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ENCRUZILHADA DE ESTÓRIAS –
REGISTRO DAS FESTIVIDADES RELIGIOSAS
Thayná Cambará Beraldo
Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
thayna.cambara@gmail.com
Mário Teixeira de Sá Júnior
Universidade Federal da Grande Dourados.
mariosa@ufgd.edu.br
Introdução
Os municípios de Corumbá e Ladário de Mato Grosso do Sul possuem um
conjunto de atividades culturais bastante variadas e efervescentes. Alguns quilômetros
antes da entrada principal das duas cidades, é possível ver placas de sinalização na
estrada apontando que Corumbá, seria o berço da cultura (ROCHA, 1997).
Durante todo o ano ocorrem eventos culturais que movimentam diversos setores
da sociedade como do turismo, da economia, das religiões etc. O calendário comporta
celebrações1 que se mesclam em suas realizações. Elas ocupam um espaço significativo
do viver de parte dessa sociedade, mesmo em muitos casos estando fora do calendário
oficial (MENESES, 2014).
Essas celebrações envolvem grupos distintos da comunidade local e mesmo de
fora dela. É comum encontrar, devido à localização geográfica desses municípios,
bolivianos, sul-mato-grossenses e mato-grossenses em perfeita harmonia.
Entre os anos de 2018 e 2019, participamos da realização do “Inventário
Nacional de Referências Culturais – INRC” para o Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional – IPHAN, como subsidio para o reconhecimento da celebração do
1Celebração compreende o ato de comemorar, festejar, reverenciar, adorar, homenagear, através de atos rituais, praticados coletivamente por membros de um grupo.
“Banho de São João de Corumbá e Ladário” 2. Durante a pesquisa foi possível perceber
que os religiosos afro-brasileiros tinham uma participação bem mais significativa do
que os meios midiáticos e os registros escritos demonstravam (SÁ JUNIOR, 2016). O
evento, em uma primeira abordagem, uma festa católica, demonstrava a força e a
importâncias dos religiosos afro-brasileiros em sua realização.
Essa percepção nos permitiu estender essa análise para outras celebrações da
cidade. E, de igual forma, foi possível perceber que a participação dos religiosos afro-
brasileiros é muito mais efetiva do que a princípio transparecia. Em um calendário de
muitas celebrações o papel desses religiosos é presente e significativo em muitas delas
(PRANDI, 2001).
Isso se deve ao fato de que essas religiões e, de forma especial a Umbanda,
realizam, um sincretismo religioso com o catolicismo, além de outras expressões
religiosas. É possível afirmar que a Umbanda é eminentemente brasileira, fruto da
dinâmica cultural de religiões européias (catolicismo e espiritismo), africanas (Culto aos
Orixás, Culto aos Vodus e Culto aos Inkices) e religiões americanas (religiões
indígenas). Dessa resultante temos como um dos seus elementos a crença em seres
sobrenaturais que podem ser representados tanto por hagiografias e imagens de santos
católicos, como de africanos ou americanos.
Essa constatação levou a construção da pesquisa, em nível de pós-doutoramento,
intitulado “Encruzilhadas de estórias: memórias das religiões afro-brasileiras em
Corumbá e Ladário”, coordenada pelo Professor Doutor Mario Teixeira de Sá Junior da
Universidade Federal da Grande Dourados, a qual tenho acompanhado na condição de
produtora cultural.
É notória a forte participação nessas festas e celebrações, de detentores das
religiões afro-brasileiras, mas falta visibilidade a esses atores e estudos aprofundados
sobre as diferentes celebrações comuns nos municípios de Corumbá e Ladário/MS. É
essa lacuna que esta pesquisa pretende fechar, a partir de entrevistas e cobrindo os atos
religiosos dos afro-brasileiros no período de um ano (2020/2021), mais especificamente
2Pesquisa coordenada pelo Prof. Álvaro Banducci Junior da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
das festas de São Sebastião (Oxóssi) e Nossa Senhora dos Navegantes (Yemanjá) que
ocorrem, respectivamente, nos dias 20/01 e 02/02.
A Festa de São Sebastião ocorre no dia 20 de janeiro. Devido ao sincretismo
religioso, para os afro-brasileiros São Sebastião é Oxóssi, as casas religiosas, de uma
forma geral, e as de Corumbá e Ladário, de forma mais específica, realizam rituais de
festa nesse dia. Alguns devotos incluem o assistir missa para o Santo de dia e, à noite,
em seus terreiros realizam os festejos. O Orixá e os caboclos (espíritos indígenas) são
homenageados com frutas e bebidas que são compartilhadas com os adeptos e
convidados que participam da celebração. O intuito maior é agradecer o ano alimentar
anterior e pedir fartura para o presente, já que o Orixá é um grande caçador. Ao
contrário da Festa de Iemanjá, a festa de Oxóssi / São Sebastião é realizada em caráter
mais interno nas casas religiosas. Mesmo assim, movimentam um significativo
contingente de pessoas.
A festa de Iemanjá é uma das mais tradicionais festas do Brasil. Ela ocorre ou na
virada de ano, ou no dia 02 de fevereiro. Essa Orixá é associada a algumas santas
católicas, como Nossa Senhora dos Navegantes. Em Corumbá e Ladário a festa é
ressignificada. A deusa do mar é adaptada ao rio Paraguai. Essa atividade é fortemente
manifestada nas casas religiosas afro-brasileiras, onde são preparadas obrigações com
os elementos que agradam Yemanjá como perfume, espelho, pentes, flores e outros
elementos de adorno que são levados até o rio e entregues com pedidos e
agradecimentos.
De acordo com o livro “Manifestações Religiosas de Mato Grosso do Sul” da
Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul - FCMS, as celebrações em torno de São
Sebastião e Nossa Senhora dos Navegantes se tornaram tradição e são consideradas
algumas das mais antigas manifestações de fé do povo sul-mato-grossense.
1. Desdobramentos do trabalho de campo...
Com o intuito de cumprir com a programação do registro das manifestações reli-
giosas no período de janeiro e fevereiro de 2021, estivemos em campo acompanhando
as louvações em 06 (seis) terreiros inicialmente, sendo eles: Tenda Espírita São José;
Tenda Espírita de Umbanda Caboclo João da Mata; Tenda Nossa Senhora da Guia;
Tenda Nossa Senhora da Conceição; Ilé Axe Ogum Jáloya e C.E.U – Pai Oxalá.
O dia 20 de janeiro foi um dia intenso e de muito trabalho, o dia iniciou às 6h da
manhã no espaço religioso Tenda Espírita São José, com a celebração da palavra presi-
dida pelo Diácono Anselmo, religioso esse que já tem uma relação de amizade e de par-
ceria com o Babalorixa Pai Hamilton de Xangô que é responsável pela Tenda Espírita
São José, na oportunidade o celebrante falou sobre a importância de São Sebastião, so-
bre a prática da caridade, do amor ao próximo e do dialogo entre as religiões, o respeito
e os valores que devem ser resgatados, teve ainda a benção a todos com a água benta e
ao final a partilha do alimento em um café da manhã ofertado aos que estavam ali pre-
sentes.
Figura 1 - Celebração da Palavra – Tenda Espírita São José Em torno das 11horas da manhã foi à vez de acompanhar as atividades da Tenda
Nossa Senhora da Guia que como o zelador da casa o sacerdote João Gonçalves de Pau-
la Júnior, mais conhecido como Joãozinho de Cacilda, por ser sobrinho da grande e re-
conhecida religiosa Da. Cacilda. Em sua casa teve muita reza e oração, a cerimônia ini-
ciou-se com o zelador preparando de três alguidars com a comida para Oxóssi, enquanto
puxava “ponto” de caboclo. Enquanto isso os filhos da casa já tinham feito a ornamen-
tação do terreiro, assim como já estava pronta a oferta a Oxóssi, tendo a imagem de São
Sebastião ao meio, com folhagens verdes, muitas frutas e velas na cor branca e verde,
além de coités com vinho e charuto, além das varetas de incenso.
Ao adentrar a casa com os alguidars, o zelador ofertou a Oxóssi posicionando os
mesmo sobre a obrigação que já estava preparada ao centro do terreiro, os demais filhos
fizeram a saudação, deitando sobre a oferenda e em seguida deu inicio as orações, com
o sinal da cruz e a oração do terço, que foi seguido por todos. Ao final do terço, todos
puxaram e cantaram pontos saudando Oxóssi e todos os caboclos.
As 16h foi a vez de acompanhar a louvação na Tenda Espirita Nossa Senhora da
Conceição, os trabalhos foram conduzidos pela Mãe de Santo Da. Natalícia, filha da
finada Da. Cacilda, que hoje é a responsável pelo terreiro e perpetua o trabalho que a
finada iniciou. A louvação foi de forma muito singela, já estava pronto a obrigação na
área central do terreiro, com imagem de Oxóssi, folhagens de bananeiras e de ficos que
no chão fazem o desenho de um arco e flecha ao redor das oferendas, tendo ali frutas,
abobora, milho cozido, vinho, charuto e incenso.
Da. Natalícia trabalha boa tarde do tempo com a vidência, então fomos agracia-
dos em presenciar o momento em que ela incorporou o caboclo Bomba na Calunga que
saudou as obrigações e logo em seguida abençoou os poucos filhos presentes, além dele
tinha mais uma filha de santo da casa incorporada e no atabaque estava Corsinha, filha
de Da. Natalícia conduzindo os pontos cantados.
Figura 2 - Mãe de Santo Da. Natalícia – Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição Em seguida fui acompanhar os trabalhos do C.E.U – Pai Oxalá, casa da qual fa-
ço parte e que foi muito especial poder acompanhar com o olhar de pesquisadora. A
casa preparou uma grande noite, o altar estava todo ornamento, com a troca de toalhas,
arranjo de flores, a mesa para o jantar tinha flores e muitas frutas e o chão foi todo co-
berto com folhagem, deixando assim o ambiente ante mais acolhedor, dando a sensação
de estar em uma verdadeira mata.
A Ialorixá, Elenir B. Rachid deu inicio a abertura dos trabalhos junto aos filhos
que estava na corrente mediúnica, e iniciou a noite com a incorporação da cabocla
Jupirá, chefe espiritual da casa, que fez benção inicial junto ao restrito público que
estava presente, consagrou o alimento que seria servido no jantar, tendo na oferta
vegetais de força e prosperidade, como batata-doce, mandioca, milho-verde e abóbora,
além de frutas que decoravam o altar, durante o ato religioso. Os demais médiuns,
também trabalharam com suas entidades, dando passe aos consulentes da casa. Foi
possível ainda nessa noite tão especial, receber em reino mais duas entidades da linha de
caboclo, sendo eles o Caboclo Caçador Flecheiro da Jurema, que deu a sua benção à
todos presentes, e a Cabocla Juremeira que aproveitou o momento para fazer a limpeza
na sua médium, como em outros filhos que precisavam, além de trazer mais benção à
todos presente. Durante a celebração, os filhos cantaram parabéns para Oxóssi e
colocaram no altar a oferta de um tabuleiro com pão surpresa, iguaria muito apreciada
por todos na comunidade.
Figura 3 - Cabocla Jupira – C.E.U – Pai OXALÁ Já no dia 23 de fevereiro, às 18h estivemos no terreiro de Candomblé Ilé Axe
Ogum Jáloya onde foi realizada uma gira de caboclo e de preto velho em parceria a
Tenda de Umbanda Pai Tomé de Angola. O babalorixá Pai Robson de Ogum e Pai Alex
de Oxalá abriram o trabalho saudando primeiramente aos guardiões, pedindo a
segurança e a proteção da casa para a condução dos trabalhos e em seguida Pai Alex de
Oxalá, incorporou o Caboclo Pedra Branca que deu inicio as atividades, no atabaque os
cantos eram puxados por uma filha de santo e ao longo do trabalho mais dois irmãos se
juntaram a ela para essa missão. Na louvação estavam presentes os filhos de santo de
ambas as casas, mais alguns médiuns oriundos de outras casas que tinham sido
convidados, Pai Robson de Ogum ficou a todo o momento acompanhando o trabalho e
supervisionando o ritual, ate que certo momento ele incorporou o Caboclo Sete Flechas
e então foi dando a sua benção a todos os presentes. Após esse momento os médiuns
convidados deram inicio ao processo de incorporação de suas entidades e em pouco
tempo estava em reino caboclos e pretos velho.
Figura 4 - Caboclo Pedra Branca – Ilé Axe Ogum Jáloya Um caldeirão com ensopado foi levado até cumeeira, que é o ponto central de
energia do barracão, a base, a estrutura e o cerne de uma casa de candomblé. Ali os
chefes das casas Caboclo Pedra Branca e Caboclo Sete Flechas abençoaram o alimento
que seria compartilhado com todos os filhos e consulentes.
Adentrando a noite foi a vez de encerrar a pesquisa de campo na casa da Mãe de
Santo Dona Nice, como é mais conhecida em Corumbá. Ela é a zeladora da Tenda
Espírita de Umbanda Caboclo João da Mata, ao chegarmos lá os trabalhos já tinham
sido iniciados e a mesma já estava incorporada com o Caboclo João da Mata,
acompanhado de mais 05 filhos de santos que estavam encangados com as suas
entidades, tendo em reino o total de 05 caboclos e 01 preto velho. O terreiro tem
características muito marcantes: o chão de terra batida, na qual todos trabalham
descalços; altar com muitas imagens; casa das almas fica dentro do terreiro, assim como
a altar dos guardiões, tudo é muito simples e singelo. Porém o que mais chama atenção
nessa casa é a forte presença da família é toda feita no feita no Santo, a mãe pequena da
casa é a Elenina, filha de Dona Nice que ao lado da mãe são as responsáveis pela
condução dos trabalhos no terreiro, no atabaque estava o afilhado de Elenina, um de
seus filhos, mais senhor de idade bem avançada que é da família, e na função de
cambone da noite estava sua filha Carolina.
A louvação estava muito animada, os caboclos dançaram, fumaram seus
charutos, beberam seus vinhos e saudaram o Oxóssi com muita alegria. No chão do
terreiro, logo abaixo do altar foram colocadas várias imagens de São Sebastião e dos
caboclos da casa, juntamente com verduras, frutas e velas na cor verde.
No meio do trabalho o Caboclo João da Mata se despediu de todos os presentes e
eu passagem para que a Cabocla Pena Vermelha pudesse vir dar o seu axé, e a sua
chegada foi no mínimo esplêndida e muito marcante, Dona Nice foi até sua casa, trocou
de roupa e colocou uma camisa de seda rosa que em contraste com sua pela negra,
ressaltou ainda mais sua beleza. É importante ressaltar que Dona Nice tem 83 anos e
mais de 50 anos no santo e mesmo assim tem vigor para trabalhar e encantar a todos
com sua simpatia e humildade. E assim são suas entidades, sempre acolhedores e
queridas, a Cabocla Pena Vermelha chegou em reino com muita cantoria e evocando
seus gritos na mata, que muito me emocionou no momento da filmagem, a mesma ainda
pediu desculpas por não estar usando seu penacho, pois infelizmente tinha estragado e
por isso ela estava usando o penacho do seu senhor, o Caboclo João da Mata,
demonstrando mais uma vez sua humildade.
Figura 5 - Cabocla Pena Vermelha - Tenda Espírita de Umbanda Caboclo João da Mata Os que ali estavam presentes puderam tomar seu passe, conversar com as
entidades e agradecer por suas vidas. E não foi diferente com a nossa equipe, em todas
as casas fomos bem recebidos, sempre pedindo a bênção do chefe espiritual da casa no
inicio dos trabalhos, em seguida eu já pedia a permissão para dar continuidade aos
trabalhos de filmagem, e sempre tivemos a acolhida e permissão de todos. Ao final das
gravações eu seguia o mesmo rito de despedida, pedia a benção do chefe da casa,
agradecia a acolhida, bem como pedia a benção para que pudéssemos continuar esse
projeto com muita graça e fé.
Assim encerrou-se a experiência de gravação de louvação a Oxóssi, deixando
muito evidente a demonstração de fé das pessoas, de como elas projetam seus futuros na
proteção do pai maior, que ajuda a garantir a fartura à mesa, assim como a prosperidade
e saúde as suas famílias.
Dando inicio aos trabalhos e Louvação e Yemanjá, estivemos no dia 31 de
janeiro acompanhando a obrigação organizada pela Tenda Espírita São José, que foi
realizada no Vale dos Orixas, que é 1,5 ha, ambientalmente preservada. No local, existe
a cachoeira de São Domingos, onde os religiosos praticam seus cultos. A Secretaria
Municipal de Meio Ambiente desenvolveu um projeto de preservação, que inclui até
replantio de árvores nativas do cerrado, e instalação de lixeiras.
Na ocasião estavam presentes o Babalorixá Pai Hamilton de Xangô e o
Babalorixá Pai Tel Cosme de Xangô que juntamente com seus filhos, ofertaram na mata
uma toalha para Yemanjá, saudando também Oxalá. No início todos os filhos ajudaram
na limpeza do espaço, bem como na arrumação da toalha e na firmação das velas, em
seguida o Caboclo Pena Branca de Pai Hamilton, chegou em reino para abençoar os
filhos e firmar a toalha.
Na obrigação era possível encontrar comidas, flores, frutas, espelhos, batons,
esmaltes, maquiagens e bebidas, todas ofertadas a Senhora do Mar, como demonstração
de fé e gratidão. No atabaque Pai Tel Cosme de Xangô conduzia a cantoria, até o
momento que sua entidade o Caboclo Lua Nova chegou para acompanhar os trabalhos,
enquanto os filhos foram tomar ponto de fogo e sacudimento das folhas com o Caboclo
Pena Branca os outros filhos já iam tomando a benção com o Caboclo Lua Nova e se
dirigindo para a cachoeira para dar prosseguimento aos trabalhos, com o banho de
limpeza.
Nas águas de Oxum a limpeza era feita em várias etapas na seguinte ordem:
lavava a cabeça com sabonete, enxaguava, em seguida vinha com cerveja branca,
enxaguava, depois cerveja preta, enxaguava e assim sucessivamente, foi sendo utilizado,
refrigerante, leite, alfazema e vinho. Sendo que cada bebida pertence a uma linhagem de
entidade que é utilizada no processo de purificação e limpeza do filho, todo esse rito foi
conduzido pelas duas entidades e ao final do banho, dependendo da carga energética de
cada médium, o mesmo entrava em processo de incorporação, podendo receber ali a sua
entidade, que vinha trazer axé e força para finalizar o processo de limpeza, ficando
pouco tempo em reino e depois desincorporava, deixando o médium bem e como eles
dizem “formoso”. Esse processo foi realizado com todos os filhos, mas por ter um
publico considerável, resolvemos encerrar naquele momento as gravações e deixar que
esse momento ficasse mais restrito a eles, sem a nossa interferência.
Já no dia 02 de fevereiro é celebrado o dia da padroeira de Corumbá, Nossa Se-
nhora da Candelária, por essa razão estivemos pela manhã presentes na missa das auto-
ridades realizada na igreja Nossa Senhora de Caacupê, no evento sacerdotes religiosos
da Umbanda e do Candomblé estiveram presentes, com a imagem de Yemanjá e alguns
filhos de santo para louvar a rainha das águas.
Figura 6 - Missa Nossa Senhora da Candelária_Ialorixá Elenir Rachie e Pai Robson de Ogum Ao final do dia acompanhamos os trabalhos realizados na Prainha do Porto Ge-
ral, as margens do Rio Paraguai, onde esteve presente o terreiro, C.E.U – Pai Oxalá
cumprindo com a louvação mais completa, com direito a preparação das oferendas e
incorporação dos médiuns da casa e também foi possível acompanhar a Tenda de Um-
banda Pai Tomé de Angola, o terreiro Ilé Axe Ogum Jáloya, a Tenda Divino Espírito
Santo, a Tenda de Umbanda Jurema Sagrada Senzala de Xangô além de vários fiéis que
foram entregar suas barcas, acender suas velas, oferecer champanhe a rainha da Mar,
além de fazer suas orações e agradecimentos.
Figura 7 - Tenda Nossa Senhora da Guia - Louvação Yemanjá – Prainha do Porto Geral de Corumbá
(MS).
2. Considerações
A imersão em campo nos permitiu vivenciar experiências incríveis de fé e de su-
peração, nos possibilitou registrar essa relação entre fé e cultura e principalmente de
como isso impacta diretamente nos hábitos da comunidade e na construção das memó-
rias afetivas.
Sendo assim foram produzidos inicialmente 02 curtas-metragens, sendo o
primeiro um especial de louvação a Oxóssi e outro da louvação de Yemanjá, ambos
produzidos e gravados no mês de janeiro e fevereiro de 2021, porém o projeto irá
acompanhar o calendário festivo religioso de Corumbá e de Ladário a fim de registrar as
demais louvações, assim como a relação de amor e de fé existente nos terreiros de
Umbanda e de Candomblé.
É válido ressaltar que essa demonstração da fé, implica diretamente nos hábitos
dessas comunidades, onde a prática religiosa é vista também como demonstração
cultural, já que reflete as crenças permeadas dentro das relações familiares e sociais.
Em virtude do cenário pandêmico em todo o mundo, o projeto está criando
alternativas de divulgação e interação com o público pelas plataformas digitais, se
utilizando das redes sociais – Facebook e Instagram, além do canal no YouTube como
ponto de partida para distribuição desse trabalho, a fim de garantir melhor visibilidade e
alcance na divulgação do projeto.
Acreditamos que, com a produção das demais louvações ao longo do ano, será
possível no período de 12 meses termos como produto final, uma série de curtas que
abordem as festividades religiosas no viés das religiões de matrizes Afro-Brasileiras que
possam ser usadas didaticamente pelas escolas, com crianças, jovens e adultos.
O projeto foi realizado com recursos do Fundo de Investimentos Culturais do
Pantanal | Edital Nº003/2020 - FIC/Pantanal - Lei Aldir Blanc |Eixo IV: inovação
cultural e cumprindo com a contrapartida social do investimento, os curtas-metragens
serão distribuídos na rede pública de ensino através de mídias digitais.
3. Referências
ANJOS, José |Carlos Gomes dos. No território da linha cruzada: a cosmopolítica
afro-brasileira. Porto Alegre, Ed. Da UFRGS, 2006.
ASSIS, Edvaldo de. Contribuição para o estudo do negro no Mato Grosso. Cuiabá;
UFMT-NDHIR / Imprensa Universitária, 1988.
MENESES, Suelen. Festas religiosas: um bem a ser preservado. Desafios do
desenvolvimento. IPEA. Ano 7. Edição 56, 2009. Disponível em:
https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=230
2:catid=28&Itemid=23
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
ROCHA, Eunice Ajala. A Festa de São João em Corumbá. São Paulo, Editor Ação,
1997.
SÁ JUNIOR, Mario Teixeira de. Não é feitiçaria! É tecnologia! Africanos e
descendentes na mineração do Mato Grosso setecentista. Revista eletrônica História
em Reflexão, Dourados, V. 10, n. 19, p.81-98. Ago. 2016. ISSN 1981-2434. Disponível
em https://ojs.ufgd.edu.br/index.php/historiaemreflexao/article/view/5499
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