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DIVERTEâORRECom Connery fora de vez, Vive e Deixa Morrer
precisava não só de apresentar um novo 007 em
Roger Moore, como de reinventar o envelhecidoherói de Fleming para um mundo moderno
ichael Billington morrera sete
anos antes e, se não fosse Roger
Moore, o mais certo era a sua
morte ter sido capa de jornais.
Porquê? Para quem conhece
a saga Bond, ele foi Sergei Barsov em AgenteIrresistível- mas para quem realmente conhece
a saga Bond, Billington foi um candidato bem
classificado na mais ferozmente disputadacorrida do cinema de todos os tempos. Que iria
ser ganha, ainda que na altura ninguém o
soubesse, por um insider. Embora exportado
para os EUA como estrela de cinema nos anos
1950, Moore tornou-se um nome residente comoestrela de TV nos anos 1960, e foi assim que deu
por si no chique Curzon House Club na zona
Mayfair de Londres, onde rapidamente se fez
amigo dos produtores de Bond Cubby Broccoli
e Harry Saltzman.
Talvez não tão coincidência, o Curzon House
Club era um casino. E embora Moore, Broccoli e
Saltzman viessem a tornar-se muito bons amigos- de família, passavam o Natal e a Páscoa juntos
-, eram homens que gostavam de jogar cartas,sobretudo aos sábados. Moore conhecia o quese passava no mundo deles; houve até rumores
de que estaria na lista original de atores queeles queriam que fossem James Bond, embora
(diz ele) nunca lhe tenham dito. E enquantoSean Connerv estava a atingir os trincaras :
• O realizadorGuy Hamiltondiscute com onovo James Bondcomo é que alancha vai saltar.
na pele do lucrativo espião, Broccoli e Saltzman
mantinham-no informado, mostrando-lhe todos
os filmes de Bond logo que saíam, cada um na sua
primeira montagem. E, ao fim de quatro, ele não
conseguiu deixar de reparar que a estrela estava
a preparar-se para saltar.. .
"O Sean andava a dizer que não o ia fazer
mais", recorda Moore. "Por isso, falaram comigo.Começámos a falar sobre filmar no Camboja- eles estavam ocupados a encomendar elefantes
-, mas rebentou o caos por lá e a rodagem ficou
na prateleira. Entretanto, eu estava a fazer
outro filme e eles descobriram George Lazenby.
Depois o Sean voltou, para fazer Os DiamantesSão Eternos, e nessa altura eu estava a terminar
a minha participação em Os Persuasvres."
Primeiro Saltzman ligou-lhe a dizer:
"O Cubby concordou, queremos que tu o faças."
Depois Cubby ligou-lhe e disse: "O Harryconcordou, queremos que tu o faças." Ambos lhe
disseram que não estava em forma, que precisavade cortar o cabelo e que a ideia tinha sido do
outro. "Então, fiz dieta e exercício como umdoido. Cortei o cabelo várias vezes e depoissentei-me com o Guy Hamilton, que ia realizar
o primeiro filme comigo, e falámos sobre tudo.
Falámos sobre como iria abordar a personagem.Queríamos evitar qualquer comparaçãodeliberada com o Sean, tirando o facto de eu
desempenhar a mesma personagem. Como
nunca dizer: 'Martini, batido, não mexido.'"
Hamilton, que Moore descreve como
Os Diamantes são Eternos, com o Sean. Não era
suposto ter o Sean, mas fizeram-lhe uma oferta
irrecusável. Então, fiz o filme e foi divertido.
E depois disse: 'Adeus, obrigado!' E eles: 'Não,não, tu assinaste para fazer o novo Bond.'"
Embora Hamilton tivesse estado envolvido
na procura, e filmou muitos testes de imagem,guardou as suas opiniões para si próprio."Mantive-me de fora", afirma, "porque eraum franchise que pertencia ao Saltzman e
ao Broccoli, por isso não valia a pena - eles
é que decidiam! Estava muito mais interessado
no guião, que ia ser bastante difícil de fazer,
porque o problema com os livros de lan Flemingera que tinham quase 20 anos. Aqueles clímax
com helicópteros apareciam em todas as séries
de televisão na América! O problema era: onde
levamos Bond desta vez? Porque eu acreditava
piamente - sobretudo naquela época, em quenão havia Ryanairs, ou coisa parecida, e a Costa
Dcl Sol era o mais longe que se ia - que um filmeBond devia levar-nos a sítios onde nunca iríamos
em toda a nossa vida. Essa era uma partesubstancial da filosofia de Bond."
Hamilton juntou-se ao argumentistaTom Mankiewicz, que tinha trabalhado emOs Diamantes São Eternos quando tinha pertode 30 anos e tornou-se autor fixo de Bond,famoso pelas suas piadas. Fala-se que terá sido
Mankiewicz que sugeriu Vive e Deixa Morrer;o segundo livro de lan Fleming, publicado em
1954, descrevia, na pouco discretamente racista
começaram a falar sobre perseguições em barcos
a motor e Hamilton pensou: "Se conseguíssemos
pôr um barco a motor a saltar, era bom!" A esta
altura, já tinham enredo suficiente para justificaro envio de uma unidade para Nova Orleàes
e, enquanto Mankiewicz trabalhava no guião,Hamilton foi fazer reconhecimentos paraas Caraíbas, acabando na Jamaica adotada
"Se conseguíssemos por um barco a motor
a saltar, era bom!"< ..., n ,.,,;
"um herói de guerra da vida real", tendo liderado
ataques na II Guerra Mundial através do Canal
em barcos a motor até Dieppe, tinha trabalhado
com Broccoli e Saltzman em 007- Contra
Goldfinger, em 1964, o filme para refinar
a fórmula do filme Bond. "Eu fiz Goldfinger,
gostei, e eles pediram-me para fazer o seguinte",recorda. "Disse eu: 'Sabem uma coisa? Fiqueisem ideias.' Por isso, só voltei a fazer outro em
linguagem da época, as atividades de umcontrabandista de ouro obcecado por vudu
nas Caraíbas, chamado Mr. Big. Talvez inspirado
pela recente vaga de filmes de temas afro-americanos
do género, como They Call Me Mister Tibbs!
(1970) e Shaft (1971), Mr. Big, aka Kananga(representado pelo aclamado ator de Nova
lorque Yaphet Kotto), é um déspota do TerceiroMundo agindo como traficante de droga emHarlem para inundar o mercado de heroína
mundial. Mankiewicz decidiu filmar em NovaOrleães (o livro usava a Florida, onde Bond
já tinha ido), e com Hamilton, os dois inventaram
a cena de abertura em que um espião britânicoé assassinado mmjazzfunerul.
Hamilton levou a ideia aos produtores, que,
para sua surpresa, concordaram. Depois, no pub,Mankiewicz riu e disse: "És um chato esperto!"Hamilton respondeu: "Não, espera lá -mandaruma unidade para Nova Orleães para três
minutos e meio de filme não vai resultar. Eles vão
acordar. Que mais se passa em Nova Orleães?"
Mankiewicz disse: "Bem, há bayous." "O queé um bayouT' "É uma espécie de canal." Então,
por Fleming. Lá encontrou uma quintade crocodilos, destinada a uma sequência.
Mankiewicz e Hamilton tinham muitas ideias
que mostraram aos produtores. "Algumas eles
recusaram", conta ele. "Às vezes, porque eramdemasiado caras - outras, porque não custavam
o suficiente! Porquê filmar uma cena num quarto
quando a podíamos ter filmado no topo das
pirâmides? Tentámos manter-nos o mais fiéis
possível ao livro, mas algumas coisas estavam
ultrapassadas. Por exemplo, em Goldfinger, os
vilões nunca entram em Fort Knox. Conseguem
imaginar fazer um filme cujo objetivo da
operação é entrar em Fort Knox e serem todos
apanhados antes? O público atirava-nos tijolos!"Hamilton, contudo, refuta a sugestão de que
Vive e Deixa Morrer foi uma tentativa diretade apanhar a onda da exploração negra. "Não",afirma. "É precisamente ao contrário. O livro
passa-se nas Caraíbas, tem vudu e uma senhora
negra com quem Bond se envolve." Esta última,encarnada por Gloria Hendry, viria a ser o facto
mais contencioso do filme. "Tinham corrido
rumores de que eu ia beijar uma rapariga negra",nota Moore. "Acho que foi uma discussão entre
o Cubby e o Harry e a United Artists sobre até
onde isso iria." De facto, quando eles estavam
em Nova lorque a fazer castings para atores
americanos, disseram ao Hamilton: "Tens de
escolher mulheres protagonistas de cor pastel."O realizador ficou horrorizado. "Eu tinha
muitos amigos negros em Inglaterra e senti-me
mal por estar naquela situação. Por isso, no
casting escolhi a mulher mais negra que encontrei!
Tive de propô-la aos produtores, que foram
maravilhosamente liberais, abençoados sejam."
[riosamente, até hoje, Jane Seymourcha que a sua personagem era a quelevia ser negra, mas não foi. Errado:
ias palavras de Fleming, Solitaire
ra "pálida, a palidez das famílias de
brancos que vivem há muito tempo nos trópicos".Descoberta na série da BBC The Onedin Line,
Seymour, então de vinte e poucos anos, foiescolhida para a vidente virginal de Mr. Big, e
deu o seu melhor. "Depressa percebi que os filmesde Bond, sobretudo este, eram escritos paraserem muito irónicos", ri a atriz, "com a essência
de lan Fleming, mas não necessariamente todos
os factos. Mas eu levei o papel muito a sério, porisso, o Roger Moore deu-me a alcunha de "BabyBernhardt". Eu achava que era um papel de
representação, mas era mais de tentar ser bonita
e correr três passos atrás de um homem armado."O filme é hoje famoso por uma elaborada
perseguição com lanchas rápidas a acelerar porterra e bayou, e embora pareça fácil, levou semanas
a planear. A política de Hamilton era nunca filmar
uma acrobacia sem a experimentar, mas sempre
que mandavam uma lancha por uma rampaacima, caía no fim com um chape. "Eu estava a
começar a entrar em pânico", conta ele, "porquea data de rodagem estava a aproximar-se >
depressa. Até que alguém disse: 'Porque não vai
à universidade e usa os computadores deles?
Porque é isso que os computadores fazem.' Entreiem contacto com o departamento de informática,
expliquei o problema e eles calcularam o ângulo
que a rampa devia ter. Só tivemos de baixar
o motor fora de bordo 1 5 cm. Depois disso. . .
Cheguei lá um dia e os sorrisos nas caras deles
disseram tudo. Até voámos!"
Escusado será dizer que a estrela não esteve
envolvida na condução mais ousada. "Eles
deixaram-me fazer tudo exceto guiar pela relvafora", conta. "Mas guiei o barco várias vezes
e andei pelos bayous. Se o motor falhasse, iria na
direção em que estava a seguir, ou seja, sempre emfrente quase à mesma velocidade. A certa altura,fiz uma curva, o depósito de combustível estava
a um terço e o motor parou. Bati - PHOOM!- direto a uma casa de barcos que um idiota
qualquer tinha deixado na borda do bayou, queme danificou os dentes. Felizmente não os perdi."
A proeza mais memorável do filme ainda deixa
Moore arrepiado, quase 40 anos depois. "Vocês
conhecem a cena", diz ele. "Estou numa pequenailha. A ponte móvel é recolhida e sou lá deixado,com pedaços de galinhas ensanguentadas portodo o lado. Bem, disseram-me que tinham tiradotodos os crocodilos da zona, mas eu só via olhos
na vegetação."A famosa ideia era que Bond, preso numa
quinta de crocodilos, chamasse as criaturas
com isco e depois corresse por cima dos seus
dorsos para fugir. Para os impedir de saltar- os crocodilos não saltam em terra, mas na águapodem usar as caudas para subir até 4,5 metros- a equipa teve de construir muitas caixas de rede
que pudessem ser mergulhadas abaixo da linhade água, para que, quando Moore atirasse
as vísceras, os crocodilos viessem em bando.
"Mas eles não conseguiam elevar-se e chegaraos iscos!", ri Hamilton. "Por causa das caixas.
No ensaio, essa cena demorou 30 segundos,e o take demorou 1 5 e meio!" "Quando chegouà parte do salto real", diz Moore, "foi um tipoamoroso chamado Ross Kananga. Quando euos pisei eram bonecos com cargas elétricas quefaziam as caudas e as cabeças dispararem para o
ar. Quando ele o fez, fê-lo com crocodilos reais."
A deliciosa autopiada do momento ajudariaa definir o tom para toda a era Moore. Algo que
já estava assente quando o fume terminado se
tornou um êxito maciço, fazendo S 1 60
milhões a partir de um orçamento de S 7 milhões,
para grande prazer e surpresa de Hamilton."Nunca se sabe quando se vai ter sucesso",confessa. "A alegria de ser um realizador
a trabalhar num filme de Bond é que estamos
a jogar com o público." DW
"Eu só via olhos de
crocodilo na vegetação."
Roger Moore
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