se na categoria dos contratos de fornecimento contínuos, ou seja,
contratos administrativos pelos quais um fornecedor ou prestador de
serviços se compromete, durante certo período de tempo, a
entregar/prestar regularmente à entidade contratante certos bens/serviços
contratados.
De acordo com o NPC 26 do Anexo I do Decreto-Lei nº 192/2015, de 11/09,
um contrato deste tipo configura um Compromisso continuado, nos termos
do Sistema de Normalização Contabilística para as Administrações Públicas
4
(SNC-AP). Ou seja, é um compromisso de caráter permanente que gera
responsabilidades recorrentes durante um período indeterminado de
tempo.
Nos termos do disposto no artigo 3º, alínea a), da Lei n.º 8/2012, de 21/02,
republicada pela Lei n.º 22/2015, de 17/03, que aprova as regras aplicáveis à
assunção de compromissos e aos pagamentos em atraso das entidades
públicas, os compromissos consideram-se assumidos quando é executada
uma ação formal pela entidade, nomeadamente:
a) Emissão de uma ordem de compra;
b) Nota de encomenda ou documento equivalente;
c) Assinatura de um contrato, acordo ou protocolo.
Os compromissos podem também, nos termos do mesmo artigo, ter
caráter permanente e estar associados a pagamentos durante um
período de tempo indeterminado.
De acordo com o artigo 8º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21/06,
republicado pelo Decreto-Lei n.º 99/2015, de 02/06, que regulamenta a
Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso, a assunção de
compromissos no âmbito dos contratos com duração limitada ao ano
civil, independentemente da sua forma e natureza jurídica, deve ser
efetuada pelo seu valor integral aquando da outorga do respetivo
contrato, emissão da ordem de compra, nota de encomenda ou
documento equivalente.
No entanto, conforme é estabelecido no n.º 2 do mesmo artigo,
“independentemente da duração do respetivo contrato, se o montante
efetivamente a pagar não puder ser determinado no momento da
celebração do contrato, nomeadamente, por depender dos consumos
efetuar pela entidade adjudicante, a assunção do compromisso é
efetuada aquando da emissão da nota de encomenda se for o caso ou pelo
valor estimado de encargos relativos ao período temporal de
apuramento dos fundos disponíveis”.
Ou seja: neste caso, a assunção do compromisso é efetuada aquando da
emissão da nota de encomenda (e não com a outorga do contrato), ou pelo
valor estimado de encargos que irão ocorrer no período temporal de
apuramento dos fundos disponíveis.
5
Entende-se, assim, que, caso a entidade pública subscreva um contrato em
que estabeleça um limite não vinculativo até ao qual possa efetuar
requisições, o procedimento deve ser o seguinte:
a) O Cabimento pela totalidade do valor estimado a executar no
exercício, aquando da abertura do procedimento;
b) O registo do compromisso deve preceder apenas a emissão de cada
requisição externa ou documento equivalente, que seja emitida por
conta do referido contrato, que, no caso em apreço, consiste na “faturação
processada mensalmente e apresentada de modo a identificar, por unidade
(Águeda, Aveiro e Estarreja) e respetivo serviço requisitante e o número de
refeições por tipo de dieta efetivamente fornecidas aos serviços”, (cf.
cláusula 7.ª do Caderno de Encargos).»
f) Foi solicitada a remessa de comprovativo da autorização para assunção de
encargos plurianuais, tendo o CHBV respondido que:
«O pedido de autorização para a assunção do encargo plurianual foi
formalizado no dia 28 de março de 2019. Não obstante as várias insistências
por parte do CHBV em 26 de abril e 28 de maio, ainda não foi obtida
autorização.»
g) Foi ainda solicitado ao CHBV que demonstrasse documentalmente que, à
data da autorização do início do procedimento, a respetiva despesa se
encontrava devidamente cabimentada.
Tendo O CHBV remetido o documento junto a folhas 222, intitulado
«Declaração de Suficiência Orçamental», datado de 21.01.2019, e subscrito
pelo vogal executivo do Conselho de Administração, conforme abaixo se
reproduz:
6
h) Foi ainda remetido pelo CHBV, um documento datado de 24.05.2019,
intitulado «Informação de cabimento e compromisso orçamental», também
subscrito pelo vogal executivo do Conselho de Administração, conforme
abaixo se reproduz:
7
– DE DIREITO
4. A principal questão suscitada no presente caso prende-se com o facto do CHBV
não ter demonstrado que à data da autorização do início do procedimento a
despesa decorrente do contrato submetido a fiscalização prévia se encontrava
devidamente autorizada e cabimentada, e que o compromisso assumido foi
emitido e registado, e não ultrapassou os fundos disponíveis para o satisfazer.
5. Nos termos do artigo 10.º-D da Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto, na redação que
lhe foi dada pela Lei n.º 41/2014, de 10 de julho (Lei de Enquadramento
Orçamental)1, os organismos e entidades da Administração Pública estão sujeitos
ao princípio da sustentabilidade financeira, o qual se traduz «na capacidade de
financiar todos os compromissos assumidos ou a assumir, com respeito pela regra
do saldo orçamental estrutural e pelo limite da dívida pública, conforme previsto
na presente lei e na legislação europeia».
1 Mantida parcialmente em vigor pelas disposições conjugadas dos artigos 7.º. n.ºs 1 e 2 e 8.º, n.º
2, ambos da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro (Nova Lei do Enquadramento Orçamental).
8
6. Em concretização deste princípio, o artigo 42.º, n.º 6, da mesma lei, dispõe que
nenhuma despesa pode ser autorizada ou paga sem que, cumulativamente:
a) O facto gerador da obrigação de despesa respeite as normas legais
aplicáveis;
b) A despesa disponha de inscrição orçamental, tenha cabimento na
correspondente dotação e esteja adequadamente classificada;
c) A despesa em causa satisfaça o princípio da economia, eficiência e eficácia.
7. Tal normativo é ainda complementado com o disposto no artigo 45.º do mesmo
diploma legal segundo o qual «Apenas podem ser assumidos compromissos de
despesa após os competentes serviços de contabilidade exararem informação
prévia de cabimento no documento de autorização da despesa em causa».
8. Reforçando o princípio da sustentabilidade financeira, e com vista a um melhor
controlo e disciplina orçamental veio, entretanto, a Lei n.º 8/20122, de 21 de
fevereiro (Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, doravante LCPA) e
o Decreto-Lei n.º 127/20123, de 21 de junho, que a regulamenta, a estabelecer as
regras aplicáveis à assunção de compromissos por parte dos organismos e
entidades públicas.
9. Visando assegurar que não são assumidos novos compromissos sem garantia de
disponibilidades de tesouraria que lhes façam face, a LPCA veio estabelecer a regra
de que, para além do requisito tradicional de inscrição orçamental, um
compromisso de despesa só pode ser assumido se for demonstrada a existência
de efetivos fundos disponíveis para o satisfazer.
10. Consideram-se «Fundos disponíveis as verbas disponíveis a muito curto prazo, que
incluem, quando aplicável e desde que não tenham sido comprometidos ou gastos:
2 Alterada pelas Leis n.ºs 20/2012, de 14 de maio, 64/2012, de 20 de dezembro, 66-B/2012, de 31 de
dezembro, e 22/2015, de 17 de março. 3 Alterado pelas Leis n.ºs 64/2012, de 20 de dezembro, 66-B/2012, de 31 de dezembro, e 99-B/2015,
de 2 de junho.
9
i) A dotação corrigida líquida de cativos, relativa aos três meses seguintes; ii) As
transferências ou subsídios com origem no Orçamento do Estado, relativos aos
três meses seguintes; iii) A receita efetiva própria que tenha sido cobrada ou
recebida como adiantamento; iv) A previsão da receita efetiva própria a cobrar nos
três meses seguintes; v) O produto de empréstimos contraídos nos termos da lei;
vi) As transferências ainda não efetuadas decorrentes de programas e projetos do
Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e de outros programas
estruturais, cujas faturas se encontrem liquidadas e devidamente certificadas ou
validadas; vii) Outros montantes autorizados nos termos do artigo 4.º da LCPA»
(cf. artigos 3.º, alínea f), da LCPA e 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de
junho).
11. Os titulares de cargos políticos, dirigentes, gestores e responsáveis pela
contabilidade só podem assumir compromissos até ao montante dos fundos
disponíveis (cf. artigo 5.º n.º 1 da LCPA e n.º 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º
127/2012).
12. E nos termos do nº 3 do artigo 7º do citado Decreto-Lei nº. 172/2012 «Sob pena da
respetiva nulidade, e sem prejuízo das responsabilidades aplicáveis, bem como do
disposto nos artigos 9.º e 10.º do presente diploma, nenhum compromisso pode
ser assumido sem que tenham sido cumpridas as seguintes condições:
a) Verificada a conformidade legal e a regularidade financeira da despesa, nos
termos da lei;
b) Registado no sistema informático de apoio à execução orçamental;
c) Emitido um número de compromisso valido e sequencial que é refletido na
ordem de compra, nota de encomenda ou documento equivalente».
13. Estabelecendo o n.º 3 do artigo 5º da LCPA que "Os sistemas de contabilidade de
suporte à execução orçamental emitem um número de compromisso válido e
sequencial que é refletido na ordem de compra, nota de encomenda ou documento
equivalente, e sem o qual o contrato ou a obrigação subjacente em causa são, para
todos os efeitos, nulos».
10
14. Este regime é aplicável a todas as entidades públicas do Serviço Nacional de Saúde
– cf. artigo 2.º, n.º 1, da LCPA.
15. Compromissos para efeitos da LCPA são as «obrigações de efetuar pagamentos a
terceiros em contrapartida do fornecimento de bens e serviços ou da satisfação de
outras condições» (artigo 3.º, alínea a), da LCPA).
16. Consideram-se “Compromissos plurianuais” os compromissos que constituem
obrigação de efetuar pagamentos em mais do que um ano económico ou em anos
económicos distintos do ano em que o compromisso é assumido (cf. artigo 3.º,
alínea b), da LCPA e 11.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 127/2012).
17. A assunção de compromissos plurianuais está sujeita a prévia autorização, por
decisão conjunta dos membros do Governo responsáveis pela área das finanças e
da tutela, quando envolvam entidades pertencentes ao subsetor da administração
central, direta ou indireta, e segurança social e entidades públicas do serviço
Nacional de Saúde, salvo quando resultarem da execução de planos plurianuais
legalmente aprovados (cf. artigo 6.º n.º 1, alínea a), da LCPA).
18. E para além da referida autorização prévia, é obrigatória a inscrição integral dos
compromissos plurianuais no suporte informático das entidades responsáveis pelo
controlo orçamental em cada um dos subsetores da Administração Pública (n.º 2
do citado artigo 6.º da LCPA).
19. Os compromissos «(…) consideram-se assumidos quando é executada uma ação
formal pela entidade, como sejam a emissão de ordem de compra, nota de
encomenda ou documento equivalente, ou a assinatura de um contrato, acordo ou
protocolo, podendo também ter um caráter permanente e estar associados a
pagamentos durante um período indeterminado de tempo, nomeadamente
salários, rendas, eletricidade ou pagamentos de prestações diversas» (citada alínea
a) do artigo 3.º da LCPA).
20. Esclarecendo o n.º 1, do artigo 8.º, do citado Decreto-Lei n.º 127/2012 que «A
assunção de compromissos no âmbito dos contratos com duração limitada ao ano
11
civil, independentemente da sua forma e natureza jurídica, deve ser efetuada pelo
seu valor integral aquando da outorga do respetivo contrato, emissão da ordem de
compra, nota de encomenda ou documento equivalente».
21. E o n.º 2 do mesmo artigo que «Independentemente da duração do respetivo
contrato, se o montante efetivamente a pagar não puder ser determinado no
momento da celebração do contrato, nomeadamente, por depender dos consumos
a efetuar pela entidade adjudicante, a assunção do compromisso é efetuada
aquando da emissão da nota de encomenda se for o caso ou pelo valor estimado
de encargos relativos ao período temporal de apuramento dos fundos disponíveis».
22. Alega o CHBV que “Conforme previsto no ponto 3 da cláusula 5ª do caderno de
encargos, as quantidades constantes do Anexo VI são meramente estimativas,
tendo por base os consumos médios anuais verificados, pelo que as quantidades
reais objeto da prestação dos serviços poderão ser diferentes das indicadas. E que
de acordo com o disposto na cláusula 7ª do caderno de encargos, a faturação deverá
ser processada mensalmente e apresentada de modo a identificar, por Unidade
(Águeda, Aveiro e Estarreja) o respetivo serviço requisitante e o número de
refeições por tipo de dieta efetivamente fornecidas aos serviços.”
23. Defende que o contrato em apreço se subsume na categoria dos contratos de
fornecimento contínuos, e que “De acordo com a NPC 26 do Anexo I do Decreto-
Lei nº 192/2015, de 11/09, um contrato deste tipo configura um Compromisso
continuado, nos termos do Sistema de Normalização Contabilística para as
Administrações Públicas (SNC-AP). Ou seja, é um compromisso de caráter
permanente que gera responsabilidades recorrentes durante um período
indeterminado de tempo”.
24. Concluindo que estando em causa um compromisso permanente só é assumido
“aquando da emissão da nota de encomenda (e não com a outorga do contrato),
ou pelo valor estimado de encargos que irão ocorrer no período temporal de
apuramento dos fundos disponíveis.”
12
25. E que “O registo do compromisso deve preceder apenas a emissão de cada
requisição externa ou documento equivalente, que seja emitida por conta do
referido contrato, que, no caso em apreço, consiste na “faturação processada
mensalmente e apresentada de modo a identificar, por unidade (Águeda, Aveiro e
Estarreja) e respetivo serviço requisitante e o número de refeições por tipo de dieta
efetivamente fornecidas aos serviços”, (cf. cláusula 7.ª do Caderno de Encargos).”
26. Porém, ao contrário do que defende O CHBV o compromisso foi assumido com a
assinatura do contrato e não estamos perante um compromisso permanente, mas
sim perante um compromisso plurianal.
Vejamos,
27. Nos termos da alínea a) do artigo 3.º da LCPA os compromissos podem “(…) ter
um carácter permanente e estarem associados a pagamentos durante um período
indeterminado de tempo, nomeadamente salários, rendas, eletricidade ou
pagamento de prestações”.
28. Em sintonia com a citada disposição legal, na definição constante da “NPC 26”, do
Anexo I, do Decreto-Lei nº 192/2015, de 11/09, que o CHBV invoca em defesa da
sua posição, “Compromisso continuado é um compromisso de carácter
permanente, que gera responsabilidades recorrentes durante um período
indeterminado de tempo, nomeadamente, salários, rendas, consumo de
eletricidade ou de água”.
29. Enquanto o “compromisso pontual” é definido como um compromisso “que
quando assumido gera uma única responsabilidade ou uma série de
responsabilidades durante um período de tempo determinado”.
30. A definição de “compromisso plurianual” coincide também com a constante da
LCPA, sendo definido na citada “NPC 26” como “um compromisso que quando
assumido gera responsabilidade para a entidade em mais do que um período
orçamental, ou pelo menos em período diferente daquele em que é assumido”.
13
31. No presente caso, o contrato submetido a fiscalização prévia foi celebrado para
vigorar por um período de tempo determinado (de doze meses), o que desde logo
afasta a possibilidade do compromisso assumido poder ser considerado como
compromisso de carácter permanente, definido pela lei, como já referido, como um
compromisso “que gera responsabilidades recorrentes durante um período
indeterminado de tempo”.
32. O contrato tem um preço e um prazo de vigência determinados, tendo o preço
sido fixado com base nos consumos médios dos anos anteriores.
33. Com a assinatura do contrato o CHBV obrigou-se a pagar à adjudicatária o valor
correspondente às quantidades efetivamente fornecidas, previamente
determinadas, até ao montante global do preço contratual acordado.
34. Na eventualidade das quantidades efetivamente fornecidas no período de vigência
e execução do contrato serem inferiores às estimadas poderá haver lugar a uma
redução, na proporção da diferença verificada para menos, mas a obrigação
originária assumida com a assinatura do contrato abrange a totalidade do preço
contratual acordado.
35. Como aliás, o CHBV reconhece, na intitulada «Declaração de Suficiência
Orçamental», datada de 21/01/2019, subscrita pelo vogal executivo do Conselho de
Administração, na qual foi previsto o encargo total de 1 187 000,00 €, dividido do
seguinte modo: 692 416,67 € (2019) e €494 958,33 € (2020).
36. O contrato prevê a emissão de faturas e pagamentos mensais, mas o compromisso
foi assumido pela globalidade do preço, tendo o CHBV, com a outorga do contrato,
assumido a obrigação de efetuar pagamentos até ao montante global do preço
contratual acordado em contrapartida do fornecimento dos bens e serviços que a
adjudicatária se obrigou a fornecer.
37. O facto de o contrato prever a emissão de faturas e pagamentos mensais, respeita
apenas ao prazo de pagamento, em nada alterando a obrigação do CHBV efetuar
pagamentos até ao montante global do preço contratual acordado.
14
38. Ao contrário do que defende o CHBV a obrigação de pagamento do preço emerge
diretamente da assinatura do contrato, não estando dependente de qualquer nota
de encomenda ou “requisição externa”, constituindo esta um mero instrumento de
controlo, no âmbito da execução do contrato, das quantidades efetivamente
fornecidas.
39. Deveria, pois, ter sido oportunamente emitido e registado um compromisso, pelo
valor dos encargos a pagar no ano de 2019.
40. Por outro lado, como já referido, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 22.º
do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de junho, a abertura de procedimento relativo a
despesas que deem lugar a encargo orçamental em mais de um ano económico ou
em ano que não seja o da sua realização, não pode ser efetivada sem prévia
autorização conferida em portaria conjunta do Ministro das Finanças e do respetivo
ministro.
41. E, reiterando idêntica exigência, as normas constantes da alínea a) do n.º 1 do artigo
6.º da Lei n.º 8/2012, e do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, estabelecem que
a assunção de compromissos plurianuais está sujeita a autorização prévia, por
decisão conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças
e da tutela.
42. Em face do exposto, a abertura do procedimento, com encargos previsíveis em mais
do que um ano económico, sem obtenção prévia (aquando da abertura do
procedimento) de portaria de extensão de encargos, por estar em causa encargo
plurianual, acarreta a violação de normas financeiras (constantes dos citados
artigos 22.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8/62, e 45.º, n.º 2, da Lei de
Enquadramento Orçamental [LEO: Lei n.º 91/2001, de 20/83, ainda parcialmente
em vigor ao abrigo do artigo 7.º, n.º 2, e 8.º, n.º 2, da Lei n.º 151/2015, de 11/94, que
aprova a nova LEO]).
43. Por outro lado, o CHBV também não demonstra que tenha dado cumprimento ao
disposto no artigo 42.º da Lei de Enquadramento Orçamental, aprovada em Anexo
15
à Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto (igualmente em vigor por força do disposto no
n.º 2 do artigo 7.º e no n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro).
44. Com efeito, no que diz respeito ao cabimento orçamental, no momento da abertura
do procedimento (por deliberação do Conselho de Administração de 24-01-2019),
foi remetida apenas cópia da “Declaração de Suficiência Orçamental”, datada de 21
de janeiro de 2019, reproduzida na alínea g) dos factos assentes.
45. Sendo que, a declaração de suficiência orçamental é um documento que se
encontra previsto no n.º 4 do artigo 5.º da LOPTC, apenas para fiscalização do
cabimento orçamental das entidades previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do
artigo 2.º da mesma Lei, nas quais, os CHBV não se inclui, uma vez que é uma
entidade reclassificada que integra os serviços da administração central.
46. E, na sequência do pedido de esclarecimentos e de junção de documentação
financeira, além da referida declaração de suficiência orçamental foi apenas
remetido pelo CHBV o documento, com data de 24-05-2019, posterior, portanto, à
data da outorga do contrato (15-04-2019), reproduzido na alínea h) da matéria de
facto, e que apresenta informação que não resulta clara, já que confunde
informações de «cabimento» e de «compromisso orçamental» num único
documento.
47. A cabimentação e o compromisso orçamental têm de ser feitos antes da realização
da despesa. Diz-se, aliás, no artigo 13º do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de julho, sob
a epígrafe de “Registo de cabimento prévio” que “[p]ara a assunção de
compromissos, devem os serviços e organismos adotar um registo de cabimento
prévio do qual constem os encargos prováveis”.
48. Ou seja, os procedimentos de contratação só devem iniciar-se se tiver sido
assegurada, atempada e previamente, inscrição e cabimento orçamental da
despesa prevista. E o cabimento das despesas a realizar deve reportar-se à data da
abertura do procedimento, assegurando-se, igualmente, a cobertura orçamental
para os anos subsequentes.
16
49. Tendo o contrato sido celebrado em abril de 2019 para vigorar por um período de
doze meses, o compromisso assumido com a assinatura do contrato gera
responsabilidade para o CHBV em mais do que um período orçamental (2019 e
2020).
50. Estando em causa um compromisso plurianual, não resulta demonstrado que
tenha sido inscrito, nos termos previstos e exigidos pelo n.º 2, do artigo 6.º, da
LCPA, norma que igualmente reveste natureza financeira.
51. Por outro lado, o CHBV também não demonstrou a necessária emissão e registo
de compromisso, pelo valor a pagar no ano de 2019, nem a existência de fundos
disponíveis para assunção do mesmo. E a lei comina com a nulidade a assunção
de compromissos sem a comprovação da existência de disponíveis e o
correspondente registo (cf. citado n.º 3 do artigo 5.º da LCPA e n.º 3 do artigo 7.º,
do Decreto-Lei n.º 127/2012).
52. Como já referido, não procede a argumentação do CHBV no sentido de que
emissão e registo dos compromissos “deve preceder apenas requisição externa ou
documento equivalente, que seja emitida por conta do referido contrato”. Mas
ainda que o montante efetivamente a pagar não pudesse ser determinado aquando
da outorga do respetivo contrato, situação que não se verifica no presente caso,
sempre teria de ser emitido e registado compromisso pelo valor estimado de
encargos relativos ao período temporal (três meses, nos termos da alínea f) do
artigo 3.º da LCPA) de apuramento de fundos disponíveis (cf. citado n.º 2, do artigo
8.º, do Decreto-Lei n.º 127/2012).
53. E no caso de não existirem fundos disponíveis para a parcela anual dos
compromissos plurianuais, seria necessário solicitar autorização à entidade
competente para aumento temporário dos fundos disponíveis, permitido, a titulo
excecional, nos termos do artigo 4.º da LCPA.
54. Cabe à entidade fiscalizada o ónus de alegar e provar o preenchimento das
condições necessárias à obtenção de visto, como decorre do disposto no artigo
81.º, n.º 1, da LOPTC e das instruções para que esta norma remete (constantes da
17
Resolução do Tribunal de Contas n.º 14/2011, in Diário da República, II Série, n.º
156 – relevando no presente caso o seu artigo 9.º e o Anexo I).
55. Faltando à colaboração devida ao Tribunal, o CHBV não juntou os documentos que
lhe foram solicitados, nem prestou, em relação a cabimento orçamental e fundos
disponíveis, a informação e comprovação documental que lhe foi solicitada.
56. Admitiu não ter emitido e registado compromisso pelo valor a pagar no ano de
2019, mas não informou, apesar de tal informação lhe ter sido solicitada, se tinha
fundos disponíveis para o assumir.
57. A não demonstração da existência de cabimentação e de compromisso válido ao
tempo da assunção da despesa, para além de constituir violação de normas
financeiras [normas constantes do art.º 5.º, n.º 3, da L.C.P.A., art.º 7.º, n.º 3, do
Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21.06, artigos 42.º e 45.º, da L.E.O., e 13.º e 22.º, do
Decreto-Lei n.º 155/92, de 28.07], gera, ainda, a nulidade do contrato e da obrigação
que lhe subjaz.
58. E nos termos das alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 44.º da Lei de Organização e
Processo do Tribunal de Contas (LOPTC), tanto a nulidade como a violação de
normas financeiras constituem fundamentos absolutos de recusa de visto.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos indicados, acordam os juízes do Tribunal de Contas, em
subsecção da 1.ª Secção, em decidir recusar o visto ao contrato supra identificado,
tendo por base os fundamentos constantes das alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 44.º
da LOPTC.
São devidos emolumentos nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do Regime Jurídico dos
Emolumentos do Tribunal de Contas (Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de maio, com as
alterações introduzidas pela Lei n.º 139/99, de 28 de agosto, e pela Lei n.º 3-B/2000,
de 4 de abril).
18
Lisboa, 10 de julho de 2019
Os Juízes Conselheiros,
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(Alziro Antunes Cardoso, relator)
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(Paulo Dá Mesquita)
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(Fernando Oliveira Silva)
Fui presente
A Procuradora-Geral Adjunta,
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