APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

Preview:

Citation preview

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    1/65

    COMPETNCIA EM EDUCAO PBLICA PROFISSIONALCentro Estadual de Educao Tecnolgica Paula Souza

    GOVERNO DO ESTADO DE SO PAULO

    A P O S T I L A

    ANLISE E PRODUO DE TEXTOS TCNICOS

    REVISO GRAMATICAL

    DISCIPLINASLinguagem, Trabalho e Tecnologia

    Cursos Tcnicos: Qumica, Mecatrnica, Eletrnica, Eletroeletrnica, Administrao, Informtica,Informtica para Internet, Contabilidade, Administrao, Automao Industrial e Logstica

    Representao e Comunicao em Lngua PortuguesaRepresentao e Comunicao Organizacional

    Curso Tcnico: Secretariado

    Autora: Professora Lucivnia A. S. Perico

    SO BERNARDO DO CAMPOAGOSTO - 2011

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    2/65

    2

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    SUMRIO1. A IMPORTNCIA DA COMUNICAO .............................................................. 3

    1.1 VOCABULRIO E ADEQUAO LINGUSTICA .................................. 42. NOES DE VARIAO LINGUSTICA ............................................................. 6

    2.1 LNGUA CULTA X LNGUA COLOQUIAL ....................................... 7EXERCCIOS ...................................................................................................... 7

    3. CONTEXTO: CONSIDERAES SOBRE A NOO DE TEXTO ..................... 93.1 COMPREENDENDO O CONTEXTO ......................................................... 11QUESTIONRIO ................................................................................................ 11

    4. INTERTEXTUALIDADE: AS RELAES ENTRE TEXTOS .............................. 12EXERCCIOS ...................................................................................................... 16

    5. O TEXTO E SUAS RELAES COM A HISTRIA ............................................ 175.1 OS LIMITES DA RETRICA DE MERCADO .......................................... 20QUESTIONRIO ................................................................................................ 23

    6. RESUMO ................................................................................................................... 24ATIVIDADE ....................................................................................................... 25

    7. RESENHA ................................................................................................................. 267.1 DIFERENCIANDO: RESUMO X RESENHA ............................................ 27

    REDAO .......................................................................................................... 288. FILME TEMPOS MODERNOS ............................................................................ 299. REDAO TCNICA E COMERCIAL ................................................................. 30

    9.1 CURRCULO ................................................................................................ 309.2 CARTA COMERCIAL ................................................................................. 329.3 MENSAGEM ELETRNICA (E-MAIL) ..................................................... 339.4 RELATRIO ................................................................................................. 349.5 ATA ............................................................................................................... 359.6 REQUERIMENTO ........................................................................................ 359.7 DECLARAO ............................................................................................ 369.8 OFCIO .......................................................................................................... 379.9 MEMORANDO ............................................................................................. 38

    9.10 CIRCULAR ................................................................................................. 389.11 PROTOCOLO ............................................................................................. 399.12 RECIBO ....................................................................................................... 409.13 ATESTADO ................................................................................................ 409.14 AVISO ......................................................................................................... 419.15 EXPRESSES ESTRANGEIRAS MAIS UTILIZADAS .......................... 419.16 CARTA PESSOAL ...................................................................................... 42

    10. MORFOLOGIA REVISO ................................................................................. 43EXERCCIOS ...................................................................................................... 4510.1 SIGNIFICAO DAS PALAVRAS .......................................................... 46

    11. SINTAXE REVISO ........................................................................................... 47EXERCCIOS ...................................................................................................... 48

    12. REGNCIA NOMINAL E VERBAL REVISO ............................................... 4913. CRASE REVISO ............................................................................................... 53

    EXERCCIOS REGNCIA E CRASE ............................................................ 5414. CONCORDNCIA NOMINAL REVISO ........................................................ 55

    EXERCCIOS ...................................................................................................... 5615. CONCORDNCIA VERBAL REVISO ........................................................... 57

    EXERCCIOS ...................................................................................................... 5816. ACENTUAO REVISO ................................................................................ 59

    EXERCCIOS ...................................................................................................... 6017. COESO, COERNCIA E CLAREZA TEXTUAL .............................................. 61

    17.1 PONTUAO REVISO ....................................................................... 61EXERCCIOS ...................................................................................................... 63

    BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................... 65

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    3/65

    3

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    1 A IMPORTNCIA DA COMUNICAO

    Ns, seres humanos, temos um nvel de sofisticao que nos diferencia de outros seres vivos,que a capacidade de comunicao. A comunicao a transmisso e a compreenso de informaesentre as pessoas. Comunicar equivale a tornar uma ideia comum entre o emissor e o receptor damensagem. chamada de emissor a pessoa que emite a informao e o receptor a pessoa que arecebe.

    Para que o processo de comunicao efetiva acontea, so necessrias oito etapas. Tendo comoponto de partida o emissor, consideram-se trs etapas: elaborar uma ideia, codificar e transmitir amensagem. As cinco etapas seguintes, que envolvem o receptor, so: receber, decodificar, aceitar,usar a informao recebida e dar uma resposta.

    Durante esse processo podem ocorrer barreiras, que so rudos ou interferncias que podemcausar distoro na comunicao. Essas barreiras podem ser: fsicas, semnticas ou de ordem pessoal.As barreiras fsicas so as que decorrem do ambiente fsico, como barulho e distncia. As barreirassemnticas so aquelas que limitam a compreenso das palavras e aes, como o uso de umalinguagem que no seja comum ao emissor e ao receptor. As barreiras de ordem pessoal decorrem dafalta de sintonia emocional entre as pessoas que se comunicam.

    Vejamos o caso abaixo:

    Numa cidadezinha pequena do interior... o forr tava comendo solto! A moa preparou-setoda para ir ao baile, que era o nico evento da cidade depois de muito tempo. Esperava encontrar oseu prncipe encantado no tal baile. L chegando, um rapaz franzino, meio desengonado, quetranspirava muito, aproximou-se dela e convidou-a para danar.

    Ela no achou o rapaz muito interessante, porm, para no arrumar confuso, pois na cidadeisso era considerado indelicado, acabou aceitando. Mas o rapaz realmente suava tanto, mas tanto,que ela, j no suportando mais, disse:

    - Voc sua, hein?Diante disso, o rapaz sorriu, apertou-a com fora e respondeu:- Tambm v s seu, minha princesa!

    Refletindo sobre o texto, que rudo interferiu na comunicao? importante considerarmos que h dois de tipos de comunicao: verbal e no-verbal.A comunicao verbal falada realiza-se atravs da fala, como no caso de palestras. A

    comunicao verbal escrita ocorre por meio da escrita, como ocorre nas mensagens trocadas por e-mails. A comunicao no-verbal ocorre por intermdio de aes como gestos, expresses faciais,posturas e movimentos corporais.

    Saber comunicar-se efetivamente, iniciar e encerrar uma conversao, fazer e responderperguntas, gratificar e elogiar, dar e receber feedback so algumas das principais habilidades decomunicao, e elas so muito valorizadas no mundo do trabalho. As habilidades de fazer e responderperguntas envolvem entonao, volume de voz, expresso facial e gesticulao. As habilidades degratificar e elogiar referem-se a recompensar emocionalmente algum para que o outro se sintavalorizado, reconhecido e respeitado, como ocorre quando o elogio percebido como verdadeiro e

    adequado. As habilidades de dar e receber feedback fazem parte das principais habilidades decomunicao. O feedback pode ser compreendido como crtica construtiva ou como crtica destrutiva.Como crtica construtiva traz consequncias positivas e, como crtica destrutiva faz o contrrio,causando dor, tristeza e sofrimento a quem o recebe.

    Sabedores de que possvel promover o desenvolvimento pessoal e profissional atravs danossa forma de comunicao, torna-se fundamental planej-la adequadamente, de forma tica eresponsvel.

    Somos seres sociais, devemos cuidar de nossas relaes interpessoais em todos os momentos,a fim de criar, manter e melhorar esses relacionamentos. Certamente, podemos entender acomunicao como parte disso.

    Conceitualmente, o feedback uma forma de comunicao pela qual o receptor da mensagem

    original transmite ao emissor a maneira como ela foi recebida. Em consequncia, a pessoa saber oefeito de seu comportamento sobre os outros. Oferecer feedback pode ser um fator que alavanca amodificao interna para o desenvolvimento pessoal, desde que o emissor (a pessoa que faz a crtica)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    4/65

    4

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    saiba realmente fazer a crtica e o receptor (a pessoa que a recebe) esteja aberto a receb-la como algoconstrutivo.

    Para fazer a crtica construtiva recomenda-se que o emissor descubra a razo de faz-la,comunique-se diretamente com a pessoa, seja especfico, descreva os fatos, assuma seu ponto de vista,observe a contingncia, faa referncia aos efeitos, crie um clima favorvel, v diretamente ao assunto,escute compreensivamente, foque o objetivo a ser alcanado, resuma ao final. Para receber a crtica deforma construtiva, recomenda-se que o emissor: escute compreensivamente, aceite-a como crticaconstrutiva, faa perguntas ao emissor, agradea-lhe e, sempre que possvel, solicite a crtica.

    A tica tambm deve pautar o ato de fazer e receber crticas, sob pena de, com crticas malelaboradas e baseadas em objetivos escusos, gerar prejuzos no s para as relaes interpessoais, massofrimento fsico e mental a quem as recebe. Assim, observamos que o domnio da comunicaoeficaz fundamental para o sucesso pessoal e profissional, para tanto importante nos comunicarmoscom clareza e de maneira apropriada ao ambiente.

    1.1 VOCABULRIO E ADEQUAO LINGUSTICA

    O texto a seguir circulou pela Internet como

    uma piada. Utilize-o como base para responderas questes dos exerccios 1 e 2 .

    Correo ortogrfica

    O gerente de vendas recebeu o seguinte faxde um dos seus novos vendedores:

    Seo Gomis,O criente de belzonte pidiu mais cuatrucenta

    pessa. Faz favor toma as providenssa.Abrasso, Nirso

    Aproximadamente uma hora depois recebeuoutro fax:Seo Gomis,Os relatrio di venda vai xega atrazado

    proque to fexando umas venda. Temo quemanda treiz miu pessa. Amanh to xegando.

    Abrasso, Nirso

    No dia seguinte, outro fax:Seo Gomis,

    Num xeguei pucausa de que vendi maiz deismiu em Beraba.To indo pra Brazilha.

    No prximo fax:Seo Gomis,

    Brazilha fexo 20 miu. Vo pra Frolinopolis ede l pra Sum Paulo no vinho das cete hora.

    E assim foi o ms inteiro. O gerente, muitopreocupado com a imagem da empresa, levouao presidente as mensagens que recebeu dovendedor. O presidente, um homem muitopreocupado com o desenvolvimento da empresae com a cultura dos funcionrios, escutouatentamente o gerente e disse:

    - Deixa comigo que eu tomarei as

    providncias necessrias.E tomou. Redigiu de prprio punho um avisoque afixou no mural da empresa, juntamentecomo os faxes do vendedor:

    A partir de oje nois tudo vamo faz feito oNirso. Si pricup menos em iscrev serto mod avend maiz.

    Acinado, O Prezidenti

    (Portugus Lngua e Literatura pg. 145 e 146)

    1. Geralmente, as piadas manifestam umapostura preconceituosa e nos permitem refletirsobre como so avaliadas as pessoas a partir douso que fazem da lngua, seja na sua forma oralou escrita.

    a) Embora os erros ortogrficos chamemimediatamente a ateno de quem l o texto, oproblema percebido pelo gerente nos textos doNirso pode ser entendido de outra maneira.Explique.

    b) Por que a piada reflete uma viso lingusticapreconceituosa?

    2.O comportamento do gerente deixa implcitasua opinio sobre diferentes variantes daLngua Portuguesa.

    a) Que opinio essa?

    b) De que maneira a atitude tomada pelopresidente da empresa demonstra que o uso deuma variante no pode ser associado ao modo

    de avaliar o falante que a utiliza?

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    5/65

    5

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Leia o texto e responda as questes que oseguem:

    Quem no se comunica...

    Havia no Rio de Janeiro nos anos 1920 umgramtico famoso, professor do Pedro II,inimigo dos galicismos, dos pronomesmalcolocados e da linguagem descuidada.Falava empolado e exigia correo delinguagem at em casa com a famlia. Uma vez,esse gramtico foi passar frias em um hotel-fazenda de Terespolis. L, um dia, decidiu darum passeio a cavalo pelos terrenos da fazenda.Por segurana, ia acompanhado de umcavalario montado em um burrinho. Pelas

    tantas, o cavalo do gramtico disparou. Ocavalario foi atrs em seu burrinho, gritando:Doutor, puxe a rdea! Doutor, puxe a rdea!

    Nada aconteceu, at que o cavalo saltou umvalado e jogou o gramtico numa moita deurtiga. Finalmente o cavalario o alcanou,levantou-o e ajudou-o a se livrar de unsespinhos que se grudaram nele. Doutor, porque o senhor no puxou a rdea? Eu vinhagritando atrs, doutor, puxe a rdea, doutor,puxe a rdea!

    O gramtico, j senhor de si, perguntou: E o

    que puxar a rdea? fazer isso, , e fez o gesto explicativo.Ah! Dissesses sofreia o corcel, eu teria

    entendido.(VEIGA, J. J. O Almanach de Piumhy. RJ: Record, 1998.)

    (Portugus Lngua e Literatura pg. 154)

    3.No texto transcrito, foram utilizadas duasvariedades lingusticas. Quais so elas?Justifique sua resposta com elementos do texto.

    4.Falar e escrever bem significa, alm deconhecer o padro formal da LnguaPortuguesa, saber adequar o uso da linguagemao contexto discursivo. O texto transcritomostra uma situao em que a linguagem usada inadequada ao contexto. Em que consiste essainadequao?

    5.Voc considera que a postura rgida dogramtico em relao correo dalinguagem a ser utilizada pelos falantes adequada? Justifique sua resposta.

    Artigo: A carreira nas alturasRevista Lngua Portuguesa Ano 5 n 63 Janeiro de 2011

    QUESTIONRIO

    1. Segundo o texto, por que hnecessidade do domnio da norma cultada Lngua Portuguesa? Justifique.

    2. Quais as principais mudanas nomercado de trabalho que exigem umnovo perfil profissional?

    3. A Lngua um instrumento deprestgio e marginalizao. Explique.

    4. Na sua opinio, qual o principal fatorque implica na falta de domnio danorma culta da Lngua Portuguesa?

    5. De que maneira a leitura deste artigopode auxiliar na sua formaoprofissional?

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    6/65

    6

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    2 NOES DE VARIAO LINGUSTICA

    Todas as pessoas que falam em determinada lngua conhecem as estruturas gerais, bsicas, defuncionamento dessa lngua. Embora sejam mais ou menos constantes dentro do idioma, essasestruturas bsicas podem sofrer variaes devido influncia de inmeros fatores. Tais variaes, ques vezes so pouco perceptveis e outras vezes bastante evidentes, recebem o nome genrico devariedadesou variaes lingusticas.

    Entre as causas que mais claramente determinam o surgimento das variaes lingusticas destacam-se: o grupo social a que o falante pertence (variao scio-cultural), o lugar em que ele nasceu ou vive(variao geogrfica) e a poca (variao histrica).

    Variao Scio-CulturalEsse tipo de variao pode ser percebido com certa facilidade: por exemplo, algum diz:Ta na cara que eles no teve peito de encar os ladro. (frase 1)Que tipo de pessoa comumente fala dessa maneira? Vamos caracteriz-lo, por exemplo, pela sua

    profisso: um advogado? Um trabalhador braal da construo civil? Um mdico? Um garimpeiro?Um reprter de tv?

    E quem usaria a frase abaixo?

    Obviamente faltou-lhes coragem para enfrentar os ladres. (frase 2)Sem dvida, associamos frase 1 os falantes pertencentes a grupos sociais economicamente maispobres. Pessoas que, muitas vezes, no frequentaram nem a escola primria, ou, quando muito,fizeram-no em condies no adequadas.

    Por outro lado, a frase 2 mais comum aos falantes que tiveram possibilidades scio-econmicasmelhores e puderam, por isso, ter um contato mais duradouro com a escola, com a leitura, com pessoasde um nvel cultural mais elevado e, dessa forma, aperfeioaram o seu modo de utilizao da lngua.

    Convm ficar claro, no entanto, que a diferenciao feita acima est bastante simplificada, uma vezque h diversos outros fatores que interferem na maneira como o falante escolhe as palavras e constrias frases. Por exemplo, a situao de uso da lngua: um advogado, num tribunal de jri, jamais usaria aexpresso ta na cara, mas isso no significa que ele no possa us-la numa situao informal(conversando com alguns amigos, por exemplo).

    Variao geogrficaA variao geogrfica , no Brasil, bastante grande e pode ser facilmente notada. Ela se caracteriza

    pelo acento lingustico, que o conjunto das qualidades fisiolgicas do som (altura, timbre,intensidade), por isso uma variante cujas marcas se notam principalmente na pronncia. Ao conjuntodas caractersticas da pronncia de uma determinada regio d-se o nome de sotaque: sotaque mineiro,sotaque nordestino, sotaque gacho etc.

    A variao geogrfica, alm de ocorrer na pronncia, pode tambm ser percebida no vocabulrio,em certas estruturas de frases e nos sentidos diferentes que algumas palavras podem assumir emdiferentes regies do pas.

    Leia, como exemplo, o trecho abaixo, de Guimares Rosa, no conto So Marcos, no qual recria afala de um tpico sertanejo do centro-norte de Minas:

    - Mas voc tem medo dele... [de um feiticeiro chamado Mangol]- H-de-o!... Agora, abusar e arrastar mala, no fao. No fao, porque no paga a pena... De

    primeiro, quando eu era moo, isso sim!... J fui gente! Gente. Para ganhar aposta, j fui, de noite,fora dhora, em cemitrio... (...) Quando a gente novo, gosta de fazer bonito, gosta de secomparecer. Hoje, no: estou percurando sossego...

    Variao histricaAs lnguas no so estticas, fixas, imutveis. Elas se alteram com o passar do tempo e com o uso.

    Muda a forma de falar, mudam as palavras, a grafia e o sentido delas. Essas alteraes recebem onome de variao histrica.

    O trecho abaixo, de Carlos Drummond de Andrade, exemplifica a mudana da lngua ao longo do

    tempo:

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    7/65

    7

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Antigamente

    Antigamente, as moas chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas.No faziam anos: completavam primaveras, em geral dezoito. Os janotas, mesmo no sendorapages, faziam-lhes p-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio.E se levavam tbua, o remdio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em outra freguesia. (...) Osmais idosos, depois da janta, faziam o quilo, saindo para tomar fresca; e tambm tomavam cautela deno apanhar sereno. Os mais jovens, esses iam ao animatgrafo, e mais tarde ao cinematgrafo,chupando balas de altia. Ou sonhavam em andar de aeroplano; os quais, de pouco siso, se metiamem camisa de onze varas, e at em calas pardas; no admira que dessem com os burros ngua.

    2.1 LNGUA CULTA X LNGUA COLOQUIAL

    Convencionalmente, costumamos como correta a lngua utilizada pelo grupo de maior prestgiosocial. Essa a chamada lngua culta, falada e escrita, em situaes formais, pelas pessoas de maiorinstruo. A lngua culta nivelada, padronizada, principalmente pela escola e obedece gramtica dalngua padro. A lngua coloquial, por outro lado, uma variante espontnea, do cotidiano, semmuita preocupao com as normas. O falante, ao utiliz-la, comete deslizes gramaticais com

    frequncia considervel. Outra caracterstica da lngua coloquial o uso constante de expressespopulares, frases feitas, grias etc.No quadro a seguir, esto resumidas as diferenas que mais facilmente podem ser observadas entre

    lngua culta e lngua coloquial:

    USO COLOQUIAL / POPULAR USO CULTOPronncia mais descuidada de certas palavras eexpresses: nis, num v, num qu, c ta bem?

    Maior cuidado com a pronncia: ns, no vou,no quer, voc est bem?

    No utilizao das marcas de concordncia.Ex.: Os menino vai bem.

    Utilizao dessas marcas.Ex.: Os meninos vo bem.

    Uso constante de a genteno lugar de ns. Uso regular da forma ns.Emprego de expresses do tipo: n, ento, a,

    pois .

    Raro uso dessas expresses.

    Mistura de pessoas gramaticais.Ex.: Voc sabe que te enganam.

    Uniformidade no uso das pessoas gramaticais.Ex.:Voc sabe que o enganam.

    Tu sabes que te enganam.Uso livre da flexo dos verbos.Ex.: Se ele fazer, se ele por...

    Eu truxe o seu presente.

    Utilizao da flexo verbal conforme as normasgramaticais.Ex.: Se ele fizer, se ele puser...

    Eu trouxe o seu presente.Uso de grias. No utilizao de grias.

    EXERCCIOS

    1.Leia o texto abaixo:

    Cedo ou tarde, uma dvida cruel pinta na suacabea: Que profisso escolher? Ou ainda:Em que faculdade entrar? E justamentenessas horas que aparece uma poro de gente

    pra dar os palpites mais infelizes. (...) por isso que a Editora Abril est lanando oGuia do Estudante. Porque o que ele mais tem exatamente o que voc mais precisa saber:tudo sobre todas as profisses universitrias e

    tcnicas, o mercado de trabalho, os cursos e onvel de todas as faculdades brasileiras, onde e

    como conseguir bolsas de estudos e muitasdicas de profissionais bem-sucedidos. Umaverdadeira luz pra voc acertar na escolha da

    profisso que mais faz sua cabea.O melhor de tudo que a deciso ser sua e demais ningum. Com os ps no cho. Sentindo

    firmeza.Pode contar com o Guia do Estudante praencarar essa parada. Ele vai dar a maior fora

    pra voc.(Veja, n 976)

    (Aprender e praticar gramtica pg. 47)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    8/65

    8

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    a) A que grupo social faz parte oconsumidor que o anncio pretende atingir?b) Transcreva alguns trechos do texto queconfirmem sua resposta questo anterior.c) Transcreva do texto um trecho onde seutiliza uma linguagem mais formal.

    2.Suponha que voc seja um criador detextos de campanhas publicitrias e quetenha sido contratado por uma indstria decalados para produzir os textos depropaganda de uma nova linha de sapatos.Levando em conta as caractersticasprprias da linguagem de cada grupo social,escreva um pequeno texto dirigido a cadaum dos seguintes tipos de pblicoconsumidor do produto:

    a) jovens adolescentes urbanosb) homens de elevado padro scio-econmicoc) crianas de 5 a 8 anos de idaded) mulheres idosas

    3.(Univ.Metodista-SP) Leia o trechoabaixo:

    Os nossos salrio, cum relao ao que nisfazemo e o lucro que os outros tem,

    insignificante. Por que acontece isso? Eutenho que trabai trezentos e sessenta ecinco dias por ano. O outro num trabaianem... nem cem dias, ganha muito mais.Por que eu s a mquina que d descansopra ele.

    (Luiz Flvio, Os pees do Grande ABC)

    Transponha a linguagem coloquial para opadro escrito da linguagem formal.

    4.(Unicamp-SP) O jornal Folha de So

    Paulo introduziu com o seguintecomentrio uma entrevista com o professorPaulo Freire:

    A gente cheguemos no ser umaconstruo errada na gesto do Partidodos Trabalhadores em So Paulo.

    Os trechos da entrevista nos quais aFolha de So Paulo se baseou para fazertal comentrio foram os seguintes:

    A criana ter uma escola na qual a sualinguagem seja respeitada (...) Uma escolaem que a criana aprenda a sintaxedominante, mas sem desprezo pela sua (...)

    Esses oito milhes de meninos vm da

    periferia do Brasil (...) Precisamos respeitar a (sua)sintaxe mostrando que sua linguagem bonita egostosa, s vezes mais bonita que a minha. E,mostrando tudo isso, dizer a ele: Mas para a tuaprpria vida tu precisas dizer agente chegou emvez de a gente chegamos. Isso diferente, aabordagem diferente. assim que queremostrabalhar, com abertura, mas dizendo a verdade.

    Responda:

    a) Qual a posio defendida pelo professor PauloFreire com relao correo dos erros gramaticaisna escola?b) O comentrio do jornal faz justia aopensamento do educador? Justifique sua resposta.

    5.Provocou polmica o fato de um livrorecomendado pelo Ministrio da Educao endossarum erro de portugus. Na pgina 15 de Por umavida melhor, o texto afirma: "Voc pode estar seperguntando: 'Mas eu posso falar os livro?'. Claroque pode. Mas fique atento porque, dependendo dasituao, voc corre o risco de ser vtima depreconceito lingustico".

    Muita gente viu a um erro do livro e do prprioMinistrio da Educao. H, porm, quem pense ediga o contrrio, como o prprio MEC e a autora daobra, Helosa Ramos. Do ponto de vista lingustico,

    de fato, no h sentido em dizer que algum falaerrado apenas porque no obedece chamadanorma culta. Se algum diz "ns pesca os peixe",ser compreendido por seu interlocutor. Para alingustica, o resultado o que importa.

    Ao advertir seus leitores-estudantes do risco de"preconceito lingustico", a autora est apontandopara o fato de que esse tipo de uso da lngua,desconsiderando a norma culta, mais comumentre pessoas com menos instruo e, portanto, emgeral, em posio inferior na escala social. A autorae o MEC defendem o livro com o argumento de que

    reconhecem as variedades da lngua portuguesa e alinguagem dos diversos grupos sociais. (...)

    (Fbio Santos, Jornal Destak. Disponvel em:http://www.destakjornal.com.br/readContent.aspx?id=18,96935consultado em 20/07/2011)

    Com base nos nossos estudos sobre variaolingustica, produza um artigo de opinio,assumindo um posicionamento sobre a polmicaapontada no artigo acima.

    Imagine que seu artigo ser publicado no

    editorial de um jornal de grande circulao.Seu texto deve ter, no mnimo, 15 linhas.No esquea do ttulo!

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    9/65

    9

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    3 CONTEXTO: CONSIDERAES SOBRE A NOO DE TEXTO

    Sem dvida alguma, a palavra texto familiar a qualquer pessoa ligada prtica escolar. Elaaparece com alta frequncia no linguajar cotidiano tanto no interior da escola quanto fora de seus limi-tes. No so estranhas a ningum expresses como as que seguem: "redija um texto", "texto bemelaborado", "o texto constitucional no est suficientemente claro", "os atores da pea so bons mas otexto ruim", "o redator produziu um bom texto", etc. Por causa exatamente dessa alta frequncia deuso, todo estudante tem algumas noes sobre o que significa texto. Dentre essas noes, algumasganham importncia especial para redao, que se prope ensinar a ler e a escrever textos.

    Nesta lio introdutria, vamos fazer duas consideraes fundamentais sobre a natureza dotexto:

    Primeira considerao: o texto no um aglomerado de frases.A revista Veja de 1 de junho de 1988, em matria publicada nas pginas 90 e 91, traz uma

    reportagem sobre um caso de corrupo que envolvia, como suspeitos, membros ligados administrao do governo do Estado de So Paulo e dois cidados portugueses dispostos a lanar umnovo tipo de jogo lotrico, designado pelo nome de "Raspadinha". Entre os suspeitos figurava o nomede Otvio Ceccato, que, no momento, ocupava o cargo de secretrio de Indstria e Comrcio e quenegava sua participao na negociata.

    O fragmento que vem a seguir, extrado da parte final da referida reportagem, relata a respostade Ceccato aos jornalistas nos seguintes termos:

    Na sua posse como secretrio de Indstria e Comrcio, Ceccato, nervoso, foi infeliz aorebater as denncias. "Como So Pedro, nego, nego, nego", disse a um grupo de reprteres,referindo-se conhecida passagem em que So Pedro negou conhecer Jesus Cristo trs vezes namesma noite. Esqueceu-se de que So Pedro, naquele episdio, disse talvez a nica mentira de suavida. (Ano 20. 22:91.)

    Como se pode notar, a defesa do secretrio foi infeliz e desastrosa, produzindo efeito contrrioao que ele tinha em mente.

    A citao, no caso, ao invs de inocent-lo, acabou por compromet-lo.

    Sob o ponto de vista da anlise do texto, qual teria sido a razo do equvoco lamentvelcometido pelo secretrio? Sem dvida, a resposta esta: ao citar a passagem bblica, o acusadoesqueceu-se de que ela faz parte de um texto e, em qualquer texto, o significado das frases no autnomo.

    Desse modo, no se pode isolar frase alguma do texto e tentar conferir-lhe o significado que sedeseja. Como bem observou o reprter, no episdio bblico citado pelo secretrio, So Pedro, enquantoCristo estava preso, foi reconhecido como um de seus companheiros e, ao ser indagado pelo soldado,negou trs vezes seguidas conhecer aquele homem. Segundo a mesma Bblia, posteriormente Pedroarrependeu-se da mentira e chorou copiosamente.

    Esse relato serve para demonstrar de maneira simples e clara que uma mesma frase pode tersignificados distintos dependendo do contexto dentro do qual est inserida. O grande equvoco dosecretrio, para sua infelicidade, foi o de desprezar o texto de onde ele extraiu a frase, sem se dar conta

    de que, no texto, o significado das partes depende das correlaes que elas mantm entre si.Isso nos leva concluso de que, para entender qualquer passagem de um texto, necessrio

    confront-la com as demais partes que o compem sob pena de dar-lhe um significado oposto ao queela de fato tem.

    Em outros termos, necessrio considerar que, para fazer uma boa leitura, deve-se semprelevar em conta o contexto em que est inserida a passagem a ser lida.

    Entende-se por contexto uma unidade lingustica maior onde se encaixa uma unidadelingustica menor. Assim, a frase encaixa-se no contexto do pargrafo, o pargrafo encaixa-se nocontexto do captulo, o captulo encaixa-se no contexto da obra toda.

    Uma observao importante a fazer que nem sempre o contexto vem explicitadolinguisticamente. O texto mais amplo dentro do qual se encaixa uma passagem menor pode vir

    implcito: os elementos da situao em que se produz o texto podem dispensar maiores escla-recimentos e dar como pressuposto o contexto em que ele se situa.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    10/65

    10

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    Para exemplificar o que acaba de ser dito, observe-se um minsculo texto como este:A nossa cozinheira est sem paladar.

    Podem-se imaginar dois significados completamente diferentes para esse texto dependendo dasituao concreta em que produzido.

    Dito durante o jantar, aps ter-se experimentado a primeira colher de sopa, esse texto podesignificar que a sopa est sem sal; dito para o mdico no consultrio, pode significar que a empregadapode estar acometida de alguma doena.

    Para finalizar esta primeira considerao, convm enfatizar que toda leitura, para no serequivocada, deve necessariamente levar em conta o contexto que envolve a passagem que est sendolida, lembrando que esse contexto pode vir manifestado explicitamente por palavras ou pode estarimplcito na situao concreta em que produzido.

    Segunda considerao: todo texto contm um pronunciamento dentro de um debate de escalamais ampla.

    Nenhum texto uma pea isolada, nem a manifestao da individualidade de quem oproduziu. De uma forma ou de outra, constri-se um texto para, atravs dele, marcar uma posio ouparticipar de um debate de escala mais ampla que est sendo travado na sociedade. At mesmo umasimples notcia jornalstica, sob a aparncia de neutralidade, tem sempre alguma inteno por trs.

    Observe-se, a ttulo de exemplo, a passagem que segue, extrada da revista Veja do dia 1 dejunho de 1988, pgina 54.

    CRIME: TIRO CERTEIROEstado americano limita porte de armas.

    No comeo de 1981, um jovem de 25 anos chamado John Hinckley Jr. entrou numa loja dearmas de Dallas, no Texas, preencheu um formulrio do governo com endereo falso e, poucos mi-nutos depois, saiu com um Saturday Night Special - nome criado na dcada de 60 para chamar umtipo de revlver pequeno, barato e de baixa qualidade. Foi com essa arma que Hinckley, no dia 30 de

    maro daquele ano, acertou uma bala no pulmo do presidente Ronald Reagan e outra na cabea deseu porta-voz, James Brady. Reagan recuperou-se totalmente, mas Brady desde ento est preso auma cadeira de rodas. (...)

    Seguramente, por trs da notcia, existe, como pressuposto, um pronunciamento contra o riscode vender arma para qualquer pessoa, indiscriminadamente.

    Para comprovar essa constatao, basta pensar que os fabricantes de revlveres, se pudessem,no permitiriam a veiculao dessa notcia.

    O exemplo escolhido deixa claro que qualquer texto, por mais objetivo e neutro que parea,manifesta sempre um posicionamento frente a uma questo qualquer posta em debate.

    Ao final desta lio, devem ficar bem plantadas as seguintes concluses:

    a) Uma boa leitura nunca pode basear-se em fragmentos isolados do texto, j que osignificado das partes sempre determinado pelo contexto dentro do qual seencaixam;

    b) Uma boa leitura nunca pode deixar de apreender o pronunciamento contido por trsdo texto, j que sempre se produz um texto para marcar posio frente a uma questoqualquer.

    (SAVIOLI, F.P. & FIORIN, J.L. Para entender o texto: leitura e redao. 17 ed. So Paulo: tica, 2007 pg. 11 a 14)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    11/65

    11

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    3.1 COMPREENDENDO O CONTEXTO

    REFINE SEU VOCABULRIO CORPORATIVO

    No ltimo 28 de maro, o jornalista William Bonner recebeu o prmio Melhores do Ano, daTV Globo, na categoria jornalismo. Ao ser perguntado sobre qual era o sabor daquele trofu,

    especialmente aps substituir um dos maiores cones do jornalismo brasileiro o apresentador CidMoreira , Bonner respondeu enfaticamente: Eu no substitu o Cid, eu o sucedi. Seria impossvelsubstitu-lo.

    Os verbos substituir e suceder podem, a princpio, parecer quase sinnimos. No entanto,para Bonner, a opo por suceder foi muito mais feliz. Suceder soa mais natural que substituir,enquanto substituir muito mais apropriado para uma lmpada do que para uma pessoa. Pequenassutilezas como essa fazem toda a diferena na comunicao.

    Muita leitura e um dicionrio sempre mo na hora de escrever so as principais dicas paraquem deseja refinar o vocabulrio. importante ressaltar a diferena entre refinar e rebuscar. Oprimeiro conceito est muito mais prximo de lapidar, trabalhar para escolher as palavras quemelhor exprimem a mensagem desejada. J o segundo significa florear, sofisticar sem necessidade.

    No faz sentido em um jantar familiar dizer Por obsquio, passe-me o sal. Note que no

    exemplo de William Bonner, ele no usa nenhum rebuscamento. No entanto, ele procura a palavraexata para exprimir sua mensagem. O refinamento assemelha-se a um trabalho mais artesanal.Em entrevista a Folha de So Paulo, Marina Silva tambm constri com palavras a sua posio

    na campanha eleitoral para presidente. O Brasil precisa de um sucessor, e no de um continuador oude um opositor. O opositor tende a jogar tudo na lata do lixo, e o continuador acha que j est tudopronto.

    Escolher as palavras certas pode ser um diferencial positivo na carreira de um profissional. Porisso, mos obra.

    (Disponvel em: http://www.scrittaonline.com.br/artigos/refine-seu-vocabulario-corporativo, consultado em 29/07/10)

    QUESTIONRIO

    1. Por que para o jornalista William Bonner seria impossvel substituir Cid Moreira?

    2. O profissional deve buscar um vocabulrio refinado ou rebuscado? Explique.

    3. Para a anlise de um texto necessrio que se considere o contexto (relao entre o texto e asituao em que ele ocorre). Em que contexto est inserida a fala de Marina Silva?

    4. Considerando o contexto, para Marina Silva, quem o continuador e quem o opositor(cite nomes)? Justifique sua resposta.

    5. Trace um paralelo entre os discursos de William Bonner e Marina Silva justificando a razo de

    optarem pelo verbo suceder.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    12/65

    12

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    4 INTERTEXTUALIDADE: AS RELAES ENTRE TEXTOS

    Observe os trechos que seguem:Nosso cu tem mais estrelas,Nossas vrzeas tm mais flores.Nossos bosques tm mais vida,Nossa vida mais amores.

    (DIAS, Gonalves. Cano do exlio)

    Do que a terra mais garridaTeus risonhos, lindos campos tm mais flores;Nossos bosques tm mais vidaNossa vida, no teu seio, mais amores.

    (Hino Nacional Brasileiro)

    Nossas flores so mais bonitasnossas frutas mais gostosasmas custam cem mil ris a dzia.

    (MENDES, Murilo. Cano do exlio)

    Os trs textos so semelhantes. Como o de Gonalves Dias anterior aos dois primeiros, o queocorre que estes fazem aluso quele. Os dois primeiros citam o texto de Gonalves Dias.

    Com muita frequncia um texto retoma passagens de outro. Quando um texto de carter cientficocita outros textos, isso feito de maneira explcita. O texto citado vem entre aspas e em nota indica-se

    o autor e o livro donde se extraiu a citao.Num texto literrio, a citao de outros textos implcita, ou seja, um poeta ou romancista no

    indica o autor e a obra donde retira as passagens citadas, pois pressupe que o leitor compartilhe comele um mesmo conjunto de informaes a respeito das obras que o compem um determinado universocultural. Os dados a respeito dos textos literrios, mitolgicos, histricos so necessrios, muitasvezes, para compreenso global de um texto. A essa citao de um texto por outro, a esse dilogo entretextos d-se o nome de intertextualidade.

    Compreender um texto implica tambm acessar conhecimentos prvios, adquiridos em experinciasanteriores a que tenhamos sido expostos em nosso convvio social: leituras, filmes, aulas, palestras,sermes, conversas. A intertextualidade acontece quando utilizamos esses conhecimentos paraelaborar um novo texto. Essa utilizao pode ser em explcita ou implcita.

    Voltemos aos trs textos colocados no princpio desta lio. O poema de Gonalves Dias possuimuitas virtualidades de sentido. Entre elas, a exaltao ufanista da natureza brasileira. Para ele, nossaptria sempre mais e melhor do que os outros lugares. Os versos do Hino Nacional retomam o textode Gonalves Dias para reafirmar esse sentido de exaltao da natureza brasileira. J os versos deMurilo Mendes citam Gonalves Dias com inteno oposta, pois pretendem ridicularizar onacionalismo exaltado que pode ser lido no poema gonalvino.

    Um texto cita outro com, basicamente, duas finalidades distintas:a) para reafirmar alguns dos sentidos do texto citado;b) para inverter, contestar e deformar alguns dos sentidos do texto citado; para polemizar com ele.

    Em relao ao texto de Gonalves Dias, o Hino Nacional enquadra-se no primeiro caso, enquanto ode Murilo Mendes encaixa-se no segundo. Quando um texto cita outro invertendo seu sentido, temosuma pardia. Os versos do Hino Nacional parafraseiam versos de Gonalves Dias; os de Murilo

    Mendes parodiam-no.Compare agora estas duas estrofes, de dois poemas:

    Meus oito anos

    Oh! Que saudade que tenhoDa aurora da minha vida,Da minha infncia queridaQue os anos no trazem maisQue amor, que sonhos, que floresNaquelas tardes fagueiras sombra das bananeiras,

    Debaixo dos laranjais![...]

    (Casimiro de Abreu)

    Meus oito anos

    Oh que saudades que eu tenhoDa aurora de minha vida,De minha infncia queridaQue os anos no trazem maisNaquele quintal de terraDa Rua de Santo AntnioDebaixo da bananeira

    Sem nenhum laranjais![...]

    (Oswald de Andrade)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    13/65

    13

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    O texto de Casimiro de Abreu foi escrito no sculo XIX, o texto de Oswald de Andrade foi escritono sculo XX. As semelhanas entre os textos so evidentes, pois o assunto deles o mesmo e hversos inteiros que se repetem. Portanto, o texto de Oswald cita o texto de Casimiro, estabelecendocom ele uma relao intertextual. Observe, porm, que o 2 texto tem uma viso diferente daapresentada pelo 1. No 1 texto, tudo na infncia parece perfeito, rodeado por amor, sonhos eflores; j no 2 texto, esses elementos so substitudos por um simples quintal de terra, um espaoconcreto e comum, se idealizao. Alm disso, com o verso sem nenhum laranjais, Oswald ironizaCasimiro, como que dizendo: na minha infncia tambm havia bananeiras, mas no havia os taislaranjais que o Casimiro cita em seu poema.

    Observe que Oswald, com seu poema, no apenas cita o poema de Casimiro, ele tambm criticaesse poema, pois considera irreal a viso que Casimiro tem da infncia. Certamente, na viso deOswald, infncia de verdade, no Brasil, se faz com crianas brincando no quintal de terra, embaixo dasbananeiras, e no com crianas sonhando embaixo de laranjais. Podemos dizer que o texto de Oswald uma pardia do texto de Casimiro.

    A percepo das relaes intertextuais, das referncias de um texto a outro, depende do repertriodo leitor, do seu acervo de conhecimentos literrios e de outras manifestaes culturais. Da aimportncia da leitura, principalmente daquelas obras que constituem as grandes fontes da literaturauniversal. Quanto mais se l, mais se amplia a competncia para apreender o dilogo que os textos

    travam entre si por meio de referncias, citaes e aluses. Por isso, cada livro que se l torna maior acapacidade de apreender, de maneira mais completa, o sentido dos textos.Vamos analisar o poema de Murilo Mendes:

    Cano do exlio

    Minha terra tem macieiras da Califrniaonde cantam gaturamos de Veneza.Os poetas da minha terraso pretos que vivem em torres de ametista,os sargentos do exrcito so monistas, cubistas,os filsofos so polacos vendendo a prestaes.

    A gente no pode dormircom os oradores e os pernilongos.Os sururus em famlia tm por testemunha

    [a Gioconda.

    Eu morro sufocadoem terra estrangeira.Nossas flores so mais bonitasnossas frutas mais gostosasmas custam cem mil ris a dzia.

    Ai quem me dera chupar uma carambola de[verdadee ouvir um sabi com certido de idade!

    (MENDES, Murilo. Poemas. In: --. Poesias(1925-1955). Rio de Janeiro, J. Olympio, 1959. p.5)

    Observe a seguir o poema de Gonalves Dias:

    Cano do exlio

    Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabi;

    As aves, que aqui gorjeiam,No gorjeiam como l.

    Nosso cu tem mais estrelas,Nossas vrzeas tm mais flores,Nossos bosques tm mais vida,Nossa vida mais amores.

    Em cismar, sozinho, noite,Mais prazer encontro eu l;Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabi.

    Minha terra tem primores,Que tais no encontro eu c;

    Em cismar sozinho, noiteMais prazer encontro eu l;Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabi.

    No permita Deus que eu morra,Sem que eu volte para l;Sem que desfrute os primoresQue no encontro por c;Sem qu'inda aviste as palmeiras,Onde canta o Sabi.

    (DIAS, Gonalves. Gonalves Dias: poesia.Por Manuel

    Bandeira. Rio de Janeiro, Agir, 1975. p. 11-2)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    14/65

    14

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    Voc leu duas canes do exlio diferentes. A de Gonalves Dias enaltece a ptria, considera-asuperior terra do exlio. Murilo critica, com mordacidade, o Brasil e julga-se exilado em sua prpriaterra por no compartilhar dos valores nela vigentes. Cada texto um pronunciamento sobre dadarealidade; cada texto revela a viso de mundo de quem o produz.

    Mas no s na literatura que isto acontece!A intertextualidade uma forma de dilogo entre textos, que pode se dar de forma mais implcita

    ou mais explcita e em diversos gneros textuais. O intertexto serve para ilustrar a importncia doconhecimento de mundo e como este interfere no nvel de compreenso do texto. Ao relacionar umtexto com outro, o leitor entender que a intertextualidade uma das estratgias utilizadas para aconstruo dos mesmos.

    Chico Tirando Palha de Milho,2000,acrlica sobre tela164x125 cm

    Caipira Picando Fumo, 1893, Almeida Jnior(1850-99), leosobre tela,202x141cm.Pinacoteca de So Paulo, SP, Brasil

    No caso especfico do anncio publicitrio, por exemplo, o intertexto, quando usado, uma formadiferente de persuaso, com o objetivo de levar o leitor a consumir um produto e tambm difundir acultura.

    A televiso, muitas vezes, divulga sua programao e estimula sua audincia atravs de seusprprios produtos comunicacionais fazendo referncias uns aos outros. Em alguns episdios de

    desenhos animados, como os Simpsons, por exemplo, nota-se esta referncia. Os desenhos animadostambm so direcionados, e em alguns casos, principalmente, aos adultos. Prova disto est nautilizao de obras da arte (clssica, surrealista, etc.) como elementos que compem seus argumentos.A maioria das crianas no faz ideia da existncia da "Capela Cistina". ( bem verdade que muitosadultos tambm esto na mesma situao!). Mas tudo isso para dizer que a intertextualidade s fazsentido e, s percebida, quando o pblico e/ou audincia a que destinam-se, tem um conhecimentoprvio acerca do assunto.

    Quanto intertextualidade na publicidade, pode-se dizer que ela assume a funo no s depersuadir o leitor como tambm de difundir a cultura, uma vez que se trata de uma relao com a arte(pintura, escultura, literatura etc). Assim, quando h a utilizao deste recurso, boa parte do efeito de

    uma propaganda ou do ttulo de uma reportagem proveniente da referncia feita a textos pr-existentes. Esses textos ora so retomados de forma direta, ora de forma indireta, levando odestinatrio a reconhecer no enunciado o texto citado.

    Veja a seguir outros intertextos:

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    15/65

    15

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Clich: o enunciado que se transformou em uma unidade lingustica estereotipada por ser muitoproferido pelas pessoas. Num jornal sobre esportes foi criada uma charge com o enunciado: Por trsde todo grande time h um grande treinador. Tal enunciado remete a outro pertencente ao patrimniosocial Por trs de todo grande homem h uma grande mulher. O enunciado do jornal, na poca,pretendia elogiar a conduta do treinador pelo fato do time Vasco ter ganhado o campeonato.

    Outro exemplo destacado foi o da publicidade do SESI a respeito de um concurso de empresassobre a qualidade no trabalho. O slogan da publicidade era: Se o trabalho dignifica o homem, otrabalho em equipe o torna um vencedor. Observa-se que a partir de um clich O trabalho dignificao homem, utilizado numa estrutura com valor condicional Se o trabalho..., ressalta-se em seguida aimportncia do trabalho em equipe ... o trabalho em equipe o torna um vencedor.

    Proverbial: um enunciado popular que expressa de forma sucinta uma mensagem. O ttulo de umareportagem sobre funcionrios e aes trabalhistas: Depois do suor, o desamparo que remete aoprovrbio Depois da tempestade vem a bonana. Sendo que ao contrrio desse (depois dos fatosnegativos vem o positivo), o ttulo da reportagem sugere que depois de todo esforo suor, osfuncionrios no obtiveram o que almejavam: o reconhecimento. Foram vtimas do desemprego, odesamparo.

    Palavro: o enunciado que apresenta uma palavra grosseira ou obscena. O jornalista Agamenon,responsvel por uma matria do Segundo Caderno do jornal O Dia, cuja caracterstica o humor,nomeou uma de suas matrias de Cuba se Fidel. No mesmo, observa-se a aluso ao palavro sefo... e um jogo entre este e o nome do presidente de Cuba, Fidel Castro, por causa da semelhanafontica Fidel e fo.

    Bblico: quando o enunciado menciona uma passagem da Bblia. O ttulo de uma reportagem sobreo turismo na Ilha Grande A f move turistas nas trilhas da Ilha Grande se referindo passagembblica que diz: A f move montanha.

    Literrio: quando o enunciado refere-se a verso(s), a passagem(ns) ou a ttulo(s) de obra.- Exemplo de ttulo de obra: A publicidade da marca Ceramidas usa como slogan o seguinteenunciado: Dona Flor e seus dois produtos, que, por sua vez, se reporta a uma das obras de JorgeAmado intitulada Dona Flor e seus dois maridos. Observa-se assim que na publicidade Dona Flor representada pela marca Ceramidas e os dois produtos pelo xampu e pelo condicionador.

    Uma matria da revista Isto intitulada: E o vento levou sobre produtos para cabelo o ttulode uma obra de Margaret Mitchell. Essa matria mostra como os produtos mencionados deixam oscabelos leves e soltos.- Exemplo de verso: O ttulo de uma reportagem: Infinito, mas enquanto durou se referindo ao versode Vincius de Moraes que seja infinito enquanto dure que, por sua vez, faz aluso ao pensamento deSofocleto: O amor eterno enquanto dura.

    Musical: quando a letra de uma msica se reporta a outra letra j existente. Num trecho do rapSem sade, de Gabriel O Pensador, o compositor diz: ... me cansei de lero-lero / d licena mas euvou sair do srio... mencionando uma das msicas de Rita Lee.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    16/65

    16

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    Com base em tudo o que vimos a respeito de intertextualidade, podemos destacar a importncia doconhecimento de mundo e como esse fator interfere no nvel de compreenso do texto. Pois, embora oaluno-leitor no identifique o intertexto, vai entend-lo. Mas ao relacionar um texto com outro,compreender o texto lido na sua profundidade e por consequncia ser capaz de refletir sobre orecurso adotado pelo autor para quando for compor textos. Dessa forma, na aula de Portugus, porexemplo, o aluno compreender que a intertextualidade um das estratgias utilizadas para aconstruo de um texto. No caso especfico da publicidade, quando utiliza a intertextualidade umaforma diferente de persuaso cuja inteno de levar o leitor a consumir um produto e de tambmdifundir a cultura.

    A intertextualidade deve fazer parte do planejamento de texto daquele que escreve, pois, afinal, acultura do pas e do mundo que esto em movimento. Cabe a ele, ento, reconhecer intertextos e aredigir utilizando tambm esse recurso.

    EXERCCIOSLeia este anncio:

    1.Que tipo de linguagem utilizado na

    construo do texto: a verbal, a visual ou ambas?

    2.Leia apenas a frase situada na parte inferior doanncio. Qual o seu sentido?

    3.Observe a figura central do anuncio: a roupa,os cabelos, o meio-sorriso da pessoa fotografadae o cenrio de fundo. Por esse conjunto deelementos, notamos que no se trata de umanncio comum, pois h nele a voz de outrotexto bastante conhecido. Que texto esse?

    4.Ao lanar mo desta intertextualidade, oanunciante pode correr alguns riscos, pois oleitor pode no conhecer a obra de Leonardo daVinci.

    a) Levando em conta que o produto anunciado um amaciante de roupas (portanto algo refinado, quenem todos utilizam) e que o anncio foi publicado numa revista de pblico predominantementefeminino e de classe mdia, provvel que a maior parte dos leitores perceba o recurso deintertextualidade empregado ou no? Por qu?

    b) Quanto aos leitores que no conhecem Da Vinci, eles poderiam, mesmo assim, ser atingidos pelo

    apelo do anncio, de modo que seu objetivo principal promover o produto fosse alcanado? Porqu?

    5.Imagine como seria um anncio tradicional desse produto (compre..., use..., experimente...) ecompare ao anncio lido. Levante hipteses: que vantagens h, para o anunciante, em criar umanncio com esse tipo de inovao?

    (Portugus: Linguagenspg.111, 112 e 113)

    6.Retome os poemas Cano do exlio. Observe que quando voc redige um texto, voc elabora seupronunciamento sobre uma determinada realidade. Por isso, num texto, voc deve fazer uma reflexopessoal e no repetir lugares-comuns. Escreva agora sua cano do exlio mostrando como voc vsua ptria. Seu texto deve ser em verso, mas no precisa ter rima. importante que nele voc arrole

    imagens que indiquem a concepo que voc tem de seu pas. Sua produo deve ter um ttulo e, nomnimo, 20 linhas.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    17/65

    17

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    5 O TEXTO E SUAS RELAES COM A HISTRIA

    Todos conhecem as aventuras do Super-homem. Ele no um terrqueo, mas chegou Terra, aindacriana, numa nave espacial, vindo de Crpton, planeta que estava para ser destrudo por uma grandecatstrofe. dotado de poderes sobre-humanos; seus olhos de raio X permitem ver atravs dequaisquer corpos, a uma distncia infinita; sua fora ilimitada, possibilitando-lhe escorar pontesprestes a desabar e levantar transatlnticos; a presso de suas mos submete o carbono a temperaturasto altas que o transforma em diamante; sua apurada audio permite-lhe escutar o que se fala emqualquer ponto. Pode voar a uma velocidade igual da luz e, quando ultrapassa essa velocidade,atravessa a barreira do tempo e transfere-se para outras pocas; pode perfurar montanhas com oprprio corpo; pode fundir metais com o olhar. Alm disso, tem uma srie de qualidades: beleza,bondade, humildade. Sua vida dedicada causa do bem.

    O Super-homem vive entre os homens sob a aparncia do jornalista Clark Kent, que um tipomedroso, tmido, pouco inteligente, mope. Clark Kent apaixonado por Lois Lane (quando osquadrinhos vieram para o Brasil, o nome dela era Miriam Lane, depois passou a ser Lois), sua colega,que, na verdade, ama loucamente o Super-homem.

    J vimos que todo texto um pronunciamento sobre uma dada realidade. Ao fazer essepronunciamento, o produtor do texto trabalha com as ideias de seu tempo e da sociedade em que vive.

    Com efeito, as concepes, as ideias, as crenas, os valores no so tirados do nada, mas surgem dascondies de existncia. As concepes racistas, por exemplo, aparecem numa poca em que certospases, necessitando de mo de obra, iniciam a escravizao de negros. A ideia de que certas raas soinferiores a outras no uma maldade dos brancos, mas uma justificativa apaziguadora da conscinciados senhores de escravos. Essas concepes ganham um impulso maior quando os pases europeus,precisando de matrias-primas, iniciam o processo de colonizao da frica e da sia. A colonizao, assim justificada por um belo ideal: expandir a civilizao.

    Todo texto assimila as ideias da sociedade e da poca em que foi produzido. Neste momento, vocpoderia estar dizendo que o texto do Super-homem prova exatamente o contrrio, pois nada tem ele aver com a realidade histrica, na qual no existem super-homens. Quando se afirma que os textos serelacionam com a histria, no se quer dizer que eles narram fatos histricos de um pas, mas querevelam os ideais, as concepes, os anseios e os temores de um povo numa determinada poca. Nesse

    sentido, a narrativa do Super-homem mostra os anseios dos homens das camadas mdias dassociedades industrializadas do sculo XX, massacrados por um trabalho montono e por uma vida semqualquer herosmo. Esse homem, mediocrizado e inferiorizado, nutre a esperana de tornar-se um sertodo-poderoso assim como Clark Kent, que se transforma em Super-homem. As condies deimpotncia do homem diante das presses sociais geram um ideal de onipotncia refletido na narrativado Super-homem.

    Alm disso, as concepes de sociedade em que esse texto foi produzido esto presentes na ideia deBem.

    Como nota Umberto Eco, famoso autor italiano, um indivduo dotado dos poderes do Super-homem poderia acabar com a fome, a misria e as injustias do mundo. No entanto, ela no faz nadadisso. Ao contrrio, o bem que pratica a caridade, e o mal que combate o atentado propriedadeprivada. Lutar contra o mal assim combater ladres. Dedica sua vida a isso.

    Como se v, as ideias produzidas num determinado tempo, numa dada poca esto presentes notexto. Cabe lembrar, no entanto, que uma sociedade no produz uma nica forma de ver a realidade.Como ela dividida pelos interesses antagnicos dos diferentes grupos sociais, produz ideiascontrrias entre si. A mesma sociedade que gera as ideias racistas produz ideias antirracistas. Por isso,controem-se nessa sociedade textos que fazem pronunciamentos antagnicos com relao aos mesmosdados da realidade.

    H algumas ideias que predominam sobre suas contrrias numa dada poca. Elas refletem osinteresses dos grupos sociais dominantes. Fazer uma reflexo pessoal analisar essas ideias demaneira crtica, verificando at que ponto elas tm apoio na realidade.

    Para entender com mais eficcia o sentido de um texto, preciso verificar as concepes correntesna poca e na sociedade em que foi produzido. Assim, no se corre o risco de considerar, por exemplo,

    como pronunciamentos idnticos um texto sobre a democracia ateniense e um sobre a democracia nassociedades capitalistas modernas, que, na verdade, tratam de concepes distintas. As ideias de umapoca esto presentes nos significados dos textos. Observe a figura a seguir: quais mudanasdiscursivas ocorreram ao longo da histria?

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    18/65

    18

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    Cabe lembrar ainda que as ideias de uma poca so veiculadas por textos, uma vez que no existemideias puras, ou seja, no transmitidas linguisticamente. Assim, analisar as ideias de um texto estudaro dilogo entre textos, em que um assimila e registra as ideias presentes nos outros.

    Vamos fazer agora a anlise de dois textos cujo discurso mudou ao longo da histria.

    A CARTEIRA PROFISSIONAL (1976)

    Por menos que parea e por mais trabalho que d ao interessado, a carteira profissional umdocumento indispensvel proteo do trabalhador.

    Elemento de qualificao civil e de habilitao profissional, a carteira representa tambm ttulooriginrio para a colocao, para a inscrio sindical e, ainda, um instrumento prtico do contratoindividual de trabalho.

    A carteira, pelos lanamentos que recebe, configura a histria de uma vida. Quem a examina, logover se o portador um temperamento aquietado ou verstil; se ama a profisso escolhida ou ainda noencontrou a prpria vocao; se andou de fbrica em fbrica, como uma abelha, ou permaneceu nomesmo estabelecimento, subindo a escala profissional. Pode ser um padro de honra. Pode ser umaadvertncia.

    Alexandre Marcondes FilhoMENSAGEM DO SENHOR MINISTRO (1988)

    Criada em 1932, a Carteira de Trabalho e Previdncia Social resistiu ao passar dos anos,assimilando com muita presteza as profundas modificaes que se registraram, nestas dcadas, nacomposio, distribuio e qualificao da nossa fora de trabalho.

    Sem nenhum exagero, pode-se afirmar que este documento, por muitos ainda hoje conhecido comocarteira profissional, converteu-se num dos mais importantes instrumentos disposio dotrabalhador, fazendo as vezes de cdula de identidade, ttulo de crdito, atestado de antecedentes, deboa conduta e de residncia, para citar apenas algumas de suas mltiplas utilidades.

    Em sua simplicidade, a CTPS reflete a carreira do trabalhador e sua evoluo profissional. Cabe-lhe, pois, proteg-la atenta e cuidadosamente, porque enquanto pelos seus aspectos externos essaCarteira revela traos importantes da personalidade e da formao do seu possuidor, os registros

    internos, habitualmente insubstituveis, se constituem nas melhores garantias da preservao e daefetivao dos seus direitos trabalhistas e previdencirios.

    Almir Pazzianotto Pinto

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    19/65

    19

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Instituda na dcada de 1930, a Carteira de Trabalho e Previdncia Social (CTPS) apresentava umadupla funo, mantida at hoje: alm de resguardar os direitos do trabalhador funcionava tambmcomo um tipo de condensao das atividades profissionais deste, servindo de alerta aos empregadores:Quem a examina, logo ver se o portador um temperamento aquietado ou verstil; se ama aprofisso escolhida ou ainda no encontrou a prpria vocao; se andou de fbrica em fbrica, comouma abelha, ou permaneceu no mesmo estabelecimento, subindo a escala profissional. Pode ser umpadro de honra. Pode ser uma advertncia.

    Atendendo s orientaes da CTPS de 1976, um funcionrio admitido na LIGHT nome daempresa estadual de energia eltrica na poca designado para o setor de pessoal da empresa, recebeua seguinte orientao do seu chefe: Fique atento carteira profissional do candidato e ao nmero deanos que permaneceu em cada empresa; entreviste-o bem prximo, para ver se ele no cheira acachaa. Conte uma boa piada para faz-lo rir e avaliar a sua sade, a partir da qualidade dos seusdentes.

    Era esta a postura da empresa diante do trabalhador.O discurso escrito na CTPS foi reformulado e, em 1988, ela passou a ser atestado de antecedentes,

    de boa conduta e de residncia, para citar apenas algumas de suas mltiplas utilidades. Permanecia odiscurso anterior, agora aprimorado.

    Atualmente, a CTPS possui nas pginas iniciais quatro itens do Art.XXIII, da Declarao Universal

    dos Direitos do Homem, absolutamente utpicos para o momento atual: dizendo que Todo homemtem direito ao trabalho, livre escolha de emprego, a condies justas e favorveis de trabalho e proteo contra o desemprego. Mas ser que isso verdade?

    Em seguida, h um trecho do Decreto-Lei n229, de 28 de fevereiro de 1967, e na sequncia umtexto dirigido ao trabalhador, que diz assim:

    TRABALHADOR

    Esta a sua Carteira de Trabalho e Previdncia Social, instituda pelo Decreto n 22.035, de 29 deoutubro de 1932, e posteriormente reformulada pelo Decreto-Lei n 5.452, de 1 de maio de 1943, queaprovou a Consolidao das Leis do Trabalho.

    o documento obrigatrio para o exerccio de qualquer emprego, seja de natureza urbana, rural, de

    carter temporrio, permanente, ou mesmo em atividade profissional exercida por conta prpria.Nela so registrados os salrios e todos os elementos bsicos para o reconhecimento de seusdireitos perante a Justia do Trabalho, bem como para a obteno da aposentadoria e demaisbenefcios da Previdncia Social, tanto para voc como para seus dependentes. Alm de registrar todasas relaes de trabalho de seu portador, comprovando o vnculo que mantm com o empregador, aCTPS garante-lhe tambm o direito ao Seguro-Desemprego.

    Alm de valer, tambm, como prova de identidade, conforme dispe o artigo 40 da Consolidaodas Leis do Trabalho, o conjunto de anotaes da CTPS e seu estado de conservao espelham aconduta, a formao e o passado do trabalhador. Pelo conjunto das informaes que encerra, serve, aomesmo tempo, como documento de crdito e atestado de antecedentes, tornando-se instrumento demltiplas utilidades ao seu portador.

    Pela sua importncia, seu dever proteg-la e cuid-la. o registro de toda a sua vida profissional

    e a garantia da preservao e validade de seus direitos como trabalhador e cidado, contribuindo paraassegurar o seu futuro e de seus dependentes.

    (sem assinatura)

    Observamos a mudana no discurso escrito, porm a CTPS permanece sendo, intrinsicamente, umatestado de conduta pessoal e profissional, uma vez que o conjunto de anotaes da CTPS e seuestado de conservao espelham a conduta, a formao e o passado do trabalhador. Pelo conjunto dasinformaes que encerra, serve, ao mesmo tempo, como documento de crdito e atestado deantecedentes (...), ou seja, as palavras mudaram, mas os conceitos no. Ao contrrio do discursopercebido na figura relacionada ao ensino (1969-2009).

    O artigo a seguir, extrado da revista Lngua Portuguesa, d conta da anlise de campanhas

    publicitrias e sua relao com o contexto e a histria.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    20/65

    20

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    5.1 OS LIMITES DA RETRICA DE MERCADO

    Polmica mundial envolvendo campanha de agncia brasileira mostra a dificuldade em controlar ainterpretao dos consumidores

    O anncio Avies, da WWF, provocou reaes indignadas nos EUA contra a agncia DM9DDB: texto insensvel

    Uma das mais tarimbadas agncias do pas, com vinte anos de janela, a DM9DDB se meteu num vespeiro,ms passado, com a repercusso mundial de uma campanha publicitria criada para a WWF, organizao nogovernamental dedicada conservao da natureza. A pea, composta pelo impresso Avies e pelo filme

    Tsunami, lana uma centena de avies contra o World Trade Center. No filme, a cena escurece para dar lugar aletreiros com a premissa retrica que sustenta o anncio: "O tsunami matou 100 vezes mais pessoas do que o 11de setembro". Em seguida, o apelo reflexo: "Nosso planeta poderoso. Respeite e preserve".

    Alm do erro conceitual (tsunamis so fenmenos geolgicos, no relacionados destruio da natureza pelohomem) e da premissa controversa (o paralelo entre ato terrorista e mudana ambiental), a campanha ps emxeque um dos pilares da retrica publicitria desde a era dos reclames: a interpretao (programada) dasmensagens que veicula.

    Difcil localizar quem interpretou o anncio da WWF, conforme o planejado pela DM9, como um alerta devastao. Nos EUA, ela foi recebida antes como afronta ao sofrimento norte-americano no aniversrio de oitoanos do atentado. Foi condenada no s pela mdia especializada, como a revista nova-iorquina Advertising Age,mas por programas da rede NBC e pelo tradicional New York Times.

    Na primeira semana de setembro, o caso virou um jogo de empurra entre a agncia e o brao local da ONG.Em nota, a DM9DDB alegou que o anncio foi "fruto somente da inexperincia" dos profissionais envolvidos

    "de ambas as partes". Por sua vez, o brao brasileiro do WWF divulgou que a pea havia sido rejeitada. Depois,em nota conjunta, ambos admitiram que o anncio foi aprovado em dezembro de 2008, "equivocadamente".

    Nenhum reparo prvio, no entanto, impediu que a pea fosse divulgada imprensa por release da prpriaDM9, publicada num jornal de So Paulo antes de ter sua veiculao suspensa, inscrita no festival de Cannes epremiada com um diploma Merit pelo One Show, competio internacional da propaganda, o que deu lenha repercusso mundial do caso. O prmio foi cancelado, a pedido da agncia, mas o estrago j havia sidopotencializado por sites e blogs de todo o mundo.

    Na era da internet, com blogs bisbilhoteiros e repercusso em escala, de site a site, a possibilidade deinterpretao indesejada de mensagens publicitrias tem crescido exponencialmente. No incio de setembro, aUnimed Porto Alegre viu um anncio seu virar alvo de blogs de estudantes e publicitrios. A campanha"Cuidar", desenvolvida pela agncia Escala desde o incio do ano, partia do conceito de que, para umacooperativa de mdicos, no mero plano de sade, cuidar to importante quanto curar. Da desenvolver a sriede anncios em que letras de palavras, como "trabalho", "respeito" e "amor", fossem substitudas pelo corpo

    humano. No caso de "cuidar", no entanto, a letra i deu lugar a uma modelo esguia e ereta, o suficiente para queblogueiros a vissem como um muro a separar um verbo de um substantivo indesejado.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    21/65

    21

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Fora de contextoA infeliz coincidncia, no entanto, de circulao restrita pois publicada num caderno especial do jornal Zero

    Hora em 1 de setembro, para comemorar um prmio recebido pela empresa, espalhou-se pela blogosfera, masno teve repercusso negativa junto aos 450 mil usurios da Unimed, garante Eduardo Axelrud, diretor decriao da agncia gacha.

    - Tirada do contexto, a leitura inadvertida de fato plausvel. Mas para o consumidor, a palavra "cuidar" foiparte de uma sequncia de outras palavras que integraram uma campanha de longa durao, que traduz a ideia de

    que "nossa vida cuidar da sua", com a qual as pessoas tm familiaridade e entendimento j consolidado aolongo dos anos. Por isso, no teria havido margem a duplo sentido, nem a interpretaes escatolgicas oupornogrficas - afirma Axelrud.

    A pea, lida isoladamente, descontextualizada, autorizaria a leitura indesejada. Mas, integrante de umconjunto de aes de marketing e de propaganda, o tropeo se "contamina" pela lgica interna das outras peasque integram a rede de mensagens de uma campanha. O que reduziria, diz Axelrud, a possibilidade deinterpretao dbia.

    - O anncio no nos constrangeu. Muito pouca gente que o viu deu ateno ao fato porque ele est numcontexto maior de uma campanha que se prolongou no tempo - diz Gerson Lus Silva, gerente de marketing daUnimed Porto Alegre.

    FunerriaA leitura de duplo sentido, porm, pode ser um efeito proposital de certas campanhas. Maior empresa

    funerria do Rio de Janeiro, com 10% do mercado carioca, a seguradora Sinaf criou uma tradio de humornegro publicitrio. Para promover a empresa, a Comunicao Carioca criou uma campanha em 2003 comslogans de duplo sentido:

    "Cremao: uma novidade quentinha da Sinaf.""Nossos clientes nunca voltaram para reclamar.""O seguro de vida que voc vai dar graas a Deus. Pessoalmente.""Como planejar a morte da sua sogra."

    Apesar de produzir mensagens no limite entre a eficincia comunicativa e o mau gosto, o que poderiaafugentar os interessados nos servios da empresa, o tom inusitado dos anncios subvertia a dificuldade de aspessoas lidarem com a morte. O sucesso da campanha aumentou a procura pelos servios funerrios e facilitou aabordagem dos vendedores da empresa. Passado o impacto inicial, a atual agncia da empresa, a Script, atenuouo tom escancarado dos anncios da seguradora, mas ainda mantm a ironia de antes:

    "O melhor plano viver. Mas vai que d errado."

    "Reforme sua casa de olhos fechados.""Se beber, no dirija. Se dirigir, Sinaf.""Um dia voc no acorda e est rico.""Sinaf, 25 anos. Incrvel chegar onde chegamos perdendo um cliente atrs do outro."

    Podemos qualificar as campanhas da funerria Sinaf como um humor negro, mas com resultados.

    Caf com leiteO mais comum, no entanto, ver mensagens publicitrias que permitem dupla interpretao botarem a perder

    todo um esforo comunicativo. A Parmalat lanou em 1998 uma campanha para promover sua marca de cafsolvel. A ideia era transferir para o caf a bem-sucedida imagem da empresa de laticnios, num casamento quereproduzisse a combinao clssica do caf-com-leite. A campanha materializou a combinao numa metforavisual, em que brancos e negros formavam casais. A azeitona da empada, no entanto, foi a construo do texto,com involuntria invocao racista: "Um caf altura do leite".

    - Dizer que o caf est altura do leite partir da premissa de discriminao tica, de apresentao alegricaque refora a crena na superioridade do leite, branco, sobre o caf, que se toma por metfora do negro - entende

    A campanha da Unimed-RS, em que uma modelo substitui a letra i, dividindo a palavra "cuidar" em um verboe um substantivo indesejado

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    22/65

    22

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    Clvis de Barros, professor de tica da ECA-USP, da Escola Superior de Propaganda e Marketing, ecoordenador do Espao tica.

    Dar orientao argumentativa a uma ideia um desafio que extrapola o meio publicitrio, explica o professorFrancisco Plato Savioli, da USP e do sistema Anglo de Ensino.

    - Bom texto o que atinge o resultado programado. Bom escritor no o que escreve correto, mas o que sabeescolher para o seu texto os recursos que obedecem sua inteno. O controle da forma mais funcional paraatingir o efeito desejado um dos ingredientes da construo textual, mas h outros a controlar, como o respeito

    por crenas e valores do interlocutor, a adequao competncia interpretativa dos leitores etc. - escreveu ele Lngua.

    ExemplumA busca do ouro na criao de certas peas publicitrias passa muitas vezes por inverter expectativas, ser

    provocativo e imprevisvel, com o que se define o sucesso ou o fracasso de uma comunicao. Controlar o efeitode suas mensagens virou, por isso, o desafio retrico do mundo da propaganda.

    No por acaso, a publicidade bebe na fonte da retrica antiga. A pea criada pela DM9, por exemplo, usou omanjado recurso persuasivo do exemplum, episdio ou caso exemplar apresentado para ilustrar um ponto fortedo debate. A recomposio da mecnica discursiva mostraria que a DM9 tinha a tarefa de criar a imagem dadevastao da natureza na mente do pblico-alvo da WWF. Nada parece mais eficiente para dar dimenso dealgo do que compar-lo a exemplo palpvel e familiar.

    Efeitos sociaisPensemos num primeiro termo de comparao: o que foi devastador e est fresquinho no imaginrio popular?O tsunami, que matou mais de 280 mil pessoas desde 2006. Eureka! Mas o que poderia dar dimenso damagnitude de tal cifra? Compar-lo a uma outra devastao que tenha tido ainda maior impacto na memriacoletiva, mas saldo de vtimas bem menor. Que tal o World Trade Center? A sacada parecia genial. At algumnotar que o rei estava nu.

    - A publicidade nunca vale por ela mesma mas pelos efeitos que provoca na sociedade. Muito desuas consequncias so produzidas em cadeia para alm dos resultados mais imediatos no consumo - diz oprofessor Clvis de Barros Filho.

    O mundo da propaganda, diz Barros Filho, provoca efeitos sociais que envolvem trs nveis de leituraesperados num consumidor de mensagens comerciais. O primeiro grande efeito procurado a converso damensagem em prticas de consumo. A segunda leitura desejada a representao simblica do anunciante, areferncia a que a marca passou a ser associada aps dada campanha. Mas os publicitrios no raro ignoram uma

    terceira dimenso da interpretao de anncios, avalia o professor da USP: o da cultura tica.Para o professor, uma mensagem publicitria no s pode alterar o ritmo de vendas e consolidar uma imagemque agrada ao anunciante, como tende a participar de uma determinada maneira de interpretar o mundo e atribuirvalor s coisas, que permitem escolhas relativas no s ao consumo.

    - possvel conceber uma mensagem que se converta em ganho de consumo e, num segundo momento, emconstruo positiva da marca, mas se inscreva no mundo social de modo a contribuir para a defesa de valoresdiscriminatrios, xenfobos ou que apequenam a existncia humana. Esse cuidado deve ser tomado - diz BarrosFilho.

    ValoresFoi-se a poca em que um anncio demonstrava a capacidade do produto. Um refrigerante mata a sede, um

    carro nos leva a um lugar, o saplio limpa mais. Um dia, veio a sacada e o refri passou a espantar os males davida, uma cervejinha virou afrodisaco e um singelo sanduche, sinnimo de realizaes. At fumante virou

    atleta nos tempos em que anncios de cigarro eram parte da paisagem.O mundo sob o prisma da publicidade sem ndoas ou crises, pois o menor sinal negativo termina anuladopela exibio triunfal do produto. Quando Coca-Cola d vida a tudo e o primeiro suti resume a puberdade, umsinal dado e consumido. Mas sempre algo trai a dimenso retrica, o fato de a mensagem ser feita para nosconvencer a comprar um peixe. Casos como o dos cem avies, do caf altura do leite ou do humor funerriomostram que o rudo ocorre quando a publicidade tenta vender seu peixe a qualquer preo.

    Internet estimula stira a agncias e anunciantesEmbora recebendo interpretaes distintas por parte das pessoas que tiveram contato com seus anncios,

    tanto a WWF como a Unimed-RS atribuem a repercusso de suas recentes peas publicitrias ao que consideramuma terra de ningum: a internet. Veiculadas uma nica vez cada um, em jornais locais, as peas "Avies" e"Cuidar" se multiplicaram em blogs e no twitter.

    O presidente da DDB Brasil, Srgio Valente, admitiu o impacto da difuso global de tropeos localizados ao

    divulgar em setembro um constrangido pedido de desculpas pelos anncios da campanha "Avies".- Essas peas publicitrias, ainda que veiculadas uma nica vez em veculos locais, acabaram por gerar

    consequncias globais que mostram que o alcance de uma pea publicitria j no mais apenas local.Eduardo Axelrude, da agncia Etapa, que detm a conta da Unimed-RS, tambm acusa o golpe on-line.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    23/65

    23

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    - A repercusso de casos assim mostra a capacidade da internet de "viralizar", replicar comentrios sobpseudnimo, extrapolando a incidncia do caso um a um - diz ele.

    A internet virou um celeiro de stiras a anncios, para alm dos comerciais de mentirinha criados pelo grupoDesencannes, famoso por inventar pardias publicitrias, como a que simula Ronaldo Fenmeno num annciodo Santander: "Eu nunca fico no Banco do Brasil".

    A divertida iniciativa do Desencannes restringe-se homenagem pardica. No o que foi feito por piratas dapublicidade que criaram, por exemplo, um site de vdeos para a marca GM, como se a prpria montadora

    apontasse seus produtos como poluidores e recriminasse sua poltica de distribuio de bnus para executivos.Em outra ao viral, o logotipo do banco Bradesco foi redesenhado para a insero de avies colidindo com astorres gmeas, no 11 de setembro.

    O comercial das motos Dafra com o ator Wagner Moura foi redublado para desmentir todas as qualidades quea pea publicitria original anunciava sobre a marca.

    Ronaldo na pardia do site Desencannes e o logotipo do Bradesco premonitrio do 11 de setembro: ao viral

    (JUNIOR, Luiz Costa Pereira. Os limites da retrica de mercado. Lngua Portuguesa.So Paulo, Ano IV, n 48, p. 46 50. Out. 2009)

    QUESTIONRIO

    1. Considerando a campanha publicitria Avies, da WWF, o que provocou reaes indignadas nos

    EUA contra a agncia DM9DDB? Por que o pblico reagiu assim?2. Para Eduardo Axelrud, diretor de criao da agncia gacha Escala, a campanha da Unimed-RSno teve repercusso negativa junto aos 450 mil usurios da Unimed. Por que ele alega isso? Vocconcorda com ele?

    3. Analise o sucesso das campanhas publicitrias da seguradora Sinaf, maior empresa funerria do Riode Janeiro, promovido pela agncia Comunicao Carioca. Voc acredita que a empresa correu o riscode ser prejudicada pela campanha publicitria? Justifique sua resposta.

    4. Comente a fala do professor Francisco Plato Savioli a respeito da construo textual.

    5. Estudamos um recurso chamado intertextualidade e a importncia de se considerar o conhecimentoprvio do leitor (o seu repertrio) sobre o assunto. Qual a intertextualidade estabelecida pelo trecho aseguir: A sacada parecia genial. At algum notar que o rei estava nu.?

    6. Percebe-se que a Internet tem um importante papel na divulgao das campanhas publicitrias.Comente-o.

    7. O grupo Desencannes ficou famoso por inventar pardias publicitrias, ou seja, comerciais dementirinha na Internet, a inteno era uma homenagem pardica. Porm, piratas da publicidadecriaram propagandas desagradveis. Quais foram estas propagandas e que prejuzos voc acredita quepossam trazer para as empresas citadas?

    Para a prxima aula, trazer dicionrio.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    24/65

    24

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    6 RESUMO

    Resumo uma condensao fiel das ideias ou dos fatos contidos no texto. Resumir um textosignifica reduzi-lo ao seu esqueleto essencial sem perder de vista trs elementos:

    a) cada uma das partes essenciais do texto;b) a progresso em que elas se sucedem;

    c) a correlao que o texto estabelece entre cada uma dessas partes.

    O resumo , pois, uma reduo do texto original, procurando captar suas ideias essenciais, naprogresso e no encadeamento em que aparecem no texto. Quem resume deve exprimir, em estiloobjetivo, os elementos essenciais do texto. Por isso no cabem, num resumo, comentrios oujulgamentos ao que est sendo condensado.

    Muitas pessoas julgam que resumir reproduzir frases ou partes de frases do texto original,construindo uma espcie de "colagem". Essa "colagem" de fragmentos do texto original no um

    resumo. Resumir apresentar, com as prprias palavras, os pontos relevantes de um texto. Areproduo de frases do texto, em geral, atesta que ele no foi compreendido.Para elaborar um bom resumo, necessrio compreender antes o contedo global do texto. No

    possvel ir resumindo medida que se vai fazendo a primeira leitura. evidente que o grau dedificuldade para resumir um texto depende basicamente de dois fatores:

    a) da complexidade do prprio texto (seu vocabulrio, sua estruturao sinttico-semntica, suasrelaes lgicas, o tipo de assunto tratado etc.);

    b) da competncia do leitor (seu grau de amadurecimento intelectual, o repertrio de informaes quepossui, a familiaridade com os temas explorados).

    Alguns procedimentos para diminuir as dificuldades de elaborao do resumo:

    1. Ler uma vez o texto, ininterruptamente, do comeo at o fim: sem a noo do conjunto, maisdifcil entender o significado preciso de cada uma das partes. Essa primeira leitura deve ser feita com apreocupao de responder seguinte pergunta: do que trata o texto?

    2. Uma segunda leitura sempre necessria. Mas esta, com interrupes, com o lpis na mo, paracompreender melhor o significado de palavras difceis (se preciso, recorra ao dicionrio) e para captaro sentido de frases mais complexas (longas, com inverses, com elementos ocultos), bem como asconexes entre elas.

    3. Num terceiro momento, tentar fazer uma segmentao do texto em blocos de ideias que tenhamalguma unidade de significao. Em um texto pequeno, normalmente pode-se adotar como critrio desegmentao a diviso em pargrafos. Quando se trata de um texto maior (o captulo de um livro, porexemplo) conveniente adotar um critrio de segmentao mais funcional, o que vai depender de cadatexto. Em seguida, com palavras abstratas e mais abrangentes, tenta-se resumir a ideia ou as ideiascentrais de cada fragmento.

    4. Dar a redao final com suas palavras, procurando no s condensar os segmentos mas encade-losna progresso em que se sucedem no texto e estabelecer as relaes entre eles.

    (SAVIOLI, F.P. & FIORIN, J.L. Para entender o texto: leitura e redao. 17 ed. So Paulo: tica, 2007 pg. 420 e 421)

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    25/65

    25

    Autora: Lucivnia A. S. Perico

    Exemplo:

    A Receita Federal brasileira vai iniciar um processo de integrao com o fisco dos demais pases doMercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai) para combater as fraudes fiscais que esto ocorrendo nasoperaes comerciais feitas entre empresas do bloco econmico.

    Com a globalizao, os chamados "preos de transferncia" se transformaram no principal alvo dasadministraes tributrias dos pases filiados ao Centro Interamericano de Administradores Tributrios(CIAT). Por esse mecanismo, as empresas conseguem fraudar o fisco realizando operaes de comprae venda com preos que no correspondem ao valor real dos produtos ou servios negociados. Emtodos os casos, sempre necessrio utilizar um paraso fiscal - pas que apresenta vantagens e isenestributrias.

    No caso de uma exportao, a empresa vende seu produto por um preo muito baixo, o quecaracteriza uma operao no-lucrativa (portanto, sem incidncia de Imposto de Renda). A venda intermediada por uma empresa localizada em um paraso fiscal, que recoloca o preo em seu patamarreal e conclui a venda ao comprador. O lucro realizado por essa empresa retorna ao exportador semnus fiscal.

    Na importao, a operao inversa. O produto comprado a um preo elevado, reajustado em umparaso fiscal antes de chegar ao seu destino. O importador alega prejuzo na operao e escapa ao

    fisco."A globalizao, que agilizou e sofisticou os negcios entre as empresas, criou modernas doenasfiscais. Temos que combat-las", disse o Secretrio da Receita Federal do Brasil, Everardo Maciel, Folha.

    Apenas um trabalho conjunto entre os diversos pases do Mercosul poder extinguir ou, pelomenos, neutralizar as fraudes fiscais internacionais.

    (Folha de S. Paulo - 18.5.97, com adaptaes)

    Resumo

    A globalizao da economia, embora tenha agilizado e sofisticado os negcios entre as empresas,tambm criou algumas "doenas", como fraudes fiscais que esto ocorrendo nas operaes comerciaisentre empresas do Mercosul. Assim, o Brasil e os pases do Mercosul devem trabalhar em conjunto afim de extinguir, ou ao menos neutralizar, essas fraudes fiscais internacionais.

    ATIVIDADE

    1 Retome o artigo Os limites da retrica de mercado, extrado da revista Lngua Portuguesa.

    2 J fizemos anteriormente uma primeira leitura ininterrupta, agora importante fazer uma segundaleitura e destacar as palavras que voc desconhece; logo aps, procurar o seu significado nodicionrio;

    3 Na terceira leitura, grife em cada pargrafo a ideia central (tpico frasal);

    4 Por fim, escreva o resumo, com suas prprias palavras, utilizando o menor nmero de linhaspossvel.

  • 5/24/2018 APOSTILA-Gramatica e Redacao Tecnica-rev

    26/65

    26

    LTR/REP/RCP - Apostila de Redao Tcnica

    7 RESENHA

    Resenhar significa fazer uma relao das propriedades de um objeto, enumerar cuidadosamenteseus aspectos relevantes, descrever as circunstncias que o envolvem. O objeto resenhado pode ser umacontecimento qualquer da realidade (um jogo de futebol, uma comemorao solene, uma feira delivros) ou textos e obras culturais (um romance, uma pea de teatro, um filme).

    A resenha, como qualquer modalidade de discurso descritivo, nunca pode ser completa e exaustiva,j que so infinitas as propriedades e circunstncias que envolvem o objeto descrito. O resenhadordeve proceder seletivamente, filtrando apenas os aspectos pertinentes do objeto, isto , apenas aquiloque funcional em vista de uma inteno previamente definida.

    Imaginemos duas resenhas distintas sobre o mesmo objeto, o treinamento dos atletas para uma copamundial de futebol: uma resenha destina-se aos leitores de uma coluna esportiva de um jornal; outra,ao departamento mdico que integra a comisso de treinamento. O jornalista, na sua resenha, vairelatar que um certo atleta marcou, durante o treino, um gol olmpico, fez duas coloridas jogadas decalcanhar, encantou a plateia presente e deu vrios autgrafos. Esses dados, na resenha destinada aodepartamento mdico, so simplesmente desprezveis.

    Com efeito, a importncia do que se vai relatar numa resenha depende da finalidade a que ela sepresta. Numa resenha de livros para o grande pblico leitor de jornal, no tem o menor sentido

    descrever com pormenores os custos de cada etapa de produo do livro, o percentual de direitoautoral que caber ao escritor e coisas do tipo.A resenha pode ser puramente descritiva, isto , sem nenhum julgamento ou apreciao do

    resenhador, ou crtica, pontuada de apreciaes, notas e correlaes estabelecidas pelo juzo crtico dequem a elaborou.

    A resenha descritivaconsta de:

    a) uma parte descritiva em que se do informaes sobre o texto:- nome do autor (ou dos autores);- ttulo completo e exato da obra (ou do artigo);- nome da editora e, se for o caso, da coleo de que faz parte a obra;

    - lugar e data da publicao;- nmero de volumes e pginas.

    Pode-se fazer, nesta parte, uma descrio sumria da estrutura da obra (diviso em captulos,assunto dos captulos, ndices, etc.). No caso de uma obra estrangeira, til informar tambm a lnguada verso original e o nome do tradutor (se tratar de traduo).

    b) uma parte com o resumo do contedo da obra:

    - indicao sucinta do assunto global da obra (assunto tratado) e do ponto d