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II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades
Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013
PLANO DE AÇÃO E A FUNÇÃO SOCIAL DA ARQUITETURA
MODERNA PRODUZIDA EM SÃO PAULO
BUZZAR; MIGUEL A. (1); CORDIDO, MARIA TEREZA R. L. DE B. (2);
SIMONI, LUCIA N. (3)
Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo Departamento de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo
Av. Trabalhador São Carlense, 400, Centro. CEP: 13566-590
(1) Professor Livre-Docente; Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo/ - IAU-USP (São Carlos)
mbuzzar@sc.usp.br
(2) Doutora; Pesquisadora do Grupo de Pesquisa ArtArqBR / IAU-USP São Carlos terecordido@hotmail.com
(3) Doutora; Prefeitura Municipal de São Paulo; simoni.lucia@gmail.com
RESUMO
O Plano de Ação do Governo Carvalho Pinto - PAGE - (1959-1963), constituiu um momento excepcional no qual planejamento de governo e arquitetura moderna se entrecruzaram. Entretanto, esta produção responsável por centenas de obras públicas (novas edificações, reformas e ampliações), entre escolas, postos de saúde, equipamentos de segurança (incluindo Fóruns de Justiça), casas da lavoura e outros equipamentos agrícolas, encontra-se totalmente esmaecida. Sobretudo, a promoção de equipamentos públicos pelo PAGE, guarda um aspecto decisivo na caracterização da arquitetura em São Paulo e do chamado Brutalismo Paulista ou Escola Paulista. Além de contribuir para a difusão e afirmação moderna no estado, o PAGE corroborou decisivamente para o estabelecimento de uma marca muito profunda na produção paulista, a dimensão social da arquitetura, que ao longo dos anos 1960 e 1970 dirigiu o debate arquitetônico brasileiro. Recuperar a constituição do Plano de Ação, o percurso da produção que possibilitou que deram sentido a concepção de função social da arquitetura e ao trabalho do arquiteto é o objetivo principal deste trabalho.
Palavras Chave: Plano de Ação. Arquitetura em São Paulo. Dimensão Social da Arquitetura.
PLANO DE AÇÃO E A FUNÇÃO SOCIAL DA ARQUITETURA
MODERNA PRODUZIDA EM SÃO PAULO1
A representação da nação, ou do Estado que forja a nação, conheceu na arquitetura
moderna um aliado perene, exemplarmente representado pelo edifício do Ministério da
Educação e Saúde Públicas (MESP - 1937/1943), projetado por Lúcio Costa e equipe,
contando com a participação de Le Corbusier, um dos mestres do modernismo. Se na era
Vargas o modernismo conviveu e disputou com outras linguagens o papel de servir o
Estado, ao final do Estado Novo o modernismo foi se firmando paulatinamente como a
melhor vertente estética capaz de representar o Estado, nos seus vários níveis, e a própria
sociedade brasileira na busca pela construção de um país que superasse os atrasos de toda
ordem e encetasse o desenvolvimento econômico e social.
Um desses momentos deu-se com a implementação do Plano de Ação (1959-1963) pelo
governador de São Paulo Carvalho Pinto. A produção de equipamentos públicos pelo
Estado nesse período é de um vulto espetacular. Com o PAGE foram construídos
(reformados ou ampliados) centenas de edifícios entre escolas, postos de saúdes, fóruns e
delegacias de polícia, dentre outros edifícios institucionais. Apesar de várias associações
entre a arquitetura moderna e o Estado que foram se tornando rotineiras, como
demonstram, por exemplo, as obras da Pampulha em Minas Gerais, patrocinadas pelo
então governador Juscelino Kubtschek, ainda na década de 1940, ou o Conjunto de
Edificações do Parque Ibirapuera, quando dos festejos do VI Centenário da Cidade de São
Paulo (1954), ou mesmo no caso do Programa Convênio Escolar,2 promovido, a exemplo do
Ibirapuera, pela Prefeitura do Município de São Paulo e de forma emblemática os projetos
do plano de Brasília e de seus principais palácios e edifícios governamentais,
respectivamente de autoria de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer inaugurados em 1960,3 no
caso específico do Estado de São Paulo, até 1959 os projetos e obras públicas possuíam
uma linguagem eclética, sendo elaborados pelo corpo de funcionários do Departamento de
Obras Públicas (DOP).
Tal questão não deixa de surpreender, pois além das obras modernas produzidas pela
municipalidade, o modernismo constituiu-se durante os anos 1950, ao menos na capital do
estado de São Paulo, na linguagem do conjunto das novas edificações produzidas pela
1 Este trabalho é fruto de pesquisas iniciadas há alguns anos, mas que agora adquiriram novo impulso através
do apoio da FAPESP ao projeto intitulado ARQUITETURA MODERNA NO BRASIL E SUA DIFUSÃO – O CASO DO PLANO DE AÇÃO DO GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO (1959-1963). 2
Convênio Escolar, acordo firmado em 1948 entre o Estado e o Município de São Paulo, seu período mais fértil de produção de edifícios deu-se entre 1949-1954. Pelos termos do Convênio, a Prefeitura comprometia-se em construir equipamentos educacionais, principalmente, escolas que seriam repassadas para administração do Estado.
3 Vale registrar que o concurso de projetos para a cidade, vencido por Lúcio Costa foi realizado em 1957 e
estudos de alguns dos seus principais edifícios já haviam sido apresentados por Niemeyer em 1955.
sociedade civil. Edifícios residenciais e comerciais, e mesmo industriais, abandonando a
linguagem eclética que ainda podia ser verificada nos anos 1940 tomavam a cena urbana na
capital, no período em que representou, como em poucos momentos, o desenvolvimentismo
econômico brasileiro.
O Plano de Ação, objetivos, referências e estruturação.
No início de seu mandato de governador, Carvalho Pinto, lançou as bases do Plano de Ação
do Governo do Estado, PAGE, através do Decreto n. 34.656, de 12 de fevereiro de 1959,
cujo objetivo seria o de levar progresso ao conjunto do Estado com a implantação e
construção de serviços e equipamentos sociais.4 O artigo afirma que as “As Secretarias de
estado e a Reitoria da Universidade de São Paulo apresentarão ao Governador, no prazo
máximo de 60 (sessenta) dias, exposição dos problemas fundamentais relacionados com a
execução de obras e serviços que lhe são afetos”5. Também através deste decreto era
constituído junto ao Gabinete do Governador o Grupo de Planejamento que deveria
apresentar, um Plano de Ação do Governo do Estado, sendo responsável por sua
implantação e gestão.6
Na mensagem apresentada pelo governador à Assembleia Legislativa em 14 de março de
1961 pode se observar as bases que apoiaram os objetivos traçados para o Plano:
(...) Ao elaborar o Plano de Ação quis fazer dele também o instrumento da
elevação das condições de vida das populações interioranas – relegadas
até há poucos anos ao abandono – precisamente pelo fato de reconhecer,
como já declarei, as disparidades de que se assinala no progresso de São
Paulo pelo gigantismo das áreas metropolitanas em confronto com o
atraso do campo.(...)
A verdade é que, desprovido, em outros tempos de quase todos os
recursos, o interior do Estado se transformou rapidamente graças às obras
do Plano de Ação(...)
4 Carlos Alberto de Carvalho Pinto advogado formado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco em
1931, iniciou sua carreira política como Assessor Político da Prefeitura de São Paulo entre 1938 e 1945, na gestão de Prestes Maia. Em março de 1953 ocupou o cargo de Secretário das Finanças na gestão municipal de Jânio Quadros. Em outubro de 1958, foi eleito governador de São Paulo com o apoio de Quadros, pelo Partido Democrata Cristão Brasileiro, governando de janeiro de1959 a janeiro de 1963. 5
“Estado de São Paulo, Plano de Ação do Govêrno - 1959-1963- Administração Estadual e Desenvolvimento Econômico e Social”, São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1959, s/p.
6 Composição inicial do Grupo de Planejamento: Plínio Soares de Arruda Sampaio- Coordenador; Diogo Adolho
Nunes Gaspar - Economista, Secretário Executivo; Celeste Angela de Souza Andrade - Diretor Geral do Departamento de Estatística do Estado; Paulo Menezes Mendes da Rocha - Professor Catedrático da Escola Politécnica - U.S.P.; Ruy Aguiar da Silva Leme - Professor Catedrático da Escola Politécnica - U.S.P.; Antônio Delfim Netto - Assistente da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas - U.S.P.; Sebastião Advíncula da Cunha _ Do Departamento Econômico do B.N.D.E.; Orestes Gonçalves _ Chefe do Gabinete de Estudos Econômicos e Financeiros da Secretaria da Fazenda.; Ruy Miller Paiva - Engenheiro Agrônomo do Departamento da Produção Vegetal da Secretaria da Agricultura.
(...) energia, ferrovia, rodovias, aeroportos, navegação; obras públicas são
os empreendimentos relacionados com a instalação dos estabelecimentos
de ensino, de hospitais, de instituições penais, de casas de detenção, de
unidades sanitárias, de casas de lavoura, de armazéns de abastecimento
de água e com os serviços de esgoto. (...) 7
Com viés moderador, foi fundamentado com o intuito de promover e incentivar o
desenvolvimento das “regiões atrasadas” do interior do Estado, incrementado com as bases
humanísticas influenciadas pelo pensamento e trabalho do Padre Lebret.
Na mesma mensagem, guardada a ênfase discursiva, pode-se identificar as influências
Lebretianas na concepção do plano:
O Plano de Ação é assim, incontrastavelmente, um programa de governo
que visa ao bem estar social encarado sob suas múltiplas formas –
portanto um instrumento de humanização sociais do nosso Estado.
(PAGE, 1961).
O principal articulador do governo, Plínio Sampaio travou os primeiros contatos com o padre
francês Louis Joseph Lebret, na Sociedade para Análise Gráfica e Mecanografia Aplicada
aos Complexos Sociais, SAGMACS8, quando os fundamentos ideológicos da economia
humanística foram introduzidos no Brasil e influenciaram o Partido Democrata Cristão
Brasileiro9, e uma serie de jovens a ele ligados. Sobre Lebret e suas concepções Sampaio
afirmou:
O Lebret é um padre dominicano, uma figura muito especial, é
inclusive o homem que redigiu a Encíclica Popular no Congresso.
Ligadíssimo ao João XXIII. (...) E ele tinha uma teoria chamada de
economia humana, economia das necessidades. Que não era
economia socialista, nem capitalista. Nós éramos católicos. Mas
nós não éramos convencionais. Nós éramos da estação popular,
7
PINTO, Carvalho, Mensagem apresentada pelo Governador Carvalho Pinto à Assembléia legislativa do Estado de São Paulo em 14 de março de 1961. 8 Louis-Joseph Lebret (1897-1966), frade dominicano, geógrafo, fundador do movimento “Economia e
Humanismo”, dirigiu e fundou nos anos 1950, em São Paulo, a Sociedade para Análise Gráfica e Mecanografia Aplicada aos Complexos Sociais (SAGMACS), instituição pioneira de consultoria que durante 16 anos realizou estudos e pesquisas, influenciando contingente de profissionais do planejamento urbano e regional. Ver: LAMPARELLI, Celso Monteiro, Louis-Joseph Lebret e a pesquisa urbano-regional no Brasil - Crônicas Tardias ou história prematura. Revista de Estudos Regionais e Urbanos- Espaço&Debates. São Paulo: NERU, ano XIV- 1994- nº 37. 9
PDC - O Partido Democrata Cristão criado em 9 de julho de 1945, pelo professor de Direito do Trabalho, da USP, Antônio Cesarino Júnior, com orientações advindas da Democracia Cristã Europeia após a segunda guerra mundial, buscando orientar suas ações para amplos setores sociais.
gostávamos do povo e ele nos ofereceu um norte naquele tempo.
(SAMPAIO, 2007).
Sobre esta questão, o professor Celso Lamparelli, arquiteto que trabalhou na SAGMACS e
integrou a Equipe Técnica do PAGE como responsável pela educação, afirmou em
entrevista:
As teses do Padre Lebret de desenvolvimento integrado e harmônico de
toda a pessoa e de todas as pessoas, especialmente um esforço para
elevação dos níveis de vida, e o Estado como “estado de bem estar” na
promoção do “bem comum”, ao lado da concepção keynnesiana de que o
estado precisava investir nos tempos de crise econômica, o que era o
caso do Brasil e também do Estado de São Paulo, influenciaram o trabalho
do GP. (LAMPARELLI, 2007).
Em termos sociais, as influências do pensamento humanístico de Lebret estavam
manifestas no próprio plano:
[...] Lícito seria dizer que começaram a ser visíveis os frutos do
desenvolvimento e que o Homem pode investir, substancialmente, para
aumentar seu próprio “bem estar” [...] (PAGE - 1959-1963, p. 15)
Apesar da extensão dos princípios econômicos humanísticos na sua formulação, o PAGE
abrigou certa heterogeneidade de ideias por meio dos participantes do Grupo de
Planejamento.10 No conjunto de orientações, as melhorias das condições de vida
responderiam a ações ordenadas através do Plano de Governo, no qual o desenvolvimento
e o progresso de cada região deveria se ajustar a uma evolução do bem-estar social, porém
dentro de uma perspectiva “moderada”, afinada com o pensamento político de Carvalho
Pinto.
Sobre o viés econômico e, de certa forma, confirmando a orientação 'reformista' do PAGE,
Sampaio confirmou:
Era um programa keynesiano, o Diogo tinha um retrato de Keynes
na sala dele, era um apaixonado. Era uma intervenção keynesiana
para corrigir previamente os perigos de um estanqueamento da
economia paulista. A análise é muito bem feita. A análise daquele
Plano é muito bem feita e tem ingredientes do Sebastião, do Diogo
e do Delfim. (SAMPAIO, 2007)
10
Em entrevistas, Sampaio e Whitaker afirmam que os economistas do Grupo tinham orientação tradicional da economia, destacando-se Diogo Adolpho Nunes Gaspar, explicitamente Keynesiano.
Apesar de não existir unidade ideológica entre seus agentes, pode-se verificar através dos
relatos orais e registrados, que estes compartilhavam da idéia de que a intervenção do
Estado para o alcance dos objetivos econômicos e sociais do plano era inquestionável e as
diferenças não eram impedimento para sua implementação.
O “viés modernizador” do Plano, presente nas ações que contemplavam “aumento da
produtividade e da produção através de aplicações maciças na infra-estrutura da economia
– como energia, ferrovias, rodovias, aeroportos, pontes, armazenagem e ensilagem e
abastecimento – e, diretamente, nos setores agrícola e industrial, através de fomento e
estímulo [...]” (PAGE, 1959, p. 18), entre outras, articulava-se às ações desenvolvimentistas
do Plano de Metas de Kubitschek .
O PAGE fixava objetivos, estabelecia escalas de prioridades e prazos de execução, sendo
que os pontos iniciais dessas metas advinham das análises dos programas estabelecidos
pelas Secretarias, das projeções econômicas e das possibilidades financeiras de sua
execução para o período de quatro anos.
As iniciativas estavam assim divididas:
I. Coordenação dos vários setores da administração com a atuação do Grupo de
Planejamento.
II. Reorganização interna dos órgãos existentes com a reestruturação das Secretarias.
III. Reforma administrativa com a criação de novos órgãos. Criação do Fundo de
Construção Escolar – FECE e Fundo de Construção da Cidade Universitária -
FUNDUSP, além de outros na área da Saúde, Agricultura e Obras.11
IV. Introdução da técnica do Planejamento Orçamento.12
O processo técnico chamado “planejamento-orçamento”:
[...] Consiste na reunião de duas técnicas distintas, mas realmente
indissociáveis: o denominado processo de planejamento-orçamento.
Planejamento como meio de selecionar objetivos e de disciplinar o modo
de atingi-los – portanto, como instrumento que fornece ao Governo
elementos necessários à fixação e execução de um programa de trabalho;
orçamento, como plano destinado a financiar esse programa de trabalho.
(PAGE, 1960, p. 7)
11
O FECE e o FUNDUSP foram estruturados neste período, através da Lei Estadual nº 5.444 de 17.11.1959, bem como a criação da Universidade de Campinas através da lei Estadual nº 7.655 em 28.12.1962, sendo que sua instalação oficial aconteceu somente em 1966. Ainda sob ação do PAGE foi fundada a FAPESP, Fundação de Amparo a Pesquisa, pela Lei Orgânica nº 5.918 de 18.10.1960, começando a funcionar de fato somente em 1962, com o Decreto nº 40.132 de 23.5.1962. Entre outras ações, o PAGE propiciou ainda o início da construção da Usina Hidrelétrica de Urubupungá, a realização das obras nas usinas de Limoeiro, Euclides da Cunha, Barra Bonita, Jurumirim, Bariri, Graminha e Xavantes. 12
PAGE, 2º relatório, p. 20, 21 e 22.
O “planejamento-orçamento”, aparelhando e dando suporte às iniciativas do PAGE visando
garantir a execução dos empreendimentos e serviços sem interrupções, teve sua
distribuição e revisão avaliada em período anual. Segundo seu decreto de criação, esta
periodização foi determinada “a fim de adequá-lo às mutações da conjuntura econômico-
financeira e às decorrentes da própria execução e funcionamento das obras e serviços e
empreendimentos”.13
Mas há outra questão fundamental. Além do planejamento-orçamento, o Plano foi aprovado
pela Assembleia Legislativa do Estado como Plano Plurianual (o primeiro Plano plurianual
brasileiro), desta forma havia a garantia da continuidade orçamentária dos trabalhos
contemplados, além de adaptá-lo de forma mais flexível “às mutações da conjuntura
econômico-financeira”.14 Sobre a necessidade da revisão anual prevista pelo plano, relatou
Sampaio:
[...] para poder funcionar o Plano, nós fizemos o primeiro orçamento
plurianual do Brasil. O Carvalho Pinto disse: - Para a gente garantir o
preço e que não tenha reajuste, eu preciso ter o orçamento inteiro. Se a
obra começa agora em setembro e acabar no ano que vem e em
setembro, eu preciso votar o orçamento de novo; o “cara” não é louco de
dar um novo preço, ele tem o direito de reajuste. Quando chegar
setembro, para que ele receba tudo, é preciso que o dinheiro esteja livre.
Então vamos separar a verba de capital que será de quatro anos e a verba
de manutenção que será de ano a ano. (SAMPAIO, 2007)’
A captação de recursos financeiros para a execução da receita orçamentária e,
consequentemente, a realização de obras, serviços e empreendimentos propostos foi um
dos principais motes da atuação do Grupo. Para tanto, foram recorridos como agentes
financeiros os bancos estatais, o Instituto de Previdência do Estado – IPESP. Como forma
de incentivar setores específicos, foram criados fundos também específicos e fundações
com dotações orçamentárias próprias, tais como o Fundo para Expansão Agropecuário e de
Estímulo Industrial e o Fundo para Indústria de Base e de Bens de Produção, entre outros.
Os Fundos eram uma espécie de BNDES de São Paulo. Criamos o Fundo
Agropecuário, o Fundo de Apoio a Pequena e Média Indústria e o Fundo
de Expansão da Indústria Básica de São Paulo, que deram uma
musculatura espantosa ao Estado de São Paulo. (SAMPAIO, 2007)
13
Decreto nº 34.656, de 12.2.1959. Artigo 2º, Inciso 1º, Parágrafo b.
14 PAGE, 1960, p.13.
O PAGE era ordenado através de 3 grandes setores "Expansão Agrícola e Industrial",
"Melhoria das Condições do Homem" e "Infraestrura", que por sua vez conheciam
subdivisões específicas.
O Plano de Ação e a Arquitetura Moderna
De acordo com o relatório do PAGE apresentado pelo governador, as demandas físicas do
Plano e as prioridades das Secretarias foram atendidas pela Equipe Técnica, optando-se,
primeiramente, por reequipar e reformar as unidades existentes, finalizar as obras da gestão
anterior Jânio Quadros (1955-1959), além de efetuar convênios com entidades particulares
para melhorar o funcionamento dos seus equipamentos e solucionar seus problemas. Na
sequencia, foram construídas novas unidades das redes de serviço pelo interior do Estado e
na capital.
A maioria das obras teve financiamento do IPESP artifício já utilizado na gestão anterior,
que também serviu para a contratação de projetos por profissionais fora do Departamento
de Obras Públicas, que conheceu novas estratégias de organização do trabalho, segundo o
arquiteto Francisco Whitaker responsável pelo departamento na época:
O DOP trabalhava com procedimentos antigos tinha setores separados
para arquitetura, hidráulica, elétrica, etc. Quando entrava um projeto cada
setor desenvolvia isoladamente sua tarefa e ficava circulando entre eles
separadamente, sem noção de conjunto perdendo muito tempo no projeto.
Então veio a idéia, por influência do padre Lebret que tinha ideias de
interdisciplinaridade, do DOP fazer ateliês para desenvolver o trabalho
completo. Quer dizer nos ateliês, que tinham outro nome na época, tinha o
arquiteto, o hidráulico, todos os técnicos das diversas fases da obra. Eles
pegavam o projeto e tinham que resolver integralmente. (WHITAKER,
2007)
Ainda que a produção do DOP começasse a conhecer uma inflexão, o seu ritmo não se
adequava aos objetivos e prazos do plano. Mas havia outra questão, e mais importante.
Para Plínio de Arruda Sampaio que dialogava com vários arquitetos modernos, seus
amigos, os “projetos padrão” desenvolvidos pelo DOP não atendiam as qualidades
pretendidas, em termos de aproveitamento, desempenho e funcionalidade:
(...) o DOP que tinha mais obras continuava com os chamados “projetos
padrão.” (...) eu andava com os arquitetos, os arquitetos chegavam para
mim e diziam: O que se gasta para preencher o terreno ou tirar o terreno,
você gasta num bom projeto que rompia o padrão, aproveita o terreno e
faz algo muito melhor, com a insolação bem feita, etc. (SAMPAIO, 2007)
Mas, sobretudo, as qualidades formais e simbólicas das obras modernas, que
amalgamavam desenvolvimentismo e modernismo, solicitavam a adoção da arquitetura que
naquele momento já tinha “feito história” e que a presença de Brasília tornava inequívoca:
(...) era óbvio que tinha que ser moderno. Nem se discutia, era uma coisa
de senso comum. Era tão hegemônica a idéia e eles todos eram ligados a
isso, tinham acabado de sair da arquitetura. Eram todos alunos do Artigas,
desse pessoal “craque”. Então eles todos... eu não me lembro de
nenhuma discussão formal. Mas eu me lembro que todo mundo achava
muito bonito, nos recebemos muitos elogios. Os prefeitos ficavam
contentes, tinha maquete que era bonita. Então eu recebia muito
telegrama, muito obrigado e “tal”. (SAMPAIO, 2007)
Assim, a opção por contratar projetos fora do quadro funcional atendia aos aspectos
simbólicos e de renovação e permitia aos arquitetos, ou pelo menos parte deles, explorarem
“invenções de soluções” dos equipamentos.
A produção de equipamentos públicos em larga escala associada a um planejamento de
estado propiciou aos arquitetos paulistas uma experiência fundamental para o
desenvolvimento da questão social da arquitetura moderna produzida em São Paulo.
O Modernismo Brasileiro nas artes plásticas, na arquitetura e no urbanismo, desde as suas
origens, entre os anos 1920 e 1930, estabeleceu duas constantes programáticas que
acabariam por marcar o seu reconhecimento de forma a tornar mais ou menos válida a
experiência moderna, em função ou não da presença destas constantes nos trabalhos
artísticos e arquitetônicos. Estas podem, grosso modo, serem definidas como o caráter
nacional da produção moderna local e o compromisso do modernismo com a modernização
do país.
O caráter nacional na produção cultural não é uma questão de fácil definição e não guarda
uma sincronia absoluta entre as várias disciplinas artísticas. Entretanto, ele pode ser
interpretado como a contrapartida superestrutural, ao ingresso periférico do país na
modernidade, que o desenvolvimento econômico engendraria. Ou seja, no campo da
cultura, procurou-se estabelecer legitimidade e substância históricas para a modernização.
Olhando o passado, e por vezes construindo o próprio passado, o modernismo brasileiro
propunha ser qualificado com elementos capazes de estabelecer uma identidade local, ao
mesmo tempo em que, projetava um futuro que iria resolver o nosso atraso econômico e
desta forma o social também. Dotado de “raiz” o desenvolvimento nacional, não sendo
abstrato, teria traços particulares, adequados à nação brasileira.
Esta “nacionalização” do modernismo ganharia com as políticas desenvolvimentistas da
década de 1950, outra dimensão, justamente, a de representar a modernização em curso,
cujos ícones mais reconhecíveis talvez sejam a implantação da indústria automobilística e a
construção de Brasília. Neste processo, não faltaram críticas a arquitetura moderna
brasileira, para elas suas qualidades davam-se através de grandes obras, residências para
as elites, palácios governamentais, etc, desprovidas de conteúdo social.
Sem se opor as dimensões nacionalistas e de modernização, a questão social na arquitetura
moderna brasileira sempre foi objeto de discussão. O 1º Congresso Brasileiro de Arquitetos
(1945) teve como tema central a 'Função Social do Arquiteto'. Nele, Urbanismo e Habitação
articulando a função social da arquitetura tinham lugar destacado. Como pensado no início
do modernismo a concepção da cidade industrial e a produção de habitação para população
de baixa renda qualificavam a dimensão social da arquitetura. Mas, de fato, tal dimensão em
grande parte compareceu como promessa, não caracterizando a produção moderna
brasileira. Neste sentido, basta lembrar suas primeiras obras emblemáticas, Palácio
Capanema, ou edifício do MESP; Igreja da Pampulha, Cassino e Casa do Baile do mesmo
conjunto, etc.
O virtuosismo desta produção arquitetônica, denominada "Escola Carioca", e tida como a
verdadeira arquitetura brasileira, por vezes foi questionado frente aos (des)compromissos
sociais que a caracterizariam. Uma critica paradigmática foi efetuada por Max Bill, para
quem a arquitetura moderna local padecia do "amor à forma pela forma".15 Críticas como
essa, levaram, por exemplo, Niemeyer no texto Problemas Atuais da Arquitetura Brasileira
(1955), a afirmar que a ausência de conteúdo social (nas suas palavras, humano), da
arquitetura moderna brasileira advinha da natureza político-social do país, de suas
contradições, que não permitiam o desenvolvimento social da arquitetura.
O que pode ser depreendido é que, o tema social compareceu durante algum tempo, como
fundamento e impossibilidade na produção arquitetônica moderna brasileira. Entretanto, nos
anos 1960 a discussão da Função Social do Arquiteto, ou da arquitetura, norteou os debates
e propiciou certa renovação do ideário moderno e a ascensão ao primeiro plano da
produção arquitetônica de Artigas e da arquitetura que se desenvolveu principalmente a
partir de suas obras, o chamado Brutalismo Paulista, ou Escola Paulista. A discussão social
conheceu seu ápice no final dos anos 1960 com as polêmicas entre Artigas de um lado, e
Sérgio Ferro e Rodrigo Lefèvre de outro, que questionavam o próprio trabalho arquitetônico.
15
Max Bill Censura os Arquitetos Brasileiros. Entrevista a Flávio d’Aquino, in Arte em Revista nº 4, ag. 1980, p. 50. Publicada originalmente na revista Manchete nº 60, sob o título Max Bill, o Inteligente Iconoclasta, em jun. 1953 e reproduzida em Habitat nº 12, em set. do mesmo ano.
Entretanto, a constituição da articulação entre forma arquitetônica, fazer arquitetônico e
programa da edificação, que fundamenta a função social da arquitetura e o processo que
viabilizou as obras que deram sentido a essa constituição, em geral, não é esclarecido.
Para o seu entendimento, faz-se necessário verificar algumas situações na produção de
Artigas. A guinada formal, quando os materiais, sobretudo o concreto, ganharam forte
expressão, surgindo sem revestimentos e o volume construído foi sendo condensado em
uma grande estrutura, grosso modo, a caixa de concreto, ocorreu com a Casa Olga Baeta
de 1956. Entretanto, a dimensão social de sua arquitetura, em que pese o aspecto genérico
que todo edifício moderno propõe-se enquanto formador de novas sensibilidades ao seu
usuário ou morador, necessitou de outro tipo de edifício para sua afirmação.
Esse tipo de edifício, não foram os conjuntos habitacionais modernos, pois Artigas somente
viria a projetar o Conjunto Habitacional Zezinho Guimarães em 1968, quando a marca social
já estava associada a sua produção. Foi justamente com as obras projetadas para o PAGE,
vale salientar, equipamentos públicos, e, sobretudo, com as escolas de Itanhaém,
Guarulhos, Utinga e a própria FAUUSP (projetada em 1961 e finalizada em 1968), que suas
propostas arquitetônicos, articulado a de outros arquitetos no período como Paulo Mendes
da Rocha, Carlos Milan, dentre vários, adquiriram a dimensão social pela qual é
reconhecida, atribuindo consistência a ideia de Brutalismo Paulista.
Certamente, a questão social era associada a discussão sobre a modificação do caráter dos
espaços dos equipamentos públicos. Durante anos, os equipamentos públicos não
incorporavam como deviam, a noção de uso e utilização universal. Discutindo sobre isso,
tendo como base seu projeto do Fórum de Araras para o PAGE Fábio Penteado, associado
às formulações de Artigas, afirmou:
O que é um Fórum? Você pode pegar a história para enriquecer, aumentar
o livro, história antiga, etc. Aí vem a realidade se aproximando da
realidade, onde ele é? Para quem que ele vai atender? Em Araras devia
ter quinze mil habitantes. Também fui ver o que era um Fórum e tinha um
padrão geral, assim era a descrição que vi na época: um padrão dentro
daquela linha dos juízes, do comando não sabe da onde. Um prédio
Vetusto. E acomodava no terreno, conforme o projeto vinha uma escada,
com pé direito duplo na entrada na porta, uma réplica de salas dos passos
perdidos que as pessoas se dirigem. (...). (PENTEADO, 2007)
Diante desta situação o cidadão comum via-se intimidado:
O cidadão comum ao se aproximar já tem dúvida, já tem medo, é
ancestral. Na porta daquele prédio tem um cidadão que é guarda que
pode barrá-lo e ele pode não fazer nada, mas está lá relaxado, já
maltratando pelo princípio de ser autoridade. (PENTEADO, 2007)
Para o arquiteto o Fórum poderia ter outro entendimento que servisse de base para uma
nova concepção espacial:
O Fórum não é só Fórum de Justiça, ele tem lá o registro imobiliário, os
cartórios, então o cidadão nasce um filho vai registrar, morreu alguém ele
tem que fazer inventário. Ai entra todo o aspecto da realidade.
(PENTEADO, 2007)
Visando repensar o caráter do Fórum, através da arquitetura, rompendo o “princípio de
autoridade” e a hierarquia espacial que o Fórum tradicional guardava, favorecendo a
apropriação do equipamento por parte dos cidadãos, Penteado propôs:
(...) um Fórum que não tivesse porta. A área era uma praça grande, tinha
espaço. Então a idéia em princípio foi de usar um espaço onde chamaria
de Fórum, ele gerava uma sombra na pracinha onde o cidadão aguardava
na sombra. (PENTEADO, 2007)
O Fórum deveria ser visto como um equipamento público, de uso público verdadeiro, sua
relação com o ambiente externo, com o espaço público, tornado praça, devia ser de
continuidade e não de restrição. Esta concepção de equipamento público norteou se não o
conjunto da produção moderna dos edifícios do Plano de Ação, a parte da produção que
direta, ou indiretamente, era influenciada pelas ideias de Artigas. Esta mesma concepção
pode ser verificada no Fórum que projetou em Promissão e no de Paulo Mendes da Rocha
para Itapira.
Figura 1: Fórum de Araras, projeto Fábio Penteado, 1959.
Os Fóruns representaram um laboratório muito instigante para os arquitetos modernos, mas
outro tipo de edificação, como dito, destacou-se na produção moderna do PAGE, quer pela
quantidade de unidades construídas, quer pelo significado que incorporou para a discussão
da função social da arquitetura. Este foi o edifício escolar. Se há um aspecto intrínseco a
todo edifício moderno, que é o de formar seu usuário, a formação no edifício escolar adquire
uma dupla dimensão, além da formação propiciada pelo ensino e atuando sobre ela, há (ou
deveria haver) a formação social que a escola proporciona de maneira privilegiada e o
espaço arquitetônico, tanto melhor é, quanto melhor potencializa tal formação.
Duas escolas projetadas por Artigas para o PAGE sintetizam as concepções que
caracterizariam o Brutalismo Paulista, e que estabeleceram a linguagem apropriada de uma
arquitetura com compromisso social, a saber, os ginásios de Itanhaém e de Guarulhos,
neles a caixa de concreto, ou a grande laje, que guarda todo o programa de necessidades
do edifício conheceu uma formulação que dali em diante tornou-se paradigmática para a
produção de inúmeros arquitetos.
No Ginásio de Itanhaém, de 1959 a laje encerrava um pequeno universo. O edifício como
abrigo social, não era só proteção, era convívio, troca de experiências, o organizador e o
cenário de formação e das atividades culturais e particularmente educacionais.
Figura 2: Ginásio de Itanhaém, projeto Vilanova Artigas, 1959.
A estrutura independente permitindo a continuidade e fluidez espacial conduzia a
localização das atividades internas em três blocos: o didático, o administrativo e o central
com serviços, cozinha e cantina. Pelo porte e dimensão da laje uma forte tensão era
estabelecida entre a estabilidade de seu perfil horizontal e o arrojo técnico que os pilares de
borda, com o formato de triângulo retângulo invertido, personificavam. Da mesma lavra faz
parte o Ginásio Estadual de Guarulhos de 1960. Esta obra possui uma implantação
inovadora, aproveitando uma suave depressão do terreno, o grande bloco horizontal da
escola aparenta um edifício ponte unindo as duas extremidades mais altas do mesmo
terreno. A faixa da edificação parece completar o horizonte que havia sido seccionado.
Quanto ao agenciamento espacial, pode-se dizer que há um piso inferior, de área limitada,
com poucas funções abrigando cantina, sanitários, depósito e o acesso a outro andar. Mas
de fato, o grande bloco possui alguns níveis que conformam espaços funcionais, circulações
generosas propícias a encontros e um grande pátio central. Este rege a espacialidade
interior permitindo aos usuários uma riqueza múltipla de situações e visibilidades. Apesar de
todo aberto a volumetria dos níveis, a plasticidade dos pilares, o detalhe dos longos bancos
de concreto, a iluminação zenital que Artigas utilizava pela primeira vez, nesse tipo de
edificação, gera um interesse profundo, que corrige o olhar para dentro. A cidade esta a
vista a todo o momento, mas é a cidade/escola que conquista a atenção de forma plena.
Esta mesma espacialidade, ao mesmo tempo, aberta e interiorizada, conheceria um
desenvolvimento maior no edifício da FAUUSP na cidade universitária e estaria também
presente no ginásio de Utinga.
Figura 3: Ginásio de Guarulhos, projeto Vilanova Artigas, 1960.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No relatório apresentado à Assembleia em 14 de março de 1962, terceiro e último,
praticamente um ano antes de terminar o Plano, consta que o governo contratou entre
grupos escolares, unidades sanitárias, fóruns, casa de lavoura, chefias de extensão
agrícola, delegacias regionais agrícolas, etc., 646 obras de prédios com financiamento pelo
IPESP, sendo que 520 já haviam sido entregues.
Esses dados representam, entre outros, 7.000 novas salas de aula para o (antigo) primário,
1.100 para o (antigo) secundário, construção de edificações de ensino superior na Cidade
Universitária Armando Salles de Oliveira - USP, 113 Cadeias e Delegacias, 57 novos
Fóruns, 100 postos de Assistência Médica Sanitária, 308 Casas da lavoura, etc.16
A pesquisa em curso ainda não pode concluir sobre a precisão desses números, entretanto,
menos do que indicar uma quantidade menor, as avaliações até agora indicam um número
maior de empreendimentos, mesmo porque, as obras do último ano não constavam do
16
(PAGE, 1962, p. 59).
último relatório e pelo que alguns dados informam, muitas obras foram viabilizadas com
recursos do próprio estado e não somente através do IPESP, como no caso de
equipamentos vinculados à Secretaria de Agricultura.
Ainda que possa ser interpretado como um Plano de Investimentos que conteve aspectos de
indução do desenvolvimento econômico e social, o PAGE através das redes de
equipamentos públicos, estradas e outras instalações de infra-estrutura pode ser visto como
instrumento de Planejamento Territorial inovador na experiência brasileira de políticas
públicas. Através dele uma nova configuração físico-territorial foi constituída a partir do
incremento dos equipamentos públicos, que estabeleceram um padrão urbano, que renovou
a anterior configuração urbana do interior, propiciada pelo café.
As redes de equipamentos, em parte existentes, conheceram uma nova dimensão que
alterou qualitativamente política e socialmente o interior, associando as cidades ao território
e estabelecendo para este um novo padrão e uma nova dimensão espacial-administrativa.
Ainda deve-se considerar que mesmo tendo um impacto maior no interior, inúmeros
equipamentos públicos também foram executados na capital, principalmente escolas.
Nem todas as obras do PAGE foram modernas. Certamente, as obras produzidas a partir de
projetos contratados junto a arquitetos profissionais liberais, eram de extração moderna. O
DOP projetou e produziu obras modernas, mas muitas com uma linguagem ambígua,
convencional, onde a simplificação formal obedecia mais questões de praticidade projetual
do que de intencionalidade arquitetônica e mesmo alguns projetos do DOP mantiveram uma
linguagem eclética.
Por outro lado, nem todas obras modernas, contratadas via IPESP seguiram as formulações
de Artigas, as suas formulações estavam por assim dizer, sendo gestadas naquele
momento e outros profissionais desenvolviam produções com características próprias.
Entretanto, a transformação do edifício escolar na grande expressão social da arquitetura,
competindo com a habitação, para não dizer suplantando-a em termos de elaboração e
estudos durante anos na prática profissional e nas escolas de arquitetura e a transformação'
da solução da 'caixa de concreto', ou da grande 'laje de cobertura' de toda edificação como
um cânone do edifício escolar, que se combinava e estendia para qualquer outro tipo de
programa, de residência individual à Fórum de Justiça, representa um legado claro do Plano
de Ação.
A pesquisa aponta que em relação as obras novas do PAGE a produção moderna foi
majoritária e considerando os números acima indicados, pode-se intuir que a sua
quantidade transforma-se em uma dimensão qualitativa ao se considerar o impacto que
tiveram na recepção e difusão do modernismo. Além de Brasília, que em termos simbólicos
representava a modernização do Brasil, mas que podia ser observada indiretamente, a
distância, as obras do PAGE podiam ser experimentadas em cada cidade, ao alcance de
todo habitante, propiciando uma concretude para além da representação simbólica.
No âmbito específico das formulações arquitetônicas, mesmo considerando, que as formas
arquitetônicas do Brutalismo Paulista como a Casa Baeta indicava já estavam em curso, o
alcance que o Brutalismo adquiriu através do PAGE, mesmo sendo uma parte da produção
moderna, foi decisivo para que sua teleologia, a de que o edifício moderno deve contribuir,
ou mesmo ser determinante para difundir novos hábitos e relações sociais, associada a sua
fatura material, para que fosse convertido à qualidade de vertente hegemônica da
arquitetura moderna produzida em São Paulo nos anos 1960 e 1970, condição que se
difundiu para o resto do país.
REFERENCIAS
ARTIGAS, J. B. V., 1989. Função Social do Arquiteto, São Paulo, Fund. Vilanova Artigas/Nobel,
CESTARO, L. R. 2010, Urbanismo e humanismo: a SAGMACS e o estudo da "estrutura urbana da
aglomeração paulistana", São Carlos, EESCUSP.
CORDIDO, M. T.R. L. de B., 2007, Arquitetura Forense do Estado de São Paulo, São Carlos, mimeo.
PINTO, Carvalho, 1961, Mensagem apresentada pelo Governador Carvalho Pinto à Assembléia
Legislativa do Estado de São Paulo em 14 de março de 1961, para a Lei nº 6.047, de 27 de janeiro de
1961, São Paulo, Decretos e Relatórios, São Paulo, Imprensa Oficial.
S/A, Estado de São Paulo, 1959, Plano de Ação do Govêrno- 1959-1963- Administração Estadual e
Desenvolvimento Econômico e Social, São Paulo, Imprensa Oficial do Estado.
ENTREVISTAS
CASTALDI, I. G., 2007, Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na cidade moderna e
contemporânea (ArtArqBr) .
MELLO FILHO, J.H. de, 2012, Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na cidade moderna
e contemporânea (ArtArqBr) .
LAMPARELLI, C. M., 2007- Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na cidade moderna e
contemporânea (ArtArqBr).
FERREIRA, F. W., 2007 - Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na cidade moderna e
contemporânea (ArtArqBr).
PENTEADO, F. M., 2007 - Grupo de Pesquisa Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na
cidade moderna e contemporânea (ArtArqBr).
SAMPAIO, P. de A., 2007 - Grupo de Pesquisa Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos
na cidade moderna e contemporânea (ArtArqBr).
VACCARI, M. e PASSOS, M. L. de B., 2007 - Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na
cidade moderna e contemporânea (ArtArqBr).
VISCONTI, M.G. C.e BARBOZA, M. M., 2011- Grupo de Pesquisa Arte e Arquitetura, Brasil – diálogos na
cidade moderna e contemporânea (ArtArqBr).
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