View
221
Download
0
Category
Preview:
DESCRIPTION
Trabalho desenvolvido para conclusão do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Trata da história do grafite até a construção da revista
Citation preview
0
CLÁUDIA ARAÚJO MACEDO
20956004-2
CONSTRUÇÃO DO PROJETO DA REVISTA DE ARTE DE RUA “ART!”
Niterói
2013
1
CLÁUDIA ARAÚJO MACEDO
20956004-2
CONSTRUÇÃO DO PROJETO DA REVISTA DE ARTE DE RUA “ART!”
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora da Universidade Candido Mendes – Niterói, como exigência parcial para a obtenção do título de bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo.
ORIENTADOR: Professor Marcelo Fonseca
Niterói
2013
2
Macedo, Cláudia Araújo.
Construção do projeto da revista de arte de rua “Art!” / Cláudia Araújo Macedo – Niterói, RJ: Universidade Candido Mendes, 2013.
Projeto Experimental apresentado a Banca Examinadora da Universidade Candido Mendes – Niterói, como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo.
1. Arte de rua, grafite, revista, vandalismo.
3
CLÁUDIA ARAÚJO MACEDO
CONSTRUÇÃO DO PROJETO DA REVISTA DE ARTE DE RUA “ART!”
Projeto Experimental apresentado à
Banca Examinadora da Universidade
Cândido Mendes – Niterói, como
exigência parcial para a obtenção do
grau de bacharel em Comunicação
Social – Habilitação em Jornalismo.
Nota: _____________ Aprovada ( ) Aprovada com louvor ( ) Aprovada com restrições ( ) Reprovada ( ) Data: ___/___/______
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________ Marcelo Fonseca Alves (orientador)
_________________________________________
Sandro Dias Tebaldi (convidado)
_________________________________________ Marcos Antônio de Azevedo Monteiro (convidado)
4
Dedico este trabalho a Deus, em primeiro lugar, que me deu a oportunidade de começar uma faculdade. Aos meus pais, Maria Lúcia e Valmir, e irmão, Glauber, pelo apoio, amor e carinho. Agradeço também ao amigo Lucas Reis, por me ensinar a fazer o projeto gráfico; ao Yan Bockorny, pela ajuda com as fotografias; aos amigos Maria Cristina Mello, Sâmara Palmares, Marina Reis, Tamiris Moraes, Denise de Oliveira, Ronan Barradas e Bruno Cardoso, pela amizade durante este tempo.
5
Agradeço ao professor Marcelo Fonseca, pela orientação, apoio e por acreditar no projeto, me permitindo ter segurança e esclarecendo todas as minhas dúvidas. São mestres como Marcelo que me fazem continuar na luta por uma carreira melhor.
6
“Algumas pessoas se tornam policiais porque querem fazer do mundo um lugar melhor. Algumas pessoas se tornam vândalos porque querem fazer do mundo um lugar visualmente melhor”.
Banksy
7
RESUMO
O presente trabalho introduz o projeto sobre a revista “Art!”, que aborda a arte
urbana no estado do Rio de Janeiro, especificamente nas cidades de São Gonçalo,
Niterói e Rio. Tendo como foco de estudo o grafite como meio de comunicação e
divulgação de mensagens e ideologias, o objetivo central é trazer ao mercado uma
revista que trate do assunto como o que ele realmente é: arte. As matérias mostram
talentos da região para o público, ajudando a diminuir a visão pejorativa e
marginalizada que a sociedade tem pela arte urbana. Apesar da importância cultural
e social, ela ainda é vista como vandalismo.
Palavras-chaves: Arte de rua, grafite, revista, vandalismo.
8
ABSTRACT
The following work introduce the project of the magazine "Art", which approaches
with urban art in the state of Rio de Janeiro, specifically in São Gonçalo, Rio and
Niterói. The focus of the study is the graphite as a meaning of communication and
dissemination of messages and ideologies. The central objective is to bring a market
magazine that deals with the subject as what it really is: art. The reports show the
talents of the region to the public in a way that helps to reduce pejorative and
marginalized vision that society has for urban art. Although the cultural and social
significance, it is still seen as vandalism.
Keywords: street art, graphite, urban, magazine, vandalism.
9
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10
2. EMBASAMENTO TEÓRICO ...................................................................... 11
3. A REVISTA ART! ....................................................................................... 14
3.1. O tema .................................................................................................. 15
3.2. A pauta ................................................................................................. 18
3.3 O texto ................................................................................................... 20
3.4 A imagem .............................................................................................. 21
3.5 A revista................................................................................................. 23
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................... 46
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA ................................................................... 47
ANEXOS ......................................................................................................... 49
Anexo 1 ....................................................................................................... 49
Anexo 2 ....................................................................................................... 49
Anexo 3 ....................................................................................................... 53
Anexo 4 ....................................................................................................... 54
Anexo 5 ....................................................................................................... 57
Anexo 6 ........................................................................................................58
Anexo 7 ........................................................................................................58
Anexo 8 ........................................................................................................59
10
1. INTRODUÇÃO
Desde os primórdios da humanidade, o grafite tem se instaurado como forma
de comunicação entre membros de um grupo. Da Roma antiga ao Bronx nos anos
70, a arte urbana se consolida como um meio de comunicação para aqueles
considerados “sem-voz” ou perseguidos pelo poder público. Apesar disso, a visão de
algo marginalizado pela sociedade ainda está enraizada. É para valorizar o lardo
artístico e social do grafite que foi criado o projeto da revista Art!, mostrado nas
próximas páginas deste trabalho.
O capítulo dois trata da linguagem e dos recursos utilizados no texto da
revista para torná-lo mais interessante e visualmente atrativo. No capítulo três,
falamos sobre o histórico do tema grafite (desde seu significado até o papel na
sociedade) e como encaixamos a revista como uma “mídia da mídia” grafite.
Também citamos a criação do projeto gráfico e o papel das imagens e do texto na
publicação. No item 3.5 podemos ver todas as páginas da primeira edição, da capa
às matérias, da forma como ela foi idealizada e será, posteriormente, publicada.
Optamos pelo veículo revista por ser uma mídia que valoriza igualmente fotos
e textos, e por funcionar como símbolo de identificação de um grupo. As matérias
focarão artistas solo, coletivos, projetos e eventos relacionados ao grafite, falando
sobre criação, conceito, objetivo e carreira do artista.
A revista tem um projeto gráfico preto e branco com fotos coloridas, que dão
vida ao veículo. Não há imagens de estúdio, pois não seriam de acordo com o
projeto inicial. Apesar do layout simples, houve a preocupação de fazê-lo limpo e de
obedecer a critérios de distribuição e equilíbrio na diagramação. As fontes são de
fácil leitura e conversam com o objetivo da revista, e foram adaptadas para uma boa
leitura tanto numa página limpa quanto em uma com imagens.
11
2. EMBASAMENTO TEÓRICO
Segundo Maria Cristina Barbosa1, revista é um veículo de massa
intermediário entre livro e jornal, por ser menos efêmera que o primeiro e não tão
permanente quanto o segundo. Tem a característica de trazer matérias mais longas
e completas que o jornal, permitindo o uso de artifícios impensáveis em um veículo
de circulação diária.
Como a mídia permite uma linguagem mais informal, optamos por utilizar
recursos estilísticos para deixar os textos mais descontraídos e menos cansativos.
Como exemplo, na matéria da página 23 do projeto, a matéria se encerra com a
frase “Não se sabe até quando o gigante continuará acordado, mas os protestos que
marcaram a segunda metade do ano já entraram para a história.” É feita uma
referência à expressão “o gigante acordou”, bordão utilizado largamente durante as
manifestações de 2013, para aproximar o leitor do contexto espacial da matéria.
A revista também é entendida como um símbolo de um grupo.
Revista é também um encontro entre um editor e um leitor, um contato que se estabelece, um fio invisível que une um grupo de pessoas e, nesse sentido, ajuda a construir identidade, ou seja, cria identificações, dá sensação de pertencer a um determinado grupo. Não é à toa que leitores gostam de andar abraçados às suas revistas – ou de andar com elas à mostra – para que todos vejam que eles pertencem a este ou àquele grupo. Por isso, não se pode nunca esquecer: quem define o que é uma revista, antes de tudo, é o seu leitor. (Scalzo apud. Gruszynski. 2006, p. 39)
Nesse sentido, a compra da revista depende da identificação do leitor com a
publicação. O projeto editorial é estabelecido, assim, como a identidade de um
1 Os primórdios do design gráfico.Klaxon & Base: duas revistas, dois exemplos no modernismo. 1996. Dissertação (Mestrado) – UFRJ, Escola de Comunicação, Rio de Janeiro, 1996, p.29.
12
conjunto que, embora seus membros não se conheçam, permanece unido pelos
gostos em comum, traduzidos e simbolizados pela publicação.
Para Gruszynski (Ibid., p.42), “as revistas são um produto que, como todos os
outros, dependem de resultados comerciais para continuar existindo”. Ou seja, não
existe o produto sem a compra. O público-alvo da revista Art! faz parte de um nicho
até então esquecido pelas editoras: o de amantes da arte de rua, especificamente o
grafite.
A tentativa de publicações parecidas no Brasil não teve resultados positivos;
portanto, a revista não tem um concorrente direto até então. O projeto será
estabelecido em um local em que a arte urbana faz parte do cotidiano da cidade,
como manifestação do indivíduo que lá está. A revista segue um dos pilares do
grafite: feita para e pelo público.
Vilas Boas (1996, p.21) diz que “toda reportagem de revista traz no texto,
implícito ou não, uma espécie de ponto de vista, que aqui não deve ser confundido
com qualquer tipo de opinião”. O ponto principal da publicação é de divulgar os
impactos positivos do grafite e da arte de rua na sociedade, seja ela como espaço
físico ou grupo populacional. As matérias abordam trabalhos que lidam com os dois
aspectos, e estes não são influenciados pela opinião de quem escreve ou edita a
revista.
Mesmo com esta ideia inicial, há o respeito pelas opiniões divergentes dos
entrevistados. Na matéria Arte contra a propaganda irregular, o entrevistado Justin
Phame diz que respeita, mas não gosta de pichações porque elas “estragam a
moradia das pessoas. Algumas pichações são boas, mas eu não consigo ler nada”.
Ele completa dizendo que sente total liberdade para grafitar, sem a interferência da
polícia. Já Gabriel Mattos discorda, afirmando que “é normal levar dura (da polícia)”.
Na mesma reportagem, Felipe Blunt diz que não considera a pichação algo feio,
sendo também um dos temas de seus desenhos.
Um fator de grande importância para a identificação e conseqüente compra é
a capa. Segundo Scalzo (2008, p.62) a capa é a “síntese irresistível da edição”. Ela
resume aquilo que há de mais interessante na revista, sendo em ilustração/foto,
título ou chamadas. No conceito do projeto, a publicação trará na capa uma obra
feita por um dos artistas/coletivos citados, levando em conta a matéria que mais se
destacar naquela edição. A capa final também terá uma ilustração fotográfica,
acompanhada do expediente. Há também a preocupação com o uso correto da
13
linguagem, mas sem deixá-la rebuscada. Um público jovem pede uma linguagem
mais jovem.
14
3. A REVISTA ART!
Segue a memória descritiva da revista Art!, como protótipo de publicação
voltada para a arte de rua do estado do Rio de Janeiro, especificamente grafite,
destacando o trabalho e os artistas e dando mais enfoque à região metropolitana e
capital.
O principal conceito é falar sobre o grafite como arte, sem ressaltar o rótulo de
vandalismo nem quando o assunto tratado é a pichação. Os grafiteiros ou artistas
são valorizados e trazidos ao público. As matérias procuram informar o objetivo do
trabalho, seja ele embelezar a cidade, fazer uma crítica social ou simbolizar
resistência contra o Governo ou outras formas de poder.
A publicação será mensal, trazendo o que de mais relevante aconteceu no
estado do Rio em relação à arte urbana. O formato é de 26cm x 26cm. A ideia foi de
adaptar o projeto às imagens, que mostram o produto dos personagens das
matérias.
Com público-alvo jovem, na faixa etária entre 17 e 35 anos, o projeto abrange
o adolescente que quer começar a grafitar, o jovem que gosta da arte e aquele que
já pratica ou trabalha com isto.
O nome da revista é inspirado no icônico rato largamente grafitado em stencil
por Blek Le Rat2 (rat é um anagrama para art) e Banksy.
2 Artista francês conhecido como o criador do grafite com stencil. Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/Blek_le_Rat. Acesso em novembro/2013.
15
3.1. O tema
Ao contrário do que dizem por aí, o grafite não é a mais baixa forma de fazer arte. Embora seja necessário se esgueirar pela noite e mentir para a mãe, grafitar é, na verdade, uma das mais honestas formas de arte disponíveis. Não existe elitismo ou badalação, o grafite fica exposto nos melhores muros e paredes que a cidade tem a oferecer e ninguém fica de fora por causa do preço do ingresso. (BANKSY, 2012, p.8)
A real origem da palavra grafite vem de tempos remotos. Grafite3 ou grafito
vem do italiano graffiti, plural de graffito, também originados do termo graffiato, que
significa “arranhar, riscar ou raspar”, costume muito comum na Roma Antiga. Outro
termo relacionado é sgraffito, que seria raspar uma camada de pigmento para
revelar outra por baixo4. Hunter (2013, p.10) diz que a palavra tem origem do termo
grego graphein, de mesmo significado.
Segundo o mesmo autor, o grafite mais antigo data de quatro mil anos atrás,
em uma parede de um penhasco egípcio, apresentando duas inscrições
aparentemente com conotação religiosa. A técnica ainda foi muito utilizada pelas
sociedades secretas romanas, incluindo os primeiros cristãos, vítimas de
perseguição na época.
Para Leila Dupret (2008, p.416), o grafite é
uma manifestação de cunho popular (que) se traduz na comunicação ampla e social de posições dos que se sentem sem condições de utilizar os veículos midiáticos instituídos para revelar seus princípios e/ou objetivos.
Ou seja, a “voz” de quem não possui recursos para se comunicar ou
manifestar insatisfações e revoltas. Any Ivo Leal Brito enxerga o grafite como uma
das formas de expressão e comunicação dos diversos grupos socioculturais que
vivem na cidade, entendida como palco de todas essas manifestações5.
Arthur Lara (apud. Dupret, p.416) cita dois marcos históricos importantes para
o entendimento do grafite como arma de resistência e protesto:
3 Dicionário Houaiss, verbete "grafito". 4 Grant, Alison. North Devon Pottery: The Seventeenth Century. University of Exeter Press, 1983, pp. 1–2. 5 2007. p.108
16
França: Em 1968, um movimento estudantil utilizava muros com dizeres e
caricaturas que descreviam suas reivindicações.
Bronx: também nos anos 60, os negros usavam o grafite para denunciar as
opressões que sofriam. Foi nesta época que o grafite virou um dos quatro elementos
do movimento Hip-Hop, junto do break, do MC e do DJ.
Banksy (Op.cit. p.130) cita a teoria da janela quebrada6 como base para a
política de tolerância zero com o grafite.
Quando começou a ser encarado como arte com referência social e marco
histórico, o grafite deixou de ser discriminado e passou a ser aceito pela sociedade e
pelo mercado – o mesmo que ele se permite vandalizar. Como ainda hoje é utilizado
como marca de protesto e resistência, um movimento que vem ganhando força
internacionalmente na cena é o Brandalism (branding + vandalismo), movimento
criado em 2012 como uma “resposta” ao excesso de merchandising em muros,
prédios e outdoors. Banksy (Ibid. id. p.196) definiu como:
Qualquer anúncio num espaço público que não permite que você escolha se quer vê-lo ou não é seu. Ele lhe pertence. Você pode se apropriar dele, rearrumá-lo e reutilizá-lo. Pedir permissão para isso é como perguntar se você pode ficar com a pedra que alguém jogou na sua cabeça.
Em julho do mesmo ano, às vésperas das Olimpíadas de Londres, o grupo
formado por 26 artistas instalou 35 criações artísticas por todos os espaços
utilizados por publicidade na Inglaterra. O objetivo, segundo os participantes, era de
“desafiar os impactos destrutivos da indústria publicitária”.
6 Teoria criada pelos criminologistas James Q. Wilson e George Kelling nos anos 80. Eles diziam que, se uma janela é quebrada e ninguém a conserta, as pessoas que ali passam vão pensar que ninguém se importa e, por conseqüência, quebrarão mais janelas e contribuirão para o aumento de crimes. Os pesquisadores acreditavam na ligação direta entre vandalismo, violência e degradação da sociedade.
17
Figura 1: brandalismo na Inglaterra
A mudança de imagem da arte também se deve ao reconhecimento artístico
de pioneiros como Jean-Michel Basquiat, no Brooklyn; Blek le Rat, em Paris; e
Banksy, em Bristol. Artista visual de estilo único, Basquiat começou sua carreira nos
muros do Brooklyn e de Manhattan. Em apenas oito anos de carreira, pulou para o
neoconcretismo e foi reconhecido internacionalmente. Blek le Rat mudou a arte de
rua após trazer o recurso do stencil para os muros franceses. Já Banksy, seguidor
da técnica do stencil, tem obras espalhadas por todo o mundo. É um dos maiores
nomes do grafite contemporâneo e tem desenhos vendidos em leilões a preços
altos.
Uma das mostras da reviravolta do grafite como movimento artístico foi em
2010, quando Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, recebeu do primeiro
ministro britânico uma obra de Eine, artista urbano londrino.7
No Brasil, vários nomes levaram o grafite a um patamar elevado. Os Gêmeos,
artistas paulistas reconhecidos internacionalmente, deixaram suas críticas sociais
em muros nos Estados Unidos, Cuba, Inglaterra, Espanha, Alemanha e Grécia,
entre outros. No nosso recorte espacial, Marcelo Eco, Fábio Ema e Akuma são três
dos nomes mais importantes do cenário no grafite carioca e começaram a carreira
em Niterói, São Gonçalo e Rio, consolidada na época da festa Zoeira Hip-Hop, que
entre 1997 e 2003, foi reduto da cena hip-hop do estado.
7 HUNTER, p.86
18
O Brasil costuma distinguir grafite e pichação. O grafite é mais aceito por ser
elaborado, ter técnica e planejamento, críticas sociais e políticas, além do
compromisso com a estética. É visto como inserção social e possibilidade de um
futuro alternativo ao crime, além de estímulo ao trabalho coletivo (também visto em
grupos de pichadores). Já a pichação é vista como vandalismo e ataque ao
patrimônio público, mesmo com seu caráter de resistência, e considerada crime
ambiental8. Apesar disto, os grupos de pichadores continuam atacando à noite e se
manifestando contra governos, leis e injustiças.
Contudo, o que mais marca a diferença entre grafite e pichação é o que se
entende por belo ou feio. O grafite procura embelezar lugares desprezados; a
pichação, marcar lugares belos e de grande visibilidade para chamar atenção. Nas
palavras do historiador Paulo Knaus:
A pichação se instala onde a cidade é bonita, arrumada. Ao contrário do grafite, que tende a buscar lugares desprezados. Isto faz parte de uma lógica de abordar e provocar a cidade. Picha-se o que é bonito e se grafita o que é feio. Assim, essas duas formas de expressão exercitam suas críticas urbanas e denunciam a lógica da cidade. Todas as imagens são modos de projetar a presença humana na paisagem. (Knaus apud Kaz, 2007)
3.2. A pauta
As pautas levaram em consideração a localidade (Rio de Janeiro e região
metropolitana), pontos de vista diversificados sobre o grafite, trabalhos relevantes e
diferentes entre si. Houve o destaque para Lya Alves, que é ativa em vários projetos
de grafite nas cidades de São Gonçalo e Niterói.
Na revista, as matérias estão na seguinte ordem:
Muito além do grafite – como Lya Alves levou filosofia e conversão à sua
arte: Lya Alves é um personagem importante no cenário do grafite em São Gonçalo
e Niterói, principais cenários da arte urbana carioca. Já fez várias exposições no
estado e suas telas foram enviadas a países como Portugal, Itália e Japão. Esteve
em constante batalha para que a lei a favor do grafite fosse sancionada em Niterói.
8 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9605.htm. Acesso em novembro/2013
19
Lya também tem trabalhos com base filosófica e teológica (oficina Philosoffiti) e
missionária (Graffiti Evangelista).
Lei N° 3054 de 23 de outubro de 2013
Dispõe sobre a pintura de grafite como forma de expressão e de arte e dá outras providências.
Art. 1º - Fica autorizada a pintura de grafite, como forma de expressão e de arte, nos pilares dos viadutos, pontes, passarelas, pistas de skate e muros públicos selecionados, situados no Município de Niterói.
Parágrafo Único. Os locais públicos de que trata o caput deste artigo serão definidos e autorizados pela administração pública que os identificará e os discriminará por região administrativa.
Graffiti Evangelista: O ponto chamativo da pauta é a união entre a arte marginal e
a missão evangélica, misturando ideologias diferentes e trazendo o que pode ser
considerado ligação entre sagrado e profano. Os participantes levam aos moradores
algo comum ao cotidiano dos subúrbios como atrativo para uma mudança de vida. É
um movimento social com várias vertentes artísticas, sendo o grafite o sinal de
partida.
Arte contra a propaganda irregular: O Movimento Mais Respeito é uma
iniciativa que começou pelo Facebook, causada pela indignação às propagandas
irregulares que se sobrepõem aos grafites feitos em muros, sem autorização prévia.
O resultado do projeto foi visto de forma positiva tanto pela população quanto pela
Prefeitura. Foram feitas matérias em sites de média relevância para designers,
artistas de rua e comunicadores, como o Mistura Urbana e o Choco La Design.
Os entrevistados para a matéria sobre o Movimento são artistas de rua que
mostram pontos de vista e objetivos com a arte completamente diferentes. Além
disto, são pessoas comuns, que trabalham e estudam. A proposta é de fazer o leitor
se identificar com o entrevistado e causar empatia com o artista e com a arte.
Manifestações de 2013 – o grafite como arma de protesto: A pichação
como assinatura das reivindicações deste ano reforça a ideia de que o ato de grafitar
não se trata unicamente de vandalismo, e sim de uma marca de protesto e
20
resistência. Seu uso em prédios históricos e públicos foi uma reação agressiva,
porém sem o uso de violência, contra as ações do Governo e da Polícia Militar.
Projeto NARUA traz poesia às ruas e transforma os muros em Niterói:
Evento que misturou poesia e grafite, transformando a cidade em uma exposição a
céu aberto. Partindo da ideia de homenagear o centenário de Vinícius de Moraes, os
artistas convidados fizeram obras inspiradas no poema “O operário em construção”,
nos muros perto da entrada da Ponte Rio-Niterói. A iniciativa tem o apoio da FAN
(Fundação de Artes de Niterói), reforçando a mudança de imagem do grafite como
arte, sem o rótulo de vandalismo.
Arte geométrica - como o Polígonno supera seus suportes e se adapta a
qualquer tela: A dupla formulou uma maneira única de arte urbana, usando figuras
geométricas para compor as formas, sejam elas humanas ou animais. As obras
ultrapassam os suportes, com o objetivo de mostrar que a arte não tem limites. O
projeto é reconhecido internacionalmente e levou a dupla para a Affordable Art Fair,
em Seattle.
Idol No! Project e o pós-grafite – coletivo recicla materiais para
customizar ideias: O Ido No! Tem sua própria concepção de arte: o “pós-grafite” –
uma tendência do grafite, que vai além do muro. O grupo usa o mesmo conceito
para customizar e reciclar roupas e acessórios, levando o grafite a outros suportes.
3.3 O texto
As matérias (Anexos) foram escritas levando em consideração o bom
entendimento por parte do leitor, sendo ele um conhecedor da arte urbana ou não.
Houve a preocupação de se empregar uma linguagem entendível a leitores fora da
faixa etária que a publicação tem como público-alvo. No texto da página 14, Arte
contra a propaganda irregular, a introdução é feita da seguinte forma: ‘“Trago a
pessoa amada”. A frase, tão famosa nos muros cariocas, provocou indignação de
grafiteiros quando foi pintada em cima de um grafite de Akuma, um dos pioneiros da
arte de rua em São Gonçalo, no bairro Itaipu, Niterói’. Optou-se por empregar o
21
slogan largamente difundido nas ruas para trazer o leitor à realidade do artista e da
matéria; além disto, houve a fuga do tradicional lead para evitar a linguagem de
jornal.
Por ser uma revista voltada a um público mais jovem, os textos são curtos
(com exceções para perfis de personagens um pouco mais relevantes no cenário do
grafite. No primeiro número, o este papel fica para Lya Alves), com estilo mais
simples, livre e informal, sem pecar pelo excesso de palavras coloquiais ou gírias.
Toda a parte escrita segue o princípio de contar uma história: usando as
perguntas básicas do lead, as matérias falam sobre o objeto (sendo pessoa, grupo
ou evento), explicando o que, quando, onde, como e por quê. O texto conversa com
a imagem, sem que um seja mais importante ou relevante que o outro.
3.4 A imagem
Como citado na introdução do item 3, o plano de paginação 26 x 26 cm foi
pensado para valorizar a foto, que costuma ter o objeto principal no centro. Todo o
projeto gráfico segue o mesmo conceito de reconhecimento da arte e do artista
retratados nas imagens.
O layout é simples e em preto e branco; as cores são de responsabilidade das
obras. As fontes escolhidas foram Myriad Pro e Stencil St Bold – esta última
representando uma das técnicas mais utilizadas pelos grafiteiros e consagrada por
Blek le Rat e Banksy: o stencil. Legendas e créditos tamanho 11, texto e números de
página tamanho 12. Títulos variam de tamanho, sendo adaptados à melhor maneira
de encaixe na página.
As imagens escolhidas seguem alguns critérios. Todas são coloridas e vivas,
mostrando o desenho como ele realmente é. As imagens das páginas 28 e 29 foram
feitas nas ruas:
22
Figura 2: páginas 28 e 29
Procuramos também retratar os objetos e a forma como os artistas trabalham,
como mostra a imagem do índice. Ela também exemplifica o layout simples, com
preto e branco e a fonte stencil.
Figura 3: índice
As fotos também seguem o conceito de “contar histórias”, citado no item 3.3.
Algumas páginas mostram os artistas trabalhando e, por fim, a obra pronta, como na
página 29:
23
Figura 4: página 19
3.5 A revista
Nas páginas seguintes, reproduzimos o layout da revista. Podemos perceber
com maior facilidade a simplicidade do projeto gráfico, que prioriza as imagens e
suas cores. As fontes foram escolhidas para dar maior clareza ao texto e combinar
com a proposta do projeto. Por ser resumido, optamos por colocar o editorial na
parte inferior da capa final. A capa privilegia as obras dos entrevistados.
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após toda a pesquisa e desenvolvimento, a conclusão da viabilidade do
projeto é considerada após a boa receptividade por parte dos entrevistados. Apenas
um dos grafiteiros procurados recusou-se a falar (Akuma) e outros dois
concordaram, mas não responderam depois (Marcelo Eco e Camiz Cr). Todos os
outros artistas acharam uma proposta interessante e concordaram em participar.
O estado do Rio de Janeiro tem uma grande variedade de artistas, coletivos e
projetos urbanos que devem ser levados ao público que, muitas vezes, passa em
frente ao muro grafitado, mas não presta atenção no conceito e objetivo da obra –
que vai muito além do simples “vandalismo”.
A revista vai levar a ideia do grafite como meio de comunicação dos menos
favorecidos, arte contemporânea e mensagem e manifestação de um grupo ou
crítica social. As matérias tratarão a prática também como subversiva e
contestadora, mas não marginalizada.
Mais do que trazer artistas já consagrados, o objetivo maior é de trazer
grafiteiros conhecidos na cena, mas não pela população. É dar voz ao alvo da
revista – já que partimos do pressuposto de que os artistas também farão parte do
público consumidor.
Apesar disto, caso seja do interesse do consumidor, haverá espaço para
pichadores, mesmo não sendo o principal objeto de estudo da publicação.
47
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA
Livros:
BANKSY. Guerra e spray. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2012.
BOAS, Sérgio Vilas. O estilo magazine: o texto em revista. São Paulo: Summus, 1996.
COLLARO, Antonio Celso. Projeto Gráfico - Teoria e Prática da Diagramação. São Paulo: Summus, 2009.
HUNTER, Garry. Arte de rua ao redor do mundo. São Paulo: Madras, 2013.
Artigos:
DUPRET, Leila. Subjetividade e Arte de Rua: 100% Graffit. In Revista Semestral da. Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE), v.12, n.2, dezembro/2008.
BRITO, Any Ivo Leal. Cidade - mídia e arte de rua. In BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira (org). Desigualdades Sociais e Educação. Salvador: Caderno CRH, Vol. 20 N. 49. 2007.
Trabalhos de Conclusão de Curso:
GRUSZYNSKI, Ana Cláudia e CHASSOT, Sophia Seibel. O projeto gráfico de revistas: uma análise dos dez anos da revista Capricho. Monografia (Comunicação Social: Habilitação em Propaganda e Publicidade). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. Disponível em: < http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/18702/000591356.pdf?sequence=1> Acesso em novembro/2013
ROLLO, Poliana Nunes. Jornalismo de revista: análise de noticiabilidade das capas da revista Época. Monografia (Comunicação Social: Habilitação em Jornalismo). Centro Universitário de Belo Horizonte, 2008. Disponível em <http://convergencia.jor.br/bancomonos/2008/poliana_nunes.pdf> Acesso em novembro/2013
48
Sites:
CÂMARA MUNICIPAL DE NITERÓI. Gabinete do Vereador Leonardo Giodarno – PT Projeto de lei nº 101/2011> Disponível em <http://camaraniteroi.rj.gov.br/wp-content/plugins/website/widgets/vereador-proposicoes-ajax.php?&a=2011&t=1&n=10> Acesso em novembro/2013
CHOCO LA DESIGN. Respeito e Graffiti é bom e nós gostamos! Disponível em: <http://chocoladesign.com/respeito-graffiti-gostamos> Acesso em outubro/2013.
MISTURA URBANA. Graffiteiros confrontam propaganda irregular e conquistam respeito na cidade. Disponível em <http://misturaurbana.com/2013/10/graffiteiros-confrontam-propaganda-irregular-e-conquistam-respeito-na-cidade/> Acesso em outubro/2013.
BROOKLYN MUSEUM. Street to Studio: The Art of Jean-Michel Basquiat. Disponível em <http://www.brooklynmuseum.org/exhibitions/basquiat/street-to-studio/spanish/whobasquiat.php>. Acesso em novembro/2013
PROPMARK. Movimento subversivo invade outdoors do Reino Unido em ação de guerrilha. Disponível em <http://propmark.uol.com.br/mercado/41113:movimento-subversivo-invade-outdoors-do-reino-unido-em-acao-de-guerrilha> Acesso em novembro/2013
REVISTA DE HISTÓRIA. Pichação em monumentos históricos. Disponível em http://www.revistadehistoria.com.br/secao/em-dia/pichacao-em-monumentos-historicos
49
ANEXOS
Anexo 1
Editorial
Depois de muito trabalho, a revista Art! finalmente chega às bancas. Sua
proposta é de mostrar a arte de rua com outros olhos, trazendo ao público artistas
que transformam as cidades em suas telas.
Nesta primeira edição, veremos grafiteiros que vieram de São Gonçalo ao
Brooklyn e fazem a diferença na região metropolitana no Rio. O destaque fica para
Lya Alves, que nos leva a refletir sobre alienação e fetichismo em sua obra. Lya
também nos mostra três ótimos projetos culturais que acontecem nas cidades de
São Gonçalo e Niterói: o Graffiti Evangelista, que mistura arte com conversão; o
Movimento Mais Respeito, contra as propagandas irregulares nos muros cariocas; e
o NARUA, com poesia e grafite nas proximidades da Ponte Rio-Niterói.
Mudando um pouco o foco, a revista aborda também o uso do grafite e da
pichação como armas de protesto nas recentes manifestações de 2013. Rio e São
Paulo usaram a arte como manifestação das reclamações mais freqüentes, como o
Governo e a polícia militar.
Anexo 2
Muito além do grafite
Como Lya Alves levou filosofia e conversão para sua arte
A gonçalense Lya Alves abandonou o curso de Direito para seguir o sonho da
arte. Começou a pintar telas em 2002 e a grafitar em 2008. Suas obras utilizam
metáforas, simbolismos, crítica social e filosofia – esta última servindo de base para
suas oficinas de grafite para jovens carentes, a Philosoffiti.
50
Realizou exposições na Itália, Uruguai, e em Portugal, no Núcleo Português
de Arte Fantástica (NPAF), e fundou a Intercâmbio Cultural Arts, empresa
responsável pelo envio de trabalhos de artistas brasileiros a Portugal, Itália, Japão e
outros países através da parceria com a L’Agenzia de Arte (Portugal), Centro
CulturaleCasatani (Itália) e Iapaj (Japão).
Lya também usa sua arte para a fé, promovendo o Graffiti Evangelista em
morros e lixões de São Gonçalo e Niterói. Futuramente, pretende transformar o
projeto em um documentário. Nesta entrevista, Lya fala livremente sobre influências,
conversão e alienação.
Em suas obras, a artista retrata sua irmã, Ivy Titto.
Por que você optou pelo grafite?
O grafite tem um alcance maior. Qualquer pessoa passa de ônibus e vê. E às vezes
você quer se expressar e de forma não tão simpática. Na questão política, a rua é
muito mais interessante quando se tem uma mensagem a passar.
Por quê?
Porque numa tela o ambiente é muito fechado. Quero fazer uma reclamação ao
prefeito e, na rua, vou alcançar muito mais pessoas. Se a idéia é fazer uma crítica,
ela me soa muito mais agressiva no muro do que numa tela em casa. Costumo dizer
que tela é algo doméstico. O grafite é mais “selvagem”.
Aliás, eu queria ser mais agressiva no grafite, mas aí entra outro lado: às vezes a
pessoa que está rua precisa ver uma coisa legal. Quando eu li a história de Cecília
Meirelles, fiquei impactada, porque ela era envolvida em muita coisa política, mas
você não percebe quando lê os poemas dela. O amargo que ela provava não era
passado para a obra, e eu acho isso muito legal. Tenho uma tela chamada “A
Cecília que você não viu”, e tomei essa filosofia pra mim: nem sempre vou deixar
passar (para o trabalho) as amarguras. A alienação é um tema que está
constantemente no meu trabalho: a alienação de si mesmo, o desprezo que o ser
humano tem pelo outro, e tem maneiras mais positivas de falar.
Na semana passada eu grafitei num morro administrado pelo Comando Vermelho. O
trabalho ficou assim: o poste com uma pichação do CV e do meu lado (do muro), um
51
grafite com as palavras “O amor é mais forte”. Qual poder é maior: o que mata ou o
que dá a vida?
O grafite veio depois da fé, da sua conversão?
Depois. Desenho desde criança, influenciada pelo meu tio, que trabalhava com arte
visual. Quando ele abriu mão e foi para a música, pensei: “ele era bom e desistiu,
então isto não é pra mim”, e abortei este sonho. Um dia eu estava num culto e Deus
falou pra mim: “Eu vou trazer de volta algo que você enterrou”. Na hora, não entendi
o que era, mas Ele deixou claro que me devolveria um sonho.
Uma semana depois saiu no Globo que uma galeria num shopping estava
selecionando artistas para uma exposição.Então o André (marido da Lya) achou que
eu deveria me inscrever. Não me sentia pronta, mas ele insistiu. Fui selecionada e
então entendi o que Deus quis dizer. Foi em 2002 que comecei a organizar minha
primeira exposição. E depois disso eu não parei: mandei várias telas para Itália e
Portugal. O grafite veio depois, mas também pela fé.
Eu estava numa igreja, atuava muito com a comunidade do Cantinho. Vendo aquilo
tudo, aquela criançada, pensei em fazer uma oficina de grafite. Mas eu não sabia
grafitar, então aprendi enquanto dava as aulas na oficina.
Não só o grafite, mas a pintura veio por um posicionamento de fé, de restauração.
Eu ouvia Deus dizendo: “Eu te criei com um talento, e não vamos enterrá-lo. Não se
oriente pelo mercado de trabalho, se oriente com a direção que Eu tenho pra você.
Eu criei você pra uma tarefa.”. E esta foi a direção que Deus deu para o curso.
Você antes desenhava pin-ups. Deixou de fazê-las?
Não. Meu tio desenhava muitas pin-ups, a marca dele eram as mulheres sensuais.
Eu me inspirei muito nele e também no Hajime Sorayama, que faz umas pin-ups
sadomasoquistas muito loucas. Gosto de trabalhar com a sensualidade feminina, é
algo que nasce com a mulher. A maneira como eu trabalho não é aquela coisa
“cachorra”, entende? É um lance que a mulher gosta.
Mas eu continuo fazendo. Minha pin-up agora é a Carmela (personagem da história
em quadrinhos “Guerreiros de Deus”, feita em parceria com o marido). Ela usa
espartilho, é sacerdotal mas hiperfeminina. A proteção dela é o que a Bíblia fala: a
52
armadura da fé; agora a forma como vou representá-la é com o espartilho, roupa de
vinil, justinha, de couro... para alguém que é da igreja, ela é sexy pra caramba
(risos). É a minha personagem de assunto feminista na revistinha.
Às vezes na igreja rola esse estresse de achar que a mulher não pode ser sensual.
Ela tem que ser feminina, não uma peça de açougue. A Carmela tem um corpo
bonito e eu tento fazer isso de uma maneira legal, sem partir para o lado sexista.
Como você fez pra aplicar filosofia na Philosophitti, a oficina de grafite? De onde
surgiu a ideia?
O cristão já absorve muita filosofia por meio da Bíblia. Paulo era filósofo. O leitor da
Bíblia está acostumado a uma linguagem muito mais culta. Para entender o
Cristianismo, tem que filosofar muito. Qual o sentido da vida? A Bíblia responde, ou
pretende responder.
A minha conversão foi muito filosófica. Antigamente eu era ateia, seguidora de
Nieztche, que dizia que o nada existe, nem que seja como ideia, porque se não
existisse, eu não poderia nem conceber a ideia dele. Se o nada existe, então Deus
existe, né? Nem que seja como ideia. Fiquei apavorada. O Nietzche acabou me
ajudando na conversão. A bronca dele não era com Deus, mas com o sistema
religioso.
Comecei a procurar temas que fossem aplicáveis no dia-a-dia. Talvez a pessoa que
esteja assistindo à minha aula hoje não volte, então tenho que ensinar algo que ela
possa absorver, digerir e se enxergar. Já fiz aulas sobre heróis e sexismo, Sartre,
Leonardo Boff – todo o ponto de vista é a vista de um ponto: eu peguei uma frase
dele e trabalhei o conceito. Se eles entenderem já está muito bom, porque é algo
que podem aplicar e repensar.
A oficina sobre sexismo enlouqueceu os adolescentes. Eu comecei falando da
Marvel: se a revista tiver uma capa cheia de heróis, a mulher está posando enquanto
os caras estão combatendo o crime. Parti para as princesas da Disney, que são
aquele modelo de mulher que só precisa de um homem pra dar sentido à vida. Citei
a Xuxa, que também era um estereótipo, e as panicats.
53
Como eu trabalho em comunidade, vejo as meninas sempre expostas. Teve um dia
em que saí de sobretudo, cachecol e bota, e as garotas na rua de casaco jeans e
shortinho. Você não pode sentir frio, os seios ou a perna têm que estar de fora. Eu
coloco essas questões e sempre com relação ao próprio corpo.
Fiz um trabalho falando de quando as coisas passam a ter mais valor que o ser
humano. Tem gente que mata por um carro, por um tênis de marca; isto é cotidiano,
alienação, coisificação. Mas aí eu começo a mostrar que não tem que ser assim. Se
é esse o valor que você dá, então qual o valor que você tem? Às vezes é muito
informação para os alunos, então eu vou devagar.
Na hora de passarem para o papel, eles têm que pensar. Aí eu converso com cada
um. Gosto de falar com todo mundo e depois orientar individualmente.
O Sartre tem uma filosofia que indaga: “O que você pode fazer com o que fizeram de
você?”. E a aula era em torno disso. O aluno fazia um desenho e passava para o
outro, que mudava completamente a arte inicial e o devolvia. E agora o que você vai
fazer com o que fizeram do seu trabalho? E é esta a proposta do Sartre. Você é uma
pessoa, e a sociedade te transforma em outra coisa. E o que você vai fazer com o
que fizeram de você? O conceito dessa aula fechou perfeitamente. E depois é só
fazer o desenho.
Anexo 3
Grafitti Evangelista
O projeto Grafitti Evangelista é realizado pela comunidade de profetas da Lya,
a Ninho das Águias, desde março. Indo em comunidades carentes dos morros de
Niterói e São Gonçalo, os artistas participantes grafitam os muros e os missionários
evangelizam os moradores. “À tarde, enquanto os grafiteiros finalizam os trabalhos,
começa o culto evangelístico na rua com participação de outros ministérios
convidados: teatro, dança, música, circo, atividade infantil”.
54
A intenção do projeto é de levar mudança para o local. “O Ninho das Águias
aposta no desenvolvimento e na inclusão social como formas de impactar a
sociedade. Acreditamos que erradicar a miséria da cultura pode ser um meio de
erradicar a própria miséria”, diz Lya Alves.
Qualquer pessoa pode levar o projeto para seu bairro. “É só entrar em contato
e falar com alguma igreja, católica ou protestante, para fazermos uma parceria”. Os
interessados devem entrar em contato pelos telefones (21)2609-8275/(21) 7679-
1462 ou pelo emailndaescoladeprofetas@gmail.com.
Anexo 4
Arte contra a propaganda irregular
Indignados com o desrespeito dos propagandistas irregulares, grafiteiros de Niterói
resolvem contra-atacar usando sua melhor arma: a arte
“Trago a pessoa amada”. A frase, tão famosa nos muros cariocas, provocou
indignação de grafiteiros quando foi pintada em cima de um grafite de Akuma, um
dos pioneiros da arte de rua em São Gonçalo, no bairro Itaipu, Niterói. Como
resposta, a artista urbana Lya Alves criou um evento no Facebook – a “Operação
Mais Respeito” e convocou artistas do município e arredores para se reunir na
manhã do dia 29 de outubro e renovar a parede localizada ao lado do Shopping
Itaipu Multicenter.
Cada participante levou seu material: stencil, pincéis, sprays, tintas e canetas
transformaram a parede até então ocupada pela propagada irregular. Segundo Lya
Alves, o objetivo do trabalho foi “usar a própria propaganda irregular contra quem
faz”. Ela diz que a população odeia os anúncios: “Enquanto estávamos pintando o
muro, muita gente que passava falou para ‘darmos um jeito’ porque estava mesmo
horrível”, concluiu.
A próxima Operação será feita no bairro Badu, também em Niterói.
55
Jorge Silveiro é professor de desenho e trabalha com painéis há 12 anos. O
que o motivou foi o ineditismo. “Para mim, foi o fato de ter uma motivação coletiva,
de ser um ato em grupo contra o desrespeito ao espaço público realizado pelas
propagandas. Achei maravilhosa a experiência de ver artistas realizando uma
intervenção com motivação em benefício da cidade”.
De Broklyn para Niterói
Justin Phame, autor dos grafites da página, começou em 1998 nos metrôs,
trens e muros de Nova York. Mudou-se para Niterói com sua esposa e continuou na
arte, pintando com mais liberdade. “Me sinto livre para fazer meus grafites no Brasil.
Nos EUA, somos tratados como criminosos.”
Seu trabalho pode ser visto em muros de bairros como Botafogo e Vila da
Penha, e na cidade de Niterói. Amante das cores – a maior motivação para pintar -,
diz que o objetivo de sua arte édeixar o dia do pedestre mais alegre. “Não estou
tentando enviar uma mensagem; quero que as pessoas vejam meu trabalho e se
sintam felizes”.
Ao contrário de outros grafiteiros, Justin não parece gostar de pichação. “Eu
respeito pichadores, mas não gosto quando eles sobem em prédios residenciais e
fazer peças feias. Eles estragam a moradia das pessoas. Algumas pichações são
boas, mas eu não consigo ler nada”. Ele sente total liberdade para pintar sem o
impedimento da polícia: “Os americanos sempre denunciam quando veem grafite.
São tão estúpidos que acreditam que a arte é feita por bandidos”, reclama.
“Brasileiros amam grafite e acredito nessa energia positiva do público. As
pessoas andam por onde estou trabalhando e sempre dizem ‘uau, incrível, muito
legal’”.
56
Gabriel Mattos e o surreal
Aos 19 anos, Gabriel Mattos já pode se considerar um veterano no grafite:
começou há cinco anos e não parou mais. Usando elementos que beiram o
surrealismo, costuma pintar lugares velhos e destruídos com o objetivo de “levar a
arte pra onde precisa”.
Com rolinho, spray e pincéis, Gabriel busca o abstrato usando misturas de
cores, mas sem muitas referências. Não costuma fazer esboços – a arte feita
durante o Movimento foi pensada assim que chegou ao local. Recebe muitos
elogios, críticas e até reclamações da polícia: “No grafite, é normal levar dura”.
Apesar de achar difícil viver de arte, não pensa em desistir: “Meu objetivo é
mostrar que o grafite é muito mais que protesto”.
Felipe Justino, o Blunt
Felipe Justino, 23 anos, conhecido como Blunt, começou a grafitar no ano de
2009, quando juntou dinheiro para comprar latas de spray e treinar em casa.
Costuma se inspirar em elementos de seu cotidiano e de muitos outros jovens:
skate, rap, rock, tatuagem e pichação – este último, segundo ele, provoca
preconceito de algumas pessoas: “Sempre tem um ou outro que ofende. As pessoas
idosas falam pra sair dessa vida e às vezes querem nos evangelizar, sem imaginar
que muitos grafiteiros são cristãos”, afirma. Para complementar a renda, Felipe tem
uma grife de camisas com estampas de seu grafite - a PowPowPow.
Seu trabalho é bem visto nas ruas? As pessoas respeitam ou acham que é
pichação?
A grande maioria respeita e gosta, mas sempre tem um ou outro que chama de
pichador. O grafite é muito diferente de pichação, que também não é algo feio. Os
idosos às vezes querem nos evangelizar, sem nem mesmo saber que muitos
grafiteiros são cristãos.
Quais os temas abordados?
57
Eu costumo pintar coisas que eu gosto e que estão presentes em meu dia-a-dia,
como skate, grafite, pichação, rap, rock e tattoo.
Por que escolheu as ruas como cenário dos seus desenhos?
Por que é onde precisa, onde tem necessidade de informação desse tipo. Procuro
fazer os trabalhos em lugares movimentados.
Você aborda assuntos políticos ou sociais com seu trabalho?
Mais pro lado social. Tento mostrar a arte do grafite mesmo a maioria conhecendo
como vandalismo. A mensagem que tento passar é que há vários estilos de arte,
que muitas vezes são desvalorizados.
Quais suas influências?
Tenho várias, como Mike Deodato, Os Gêmeos e grafiteiros de Niterói e São
Gonçalo.
Anexo 5
Manifestações de 2013 – o grafite como arma de protesto
Pichações marcam a revolta popular no Brasil
O ano de 2013 será lembrado pelo grande número de protestos realizados
pela população brasileira. Começando pelo aumento das passagens de ônibus,
cidadãos foram às ruas reclamar contra a corrupção e por melhores condições de
vida e de trabalho. Com o constante embate contra a polícia, os manifestantes
usaram vários meios para demonstrar indignação e resistência – entre eles, o
grafite.
Sempre considerada manifestação de vandalismo, a pichação apareceu em
forma de símbolos e frases de ordem que tomaram conta das ruas, monumentos,
bancos e edifícios de todo o país. No Rio, predominaram ofensas contra Cabral,
58
Paes e a PM. As fotos a seguir mostram as marcas deixadas em junho, ápice do
movimento contra o aumento das passagens. Grande parte delas já foi apagada.
Não se sabe até quando o gigante continuará acordado, mas os protestos que
marcaram a segunda metade do ano já entraram para a história.
Anexo 6
Projeto NARUA traz poesia às ruas e transforma os muros de Niterói
Primeira edição do projeto traz Vinícius de Moraes às paredes na subida da Ponte
Rio-Niterói
O NARUA é um projeto cultural emespaços públicos que une grafite e música.
Produzido por Silverton Cruz e Yule Mansur, tem como objetivo transformar a cidade
numa exposição a céu aberto. A primeira edição aconteceu nos dias 25, 26 e 27 de
outubro, nos muros da Emop (Empresa de Obras Públicas), perto da Ponte Rio-
Niterói.
Dez grafiteiros foram convidados pela Fundação de Arte de Niterói (FAN). Lya
Alves, David Baltar, Gabriel Mattos, Marcelo Melo, Felipe Blunt, Andréa Paula,
Raphael Egi, Will Silva, Pakato e Maco tinham como missão interpretar o poema “O
operário em construção”, de Vinícius de Moraes, em comemoração ao centenário do
Poetinha, ocorrido em 19 de outubro. As obras uniram o traço de cada artista e a
profundidade do texto, com interpretações únicas.
Anexo 7
Arte geométrica
Como o Polígonno supera seus suportes e se adapta a qualquer tela
59
A designer Ana Carolina Ramos e o artista plástico e filósofo Eric Gerhard
formam o Polígonno - projeto que, segundo Carol, trabalha com a construção do
belo na arte. “Pensamos numa ideia estética que fosse possível de executar as mais
diversas imagens possíveis, dentro de uma ordem poligonal. A filosofia proposta
pelo Polígonno é de não se deixar enquadrar por molduras”.
A arte pode ser monocromática ou colorida e transborda pelos suportes,
começando em uma tela e terminando na parede, sem fronteiras. Para a riqueza do
trabalho, a dupla prioriza a pesquisa e produção constantes. “A nossa intenção é
causar mais e mais beleza. Trabalhamos essencialmente com a construção do
belo.”
Ao contrário da maioria dos artistas de rua, Carol e Eric preferem grafitar em
parceria com lojas ou empresas, com temas vinculados ao Pollígono. A dupla já
pintou alguns muros em Niterói e tem projetos para Recreio, Barra, Itaboraí, São
Paulo e nos Estados Unidos. Os dois partiram para Seattle para participar da
Affordable Art Fair, feira de arte com viés alternativo realizada em diferentes cidades
ao redor do mundo.
Carol diz que o trabalho feito na rua tem saldo positivo: “É simplesmente
emocinante tanto reconhecimento, perceber que causamos no expectador tanta
admiração!”
O Polígonno é fortemente influenciado pelo neoconcretismo brasileiro, Hélio
Oiticita e Lygia Clark.
Anexo 8
Idol No! Project e o pós-grafite
Coletivo recicla materiais para customizar ideias
O Idol No Project é um coletivo de arte formado por Djone Real, Mary Girl,
Sock PPXI, Be Mendes e as filhas do casal Djone e Mary: MM, de quatro anos, e
Pink Girl,de um ano e meio. Autodenomiado pós-grafite (segundo Mary, “uma
60
vertente do grafite, que busca novos suportes”), o grupo também conta com a
participação de colaboradores.
A assinatura IDOLNO! surgiu quando Djone, que até então fazia parte do
grupo Flash Black Crew, sentiu a necessidade de criar sua própria equipe. Utilizando
reciclagem e reaproveitamento, o coletivo pretende “customizar coisas e ideias”, nas
palavras da Mary, utilizando spray com pincel, stencil, carimbos sobre fotos, roupas
e outros suportes.
Os artistas têm como influência desde Banksy até Andy Warhol, passando por
Van Gogh, Hendrix e pichação.
Recommended