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ENsAios HISTóRICOS
Qualidade papeleíra I
1ecljeld Rodes
opresenteensaio e os pró
ximos formam um conjun
to que visa estudara evolução da qualidade papeleira ao longodas rotas comerciais e culturais quelevaram as tecnologias do papel atéos povos da Europa Wdcntal 0 períodoconsiderado abrange do desenvolvíiwnlo inicial do papel por Wai Lun até osnossos dias
Definição da qualidade históricaPara poder coneguir uma avalia
ção consistente das sucessivas situações ligadas à qualidade é precisodefinir preliminarmente o conceitode qualidade que será utilizado Estadefinição não é fácil visto que a palavra qualidade carreia nas suas múltiplas interpretações subjetivas umpeso semântico muito rico Consideramos satisfatória para a finalidadedeste ensaio a seguinte definiçãode qualidade
0 nível de qualidade é dado peloatendimento satisfatório de uma expectativa funcional ou estética numdado contexto cultural como resulta
do cio consumo de um produto ou dautilização de um servíço adquirida
Quando nos debruçamos sobre osprodutos papeleiros oferecidos aoconsumidor moderno é fácil perceberque os nomes da sua classificaçãofuncional escrever imprimir empacotar absorver embalagem ou outrasfunções especiais é simplesmente aponta visível de umieberg que mantêm escondida e submersa a maior par
te dos inúmeros desdobramentos quecompõem sua massa Além dasvariantes de cada uma das classifica
ções acima mencionadas precisamser consideradas as alternativas de um
grande número de matériasprimascelulósicas naturais plantas fibrosasanuais trapos papéis velhos reciclados fibras de madeira entre outrasassim como as novas fibras sintéticas
à base de polímeros orgânicos arúftciais macromoléculas inspiradas emmodelos encontrados na natureza
Se por um lado temos um problemana grande variedade de matériasprimase nas suas respectivas influências sobreo nível da qualidade fina dos papéisoferecidos ao consumidor por outrolado o pano de fundo cultural sobre oqual devem ser julgados estes níveisapresenta uni outro problema sua mobilidade contínua ao longo dos períodoshistóricos consideradas
Influência do ambiente cultural sobre
o conceito de qualidadeA cultura representa aquilo que
uma sociedade considera própriosendo considerado bárbaro aquiloque não o é Uma das característicasdo ocidente europeu é a sua capacidade histórica de incorporar componentes nãopróprios periféricosou herdados de contextos anteriores
nutria linha evolutiva Em outras palavras toda cultura é um espaço queabriga participações e contribuiçõesde outras culturas Quando unia cul
tura se fecha quando ela se mostra
incapaz de se abrir a novas fontessua vida intelectual praticamentedesaparece e ela pode ser considerada uma cultura fóssil É bom lem
brar aqui que isso é válido tambémpara os conhecimentos tecnológicosconsiderados de ponta porquantosem sangue novo eles também acabani fossilizados
Como exemplo dessa mobilidadepode ser mencionada a recente ampliação na abrangência conceítual daqualidade que já não pode se limitara focalizar exclusivamente a fun
cionalidade do produto final Mesmoque a saúde financeira do empreendimento fique numa dependênciamuito elevada da susteiltabil idade eco
nõmica o conceito da qualidade estáintimamente ligado também a aspectos da qualidade ambiental assim comoaos da qualidade de vida do corpo socialdireta e indiretamente envolvido no processo produtivo formando um tripéeconômicoecológicosocial sobrecuja interação consolidada passa a serfundamentada a sustentabi I idade dos
desenvolvimentos humanos
Ao longo da história a qualidadedos papéis feitos à mão dependeu desoluções de compromisso entre as expectativas sonhadas e o campo das reáspossibilidades num momento determinado principalmente nas sucessivasescolhas tecnológicas na procura desoluções para situações conflitantes entreconsiderações econômicas disponibilidade de matériasprimas e a de recursos humanos com capacidade para um
22 0 Papel Fevereiro 1997
lesempenho funcional responsável
4s grandes etapas do evolução dajualidade papeleira
Para um melhor acompanhamentoa evolução histórica da qualidade dopapel manufaturado será avaliada numa seqüência de etapas definidas arbitrariamente como segue
1 antes de Wai Lun 105 dC2 desde Wai Lun até o fim do
Império Romano 105 dC 450
dC
3 expansão do Islão 450 dC1300dC
4 modernização precursora da
produção continua 1300 dC1800 dC5 do uso da madeira como fonte
de fibras até hoje 1800dC1992dC
ófuturos m ateriais papeleiras 2000dC
A descriçã de todas as etapas acima listadas porém demanda maisespaço do que o disponível para cadaum dos ensaios históricos desta série
Assim sendo o presente ensaio tratarádas três p iras etapas sendo queas quarta qu nta e sexta deverão serobjeto de um ensaio histórico separado
As tabelas 1 2 e 3 mostram uma se
Tabelas 1 2 e 3
1 etapa Antes de Tsai Lun k 1 OS dC
qüéncia de eventos históricos que permite balizar a linha evolutiva da qualidade papeleira ao longo das três primeiras etapas
15 etapaAntes de Tsai Lun 1 OS dC
Com base nas escassas amostras
encontradas nas regiões mais inóspitas situadas nas áreas centrais doContinente Asiático são poucos os dados disponíveis para tirar conclusõesconfiáveis sobre a qualidade materialdos papéis usados nos séculos I e IIaC Em número muito limitado e re
colhidas em diferentes épocas e emlocalidades esparsas Bagiao JuyanFufeng as amostras apresentam umnível elevado de deterioração o quedificulta a avaliação da qualidade original Tudo parece indicar porém queas amostras encontradas em Bagiaorepresentam uma compactação maispróxima a um feltrado do que a estrutura do papel de Wai Lun As amostrasachadas em Fufeng e em Juyan podematé ser consideradas papéis em embrião precursores da inovação de WaiLun As amostras de Hantanpu aparentam um caminho tecnológíco coetâneoda inovação do grande mandarim chinêsporem que não vingou não teve a
aceitação da inovação revolucionariade Wai Lun ponto final desta etapa
2 etapaDe Wai Lun até o desmoronamento
do Império Romanol os dC 4s0 dC
A inovação de Wai Lun consistiu em desenvolver um entrelaçadode fibras vegetais formando camadasdelgadas e flexíveis que herdaram adenominação de folhas pela sua semelhança a algumas folhas vegetaisanteriormente usadas para registraros símbolos da escrita As novas fo
lhas artificialmente manufaturadas a
presentavam uma superfície mais uniforme e em ambas assuas faces o quepermitiu nelas conservar mediante representação gráfica expressões verbais do pensamento humano O më
d Papel fevereiro 1997 1 23
c105 Tsai Lun
2 etapa Desde Wai Lun até o fim do Império Ili mano 105 450dC
105 Tsai Lun107 Assíria Arménia Mesopotâmia províncias romanas264 Papel encontrado em Loulan datado confia elmente400 Invenção da tinta ã base de negro de fumo 1 China409 Invasão da Península Ibérica pelos povos germânicos414 Ataulfo rei visigodo instala sua capital em Barcelona445 Fim do Império Romano Saque de Roma pelos Vândalos508 Cap talidade Toledana visigâtica
3 etapa Expansão do talam 450 1300 d0600 Captura de Alexandria pelos árabes651 Papel feito ã mão em Samarkanda711 Invasão islâmica da Península
732 Poitiers Charles Martel
751 Batalha de Thalas perto de Samarkanda Os árabes adquirem atecnologia papeleira com prisioneiros chineses
831 Palermo Sicília Messina ocupadas pelos rT uçulmanos900 0 papel é manufaturado no Egito pela prim 3ira vez961 AIHaquem II Biblioteca de 400000 volum s em Córdoba970 Fundação do Cairo976 Mosteiro de Ripou registra 65 obras na biblioteca
1047 Mosteiro de Ripoil indica 240 manuscritos1056 Primeira menção de um moinho papeleiro ria Península Ibérica
propriedade de Abu Masafya com 20 operários perto de Xãfva1085 Moinho de papel de trapos em Toledo trap s velhas misturados
a resíduos de linho1095 Primeira Cruzada
1151 Moinho papeleiro em Valência acionado po rodadágua1155 Rodadágua no moinho de Xativa vide 11 E 11206 Genghis Khan Mongólia1237 Documento Repartiment dei Regne de VaU nela no arquivo da
Corõa de Ara gão feito com fibras de linho dicionadas de fibrasde trapos e de cânhamo Encolado com am do de arroz ou trigoe alisado com martinete
1238 Capellades registro de três moinhos1252 Afonso X o Sábio1275 Viagens de Marco Polo pela trilhada seda Serviu ao Grão Khan
17 anos antes de sua volta
1298 Marco Polo relata sobre o uso do papel moada na China
qüéncia de eventos históricos que permite balizar a linha evolutiva da qualidade papeleira ao longo das três primeiras etapas
15 etapaAntes de Tsai Lun 1 OS dC
Com base nas escassas amostras
encontradas nas regiões mais inóspitas situadas nas áreas centrais doContinente Asiático são poucos os dados disponíveis para tirar conclusõesconfiáveis sobre a qualidade materialdos papéis usados nos séculos I e IIaC Em número muito limitado e re
colhidas em diferentes épocas e emlocalidades esparsas Bagiao JuyanFufeng as amostras apresentam umnível elevado de deterioração o quedificulta a avaliação da qualidade original Tudo parece indicar porém queas amostras encontradas em Bagiaorepresentam uma compactação maispróxima a um feltrado do que a estrutura do papel de Wai Lun As amostrasachadas em Fufeng e em Juyan podematé ser consideradas papéis em embrião precursores da inovação de WaiLun As amostras de Hantanpu aparentam um caminho tecnológíco coetâneoda inovação do grande mandarim chinêsporem que não vingou não teve a
aceitação da inovação revolucionariade Wai Lun ponto final desta etapa
2 etapaDe Wai Lun até o desmoronamento
do Império Romanol os dC 4s0 dC
A inovação de Wai Lun consistiu em desenvolver um entrelaçadode fibras vegetais formando camadasdelgadas e flexíveis que herdaram adenominação de folhas pela sua semelhança a algumas folhas vegetaisanteriormente usadas para registraros símbolos da escrita As novas fo
lhas artificialmente manufaturadas a
presentavam uma superfície mais uniforme e em ambas assuas faces o quepermitiu nelas conservar mediante representação gráfica expressões verbais do pensamento humano O më
d Papel fevereiro 1997 1 23
rito da inovação do Mandarim chinês estriba em dois aspectos do novoproduto por ele desenvolvido primeiramente as manufaturas papeleirasreaproveitaram as fibras usadas detecidos velhos de trapos ao lado defibras vegetais virgens numa ver
dadeira operação de reciclagem daqual resultava uma vantajosa reduçãode custos As folhas formadas com o
feltrado das fibras vegetais tornoumuito conveniente o seu uso como
suporte da escrita por ser muito maisleves que a alternativa das tabletesde terracotta que acolhiam a escritacuneiforme mesopotâmica ou que astabuinhas de madeira destinadas a a
colher as escritas cal ígráfiew ou os ideogramas daqueles tempos antigos
Foi nesta etapa que surgiu o uso datinta chinesa preparada com fuligem negro de fumo disperso em águajunto com cola vegetal e resina formando uma pasta que na forma debastonetes secos era usada para regenerar a dispersão aquosa original mediante a adição de água na proporçãoadequada à tonalidade desejada
351 etapaExpansão do Islão 450 dC 1300
dCA cultura islâmica se expandiu em
espaços que eram anteriormente helenizados e subseqüentemente romanizados Em direção leste seguiu rotas de Alexandre Magno que levaramos árabes até Samarkanda ponto deencontro das grandes caravanas quefaziam o comércio com a China No
sentido oeste encontrou aberto o
grande caminho mediterrâneo etendo chegado à velha Hispânia estruturou sua maior expressão no Califado de Córdova centro irradiadorda nova cultura
Fscaia de budutorsesle5cnbosnos
O encontro toledano das três reLL
ligiões monoteístas as religiões doLivro propiciando escolas e equipes
de tradutores copiando transcrevendo traduzindo transportando idéiastransmitindo conhecimentos entre
diferentes áreas idiomáticas de uma
biblioteca ligada numa mesquita paraoutra biblioteca conectada à sinagogaoutras bibliotecas abrigadas em catedrais ou mosteiros A expansão islâmica significou um trabalho de um
grande valor pela conservação e preservação de números documentos originalmente manuscritos em línguasbárbaras Como diz Rémi Bragueo que deixou de ser copiado foi condenado à morte Isto coloca o Islão
como intérprete entre Oriente e Ocidente no mundo medieval corno o tra
dutor no sentido mais amplo deste
termo cultural por excelência OOcidente europeu mostrou urna grande capacidade de incorporar ingredientes não próprios bárbaros periféricos ou procedentes de culturas anteriores de uma linha evolutiva quesedimentou em camadas discernïveis
pelascontribuições ou omissões diferenciadas e Sucessivas gerações imersas em outras culturas coetâneas As
sim a cultura islâmica irradiou seus
conhecimentos de álgebra astronomiamedicina alquímia e de navegação marítima entre outros muitos conheci
mentos práticos tais como as tecnologias papeleiras que as equipes de copistas árabes judeus e cristãos foramtranscrevendo de bibliotecas mais anti
gas para outras mais modernas Estasituação disseminada dos conhecimentos escritos permitiu salvaguardar cópiasvaliosíssimas dos documentos originaisque se perderam no incêndio da grandebiblioteca de Alexandria
à expansão do Islã exige maiorprodução e melhor qualidade
Por tentativas sucessivas foramse
aprimorando as tecnologias usadas noprocessamento das diversas fibras vegetais encontradas ao longo das ro
tas papeleiras que veicularam a expansão da cultura árabe ao longo dascostas mediterrâneas do norte de África
É neste período que aconteceramimportantes modificações nas formas manuais usadas ria manufatur
filas folhas de papel Entre elas podemocolocar em destaque a utilização drodadágua para gerar a energia necessária ao acionamento dos marte
los utilizados no batimento das fibras
Também a preparação manual doarames e fios metálicos permitindomelhorar a padronização das peneiras parte essencial das formas A melhoria nas peneiras usadas propiciouo desenvolvimento das primeiras filigranas em Fabriano centro papelei rclocalizado nos Estados Pontifícios
época Pela sua situação geográfica edependência política o volume e
qualidade dos papéis manufaturadosem Fabriano mostram claramente a
importância da manufatura de papelpara usos culturais e burocráticos nacapital da cristiandade
Características gerais das trêsetapas iniciais
Nestas três etapas iniciais as manufaturas papeleiras foram se desenvolvendo acompanhando duas trilhasestreitamente interligadas Por um ladosuas atividades foram expressões deum artesanato que demandava umpaciente aprendizado difícil e longooferecendo um amplo gradiente desituações e de escalas produtivas no qualpodem ser encontradas desde umoperário individual um clã familiar umagrupamento gremial até uma estruturaempresarial e industrial demandada pelacoordenação de vários moinhos papeleiros Por outro lado pelas características físicas e mecânicas dos papéismanufaturados podemos deduzir umasdemandas crescentes dos consumidores
para cada tipo e classe de papel comrelação a seus aspectos físicos e alimentando umas expectativas qualitativasconscientes ou subconscientes decor
rentes das suas características qualitativas ao encontro de uma continuidade histórica no atendimento das res
pectivas funcionalidades
24 0 Papel Fevereiro 1997
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