Citicercose

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PARASITOLOGIA MÉDICA

PARASITOLOGIA MÉDICA

CISTICERCOSE HUMANACISTICERCOSE HUMANA

CisticercoseCisticercose humana humanaCisticercoseCisticercose humana humana

O cisticerco da Taenia soliumO cisticerco da Taenia soliumA cisticercose humana é o

resultado da infecção de certos indivíduos pelas formas larvárias da tênia do porco ou Taenia solium.

As proglotes grávidas dessa tênia (1) contêm, cada uma, 30 a 50 mil ovos já embrionados (2), isto é, com oncosferas formadas.

Os pacientes parasitados elimi-nam quase todos os dias pequenos segmentos do estróbilo com 3 a 6 proglotes, por ocasião das evacua-ções.

As superfícies de apólise (que resultam da fragmentação da cadeia e, portanto, sem tegumen-to) permitem que por aí os fundos de saco uterinos herniem e se rompam, liberando seus ovos.

A condição para que os ovos eclodam é sua passagem pelo estômago e duodeno, onde agem os sucos digestivos e a bile, o que sucede normal-mente no porco.

Quando isso se dá no homem, a oncosfera liberada e ativada invade a mucosa intestinal e penetra na circu-lação, indo localizar-se em algum tecido do organismo.

Ela se transforma então em cisticerco.

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O processo de infecçãoO processo de infecçãoO mecanismo envolvido pode ser

por:─ hétero-infecção,─ por auto-infecção externa,─ ou por auto-infecção interna.Na hétero-infecção, que é o caso

mais comum, o paciente ingere acidentalmente os ovos da tênia, veiculados pela água, por alimentos contaminados ou por mãos sujas.

O portador de T. solium, em uma casa, representa alto risco para os que aí convivem. Pois, suas fezes são muito ricas em ovos.

Por vezes um conjuge tem a teníase e o outro a cisticercose.

Nesses casos o número de cisticercos adquiridos costuma ser pequeno.

A gravidade da infecção dependerá da localização dos parasitos (no olho, no sistema nervoso central etc.).

Na auto-infecção externa, o paciente é portador de uma tênia adulta e, por suas mãos sujas, ingere muitos ovos que vão formar cisticercos.

Na auto-infecção interna, os movimentos antiperistálticos ou de vômito levam proglotes grá-vidas até o estômago, onde são digeridas. Os ovos liberados eclodem e são ativados, indo causar cisticercose maciça e disseminada em todos os teci-dos (chamada ladraria humana).

Condição que é extremamente grave.

Formação do cisticercoFormação do cisticercoAs oncosferas sofrem elevada

mortalidade, mas as que sobre-vivem aos mecanismos imunoló-gicos e já se encontrem nos tecidos, passam por um proces-so de crescimento e, depois, de vacuolização central (A).

Em um ponto de sua parede vai formar-se uma invaginação onde se distinguem (B):

- um receptaculum capitis (a),- o escólex invaginado (b)

com suas pregas (c), e - no fundo, as 4 ventosas e o

rostro, com sua dupla fileira de acúleos.

Tudo mergulhado num líquido (d) segregado pela parede do cisticerco (e).

Aos 3 meses a diferenciação está completa. A vesícula pode atingir 15 mm de comprimento por 7 ou 8 mm da largura.

Sua forma varia com as pres-sões que sofre nos tecidos.

No olho, tende para a esferi-cidade, ou pode desenvaginar-se (como na fig. C).

Localização dos cisticercosLocalização dos cisticercos Só depois de 1 a 3 dias de ocorrida a infecção, os ovos eclodem, as oncosfe-ras invadem a mucosa intestinal e ganham a cir-culação, indo localizarem-se nos tecidos.

Na radiografia ao lado, numerosos cisticercos pro-jetam-se sobre a imagem do esqueleto, muitos deles localizados na pele e nos músculos. As localizações mais fre-qüentes, quando há raros parasitos, são : Olhos e anexos ...... 46,0% Sistema nervoso .... 41,0 Pele e subcutâneo.. 6,3 Músculos ................ 3,5 Outros órgãos ........ 3,2 Das localizações oculares, 60% ocor-rem

na retina ou no vítreo.

Doc. do Dr. Hélio Moraes, Rio de Janeiro.

Patologia da cisticercosePatologia da cisticercoseAs manifestações patológicas do

parasitismo só se evidenciam depois que o cisticerco comece a crescer.

Dois fatores respondem por sua variada sintomatologia:

─ a compressão mecânica e o deslocamento das estruturas anatômicas, com as conseqüen-tes alterações da fisiologia; p. ex., obstrução da circulação liquórica, produzindo hidroce-falia;

─ o processo inflamatório, que envolve o parasito, pode esten-der-se às estruturas vizinhas, sendo do tipo celular crônico.

Tudo depende da localização, do número e da vitalidade ou não dos parasitos.

No sistema nervosoUm ou mais cisticercos podem

alojar-se no sistema nervoso central; em geral menos de 10, mas podendo chegar excepcio-nalmente a mais de 2.000.

Em torno dos parasitos forma-se uma cápsula fibrosa, mas ao morrerem a inflamação aumenta muito, tendendo para a forma-ção de granulomas.

Reabsorvidos os restos larvá-rios, a inflamação diminui, dei-xando um nódulo cicatricial residual, que pode calcificar-se.

Como reações à distância, ocorrem por vezes leptomeningi-tes, endarterites com distúrbios circulatórios, ou lesões tóxicas do tecido nervoso.

Neurocisticercose (1)Neurocisticercose (1)

Depois, podem surgir paralisias, paresias, afasias etc. que regridem em horas ou dias. Se as crises mudam de localização, sugerem a existência de focos epileptógenos distintos.

A doença pode persistir 10 anos ou mais e terminar com a morte em estado de mal epiléptico. A cura espontânea é muito rara.

A localização dos cisticercos no SNC é aleatória, o que explica a va-riedade de quadros clínicos possíveis.

Eles são reunidos em três grupos:Formas convulsivas – Que se apre-

sentam em metade dos casos de neurocisticercose e aparecem em adultos sem antecedentes pessoais ou familiares.

As convulsões são em geral do tipo bravais-jacksoniano; isto é, crises paroxísticas, focais, com movimentos tônicos e depois clônicos unilaterais, iniciando-se em determinados grupos musculares). Outras vezes são crises generalizadas.

Corte de cérebro com numerosos cisticercos localizados de preferência na substância cinzenta (Doc. do Prof. Maffei, USP).

Neurocisticercose (2)Neurocisticercose (2)Formas hipertensivas e pseudo-tumorais

São as que apresentam sinais de hipertensão intracraniana e sintomas neuropsíquicos focais, associados ou não.

Quase tão freqüente como a forma convulsivante, caracteriza-se por: cefaléia intensa, cons-tante e com paroxísmos aos esforços físicos, vômitos em jato e edema da papila.

Este edema tende a progredir diminuindo a visão e termina com cegueira, por atrofia do nervo óptico.

Ocorrem também bradicardia, distúrbios respiratórios, sono-lência e vertigens. A neurocisti-cercose é causa de 25 a 75% dos casos de convulsões e epilepsia.

As alterações psíquicas que acompanham esse quadro são principalmente: apatia, indife-rença, diminuição da atenção, estado de torpor ou de agitação ocasional.

O processo patológico consis-te em meningite da fossa poste-rior causada por cisticercos aí situados ou à distância.

A localização no 4º ventrículo produz a síndrome de Bruns: vertigens associadas a movi-mentos bruscos da cabeça, com cefaléia e vômitos.

A distensão do 3º ventrículo leva a distúrbios ao nível do quiasma e sela túrcica que simulam tumores dessa região.

Neurocisticercose (3)Neurocisticercose (3)Formas psíquicas

Os sintomas psíquicos acom-panham muitas vezes as demais formas clínicas da doença. Mas, aqui as perturbações mentais dominam o quadro ou são as únicas presentes.

Elas não se distinguem das apresentadas em outras psico-ses, como a esquizofrenia, a mania, a melancolia, as síndro-mes delirantes etc.

OftalmocicticercoseA localização na câmara anterior

logo chama a atenção do paciente; mas, na posterior, os sintomas são discretos, indolores, e só percebidos ao interferirem com a visão central ou periférica.

As formas mais graves comprometem a visão por descolarem a retina ou por opacificarem os meios trans-parentes.

Também há dor devida à irite.As localizações orbitárias são

assintomáticas ou produ-zem exoftalmia, desvio do globo ocular ou miosite com ptose.

Cisticercose disseminadaNo tecido subcutâneo e na

musculatura esquelética não causam incômodo ou produ-zem apenas mialgias.

Mas são as localizações no sistema nervoso e nos olhos que caracterizam a forma disseminada da cisticercose.

Diagnóstico da Neurocisticercose (1)

Por sua raridade e pela varie-dade de seus quadros clínicos, que podem ser atribuíveis à outras causas, em geral não se pensa nesta doença.

Só a cisticercose ocular (com os meios transparentes) e a subcutânea são facilmente diagnosticadas.

Entretanto, a origem do pa-ciente, seus hábitos alimentares (consumo de carne de porco) e ter sido ou ser portador de uma tênia devem levar à suspeita clínica.

Os exames de laboratório são essenciais para o diagnóstico diferencial.

Exame de fezesAs técnicas são as mesmas

recomendadas para as teníases em geral (ver).

Exame do líquorÉ o mais informativo, pois:─ muitas vezes a pressão está

aumentada;─ o exame citológico mostra

aumento de proteínas, hipercito-se moderada (5-50 células/mm³), com predomínio de linfócitos; mas, é a eosinofilia no líquor que tem alto significado diagnóstico.

─ a reação de fixação do complemento é positiva para cisticercose e as reações para sífilis negativas.

Diagnóstico da Neurocisticercose (2)

Testes imunológicosAtualmente os testes mais

usados são:─ a técnica de ELISA, que mostra

sensibilidade próxima de 80%─ a imunoeletroforese, reco-

mendada por não apresentar resultados falsos positivos, mas apenas 54 a 87% dos positivos;

─ a imunofluorescência indire-ta, tida por altamente especí-fica, mas faltando-lhe a sensibi-lidade.

A limitação maior da sorologia é que a presença de anticorpos nem sempre significa infecção atual; assim como não localiza os parasitos e pode dar reações cruzadas com outras cestoi-díases.

Exames radiológicosA demonstração radiológica da

cisticercose é feita pelo encontro dos nódulos calcifica-dos, com aspecto mais ou menos característico.

A calcificação só se processa após a morte do parasito e não em todos os casos.

As calcificações intracrania-nas ocorrem apenas em 15 a 35% dos pacientes. Elas são mais freqüentes nos músculos.

A tomografia computadorizada fornece dados importantes para a localização das lesões no sistema nervoso central, tanto com parasitos vivos como com parasitos mortos.

Diagnóstico da Neurocisticercose (3)

As figuras ao lado mostram tomografias computadorizadas de crânios de pacientes com neurocisticercose.

A ─ Paciente com cisticercos vivos, três dos quais situados nos lobos frontais (áreas circula-res claras e com escólex bem visível).

Por apresentar hipertensão intracraniana, foi-lhe implantada uma válvula de derivação intraventricular-peritoneal, visível na região póstero-lateral da cabeça (lado esquerdo).

B ─ Caso com vários cisticercos vivos (áreas circulares claras) e outros calcificados (manchas negras).

C ─ Cérebro com um grande número de cisticercos calcificados.

(Tomografias do Dep. de Neurologia Clínica, da Escola Paulista de Medicina, São Paulo)

Tratamento da cisticercoseTem sido aplicado de várias

maneiras:A neurocirurgia encontra indi-

cação quando o número de parasitos é pequeno e a localiza- ção favorável para a interven-ção.

Na cisticercose ocular, a ci-rurgia não oferece dificuldades quando o parasito se encontra na câmara anterior do olho; ou em situação subconjuntival ou sub-cutânea.

No vítreo, os sucessos são da ordem de 85%; e na sub-retina de 71%, em algumas estatís-ticas.

A quimioterapia é feita com praziquantel ou com albendazol.

Esses medicamentos pene-tram rapidamente no liquor e lentamente nos cisticercos.

Os parasitos levam cerca de três meses para desaparecerem da pele, após medicação.

A tolerância ao tratamento é boa em 80% dos casos. Nos demais aparecem sintomas atri-buídos à reação dos pacientes aos produtos dos cisticercos mortos.

Em alguns casos houve hiper-tensão aguda intracraniana por edema cerebral, que exigiram cuidados de urgência.

O praziquantel é contra-indica-do na cisticercose ocular.

Todo tratamento deve ser feito com paciente internado em uma enfermaria de Clínica Neuroló-gica e sob estrita vigilância mé-dica, mesmo por alguns dias após terminada a medicação.

Pacientes assintomáticos ou com cisticercos mortos não devem ser tratados.

Profilaxia e controle da cisticercoseProfilaxia e controle da cisticercose

A profilaxia da cisticercose humana é essencialmente a da prevenção e do controle das teníases (analisada no Capítulo 11).

Mas algumas palavras devem ser ditas sobre a prevenção da auto-infecção e da hétero-infecção com ovos da Taenia solium.

Os portadores de infecção por Taenia solium e todos os casos suspeitos devem ter seu diagnóstico assegurado o mais cedo possível.

Eles devem ser tratados imediatamente com algum dos tenicidas mencionados no capí-tulo anterior sob a rubrica: “Tratamento das teníases” (Capítulo 11).

A educação sanitária deve alertar as pessoas para o perigo de consumir carne crua ou mal cozida, assim como a carne que não passou pelo controle sanitário. E ensinar às pessoas como reconhecer a eliminação de proglotes.

A higiene pessoal é muito importante: tomar banho e lavar as mãos freqüentemente, em especial depois das evacuações e antes de manipular alimentos ou fazer as refeições.

Lembrar que as mãos sujas dos portadores de teníase e certas práticas sexuais (como sodomia e felação) podem levar à ingestão de ovos de Taenia solium e causar cisticercose no portador da teníase ou em seus próximos.

Leituras complementares

ACHA, P.N. & SZYFRES, B. – Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a los animales. 2a edição. Washington, Organización Panamericana de la Salud, 1997.

LIGHTOWLERS, M. W. et al. – Vaccination against cysticer-cosis and hydatid disease. Parasitology Today, 16 (5): 191-196, 2000.

OPAS/OMS - Relatório de uma Reunião de Consulta da OPAS/OMS sobre o Complexo Teníase/Cisticercose (Brasília, 1995). Washington, DC, OPAS, 1997.

REY, L. – Bases da Parasitologia. 2a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2002 [380 páginas].

REY, L. – Parasitologia. 3a edição. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 2001 [856 páginas].

SMYTH, J.D. – The physiology of Cestodes. Edinburg, Oliver & Boyd, 1969.