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História e Direito
Professor: Luiz Guedes
Estudante: ____________ Turma: _______________ Data: ______
Fichamento do texto Sobre verdade e mentira no sentido extra-moral,
de Nietzsche
O texto confronta os aspectos racional e intuitivo dos seres humanos, ambos
propiciados pelo intelecto, elemento por excelência diferenciador do mundo humano
em relação ao mundo da natureza. Em outras palavras, põe-se em oposição o mundo
“verdadeiro”, caracterizado pela necessidade humana de se construir um espaço de
convivência social marcado pela padronização de convenções lingüísticas, morais e
conceituais que visam a orientar os sentimentos, as ações, os comportamentos de
seus integrantes, e o mundo dos “sonhos”, que diz respeito ao desenvolvimento da
capacidade humana de recriar, de reinventar seu mundo, valendo-se das mesmas
convenções supramencionadas, sem, contudo, estar rigidamente atado a elas.
O leitor menos atento, ao ler a primeira parte do texto, corre o risco de pensar
que o autor é um irracionalista, alguém que vê com extremo pessimismo a condição
humana e que pretensamente defende o retorno ao Estado de natureza. Não obstante,
o que se entende é que, ao se valer do intelecto para manter-se vivo no mundo natural,
o ser humano criou uma série de artifícios, tais como a linguagem, as palavras, os
conceitos, que o ajudaram a apreender o ambiente em que viviam e a organizar a
coletividade. O problema reside no fato de que tal atitude levou a humanidade a
acreditar ser capaz de conhecer a verdadeira essência das coisas ao relacioná-las
àqueles artifícios.
No entanto, conforme exposto no texto, o conhecimento humano do mundo é
intermediado por diversos tipos de metáforas, tais como imagens, sons,
representações gráficas, incapazes de nos transmitir a verdade sobre cada objeto,
cada fato, cada indivíduo em particular. Esta constatação nos remete ao abismo
gnoseológico tratado pelo professor João Maurício Adeodato,1 uma vez que nosso
aparelho cognitivo não consegue apreender todas as especificidades inerentes a um
dado elemento, que é único e, no caso dos fatos, irrepetíveis. Antes, ele se pauta por
características comuns a determinados elementos, agrupados, por isso, sob uma
mesma denominação, um mesmo rótulo.
No caso dos conceitos tal generalização é ainda mais abrangente, pois são
metáforas construídas a partir de outras metáforas, as palavras. Os conceitos têm a
propriedade de fornecer um caminho seguro a ser necessariamente seguido pelos
homens. Todavia, a contínua obediência incondicional à rigidez dos conceitos torna-os,
no passar do tempo, verdades absolutas, inquestionáveis, insensíveis a visões,
opiniões diferentes, contribuindo para a construção de uma sociedade de seres
autômatos, desprovidos de análise crítica da realidade.
A subversão do ordenamento lingüístico e conceitual característico de cada
grupamento humano gera dois tipos de transgressores. O primeiro, chamado no texto
de mentiroso, aproveita-se da manipulação dissimulada das metáforas usadas por seu
grupo social para atingir finalidades particulares, criando significados para as palavras
distintos daqueles que lhes são peculiares, causando prejuízos para seus pares.
Contudo, existe também um outro tipo de transgressor, o homem intuitivo, aquele que
lida com as metáforas primárias, ou seja, as palavras, as imagens, os sons, de uma
maneira criativa, diferenciada, porém sem a intenção de causar danos à coletividade.
O homem intuitivo, à semelhança do homem racional, reconhece a existência
dos conceitos, das regras, porém procura adequá-los à realidade que o cerca. Ele não
está preocupado em conhecer, buscar a verdade inerente a cada representação das
coisas reais. Sua lide com o mundo se dá por meio de arranjos não convencionais do
arcabouço conceitual que está à sua disposição, com vistas a compreender as
particularidades dos elementos únicos a seu alcance. Logo, ele desempenha o papel
de um intérprete de um mundo pleno de peculiaridades, e não apenas mais um
repetidor de fórmulas gerais.
1 ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002, p.288-289.
Transpondo o texto para o ambiente do direito, o homem racional seria
equiparado ao jurista extremamente apegado ao que preconiza a regra posta, aquela
que goza de plena validade no ordenamento jurídico. Sua fé inabalável no texto da lei o
torna incapaz de considerar um dado caso em sua plenitude, sempre procurando
enquadrá-lo nas fórmulas que estão ao alcance de suas mãos. Tal figura corresponde
ao pensamento de Montesquieu sobre o que deve ser o papel do jurista, isto é, ser a
“boca da lei”, um repetidor da suposta certeza infalível contida nos códigos escritos.
Já o homem intuitivo se aproxima daquele jurista que, apesar de pautar sua
ação pelo direito positivado, aquela não se reduz a este. Antes, considera cada
situação não apenas como mais um caso igual a tantos outros enquadrados na mesma
espécie pelo ordenamento. Para ele, por exemplo, um homicídio culposo não deve ser
tratado somente pelo rótulo que o Código Penal o tipifica, pois, ao julgá-lo, ele buscará
os elementos que o diferenciam dos demais homicídios culposos que já passaram por
suas mãos, o que provavelmente tornará sua decisão não apenas uma simples
repetição das anteriores, as quais também não foram necessariamente idênticas.
Destarte, estamos diante de jurista que não se limita a proferir a lei – ele também cria a
lei.
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História e Direito
Professor: Luiz Guedes
Estudante: ____________ Turma: _______________ Data: ______
Fichamento do texto Os Fundamentos de um Sistema Jurídico, de H. L. Hart
O texto discorre sobre quais são os autênticos fundamentos de um dado sistema
jurídico, sobretudo aquele característico de uma sociedade complexa. Tais
fundamentos correspondem a regras secundárias de reconhecimento aceitas pelo
corpo social em geral, usadas como elementos identificadores das regras concretas do
ordenamento jurídico, dentre as quais (as regras secundárias) existe uma regra última
que, juntamente com seus critérios de validade, serve de máximo parâmetro para a
confecção das demais. Tem-se, assim, a concepção atual do que são os fundamentos
de um sistema jurídico, afastando, portanto, a antiga idéia de serem a tácita obediência
à vontade imposta por um rei ou algo semelhante, detentor do poder soberano e
ilimitado.
O ordenamento jurídico de uma nação é dotado de vários elementos revestidos
de autoridade e ao alcance todos, a fim de que possam reconhecer uma dada regra
primária de obrigação. Estes elementos são as chamadas fontes do direito
(constituição escrita, costumes, decisão dos tribunais etc) que estão dispostas
hierarquicamente, obedecendo a critérios de subordinação e primazia relativas,
estando assim aptas a solucionar conflitos. Nos sistemas jurídicos contemporâneos as
constituições escritas ocupam o topo da pirâmide das tais fontes do direito.
Apesar de sua importância para a construção do edifício jurídico de um país, as
mencionadas regras de reconhecimento comumente não são enunciadas, isto é, não
são postas. Antes, sua existência é percebida na maneira como as regras concretas
são identificadas pela sociedade. No entanto, deve-se evidenciar, em especial, a
maneira como os operadores do direito as recepcionam, principalmente os juízes, já
que seu pronunciamento possui uma autoridade jurídica destacada, podendo criar,
inclusive, direito.
Concernente ao uso, as regras de reconhecimento podem ser expressas de
duas maneiras. A primeira, classificada como afirmação interna, diz respeito ao ato de
aceitação das regras de reconhecimento por alguém inserido dentro de um dado
contexto jurídico que, mesmo sem declarar, aplica-a ao reconhecer, por seu
intermédio, uma regra primária como válida. A outra maneira, intitulada como afirmação
externa, corresponde à postura de um indivíduo apartado do âmbito de um certo
sistema jurídico e que, embora não aceite uma tal regra de reconhecimento do referido
sistema, afirma que outros a aceitam. A título de exemplo, quando alguém fala “a lei
recomenda que...”, faz uso de uma afirmação interna da regra secundária, ao passo
que a frase “No Brasil consideram direito...” corresponde a uma afirmação externa.
De maneira geral, a afirmação de que uma regra concreta é válida significa que
ela satisfaz todos os critérios facultados pela regra de reconhecimento. No entanto,
esta última deve ser acatada não apenas por quem a enunciou, sendo também
importante que indivíduos externos àquele ordenamento jurídico também a
reconheçam. De fato, o uso normal das afirmações internas ocorre em um contexto de
eficácia geral do sistema, caracterizado pela predomínio da obediência aos
comportamentos, por ele preconizados como legais, por parte da sociedade. Tal
contexto é geralmente pressuposto por quem profere uma afirmação de fato externa.
Tomando como exemplo o surgimento de um novo país, não basta que sua população
obedeça ao novo ordenamento jurídico; também faz-se imprescindível seu
reconhecimento por parte da comunidade internacional. Assim, percebe-se a
importância de se verificar ambos posicionamentos, interno e externo, no que respeita
à utilização da regra de reconhecimento.
Um ponto central abordado no texto refere-se aos conceitos de regra última e de
critério supremo. Por regra última entende-se aquela regra de reconhecimento que
indica os critérios pelos quais a validade das outras regras do sistema é avaliada,
enquanto que chama-se critério supremo somente um dos mencionados critérios,
ordenados conforme os parâmetros da subordinação e a primazia relativas. Esses dois
conceitos são de suma importância na atual concepção do direito, visto que
correspondem à visão moderna de fundamento jurídico. Todavia, é mister não
confundi-los como pressupostos para a existência de um poder legislativo juridicamente
ilimitado.
No que tange ao entendimento sobre a natureza da referida regra última do
ordenamento jurídico, várias questões podem ser levantadas. Uma delas refere-se à
possibilidade ou não de se demonstrar sua validade. Tal questionamento surge, talvez,
como uma tentativa de se assegurar a solidez de todo o edifício jurídico erigido sobre
os critérios expressos nesta regra última. O texto indica que a questão da validade não
pode ser posta em relação a este tipo especial de regra. De fato, o que se deve
investigar é se ela existe ou não. Como não está escrita em nenhum texto jurídico
oficial, sua existência está necessariamente vinculada, conforme anteriormente
mencionado, à sua aceitação e uso pela sociedade em geral com o fito de se detectar a
validade ou invalidade de regras concretas. Logo, uma maneira de se atestar sua
existência é investigar a forma mais ou menos concordante como os tribunais e as
pessoas comuns identificam o direito. Caso isto seja possível, estará então provada a
sua existência.
Outra questão diz respeito à sua classificação. Para tanto, é preciso esclarecer
que a regra última não pode ser enquadrada nas classificações próprias das regras por
ela identificadas, posto que até mesmo sua natureza exclusivamente jurídica é
questionada por algumas pessoas que defendem a sua natureza factual, pré-jurídica,
ou mesmo política. Como solução, obviamente não conclusiva, deve-se atentar para as
perspectivas da afirmação externa de sua existência na prática efetiva e da afirmação
interna referente à validade das demais regras.
Igualmente desafiadora é a questão sobre a verificação da existência ou não de
um sistema jurídico por meio da obediência ou observância, pelos homens comuns,
das regras de reconhecimento, por conseguinte, da regra última. Grosso modo, afirma-
se que, se a maior parte da população a obedece, tem-se aí um sistema jurídico ativo.
Não obstante, só isso não é suficiente. Um sistema jurídico, para existir de fato, carece
do estabelecimento de padrões oficiais comuns de procedimento de seus funcionários,
a começar da observância do que estabelece a sua regra última de reconhecimento
das demais regras. Longe de defender uma concepção autômata da função do
operadores do sistema, o que se coloca é a necessidade de se determinar
comportamentos coerentes com os padrões de conduta, sendo os desvios passíveis de
serem criticados. Com isso, obtém-se a unidade e a continuidade do sistema,
imprescindíveis para a sua manutenção.
Como visto, a convergência de ações e interesses dos cidadãos comuns e dos
funcionários do sistema jurídico de uma nação constitui um pré-requisito indispensável
para a sua existência. Entretanto, há casos em que esses dois setores da sociedade
não compartilham das mesmas idéias, inclusive no que concerne ao direito. Nesses
momentos, sobretudo quando as regras de reconhecimento do ordenamento jurídico
não são seguidas, o sistema torna-se enfraquecido, correndo o risco de desaparecer.
Guerras, revoluções, caos social são exemplos de profundas instabilidades socio-
políticas que podem recair sobre um país, desestruturando, como conseqüência, as
suas anteriores relações jurídicas.
Existem ainda outras situações de ausência das condições normais de
funcionamento do sistema jurídico, como no caso de colônias que gradativamente vão
se desvinculando jurídico-politicamente de suas metrópoles. Haverá um momento em
que estarão em vigor dois ordenamentos jurídicos na colônia: o do dominador,
originário, relutante em soltar seus tentáculos presos no território em questão, e o do
dominado, que se valerá da maioria das estruturas jurídico-administrativas herdadas
dos dominadores para implantar o seu próprio direito. Pode-se perguntar por que o
ordenamento jurídico da metrópole não pode ser mais reconhecido como dominante. A
resposta é que, apesar de manter suas estruturas na região, os fundamentos do
sistema jurídico deslocaram-se para o controle do governo local. De fato, as leis
concretas permanecem, mas o seu argumento de validação, isto é, a regra última,
agora passa a ser ditada pelos homens comuns e funcionários do novo sistema jurídico
implantado.
Este último exemplo, bem como tantos outros, nos mostra a posição destacada
que a observância da regra última, assim como seus critérios de validação do restante
do ordenamento jurídico, ocupam na preservação de todo o sistema. Qualquer
perturbação que finde por atingi-la pode trazer conseqüências bastante danosas para a
sociedade. E é exatamente nesses momentos críticos que, apesar de não existir
textualmente, sua presença (ou ausência) se faz sentir, tanto por aqueles diretamente a
ela subordinados, quanto pelos demais povos.
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História e Direito
Professor: Luiz Guedes
Estudante: ____________ Turma: _______________ Data: ______
Fichamento do texto Sistema jurídico e codificação: a vinculação do juiz à lei,
de Winfried Hassemer
O texto empreende uma investigação acerca da atual relação entre as regras
postas e a ação do decididor de conflitos juridicamente relevantes. Tradicionalmente
atrelado de maneira estrita às prescrições da lei e dos códigos escritos, o trabalho do
juiz vem ganhando, nos últimos tempos, uma dimensão mais ampla e criativa, marcada
pela possibilidade de utilização de novas concepções e diretrizes que o auxiliam na
interpretação e decisão dos casos concretos. Desse modo, será colocado em debate
qual o verdadeiro papel hoje desempenhado pelas codificações nos atos dos tribunais
e em que medida deve ser compreendida a vinculação do juiz à norma positivada.
Há muito predominou (e ainda hoje não desapareceu de todo) entre os juristas a
concepção de que seu trabalho deveria seguir à risca a letra da lei com o fito de se
realizar os ideais jurídicos de uniformidade e segurança do sistema. Tamanho equívoco
deu lugar a uma visão criativa da tarefa do juiz, desapegada da pretensa certeza
transmitida pela rígida observância dos códigos, porém não totalmente desvinculada
deles. De fato, os códigos legais ainda hoje são o principal guia dos juristas,
apresentando-se como recurso último, à sua disposição, de decidibilidade de casos,
sobretudo os mais complexos. Logo, abre-se um vasto leque de possibilidades de
relacionamento entre a lei e a decisão dos tribunais, que vai desde a fé inabalável nos
ditames das normas positivadas até a sua total desconsideração, isto é, a idéia de um
direito plenamente desvinculado da lei. A nosso ver, tais posturas são demasiado
extremadas, portanto sem aplicabilidade prática.
Diversas são as implicações resultantes da utilização de um direito codificado
em relação à jurisprudência que, em sua maioria, não representam necessariamente
um mal para o sistema. Uma delas é a já mencionada realização da segurança jurídica
do sistema decorrente de uma maior padronização dos atos dos juízes por meio das
normas postas. Apesar dos benefícios jurídicos que tal situação pode propiciar, como
uma melhor fiscalização dos atos dos juízes, por outro lado ela pode interferir
negativamente na proteção dos direitos de cidadania.
Outra implicação diz respeito à organização e visibilidade que as matérias
jurídicas ganham a partir do uso de normas codificadas. Com isso, o sistema jurídico,
assim como a sociedade, são beneficiados com um acesso mais facilitado ao
conhecimento jurídico, sendo igualmente possível se estabelecer uma melhor
diferenciação, sobretudo a nível de um direito jurisprudencial.
Digno de nota também é o efeito produzido pelas normas positivadas sobre a
legitimação das decisões jurídicas. Uma vez que os princípios utilizados pelos juristas
para decidir sobre o caso concreto encontram-se também normatizados, a necessidade
de legitimação demandada por sua utilização recai sobre o amparo da lei vigente. Em
outras palavras, o juiz pode abandonar o terreno movediço das justificativas extra-
jurídicas, sobretudo de teor moral, como a boa-fé, para legitimar a sua ação decisória
dos conflitos em artifícios legais.
Passando a tratar especificamente do papel desempenhado pela norma
codificada sobre a decisão dos conflitos, põe-se em discussão a liberdade de ação de
um juiz em confronto com a sua vinculação a critérios de decisão, tais como as normas
jurídicas. A questão é: qualquer que seja o tipo de princípio que um juiz declare seguir
como regra para estabelecer a decisão (jurídico, moral etc), tal obediência implicará
obrigatoriamente em uma restrição de sua liberdade de ação. Não obstante, tal atitude
não representa necessariamente algo repudiável. No caso da vinculação a normas
jurídicas, esta situação traz conseqüências socialmente desejáveis. Por exemplo, ao
estar vinculado, o comportamento do juiz pode ser previsto pelas partes interessadas
no caso, vislumbrando, assim, com mais clareza, o provável resultado da decisão.
Destarte, torna-se importante que o juiz esteja vinculado ao ordenamento vigente a fim
de facilitar a administração da justiça.
Não obstante os possíveis benefícios acima enumerados, a vinculação do juiz ao
conteúdo da lei também pode se apresentar de forma negativa. A estrita obediência às
normas postas do ordenamento pelo juiz juridicamente vinculado, além de limitar a sua
liberdade, pode fazê-lo incorrer em erros, haja visto o caráter poroso e vago dos
conceitos legais contidos no código, os quais nem sempre são por ele, o juiz,
interpretado de forma adequada.
Também comete um equívoco aqueles que pensam ser possível garantir a
unicidade do sistema através da produção de uma jurisprudência una, praticamente
imutável, resultante do cumprimento estrito da norma posta pelo juiz em seu trabalho
de decidir conflitos. Na verdade, tal pretensão de rígida padronização das decisões
judiciais revela-se inviável, posto que não existe lei alguma suficientemente forte a
ponto de dirigir a evolução da jurisprudência de uma nação. É sempre oportuno lembrar
que uma das funções inerentes ao ofício da judicatura é o de criar leis através de suas
decisões.
A vinculação do jurista à lei pode ser realizada sob diversas perspectivas. Uma
delas, criada pela metodologia jurídica, são os chamados métodos de interpretação
que, através de critérios lingüísticos, sistemáticos, históricos, teleológicos e
constitucionais, que restringem de maneira ampla o espaço de ação interpretativa do
jurista no trato com a lei. Apesar da rigidez aparente os métodos de interpretação
acima descritos não vinculam severamente o juiz à lei. Por exemplo, no que tange à
escolha, o juiz é livre para escolher a regra de interpretação que melhor lhe aprouver.
O juiz pode ainda estar ainda vinculado ao ordenamento por meio do direito
jurisprudencial. Embora os precedentes sejam parâmetros importantes a serem
considerados pelo juiz em suas decisões, eles não gozam da mesma força vinculatória
característica da lei. Pode-se ainda tratar a temática da vinculação pelo prisma da
dogmática jurídica, a qual incorpora as regras jurisprudenciais ao sistema regular. Tal
situação assemelha-se ao caso da vinculação jurisprudencial, isto é, possui apenas o
poder de vincular faticamente o juiz, sem a mesma força da lei. O mesmo pode-se falar
em relação aos programas informais, que são sistemas de regras não explícitas que
orientam a atividade judicial, porém não a determinam de forma pujante.
Após a explanação acima, cabe estabelecer de que maneiras (se é que isto é
possível) as supra-citadas perspectivas de vinculação do juiz às fontes do direito e às
regras informais satisfazem os requisitos característicos do princípio da vinculação à
lei. Assim, é preciso deixar claro que, apesar de sua função criadora, o juiz deve fazê-lo
mediante o que preconizam as instituições legais. Outro ponto importante é a
observância da teoria hermenêutica do direito, que afirma ser a norma jurídica um
misto da letra da lei concretizada nos fatos juridicamente relevantes. Logo, a lei jamais
pode ser considerada isoladamente.
Um aspecto igualmente relevante no presente debate é o fato de que os ideais
de regularidade e segurança jurídica, subjacentes à vinculação do juiz à lei, podem ser
atingidos por intermédio do direito jurisprudencial e da dogmática jurídica.
Por fim, ao abordarmos a vinculação sob o prisma da determinação do direito,
esta não pode ser rigidamente cobrada do juiz, servindo como diretriz de sua ação. A
solução recai na aposta pelo bom senso e preparo técnico do jurista, o que resultará
em uma ação conciliatória, por sua parte, entre a determinação do direito e os
elementos que fundamentam sua prática judicial.
Na parte final do texto há uma menção a respeito da importância de uma boa
formação acadêmica e prática dos alunos do curso de direito, a fim de que sejam
conscientes das implicações decorrentes de sua inobservância de certos postulados ou
princípios, como o da vinculação do juiz à lei, bem como a interpretação e incorporação
deles à sua vivência profissional. Declaro compartilhar do mesmo pensamento que o
autor, acrescentando que o aperfeiçoamento técnico e intelectual possibilita ao aluno,
futuro jurista, ampliar o seu leque de conhecimentos em uma disciplina tão vasta
quanto o direito. Outrossim, a experiência da prática da judicatura, quando bem
executada, agrega um precioso valor ao futuro operador do direito, na medida em que
ajuda a quebrar certezas pré-concebidas quando o aluno se dá conta da real dimensão
de sua função primordial: a decidibilidade de conflitos.
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História e Direito
Professor: Luiz Guedes
Estudante: ____________ Turma: _______________ Data: ______
Fichamento do texto Constituição como início do Direito Positivo: a
estrutura temporal das constituições, de Stephan Kirste
Em suas linhas gerais, o texto defende a teoria da constitucionalização como
transformação, a qual preconiza que o momento da confecção de uma nova
constituição corresponde igualmente ao surgimento do direito positivo. Para tanto, o
autor perfaz o caminho da criação das normas jurídicas enquanto elementos
limitadores da imprevisibilidade de condutas futuras, até chegar à encruzilhada acerca
do que consistira a sua validade, sobretudo no que diz respeito à solução do problema
do infinito regresso. Nesse ponto, várias teorias sobre a origem do direito são
explanadas como mote para a fundamentação da teoria em tela.
O ideal da autodeterminação é um princípio do direito internacional, acatado
pelas constituições da maior parte dos países, inclusive a brasileira. Grosso modo,
pode ser entendido como o poder e a liberdade que um povo possui de definir as
regras de sua organização sócio-jurídico-política. Destarte, tal ato é freqüentemente
simétrico em relação à sua temporalidade, o que significa que não está preso
exclusivamente ao passado, ao presente ou ao futuro, apesar de manter vínculo com
todas estas instâncias do tempo.
Um dos fatores que podem prejudicar sensivelmente, ou até mesmo impedir a
realização de atos de autodeterminação, caracterizados por decisões atuais e
temporalmente simétricas, é a influência do tempo futuro ou do passado. Uma solução
para esse problema é a construção de um direito mutável, constituído de normas
eminentemente jurídicas, isto é, que imputem um dever ser à sociedade.
As normas jurídicas possuem a característica de limitar as incertezas sobre o
que acontecerá no tempo futuro. Com efeito, um ordenamento jurídico operante
propicia a previsibilidade do comportamento, o que constitui uma vantagem em relação
às regras morais ou de usos sociais, posto que as normas jurídicas têm não apenas a
propriedade de garantir expectativas, mas também permitem um posterior controle
jurídico da ação. Além disso, as normas jurídicas prevêem sanções para os praticantes
de condutas não-desejadas pelo ordenamento legal.
Com o constante surgimento de novas situações passíveis de serem
normatizadas, a quantidade de novas normas jurídicas cresce na mesma proporção, o
que pode ocasionar conflitos. Logo, um dos modos de superar esta dificuldade é o
estabelecimento de critérios de modificações das normas, os quais devem ser
submetidos a outras normas que regulam a competência e os procedimentos para
fazê-lo. Tais regras existem e são chamadas de secundárias, pois servem de
parâmetros de validade para as normas primárias do ordenamento. Por seu intermédio,
outras normas jurídicas tornam-se passíveis de ser juridicamente alteráveis. Além de
permitirem uma maior previsibilidade da conduta jurídica, as normas secundárias
igualmente asseguram expectativas e reforçam a influência do passado, embora
limitado, sobre as decisões presentes.
Um aspecto importante concernente à confecção de normas jurídicas é a sua
formulação abstrata, de difícil intelecção por pessoas leigas. Para tanto, a linguagem
do direito deve ser diferenciada da linguagem do dia-a-dia. Tal procedimento contribui
para a desvinculação temporal do direito em relação aos demais tempos sociais. De
fato, o ordenamento jurídico é concebido para atingir uma certa longevidade, não
podendo, portanto, mudar por uma alteração política ou social qualquer. Por exemplo, a
chegada ao poder de um novo presidente não é, a rigor, motivo suficiente para se
alterar profundamente o sistema. Nada obstante, o tempo jurídico não deve manter-se
completamente dissociado da realidade no qual está inserido. Logo, é preciso se
estabelecer um certo sincronismo em relação aos outros tempos da sociedade.
Outra temática relativa à questão do tempo no direito diz respeito ao problema
do regresso infinito. A questão pode ser entendida da seguinte forma: como toda norma
jurídica, para ser válida, necessita de outras normas anteriores que a validem e
indiquem como modificá-las, em última instância não haveria início do direito. Então,
quando seria o início do direito?
Este é eminentemente uma questão de ordem constitucional e uma pista inicial
para se encontrar a solução é a análise dos preâmbulos das constituições. Na estrutura
temporal desses documentos, encontra-se expressa a oportunidade quase única, o
momento histórico específico em que o povo de uma certa nação se dê uma
constituição. Nessas estruturas há referências aos tempos passado, presente e futuro,
de diversas formas, como a lembrança de momentos históricos, tradições, objetivos,
esperanças de um Estado etc.
Nos preâmbulos encontramos ainda as intenções que motivaram o poder
constituinte, isto é, o povo, de maneira autodeterminada, a confeccionar a sua nova, ou
primeira, constituição. Desse modo, é possível que, ao analisarmos estas intenções,
encontremos a solução para o problema teórico e de legitimidade contido no infinito
regresso da assimetria temporal do direito.
Sob tal perspectiva, a questão do infinito regresso seria melhor tratada se
considerássemos o momento da criação da constituição como o próprio início do
direito. Conseqüentemente, a constituição seria válida não por causa da simples
existência de normas jurídicas anteriores sob as quais estava embasada, e sim pela
vontade do poder constituinte de que elas valessem como direito. Está resolvido,
assim, o problema da assimetria temporal das normas jurídicas, restando agora definir
o elemento material ou ideológico que valida a Constituição.
Para solucionar essa última questão sobre o regresso infinito da normatividade
do direito, surgiram diversas teorias, dentre as quais a teoria pós-jusnaturalista de
Dworkin. Consoante sua concepção de law as integrity o poder constituinte deveria ter
uma sólida base moral, ancorada na presumida integridade dos legisladores
constituintes, para que fosse possível criar a constituição a partir desses princípios
morais, tornando-os a origem do direito. A crítica que se faz a Dworkin é que, ao
determinar a precedência do valor moral do intérprete do direito sobre os argumentos
jurídicos, faz-se necessário estabelecer critérios normativos morais sobre a ação
desses intérpretes, o que nos remete a um novo regresso infinito, agora no plano da
moral.
A teoria kelseniana indica que a validade do ordenamento jurídico está
ancorada, em última instância, na norma fundamental, idealizada para renegar a
origem factual do direito. Assim, tal norma imaginária seria a pressuposição necessária
para apresentar a explicação da validade do direito, evitando a influência de outros
conteúdos éticos em sua origem. Todavia, visto que a norma fundamental não pode ser
classificada da mesma forma como o são as normas jurídicas, ela apenas embasa
logicamente o início do direito, e não juridicamente. Logo, não responde a questão
sobre o fundamento da validade do direito.
Já no que diz respeito à teoria dos sistemas sociais de Luhmann, a constituição
seria um texto autológico. Por outras palavras, a validade das normas jurídicas seria
estabelecida no próprio sistema jurídico, do que se deduz que o direito não teria um
início definido. Na verdade, essa teoria entende o direito enquanto sistema de
comunicações que obedecem a um código binário com os seguintes pólos: o lícito e o
ilícito. A constituição, segundo tal lógica, seria o fundamento do direito positivo,
incumbida de organizar o poder público e lhe dar um forma jurídica. Seus críticos
afirmam que, ao considerar o direito como comunicação jurídica, no momento em que
fosse criada uma nova constituição, esta não poderia se guiar pela anterior, posto que
representa uma nova comunicação sobre a qual será construído o novo edifício
jurídico. Logo, a questão da origem permanece sem uma explicação satisfatória.
No que diz respeito à teoria de Bruce Ackerman, a constituição corresponde a
um ininterrupto processo de constitucionalização, bem como um diálogo dialético entre
gerações. A origem da primeira constituição não teria base histórica, mas apenas uma
expressão simbólica. Essa teoria sofre a crítica de justificar os momentos de mudança
de constituição segundo a sua própria dinâmica interna, negando, assim, o poder do
povo em se auto-determinar, transformando seu embasamento político-jurídico por
intermédio do ordenamento vigente.
Hannah Arendt também propôs uma teoria que procura resolver a questão do
infinito regresso. Consoante seu pensamento, a autoridade da Constituição provinha da
memória cultural de sua fundação, a qual preservava o projeto político-jurídico dos pais
fundadores da nação. Arendt a toma como arché, isto é, como início e princípio. O
problema consiste, no entanto, na incapacidade dessa teoria em conciliar as duas
dimensões do arché: o elemento temporalmente simétrico do início e o temporalmente
assimétrico do princípio. Destarte, também não consegue resolver a questão da
origem.
Tomando por base o texto dos preâmbulos das constituições, Kirste, autor do
texto em análise, tenta buscar um caminho alternativo. Afastando-se de entendimentos
que consideram isoladamente os diversos aspectos da questão do regresso infinito,
sua proposta é pela compreensão do processo de constitucionalização como
transformação. Grosso modo, tal concepção preconiza que o início do direito se dá no
momento em que se elabora uma nova constituição, quando ocorre o acatamento de
normas e princípios extra-jurídicos. Assim, regras morais, de usos sociais e outros
conteúdos éticos passam a integrar o sistema, transformando-se efetivamente em
normas jurídicas, obedecendo aos critérios pré-determinados.
No que diz respeito aos condicionantes históricos, também eles estarão
presentes como elementos-chave do processo, posto que vinculam a ação do poder
constituinte a normas ainda não positivadas, porém não de uma forma pungente. Isso
explica-se pelo fato de que, no processo de constitucionalização, o poder constituinte
age de forma autodeterminada, observando-se os parâmetros de participação
democrática. No que diz respeito à temporalidade, a constitucionalização é um ato
simetricamente temporal porque, apesar de dizer respeito a uma renovação operada no
presente, está, conforme visto, em certa medida vinculada ao passado e, com relação
ao futuro, algumas de suas possibilidades são recepcionadas a fim de,
paradoxalmente, ajudar o novo sistema a controlar a imprevisibilidade. Logo, fica
patente que todos aqueles elementos mencionados nas teorias anteriores estão
presentes na teoria da constitucionalização como transformação, com um maior ou
menor grau de influência.
Dentre as diversas conseqüências decorrentes da teoria da constitucionalização
enquanto transformação, podemos citar, por exemplo, que a autodeterminação do
poder constituinte o remete à não-limitação por intermédio de regras jurídicas. De fato,
quem permanece limitado pelo ordenamento antigo e sua regras procedimentais é o
poder constituído, ao passo que o poder constituinte, o povo, fica comprometido com
conteúdos de teor moral, político e histórico, isto é, extra-jurídicos, os quais serão
incorporados ao novo ordenamento. Não obstante, no período imediatamente posterior,
quando a nova constituição está finalizada, o poder constituinte terá a sua ação de
reforma do sistema vinculada aos ditames jurídico-constitucionais vigentes. Caso
deseje novamente operar profundas modificações, o poder constituinte pode optar pela
autodeterminação direita, iniciando, assim, um novo processo de constitucionalização.
No final do texto, o autor expõe algumas questões levantadas por Holmes sobre
as implicações da teoria da constitucionalização enquanto transformação. Uma delas
põe em dúvida se um povo juridicamente autodeterminado, isto é, livre das restrições
da lei, poderia agir como poder constituinte. Essa questão, assim como as demais, nos
faz refletir quais seriam as tais restrições jurídicas que deveriam recair sobre o poder
constituinte no momento máximo de sua expressão, isto é, de criar o novo
ordenamento jurídico, a fim de que seu ato fosse realizado consoante as diretrizes do
sistema democrático. Acredito que tais restrições deveriam ser principalmente de
natureza moral, política, e não estritamente jurídica. Obviamente que certas regras
concernentes aos procedimentos adotados para se averigüar a vontade da maioria,
sobretudo de natureza eleitoral, deveriam ser pré-estabelecidas, como de fato ocorre
entre os países democráticos do mundo. Afora isso, defendo que o povo tem, sim, o
direito de se autodeterminar todas as vezes que achar necessário, sobretudo após o
fim de um regime político autoritário e claramente contrário ao interesse da maioria do
povo, que atente contra as liberdades e garantias individuais e coletivas, por exemplo.
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