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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII
CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
ALINE DA SILVA NORONHA
A PRESCRIÇÃO DA AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DOS TRIBUTOS SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
São José Maio de 2007
A PRESCRIÇÃO DA AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DOS TRIBUTOS SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Fabiano Pires Castagna
São José Maio de 2007
Dedico este trabalho ao meu avô Ataíde Machado da Silva, por ter sonhado comigo e ter transmitido o exemplo de que cultura, conhecimento e educação ainda são as melhores apostas em nossas vidas.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar a DEUS, que me abençoou com a capacidade
necessária à realização deste trabalho.
A minha mãe, Rosmari da Silva Noronha, que apostou na minha
formação e me ensinou os valores de uma vida construída com bases sólidas,
nutrida com esforço diário.
Ao meu pai, Osório José Noronha, pelo brilho dos seus olhos ao me
analisar e ter a certeza de que valeu a pena.
Ao meu irmão, Mauro, pela admiração e carinho.
Ao Wellington, pelo amor e por toda a paciência nos momentos em que
estive nervosa com a realização deste trabalho; pela ausência sentida, em função
dos estudos.
Ao meu anjo pessoal, que tornou possível a concretização deste
sonho.
Ao meu professor orientador Fabiano Pires Castagna, que sempre
esteve solícito e atencioso, especialmente nos momentos de corrida contra o tempo.
Aos meus colegas de trabalho, pelas concessões e pela compreensão;
em especial à Joana, pelo apoio, auxílio e amizade.
Muito obrigado a todos aqueles que, de uma forma ou de outra,
contribuíram para a realização deste momento.
Obrigada!
Enquanto alguns sonham com o sucesso, nós acordamos cedo
e trabalhamos duro para alcançá-lo.
(Abílio Diniz).
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade
pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
São José (SC), Maio de 2007.
Aline da Silva Noronha
Graduanda
RESUMO
O presente trabalho trata da prescrição da Ação de Repetição de Indébito nos tributos sujeitos ao Lançamento por Homologação. Colaciona no primeiro capítulo os institutos do direito tributário e a competência para tributar. Avalia as espécies tributárias e a aplicação da legislação no âmbito do Direito Tributário Analisa no segundo capítulo a constituição do crédito tributário, bem como sua extinção. Analisa o modo como os tributos devem ser apurados e esclarecendo que o crédito dos tributos em que o contribuinte antecipa o pagamento, são extintos definitivamente com a homologação, expressa ou tácita, da Fazenda Pública. Aborda a questão da prescrição da pretensão à repetição do indébito nos tributos cujo lançamento se dá pela homologação, apresentando o entendimento do Superior Tribunal de Justiça antes da edição de Lei Complementar n°118 de 09 de fevereiro de 2005, esclarecendo a denominada “Tese dos cinco mais cinco”. A alteração incluída pelo Art. 3° da Lei Complementar 118/2005 modificou o entendimento consolidado na jurisprudência em que o prazo prescricional deveria ser contado a partir da data da homologação do lançamento, determinando que o início do prazo prescricional da ação de repetição de indébito será do pagamento antecipado pelo contribuinte. Diante da questão, aborda-se o caráter inovador, e não interpretativo, do citado art. 3° da LC 118/2005. Diante do estudo das implicações trazidas pela nova lei, concluiu-se pela impossibilidade de aplicação retroativa do art. 3° da LC 118/2005.
Palavras-chave: Prescrição. Repetição. Indébito. Tributo. Lei Complementar 118/200
SUMARIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................11
1 DIREITO TRIBUTÁRIO...........................................................................................14
1.1. Conceito de Tributo.......................................................................................... 15
1.2 Espécies de Tributo...........................................................................................17
1.2.1 Impostos...................................................................................................17
12.2 Taxas.........................................................................................................18
1.2.3 Contribuições de Melhoria ........................................................................19
1.2.4 Empréstimo Compulsório..........................................................................20
1.25 Contribuições Sociais.................................................................................21
1.3 Fontes do Direito Tributário .............................................................................22
1.4 Os princípios jurídicos da tributação: limitações constitucionais ao poder
de tributar..................................................................................................................24
1.4.1 Legalidade Tributária ................................................................................25
1.4.2 Irretroatividade da Lei Tributária ...............................................................27
1.4.3 Anterioridade ............................................................................................28
1.4.4 Capacidade Contributiva ..........................................................................29
1.5 Aplicação da legislação Tributária ...................................................................30
1.5.1 Leis Interpretativas ...................................................................................31
1.6 Obrigação Tributária..........................................................................................32
1.7 Fato Gerador.......................................................................................................33
1.8 Sujeito Ativo e Sujeito Passivo da Obrigação Tributária...............................35
2 CONSTITUIÇÃO E EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO...............................37
2.1 Constituição do Crédito Tributário ..................................................................38
2.2 Lançamento........................................................................................................40
2.3 Espécies de Lançamento..................................................................................42
2.3.1 Lançamento por declaração...................................................................42
2.3.2 Lançamento de Ofício ............................................................................43
2.3.3 Lançamento por homologação ...............................................................45
2.4 Extinção do Crédito Tributário .........................................................................48
2.4.1 Pagamento ...............................................................................................49
2.4.2 Compensação ..........................................................................................49
2.4.3 A Transação .............................................................................................50
2.4.4 Remissão..................................................................................................51
2.4.5 Decadência...............................................................................................52
2.4.6 Prescrição ................................................................................................53
2.4.7 Conversão do depósito em renda.............................................................54
2.4.8 O pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do
art. 150 e seus §§ 1° e 4°..................................................................................55
2.4.9 Consignação em pagamento ...................................................................55
2.4.10 Decisão Administrativa Irreformável .......................................................56
2.4.11 Decisão Judicial Passada em Julgado....................................................57
2.4.12 Dação em pagamento ............................................................................57
3 A PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS
SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMLOGAÇÃO............................................57
3.1 O Indébito Tributário .........................................................................................58
3.2 O Direito Constitucional à Repetição do Indébito...........................................59
3.2.1 A Ação de Repetição do Indébito .............................................................60
3.3 O Prazo Prescricional da Ação de Repetição do Indébito e a “norma
interpretativa” da Lei Complementar 118/2005 – Contexto fático-jurídico .........62
3.3.1 Posição Jurisprudencial............................................................................68
Conclusão ................................................................................................................72
Referências ..............................................................................................................73
11
INTRODUÇÃO
O objeto desta monografia é a análise do Prazo Prescricional da Ação
de Repetição de Indébito nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação.
Escolheu-se o presente tema tendo em vista a inovação trazida pela
Lei Complementar 118/2005, no que diz respeito à contagem do prazo para o
sujeitos passivo em restituir os tributos pagos indevidamente.
Procurando estruturar a sistemática da aplicação da nova lei, a
presente monografia foi dividida em três capítulos para a construção de um
raciocínio lógico e coeso com assuntos ligados ao tema.
O primeiro Capítulo aborda a conceituação do Direito Tributário e de
tributo, apresentando, segundo a posição doutrinária, as espécies tributárias, bem
como suas formas de instituição e fiscalização.
Referiu-se, ainda no primeiro capítulo, às fontes do Direito Tributário,
aos princípios constitucionais limitadores da competência tributária, à aplicação da
legislação tributária segundo a Constituição Federal, com ênfase nas leis
complementares.
Definida a obrigação tributária e as particularidades do fato gerador, a
primeira parte deste estudo encerra com os sujeitos passivo e ativo da relação
jurídica tributária.
Em um segundo momento, discorreu-se acerca da constituição e
extinção do crédito tributário. Sobre a constituição do crédito tributário, dissertou-se
em torno do lançamento como ato administrativo imprescindível para a sua
12
ocorrência, comportando a suas três modalidades: o lançamento por declaração, o
lançamento de oficio e o lançamento por homologação.
Ainda, abordou-se as diferentes formas de extinção do crédito tributário
procurando remeter às implicações que o momento exato da extinção vai afetar na
contagem do prazo prescricional da restituição do indébito tributário.
Diante da inovação trazida pelo artigo 3º da LC 118/05, o derradeiro
capítulo desta obra apresenta e analisa as posições da doutrina e jurisprudência,
ora defendendo a constituição do referido artigo, ora condenando o texto
inconstitucionalmente inovador da Lei Complementar 118 de 2005, para, ao final,
posicionar-se, de maneira fundamentada acerca da questão.
O último capítulo definiu o indébito tributário, o direito à restituição dos
tributos indevidamente recolhidos pelo sujeito passivo, os requisitos para a ação de
repetição de indébito e o prazo para a sua propositura. Nesse sentido, o artigo 165
do CTN prescreve as três hipóteses em que o sujeito passivo da obrigação tributaria
terá direito à restituição de tributo.
Em resumo, tais hipóteses configuram-se numa só, ou seja, a
incidência tributária em desconformidade com a lei: quem pagar a mais do que a
legislação determina, terá direito à restituição do montante excedente.
Por fim, estuda-se o prazo para a propositura da ação de repetição de
indébito dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Nos casos em que o
lançamento do tributo da-se pela homologação, o entendimento até então pacificado
pelo Superior Tribunal de Justiça era de que o contribuinte tinha o direito de pleitear
a restituição do prazo de cinco anos a contar da homologação pela Fazenda, que
poderia ocorrer expressa ou tacitamente, dentro do prazo de cinco anos a contar da
13
ocorrência do fato gerador, na forma disposta pelo art. 150, § 4°, do CTN, surgindo
daí a denominação “tese dos cinco mais cinco”.
No entanto, em 2005 vaio a lume a Lei Complementar 118, que trouxe,
em seu artigo 3º, autodenominado interpretativo, a determinação de que a extinção
do crédito tributário nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação,
ocorre no momento do pagamento antecipado de que trata o parágrafo primeiro do
art. 150, do Código Tributário Nacional, reduzindo sensivelmente o prazo de dez
para cinco anos.
Por fim, quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na fase de
investigação foi utilizado o Método Indutivo1. Nas diversas fases da Pesquisa, foram
acionadas as técnicas de pesquisa, a documentação indireta, baseada na análise da
doutrina, legislação e jurisprudência.
1 O método indutivo pesquisa e identifica as partes de um fenômeno e coleciona-os de modo a ter uma percepção ou conclusão geral. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 3 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2000. p. 199.
14
1 DIREITO TRIBUTÁRIO
O Direito Tributário cuida das relações jurídicas envolvendo tributos.
abordando desde os princípios fundamentais até as normas que têm por finalidade
determinar a criação dos tributos, sua forma de fiscalização e modelo de
arrecadação, bem como oferece limitações ao poder de tributar. Contempla os
preceitos constitucionais que delimitam a competência para tributar e as leis que vão
definir o fato gerador do tributo. Considera as obrigações formais dos contribuintes,
bem como os deveres da administração tributária.
Eis a lição de Sacha Calmon Navarro Coelho, sobre Direito Tributário:
“O Direito Tributário cuida especificamente das receitas derivadas do patrimônio particular transferidas para o tesouro público mediante” obrigações tributárias “previstas em lei. A ênfase do Direito Tributário centra-se na relação jurídica e não na atividade estatal de obtenção de receitas. Não é Direito do Estado, é relação jurídica entre sujeitos de direito sob os auspícios da legalidade e da igualdade”.(COÊLHO, 2005, P. 34).
O Estado, através da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, é responsável pela execução de diversas atividades, como, por exemplo:
a segurança pública, a seguridade social, a educação, o meio ambiente, entre tantas
outras.
É competente, também, para participar da ordem econômica, das políticas
urbanas, agrícolas e fundiárias, bem como para operarem em esferas dedicadas à
atividade privada.
Tais situações despendem o emprego de pessoal (funcionários), a aquisição
de bens necessários à realização das prestezas, igualmente, à concretização de
investimentos. Tudo isso envolve e demanda a obtenção de verba, para compor a
receita, que vai atender às despesas geradas por toda essa gama de atividades.
15
Essa verba auferida pelo Estado, traduzida em valor pecuniário, é resultado da
incidência de tributos sobre o patrimônio privado, o que deixa claro a finalidade do
Direito Tributário, qual seja, constituir receita aos cofres públicos. (MELO, 2007,
p.12-13).
Essa arrecadação, proveniente do pagamento de tributos, deriva do poder
de tributar. Importante salientar, nesse ponto, que tal poder é limitado, e quem define
os limites da tributação é a Constituição Federal, através de seus princípios. É um
modo de autorizar determinado ente, a produzir normas jurídicas de caráter
tributário, sendo que essa norma nova deve ir ao encontro dos princípios
constitucionais tributários, interagindo com as regras de definição de competência.
(MARTUSCELLI, 2001, p. 100).
1.1 Conceito de tributo
Interpretando o conceito de tributo, segundo o que dispõe a lei, tem-se que
é toda prestação pecuniária, com arrecadação controlada pelo Estado, a fim de
atender às despesas públicas.
Em outros termos, trata-se de relação jurídica, cuja imposição é regrada por
legislação própria e previamente definida. Visa organizar a contribuição dos
indivíduos, ora denominados contribuintes, para o custeio das despesas coletivas do
Estado.
Nesse sentido, o artigo 3º do Código Tributário Nacional define o tributo
como sendo: “[...] toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor
16
nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. (CTN, art. 3º).
Versando a respeito do conceito de tributo, Sacha Calmon Navarro Coêlho
entende que a sua legitimidade dá-se no momento em que este se diferencia das
prestações pecuniárias, porque possui uma hipótese de fato relacionada a um
determinado preceito.
Distingue-se da multa, porque não decorre de um fato ilícito. Finaliza seu
pensamento, com uma argumentação de exclusão, concluindo que tudo o que o
Estado receber de dinheiro, excluídas as entradas de caixa (fianças, cauções) e as
apropriações e que não tenha caráter indenizatório, não seja multa, nem contrato,
obviamente será tributo. (COÊLHO, 2005, p 455 - 456).
A relação tributária possui, necessariamente, um sujeito ativo, um sujeito
passivo e uma prestação de caráter patrimonial. Sendo a obrigação de dar/fazer
coisa certa, no caso da obrigação tributária, a coisa certa é dinheiro.
Fernando José Dutra Martuscelli, sobre tributo e sua relação obrigacional,
leciona:
Para que a relação obrigacional seja de natureza tributária, basta que decorra do enquadramento de um conceito de conduta à previsão conceitual abstrata da hipótese de incidência de uma regra-matriz de incidência tributária, em cujo antecedente, como já se viu, deve existir um critério material, e no conseqüente, um critério quantitativo – importa dizer – base de cálculo, típicos de uma das figuras tributárias constitucionalmente previstas. (MARTUSCELLI, 2001, p. 59).
Sendo assim, o tributo é o meio pelo qual a Administração Pública
arrecada fundos para o Erário, nos âmbitos federal, estadual e municipal. Tal
receita visa atender às despesas públicas, justificando o caráter compulsório dos
tributos. Fato pelo qual é definido em lei, no que diz respeito, principalmente, à
sua instituição, modo de prestação e caracterização do contribuinte.
17
1.2 Espécies de tributos
Luciano Amaro dispõe de maneira completa sobre as espécies tributárias
arroladas pela Constituição Federal: os impostos, as taxas, as contribuições de
melhoria, os pedágios, os empréstimos compulsórios, as contribuições sociais, as
contribuições de intervenção no domínio econômico, as contribuições de interesse
das categorias profissionais e econômicas, as contribuições para custeio do regime
previdenciário e as contribuições para o custeio do serviço de iluminação pública.
(AMARO, 2006, p. 28) Abaixo se passa a discorrer, brevemente, sobre as principais
espécies tributárias.
1.2.1 Impostos
De acordo com a definição do artigo 16 do CTN imposto “é o tributo cuja
obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade
estatal específica, relativa ao contribuinte”.
Sendo assim, o fato gerador do imposto não tem conexão direta com uma
atividade específica do Estado, não há necessidade de contraprestação
determinada.
Aliomar Baleeiro, ao interpretar esse conceito, analisa o caráter coletivo do
imposto, onde uma pessoa jurídica de Direito Público, por lei, exige coativamente
dos sujeitos com capacidade contributiva, prestação em dinheiro, sem assegurar
benefício específico. (BALEEIRO, 2005, p.197)
Sobre essa ausência de atividade específica, característica do imposto,
José Eduardo Soares de Melo diz:
18
O fato imponível não se refere a comportamento das pessoas jurídicas de direito Público interno; ao contrário, prende-se a um fato, ato, situação inerente a um particular, indicador de sua capacidade contributiva (art. 145, §1º, da Constituição). O Estado não oferece nenhuma utilidade, comodidade ou serviço fruível diretamente, não havendo nenhuma vinculação entre o pressuposto de fato previsto na norma instituidora do imposto e a atuação estatal. (MELO, 2007, p. 62-63).
Para que nasça a obrigação de pagar um imposto, há que anteriormente ter
ocorrido uma situação que configure o critério material de incidência, que no caso
dos impostos é a capacidade contributiva, levando em conta as condições
econômicas e patrimoniais do contribuinte. (MARTUSCELLI, 2001, p. 70).
No caso dos impostos, a contraprestação é implícita: o contribuinte recolhe
o imposto sem saber ao certo qual será a aplicação do dinheiro. Há um fato ou
situação que gerou a incidência do referido tributo, não importando a destinação da
contribuição.
Denota-se que o Estado irá aplicar o fundo das contribuições ao seu critério,
de acordo com as necessidades que julgar imediatas, não havendo, porém, como
particularizar essa relação de imposto – contraprestação.
1.2.2 Taxas
Ao contrário dos impostos, no caso das taxas, o fato gerador tem
contraprestação estatal específica, podendo referir-se ao exercício regular do poder
de polícia ou na prestação ao contribuinte de serviço público específico e divisível2.
2 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: (...) II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. (CF/88, art. 145, inciso II)
19
Em outras palavras, o Estado oferece determinada prestação e cobra de
quem dela aproveita, um taxa correspondente, previamente definida.
Sacha Calmon Navarro Coelho realiza boa explanação sobre o conceito e a
aplicação das taxas:
Os serviços específicos e divisíveis, quais sejam, os mensuráveis e atribuíveis a dado sujeito passivo, podem decorrer do poder de polícia ou não, mas o fato jurígeno nas taxas é sempre serviço público prestado ou posto à disposição do contribuinte. Serviço público, baseado no poder de polícia ou fundada em atividade outra do estado (fornecimento de esgoto sanitária ou de água), só pode dar origem à cobrança de uma taxa se puder ser traduzido em unidades de medida (ainda que a forfait) e atribuído ao sujeito passivo. (COÊLHO, 2005, p. 644).
Outra particularidade das taxas, pelo que se expôs, é o fato de deverem as
contraprestações, correspondentes ao pagamento da taxa, ser possíveis de
quantificar, de medir.
A título exemplificativo, o contribuinte “A”, que utilizou “X” de determinado
serviço, vai pagar o valor “Y” de taxa. Enquanto que o contribuinte “B”, que usou
“X+1” do mesmo serviço, vai contribuir com um valor “Y+1” de taxa,
exemplificativamente.
1.2.3 Contribuição de Melhoria
As contribuições de melhoria decorrem de obras públicas e, assim como as
taxas, têm atuação estatal específica e determinada. A realização de uma obra
pública decorre, para os proprietários dos imóveis adjacentes, uma valorização de
suas propriedades.
Segundo Luciano Amaro: “A contribuição de melhoria liga-se a uma atuação
estatal que por reflexo se relaciona com o indivíduo (valorização de sua
propriedade)”. (AMARO, 2006, p. 48).
20
Coêlho completa referido ensinamento, assinalando que a valorização é
equiparada à vantagem obtida pelo particular, sendo que a contribuição de melhoria
é cobrada para abonar o custo da obra. (COÊLHO, 2005, p. 648).
A previsão da contribuição de melhoria está prevista na Constituição
Federal, no art. 145, III, prevê que a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios podem instituir contribuições de melhoria, decorrentes de obra pública3.
É o caso de tributo vinculado, ou seja, decorrente de atividade estatal
especifica relativa ao contribuinte, que neste caso ocorre com a valorização de bem
privado em função da realização de obra pública.
1.2.4 Empréstimos compulsórios
É um tipo de empréstimo, em favor do Estado, de caráter obrigatório e
instituído por lei complementar. Sua previsão encontra-se no artigo 1484 da
Constituição Federal. Os proventos arrecadados devem atender às despesas, ou
investimentos, que fundamentam a instituição do empréstimo.
3 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(...) III – contribuições de melhoria, decorrente de obras publicas.
3 Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I – para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade, de guerra externa ou sua iminência; II – no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, IIO, b. Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. (CF/88, art. 148) 4 Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I – para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade, de guerra externa ou sua iminência; II – no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, IIO, b. Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. (CF/88, art. 148)
21
Sobre o fato gerador dos empréstimos compulsórios Luciano Amaro escreve
o seguinte:
A constituição não indica quais os possíveis fatos geradores dos empréstimos compulsórios. É evidente que o fato gerador do empréstimo compulsório não é a guerra nem a calamidade nem o investimento público, embora ele só possa ser instituído à vista dessas situações. A calamidade, a guerra e o investimento, nas circunstâncias previstas, condicionam o exercício da competência tributária (isto é, só se pode instituir o empréstimo se presente uma das situações referidas) e direcionam a aplicação do produto da arrecadação (vale dizer, absorvem necessariamente os recursos arrecadados). Portanto, a União tem competência para instituir o empréstimo compulsório, atrelado ou não a uma atividade estatal dirigida ao contribuinte, mas só pode exercitar essa competência se presente um dos motivos previstos. À lei (complementar) que instituir o empréstimo compulsório caberá definir-lhe o fato gerador. (AMARO, 2006, p. 51).
Analisando o artigo que define o empréstimo compulsório, junto ao
comentário do tributarista acima, não se vislumbra atrelamento do fato gerador do
empréstimo compulsório com um serviço estatal específico em benefício do
contribuinte. Como a própria nomenclatura presume, tratar-se de empréstimo:
haverá restituição por parte da Fazenda Pública.
1.2.5 Contribuições Sociais
Elencadas no art. 149 da Constituição Federal, as contribuições sociais são
instituídas pela União, visando o atendimento social, econômico e às categorias
profissionais5.
5 Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto o art. 195, §6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. Parágrafo único. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social. (CF/88, art. 149)
22
Por encontrarem-se apresentadas no Título da Constituição que trata “Da
ordem Social”, devem atender os objetivos do bem-estar e da justiça social, bem
como o primado do trabalho.
A seguridade social, exemplificativamente, é financiada por contribuições
sociais, caso do Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS. (AMARO, 2006, p.
52).
Dissertando sobre as contribuições sociais, José Eduardo Soares de Melo
explica que sua característica básica “consiste na sua vinculação a fundos,
entidades, categorias profissionais, beneficiando indiretamente a terceiros, que não
os seus contribuintes”.(MELO, 2007, p. 87).
1.3 Fontes do Direito Tributário
A principal fonte do direito tributário é a Constituição Federal, conjuntamente
com as emendas constitucionais, pois é ali que se encontra a estrutura básica da
sistemática tributária.
Equivalentes às emendas a Constituição estão os tratados e as convenções
internacionais. (MELO, 2007, p. 175-176).
Inseridas no Sistema Tributário Nacional, estão as normas
infraconstitucionais, tais como as leis complementares, que possuem o intento de
delimitar o poder do legislador no âmbito tributário, complementando, ou suprindo, o
que a constituição não esgotou, quanto à competência, por exemplo.
É a lição de Luciano Amaro:
23
Em suma, o exercício legítimo da competência para a criação de tributos é balizado não só por normas de estatura constitucional, mas também por disposições outras, de menor hierarquia, e, portanto, de menor rigidez, que atuam no sentido de complementar o desenho do campo material onde poderá ser exercida validamente a competência tributária e de definir o modo pelo qual se deve dar esse exercício. (AMARO, 2006, p. 109).
Dentre as normas infraconstitucionais que balizam a Ordem Tributária,
interessa, especialmente, as leis complementares, tema central deste trabalho. Com
o fim específico, no âmbito tributário, de editar normas gerais, seu caráter está
disciplinado no art. 146 da Constituição Federal de 19886.
Como o próprio nome já demonstra, as leis complementares têm o encargo
de complementação das normas constitucionais. Disciplinadas no artigo 59 da
Constituição Federal de 1988, requerem um quorum de aprovação de maioria
absoluta, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal7.
O jurista Aliomar Baleeiro defende que as leis complementares não podem
ir além do que já foi determinado na Constituição, sob pena de violação do
mandamento constitucional. Não podem corrigir, nem inovar, sob pena de argüição
de inconstitucionalidade da lei complementar. (BALEEIRO, 2005, p. 48).
Especificamente em matéria tributária, segundo a Constituição Federal,
poderão dispor sobre conflitos de competência, estabelecer normas gerais de direito
tributário, regular limitações ao poder de tributar e fazer atuar certos ditames
constitucionais, conforme a cláusulas do já citado artigo 146 da Constituição Federal.
6 Art. 146. Cabe á lei complementar: I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários. adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. (CF/88, art. 146)
24
No dizer de Sacha Calmon Navarro Coelho, a Constituição vai, conforme a
ocorrência, determinando a utilização da lei complementar. Em outras palavras, o
emprego da lei complementar é aquele previamente estabelecido pelo constituinte,
para fins de complementar dispositivos constitucionais de eficácia limitada e conter
dispositivos constitucionais de eficácia contida. (COÊLHO, 2005, p. 102, 105).
As leis ordinárias também são fontes do direito tributário, bem como as
medidas provisórias, as leis delegadas, as resoluções, os decretos legislativos, os
tratados internacionais, os convênios, os regulamentos e os atos administrativos. (
MELO, 2007, p. 181-190).
1.4 Os princípios jurídicos da tributação: limitações constitucionais ao poder
de tributar.
Os princípios, cujo objetivo é direcionar a ordem jurídica, indo ao encontro
dos desejos maiores da nossa Constituição Federal, serão expressos ou implícitos, e
tanto num caso, como no outro, utilizados na interpretação do caso concreto, tendo
aplicação imediata por definirem os direitos e as garantias fundamentais.
Discorrendo sobre princípios, Fernando José Dutra Martuscelli, encontra
nos princípios a orientação hermenêutica e a função paradigma para a elaboração
das normas jurídicas, sendo norma de estrutura e, ao mesmo tempo, norma de
conduta. Dessa forma, “os princípios acabam por funcionar como um limite de
contenção”. (MARTUSCELLI, 2001, p. 105).
7 Art. 69. As leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta. (CF/88, art. 69), ou seja, 50% mais um de todos os membros de cada uma das casas do Congresso Nacional.
25
Sobre o mesmo assunto, excelente a lição de Sacha Calmon Navarro
Coelho, sobre a função de zelo dos princípios constitucionais quanto à
constitucionalidade das leis, no âmbito tributário:
Vale dizer que todo o Direito Tributário brasileiro é controlável pelo Supremo Tribunal Federal a partir dos princípios constitucionais tributários. Nenhuma corte constitucional tem, em todo orbe, tamanho rol de princípios para moldar o poder de tributar e proteger os direitos e garantias do contribuinte. (COÊLHO, 2005, p. 200).
Os autores e a própria Constituição Federal definem os princípios, implícitos
e explícitos, que decorrem da atuação limitada do Estado quanto ao seu poder de
tributar. Dentre tais máximas, destacar-se-á, a seguir, os princípios que, em maior ou
menor grau, contribuirão para a análise do tema central deste trabalho.
1.4.1 Legalidade Tributária
O princípio da legalidade tributária, segundo Roberto Barcelos de
Magalhães, informa que os tributos só podem ser instituídos ou majorados,
reduzidos ou extintos, por ordem preceituada em lei tributária. Ou seja, os limites da
competência para tributar estarão explícitos na lei correspondente. (MAGALHÃES,
1991, p. 02).
Martuscelli diz que tal legalidade é qualificada por pressupostos de
legitimidade e boa-fé, não bastando para o ordenamento jurídico a simples
existência de lei que valide uma regra de imposição tributária, mas que esta lei
esteja de acordo com a Constituição Federal e com as regras e princípios por ela
abrangidos, de maneira a validar o regime jurídico tributário, desenhando o sistema
tributário nacional. (MASTRUSCELLI, 2001, p.107).
26
O tributarista Luciano Amaro, analisando o art. 114 do Código Tributário
Nacional, que define o fato gerador da obrigação principal, evidencia a recepção do
princípio da legalidade, pois o nascimento da obrigação tributária já estará previsto,
dentro da lei. Esclarece:
O conceito de fato gerador (CTN, art. 114) não deixa dúvida quanto ao que se expôs. É que, para ser possível a concreção do dever tributário com a só ocorrência do fato gerador, há de estar já na própria norma legal a completa descrição dos fatos á vista de cuja realização ter-se-á, como decorrência necessária, o nascimento da obrigação tributária, no montante apurável segundo os critérios de medida definidos em lei.
O nascimento da obrigação tributária não depende da vontade da autoridade fiscal, nem do desejo do administrador que tivesse a veleidade de ditar o que deve ser tributado, ou em que medida ou circunstância o tributo deve ser recolhido.
Isso leva a uma outra expressão da legalidade dos tributos, que é o princípio da tipicidade tributária, dirigido ao legislador e ao aplicador da lei. Deve o legislador, ao formular a lei, definir, de modo taxativo (numerus clausus) e completo, as situações (tipos) tributáveis, cuja ocorrência será necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, bem como os critérios da quantificação (medida) do tributo. Por outro lado, ao aplicador da lei veda-se a interpretação extensiva e a analogia, incompatíveis com a taxatividade e determinação dos tipos tributários. (AMARO, 2006, p. 112).
O princípio da legalidade tributária está delineado no artigo 150, inciso I, da
Constituição Federal, apontando a necessidade de que todo o tributo que se assenta
no mundo jurídico deve emanar de uma lei, ou de norma com força de lei8. Levando-
se em conta que todas as leis estão submetidas ao crivo constitucional.
(CARVALHO, 2004, p.27).
A legalidade tributária é tratada também no artigo 97, inciso I, do Código
Tributário Nacional, que limita o poder de tributar dos entes políticos titulares da
competência para instituição de tributos, ao mesmo tempo em que assegura a
8 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. (CF/88, art. 150, I).
27
garantia da legalidade aos sujeitos passivos9. Ora, esse princípio decide que a lei
oriunda do Poder Legislativo seja a única fonte formal para a criação e aumento dos
tributos. (GRANDA, 2002, p. 4-5).
1.4.2 Irretroatividade da Lei Tributária
Previsto no artigo 5º, inciso XXXVI10, da Constituição, está o princípio da
irretroatividade da lei, determina que a lei não pode atingir o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada. Tal princípio decorre da necessidade de assegurar
a certeza dos atos pretéritos em face da lei.
Tal princípio é explícito, pois a própria constituição Federal estabelece, no
art. 150, III, alínea “a”, “b” e “c”, a limitação ao poder de tributar em relação a fatos
geradores pretéritos em relação à vigência da nova lei, devendo alcançar os atos
administrativos e judiciais. No caso dos atos jurídicos, abrangem-se aqui os de
caráter legislativo, administrativo e judicial, devendo todos respeitar determinado
juízo temporal, assim é a doutrina de Fernando José Dutra Martuscelli.
(MARTUSCELLI, 2001, p. 140).
No âmbito tributário, a irretroatividade recebe contornos ainda mais
relevantes, conferidos pelas alíneas “b” e “c” do inciso II do artigo 150 da
Constituição Federal.
9 Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I – a instituição de tributos, ou a sua extinção. (CTN, art. 97, I). 10 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
...continua
28
De acordo com os argumentos desta pesquisa, adiante elucidados, vem ao
encontro, ainda que analogicamente, o pensamento do autor Luciano Amaro:
Nem a pretexto de interpretar lei anterior pode uma lei tributária voltar-se para o passado, com o objetivo de “explicitar” a criação ou amento de tributo. Ou a incidência já decorre da lei velha, ou não; no primeiro caso, a lei “interpretativa” é inócua; no segundo, é inconstitucional. (AMARO, 2006, p. 119).
Conexo com o tema central do presente trabalho, ao analisar a
irretroatividade das decisões judiciais, o tributarista Aliomar Baleeiro faz importantes
considerações, quanto ao enunciado do art. 5º, XXXVI da Constituição Federal: “A
lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Sendo assim, conforme o pensamento do referido autor, a norma constitucional
supracitada, impede que novos enunciados, ou seja, novas leis apliquem-se
retroativamente, aos atos jurídicos pretéritos, como a coisa julgada. (BALEEIRO,
2005, p. 653).
1.4.3 Anterioridade
A Constituição Federal não permite a exigência do pagamento de tributo no
mesmo exercício financeiro em que foi publicada a lei que o instituiu, ou ainda, que o
aumentou. (CASSONE, 2000, p.111).
O princípio da anterioridade garante aos contribuintes uma certeza do que
vai ser arrecadado aos cofres públicos, possibilitando que o devedor do tributo
possa planejar suas despesas. Atendendo a esse princípio, a lei tributária não irá
retroagir em prejuízo do contribuinte, nem contemplar o fato gerador que já se
iniciou. Apenas os fatos futuros é que vão atender á lei. As disposições do princípio
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. (CF/88, art.
...continua
29
da anterioridade visam à segurança jurídica daquele que tem a obrigação de pagar o
tributo, evitando surpresas. (MELO, 2007, p. 23).
Sobre o início da vigência da lei que institui ou majorou um determinado
tributo, anota Fernando José Dutra Martuscelli:
[...] por força constitucional, tem-se que o termo inicial da vigência da lei nova deve ser o primeiro dia do exercício financeiro posterior à sua publicação. Ou seja, até este termo, por força constitucional, a lei nova não pode ter vigência. Após este, poderá o ter. [...] Só com o advento de novo exercício financeiro, subseqüente à publicação e com o transcurso de eventual vacatio legis é que, no ordenamento brasileiro, se pode considerar vigente a lei. Será neste exato instante que a lei nova passará a ter vigência e eventual lei revogada deixará de o ter. (MARTUSCELLI, 2001, p. 135).
O exercício financeiro, a que se refere o doutrinador acima, tem início no dia
1º de janeiro e termina no dia 31 de dezembro de cada ano, sendo assim, uma lei
nova fica com sua eficácia pendente até o início do próximo ano fiscal (1º de
janeiro), quando passará a ter eficácia efetiva. (CARAZZA, 1998, p. 131 – 132).
1.4.4 Capacidade Contributiva
Previsto no art. 14511, §1º da Constituição de 1988, o princípio da
capacidade contributiva consiste na particularidade de que os impostos são
graduados levando-se em conta a capacidade econômica do contribuinte. Essa
condição de contribuir deve ser apurada em face do montante da tributação que
incide sobre determinado fato, ato ou situação jurídica estimável de maneira
econômica. (CASSONE, 2000, p. 102).
5, XXXVI) 11 Art. 145. (...) §1º. Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade contributiva do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (CF/88, art. 145, §1º).
30
Sobre a finalidade do princípio da capacidade contributiva, transcrevemos a
idéia de Kiyoshi Harada:
O princípio tem por escopo o atingimento da justiça fiscal, repartindo os encargos do Estado na proporção das possibilidades de cada contribuinte. Note-se que o texto refere-se corretamente à capacidade econômica do contribuinte, que corresponde à capacidade contributiva. (HARADA, 2002, p. 343).
Considerando que a obrigação tributária interfere no patrimônio dos
contribuintes, seria injusto que a importância valorativa do tributo seja superior a
disponibilidade econômica e ao patrimônio do devedor, visto que todo o tipo de
contribuinte está amparado constitucionalmente às garantias de sobrevivência.
(MELO, 2007, p.32).
Os princípios da legalidade, da irretroatividade das leis tributárias e da
anterioridade e da capacidade contributiva vão condicionando o sistema tributário
nacional para que, de fato, seja inteiramente coerente com os ditames da
Constituição Federal. Interligados, e devidamente aplicados, concretizaram a
segurança jurídica que os contribuintes fazem jus.
1.5 Aplicação da Legislação Tributária
No entender de Luciano Amaro, a lei tributária não se aplica, imediatamente,
a fatos futuros. Os fatos ocorrem primeiro, a lei se aplica depois, com exceção
daquelas leis que vão criar ou majorar tributos. (AMARO, 2006, p. 195).
Sobre o assunto, no que tange aos fatos geradores pendentes, Aliomar
Baleeiro diz que, vigente a lei nova, alcançará esta o fato gerador pendente, aquele
que se iniciou, mas não consumou; pela inexistência das circunstâncias necessárias
para que materialmente produza seus efeitos. (BALEEIRO, 2005, p. 663).
31
1.5.1 Leis Interpretativas
As leis interpretativas têm a função de esclarecer a acepção de uma lei
anterior. Segundo o artigo 106, inciso I, do Código Tributário Nacional, essas leis,
ditas interpretativas, podem retroagir a fatos passados, somente nesses casos:
interpretação autêntica e jamais inovação, mudança.
Aliomar Baleeiro muito bem define o emprego das leis ditas interpretativas:
“(...) a interpretação autêntica há de ser limitada à sua função específica: esclarecer
e suprir o que foi legislado, sem a irrogar-se a ius novum, mais oneroso para o
cidadão”. (BALEEIRO, 2005, p. 670).
Interpretando o sentido das leis interpretativas, é o ensinamento de Luciano
Amaro:
[...] A lei nova, tal qual o parecer do jurista, ou a sentença do juiz, voltaria no tempo para dizer, em relação ao fato passado, qual o direito aplicável (ou como aplicar o direito da época), inclusive para dispor, por exemplo, que o fato de “a” se deva entender compreendido na regra de tributação da lei “X”, estando, pois, a ocorrência concreta desse fato, desde a vigência dessa lei, sujeita ao tributo por ela criado.
A doutrina tem-se dedicado à tarefa impossível de conciliar à retroação da lei interpretativa com o princípio constitucional da irretroatividade, afirmando que a lei interpretativa deve limitar-se a “esclarecer” o conteúdo da lei interpretada, sem criar obrigações novas, pois isso seria inconstitucional. (AMARO, 2006, p. 201).
32
Esta monografia vem, justamente, colocar à prova o caráter interpretativo de
uma determinada lei complementar, qual seja a Lei Complementar nº 118/2005; que
veio idealizada com função interpretativa.
Porém, quando de sua aplicação, inovou entendimento já consagrado na
doutrina e na jurisprudência. Adiante, no momento oportuno, esse raciocínio será
aprofundado.
1.6 Obrigação Tributária
Obrigação tributária é a relação jurídica que envolve prestação do devedor
em favor do credor, onde o objeto será sempre uma obrigação relacionada a
determinado tributo.
Sendo o Direito Tributário ramo do Direito Público, a obrigação tributária,
obviamente, tem caráter público, e por isso mesmo, é indisponível pela
Administração Pública. O Fisco não pode dispor livremente sobre a obrigação, pois a
prestação se dá em favor do Estado.
O Código Tributário Nacional divide as obrigações em principais e
acessórias, sendo que as principais dão-se pela ocorrência do fato gerador e as
acessórias decorrem da legislação tributária12.
Para alguns tributaristas, como Sacha Calmon Navarro Coelho, as
obrigações de pagar tributo são heterônomas, pois, toda vez que ocorrer o fato
gerador, este já estará previsto em lei. Já as obrigações acessórias, não passam de
12 Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. (CTN, Art. 113)
33
condutas positivas ou negativas que os contribuintes devem obedecer, por
decorrerem de lei. (COÊLHO, 2005, p. 696).
Toda obrigação tributária requer o acontecimento de um fato gerador,
previamente definido pela legislação, para que passe a existir o dever da prestação
jurídica de um sujeito em favor de outro13.
É o que ensina Luciano Amaro quando diz que “nessas situações, o
nascimento do dever de alguém cumprir tal obrigação instrumental surgirá,
concretamente, quando ocorrer o respectivo fato gerador”.
1.7 Fato Gerador
O fato gerador é a situação, anteriormente definida, que gera a obrigação
tributária, ou seja, circunstância fática em que alguém estará obrigado a pagar
determinado tributo. Essa obrigação dá-se em função da situação econômica do
contribuinte, e pode ser definida como principal ou acessória. Luciano Amaro muito
bem define os dois tipos de obrigação:
[...] a) principais, compreendendo os deveres legais que tenham por objeto o pagamento do tributo (prestação pecuniária de natureza não sancionatória) e o pagamento de penalidade pecuniária (que, como se sabe, é sanção e não tributo); e b) acessórias, que abrangem os demais deveres estabelecidos nas leis tributárias, que não tenham conteúdo pecuniário. (AMARO. 2006, p. 256).
13 Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal. (CTN, arts. 114 e 115)
34
Quanto ao momento da ocorrência do fato gerador, tratando-se de situação
fática, ocorre na ocasião em que possa produzir seus efeitos, ou seja, uma situação
material propriamente dita.
No caso de uma situação jurídica, da mesma forma, quando a situação
jurídica estiver materializada, conforme a previsão legal. Para melhor elucidar, eis o
diagnóstico de Sacha Calmon Navarro Coelho:
Acontecido o fato previsto na hipótese legal (hipótese de incidência), o mandamento que era abstrato, virtual, torna-se atuante e incidente. Demiúrgico, ao incidir produz efeitos no mundo real, instaurando relações jurídicas (direitos e deveres). A incidência, em direito Tributário, é para imputar a determinadas pessoas o dever de pagar somas de dinheiro ao Estado, a título de tributo. Esse, precisamente, é o comportamento desejado pela ordem jurídica. (COÊLHO, 2005, p.465).
Ora, tem-se então que a mera descrição dos pressupostos elencados pela
lei não é suficiente para que aconteça juridicamente a obrigação tributária,
necessita-se que seja por alguém praticada a situação descrita na legislação, num
determinado momento, “submetida a uma base de cálculo e alíquota se se trata de
tributo avaliável ou apenas de um quantum se o tributo é fixo”. (NOGUEIRA, 1999, p.
142).
O fato gerador do tributo, portanto, é a materialidade que vai surtir em
obrigação, envolvendo um sujeito ativo, credor da obrigação tributária, e um sujeito
passivo, devedor da mesma obrigação. A base de cálculo, qua vai quantificar o fato
gerador, é definida em lei. Quando se tratar de tributo fixo, ou seja, que não
necessita de cálculo, ainda assim, a quantificação estará prevista em lei. O fato
gerador ocorre no tempo e no espaço, e tais aspectos tem importância quanto à
aplicação da lei no caso concreto, assim como quanto à existência de prazos para o
cumprimento de determinadas obrigações.
35
1.8 Sujeito Ativo e Sujeito Passivo da Obrigação Tributária
A obrigação tributária compreende, genericamente, um sujeito ativo, um
sujeito passivo e uma prestação tributária.
Quanto ao sujeito ativo, segundo o Código Tributário Nacional, em seu
artigo 119, temos que é aquela pessoa jurídica de direito público, titular da
competência para exigir o cumprimento da obrigação tributária14. Importante que não
se confunda a competência para instituir tributo com a capacidade de arrecadar e
fiscalizar. (MELO, 2007, p. 239).
Sobre a questão da titularidade para exigir o pagamento de tributos é a
Lição de Marco Aurélio Greco:
Cotejando a previsão contida no art. 119 do CTN, com a visão exposta por significante parte da doutrina tributária brasileira, ou mesmo com a posição kelseniana, nota-se que não se deu ao vocábulo “competência” nenhum dos sentidos indicados. Não houve acolhida da colocação doutrinária corrente, pois quem tem o poder de exigir o cumprimento da obrigação tributária, nem sempre pode legislar a propósito. Vejam-se os casos de parafiscalidade mencionados pela doutrina e aqui já acenados. Ademais, se tal “competência” é para exigir o cumprimento da obrigação tributária, isto é porque ela já surgiu pela ocorrência do fato imponível. Ora, para que certo evento possa ser considerado fato imponível, é mister que tenha sido previsto em lei que lhe seja anterior. Assim, não nos parece ter sido acolhida a colocação corrente. (GRECO, 2002, p 187)
O Código Tributário Nacional, no comando do artigo 119, define o sujeito
ativo da obrigação como pessoa jurídica de direito público. Assim prescrevendo,
suprime um numero significativo de possíveis sujeitos ativos, tendo em vista a
existência de “mandamentos constitucionais que permitem às pessoas titulares de
competência tributária a transferência da capacidade ativa, nomeando outro ente,
público ou privado”. (CARVALHO, 1998, p. 212-213).
14 Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento. (CTN, art. 119).
36
O sujeito passivo, dito contribuinte, é o devedor do tributo, que vai ser
caracterizado por lei. A lei vai ligar uma pessoa física ou jurídica ao fato gerador
previsto em norma prévia, ou seja, via de regra, o sujeito passivo é quem vai praticar
o fato imponível, que, consequentemente, vai surtir na obrigação de recolher ao
erário público uma grandeza econômica classificada como tributo. (MELO, 2007, p.
239-240).
Sobre a variante de o sujeito passivo não ser o contribuinte, esclarece Celso
Ribeiro Bastos:
Com efeito, em muitas hipóteses não há conveniência do fisco em fazer coincidir na própria pessoa que realiza o fato gerador a condição de sujeito passivo, embora , é forçoso que se diga, seja esta a situação mais comum. Se o fato gerador é importar mercadoria, o sujeito passivo será aquele que leva a feito esta operação. Isso, entretanto, não elide a hipótese em que o fato gerador é realizado em condições de arrecadação muito penosa para a Administração, se estivesse ela adstrita a cobrar de alguma das pessoas envolvidas. É em função dessa circunstância que o Código Tributário Nacional deixa as portas abertas para que a lei determine outro responsável, isto é, escolha alguém que jamais seria o contribuinte se aplicado o critério anterior, o que significa dizer uma pessoa alheia à ocorrência tributária, mas que estará, para todos os efeitos, sujeita ao pagamento do débito, da mesma maneira que estaria se fosse o contribuinte propriamente dito. (BASTOS, 1994, p. 197).
Existe, desse modo, a figura de um substituto legal tributário, que a lei
define como sujeito passivo de uma determinada relação tributária, sendo uma
pessoa qualquer que não tem a capacidade contributiva ligada ao fato tributável
imponível. (MACHADO, 2005, p. 152).
Analisados os institutos básicos do direito tributário, a relevância dos
princípios constitucionais quanto ás limitações do poder de tributar, bem como a
relação da obrigação tributária com o fato gerador dos tributos, passa-se, no próximo
capítulo, ao estudo da constituição e extinção do crédito tributário.
37
2 CONSTITUIÇÃO E EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
Para compreender o caminho traçado da constituição do crédito tributário
até a sua extinção, pela via do lançamento, há que se procurar entender a essência
de seu conceito.
Quando o fato gerador acontece no mundo jurídico, cria-se um vínculo entre
o credor e o devedor, onde o objeto é uma prestação pecuniária obrigatória.
(MELLO, 2007, p.293).
Diante dessa situação cria-se para o contribuinte ou responsável o dever de
entregar determinada quantia em dinheiro ao Erário Público, ao mesmo tempo em
que a Fazenda Pública tem direito de receber o referente valor. (MELLO, 2007,
p.293).
Partindo das premissas acima, o crédito tributário, assim definido pelo art
139 do CTN, é parte da obrigação tributária, que ainda contempla os sujeitos ativo e
passivo e o objeto. Esse objeto, de cunho pecuniário, é um “dar dinheiro ao
Estado15. Pois bem, esse dinheiro é o denominado crédito tributário. (COÊLHO,
1999, p. 649).
Sobre a fundamentação do crédito tributário, Ruy Barbosa Nogueira bem
esclarece:
O crédito tributário, em substância, tem a mesma natureza da obrigação, por ser dela decorrente ou extraído. Há entre eles uma separação no tempo ou em dois momentos: a obrigação nasce com a lei e a realização do fato tributável como “pretensão”; o crédito decorre da obrigação, mas depende para sua determinação de um procedimento administrativo ou de
15 Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.
38
constituição formal, isto é, de declaração de sua existência, quantia, identificação do devedor, e para sua exigibilidade ou eficácia depende da notificação deste ao devedor para pagar o débito no prazo legal ou assinado. A obrigação, enquanto pretensão, é indeterminada, ao passo que o crédito é a sua própria determinação. (NOGUEIRA, 1999, p. 289).
Paulo de Barros Carvalho conceitua o crédito tributário como sendo o
“direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que
lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em
dinheiro”. (CARVALHO, 1998, p. 255).
Diante da obrigação tributária, para que o Estado possa exigir a prestação
do tributo pelo sujeito passivo, deve haver um lançamento para a constituição do
crédito. Quando o crédito for constituído é que poderá ser exigido o adimplemento.
(MACHADO, 2005, p. 179-180).
Logo, o crédito tributário pode ser definido como “o vínculo jurídico, de
natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do
particular, o contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou
da penalidade pecuniária”. (MACHADO, 2005, p. 179-180).
2.1 Constituição do Crédito Tributário
Analisando o disposto no artigo 142 do Código Tributário Nacional, tem-se
que a constituição do crédito tributário dá-se pelo lançamento, um procedimento de
cunho administrativo. 16
16 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo
...continua
39
De outra banda, encontra-se na doutrina entendimento divergente,
nascendo o crédito tributário com a mera ocorrência do fato gerador. Entendem
alguns doutrinadores, como Paulo de Barros Carvalho, que instaurada a obrigação,
esta conterá o crédito, mesmo que ilíquido e indeterminado. (CARVALHO. 1998, p.
256).
Essa divergência ocorre pelo fato de que em considerável parte dos tributos,
as obrigações são prestadas sem que ocorra o ato do lançamento, sequer
posteriormente. Há o pagamento do valor devido, em função da obrigação
configurada, sem qualquer intervenção da Fazenda Pública. (MELO, 2007, p.295).
Sendo o lançamento um ato administrativo e levando–se em conta que a
Constituição Federal determina que ninguém esteja obrigado a fazer alguma coisa a
não ser em virtude de lei, percebe-se que o lançamento aplica a lei, mas não tem
caráter de lei, logo, não pode criar o crédito tributário. (COELHO, 1999, p. 649).
Enfatizando a contradição do caput do artigo 142, que define o lançamento,
é a preleção de Fernando José Dutra Martuscelli:
Outra objeção que se faz ao redor do caput do artigo em análise é que, em face do caráter declaratório do lançamento, o crédito constitui-se com o surgimento da relação obrigacional tributária e, portanto, independente é a sua existência real de um ato de formalização futuro. Existindo um direito, e o direito de crédito da Fazenda Pública é um direito, torna-se necessário admitir que a jurisdição cautelar seja o meio de se garantirem a efetividade do processo principal de declaração ou, especificamente, a do processo principal de satisfação. Entre a ocorrência do fato jurígeno tributário, e a formalização do credito tributário com o ato de lançamento, pode decorrer um lapso de tempo tal, que permita a mais laboriosa de todas as fraudes. (MARTUSCELLI, 2001, p. 324)
A constituição do crédito tributário implica, pois, na obrigação do sujeito
passivo em pagar determinada quantia ao sujeito ativo, em função do acontecimento
do fato jurídico tributário. O lançamento é considerado por parte da doutrina como
devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. (CTN,
...continua
40
ato declaratório do crédito tributário e por outra parte como constitutivo do crédito
tributário. (SANTI, 2004, p. 76).
Vittorio Cassone procurou esboçar um caminho genérico percorrido até a
constituição do crédito tributário, que começa no momento em que a Constituição
Federal delega competência para a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios instituírem tributos por meio de lei. (CASSONE, 2000, p. 178).
Criada a lei que define o tipo tributário e a incidência, sobrevém o sujeito
passivo que pratica o fato imponível, momento em que nasce a obrigação tributária e
o dever de pagar um valor, mesmo que ilíquido. (CASSONE, 2000, p. 178).
É neste momento em que acontece o lançamento que transforma
administrativamente obrigação em crédito tributário. (CASSONE, 2000, p. 178).
2.2 Lançamento
Definida a natureza autônoma do crédito tributário, faz-se necessário
conceituar claramente o que representa, em termos jurídicos, o lançamento.
Lançamento é uma atividade vinculada e obrigatória. Quando a
Administração constata que ocorreu um fato imponível, anteriormente previsto na
legislação tributária, e que já se deu o vínculo pessoal entre o sujeito ativo e o
sujeito passivo, qual seja, o nascimento da obrigação tributária e da relação de
débito, obrigada estará a efetuar o lançamento. Portanto, “ a hipótese de incidência
art. 142)
41
da atividade administrativa será assim a ocorrência do fato imponível previsto na
hipótese de incidência da lei tributária. (LACOMBE, 2002, p. 139)
A natureza jurídica do lançamento é declaratória, porque não cria nada de
novo, apenas certifica uma situação jurídica consumada, e constitutiva porque apura
a situação quanto à quantia que deve ser paga, configurando o crédito tributário.
(CASSONE, 2000, p. 178).
Interessante raciocínio sobre a função declaratória do lançamento nas
palavras do tributarista Sacha Calmon Navarro Coelho:
[...] O Direito, ao projetar normas de conduta, espera que os seus destinatários as cumpram. Algumas normas desnecessitam da mediação da Administração Pública (do Poder Executivo) para serem cumpridas. As normas de Direito Privado, em sua maior porção, devem ser cumpridas pelas partes, sem qualquer intervenção estatal: marido e mulher, mutuante e mutuário, depositante e depositário, e assim por diante, cumprem e exercem direitos e deveres como sujeitos autônomos e responsáveis. Somente na hipótese do descumprimento recorrem os particulares ao Poder Judiciário para obrigar os inadimplentes a cumprir suas obrigações ou para achar soluções alternativas que resolvam os conflitos instaurados. Nas áreas do Direito Público, porém, a intrusão do Estado é praticamente inevitável. O Direito Administrativo e o Direito Tributário existem para regular, regrar e disciplinar as atuações do Estado e estatuir os direitos e deveres dos administrados. É o que ocorre com as atividades estatais inerentes ao lançamento, instituto típico do Direito Tributário. [...] (COÊLHO, 1999, p. 650).
Eurico Marcos Diniz de Santi entende o lançamento como norma individual
e concreta, fruto de procedimento administrativo realizado por autoridade
administrativa, com a finalidade de formalizar o crédito tributário. (SANTI, 2004, p.
59)
A constituição do crédito tributário, de acordo com interpretação ao Código
Tributário Nacional, é uma relação jurídica fiscal ou procedimental, denominada
lançamento. Atenta-se para o fato de que há uma constituição provisória do crédito
antes do ato administrativo, que passa a ser exigível com o lançamento.
(MARTUSCELLI, 2001, 330).
42
Concebido como ato jurídico administrativo, o lançamento tributário, em seu
conteúdo, formaliza a obrigação tributária, quando identifica o sujeito passivo, a base
de cálculo e a alíquota aplicável, tornando, dessa forma, o crédito líquido e exigível.
Quanto á sua formalidade e atendendo à certeza e à segurança inerentes às
imposições tributárias, obedece a forma escrita. (CARVALHO, 1998, p. 273)
2.3 Espécies de Lançamento
O lançamento pode acontecer com base na declaração do contribuinte; de
ofício, na ausência da declaração do contribuinte, ou mesmo quando declarada, o
Fisco encontrar alguma contradição ou erro; e, por fim, através de homologação,
quando ocorre o pagamento antecipado pelo contribuinte, nos casos previstos em
lei. (MAGALHÃES, 1991, p. 17).
2.3.1 Lançamento por declaração
O lançamento por declaração é realizado, como o próprio nome já
prescreve, pela declaração que o contribuinte fornece à autoridade administrativa,
nos termos do artigo 14717 do Código Tributário Nacional. (MACHADO, 2005, p. 184-
185).
17 Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta á autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação (CTN, art. 147)
43
Analisando as condições do lançamento por declaração, são as
considerações de Celso Ribeiro Bastos:
Nesta espécie, encartada no art. 147 do Código Tributário Nacional, tanto a Administração como o contribuinte desempenham atividade própria. Á administração cabe a tarefa de investigar os casos sujeitos à tributação e apurar as relações de fato e de direito que sejam essenciais à obrigação tributária, além de efetuar o cálculo do tributo, cabendo, por sua vez, ao contribuinte o papel de entregar os dados necessários para que o lançamento possa ser efetivado.
É apontado como o método mais completo, por apresentar as maiores garantias formais, principalmente para o contribuinte. (BASTOS, 1994, p. 212).
O sujeito passivo devedor da obrigação tributária, na modalidade de
lançamento por declaração, informa as “operações, estados, fatos e situações
ocorridas num preciso momento, ou relativas a um determinado período de te18mpo”.
Portador dessas informações, o sujeito ativo tem a incumbência de após avaliar a
declaração, enunciar o lançamento. (MELO, 2007, p. 302-303)
Esse tipo de lançamento também é denominado lançamento misto, pois
para que o crédito tributário seja constituído, depende tanto do sujeito passivo, como
do sujeito ativo.
O sujeito passivo é quem entrega a declaração com as informações
necessárias à constituição do crédito e delimitando o valor que entende devido,
como ocorre com o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Propriedade Imobiliária).
Essa declaração é então analisada pela autoridade administrativa
competente (sujeito ativo), que após a análise irá notificar a fixação do lançamento
ao contribuinte. (LACOMBE, 2002, p. 304).
18 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição. (CF/88, art. 156, inicso II)
44
2.3.2 Lançamento de ofício
Essa modalidade de lançamento está prevista no artigo 149 do Código
Tributário Nacional, dependendo exclusivamente da Administração, que depois de
apurar e quantificar o quantum, expedirá uma notificação de lançamento. 19
Denota-se que a finalidade desse tipo de lançamento é fiscalizar os atos dos
contribuintes. (BASTOS, 1994, p. 211).
É dito de ofício quando lançado por iniciativa da autoridade administrativa,
sem a necessidade de qualquer intervenção do sujeito passivo, alertando para o fato
de que os tributos podem ser lançados de ofício quando não tiverem sido lançados
em outra modalidade, como é o caso do IPTU (Imposto Predial e Territorial
Urbano)20. (MACHADO, 2005, p. 184-185).
19 Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I – quando a lei assim o determine; II – quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária; III – quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-la ou não o presta satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade; IV – quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória; V – quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte; VI – quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária; VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VIII – quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior; IX – quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade essencial. (CTN, art. 149) 20 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I – propriedade predial e territorial urbana. (CF/88, art. 156, inciso I).
45
Sobre a instrumentalidade utilizada no lançamento de ofício, José Eduardo
Soares de Melo explica:
Usualmente, esses lançamentos instrumentalizam-se em auto de infração, em que, além de declarar todos os aspectos do fato gerador da obrigação principal, ou acessória, aplica (ou considera) também a infração que teria sido cometida pelo sujeito passivo, indicando as capitulações legais, tendo sido vislumbrada a existência de dois atos, e duas realidades jurídicas distintas, ou seja, o ato de lançamento propriamente dito e o ato de aplicação da sanção. (MELO, 2007, p. 305).
O auto e infração é um ato jurídico administrativo resultado de um ilícito
tributário, ou seja, a autor de infração será utilizado pela Administração Pública
quando esta descobrir o descumprimento de uma obrigação de cunho tributário.
Forma-se, a partir daí, um “vínculo jurídico de caráter sancionatório”, pois o que
deveria ser prestação tributária passa a ser multa pelo inadimplemento.
(CARVALHO, 1998, p. 277).
2.3.3 Lançamento por homologação
O lançamento por homologação, dá-se no caso dos tributos que a lei
conferir ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento, para posterior
conferência e homologação por parte da autoridade administrativa. (MACHADO,
2005, p. 184-185).
Também chamado de autolançamento, o lançamento por homologação está
previsto no artigo 150 do Código Tributário Nacional, onde o próprio contribuinte
apura a o quantum devido em função da obrigação e realiza o pagamento sem a
prévia análise da Administração21.
21 Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa,
...continua
46
Depois de cumprida a obrigação, pelo contribuinte, é que a autoridade
administrativa irá homologar o lançamento e extinguir o crédito. ( BASTOS, 1994, p.
212).
O caminho de constituição do crédito tributário pelo lançamento por
homologação começa com a formalização do crédito pelo contribuinte, que procede
ao pagamento do valor entendido como devido, momento em que o crédito se
extingue resolutoriamente.
Posteriormente o Fisco homologa expressamente o pagamento, ou nesta
ausência, decorrido o prazo prescrito, homologa tacitamente a satisfação da
obrigação.
Somente nos casos de irregularidade do pagamente, ou na falta deste, é
que a Administração é quem vai formalizar o crédito, com o ato de lançamento.
(SANTI, 2004, p. 67).
Sobre o prazo para a homologação do lançamento, Américo Masset
Lacombe ensina:
O prazo da fazenda Pública para constituir o crédito tributário (obligatio, ahftung, relação de responsabilidade) é de cinco anos. Esse prazo é de decadência; uma vez transcorrido, caduca o direito da Fazenda de constituir o crédito através do lançamento. No caso do lançamento por homologação, o prazo de ser ele efetuado é igualmente de cinco anos, salvo se a lei especial fixar outro. O prazo conta-se a partir da data da ocorrência do fato imponível (fato gerador) previsto na hipótese de
opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento. § 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito. § 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação. § 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirando esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
47
incidência da norma tributária. Expirado o prazo considera-se ocorrida a homologação e extinto o crédito e a obrigação, ressalvados os vasos de dolo, fraude ou simulação [...]. (LAMCOMBE, 2004, p. 312)
Alguns autores, como José Eduardo Soares de Melo, entendem que o
lançamento por homologação na verdade, inexiste. Ora, a Fazenda Pública só se
manifesta, quando se manifesta, depois que o contribuinte já pagou o tributo. O
referido autor entende que esse tipo de lançamento por homologação não atende à
“fisionomia jurídica” do lançamento. Ocorre apenas a confirmação da legitimidade do
ato praticado pelo contribuinte. (MELO, 2007, p. 306).
Pensando o dito lançamento por homologação, tem-se que, ocorrido o fato
imponível, o sujeito passivo, amparado pela lei, pode de pronto proceder ao
cumprimento de sua obrigação tributária, sem qualquer interferência do Poder
Público.
A Administração, nesse caso em caráter meramente fiscalizador, só sairá do
estado de inércia, se se deparar com alguma irregularidade. (CARVALHO, 1998, p.
298).
Pertinente, neste sentido, o comentário de Fernando José Dutra Martuscelli
sobre a modalidade de lançamento por homologação:
No regime do dito lançamento por homologação há, sim, pagamento antecedido por uma operação aritmética feita pelo sujeito passivo da obrigação tributária ou por terceiro, com o fito de quantificar o objeto da prestação da relação obrigacional tributária. Esse pagamento é que fica em pendência de condição. Condição essa resolutória do efeito liberatório do pagamento. Tal condição é a não-discordância da Administração tributária. A concordância da Administração, quanto à correção da conduta do sujeito passivo da obrigação tributária ou de terceiro, pode formalizar-se através de ato administrativo de controle de legalidade, denominado visto, e não homologação, na teoria do direito administrativo. A consolidação da situação jurídica de extinção do relacionamento obrigacional tributário, pode dar-se por duas vias distintas: uma via comissiva, a do visto, que a doutrina equivocadamente chama de homologação expressa; e uma via omissiva, dita equivocadamente homologação tácita, ou seja, de consolidação por decadência do direito de lançar. Rememore-se que não há ato administrativo tácito, o que seria categoria conflitante com o dever-poder de agir imanente à função administrativa. (MARTUSCELLI, 2001, p. 357).
48
A figura do lançamento é, portanto, um ato completo substancialmente; a
homologação, por sua vez, é mera concordância com o ato do contribuinte, é a
satisfação do pagamento.
Dessa forma, o lançamento por homologação é o consentimento da
Administração tendo em vista a liberdade do sujeito passivo em, por conta própria,
calcular o valor do tributo devido. (COÊLHO, 1999, p. 671-672)
2.4 Extinção do Crédito Tributário
Analisada após a ocorrência do fato gerador, a constituição do crédito
tributário, bem como a s modalidades para sua formalização (lançamento), passa-se,
a seguir, ao estudo das formas de extinção do crédito tributário.
Genericamente, toda obrigação extingue-se com a entrega da prestação
respectiva. No caso de obrigações cuja prestação possui caráter pecuniário, a
obrigação encerra com o pagamento que satisfaz o credito. (MACHADO, 2005, p.
200).
A satisfação do crédito tributário ocorre com a entrega do dinheiro pelo
contribuinte, ao sujeito ativo, que pode ser a União, os Estado, o Distrito Federal e
os Municípios, de acordo com o que preceitua o artigo 156, I do Código Tributário
Nacional. (MELO, 2007, p.327).
Segundo a definição do Código Tributário Nacional, no artigo 156, o crédito
tributário extingue-se com o pagamento, a compensação, a transação, a remissão, a
49
prescrição e a decadência, a conversão do depósito em renda, o pagamento
antecipado e a homologação do lançamento, a consignação em pagamento, a
decisão administrativa irreformável, a decisão judicial passada em julgado e a dação
em pagamento. Todas essas modalidades serão abaixo relacionadas.
2.4.1 Pagamento
É o momento em que o devedor do tributo entrega a prestação de cunho
pecuniário ao sujeito ativo, ora Fazenda Nacional. (CARVALHO, 1998, p. 304).
Para que o pagamento extinga o crédito tributário, ele deve ser provado, por
meio da certidão negativa de débito fiscal ou por um recibo simples.
(MARTUSCELLI, 2001, p. 373)
Importante ressaltar que no direito tributário não existe a presunção de
pagamento, especificamente quando o crédito for pago em prestações, o pagamento
de uma destas, não presume o pagamento de outras, ou todas. (MELO, 2007, p.
327).
2.4.2 Compensação
A compensação está prescrita no artigo 170 do Código Tributário
Nacional22. É quando o sujeito passivo tem algum valor a ser restituído pela Fazenda
Pública, que ao invés de pagar, pode compensar, debitando do crédito tributário.
22 Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública. (CTN. Art. 170)
50
O tributarista Fernando José Dutra Martuscelli, sobre a modalidade da
compensação, disserta:
A compensação é uma modalidade de extinção da relação obrigacional tributária. A compensação tributária é legal, não voluntária. Fica na dependência, a possibilidade de compensação da edição de lei ordinária autorizativa do ente tributante. Ou seja, a possibilidade de compensação não emerge diretamente do Código Tributário Nacional que, como já tantas vezes dito, é lei sobre como se fazer lei. (MARTUSCELLI, 2001, p. 382).
O ponto relevante da compensação é a praticidade; ora, se a Fazenda
Pública tem que pagar valor determinado para determinado contribuinte, e esse
mesmo contribuinte precisa saldar um tributo com a Administração, a lei aceita a
compensação dos valores, atentando-se para a hipótese de eventual saldo
remanescente. (COÊLHO, 1999, p. 713).
2.4.3 Transação
O direito tributário abraçou a modalidade de transação do direito privado, a
ser utilizada nos casos de explícita insuficiência de recursos do sujeito passivo. A
transação, prevista no artigo 171 do Código Tributário Nacional23, antes de
confirmada, deve ser analisada para que se aprove seu uso. (CASSONE, 2000, p.
184).
Amiudando a transação, Sacha Calmon Navarro Coelho explana:
Transigir é abrir mão de direitos para resolver litígio, preventiva ou litigiosamente (antes do litígio, para evitá-lo, ou durante este para obviá-lo).
No Direito Privado prevalece o império da vontade das partes capazes, que podem livremente dispor de seus direitos.
Em Direito Tributário, o sujeito ativo não pode dispor do crédito tributário, que é público e indisponível. Somente a lei pode dele dispor.
23 Art. 171. A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em terminação de litígio e conseqüente extinção de crédito tributário. (CTN, art. 171)
51
Transacionar não é pagar, é operar para possibilitar o pagar. É modus faciendi, tem efeito processual, preparatório do pagamento. Por meio de uma transação, muita vez ocorre pagamento em moeda consorciado a pagamento por compensação, a aplicação de remissões e anistias, ou mesmo a dação em pagamento de coisa diversa do dinheiro.
O certo é que a transação exige concessões recíprocas, como v.g., renúncia a honorários. Se apenas uma parte cede não há transação, senão que ato unilateral capaz de comover ou demover a outra parte. (COÊLHO, 1999, p.716-717).
É preciso que se atente para o princípio da indisponibilidade dos bens
públicos, quando a Administração Pública operar a transação. Afinal, ocorre a
abdicação, por parte do sujeito ativo, de parte das “parcelas de seus direitos”, para
possibilitar algum pagamento pelo sujeito passivo. Dessa maneira, “a transação tão-
somente prepara o caminho para que o sujeito passivo quite sua dívida, promovendo
o desaparecimento do vínculo”. (CARVALHO, 1998, p. 311).
2.4.4 Remissão
A remissão é uma maneira de perdoar a obrigação tributária, extinguindo-a.
Disciplinada no artigo 172 do Código Tributário Nacional24, pode ocorrer antes ou
depois da constituição do crédito tributário, quando se dissipa o direito que a
administração tem de exigir a prestação do tributo perdoado. (CARVALHO, 1998, p.
313).
Confirmada como ato unilateral do Estado, a remissão ocorre perante a
apreciação da situação econômica do sujeito passivo, levando-se em conta, porém,
24 Art. 172. A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo: I – à situação econômica do sujeito passivo; II – ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de fato; III – à diminuta importância do crédito tributário; IV – a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso; V – a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante. Parágrafo único. O despacho referido neste artigo não gera direito adquirido, aplicando-se, quando cabível, o disposto no art. 155. (CTN, art. 172).
52
os princípios da igualdade e da capacidade contributiva. Dispensa-se a liquidação do
tributo em face do contexto envolvido.. (COÊLHO, 1999, p. 717).
2.4.5 Decadência
A decadência está disciplinada no artigo 173 do Código Tributário
Nacional.25
O crédito tributário, para tornar-se exigível pela Fazenda Pública, depende
do ato do lançamento. Se o crédito não for lançado no tempo previsto pela lei, o
direito da Fazenda de receber o crédito se extingue pela decadência, sem que haja
o pagamento. (COÊLHO, 1999, p. 720).
Sobre os prazos decadenciais da Fazenda Pública para o ato do
lançamento, dispõe Paulo de Barros Carvalho:
A Fazenda dispõe de cinco anos para efetuar o ato jurídico administrativo do lançamento. Não o praticando, nesse período, decai o direito de celebrá-lo. Na redação do art. 173 estão consignados dois marcos iniciais para a contagem do prazo: do primeiro dia do exrcício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetivado (item I); e da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado (item II). E o parágrafo único do mesmo artigo acrescenta o terceiro: da data em que tenha sido iniciada a formalização do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. Eis a disciplina do Código a propósito da decadência do direito de lançar. (CARVALHO, 1998, p. 313)
Cassone, procurando por uma definição para decadência, bem articula: “é a
perda de um direito em conseqüência de seu titular não tê-lo exercido durante
25 Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.
53
determinado período. O prazo corre sem solução de continuidade: inexiste
interrupção ou suspensão”. (CASSONE, 2000, p. 187).
O direito perde-se, pois, pela imposição de prazo determinado para extinção
de relações jurídicas, quando a Fazenda Pública, pela inércia, deixa de efetuar o
lançamento está sendo omissa em seu exercício. Essa omissão não poderia
perdurar indefinidamente. (MELO, 2007, p. 351).
2.4.6 Prescrição
Raciocinando a prescrição, Sacha Calmon Navarro Coelho, constrói o
seguinte pensamento:
Os atos jurídicos sujeitados a tempo certo, se não praticados, precluem. Os direitos, se não exercidos no prazo assinalado aos seus titulares pela lei, caducam ou decaem. As ações judiciais, quando não propostas no espaço de tempo prefixado legalmente, prescrevem. Se um direito, para aperfeiçoar-se, depende de um ato jurídico que não é praticado (preclusão), acaba por perecer (caducidade ou decadência). Se um direito não auto-executável precisa de uma ação judicial para efetivar-se, não proposta esta ou proposta a destempo, ocorre a prescrição, gerando a oclusão do direito, já que desvestido da possibilidade de ação.(COÊLHO, 1999, p. 719-720).
Depois de ocorrido o lançamento, a Fazenda Pública tem o prazo de cinco
anos, contados da data da constituição terminante do crédito, para entrar com ação
própria contra o sujeito passivo. Decorrido esse lapso temporal sem que a Fazenda
ingresse com o processo, caracterizada estará a prescrição. (CARVALHO, 1998,
p.315-316).
A prescrição está encartada no artigo 174 do Código Tributário Nacional.26
26 Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
54
Precisa a explicação de José Eduardo Soares de Melo sobre
prescrição: “é a perda do direito de ação judicial para a cobrança do crédito
tributário, em razão de inércia da Fazenda pública após o transcurso de prazo
determinado em lei”. (MELO, 2007, 348)
2.4.7 Conversão do depósito em renda
Segundo Roberto Barcelos de Magalhães, “é o efeito do pagamento feito
pelo depósito do crédito tributário em juízo, convertendo-se em renda tributária”.
(MAGALHÃES, 1991, p. 20).
Sobre esta modalidade de extinção do crédito tributário, Carvalho explica:
Ao ferirmos o tema da suspensão da exigibilidade do crédito tributário,
pudemos verificar que o depósito do montante integral da exigência Poderia ser
promovido no curso do procedimento administrativo ou no âmbito do processo
judicial. Feito junto aos órgão da Adminsitrção Pública, seu papel é de evitar a
atualização do valor monetário da dívida, pois o procedimento prossegue até
decisão definitiva. O depósito, nessa conjuntura, não é causa de suspensão da
exigibilidade, que já está sustada pela impugnação ou pelo recurso do administrado.
Realizado, porém, na esfera do Poder Judiciário, sobre impedir a propositura da
ação de cobrança, exibindo assim seu caráter de fato suspensivo da exigibilidade do
crédito, previne a incidência da correção monetária. (CARVALHO, 1998, p. 319).
Os depósitos, efetuados pelo sujeito passivo, têm a finalidade de garantir
que em algum momento o crédito tributário vai ser satisfeito e extinguido. Finalizado
o processo judicial, em desfavor do sujeito passivo, os depósitos serão convertidos
em renda tributária em favor da Fazenda. (MELO, 2007, p. 359-360).
55
O depósito que vai ser convertido em renda é efetuado mediante a
impetração de uma Ação pertinente, qual seja a Ação de Consignação em
Pagamento, que vai consignar o crédito tributário. (MARINS, 2005, p. 451).
2.4.8 Pagamento antecipado e a homologação dos lançamentos nos termos do
disposto no art. 150 e seus §§ 1º e 4º
O pagamento, por si só, não prova a extinção definitiva do crédito tributário;
para que isso ocorra é necessário o ato de lançamento. (COÊLHO, 1999, p. 728).
No caso dos tributos cujo lançamento dá-se por homologação, onde o
contribuinte paga o tributo sem prévia atuação da Administração, a Fazenda Pública
tem um prazo de cinco anos para averiguar se o pagamento está certo. (COÊLHO,
1999, p. 728).
Se decorrer o prazo sem manifestação da Fazenda, nada mais poderá ser
requerido para pagamento, fulminando o direito ao crédito. (COÊLHO, 1999, p. 728).
Sobre o prazo prescricional, Paulo de Barros Carvalho aclara:
[...] é lícito inferir que a extinção do laço obrigacional ocorreu no preciso instante em que houve o pagamento. Isso não quer dizer, entretanto, que a Fazenda esteja impedida de discutir o nascimeto, a existência e a extinção das relações jurídicas tributárias em que é ou foi parte integrante, na condição de sujeito ativo. O único pressuposto é que não se tenha exaurido o prazo que a lei assina para o exercício desse direito, isto é, cinco anos [...]. (CARVALHO, 1998, p. 320)
2.4.9 Consignação em pagamento
Quando determinado contribuinte, possuindo o dever de cumprir com uma
prestação, ao tentar exercer o pagamento, deparar-se com recusa do sujeito ativo, o
remédio processual para a satisfação da obrigação é consignar o pagamento. O
56
sujeito passivo pode consignar em pagamento um crédito tributário de acordo com a
previsão do artigo 164 do Código Tributário Nacional27. (CARVALHO, 1998, p. 321).
2.4.10 Decisão administrativa irreformável
Roberto Barcelos de Magalhães, simploriamente, define como “o julgado da
última instância administrativa, do qual não cabe mais nenhum recurso”.
(MAGALHÃES, 1991, p. 20).
Sobre esta modalidade de extinção do crédito tributário, Sacha Calmon
Navarro Coelho, explica:
A administração pode exercer o controle de legalidade de seus próprios atos. Aliás, deve, como predicam os princípios da moralidade e do respeito à lei.
Por outro lado, o lançamento é ato jurídico simples, que se faz preceder e proceder de atos preparatórios e revisionais, que acabam por retificá-lo ou ratificá-lo, total ou parcialmente (revisão do lançamento).
Este procedimento comporta impulsos ex officio e outros tantos de iniciativa do sujeito passivo (contecioso administrativo). Contudo, o processo tributário administrativo não comporta duração ilimitada. Esgotados os recursos cabíveis, oportunamente exercitados nos prazos previstos, sobrevém uma última decisão que põe fim, na esfera administrativa, à discussão sobre o lançamento.
Quando a decisão definitiva favorece total ou parcialmente o contribuinte, não mais podendo ser objeto de ação anulatória, extingue-se o crédito tributário na medida da decisão. Isto porque o sujeito passivo não tem interesse em propor ação anulatória da decisão administrativa que lhe foi favorável. O crédito então está inteira ou parcialmente extinto, nos exatos termos da decisão administrativa. (COÊLHO, 1999, p. 728).
Diante da possibilidade de reclamações e recursos administrativos, que
estão amparados pela legislação ordinária, eivdente está que o resultado será um
julgamento final, objetivo de ambas as partes. Esse julgamento final da
27 Art. 164. A importância do crédito tributário pode ser consignada judicialmente pelo sujeito passivo, nos casos: I – de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória; II – de subordinação do recebimento ao cuimprimento de exigências administrativas sem fundamento legal; III – de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre o mesmo fato gerador. § 1º A consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se propõe a pagar; § 2º Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a imoprtânica consignada é convertida em renda; julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuizo da penalidades cabíveis. (CTN, art. 164).
57
Administração é irreformável no que tange a extinção do crédito tributário. (MELO,
2007, p. 360).
2.4.11 Decisão judicial passada em julgado
Quando é proferida uma decisão, sem que caibam novos recursos, encerra-
se o processo. Quando essa decisão julga o mérito da ação, acontece a coisa
julgada formal e material, que torna a decisão definitiva e imutável. Sendo a decisão
favorável ao contribuinte, extingue-se o crédito tributário, de acordo com o artigo
156, X, do Código Tributário Nacional28. (COÊLHO, 1999, p. 729).
2.4.12 Dação em pagamento
A dação em pagamento é uma modalidade de pagamento, em que a
Fazenda Pública aceita receber “coisa diversa daquela constitutiva do objeto da
prestação”. Essa modalidade de extinção do crédito tributário necessita de lei que a
autorize. (MARTUSCELLI, 2001, p. 376).
Apresentadas e consideradas as situações inerentes à constituição, pelo
lançamento, do crédito tributário, da mesma forma que as modalidades de extinção
da obrigação de prestar o crédito, adentra-se no âmbito do direito à Ação de
Repetição do Indébito, especialmente do que diz respeito ao seu prazo prescricional.
3 A PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DOS TRIBUTOS
SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
Quando ocorre o ato administrativo do lançamento, surge para o sujeito
passivo a obrigação do pagamento de uma quantia pecuniária a título de tributo em
28 Art. 156. Extinguem o crédito tributário: X – a decisão judicial passada em julgada. (CTN, art. 156).
58
favor da Fazenda Pública. Restando quitada a prestação, encerra-se o vínculo
obrigacional. No entanto, se o tributo descobrir-se indevido, estaremos diante da
figura do indébito tributário.
3.1 O indébito Tributário
O Código Tributário Nacional prescreve, como já foi exposto no primeiro
capítulo deste trabalho, os casos em que o tributo será devido: “Tributo é toda
prestação pecuniária compulsória, em moeda ou em cujo valor nela se possa
exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante
atividade administrativa plenamente vinculada” (CTN, art. 3º).
Pela simples análise do que é “devido”, torna-se fácil concluir que “indevido”
será o tributo que contrarie as disposições do artigo supra transcrito. Por exemplo:
um imposto arrecadado que não foi instituído por lei.
Analisando o Indébito Tributário frente ao princípio da legalidade, Gabriel
Lacerda Troianelli observa:
A ofensa ao princípio da legalidade decorre, necessariamente, do fato de que o denominado indébito tributário não é, na verdade, tributo, pois, sendo todo tributo, por definição, legal e devido, não pode uma quantia paga indevidamente a título de tributo ter natureza tributária. Também não é, por sua vez, receita não tributária do estado, uma vez que toda receita pública, assim como todo ato emanado do poder público, deve decorrer de lei e o indébito tributário é intrinsecamente ilegal. Desse modo, mesmo que o Estado trate o indébito tributário como se receita fosse – ao incluir, por exemplo, na verdade, mero ingresso de caixa decorrente da exigência ilegítima de pretenso tributo. Como mero ingresso de caixa e não verdadeira receita, não poderá se integrar legitimamente ao patrimônio do poder Público, o que implica no dever do Estado de restituir o indébito tributário ao seu legítimo proprietário, sob pena de se violar o dever da estrita legalidade que rege a atividade tributária do Estado. (TROIANELLI, 1999, p. 120).
59
Destacam-se então dois momentos de lapso ao princípio da legalidade,
primeiro porque o tributo indevido, ao não ser devido, não é tributo e sim indébito
tributário.
Sequencialmente, o indébito não pode configurar receita tributária, por não
decorrer de lei, exigência que se faz a todo o ingresso de verba nos cofres públicos.
3.2 O Direito Constitucional à Repetição do Indébito
O direito do contribuinte em restituir o que pagou indevidamente é fundado
na Constituição, simplesmente porque a própria Constituição Federal determina que
o tributo só possa ser cobrado nas formas prescritas em lei. Quando assim não o for,
terá o contribuinte o direito de restituição daquela tributação ilegal. (MACHADO,
1999, p. 11).
Ainda com base na Constituição, a restituição do que se pagou
indevidamente é direito do sujeito passivo, que tem no artigo 5º, inciso XXII da
Constituição Federal, garantido o direito de propriedade29. Ora, a verba que o
contribuinte utilizou para pagar o tributo ilegal provém de seu patrimônio financeiro.
(VAZ, 1999, p. 88).
A repetição do indébito tributário contempla o direito de quem foi lesado, ao
pagar o que não precisava, bem como a obrigação da Administração, que recebeu o
29 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII – é garantido o direito de propriedade. (CF/88, art. 5º, inciso XXII).
60
que não deveria ter recolhido. Tal situação gera para o ente público o dever de
restituir um pagamento indevido. (MELLO, 1999, p.37).
Ao lançar-se um tributo indevidamente, seja de ofício, por declaração ou por
homologação e sendo este efetivamente liquidado, nascerá para o contribuinte o
direito à restituição do montante que não deveria ter sido pago. MACHADO, 1999, p.
21).
Cairon Ribeiro dos Santos, sobre o direito à Restituição do Indébito
Tributário, fundamenta:
A restituição do valor pago indevidamente, seja qual for o motivo, é imperativo de justiça social devidamente amparado pelo Direito Positivo brasileiro. Não somente à luz da Teoria Jurídica, mas sob todos os pontos de vista analisados com coerência lógica, a restituição do indébito tributário é assegurada para aquele que pagou indevidamente ou sem causa. (SANTOS, 1999, p. 73).
O direito de repetir um tributo pago indevidamente constitui um direito de
crédito de caráter disponível, que deverá ser acrescido de correção monetária e
juros de mora, nos moldes do artigo 167 do Código Tributário Nacional30. (CAIS,
2007, p. 420)
3.2.1 A ação de Repetição de Indébito
O tributo pago indevidamente pode ser restituído tanto pela via
administrativa, quanto pela judicial.
O pedido de restituição pela via administrativa é tido como supérfluo, na
opinião de alguns juristas, como Carion Ribeiro dos Santos. Um dos motivos que se
30 Art. 167. A restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição.
...continua
61
levanta é que “(...) o prazo para conseguir a compensação na via administrativa é
incerto e o provimento jurisdicional, juntamente com a medida liminar e a tutela
antecipada, é mais célere e eficaz (...)”. (SANTOS, 1999, p. 76).
É válido, neste momento, ressaltar que a Constituição Federal, no inciso
XXV do artigo 5º assegura o princípio da universalidade da jurisdição: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
No âmbito do Poder Judiciário a ação de Repetição do Indébito é utilizada
para os casos em que o tributo foi recolhido indevidamente. Dentro de um
procedimento ordinário, pede-se à Fazenda Pública que restitua um tributo que foi
pago, quando não o deveria ter sido. (MACHADO, 2005, p. 465).
James Marins conceitua a Ação de Repetição de Indébito:
A ação de repetição de indébito em matéria tributária é ação antiexacional imprópria de tiro ordinário e de natureza condenatória, que pode ser proposta pelo contribuinte em face do ente tributante que tenha recebido tributos tidos como indevidos, com o escopo da obtenção de sentença de conteúdo condenatório que determine ao órgão exator a devolução dos ingressos indevidos. (MARINS, 2005, p.433).
O mesmo autor, sobre a causa de pedir, ou seja, o objeto da ação
repetitória, explica que o pedido é condenatório por consistir na devolução de tributos
impropriamente recolhidos. Esse pagamento é tipo como indevido por “erro material
ou formal gerador do recolhimento procedido; anulabilidade do auto de infração ou do
ato de lançamento; ou ainda a ilegalidade ou inconstitucionalidade da norma que
embasou o recolhimento do tributo (...)”. MARINS, 2005, p. 433).
Parágrafo único. A restituição vence juros não capitalizáveis, a partir do transito em julgado da deicsão definitiva que a determinar. (CTN, art. 167).
62
O Código Tributário Nacional prescreve, no artigo 165, os casos
em que é possível a Repetição do Indébito31. Analisando os requisitos para o
cabimento da Ação de Repetição do Indébito, Cleucio Santos Nunes, escreve:
Os incisos de tal dispositivo aludem a pelo menos três critérios motivadores do ressarcimento: i) o do inciso I prevê o fundamento da repetição com base no pagamento manifestamente infundado, pago, pois, sem exigência de lei, isto é, a lei não mandou o contribuinte pagar, mas, mesmo assim, ele entregou o dinheiro aos cofres públicos. Tal hipótese é típica de erro de Direito. Na segunda parte do mesmo inciso, verifica-se a hipótese de erro de fato, em que a exigência tributária, em virtude de suas características materiais não se conforma com a exigência legal. Estes são os casos mais comuns. Quando a lei exige um tributo que se adapta às prescrições constitucionais, poderá o contribuinte, lograda a declaração de inconstitucionalidade, mesmo que pela via difusa, requerer a restituição do indébito; ii) o inciso II trata de erros relacionados aos critérios inerentes à conseqüência da hipótese de incidência ou á escrituração equivocada dos tributos. Nestes casos, o pagamento indevido deverá ser restituído pelo Poder Público; iii) enfim, o inciso III, do artigo mencionado, trata das hipóteses de invalidação do crédito tributário por meio de processo administrativo que, evidentemente, também gera o direito à restituição. (NUNES, 2002, p. 143).
Está implícito, mas vale ressaltar, quanto à legitimidade para pedir a
restituição, ser direito do contribuinte que teve relação pessoal e direta com a
situação que gerou o direito à repetição do indébito. (CASSONE, 2000, p. 257).
3.3 Prazo Prescricional da Ação de Repetição do Indébito e a “norma
interpretativa” da Lei Complementar 118/2005 – Contexto fático-jurídico
31 Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do art. 162, nos seguintes casos: I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maio que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória. (CTN, art. 165).
63
Prescrição, no âmbito da Repetição do Indébito, é a perda, pelo contribuinte,
do direito de pleitear a restituição do tributo pago indevidamente. (MELO, 1999, p.
238).
Prescreve o Código Tributário Nacional em seu artigo 168, que o prazo para
a propositura da Ação de Repetição do Indébito é de cinco anos32.
O inciso I do artigo supracitado preceitua que a contagem do prazo, nos
casos do inciso I, do artigo 165 (já transcrito), do mesmo Diploma Legal, começa da
extinção do crédito tributário.
No caso dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, onde o
contribuinte antecipa o pagamento, deve observar-se o disposto nos parágrafos 1º e
4º do artigo 150 do CTN que define a extinção do crédito tributário:
Art. 150. (...)
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória de ulterior homologação ao lançamento;
(...)
§ 4º Se a lei não fixar prazo á homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (CTN, art. 150, §§ 4º e 5º).
O Superior Tribunal de Justiça, analisando os dispositivos acima
transcritos, vinha decidindo, de forma pacífica, pelo cômputo de cinco anos a
contar do pagamento, configurado pela homologação tácita do tributo recolhido
indevidamente, nos moldes do art. 150, § 4º do CTN, somados, ainda, mais cinco
anos alusivos ao prazo de prescrição do artigo 168 do mesmo Diploma Legal.
32 Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I – nas hipóteses dos incisos I e II do art. 165, da data da extinção do crédito tributário;
...continua
64
Essa maneira de interpretação e aplicação dos dispositivos legais é conhecida
como a “tese dos cinco mais cinco”. (MARINS, 2005, p. 439).
Cleide Previtalli Cais sobre o entendimento do Superior Tribunal de Justiça,
comenta:
O fundamento jurídico do entendimento do Tribunal baseou-se na interpretação dos arts. 142, 156, I e 150, § º do CTN, tendo entendido que antes da homologação do lançamento não se poderia falar em crédito tributário constituído, e, por conseguinte, no pagamento que o extingue, motivo pelo qual o prazo do art. 168, I, do CTN somente teria inicio a partir do momento da homologação pela Administração, tácita ou expressa.
Apesar de criticada por uma corrente minoritária da doutrina, essa jurisprudência manteve-se firme no decorrer de quase dez anos, sendo sufragada, inclusive, pelos Tribunais Regionais Federais. (CAIS, 2007, p.750)
No entanto, a promulgação da Lei Complementar 118, em 9 de fevereiro de
2005, trouxe interpretação diversa da convencionada pelo Superior Tribunal de
Justiça, especialmente no concernente ao artigo 3º da referida lei, interferindo
diretamente no prazo prescricional da Ação de Repetição do Indébito:
Art. 3º. Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei. (LC 118, art. 3º).
Ora, o citado artigo diz que vem interpretar o artigo 168, inciso I do Código
Tributário Nacional, quando, na verdade, inova no mundo jurídico, o prazo
prescricional para buscar a restituição do indébito, tendo em vista que, se a
prescrição começar a contar no momento do pagamento antecipado, exclui-se da
contagem os cinco anos que a Fazenda tem para homologar o tributo; ou se poderia
depreender que ambos prazos – o da Fazenda para homologar e o do contribuinte
para requerer a Repetição do Indébito – correriam simultaneamente.
II – na hipótese do inciso III do art. 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a
...continua
65
Ana Carolina Dias Lima Fernandes, promotora de Justiça do Estado de
Sergipe, sobre a citada lei, comentou em artigo publicado recentemente:
Percebe-se, portanto, nitidamente, que o comando normativo em tela, inova no plano normativo, n medida em que retira da disposição interpretada o sentido até então extraído pelo STJ. Resta claro o propósito de alterar, pela via legislativa direta, o entendimento até então dominante na Corte guardiã da legislação federal pátria. Retoma-se, assim, através dessa lei, o anterior entendimento do STF (quando ainda detinha a função de tutor da legislação federal), inicialmente atacado pelo STJ, de que a contagem do prazo prescricional para a ação de restituição de indébito, no caso do autolançamento, se iniciaria à partir da data do pagamento. (FERNANDES, 2006)
A proposição do artigo 3º da Lei Complementar 118 é contraditória em
comparação com Código Tributário Nacional. O raciocínio é simples: foi explanado
no segundo capítulo do presente trabalho que o crédito tributário, no caso dos
tributos em que o contribuinte o paga antecipadamente, extingue-se com a
homologação do lançamento.
A homologação expressa do lançamento, pela Fazenda Pública, no caso de
recolhimento antecipado pelo contribuinte, tem um prazo de 5 anos. Na inércia da
Fazenda, decorrido o prazo prescrito, consumada está a homologação tácita; logo,
extinto estará o crédito.
Transferir a extinção do crédito da data da homologação, sendo ela
expressa ou tácita, para o momento do pagamento antecipado indevido, é inovar e
jamais interpretar.
O legislador, com a nova lei, não aceita mais que a extinção do crédito
dependa do lapso temporal de cinco anos para a homologação tácita. Defende que o
pagamento antecipado é que extingue o crédito. (Correia, 2006)
decisão condenatória. (CTN, art. 168).
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A interpretação autêntica não tem a função de alterar um entendimento do
Poder Judiciário, que é quem tem a função de analisar o caso concreto e aplicar a
lei. O Poder Legislativo tem o cargo de elaborar leis e não de interpretá-las.
(HARADA, 2005)
Hugo de Brito Machado, em recente publicação da Revista Dialética de
Direito Tributário, sobre o encurtamento do prazo par pleitear a restituição do
indébito, escreve:
Assim, o prazo de 5 anos para se pleitear a restituição de tributos pagos indevidamente, relativamente aos tributos submetidos a lançamento por homologação, deixou de ser contado a partir da homologação (que, quando tácita, ocorre cinco anos após o fato gerador) e passou a sê-lo em face do pagamento antecipado. Na prática, como dificilmente ocorre uma homologação expressa, a alteração implicou um encurtamento na contagem do prazo prescricional, de 10 (5+5) para 5 anos. (MACHADO, 2007, p. 43)
Vê-se que o pagamento, que antes não extinguia, por si só, o crédito
tributário, dando início a fluência do prazo prescricional da propositura da inicial
repetitória, passou a produzir o efeito de extinção.
O artigo 4º da Lei Complementar 118 determina que a interpretação prevista
em seu artigo 3º possa atingir a fatos pretéritos.33
Alertando-se ao princípio da irretroatividade frente à lei complementar em
apreço, James Marins anota:
Como se observa, sob o pretexto de promover “interpretação autêntica do art. 168, I do CTN, a LC nº 118/2005 busca obter os efeitos retroativos previstos pelo art. 106 do CTN quando se trate de lei “expressamente interpretativa”. Ocorre que, à toda evidência, mais que mera interpretação, o dispositivo produz inovação no sistema jurídico, constituindo-se em gravame intolerável ao princípio constitucional da irretroatividade das leis previsto genericamente no art. 5º, inc. XXXVI da CF/88 e particularmente para a matéria tributária, previsto no art. 150, III, “a”.
33 Art. 4º. Esta lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional. (L C 118, art. 4º)
67
Diante da evidência da violação constitucional em que incorreu a norma supostamente interpretativa, o próprio Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou – acertadamente segundo pensamos – assentando entendimento de que sua aplicação é insuscetível de ser retroativa, podendo aplicar-se tão-somente aos pedidos de restituição de tributos formulados após a vigência do art. 3º, da LC nº 118/2005. (MARINS, 2005, p. 440-441).
O artigo 106 do Código Tributário Nacional, mencionado por James Marins,
permite que uma lei tributária possa ser aplicada retroativamente, quando esta tiver
caráter interpretativo. 34
Fernando Buono, advogado em Londrina (PR), em artigo publicado na
internet, conclui sobre a irretroatividade da LC 118:
Ademais, a norma não poderia retroagir em prejuízo dos contribuintes, cujos direitos estão resguardados pelos princípios da segurança jurídica e da irretroatividade in pejus. A se admitir a retroatividade da Lei, o contribuinte seria penalizado pela nova interpretação legal, pois perderia o prazo anteriormente assegurado pelo Poder judiciário. Não se trata, pois, de mera alteração exegética, mas de inovação legal, prejudicial ao sujeito passivo da obrigação tributária. (BUONO, 2006)
Necessário, neste ponto, esclarecer o que seja uma lei interpretativa,
basicamente, “é aquela cujo conteúdo é a atribuição de um significado a uma lei
precedente. Não inova o ordenamento jurídico, limitando-se a esclarecer o
significado de um texto já existente (...) não lhe sendo permitido alterar o texto que
interpreta.” (CAIS, 2007, p. 751).
Desta análise, questão que deve ser ponderada, é a reflexão da capacidade
de uma lei interpretativa no ordenamento jurídico brasileiro, como se intitula a Lei
Complementar 118/2005, inovar e reduzir o prazo prescricional da Ação de
Restituição do Indébito.
Necessário se faz, invocar, o princípio constitucional da segurança jurídica,
que pressupõe normas jurídicas estáveis, regulares e previsíveis, em acordo com os
34 Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
...continua
68
direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição Federal em nível da
cláusula pétrea. Antônio Jeová Santos dispõe:
A segurança é a certeza de que a pessoa pisa em solo firme. Não pode haver a idéia de trepidação, de que o temor por eventual mudança de situação já concretizada torne o ser humano medroso e o impeça de realizar negócios por temor de alteração no futuro. Se pratico um ato hoje, sob determinada lei que determina a forma e a substância do ato, ficarei tranqüilo porque, seja qual a lei superveniente, não poderá modificar o meu comportamento exteriorizado naquele ato. Terei a segurança e a certeza de que nada, absolutamente nada transformará aquele ato cometido. (SANTOS, 2004, p. 60)
A Lei Complementar em apreço ultrapassa sua competência
quando editada pelo Poder Legislativo, sob o rótulo de interpretar a medida que
determina supressão de direito adquirido conferido pelo Poder Judiciário, qual
seja: o prazo prescricional de 10 anos (tese dos 5 + 5).
3.3.1 Posição Jurisprudencial
O Ministro Teori Albino Zavascki, atento à inovação jurídica, quando
da prolação de seu voto no julgamento dos Embargos de Divergência em Resp n.º
327.043/DF, deixou claro que:
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2. Em nosso sistema constitucional, as funções legislativa e jurisdicional estão atribuídas a Poderes distintos, autônomos e independentes entre si (CF, art; 2º). Legislar, função essencialmente conferida ao Parlamento, é criar os preceitos normativos, é impor modificação no plano do direito positivo. Já a função jurisdicional - de assegurar o cumprimento da norma, que pressupõe também a de interpretá-la previamente -, é atribuída ao Poder Judiciário. A atividade legislativa está submetida à cláusula constitucional do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada (art. 5º, XXXVI), razão pela qual as modificações do ordenamento jurídico, impostas pelo Legislativo, têm, em princípio, apenas eficácia prospectiva, não podendo ser aplicadas retroativamente. A função jurisdicional, ao contrário, atua, em regra, sobre fatos já ocorridos ou em via de ocorrer. Só excepcionalmente pode o Legislativo atuar sobre o passado, assim como só excepcionalmente pode Judiciário produzir sentenças com efeitos normativos futuros. (...)
I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. (CTN, art. 106, inciso I).
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A República Federativa do Brasil está dividida entre os Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário, tendo, cada um deles, prerrogativas próprias. A atividade
legislativa não pode fazer as vezes nas funções do poder judiciário.
5. Nesse contexto, a edição, pelo legislador, de lei interpretativa, com efeitos retroativos, somente é concebível em caráter de absoluta excepcionalidade, sob pena de atentar contra os dois postulados constitucionais já referidos: o da autonomia e independência dos Poderes (art. 2º, da CF) e o do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da CF). Lei interpretativa retroativa só pode ser considerada legítima quando se limite a simplesmente reproduzir (= produzir de novo), ainda que com outro enunciado, o conteúdo normativo interpretado, sem modificar ou limitar o seu sentido ou o seu alcance.(...) Ora, lei que simplesmente reproduz a já existente, ainda que com outras palavras, seria supérflua; e lei que não é assim, é lei que inova e, portanto, não pode ser considerada interpretativa e nem, conseqüentemente, ser aplicada com efeitos retroativos. (...)
Não tendo caráter interpretativo e sim inovador, a Lei Complementar em
apreço contornou a jurisprudência construída pelo Superior Tribunal de Justiça,
contrariando entendimento de quem está investido na função de aplicar a legislação
pertinente.
7. Não se nega ao Legislativo o poder de alterar a norma (e, portanto, se for o caso, também a interpretação formada em relação a ela). Pode, sim, fazê-lo, mas não com efeitos retroativos. Admitir a aplicação do art. 3º da LC 118/2005, sobre os fatos passados, nomeadamente os que são objeto de demandas em juízo, seria consagrar verdadeira invasão, pelo Legislativo, da função jurisdicional, comprometendo a autonomia e a independência do Poder Judiciário. Significaria, ademais, consagrar ofensa à cláusula constitucional que assegura, em face da lei nova, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e à coisa julgada. Portanto, o referido dispositivo, por ser inovador no plano das normas, somente pode ser aplicado a situações que venham a ocorrer a partir da vigência da Lei Complementar 118/2005, que ocorrerá 120 dias após a sua publicação (art. 4º), ou seja, no dia 09 de junho de 2005. Tratando-se de norma que reduz prazo de prescrição, cumpre observar, na sua aplicação, a regra clássica de direito intertemporal, afirmada na doutrina e na jurisprudência em situações dessa natureza: o termo inicial do novo prazo será o da data da vigência da lei que o estabelece, salvo se a prescrição (ou, se for o caso, a decadência), iniciada na vigência da lei antiga, vier a se completar, segundo a lei antiga, em menos tempo. São precedentes do STF nesse sentido:
"Prescrição Extintiva. Lei nova que lhe reduz prazo. Aplica-se à prescrição em curso, mas contando-se o novo prazo a partir da nova lei. Só se aplicará a lei antiga, se o seu prazo se consumar antes que se complete o prazo maior da lei nova, contado da vigência desta, pois seria absurdo que, visando a lei nova reduzir o prazo, chegasse a resultado oposto, de ampliá-lo" (RE 37.223, Min. Luiz Gallotti, julgado em 10.07.58).
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(...) Quando se trata de redução, porém, não se podem misturar períodos regidos por leis diferentes: ou se conta o prazo, todo ele pela lei antiga, ou todo, pela regra nova, a partir, porém, da vigência desta. Qual o critério para identificar, no caso concreto, a orientação a seguir? A resposta é simples. Basta que se verifique qual o saldo a fluir pela lei antiga. Se for inferior à totalidade do prazo da nova lei, continua-se a contar dito saldo pela regra antiga. Se superior, despreza-se o período já decorrido, para computar-se, exclusivamente, o prazo da lei nova, na sua totalidade, a partir da entrada em vigor desta. 8. Ocorre que o art. 4º da Lei Complementar 118/2005, em sua segunda parte, determina, de modo expresso, que, relativamente ao seu art. 3º, seja observado “o disposto no art. 106, I, da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”, vale dizer, que seja aplicada inclusive aos atos ou fatos pretéritos. Ora, conforme antes demonstrado, a aplicação retroativa do dispositivo importa, nesse caso, ofensa à Constituição, nomeadamente ao seu art. 2º (que consagra a autonomia e independência do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo) e ao inciso XXXVI do art. 5º, que resguarda, da aplicação da lei nova, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Assim, fica evidenciada a inconstitucionalidade do dispositivo, cumprindo observar, em relação a ele, o disposto no art. 97 da Constituição, instalando-se o devido incidente de inconstitucionalidade . Não basta, para contornar o incidente, simplesmente deixar de aplicar o dispositivo inconstitucional. Ao Judiciário, que está submetido à lei, somente é dado deixar de aplicá-la quando ela for incompatível com a Constituição, o que só pode ser reconhecido e declarado pela maioria absoluta dos seus membros ou dos membros do órgão especial. Bem a propósito, eis a orientação do STF a respeito, em situação absolutamente análoga: “A declaração de inconstitucionalidade de norma incidenter tantum, e, portanto, por meio do controle difuso de constitucionalidade, é o pressuposto para o juiz ou o Tribunal, no caso concreto, afastar a aplicação da norma tida por inconstitucional. Por isso, não se pode pretender, como o faz o acórdão recorrido, que não há declaração de inconstitucionalidade de uma norma jurídica incidenter tantum quando o acórdão não a declara inconstitucional, mas afasta a sua aplicação, porque tida como inconstitucional. Ora, em se tratando de inconstitucionalidade de norma jurídica a ser declarada em controle difuso por Tribunal, só pode declará-la, em face do disposto no artigo 97 da Constituição, o Plenário dele ou seu Órgão Especial, onde este houver, pelo voto da maioria absoluta dos membros de um ou de outro” (STF, RE 179.170, 1ª Turma, Min. Moreira Alves, DJ de 30.10.98).
Analisado o voto supracitado, e toda doutrina exposta, percebe-se que o
prazo prescricional foi tolhido drasticamente pela lei nova, que diminuiu pela metade
o lapso temporal a que o contribuinte tem direito para pedir a repetição do tributo
pago antecipada e indevidamente.
Oportuno salientar que independente do artigo 3º da Lei Complementar 118,
que determina a extinção do crédito tributário no momento do pagamento
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antecipado, não houve a revogação do inciso VII do artigo 156 do Código Tributário
Nacional, que continua determinando que o pagamento antecipado necessite da
homologação do lançamento, que, por sua vez, só ocorre cinco anos após o fato
gerador. (SANTI, 2007, p. 35)
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CONCLUSÃO
O Sistema Tributário Nacional é delimitado por princípios
constitucionais, que vão norteando desde a instituição dos tributos até a aplicação
da legislação própria.
Viu-se que o crédito tributário, para ser definitivamente constituído, no
caso dos tributos em que o sujeito passivo antecipa o pagamento, necessita da
ulterior homologação do Fisco.
No caso de ser este pagamento indevido, materializado está o indébito,
surgindo para o contribuinte o direito à Ação de Repetição do Indébito, nos moldes
do Código Tributário Nacional.
A Lei Complementar 118/2005, em seu artigo 3°, modificou o
entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, compulsando os
operadores do direito à releitura do art. 168, inciso I, do Código Tributário Nacional e,
via de conseqüência, de toda sistemática relativa à Ação de Repetição de Indébito
de tributos sujeitos ao lançamento por homologação.
A explícita definição de seu caráter interpretativo é contestado por boa
parte da doutrina, pois, quando de sua aplicação, trata-se de dispositivo inovador,
propulsor de substancial alteração da ordem jurídica.
Pelo exposto, verifica-se que, a Lei Complementar n° 118/2005
introduziu regra nova referente à prescrição do direito do contribuinte de efetuar a
recuperação dos tributos recolhidos indevidamente, motivo pelo qual o prazo de
cinco anos por ela veiculado, conforme entendimento já consolidado pelo Superior
Tribunal de Justiça, apenas deverá aplicar-se aos créditos ocorridos posteriormente
à sua vigência
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