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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
A MÚSICA NA ESCOLA: PERSPECTIVAS A PARTIR DA OBRIGATORIEDADE DO
ENSINO
Aparecida Pinheiro de Souza Barbosa1
Cleusa Erilene dos Santos Cacione2
RESUMO
Encontramo-nos em um momento histórico de transição com a promulgação da Lei 11.769/2008 que trata da obrigatoriedade do ensino de música na escola. As possibilidades de reflexões foram muitas, promovendo assim um diálogo com as inúmeras manifestações musicais da contemporaneidade. Este projeto foi implementado com alunos da 5ª e 8ª séries, da Escola Estadual Santa Terezinha, no município de Santo Antonio da Platina/PR,pertencente ao Núcleo Regional de Educação de Jacarezinho, tendo como fio condutor a música a partir da obrigatoriedade do seu ensino. O mesmo foi desenvolvido na modalidade de pesquisa, pesquisa-ação, para subsidiar a lacuna entre teoria e prática, havendo assim a participação dos alunos e professora num processo de ação-reflexão-ação, onde utilizamos diferentes estratégias. Os alunos participaram ativamente do processo de planejamento da própria aprendizagem, que os auxiliou a serem flexíveis, reconhecendo o outro e compreendendo seu próprio meio pessoal e cultural. O trabalho foi desenvolvido em quatro etapas, quando cada série chegou a uma conclusão. Pode-se considerar que, a relação entre teoria, prática e interdisciplinaridade foram atingidas à medida em que os trabalhos realizados contemplaram as sequências metodológicas, culminando com DCE do Paraná, que contempla o teorizar, o sentir e perceber e o trabalho artístico de forma positiva e válidas para o trabalho pedagógico com música.
Palavras-chave. Música. Educação. Arte. Educação Musical.
1 Professora PDE. Disciplina de Arte. Escola Estadual Santa Terezinha – EF. Santo Antônio da
Platina-PR 2 Orientadora, Professora Ms. Do Curso de Graduação em Música da Universidade Estadual de
Londrina – UEL.
2
ABSTRACT
We are in a transitional moment in history with the promulgation of the law that deals with 11.769/2008 requirement for teaching music in school. The possibilities are many reflections, thus promoting a dialogue with the many manifestations of contemporary music. This project was implemented with students in 5th and 8th grades, the State School Santa Teresa, in Santo Antonio da Platina / PR, Regional Education Center of Jacarezinho, with the common thread of music from the mandatory education. It was developed in the form of research, action research, to subsidize the gap between theory and practice, with the involvement of students and teachers in a process of action-reflection-action where we use different strategy. Os students participated actively in the process planning their own learning, which helped them to be flexible, recognizing the other and understanding their own personal and cultural environment The study was conducted in four stages, where each series has come to a conclusion. One can consider that the relationship between theory, practice and interdisciplinarity were affected to the extent that the work covered the methodological sequence, culminating in Paraná where DCE includes theorizing, feeling and sensing and the artwork in a positive and valid for pedagogical work with music.
Keywords. Music. Education. Arts. Music Education.
1. INTRODUÇÃO
A música é uma forma de expressar-se, de compreender e de se relacionar
com o mundo e com as outras pessoas. Constitui, assim, uma área de conhecimento
autônoma, com especificidades e fundamentos próprios, e, por esse motivo, é
importante e legítimo que todos tenham acesso a esse conhecimento, de maneira
democrática, assim como se tem aos demais componentes curriculares da
Educação Básica, no Brasil. Entretanto, na história recente da educação brasileira,
isso não tem acontecido. Por diversos fatores, o conhecimento musical
sistematizado tem sido excluído da escola, a despeito de a música ser uma das
áreas compreendidas pela disciplina de Arte.
A aprovação da Lei 11.768, de 11 de agosto de 2008, torna a música
componente curricular obrigatório em todos os níveis da Educação Básica. Nesse
contexto, inúmeras dúvidas acometem os professores de arte que atuam nas
3
escolas: como distribuir o tempo entre a música e as demais áreas artísticas,
garantindo a qualidade do ensino de cada uma? Como selecionar e organizar
sistematicamente os conteúdos musicais? Que recursos seriam necessários ou mais
apropriados para otimizar o processo de ensino e aprendizagem musical? Como
inserir a cultura musical dos alunos nesse processo? E, especialmente, como
superar a existência de lacunas referentes ao conhecimento musical na própria
formação dos professores?
O ensino de Arte na realidade da Educação Básica brasileira é um desafio
para o professor que anseia desenvolver as linguagens de maneira consciente e
compromissada, permitindo ao aluno uma percepção de Arte e suas múltiplas
especificidades, possibilitando a ampliação do fazer e do pensar a Arte, como
contribuição para a formação da cidadania.
No que diz respeito mais especificamente à música, é notável sua presença
marcante no dia-a-dia das pessoas. Entretanto, poucos têm acesso ao
conhecimento musical a ponto de poderem fazê-lo instrumento para o exercício de
práticas sociais. Isso resulta, via de regra, numa submissão à produção da indústria
cultural e num fazer musical desprovido de recursos expressivos. Essa situação
evidencia a necessidade da existência de uma educação musical organizada e
estruturada, que seja acessível a todos.
Sendo a música uma linguagem artística com especificidades e
fundamentos próprios, pode-se dizer que seu ensino deve ter um papel relevante
como as demais áreas do conhecimento, e isso requer um estudo sistematizado,
reflexão e prática. Assim, é necessário que esteja inserida nos projetos
pedagógicos e no cotidiano da escola, de maneira a garantir a construção do
conhecimento e, consequentemente o desenvolvimento musical dos estudantes da
Educação Básica.
Entretanto, estudos e discussões recentes realizados por profissionais
atuantes no âmbito da área de educação musical3, buscam comprovar a
importância do desenvolvimento musical na formação do ser humano e na
construção da cidadania, culminando com a aprovação da Lei 11.796/08, que
instituiu a obrigatoriedade do ensino de música nos diversos níveis da Educação
3 Foge ao propósito deste trabalho aprofundar tais aspectos, que podem ser facilmente verificados
nas publicações e nos congressos da Associação Brasileira de Educação Musical – ABEM.
4
Básica.
Entretanto, mesmo após a aprovação da referida Lei, pode-se perceber que
ainda há um longo caminho a percorrer até que a ela se faça efetivamente presente
no dia-a-dia das escolas. Portanto, esse projeto foi desenvolvido no intuito de
contribuir para a construção desse caminho, por meio da prática pedagógica e da
reflexão.
Enfim, frente a esse contexto, é grande a insegurança dos professores de
Arte quanto à necessidade de promover o processo de ensino e aprendizagem da
música na Educação Básica. Tendo como objetivos identificar estratégias que
favoreçam a aprendizagem por meio do fazer musical - com ênfase na criação e na
apreciação, a fim de que o aluno perceba e se aproprie da música como uma
possibilidade de expressão e de interação entre ele se seu contexto social,
explorando suas possibilidades expressivas nas diferentes linguagens artísticas.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 AS POSSIBILIDADES DA INTERDISCIPLINARIDADE NA ARTE
Arte é conhecimento elaborado historicamente e traz culturalmente a visão
particular do artista e um olhar crítico sensível sobre o mundo. O fundamental no
ensino de Arte é a educação dos sentidos, concebido como conhecimento, trabalho
e expressão da cultura. O trabalho sistemático com o conhecimento vai possibilitar o
desenvolver dos aspectos cognitivo, perceptivo, criativo e expressivo na linguagem
visual, musical, cênica por meio da fruição, da apreciação, da leitura e da reflexão do
fazer, bem como sua inserção no tempo.
Hoje, há uma abertura para a compreensão da música e seus processos,
observando-a não de modo isolado dos demais conhecimentos escolares e sim com
conteúdos e metodologias próprias que possam subsidiar a atuação dos
educadores nas diferentes realidades educacionais.
Fonterrada (2008, p.13) afirma que:
5
o fator de a música ter ou não seu valor reconhecido coloca-o dentro ou fora do currículo escolar, dependendo de quanto é ou não considerada pelo grupo social. Se, em determinada cultura, a música for uma das grandes disciplinas do saber humano, o valor da educação também o será alto, em pé de igualdade com os outros campos do conhecimento. Se, porém, não houver esse reconhecimento, sua posição em relação as demais áreas será também marginal.
Por outro lado, segundo as Diretrizes Curriculares do Paraná, (2008, p.76)
No panorama musical, existe uma diversidade de estilos, e de gêneros musicais, cada qual com suas funções correspondentes a épocas e regiões. Cada povo ou grupo cultural produz músicas diferentes ao longo de sua história; surgem, assim, diferentes gêneros musicais. Eles não são isolados; sofrem transformações com o tempo, influencia de outros estilos e movimentos musicais que se incorporam e adaptam-se aos costumes, a cultura, a tecnologia, aos músicos e aos instrumentos de cada povo e época.
No entanto a música é uma forma de representar o mundo, relacionar-se
com ele; e, levar o aluno a compreender a imensa diversidade musical existente,
que de uma forma direta e indireta interfere na vida da humanidade, sendo uma das
funções da aula de música. Como afirma Gainza, “A linguagem musical é aquilo que
conseguimos conscientizar ou aprender a partir da experiência”. (GAINZA, 1998,
p.113).
Corroborando com esta idéia, Gonçalves (1999), sugere:
[...] pela força da música, por seu poder de comunicação, coerção, identificação, transformação e sublimação, proponho sua adoção irrestrita no âmbito educacional, para que o educando venha a promover transformações em si e em seu meio. [...] com a música somos levados a desenvolver múltiplas capacidades. (GONÇALVES, 1999, p.63 - 64).
Dessa forma, o ensino da Arte é de suma importância na escola e fora dela,
pois onde quer que se vá, está presente desde um outdoor, um grafismo no muro,
uma vitrine de loja, uma peça de teatro por mais mambembe que seja, as capas de
cadernos dentre outros, o ser humano é um ser simbólico, inventa e cria símbolos, e
a arte é um patrimônio cultural que nos aproxima dos códigos, fazendo
6
interpretações de qualquer época, povo e cultura, e observando que, em questão de
cultura, há toda uma massificação da arte em favor de uma “cultura de massa”.
Assim, sendo a Arte uma área de conhecimento, a escola precisa
proporcionar aos alunos a oportunidade de compreendê-la como tal, pois:
quanto mais o aprendiz tiver oportunidade de ressignificar o mundo por meio da especificidade da linguagem da arte, mais poder de percepção sensível, memória significativa e imaginação criadora ele terá para formar consciência de si e do mundo. (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA; 1998, p.12).
Sob essa visão cabe ao educador estabelecer conexões entre teoria e
prática, ampliando e integrando conhecimentos das diferentes linguagens da Arte,
criando maneiras de despertar a consciência a sensibilidade. A partir daí,
pesquisadores, educadores musicais, como Swanwick, arte-educadores, como Ana
Mae Barbosa fundamentam o ensino da Arte em três campos conceituais: o fazer
artístico, a leitura de imagem, a contextualização (grifo nosso).
Portanto,
A Arte na Educação como expressão pessoal e como cultura, é um importante instrumento para identificação cultural e o desenvolvimento individual. Através da Arte é possível desenvolver a percepção e a imaginação, apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a capacidade criadora de maneira a mudar a realidade que foi analisada, (BARBOSA, 2005, p.99).
Sobre o processo ensino/aprendizagem de música, Fonterrada (apud
LOUREIRO, 2003, p.114), afirma que:
(...) o aprendizado da música envolve a constituição do sujeito musical, a partir da constituição da linguagem da música. O uso dessa linguagem irá transformar esse sujeito, tanto no que se refere a seus modos de perceber, suas formas de ação e pensamento, quanto em seus aspectos subjetivos. Em conseqüência, transformará também o mundo deste sujeito, que adquirirá novos sentidos e significados, modificando também a própria linguagem musical.
7
Partindo dessa premissa, a educação musical não é apenas uma atividade
destinada a divertir e entreter as pessoas, tampouco um conjunto de técnicas,
métodos e atividades com o propósito de desenvolver habilidades e criar
competências. Embora essa seja uma parte importante de sua tarefa, o mais
significativo na educação musical é de que ela possa ser o espaço de inserção da
Arte na vida do ser humano, dando-lhe possibilidade de atingir outras dimensões de
si mesmo e de ampliar e aprofundar seus modos de relação consigo próprio, com o
outro e com o mundo. Essa é a real função da Arte e deveria estar na base de toda
proposta de educação musical.
Logo, as referências pessoais, fundadas nas experiências individuais, e as
referências culturais, nascidas no convívio com a cultura de seu entorno, direcionam
a conhecer arte mesmo que o indivíduo não tenha essa consciência. E assim,
quanto mais referências houver, maiores serão as possibilidades e perspectivas
para análises e interpretações. Dessa forma, as diretrizes curriculares do ensino de
Artes do Paraná (PARANÁ, 2008) contempla a metodologia do ensino de arte, com
três momentos da organização pedagógica.
1º momento: teorizar
É imprescindível que o professor considere a origem cultural e o grupo social
dos alunos, e que trabalhe nas aulas os conhecimentos originados pela
comunidade. Também é importante que se discuta como as manifestações artísticas
musicais podem produzir significado de vida aos alunos, tanto na criação como na
fruição de uma obra musical.
2º momento: sentir e perceber
Os alunos devem ter acesso à música, ao teatro,à dança e as artes visuais
para se familiarizarem com as diversas formas de produção artística. Trata-se de
envolver apreciação e a apropriação dos objetos da natureza e da cultura em uma
dimensão estética
8
3º momento: trabalho artístico
A prática artística – o trabalho criador – é expressão privilegiada, é o exercício
da imaginação e criação. E o processo de produção que acontece quando ele
interioriza e se familiariza com os processos artísticos musicais e humaniza seus
sentidos.
Os professores de arte contam com o referencial de uma interessante
proposta de Barbosa (2005) sustentada por três aspectos fundamentais:
1º aspecto: o produzir
Promover situações em que a expressão de cada indivíduo se manifeste em
produções próprias. O fazer/produzir, é marcado pelo recriar, dar-lhe nova
significação, explorando as possibilidades sonoras de diferentes materiais, e formas
de organizar o som. Nesse momento, o ato da criação é valorizado.
2º aspecto: o apreciar
Enxergar as oportunidades para o desenvolvimento da sensibilidade
artística, da capacidade do aluno ler e apreciar obras de Arte de diferentes
linguagens. O apreciar são ações ligadas ao desenvolvimento da apreciação,
observação, ouvir, assistir, sentir. Partindo da educação musical, tomando como
base a vivência cultural do educando, promovendo reapropriação ativa e
significativa.
3º aspecto: o contextualizar
Possibilita a contextualização das obras, dando acesso ao conhecimento da
história das diferentes artes, da vida e das obras de artistas de diferentes culturas,
tanto as universalmente conhecidas quanto as nacionais e locais. A
contextualização estabelece relações, possibilita o entendimento de que a música se
dá num contexto, tempo e espaço.
9
2.2 RELACIONANDO A EDUCAÇÃO COM A EDUCAÇÃO MUSICAL
Entre inúmeras dificuldades que podem ser apresentadas, destaca-se a
falta de formação da maioria dos professores de Arte para ensinarem música, esse
aspecto reflete-se no dia-a-dia da disciplina, suscitando nesses professores dúvidas
de diversas ordens. Sobre este tópico, Fonterrada levanta alguns questionamentos
sobre quem deve dar aulas de música:
O professor de educação musical? Professor de classe? O professor de artes? O músico que é também professor de educação musical? Se a resposta a esta última questão for positiva, a prática da música na escola se encerra aqui, pois, após anos que seguiram a LDB 5.692/ diminuiu tanto o número de professores de música que, se hoje por decreto fosse reimplantado o ensino nas escolas, já não seria possível cumpri-lo. Sendo assim, é preciso resgatar o professor que mesmo não sendo músico, goste de música e a traga para dentro da escola. Esse é um bom começo e pode servir de preparação a um tempo posterior, em que haverá professores habilitados em música em todas as escolas. Com a implantação de licenciaturas específicas em música essa possibilidade não é utópica. (FONTERRADA, 2008, p.274).
Esse projeto propôs buscar respostas a essas perguntas, e espera, dessa
forma, contribuir para que a música esteja, efetivamente, mais presente na
educação e na vida de nossas crianças e jovens.
Assim, uma metodologia para se trabalhar com música na escola pode ser a
estratégia do re-arranjo4, ou seja, um processo criativo em que a música escolhida
atua como ponto gerador para integrar as quatro áreas da Arte: área musical, a
visual, a cênica e a dança.
O ‘re-arranjo’ pode ser realizado com os mais diversos tipos de recursos sonoros, não requerendo qualquer material específico para a sua aplicação, embora sem dúvida as possibilidades de produção de sons estabeleçam limites para o resultado final. [...] muitas vezes são explorados apenas o corpo e a voz: outros grupos utilizam como fonte sonora diferentes objetos, ‘instrumentos’ construídos por eles, [...].Eventualmente, instrumentos musicais (convencionais) são empregados por alunos que os tocam. (PENNA; MARINHO, 2005, p.134)
4 Na proposta do “re-arranjo”, mantivemos a grafia com hífen, apesar de a palavra “rearranjo” já estar
dicionarizada- como no dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa 3.0 (MARINHO, 2010, p.171).
10
Sob essa visão, cabe ao professor de arte trabalhar com os eixos
norteadores: apreciação e reflexão, experiência de fruição, experiência da produção
artística.
O fazer/produzir, é marcado pelo recriar, dar-lhe nova significação, explorando
as possibilidades sonoras de diferentes materiais, de diferentes formas de organizar
o som. Nesse momento o ato da criação é valorizado.
Por outro lado, comumente, alunos e professores têm um referencial quase
único, que lhe é imposto pelos meios de comunicação. Hábitos de escuta e prática
musical foram abandonados e já não fazem parte da vida escolar, e além do mais a
produção musical para consumo é descartável, sem possibilidades de maiores
aprofundamentos.
Para Swanwick (apud GONZAGA, 2010, p.22-24) professor inglês,
especialista em música do conservatório musical da Grã-Bretanha, considera que é
fundamental unir atividades de execução, apreciação, e criação para que os alunos
se desenvolvam artisticamente. Para ele, “os interesses musicais dos alunos são
muito variados: alguns gostam de ouvir, outros querem compor ou ainda cantar e
tocar. O professor precisa dominar um leque de atividades para atender essas
demandas”, e portanto “o desenvolvimento musical depende das oportunidades de
interação com a música, do ambiente musical de cada um e da educação”.
O mesmo professor afirma que toda música nasce em um contexto social e que
ela acontece ao longo, intercalando-se com outras atividades culturais.
3 MÉTODOS E MATERIAL
3.1 PESQUISA-AÇÃO
Este trabalho foi desenvolvido na metodologia da pesquisa-ação para
subsidiar a lacuna entre teoria e prática, havendo assim a participação dos alunos
num processo de pesquisa onde utilizamos diferentes estratégias, além de
participarem ativamente do processo de planejamento da própria aprendizagem,
auxiliando a serem flexíveis, reconhecer o outro e compreender seu próprio meio
11
pessoal e cultural.
Na trajetória da pesquisa-ação que nunca é fixa, serve de fio condutor para a
atuação do docente em relação aos alunos.O foco é promover a compreensão dos
problemas que os alunos pesquisam, a capacidade de ir além das informações
dadas, podendo reconhecer as diferentes versões de um fato, buscando
explicações, formulando hipóteses sobre as conseqüências dessa pluralidade de
pontos de vista.
Para Hernandez (2000), o objetivo da pesquisa-ação é resolver ou esclarecer
os problemas identificados na situação observada; a pesquisa não se limita a ação,
pressupõe-se um aumento do conhecimento e do nível de consciência das pessoas
ligadas à situação e do próprio pesquisador.
3.2 MATERIAIS
Uma ação que permeou toda nossa abordagem metodológica foi a
percepção, criatividade como a capacidade de reinventar, criar e inovar elaborando
instrumentos musicais não convencionais, partindo de materiais reaproveitáveis
como: latas, potes plásticos, pratos de isopor, figurinos, adereços, imagens
transformando o espaço da apresentação em um ambiente não convencional.
Além disso, foram utilizados os instrumentos convencionais que fazem parte
do acervo da escola, como bateria, chocalho, pandeiro e outros trazidos pelos
alunos, baixo, triângulo, cavaquinho, violão, cajon e guitarra.
4 . IMPLEMENTAÇÃO DO PROJETO
Este projeto foi implementado com estudantes da 5ª e 8ª série (8ª série D,
8ª série A, grupo 1 e 2 e 5ª série A), da Escola Estadual Santa Terezinha, no
município de Santo Antonio da Platina/PR, Núcleo Regional de Educação de
Jacarezinho, tendo como fio condutor a música a partir da obrigatoriedade do seu
ensino.
12
A intervenção no primeiro momento foi a pesquisa do repertório musical do
cotidiano do aluno, ao professor coube conduzir este trabalho, fazendo a mediação
nesse processo.
A pesquisa-ação possibilitou parâmetros alternativos no decorrer dos
trabalhos, pois as propostas foram construídas de acordo com os questionamentos
e sugestões dos alunos.
Para dar início ao processo de construção em música, apresentei aos
alunos vídeos, como: Barbatuques, Stomp, entre outros.
Neste momento foi apresentada a proposta de elaboração do re-arranjo de
canções previamente selecionadas, partindo das músicas que eles ouviam, ou seja,
as quais faziam parte de seu cotidiano.
O trabalho foi desenvolvido em quatro etapas, quando cada série chegou a
uma conclusão.
1ª Etapa. Preparação – o teorizar, o contextualizar
A preparação para a atividade de re-arranjo iniciou-se com a avaliação
diagnóstica dos alunos quanto aos conteúdos que seriam abordados na unidade
didática tais como: afinal o que é som, classificação dos instrumentos musicais,
(convencionais e não convencionais) grafia alternativa (desenho do som) e
atividades preparatórias para elaboração do re-arranjo, compreendendo ainda a
realização de apreciações musicais de vários gêneros musicais, a execução de
canções utilizando canto e acompanhamento.
As atividades de preparação foram desenvolvidas em todas as turmas, de
acordo com o nível de conhecimento musical.
Através de vídeos de vários grupos musicais, foi selecionado o grupo
Barbatuques, cuja característica é criar sons com o próprio corpo.
A partir da idéia central do grupo musical, os alunos colocaram ritmo e som na
canção “nós vamos fazer música” (fotos abaixo5), usando todas as fontes sonoras
possíveis:
5 As fotos das experiências são apenas das turmas das 8ª séries.
13
• sons produzidos por objetos do cotidiano;
• sons produzidos pela voz;
• sons produzidos pelo corpo humano .
• sons produzidos por instrumentos não convencionais
14
2ª Etapa. Apreciação – o sentir, o perceber.
Após desenvolver as atividades de preparação, os alunos apontaram suas
canções preferidas
Cada grupo escolheu uma música, conforme descrito abaixo:
8ª série D: Só os loucos sabem, com Charlie Brown Jr
8ª série A: 1º grupo – Só os loucos Sabem, com Charlie Brown Jr;
2º grupo – poutpurri
5ª série A- Madri, com Fernando e Sorocaba.
8ª Série D
Dentre algumas músicas selecionadas pelos alunos, por votação, a escolhida
foi “Só os loucos sabem”.
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Só Os Loucos Sabem
Charlie Brown Jr
Agora eu sei exatamente o que fazer,
Bom recomeçar6, poder contar com você,
Pois eu me lembro de tudo irmão, eu estava lá também,
Um homem quando esta em paz, não quer guerra com ninguém,
Eu segurei minhas lágrimas, pois não queria demonstrar a emoção,
Já que estava ali só pra observar e aprender um pouco mais sobre a percepção,
Eles dizem que é impossível encontrar o amor sem perder a razão,
Mas pra quem tem pensamento forte, o impossível é só questão de opinião,
E disso os loucos sabem, só os loucos sabem,
Disso os loucos sabem, só os loucos sabem
Toda positividade eu desejo a você,
Pois precisamos disso, nos dias de luta,
O medo cega os nossos sonhos,
O medo cega os nossos sonhos,
Menina linda eu quero morar na sua rua,
Você deixou saudade, você deixou saudade,
Quero te ver outra vez, quero te ver outra vez,
Você deixou saudade,
Agora eu sei exatamente o que fazer,
Bom recomeçar, poder contar com você,
Pois eu me lembro de tudo irmão, eu estava lá também
Um homem quando está em paz não quer guerra com ninguém.
Fonte:www.vagalume.com.br.
6As palavras em negrito foram usadas para estampar as camisetas dos alunos usadas no dia da apresentação. (a autora).
16
5ª Série A
A escolha da turma foi uma música do universo sertanejo-universitário,
“Madri”, bem ao gosto dos adolescentes.
Madrid
Fernando e Sorocaba
Que saudade amor
tô sabendo que ai na Espanha tudo é lindo
Você me deixou e aqui dentro
o meu coração ficou partido
Nessa cidade
não vou mais sorrir
Que bom seria se São Paulo fosse do lado de
Madrid
Ooooooooo
No Puedo más, mi corazón
tá doendo aqui na solidão
No puedo mas vivir sin ti
Volta logo pra São Paulo ou eu vou pra Madrid
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Que saudade amor
Volta logo pro hemisfério sul do mundo
Ficar sem você
Me mostrou o quanto é bom estarmos juntos
Sonho tão lindo é ter você aqui
Que bom seria se São Paulo fosse do lado de Madrid
Ooooooooooo
Fonte: www.vagalume.com.br
As canções foram apreciadas, analisadas pela turma e, posteriormente,
registrada todas as possibilidades de criação abrangendo as quatro áreas da arte:
cênica, plástica, dança e música (re-arranjo).
3ª Etapa. Elaboração dos arranjos: o fazer, o produzir
Nesta etapa, alunos criaram um novo arranjo, integrando as possibilidades
expressivas e musicais levantadas na apreciação.
Pensando numa estruturação que leve em conta as idéias levantadas na
apreciação ao longo desse processo, o grupo registrou suas decisões e escolhas
quanto ao ”arranjo, dramatização, poesia, canto e o cenário”. Assim surgiu na 8ª
série “D” a possibilidade de relacionar a música escolhidas pelos mesmos com o
conteúdo que estava sendo desenvolvido na disciplina de História: “Música e
imagem na cultura afro-brasileira”, pelo prof. Julio Rezende (professor PDE).
Um novo re-arranjo para música foi desenvolvido, transferindo-se de rock
para o reggae. Foram ainda selecionadas palavras da música como: paz, lágrimas,
guerra, sonhos, emoção, razão, amor, positividade, opinião, loucos, luta, Irmão e
saudade, palavras estas que se transformaram em belas poesias. Cada aluno
escolheu uma dessas palavras para estampar em sua camiseta.
Foi trabalhada a expressão, a dramaticidade, a postura na interpretação oral
das poesias produzidas.
Na sequência temos a 8ª série A, que foi dividida em dois grupos,
considerando o grande número de aluno.
1º Grupo
A escolha também recaiu na música “Só os loucos sabem”, preferida do
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grupo anterior. Isso aconteceu pelo fato de se tratar de um grupo musical de
preferência dos adolescentes.
Este grupo transportou a música para ritmo de pagode, usando alguns
instrumentos como: cavaquinho, agogô, triângulo, chocalho e bateria. Foi
desenvolvida uma encenação desmembrando a história da música.
Uma vez produzido e ensaiado o trabalho, o grupo se apresentou no palco
da escola e apresentou a nova versão para a música.
2º Grupo
O segundo grupo da 8ª série “A” realizou uma apresentação com base em
um Pout pourri das músicas Epitáfio (Titãs), Pais e Filhos (Legião Urbana) e A Paz
(Roupa Nova). O espetáculo contava a história de um homem chamado Tiago, que
começara a receber cartas anônimas, as quais continham em seu envelope 'azes' de
baralho. Cada 'áz' tinha um endereço, no qual havia uma pessoa que precisava da
ajuda do protagonista para que sua vida mudasse.
5ª Série A
Após assistirem a versão de vários vídeos da música “Madri” no Youtube, os
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alunos foram pesquisar no mapa Mundi a localização de Madri e São Paulo, a
distância em relação às duas cidades, a língua falada em Madri, a cultura, a religião,
o clima.
Dentre as atividades desenvolvidas como o desmembrando a história da
música, uma aluna produziu um texto para teatro, criando personagens, situações e
cenários a partir da letra. O pai da aluna se propôs a pintar um painel identificando
São Paulo e Madri. Posteriormente, foi ensaiada e encenada. No dia da
apresentação os alunos usaram uma camiseta com a estampa e frase escolhida
pelo grupo: “ O amor é essencial”.
4.1 RESULTADO
Após as produções concluídas, cada grupo apresentou os resultados de
seus trabalhos para seus familiares juntamente com a comunidade escolar. No dia
das apresentações foi entregue um folder aos convidados em que constava a
sequência das apresentações. A ideia surgiu na 8ª série “D”, quando os alunos
fizeram o esboço do mesmo, escolhendo as frases e ilustração. As atividades foram
registradas através de filmagens e fotografias.
As seqüências das apresentações foram:
1º: 8ª série D;
2º: 8ª série A, Grupo 1;
3º: 8ª série A, Grupo 2;
4º: 5ª série A
20
8ª série D – música: “Só os loucos sabem”, versão do re-arranjo em reggae.
8ª série A – 1º grupo “Só os loucos sabem” versão do re-arranjo pagode.
21
8ª série A – 2º grupo – Pout pourri
5ª série “A” – música: “Madri” Fernando e Sorocaba
22
4.2 AVALIAÇÃO
Avaliação é um tema extremamente polêmico e contemporâneo, por
envolver pessoas, sonhos, projetos de vida, e ainda questões éticas.
Deve-se fazer presente, tanto como meio de diagnóstico do processo ensino
e aprendizagem, quanto como instrumento de investigação da prática pedagógica.
Neste sentido, o portifólio para prática musical, não se resume em registros
escritos, pastas, e sim, numa constante reflexão das ações desenvolvidas. Os
registros de filmagem das ações foram feitos semanalmente, dialogando com os
mesmos sobre o seu próprio processo de aprendizagem. Este foi um momento
propicio para auto avaliação dos alunos, referente ao processo de elaboração dos
re-arranjos e com isso os resultados finais de cada um dos grupos. Foi ressaltado
ainda a criatividade, expressão, análise e reflexão, compartilhando significados para
que ocorram mudanças através do tempo.
Chegando ao resultado final das produções pode-se notar que os avanços no
processo ensino aprendizagem ficaram bem claros, possibilitando aos mesmos
questionamentos: onde estamos? Onde podemos chegar? O quê precisamos para
chegar?
Há, ainda uma discussão em torno das possibilidades de que a música seja
um instrumento de ação social para cada um deles, enquanto cidadãos.
5 CONCLUSÃO
Considerando as propostas das DCEs , Ana Mae Barbosa, Swanwick e dos
pesquisadores e educadores musicais arte-educadores pode-se considerar que, a
relação entre a teoria e prática foram atingidas à medida em que os trabalhos
realizados contemplaram as sequências metodológicas, culminando com as
contextualizações de forma positiva e válidas para o trabalho pedagógico com
música.
Quanto as dúvidas colocadas na problematização em relação as dificuldades
encontradas pelos professores, pode-se afirmar que o principal problema continua
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sendo o tempo disponível, pois a implementação desse projeto só foi possível
devido a flexibilidade proporcionada pelo mesmo.
Quanto aos objetivos propostos, constatou-se que a adoção de estratégias
para a educação musical deu resultado a partir do momento em que os alunos
participaram ativamente do processo, com a escolha de suas músicas preferidas e
não por imposição do professor. Esse primeiro momento possibilitou todas as
demais seqüências do Projeto e, ao mesmo tempo despertou a “curiosidade” por
outros assuntos, como foi ocaso da música “Madri” havendo assim a utilização de
pesquisa no mapa Mundi sobre a localização de Madri e São Paulo, a distância em
relação às duas cidades, a língua falada, a cultura, a religião, o clima.
Quanto aos recursos, esse também se constituíram em outro problema.
Primeiro, é preciso observar que uma das propostas era utilizar instrumentos não
convencionais, corpo como instrumento, mas ainda assim, a escola de
implementação, conta com instrumentos musicais, um salão nobre onde se pode
desenvolver as atividades (trata-se de um prédio pertencente a uma congregação
religiosa, e administrada pela mesma, ainda que pública), e apoio incondicional da
Equipe Pedagógica, portanto, não se pode dizer que essa seja a realidade da
maioria das escolas públicas.
Não se pode também ignorar as palavras do professor Swanwick, quando
afirmou que “o desenvolvimento musical depende das oportunidades de interação
com a música, do ambiente musical de cada um e da educação”; nesse sentido
penso que os trabalhos com re-arranjo a partir da preferência musical dos alunos –
nitidamente influenciados pela mídia, e possibilitou aos alunos a criação envolvendo
a interdisciplinaridade entre linguagens artísticas e outras disciplina. A ampliação da
cultura musical, nesse caso, foi possível através do método indutivo, ou seja, parte-
se dessa preferência particular para o geral, pois a apreciação musical deve estar
voltada para um ou outro gênero, onde tudo é cultura.
Agora é o momento para o professor repensar em novas metodologias para
se trabalhar a música em sala de aula, deixando bem claro, que o professor precisa
estar apaixonado por música, Arte. Como diz as belas palavras de Freire, “pesquiso
para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo”.
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REFERÊNCIAS
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