COMBATE À EVASÃO. Insegurança é maior por falta de clareza sobre plano da OCDE · 2017. 9....

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Em DestaqueDIÁRIO COMÉRCIO INDÚSTRIA & SERVIÇOS � TERÇA-FEIRA, 14 DE MARÇO DE 20 1 7 3

FONTE: RECEITA FEDERAL

VISÃO GERAL

Antes e depois do Beps

2001

MP 2.158 REGULA LUCRODE CONTROLADASNO EXTERIOR

2012

OCDE COMEÇA TRAÇAR AS MEDIDASDE COOPERAÇÃO

2013

AS 15 AÇÕES DOPLANO DO BEPSÃO APRESENTADOS

2014

MP É ATUALIZADACOMO LEI COMINSPIRAÇÃO NO BEPS

2015

RELATÓRIO MAIS DETALHADO ÉENVIADO AOS PAÍSES

2016

RECEITA PADRONIZATROCA DE INFORMAÇÕESPELAS 15 AÇÕES

COMBATE À EVASÃO. Pacote tributário do organismo internacional está pouco a pouco sendoadotado no Brasil, mas ainda não se sabe até que ponto a Receita Federal atenderá às regras

Insegurança é maior por faltade clareza sobre plano da OCDEL E G I S L AÇ ÃO

Ricardo BomfimSão Pauloricardobomfim@dci.com.br

�O Brasil ainda não definiu seadotará integralmente o planode combate à evasão fiscal pro-movido pela Organização paraCooperação e Desenvolvimen-to Econômico (OCDE). Paraespecialistas, isso aumenta ainsegurança jurídica e prejudi-ca os investimentos no País.De acordo com o sócio da áreatributária do Siqueira CastroAd vo g a d o s, Daniel Clarcke, asempresas ainda não sabem co-mo o Brasil vai disciplinar o pro-grama. “Em 2013 [no lança-mento do programa], aindahavia margem para discussão.Mas agora a OCDE aprovousuas orientações e ficou uma si-tuação de incerteza, porque ospaíses vão ter que incorporaressas ações em suas leis”, diz.

O Plano de Erosão de base eTransferência de Lucros (Beps,na sigla em inglês) prevê 15 me-didas que tentam manter a tri-butação das empresas coerentecom o local de origem e de atua-ção delas. Um dos objetivos doprograma é evitar que empresasse insiram em outros paísesapenas para aproveitarem be-nefícios fiscais. “O Google colo-cou dados na Irlanda para nãoser tributado nos Estados Uni-dos, sendo que não existia con-sistência na operação na Irlan-da. É esse tipo de atitude que oplano da OCDE pretende evi-t a r”, aponta o sócio do segmen-to tributário do Fraga, Bekier-man e Cristiano Advogados,Roberto Bekierman.

Clarcke ressalta que algumasações já saíram do papel ou es-tão em vias de adoção pelo Bra-sil, mas questões como a tribu-tação na economia digital, acaracterização de Estabeleci-mento Permanente e a análisede acordos de bitributação ain-da estão muito atrasadas. na vi-são dele, tudo isso prejudica asdecisões de investimento doempresário brasileiro. “No Bra-sil a insegurança é maior, por-que não seguimos totalmenteas regras da OCDE sobre tribu-tação internacional”, observa.

De acordo com especialistas, aatual crise econômica piora a si-tuação do País, visto que ascompanhias ainda estão caute-losas em fazer grandes projetosnacionais, e com a insegurançajurídica que gira em torno doBeps, mesmo os investimentosexternos se tornam incertos.

“O custo de compliance dasempresas com atuação interna-cional vai aumentar por causadas obrigações acessórias. Asmultinacionais tanto daqui co-mo do exterior vão ter que seconcentrar apenas em negóciosapoiados em razões comerciaisv á l i d a s”, avalia Clarcke.

Os próprios acordos de bitri-butação que o País tem com 33nações estão ameaçados, naopinião de Roberto Bekierman.“A antiguidades desses contra-

tos, aliada ao fato de não terem si-do revisados ainda, torna prová-vel alguma modificação nofuturo para que eles fiquem deacordo com o que quer a OCDE”,afirma o especialista.

Enquanto isso, o fisco dá sinais

de que pretende regulamentaraos poucos as 15 ações do Beps. AInstrução Normativa 1.681/2016da Receita Federal, que imple-menta as orientações da Ação 13,por exemplo, obriga algumasempresas a fazer um relatórioanual com informações e indica-dores nos países em que tiverempresença. “Uma multinacionalcom controle no Brasil vai ter quetrazer uma série de informaçõessobre lucro ou prejuízo fiscal emcada um dos países [em queatua]. A empresa mandará issopara o fisco, que vai trocar a infor-mação com outros países”, expli-ca Daniel Clarcke. Como conse-quência haverá um custo maiorde compliance e aumentará acomplexidade de algumas decla-rações de imposto, acrescenta.

M u d a n ç asAlém disso, a insegurança porcausa do momento de transiçãopara as regras do Beps não é ex-clusividade daqui. Os paísesque fazem parte da OCDE e ou-tros membros do G-20 (Grupodas 20 maiores economias domundo mais a União Europeia)que se comprometeram a ado-tar o plano também estão em fa-se de internalizar as novas re-gras. “Possibilidades deinvestimento no exterior po-dem ser revistas. Uma empresaque possui uma holding emuma jurisdição que possui uma

baixa carga tributária pode per-der esse benefício fiscal”, co-menta Clarcke.

Segundo o sócio do A n d ra d eMaia, Leonardo Aguirra de An-d ra d e, a iniciativa é boa, mas al-guns cuidados precisam ser to-mados. Ele cita como exemplonegativo a Medida Provisória685/15, que tinha como objeti-vo criar a declaração de planeja-mento tributário, objeto das re-comendações da Ação 12 doBeps. A norma causou polêmicaquando foi anunciada, e acabousendo derrubada no Congresso.Na opinião do advogado, a MP

não foi convertida em lei porconter diversas incompatibili-dades com o ordenamento jurí-dico brasileiro. “Muitas vezes, aimportação das recomenda-ções e critérios internacionaisde maneira acrítica, sem levarem considerar os limites e as pe-culiaridades do ordenamentobrasileiro, é temerária” avisa oespecialista do Andrade Maia.

Para Clarcke, a confusão quefoi gerada em cima da MP é umaprova da dificuldade que o Paísterá para regulamentar o planoda OCDE. “O governo tentou sealinhar com a Ação 12 do Beps enão conseguiu. Outros países jáinternalizaram isso”, expressa.

Bekierman lembra que essanão foi a primeira vez que o go-verno tentou adotar uma medi-da contra a evasão fiscal e en-

controu resistência. “Em 2001,antes mesmo da criação doBeps, a MP 2.158 definiu que oslucros da empresa estrangeiracontrolada por brasileira de-vem ser tributados no Brasil. Is-so foi muito disputado e teveque ser resolvido pelo Supremo[Tribunal Federal]”, ressalta.

No Judiciário, a questão foimodulada e mais tarde foi con-vertida na Lei 12.973/2014, maso advogado chama atenção pa-ra o tempo que levou para que alegislação passasse a valer. “De2001 a 2014, ficamos com umvácuo jurídico. Isso é um riscopara as ações do Beps.”

Sem contrapartidaAguirra de Andrade tambémcritica o fato do Beps cobrarmuito das empresas em termosde compliance e transparênciae deixar o governo e a Receitasem qualquer forma de contra-partida. “Há, no fundo, umamotivação arrecadatória, o queé bastante preocupante em umcenário de crise econômica equeda de arrecadação. Os fiscosde cada país tendem a exigiruma maior transparência porparte dos contribuintes, maseles próprios não são transpa-rentes. Ou seja, trata-se de umatransparência fiscal de mãoúnica, apenas para o contri-buinte e às custas do contri-b u i n t e”, dispara.

O advogado defende que asempresas fiquem atentas àsmodificações promovidas pelaReceita na legislação tributáriapor conta do Beps. “Os empre-sários devem examinar se as no-vidades legislativas ferem ga-rantias constitucionais ou estãoem desconformidade com asregras do Direito Tributário bra-s i l e i ro”, conta ele.

Essa brecha para que as com-panhias entrem com processosadvém da própria natureza dodireito tributário brasileiro,conforme destaca Roberto Be-kierman. “O direito tributário éregido pelo princípio da legali-dade, assim como o direito pe-n a l”. O especialista lembra queesse princípio garante que ocontribuinte não tenha nenhu-ma obrigação para além do queestá escrito na lei, e reforça: ins-trução normativa não possui amesma força de uma lei.

AÇÕES DO BEPS

1. Identificar os desafiosfiscais na economia digital2. Fortalecer as regras paraempresas controladas poroutros países3. Limitar a erosão de basesgerada pelo pagamento dejuros ou outros gastos4. Combater práticastributárias lesivas de maneiramais efetiva5. Prevenir o abuso detratados internacionais6. Impedir ações que evitamartificialmente oEstabelecimento Permanente7. Estabelecer metodologiasque coletem e analisemdados do Beps8. Exigir que os contribuintesmostrem seus planejamentostributários agressivos9. Tornar os mecanismos deresolução de disputasmais efetivos10. Desenvolver uminstrumento multilateral

D R E A M ST I M E

Ações do Beps irão aumentar a complexidade de algumas declarações de imposto, dizem especialistas

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