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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
ANTONIA MARTOVANIA DE SOUSA MONTE
A PLANÍCIE FLUVIAL DO RIO POTI NOS MUNICÍPIOS DE
NOVO ORIENTE E CRATEÚS-CE: OS BARRAMENTOS E SUAS
REPERCUSSÕES SOCIOAMBIENTAIS
FORTALEZA - CEARÁ
2014
ANTONIA MARTOVANIA DE SOUSA MONTE
A PLANÍCIE FLUVIAL DO RIO POTI NOS MUNICÍPIOS DE NOVO
ORIENTE E CRATEÚS-CE: OS BARRAMENTOS E SUAS REPERCUSSÕES
SOCIOAMBIENTAIS
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Geografia da
Universidade Estadual do Ceará –
PROPGEO/UECE, como requisito para
obtenção do grau de Mestre. Área de
concentração: Análise Geoambiental e
Ordenação do Território nas regiões
semiáridas e litorâneas.
Orientadora: Profa. Dra. Andréa Almeida
Cavalcante
FORTALEZA - CEARÁ
2014
AGRADECIMENTOS
Agradeço:
A Deus, a saúde e a força na busca dos meus sonhos.
À minha Orientadora, Dra. Andrea Almeida Cavalcante, que de forma atenciosa e
paciente contribuiu para a construção e concretização deste trabalho, o seu apoio, os
ensinamentos e experiências do conhecimento geográfico.
Aos professores, Dr. Marcos Nogueira e Dr. Amaro Gomes, as suas valorosas
sugestões e os seus incentivos ao desenvolvimento da pesquisa.
À CAPES, a bolsa concedida, a qual viabilizou o bom desempenho deste trabalho.
A todas as instituições, nas quais tive constante acesso às informações necessárias à
pesquisa e que foram cedidas de forma diligente.
Ao Laboratório de Geologia e Geomorfologia Costeira e Oceânica (LGCO), a
realização das análises granulométricas necessárias à pesquisa.
Ao Laboratório de Estudos e Políticas Públicas (LEPP/UFC) que tão gentilmente me
acolheu e deu subsídios para o desenvolvimento da pesquisa. Obrigada aos amigos
deste laboratório, em especial à coordenadora Dra. Silvania Monte, minha irmã, por
estar ao meu lado e ter acompanhado todos os momentos vividos neste período.
Ao Marcos Brito, o seu apoio e sua colaboração nas pesquisas de campo.
Ao amigo, Joselito Teles G. Júnior, pessoa amável, que não mediu esforços em todo o
trabalho com valorosas contribuições na cartografia e foi presença constante.
Ao amigo, José Victor de Mesquita Filho, colega de profissão, a sua amizade, o seu
apoio, as suas ricas sugestões e discussões durante a realização deste trabalho.
Aos colegas do mestrado, a convivência e os momentos de aprendizagem.
À Carmencita, colega e companheira de trabalho, o seu carinho, amor e seus
incentivos permanentes para ingresso, permanência e conclusão desse mestrado.
Ao Gonzaga, pessoa constante em minha vida, a paciência e o desdobro com nossos
filhos, preenchendo, junto a eles, lacunas que o tempo da pesquisa me exigiu.
Às minhas irmãs, Lucy e Sandra e minha prima Thaidys, o apoio prestado.
Enfim, agradeço a todos que de forma direta ou indireta se fizeram presentes e
acreditaram na concretização deste trabalho.
RESUMO
Este trabalho discorre sobre a planície fluvial do rio Poti, na bacia dos Sertões de Crateús, nos
municípios de Novo Oriente e Crateús. Tem como finalidade caracterizar e analisar, sob a
perspectiva ambiental e social, a planície fluvial do rio Poti considerando a inserção de
barramentos e as repercussões decorrentes da implantação de tais obras. Para isto, realizou-se
inicialmente o histórico dos barramentos por meio de levantamento bibliográfico em órgãos
afins. Também foram analisados dados de precipitação e vazão obtidos na FUNCEME e
COGERH. Em campo, o monitoramento (02 campanhas) foi feito a partir de 04 seções pré-
estabelecidas, onde foram coletados dados de perfilagem do canal, sedimentos para análise
granulométrica, além de dados de uso e ocupação. O mapeamento de uso da terra foi realizado
com base em imagens de 2011, para posterior análise quanto à inserção da nova barragem – o
Lago de Fronteiras. Na proposição da análise climato-hidrológica se investigou, a partir de
dados pluviométricos e de vazões dos barramentos em questão, fazendo a correlação entre
precipitações e as respectivas vazões para os açudes Flor do Campo e Carnaubal, constatando
que há uma relação direta entre estas, o que por sua vez influencia o regime hidrológico,
alterando as vazões máximas e mínimas. Observando margens, uso e ocupação da planície,
foi possível perceber o intenso e acentuado processo de degradação pelo qual elas vêm
passando, intensificando a ação dos processos morfodinâmicos naturais. Margens
descaracterizadas e potencialmente sujeitas à erosão, à extração vegetal indiscriminada, à
pecuária extensiva, à agricultura praticada com tecnologias muito rudimentares, são, dentre
outros aspectos, as principais causas que vêm modificando as condições ambientais da
planície. Levando-se em conta a inserção de mais um barramento, o Lago de Fronteiras,
segundo prognóstico realizado, sobrepondo-o as tipologias do mapa de uso e cobertura, vê-se
que este poderá ser um marco, considerando as mais variadas repercussões ao ambiente, não
só na morfologia fluvial, como também em relação à população atingida, pois deixará em suas
vidas a marca de uma história vivida que será submersa.
Palavras-Chave: Planície Fluvial. Barramento. Morfologia. Social.
RÉSUMÉ
Le point de départ de cette recherche aurait pu être la question des enjeux de la mise en
oeuvre de politiques de gestion intégrée suivant un objectif de développement durable et des
pratiques à l’égard des ressources en eau tout particulièrement en agriculture dans le bassin de
“Sertões de Cratéus” qui regroupe presque en totalité l’ensemble des affluents en rive
gauche/droite de la Poti. Nous avons élaboré la base de données à partir des informations
fournies par FUNCEME e COGERH. Grâce à cette base de données (vers les années 2011),
l’analyse topique de l’environnement lié au barrage a gagné en texture nous permettant d’aller
plus loin en ce qui concern les schémas techniques et quelques explications sur son
fonctionnement. Nous nous focalisons sur le barrage qui s’implante dans le bassin de la Poti
affectent principalement des populations rurales et sur le processus qui commande l’existence
de ce barrage. Comme ce processus est vaste, nous cherchons à déterminer la manière dont le
barrage circule dans la société, la façon dont il emboîte les priorités, la manière dont la
prolifération de récits, de débats, d’incertitudes constitue de manière performative un énoncé,
une problématisation qui régit alors la réflexion des acteurs. Ce processus a une forme ou
plusieurs formes: une configuration certes, un diagramme, un rhizome, un réseau socio-
technique. L’histoire de la décision du barrage Lago São Francisco est composée de faits,
d’évènements qui suggèrent une évolution irrégulière et instable. L’embryon du projet
technique du barrage São Francisco apparaît avec un plan de valorisation de cette région lancé
par le Gouvernement du Ceará. Sa raison d’être technique était à la base d’un projet de
modernisation de l’Etat: l’idée de progrès grâce au développement social et économique
d’une région et d’une population appauvries. Ce caractère trans-sectoriel et indispensable fait
des relations qui se tissent autour des ressources en eau des objets sensibles par essence et très
complexes. Dès lors nous devons définir une approche géographique (en utilisant des données
selon lesquelles la proposition de l'analyse climato-hydrologique est étudié, c´est-à dire, les
précipitations et la corrélation entre elles et le débit de Flor do Campo et Carnaubal). En effet,
l'analyse des marges et de l'utilisation et de l'occupation ont révélé le processus de
dégradation intense et forte de plus en plus l'action des processus morphodynamiques
naturelles. La question est de savoir comment un barrage se constitue parallèlement à sa
conception. Mais comment s’y prendre pour suivre les pratiques qui concernent ce barrage.
Ainsi, notre regard s’arrête sur un autre barrage saillant appélé Lago de Fronteiras. Parle-t-on
des pratiques politiques, Organisationnelles, professionnelles lors de la conception du projet,
qui mélangent des questions d’intérêt et de pouvoir inhérentes à tout projet technique qui
permette de saisir non seulement la complexité des relations et la diversité des constructions
des rapports entre sociétés et ressources en eau, mais aussi les enjeux sociaux qui leur sont
liés. En d’autres termes, les relations qui existent entre les sociétés et les sources d’eau ne
rendent pas compte uniquement d’une détermination physique, mais elles résultent en grande
partie des relations entre les individus et les groupes, et de différentes relations qu’ils ont
respectivement aux sources d’eau.
Mots clés: ressources en eau, barrage, enjeux sociaux, l'analyse climato-hydrologique.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 População por faixa etária das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.................................................................
106
Tabela 2 Grau de escolaridade das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.................................................................
107
Tabela 3 Ocupação das famílias atingidas pela implantação da Barragem Lago
de Fronteiras...........................................................................................
108
Tabela 4 Relações de trabalho das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.................................................................
108
Tabela 5 Local de residência das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.................................................................
109
Tabela 6 Tempo de residência no local das famílias atingidas pela implantação
da Barragem Lago de Fronteiras............................................................
110
Tabela 7 Condições de acesso à moradia das famílias atingidas pela
implantação da Barragem Lago de Fronteiras.......................................
111
Tabela 8 Acesso à energia elétrica e abastecimento d’água das famílias
atingidas pela implantação da Barragem Lago de Fronteiras................
111
Tabela 9 Acesso à saneamento básico por parte das famílias atingidas pela
implantação da Barragem Lago de Fronteiras......................................
112
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Mapa de localização de área.......................................................................... 21
Figura 2 Informações técnicas das imagens do satélite Landsat utilizada na
pesquisa..........................................................................................................
43
Figura 3 Espacialização dos Perfis topográficos realizados........................................ 46
Figura 4 Amostragem, vidraçarias e equipamentos utilizados nas análises
granulométricas..............................................................................................
47
Figura 5 Estações de tratamento de esgoto no município de Crateús [Lagoa de
estabilização e decanto digestor]................................................................... 49
Figura 6 Leito do rio Poti eutrofizado ....................................................................... 51
Figura 7 Lixo no leito do rio Poti................................................................................ 51
Figura 8 Distribuição percentual das atividades econômicas na cidade de Crateús.... 53
Figura 9 Distribuição percentual das atividades econômicas na cidade de Novo
Oriente........................................................................................................... 53
Figura 10 Percentual de atendimento do saneamento básico nos municípios de
Crateús e Novo Oriente................................................................................. 54
Figura 11 Modelo esquemático de uma área fluvial e respectiva planície de
inundação...................................................................................................... 63
Figura 12 Nascente do rio Poti, município de Quiterianopólis.................................... 64
Figura 13 Início do Canyon do rio Poti no município de Crateús................................ 65
Figura 14 Espacialização das barragens em estudo...................................................... 67
Figura 15 Barragem do Poti (Batalhão)......................................................................... 72
Figura 16 Barragem do açude Carnaubal com visão da adutora................................... 74
Figura 17 Barragem do açude Flor do Campo.............................................................. 76
Figura 18 Agrovila gerada com a desapropriação para a construção da
barragem........................................................................................................ 77
Figura 19 Local de implantação da barragem Lago de Fronteiras................................ 79
Figura 20 Espacialização dos postos pluviométricos utilizados na pesquisa................ 81
Figura 21 Distribuição pluviométrica anual 1974-2012. Valor total dado pela média
dos postos utilizados..................................................................................... 81
Figura 22 Precipitação diária obtida pela média dos postos analisados........................ 82
Figura 23 Vazões liberadas pelo açude Carnaubal com as respectivas precipitações
do mesmo período (2007-2012) ...................................................................
83
Figura 24 Vazões liberadas pelo açude Flor do Campo com as respectivas
precipitações do mesmo período (2007-2012) ............................................. 84
Figura 25 Volume afluente para os açudes Flor do Campo e Carnaubal x
precipitação anual........................................................................................ 85
Figura 26 Perfis transversais da estação (1) para os meses de janeiro e novembro e
composição granulométrica das margens esquerda e direita.........................
89
Figura 27 Pecuária extensiva no leito do rio. Perfil (1) ................................................ 89
Figura 28
Perfis transversais da estação (2) para os meses de janeiro e novembro
(2013) e composição granulométrica das margens esquerda e direita e do
leito seco........................................................................................................
90
Figura 29 Trecho da calha usado para a transposição do açude Flor do Campo ao
açude Carnaubal (perfil 2) [Leito seco e leito com passagem do fluxo].......
91
Figura 30 Perfis transversais da estação (3) para os meses de janeiro e novembro
(2013) e composição granulométrica das margens esquerda e direita e do
leito seco........................................................................................................
91
Figura 31 Perfis transversais da estação (4) para os meses de janeiro e novembro
(2013) e composição granulométrica das margens esquerda e direita e do
leito seco........................................................................................................
92
Figura 32 Perenização do rio na área urbana por acúmulo de águas servidas............. 94
Figura 33 Mata ciliar descaracterizada com planta invasora [Planta invasora
substituindo vegetação nativa; Invasora unha do diabo]..............................
95
Figura 34 Pecuária extensiva no leito seco. Perfil (2) ................................................... 98
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Açudes gerenciados pela COGERH na Bacia dos Sertões de Crateús........... 66
Quadro 2 Ficha técnica da barragem Carnaubal – Crateús/CE ..................................... 74
Quadro 3 Ficha técnica da barragem Flor do Campo – Novo Oriente/CE ..................... 77
Quadro 4 Ficha técnica da barragem Lago de Fronteiras – Crateús/CE ........................ 79
Quadro 5 Percentual atingido com a implantação da barragem Lago de Fronteiras em
relação ao total da planície do rio Poti em estudo..........................................
102
Quadro 6 Estabelecimentos rurais para agricultura familiar e não familiar................... 103
LISTA DE MAPAS
Mapa 1 Mapa Básico.................................................................................................... 23
Mapa 2 Mapa de relevo sombreado com recursos hídricos.......................................... 58
Mapa 3 Mapa das unidades geoambientais da bacia hidrográfica dos Sertões de
Crateús.............................................................................................................
59
Mapa 4 Mapa de Declividade...................................................................................... 60
Mapa 5 Mapa Hipsométrico......................................................................................... 61
Mapa 6 Perfil topográfico do rio Poti........................................................................... 88
Mapa 7 Mapa de uso e cobertura do solo..................................................................... 96
Mapa 8 Mapa prognóstico da implantação do lago da barragem Fronteiras................ 101
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
4º BEC Batalhão de Engenharia e Construção
40º BI Batalhão de Infantaria
AGIR Agente de Guarda e Inspeção de Reservatório
ANA Agência Nacional de Águas
APP Área de Preservação Permanente
BIRD Banco Interamericano de Desenvolvimento Social
CAGECE Companhia de Águas e Esgotos do Ceará
COGERH Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos
CONERH Conselho de Recursos Hídricos do Ceará
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais.
DNOCS Departamento Nacional de Obras contra as Secas
EIA Estudo de Impacto Ambiental
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
ETTERN Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza
FUNCEME Fundação Cearense de Meteorologia e Chuvas Artificiais
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
IPPUR Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional
INMET Instituto Nacional de Meteorologia
LAGEO Laboratório de Geografia Física e Estudos Ambientais da
Universidade Estadual do Ceará
LEPP Laboratório de Estudos e Políticas Públicas
MDT Modelo Digital do Terreno
MIN Ministério da Integração Nacional
MIR Ministério da Integração Regional
MMA Ministério do Meio Ambiente
MNT Modelo Numérico do Terreno
PAC2 Programa de Aceleração do Crescimento
PERH Programa Estadual de Recursos Hídricos
PLANERH Plano Estadual de Recursos Hídricos
PROGERIRH Programa de Gerenciamento e Integração dos Recursos Hídricos
PROURB Programa de Desenvolvimento Urbano e Gerenciamento de
Recursos Hídricos
SEMACE Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Ceará
SIG Sistema de Informação Georreferenciado
SIGERH Sistema Integrado de Gestão dos Recursos Hídricos
SOHIDRA Superintendência de Obras Hidráulicas
SRHCE Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará
SRTM Shuttle Radar Topography Mission
SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
TOPODATA Banco de Dados Geomorfométricos do Brasil
UECE Universidade Estadual do Ceará
UFC Universidade Federal do Ceará.
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UTM Universal Transverso de Mercator
WCD Word Comission Dam
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 18
1.1 LOCALIZAÇÃO DA ÁREA................................................................................ 21
2 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO 25
2.1 DINÂMICA NATURAL DE CANAIS ARENOSOS EM ÁREAS
SEMIÁRIDAS..................................................................................................... 25
2.1.1 Análise sistêmica na perspectiva dos estudos fluviais.................................... 25
2.1.2 Dinâmica Fluvial, Impactos de Barragens e Uso de Margens....................... 27
2.2 A ESTRUTURA FUNDIÁRIA E AS FORMAS DE USO E OCUPAÇÃO DA
TERRA.................................................................................................................. 33
2.2.1 O conceito de atingido......................................................................................... 39
3 PROCEDIMENTOS TÉCNICO-OPERACIONAIS 41
3.1 LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO.............................................................. 41
3.2 LEVANTAMENTO DE DADOS GEOCARTOGRÁFICOS DE
SENSORIAMENTO REMOTO............................................................................. 41
3.2.1 Procedimentos operacionais................................................................................. 44
3.3 LEVANTAMENTO DE CAMPO E ANÁLISES LABORATORIAIS................. 45
3.4 PERFIL SOCIOECONÔMICO DA POPULAÇÃO ATINGIDA E AÇÃO
INSTITUCIONAL................................................................................................... 47
4 CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL 48
4.1 ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS ..................................................................... 48
4.2 COMPONENTES GEOAMBIENTAIS NO CONTEXTO DA BACIA DOS
SERTÕES DE CRATEÚS...................................................................................... 54
5 BARRAMENTOS NO SEMIÁRIDO NORDESTINO...................................... 68
5.1 OS BARRAMENTOS DO RIO POTI.................................................................... 71
5.1.1 Barragem do Poti (Batalhão)................................................................................ 71
5.1.2 Barragem Carnaubal............................................................................................. 72
5.1.3 Barragem Flor do Campo..................................................................................... 75
5.1.4 Barragem Lago de Fronteiras.............................................................................. 77
6 DINÂMICA FLUVIAL X USO E OCUPAÇÃO NA PLANÍCIE DO RIO
POTI........................................................................................................................ 80
6.1 ANÁLISE CLIMATO-HIDROLÓGICA................................................................ 80
6.2 DINÂMICA DO CANAL X ANÁLISE DOS SEDIMENTOS.............................. 86
6.3 DINÂMICA DE MARGEM X USO E OCUPAÇÃO.............................................. 93
7 A AÇÃO INSTITUCIONAL E OS ATINGIDOS PELA IMPLANTAÇÃO
DA BARRAGEM LAGO DE FRONTEIRAS NA PLANÍCIE FLUVIAL DO
RIO POTI NO MUNICÍPIO DE CRATEÚS .......................................................
105
7.1 OS ATINGIDOS PELA BARRAGEM LAGO DE FRONTEIRAS........................ 106
7.1.1
7.1.2
Perfil socioeconômico das famílias atingidas pela implantação da barragem
Relações de moradia das famílias atingidas pela implantação da barragem
106
109
7.2 AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS ESTABELECIDAS NO PROCESSO DE
IMPLANTAÇÃO DA BARRAGEM
112
7.2.1 Comitê de Apoio aos Produtores do Lago Fronteiras.......................................... 112
7.2.2 Percepção dos atingidos em relação às ações institucionais................................ 113
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 116
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 120
18
1 INTRODUÇÃO
Convivi com o rio Poti um longo período durante minha infância na cidade de
Crateús. Foram pouco mais de onze anos até vim morar na capital cearense. As lembranças
que tenho dele são de um rio caudaloso e de uma impetuosidade sem medidas nas suas cheias,
embora estivesse em estado de degradação. Porém, meus olhos infantis só enxergavam a sua
majestade a imperar nos seus domínios. As viagens de ônibus ou de trem para a região de
Crateús marcaram a memória da minha juventude nas idas e vindas das férias enquanto meus
avós eram vivos. Hoje, sei que a casa deles ficava na planície desse rio, por isso, era inundada
nos anos de cheias excepcionais. Para mim, este fenômeno era sinônimo de festa.
A ideia e interesse em estudar o rio Poti veio, portanto, da relação de convivência
e de pertencimento com o lugar, estudo esse materializado na dissertação do Mestrado. Nada
mais gratificante para uma filha da terra do que ter a oportunidade de encarar o encanto por
este rio de forma acadêmica e científica. O descaso com a planície do rio Poti dentro de sua
história e importância é notório a cada dia, sendo esta cada vez mais intensamente afetada
pela degradação ambiental com o uso e a ocupação desordenada. Não podemos esquecer que
a construção de barramentos em seu leito foi fortemente influenciada pelos rigorosos e
sequenciais períodos de estios, gerando, por outro lado, uma sequência de outras mudanças
que serão aqui discutidas.
Os ambientes fluviais têm sido amplamente alterados em razão dos diversos usos
como: a construção de reservatórios, retilinização de canais, atividades agropecuárias em
áreas de margens. Fato este que pode levar, em alguns casos, a mudanças drásticas como o
desaparecimento do canal (CAVALCANTE e CUNHA, 2011).
De modo geral as planícies fluviais consistem em ambientes de dinâmica intensa,
por isso estão em constante alteração, modificando os mecanismos de transporte de
sedimentos e formas deposicionais e, por conseguinte, alterando os tipos de usos por parte da
sociedade. Porém, o uso intenso da terra e demais intervenções antrópicas, têm gerado
impactos de forma negativa a estes ambientes fluviais.
As barragens têm sido promovidas como um importante meio de atender às
necessidades hídricas das regiões semiáridas. Entretanto, estas obras de engenharia modificam
não só as condições naturais dos cursos d’água com efeito direto na dinâmica fluvial mas
também a forma de vida das populações ribeirinhas, inclusive podendo alterar seu habitat
físico.
19
De acordo com a WCD (2000), nos últimos 50 anos, ficou claro o desempenho e
os impactos sociais e ambientais das grandes barragens que transformam fortemente os rios
do mundo. Estimativas globais sugerem que aproximadamente 40 a 80 milhões de pessoas já
foram deslocadas por ocasião da implantação de barragens. A opção de construir grandes
barragens vem sendo cada vez mais contestada, chegando ao ponto de se colocar em questão
construções deste porte em muitos países.
A construção de reservatórios se apresenta há muito tempo como estratégica na
busca de equacionar os longos períodos de escassez hídrica para as regiões semiáridas uma
vez que o abastecimento provém, em grande parte, destes reservatórios que acumulam as
águas superficiais. Assim os barramentos aparecem como resposta a essa problemática de
conotação relevante.
Por outro lado, entre os principais efeitos físicos gerados pelos barramentos, há
estudos que revelam a ocorrência de mudanças significativas nos padrões de vazões e
respectivo controle no transporte de sedimentos que afetam as condições morfológicas do
canal, provocando a busca deste por uma nova condição de equilíbrio que, muitas vezes,
afetam os usos e a ocupação nas áreas adjacentes de tais ambientes.
Os canais fluviais em regiões áridas, semiáridas e subúmidas ainda são pouco
estudados, carecendo de maiores pesquisas por se tratarem de áreas bastante vulneráveis
e sujeitas a rápidas e intensas modificações, dificultando os processos de ajuste e equilíbrio.
Segundo Tooth (2000), tais áreas possuem uma representação espacial significativa, cobrindo
quase 50% das terras do globo, apresentando recursos naturais relevantes e com crescente
demanda populacional. Nestas regiões, também, são visualizados fortes processos de
degradação dos solos e dos rios que constituem cada vez mais foco de atenção, tornando-as
áreas de interesse científico e de pesquisas que precisam ser estimuladas. Pesquisa recente, em
regiões áridas da Austrália Central, indica ainda uma maior diversidade nas mudanças das
formas e dos processos dos rios semiáridos.
Brandt (2000) afirma que barragens são construídas para múltiplos usos, tais
como: controle de enchentes, geração de energia elétrica, irrigação, controle de sedimentos,
abastecimento humano e para uso na indústria. Em boa parte delas, é comum a redução do
fluxo natural e, por conseguinte, a redução de fluxo de energia. A capacidade de transporte de
sedimentos e descargas de pico são também acentuadamente reduzidas. Acrescente-se que,
somado a isso, a implantação, a construção e a operação de um reservatório envolvem,
geralmente, potenciais impactos negativos sobre o ambiente e as comunidades situadas no
20
entorno, que geralmente são afetadas com situações como: desapropriação, remoção de
pessoas, mudanças de atividades, desagregação familiar e impactos culturais, dentre outros.
O Ceará é o estado do Nordeste que possui a maior extensão territorial no
semiárido, com cerca de 92% da sua área inserida no Polígono das Secas. Ele investe, ao
longo dos anos, na construção de uma infraestrutura hídrica voltada ao abastecimento
humano, fazendo uso de açudagem, dado que em função da intermitência de seus rios surgiu a
necessidade de armazenar água em períodos de elevadas concentrações pluviométricas para
utilização na escassez hídrica. Porém, tais investimentos como meio de combate as
consequências das secas, nem sempre levam em conta possíveis modificações nos canais
fluviais, bem como nos impactos sociais decorrentes da implantação destes reservatórios.
A relevância da temática, dentro da perspectiva ambiental e social, desperta
interesse e cria um diálogo pertinente acerca da construção destes barramentos, tornando-se
oportuno entender os efeitos da dinâmica fluvial do rio Poti, que no contexto histórico e
social, tem sua importância para o surgimento e crescimento econômico do município de
Crateús. As grandes obras de engenharia, intervindas em seu leito carecem ser abordadas,
analisadas e discutidas em âmbito geral e particular, visto ser crescente o seu número. Isto
causa alterações significativas em sua dinâmica fluvial, gerando diversos impactos naturais e
sociais.
O trabalho tem como objetivo geral caracterizar e analisar, sob a perspectiva
ambiental e social, a planície fluvial do rio Poti, considerando a inserção de barramentos ao
longo dele, bem como as repercussões decorrentes da implantação de tais obras, visto que,
este rio é o principal coletor de drenagem da bacia hidrográfica dos Sertões de Crateús.
No atendimento a essas proposições, aponta-se como objetivos específicos:
Fazer um resgate histórico e caracterizar os principais barramentos no curso do
Rio Poti, nos municípios de Crateús e Novo Oriente;
Caracterizar as condições climato-hidrológicas, considerando os efeitos dos
barramentos;
Analisar a dinâmica de margens, considerando as formas de uso e ocupação da
planície fluvial do rio Poti;
Identificar as relações existentes entre os atingidos e os agentes responsáveis
pela implantação dos barramentos na planície fluvial do rio Poti.
21
1.1 LOCALIZAÇÃO DA ÁREA
A área em estudo corresponde à planície fluvial do rio Poti no trecho entre o
açude Flor do Campo e o entorno da área de implantação da barragem Lago de Fronteiras.
Estende-se pelos municípios de Novo Oriente e Crateús, no Estado do Ceará (Figura 1).
Figura 1: Mapa de localização da área.
Organização: Martovania Monte e Gonçalves Júnior
Situados na região ocidental do Estado, os municípios têm seus aspectos físicos
marcados pela semiaridez. A maior parte da área se encontra assentada sobre o embasamento
cristalino. Apenas parte dela, compreendida pelos distritos de Oiticica e Ibiapaba, na região da
Chapada da Ibiapaba no município de Crateús, encontra-se posicionada no domínio
sedimentar. As áreas aluviais de maior expressão estão associadas à planície do rio Poti.
A Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei nº 9.433, de 8 de
janeiro de 1997, normatiza a gestão de recursos hídricos adotando a definição de bacias
hidrográficas como unidade de estudo e gestão. Para Barrella (2001), Bacia Hidrográfica é um
conjunto de terras drenadas por um rio e seus afluentes, formada nas regiões mais altas do
relevo por divisores de água, onde as águas das chuvas, ou escoam superficialmente formando
os riachos e rios, ou infiltram no solo para formação de nascentes e do lençol freático.
22
Para a utilização dos termos sub-bacias e microbacias alguns pontos divergentes
aparecem na literatura. Para Teodoro et.al (2007) as sub-bacias são, em linhas gerais,
atribuído o conceito geomorfológico, áreas de drenagem dos tributários do curso d’água
principal. Entretanto para alguns autores este conceito está vinculado a diferentes unidades de
medida. Para Faustino (1996 apud Teodoro et.al. 2007), as sub-bacias possuem áreas maiores
que 100 km² e menores que 700 km². Já para Rocha (1997, apud MARTINS et al., 2005), são
áreas entre 20.000 ha e 30.000 ha (200 km2 a 300 km2).
Para Santana (2003),
... as bacias podem ser desmembradas em um número qualquer de sub-
bacias, dependendo do ponto de saída considerado ao longo do seu eixo-
tronco ou canal coletor. Cada bacia hidrográfica interliga-se com outra de
ordem hierárquica superior, constituindo, em relação à última, uma sub-
bacia. Portanto, os termos bacia e sub-bacias hidrográficas são relativos”.
Neste estudo usamos a nomenclatura da COGERH, órgão de gestão dos recursos
hídricos e que divide a parte da bacia do Parnaíba em território cearense, para prestação de
assistência técnica e operacional, em duas: a da Serra da Ibiapaba e a dos Sertões de Crateús.
A planície fluvial, usando essa nomenclatura, se insere na bacia hidrográfica dos
Sertões de Crateús, possui uma área de 10.821 km², compreende a rede de drenagem do rio
Poti, composta pelos municípios de Ararendá, Crateús, Independência, Ipaporanga, Ipueiras,
Novo Oriente, Poranga, Quiterianopólis e Tamboril. Com capacidade de acumulação de
473,35 milhões de m³, num total de 10 açudes monitorados (COGERH, 2012), localiza-se na
porção ocidental do Estado, limita-se com as bacias; a leste, a do Banabuiú, a oeste, a do
Parnaíba (Piauí), ao norte, a da Serra da Ibiapaba e ao sul a do Alto Jaguaribe.
Na área de estudo se destacam os barramentos, Flor do Campo e Carnaubal (já
implantados) e o local da futura barragem do Lago de Fronteiras. A barragem Flor do Campo
se localiza no município de Novo Oriente - CE, próximo à localidade de Almas que está
referenciada pelas coordenadas 5º 32’ 04’’W e 40º 46’ 27’’S. A barragem Carnaubal, por sua
vez, está localizada no município de Crateús – CE, próximo à localidade de Carnaubal,
referenciada pelas coordenadas 40º 40’ 88”W e 5º 16’ 04”S; a barragem Lago de Fronteiras,
localizar-se-á acerca de 27 km a oeste da cidade de Crateús e a 2 km a leste do distrito de
Ibiapaba. O eixo cruza o rio Poti nas coordenadas 40º 54’ 16’’W e 05º 03’02’’S. Ademais,
destaca-se a barragem do Poti, conhecida como barragem do Batalhão, construída pelo 4º
Batalhão de Engenharia e Construção (4ºBEC) na década de 1950.
As principais vias de acesso, localização urbana, barramentos e uma visão sinótica
dos municípios da planície podem ser vistos no mapa básico (Mapa 1, Carta imagem 1).
25
2 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
2.1 DINÂMICA FÍSICO-NATURAL DE CANAIS ARENOSOS DO SEMIÁRIDO
2.1.1 Análise Sistêmica na perspectiva dos Estudos Fluviais
A natureza tem sido analisada e vista como um sistema no qual suas partes se
integram, seja de forma direta ou indireta, funcionando como um conjunto de elementos
interdependentes, inter-relacionados e interatuantes, coordenados entre si e envolvidos numa
complexidade formando uma estrutura Organizada (CUNHA, 2006). Na visão sistêmica, a
natureza não é estudada de forma isolada, mas é colocada numa perspectiva integrada visando
à compreensão das inter-relações entre seus componentes. A concepção geossistêmica
considera a forma como os diversos componentes ambientais se organizam e se inter-
relacionam, e em sua análise são fornecidos elementos para o conhecimento sobre a estrutura
e funcionamento da natureza e de suas interconexões com a sociedade (BERTRAND, 1972;
SOTCHAVA, 1977; TRICART, 1966; SOUZA, 2002).
Drew (1994) ressalta que dentro dos sistemas naturais existem interconexões com
a sociedade, quando coloca o papel do homem como agente de modificação do ambiente e os
impactos sobre o ambiente físico que ele causa, modificando os processos naturais, uma vez
que os elementos deste ambiente se encontram interligados. Para o autor é impossível
dissociar estes efeitos das atividades humanas.
Drew (Op cit), coloca ainda que o homem é hoje o mais poderoso agente
individual da alteração das condições na superfície terrestre, modificando o ambiente em
ritmo acelerado. Como o desenvolvimento da agricultura e da sociedade organizada sempre
esteve vinculado ao controle da água, especialmente para a irrigação, principalmente com uso
de barramentos e com o advento da moderna tecnologia, o grau da interferência humana
aumentou de maneira assustadora. Atualmente, são poucos os sistemas fluviais no mundo que
possuem caráter inteiramente natural. Além dos benefícios econômicos e sociais, outra razão
para o alto grau de interferência humana nestes sistemas é a relativa facilidade com que se
consegue realizar modificações de grande porte como barragens.
Na natureza, as bacias hidrográficas, os rios e os ecossistemas são os motores
biológicos do planeta e a base da vida e do sustento da humanidade. Ao se construir
barragens, estas transformam a paisagem e alteram de forma significativa o escoamento dos
26
rios, gerando efeitos na dinâmica fluvial, principalmente, os relativo ao transporte de
sedimentos. Compreender, proteger e restaurar os sistemas ambientais, principalmente os
fluviais é essencial para promover o desenvolvimento humano equitativo e o bem-estar de
todas as espécies (WCD, 2000). Ainda segundo Silva (2011), as intervenções feitas nas bacias
hidrográficas são de crescente envergadura, dado que elas têm sido feitas sobre uma
concepção de domínio e controle da natureza, levando, em muitas ocasiões, aos efeitos e
consequências negativas.
Na classificação dos sistemas, as bacias hidrográficas se colocam como os
sistemas não isolados, abertos de entrada (input) e saída (output), e envolvem subsistemas
como o sistema vertente, dos canais fluviais e as planícies de inundação, ocorrendo trocas
constantes de matéria e energia (CHRISTOFOLETTI, 1981, 1999).
Para Silva (2011), a análise da bacia hidrográfica, a partir de uma perspectiva
sistêmica, sustentável e complexa é válida porque, no caso dos recursos hídricos, a tarefa
consiste em compreender e considerar as relações do arranjo espaço-temporal do papel da
água como um recurso indispensável no funcionamento da biosfera, o qual se encontra
limitada dentro da esfera geográfica.
Segundo Mateo (2005) apud Silva et al (2011), quando se analisa uma bacia numa
perspectiva sistêmica é necessário considerar que: (1) na bacia interagem componentes de
diferentes caracteres como o natural, o econômico, o social, o político e o histórico, que em
conjunto conduzem à formação de diversos sistemas ambientais; (2) é uma totalidade
sistêmica, formada pela interação e a articulação de diversos sistemas ambientais (eco, geo,
sociossistêmica). O autor ressalta ainda que considerar a bacia como um todo, ou seja, como
um sistema ambiental, implica, sobretudo, entender que as relações entre os diversos
componentes naturais e socioeconômicos que se manifestam na bacia, interagem de forma
complexa. Essa interação se reflete na estrutura e no funcionamento, na dinâmica e na
evolução, no âmbito espacial e territorial.
Dessa forma, a bacia hidrográfica constitui uma unidade natural básica de
planejamento em que a ação integradora das diferentes formas de uso e manejo deve ser vista
sob a ótica sistêmica, na qual cada componente pode influenciar ou ser influenciado pelos
demais.
As características de tipologia de leito, dos canais e de padrões de drenagens nas
bacias hidrográficas, quando analisadas em conjunto, promovem uma dinâmica peculiar das
águas correntes que, associada à geometria hidráulica, culminam em processos específicos
fluviais de erosão, transporte e deposição (CUNHA, 2001).
27
Os rios são os principais componentes da bacia de drenagem, ela é constituída por
um conjunto de canais de escoamento interligados e que exibem várias peculiaridades
conhecidas como padrões de drenagem. Estes dizem respeito à situação espacial dos rios, a
qual é controlada pela estrutura geológica do terreno e pela condição climática de uma dada
região. Os diferentes padrões de drenagem determinam várias classificações de rios. As
classificações podem basear-se na gênese, na geometria ou no padrão de escoamento do
sistema fluvial (SUGUIO E BIGARELLA, 1990).
No âmbito dos sistemas naturais é relevante considerar as implicações no uso da
água e da sua forma de captação e distribuição junto aos atores naturais, sociais, culturais e
econômicos que intervêm em seu manejo e renovação (SILVA, 2011). Para o entendimento
da dinâmica fluvial é necessário pensar a bacia hidrográfica como um grande sistema e os rios
como elementos deste sistema, os quais ao mesmo tempo também podem ser concebidos
como subsistemas que interagem de forma complexa (CHRISTOFOLETTI, 1981). Na
aplicação dos estudos fluviais, a análise sistêmica propõe subsidiar a compreensão dos
processos dinâmicos do escoamento superficial através das interconexões que são realizadas
com o clima, litologia, relevo, solos, vegetação e das correlações destes com a vazão, a
descarga sólida e a morfologia do canal.
2.1.2 Dinâmica Fluvial, Impactos de Barragens e Uso de Margens
Os rios são agentes geomorfológicos significativos que mostram uma diversidade
de comportamento e forma, refletindo nas variedades de ambientes em que eles são
encontrados. Por serem altamente dinâmicos, rios e canais se ajustam e evoluem em escalas
de tempo que vão de segundos a dezenas de milhares de anos. A influência de eventos
passados também é significativa para explicar as formas atuais de canais fluviais.
(CHARLTON, 2008).
Rios e canais ao longo do tempo têm mudado de fisiografia, seja por processos
naturais ou ações antropogênicas como a inserção de barramentos. Estas mudanças vêm sendo
estudadas sob o domínio da geomorfologia fluvial, tendo como referência para estudo a óptica
das bacias de drenagem, como ressalta Cunha (2003), mostrando que estas refletem a forma
de uso do solo e sua dinâmica, além de considerar as dimensões temporal e espacial.
Geomorfologicamente o termo rio se aplica exclusivamente para designar “corrente
canalizada”. O rio constitui-se um corpo de água corrente confinada em um canal (SUGUIO e
BIGARELLA, 1990). Os rios são cursos naturais de água doce, com seus canais definidos e
28
podem ser, de acordo com seu fluxo, efêmeros, quando carregam água apenas durante ou
imediatamente após as chuvas; intermitentes, quando neles corre fluxo de água durante alguns
meses do ano, associado ao período da estação chuvosa; perenes quando possuem vazão o ano
inteiro.
O regime dos canais está associado, em grande parte, à quantidade de águas que
recebe, a qual varia em função da intensidade e quantidade de chuvas, da natureza das rochas
sobre as quais eles fluem e da topografia (CUNHA, 2003). Atuam como agentes de
transformação da paisagem ao fazerem o trabalho de erosão, transporte e deposição (SUGUIO
e BIGARELLA, 1990).
Stevaux e Latrubesse (2005), estudando os grandes rios tropicais, apresentam uma
visão geral dos sistemas tropicais do mundo salientando suas diferenças e similaridades
quanto: ao clima e arcabouço geológico de suas bacias, ao regime hidrológico que os
controlam, aos processos morfogenéticos e hidrológicos a que estão submetidos, aos impactos
introduzidos pelo homem e aos problemas deles advindos.
Para Rebouças (1997), a baixa permeabilidade das rochas que compõem o
embasamento geológico regional e as suas complexas feições lito-estruturais formam uma
densa rede hidrográfica, a qual propicia número considerável de locais favoráveis à
construção de açudes. Estes reservatórios de água visíveis constituem significativa reserva
estimada em 22 bilhões de m3 e adquiriram valor simbólico, à margem de sua efetiva e
concreta importância, como uma feição marcante da paisagem do sertão nordestino. O autor
ainda destaca que a solução hídrica no domínio de rochas cristalinas deverá ter por base o uso
eficiente dos açudes. As águas subterrâneas desse contexto têm alcance complementar e
limitado por ficarem restritas às zonas de fraturas e manchas aluviais.
No Nordeste brasileiro predominam dois contextos hidrogeológicos distintos, de
extensões semelhantes: o domínio das rochas do substrato geológico cristalino pré-cambriano,
praticamente impermeáveis e subaflorantes; e o das rochas sedimentares, nas quais ocorrem
importantes horizontes aquíferos (REBOUÇAS, 1997). Nesse arcabouço, estão inseridos os
rios do semiárido que têm como principal característica o caráter intermitente, o qual está
diretamente relacionado com o regime de precipitações das chuvas irregulares, caracterizadas
pelas incertezas que se configuram situações de seca em alguns anos.
Segundo Ab’Saber (2003) os rios do Nordeste, em algum tempo do ano, atingem
o mar. Isto diz respeito a um dos fatores de originalidade dos sistemas hidrográficos e
hidrológicos regionais, pois ao contrário de outras regiões semiáridas do mundo em que as
drenagens convergem para depressões fechadas, os rios dessa região vão desaguar no
29
Atlântico. Por isto, no semiárido em geral e no Ceará em particular, os rios são de caráter
intermitente, com drenagem exorréica, que em grande escala não permite a formação de solos
originalmente salinos, principalmente, nas vertentes e interflúvios (AB’ SABER 1956).
Segundo Nascimento (2011), uma caracterização hidrológica mais rica passa por
apreciação genérica da geomorfologia fluvial regional, no que se refere às características
naturais dos rios e canais. Neste sentido, além dos tipos de padrão de drenagem, escoamento e
sua gênese, os vales fluviais podem ser entendidos à luz dos tipos de leitos e dos tipos de
canais.
Para Araújo (1982) os rios e riachos de áreas cristalinas, via de regra chegam ao
esgotamento total um mês depois das chuvas. Para aqueles que se desenvolvem em áreas
sedimentares, frequentemente só se tornam perenes se as chuvas tiverem sido excepcionais no
ano precedente ou se receberem suficiente contribuição de aquíferos adjacentes. Além disso, o
autor acrescenta que nesses rios (semiáridos), em um ano hidrológico normal, as águas
baixam durante a estiagem até a descarga absoluta se anular. As cheias, entretanto, são súbitas
e violentas, isto é, ocorrem em pouco tempo.
Segundo Cunha (2003), os canais podem ser caracterizados pelas medições de
largura, profundidade e velocidade, combinadas com as variáveis de descarga (Q), resistência
do fluxo e declive. As inter-relações desses fatores irão constituir a geometria hidráulica
deles.
O escoamento superficial se constitui numa das variáveis mais importantes para o
entendimento da dinâmica de rios. Relacionados a este se torna relevante destacar algumas
grandezas: (1) vazão (Q), considerada como a mais importante variável para quantificar as
fontes e perdas de água no sistema fluvial, representando o volume escoado por unidade de
tempo e sendo expressa em metros cúbicos por segundo (m³/s) ou em litros por segundo (l/s);
(2) coeficiente de escoamento superficial (C) ou coeficiente de “run off”, expresso como a
razão entre o volume de água escoado superficialmente e o volume de água precipitado; (3)
tempo de concentração (tc), que mede o tempo que leva para que toda a bacia contribua para
o escoamento superficial; (4) tempo de recorrência (T), o período que determinada vazão e
que é igualado ou superado pelo menos uma vez; (5) nível da água (h) que se refere à altura
atingida pelo volume da água em relação a uma referência (VILLELA, 1975).
Conforme Cunha (1995,) o fluxo fluvial é constituído pela descarga líquida, sólida
e dissolvida. Por meio da descarga líquida (Q) são definidas a competência e capacidade do
rio. A compreensão da competência e capacidade dos rios é de relevante interesse para
esclarecimento do transporte fluvial. Por competência, entende-se o tamanho das partículas
30
que podem ser movimentadas pelo fluxo, sendo determinada pelo maior diâmetro encontrado
entre os detritos transportados como carga do leito. A capacidade do canal está relacionada
com a quantidade de material que pode ser transportada pelo rio por unidade de tempo,
correspondendo a quantidade máxima de sedimentos de determinada classe granulométrica
que o rio pode transportar.
Para Cunha (Op. cit.), a carga sólida de um rio (suspensão e fundo) decresce para
jusante, indicando diminuição na sua competência. Agrega que, a carga sólida é reflexo direto
da participação da chuva com sua intensidade e frequência, de forma a provocar erosão nas
encostas, também do papel da cobertura vegetal. Ambas, chuva e cobertura vegetal, possuem
destaque na participação do volume da carga sólida e no entulhamento de reservatórios os
quais reduzem, muitas vezes, a sua vida útil. Segundo esta autora a carga em suspensão se
constitui de silte e argila, enquanto a carga de fundo é formada por partículas de tamanho
maiores (areia, cascalho ou fragmento de rocha) que saltam ou deslizam ao longo do leito
fluvial.
Os escoamentos dos rios das regiões semiáridas estão associados diretamente às
condições climáticas as quais apresentam o regime pluviométrico que se caracteriza por
chuvas concentradas em um determinado período (estação chuvosa) e outro (estiagem) os
quais colocam seus rios por longos períodos sem fluxo, tornando-os potencialmente
preferidos para a construção de barramentos, pois nesse ínterim, ocasionalmente, ocorrem
períodos excepcionais de chuvas. Os estudos de processos em canais semiáridos são
preferencialmente vistos sob a óptica de fluxos excepcionais (Graf, 1988). Nesse sentido,
vários autores a exemplo de Leopold e Miller (1956) e Schumm e Lichty (1963), colocam a
intensidade das cheias como uma variável importante para os processos de transporte de
sedimentos e mudança no canal (TOOTH, 2000).
Para Cunha (1995), o vale fluvial pode ser entendido sob o ponto de vista dos
tipos de leitos, de canal e de rede. O leito corresponde ao espaço ocupado pelo escoamento
das águas. São designados pela classificação de Tricart, 1966, como: leito menor, de vazante,
maior e maior excepcional. A delimitação entre eles, nem sempre é fácil devido à falta de
nitidez de seus limites.
O conhecimento da geometria hidráulica, consoante Chistofoletti (1981), refere-se
às características geométricas e de composição dos canais fluviais, consideradas as relações
que se estabelecem no perfil transversal. Este conceito de geometria hidráulica foi trabalhado
inicialmente por Leopold e Maddock em 1953, nos Estados Unidos e, amplamente utilizado
na literatura geomorfológica.
31
Christofoletti, (1981) considera a forma do canal como resposta que reflete
ajustamento aos débitos que fluem através de determinada seção transversal. Considerando
que o canal em rios aluviais é resultante da ação exercida pelo fluxo sobre os materiais
rochosos componentes do leito e das margens, pode-se afirmar que suas dimensões serão
controladas pelo equilíbrio entre as forças erosivas de entalhamento e os processos
agradacionais os quais depositam material em seu leito e em suas margens. O débito deve ter
a força necessária para realizar o entalhamento, a frequência e duração suficientes para manter
a forma do canal. Como a magnitude dos débitos vai se modificando em direção a jusante,
torna-se conveniente analisar as alterações da geometria hidráulica em determinado local e no
sentido do perfil longitudinal do rio.
O escoamento superficial em canais recebe influência de diversos fatores,
podendo estes serem de natureza climática, quando associados a precipitações de natureza
fisiográfica relacionadas às características físicas das bacias hidrográficas, citando como os
mais importantes: a área, a forma, a permeabilidade, a capacidade de infiltração e a
topografia; ou ainda de natureza antrópica com destaque para as obras hidráulicas, as
barragens que, ao acumularem água em seus reservatórios, reduzem as vazões máximas de
escoamento e retardam a sua propagação (VILLELA, 1975).
Em se tratando de barramentos como fator de influência no escoamento das águas,
Trush et al (2000) relatam que ao redor do mundo os rios, eles estão sendo regulados por
barragens para acomodar as necessidades de uma população mundial em rápido crescimento,
opondo-se a tendência natural dos rios de mover os sedimentos e transportá-los. Apesar de um
benefício econômico, em sua regulação é imprevisível avaliar os custos ecológicos e naturais
dessas barragens.
Um dos efeitos imediatos das barragens ao represar o rio, é modificar o seu
sistema de escoamento, de correntezas (lótico), passando para águas semiparadas (lêntico) no
reservatório. Esse tipo de interferência gera, conforme Cunha (1995), uma série de efeitos em
cadeia que, dependendo da magnitude e área de abrangência, pode gerar fortes impactos ao
sistema fluvial.
A Wold Commission on Dams (WCD, 2000) afirma que cerca de 60% dos 227
maiores rios do mundo foram muito ou moderadamente, fragmentados por barragens ou
canalizados, causando efeitos sobre os ecossistemas de água doce e adjacências.
Carvalho (2008) relata que o curso d’água na posição do reservatório tem as áreas
de seções transversais aumentadas, enquanto as velocidades da corrente decrescem, criando
condições de deposição do sedimento. As partículas mais grossas são as primeiras a se
32
depositar enquanto o sedimento mais fino adentra o reservatório. O barramento constitui um
impedimento à passagem da maior parte de partículas a jusante. Ainda segundo o autor, a
jusante da barragem, a água limpa e sem sedimentos, bem como a modificação do regime de
vazão, provocarão erosões de leito e de margem do canal.
De acordo com Cavalcante (2012), em canais barrados, a regularização uniforme
entre vazões máximas e mínimas reduz os níveis de margens plenas (bankfull) e, portanto,
limita o alargamento do canal nessa perspectiva; ao mesmo tempo o desgaste de margens
provocado por usos descontrolados pode provocar o alargamento do canal, com o agravante
de que o material erodido é depositado no próprio local, aumentando a probabilidade de
assoreamento.
Para Cavalcante (Op.cit.), a construção de barragens no semiárido é oportuna pela
necessidade de acumulação de água para os mais diversos usos, a qual é captada,
principalmente, em períodos de maiores índices pluviométricos (estação chuvosa) para uso na
estiagem (longo período escasso de precipitação). Entre os usos preponderantes, a atividade
agrícola merece destaque e pode ser desenvolvida às margens e vazantes dos rios,
promovendo grandes índices de desmatamento e exposição do solo.
Cavalcante (2012) acrescenta ainda que dependendo da sequência de barramentos
e nível de usos de margens, aumenta a probabilidade de desmontes locais e aprisionamento de
sedimentos, uma vez que a regularização de vazões produz a diminuição das velocidades de
fluxo e redução do nível de base, favorecendo a deposição.
Os cursos d’água estão sujeitos à erosão do leito, principalmente, das suas
margens e, portanto, devem ser protegidas e preservadas em quaisquer circunstâncias para o
equilíbrio deste (CARVALHO, 2008).
Conforme Fernandez (1995), a erosão marginal provocada com a instalação de
barragens causa graves impactos ambientais tais como: a alteração na qualidade da água,
perda de áreas cultiváveis e da vegetação ribeirinha; e potencializa os efeitos no canal ao
colocar águas limpas (sem sedimentos), provocando maior erosão das margens e do leito do
canal de escoamento.
Fernandez (Op.cit.), ao estudar a erosão marginal no rio Paraná, destaca que esta
tem importante distribuição temporal, não sendo contínua e está vinculada às magnitudes dos
eventos climáticos (precipitações) e hidrológicos (enchentes). Em se tratando dos rios
semiáridos, é pertinente fazer essa relação com sua condição climática que concentra períodos
de chuvas intensas alternados com longos períodos escassos de precipitação. Como as
33
margens, em geral, têm padrões mais arenosos nessas regiões e, muitas vezes, encontram-se
bastante degradadas, a intensidade das precipitações favorece a maior erodibilidade delas.
Corroborando Hooke (1979) mostra que os processos erosivos em canais fluviais
são fortemente influenciados pela precipitação, considerando fundamental a grandeza que os
caracterizam: as precipitações de máxima intensidade; a duração e a frequência como
variável; e a quantidade precipitada que influencia diretamente as variações do nível das
águas. Consoante este autor, altas descargas aceleram o processo erosivo.
Segundo Christofoletti (1981), o fluxo d’água é o principal agente modificador de
um canal de um rio. Nesse sentido, a ação exercida por ele sobre os materiais rochosos
componentes do leito e das margens dos rios é a principal responsável pelo equilíbrio entre as
forças erosivas e os processos de deposição de material no leito e nas margens.
O fenômeno de alargamento dos canais fluviais é provocado pelos processos de
erosão das margens que estão entre os elementos mais dinâmicos dos canais fluviais. O
entendimento sobre seu mecanismo de atuação e a quantificação da magnitude é importante
para compreender a evolução dos diversos elementos da dinâmica fluvial. A erosão das
margens possui também uma importância econômica como na perda de terrenos agricultáveis
e na proteção de obras civis construídas próximo ao canal fluvial (FERNANDEZ, 1995).
2.2 A ESTRUTURA FUNDIÁRIA E AS FORMAS DE USO E OCUPAÇÃO DA TERRA
O termo estrutura fundiária é utilizado para designar a forma de acesso à
propriedade da terra e à distribuição espacial das propriedades por uma determinada região. O
conhecimento da estrutura fundiária é de grande relevância, pois, a partir dela se compreende
melhor a estrutura agrária, o uso e a ocupação da terra.
Para melhor entender a Estrutura Fundiária do Brasil é necessário situá-la dentro
do contexto histórico de ocupação do território nacional com a implantação do regime das
capitanias hereditárias a partir de 1530, quando o território brasileiro foi dividido em enormes
faixas de terras, possibilitando a concessão das sesmarias, que foram a base da economia
colonial (TALASKA e ETGES, 2013).
As sesmarias foram grandes glebas distribuídas pela coroa portuguesa a quem se
dispusesse a cultivá-las. Com as sesmarias, num tempo relativamente curto, se estabeleceram
imensos latifúndios, ocasionados pela necessidade de ocupação em função dos interesses
mercantis europeus, implicando na formação de grandes unidades de produção (SILVA,
1980).
34
O fim do regime das sesmarias em 1822, através da resolução ministerial de José
Bonifácio, fez com que se intensificassem os movimentos de posse/ocupação e de junção
desordenada das terras por particulares (TALASKA e ETGES, 2013). Entretanto, a
recuperação econômica, em meados do século XIX, com o surgimento do ciclo exportador do
café e também com as novas condições que o desenvolvimento do capitalismo na Europa
impôs às ex-colônias, significou a redefinição da política de terras. Redefinição esta que se
configurou na Lei de Terras de 1850.
A Lei de Terras veio reafirmar a grande propriedade e teve importância crucial na
história brasileira, pois esta instituiu juridicamente uma nova forma de propriedade da terra,
que é a mediação pelo mercado. Contudo, com a proibição de aquisições de terras por outro
meio que não a compra, foi reforçado o poder dos latifundiários, afirmando-se o poder
político dos grandes proprietários (SILVA, 1980).
Para Silva (1980) a terra se constitui o meio fundamental para o desenvolvimento
da produção agrícola. A distribuição da propriedade da terra se torna então o elemento
essencial que irá delinear as principais características dessa agricultura. Segundo o autor, a
estrutura fundiária se torna, por assim dizer, o pano de fundo sobre o qual se desenrola o
processo produtivo.
Outro ponto importante no que tange ao caráter político do processo de ocupação e
demarcação das terras no Brasil foi a criação do Estatuto da Terra em 1964. Desde o período
posterior à criação da Lei de Terras de 1850 e de seu respectivo regulamento em 1854, a
aquisição da propriedade privada da terra foi transmitida de geração a geração, de forma a
manter ou a aprofundar a desigual configuração fundiária herdada dos tempos coloniais.
Somente após a Segunda Guerra Mundial e o início da década de 1950, o assunto referente à
reforma agrária toma conta do cenário nacional, através do surgimento de vários movimentos
de luta de camponeses pela terra, como as chamadas Ligas Camponesas do Nordeste.
O surgimento das Ligas Camponesas fez a luta pela terra ampliar sua dimensão
política, levando o governo brasileiro a editar a Lei nº 4.504, de 1964. O Estatuto da Terra,
como a Lei ficou conhecida, definia que o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária – IBRA
(atualmente INCRA) promoveria a elaboração do cadastro dos imóveis rurais, porém não
especificava os procedimentos técnicos necessários para a caracterização espacial destes
imóveis.
O Estatuto da Terra classificou os imóveis, segundo a situação jurídica dos
declarantes, em 4 categorias: minifúndios, empresa rural, latifúndio por exploração e
latifúndio por dimensão. Para esta classificação é fundamental o conceito de “módulo rural”
35
que corresponde à “área da propriedade familiar”, entendida como o imóvel rural que é, direta
e pessoalmente, explorado pelo agricultor e sua família, absorvendo toda a força de trabalho
familiar e garantindo-lhes a subsistência, o progresso social e econômico. O “módulo rural” é
fixado em função da região e do tipo de exploração na ocasião do cadastro e, portanto, em
última instância é uma medida de área relativa ao tipo de atividade e região.
Pelo Estatuto da Terra (artigo 4º) é considerado como minifúndio, o imóvel rural
com área inferior a um módulo; como empresa rural, o imóvel explorado “economicamente e
racionalmente” que tenha área de um módulo até 600 vezes este valor; como latifúndio por
dimensão, o imóvel rural com área superior a 600 módulos e como latifúndio por exploração,
o imóvel rural que, mantidos os mesmos limites da empresa rural, “seja mantido
inexplorado”.
A Lei nº 5.868 de 1972, cria o Sistema Nacional de Cadastro Rural – SNCR.
Subordinado ao INCRA. Na prática, ele é constituído por informações cadastrais obtidas
através de declarações dos detentores dos imóveis rurais.
Silva (1980) destaca a permanência do contraste minifúndio/latifúndio, traço
característico de uma distribuição altamente concentrada de terras. Em números, temos os
minifúndios que representam mais de 70% dos imóveis e possuem pouco mais de 10% da
área total, enquanto os latifúndios tanto por dimensão quanto por exploração perfazem menos
de 25% desses imóveis com quase 80% da área cadastrada. Os dados não deixam dúvida de
que a enorme desigualdade fundiária, uma das marcas da evolução histórica da economia
brasileira, presente desde o surgimento da economia colonial, cuja base eram o latifúndio
monocultor e o trabalho escravo, permanece até hoje (HOFFMANN, 2010).
Segundo CEARÁ (2005, p. 14), a estrutura fundiária dos sertões é marcada por
condições contraditórias, capazes de exibir uma convivência simultânea de latifúndios
improdutivos e pequenas propriedades inviáveis sob o ponto de vista social e econômico. Para
esse autor, os processos de uso e ocupação da terra induzem, por consequência, à degradação
progressiva dos solos e à perda de produtividade das lavouras de subsistência.
Considerar as formas históricas de uso e ocupação de terras nas planícies fluviais
do semiárido remete a uma necessidade básica de atendimento aos pressupostos de
manutenção dos recursos naturais, considerando sua estrutura fundiária que é nitidamente
reconhecida pela concentração de pequenas propriedades familiares rurais e áreas de
assentamentos onde se praticam atividades de subsistência.
A região dos Inhamuns/Crateús teve a sua formação em um contexto histórico
muito parecido com a formação do Estado do Ceará. O homem branco, de uma forma geral,
36
veio dos estados de Pernambuco, Piauí e Bahia. Ele adentrou as terras cearenses, tomou posse
das terras das sesmarias que eram habitadas por índios os quais tinham seus costumes
estabelecidos. Então, com a chegada dos portugueses, os índios das nações Tupis e Cariris
foram obrigados por estes a trabalhar como escravos e, rebelados, travaram batalhas. A força
bruta do homem branco venceu os nativos (PDRS, 2010).
A planície do rio Poti foi uma porta de entrada dos fazendeiros de gado os quais,
tendo que transportar o rebanho dos estados vizinhos, cruzavam o Ceará abrindo estradas em
várias direções. Novo Oriente, que à época pertencia ao município de Independência e
Crateús, possui as suas origens no chamado Ciclo do Gado, período em que todo o estado do
Ceará teve sua economia baseada neste produto de exportação.
A criação de gado foi responsável pela ocupação e organização do espaço
geográfico do Ceará, bem como pela sua primeira atividade econômica de sucesso. A pecuária
se desenvolveu no sertão, notadamente de forma extensiva, seguindo os cursos dos principais
rios e ainda permanece como a maior riqueza da economia agrária cearense, sendo praticada
na sua maioria, de forma semiextensiva (CEARÁ 2005, p. 55).
Após a decadência deste ciclo, a população dos referidos municípios se efetivou e
continuou a crescer às margens do rio, motivada por outras atividades como a agricultura,
dando continuidade a pecuária em menor proporção, complementando esta atividade com o
criatório de animais de pequeno porte (PDRS, 2010).
A interiorização da colonização estabeleceu a necessidade da agricultura e da
pecuária de subsistência para prover alimentação aos moradores dos pequenos núcleos
populacionais que iam se formando, assim como às pessoas que transitavam por esses novos
caminhos. Essa agricultura e pecuária familiar deram suporte à criação de pequenas
propriedades, os minifúndios, disseminadas no semiárido.
Corroborando, Rebouças (1997) cita que a Região Nordeste, particularmente, o
estado do Ceará, nas diversas formas de ocupação do território, fundamentou a sua economia
no aproveitamento do potencial hídrico localizado, explorando de forma extensiva tanto a
agricultura quanto a pecuária. Por sua vez, estas condições primitivas de uso e ocupação do
meio físico muito têm contribuído para a destruição do solo, o empobrecimento das pastagens
nativas e a redução das reservas de água com as consecutivas e cíclicas secas, promovendo
um agravamento dos problemas de degradação ambiental nas paisagens sertanejas.
Para Rebouças (1997) é de origem social o comportamento humano que agrava os
efeitos da seca ou da enchente – pelo desmatamento, pela ocupação das várzeas dos rios, pela
37
impermeabilização do solo no meio urbano, pelo lançamento de esgoto não tratado nos rios,
pelo desperdício da água disponível. É também de origem social a atitude político-científica
diante da questão, na qual pode prevalecer ótica enviesada de unilaterização física ou social. O
autor também revela que, nessas condições, a avaliação do problema da água de uma dada
região já não pode se restringir ao simples balanço entre oferta e demanda; deve abranger
também os inter-relacionamentos entre os seus recursos hídricos com as demais
peculiaridades geoambientais e socioculturais, tendo em vista alcançar e garantir a qualidade
de vida da sociedade, a qualidade do desenvolvimento socioeconômico e a conservação das
suas reservas de capital ecológico.
As planícies fluviais do semiárido cearense e, no caso, a planície do rio Poti,
dentro da política de açudagem implantada pelo Governo do Estado do Ceará, tem o seu uso
intensificado, principalmente na década de 1990, quando nela foram construídos vários
barramentos que se constituem como reservas hídricas as quais garantirão o abastecimento de
água no período de estiagem. A finalidade destas é o abastecimento humano e a
dessedentação de animais.
No Nordeste, mais especificamente no Ceará, a implementação de grandes
projetos hídricos vem para atender esta política de açudagem que na sua retórica é a solução
para o combate às secas recorrentes. Os projetos de implantação de barragens e sua gestão são
considerados empreendimentos indispensáveis ou de grande importância para o
desenvolvimento econômico-social do nordeste brasileiro e se propõem no discurso reservar
água para os longos períodos de escassez hídrica que afetam de diversas formas o meio no
qual estes projetos se inserem com impactos de cunho social e ambiental.
Para Vainer (1992), estes reservatórios são empreendimentos que consolidam o
processo de apropriação de recursos naturais e humanos em determinados pontos do território
sob a lógica estritamente econômica, respondendo a decisões e definições configuradas em
espaços relacionais exógenos aos das populações/regiões das proximidades de tais obras.
As principais consequências deste processo são os deslocamentos compulsórios
da população, que geralmente ocasionam perdas das referências espaciais, sociais e culturais,
pois a materialização do modo de vida e subsistência dos atingidos com a instalação da
barragem será transformada em um “grande lago”. Desta forma, eles precisam se adaptar às
novas condições de sobrevivência e reprodução de si e, na maioria das vezes, se veem
obrigados a abandonar o que construíram ao longo da vida. Naturalmente, tais mudanças,
afetam de forma grosseira a estrutura fundiária da microregião atingida.
38
Vainer e Araújo (1992), ao discutirem os custos e benefícios espaciais dos
grandes projetos, argumentam que neste formato particular de apropriação do território, as
populações atingidas que configuraram e ocupam estes espaços como também a sua vida
social, passam a ser obstáculos ao processo de apropriação territorial pelo capital.
Aqueles, os quais justificam a necessidade de construção de grandes barragens,
mencionam que apesar das transformações que estas causam, incluindo a desorganização na
estrutura fundiária local, suas contribuições são importantes para o desenvolvimento e trazem
mais benefícios do que problemas. Argumentam que o armazenamento de água doce é
fundamental para a sociedade, considerando a escassez cada vez maior desse recurso,
principalmente no Nordeste Brasileiro. Também, são comumente ressaltados os diversos usos
como: abastecimento humano, incremento da produção de alimentos resultante de projetos de
irrigação ou controle de cheias.
Em outra perspectiva, são destacados efeitos negativos como: alterações na
dinâmica fluvial, inundação de terras férteis, a destruição de florestas e do patrimônio
genético, o alagamento de cidades e infraestruturas, o deslocamento compulsório de pessoas,
a invasão de terras indígenas, a degradação da qualidade da água e as perdas ictiológicas.
Outrossim, mudanças involuntárias de uma família para um novo local podem acarretar custos
sociais que vão muito além dos custos financeiros e estão relacionados à desestruturação de
laços de pertencimento ao lugar. O ato de retirar uma comunidade, ou parte dela, de seu
habitat físico e social pode acarretar aspectos negativos que não têm solução eficiente.
Na construção das grandes barragens, o volume d´água acumulado para os longos
períodos de estiagem na região, certamente, causará grandes impactos no contexto
socioambiental. Propriedades rurais, benfeitorias, flora, fauna e, principalmente, as pessoas
atingidas pelo lago formado a partir do barramento do curso fluvial, são os principais
elementos impactados. Vale ressaltar que todo o discurso governamental tem uma retórica
peculiar que nem sempre é referenciada pela prática – como a situação se apresenta na
realidade – e acaba desenvolvendo ações que dá aos atingidos a única certeza de que deixarão
para trás uma história e fortes raízes culturais em nome de uma causa que, na maioria das
vezes, não é sua e nem sequer sabem a quem irá beneficiar efetivamente.
39
2.2.1 O conceito de atingido
O Ministério da Integração Nacional considera atingido1 a parcela da população
enquadrada em, pelo menos, um dos seguintes requisitos: proprietário ou posseiro - residente
em área a ser desapropriada; proprietário ou posseiro - não residente; morador, parceleiro ou
meeiro, arrendatário, rendeiro, herdeiro, autônomo e trabalhador rural - não detentor da posse
ou do domínio da terra, que mora e/ou produz no imóvel, ou possui benfeitorias que nele
permanecem; benfeitor - morador que possui benfeitorias que permanecem no imóvel; e,
transitório - ocupantes de imóveis situados próximos às barragens, sangradouros ou áreas de
jazidas, que se tornam insalubres devido ao excesso de poeira, explosões e/ou tráfico intenso
de máquinas, atingidos somente durante o período de construção da obra, mas que após a sua
conclusão retornarão às antigas moradias (MIN, 2006).
Para a condição do imóvel o Ministério da Integração se refere à situação de
alagamento da propriedade que, conforme o caso, poderá atingir também suas benfeitorias
quando do limite da cota máxima do volume útil de água armazenado, podendo ser:
totalmente atingida; parcialmente atingida (mais de 2/3 da área); parcialmente atingida
(menos de 2/3 da área). Da mesma forma a construção do reservatório poderá atingir:
propriedade com benfeitorias e propriedade sem benfeitorias.
A produção acadêmica e técnica, bem como as lutas e reivindicações dos
movimentos de atingidos, em âmbito internacional e nacional, têm ampliado de maneira
progressiva o escopo do conceito de atingido, pois inicialmente apenas os proprietários de
terra eram reconhecidos como portadores de um direito (direito à indenização pela
propriedade inundada), configurando o que já foi qualificado de concepção “territorial
patrimonialista” (VAINER, 2008).
Termo originalmente técnico, a palavra “atingido” ganhou centralidade nos
debates e conflitos relativos à identificação e reparação de grupos sociais, famílias ou
indivíduos prejudicados pelo planejamento, pela implementação e operação de barragens. O
primeiro passo para uma abordagem abrangente da questão está no entendimento de que a
construção de uma barragem deflagra um processo de mudança social – processo
simultaneamente econômico, político, cultural e ambiental – que interfere em várias
dimensões e escalas espaciais e temporais da vida coletiva. Neste processo de mudança, além
de alterações patrimoniais e morfológicas se instauram novas dinâmicas socioeconômicas,
1 Manual Operativo para reassentamento em decorrência de processos de desapropriação para construção de
reservatórios públicos,
40
novos grupos sociais emergem na região de implantação, interesses e problemas se
manifestam (VAINER, 2008).
Para este autor, entende-se que sendo essencialmente uma categoria social em
disputa, a noção de atingido varia no tempo e no espaço, conforme os contextos políticos e
culturais e em consonância com o desenrolar e desenlace dos conflitos opondo diferentes
atores sociais envolvidos no processo de concepção, implantação e operação de projetos.
Assim, ao abordar a discussão acerca do conceito de atingido é necessário compreender que
se está discutindo acerca do reconhecimento e legitimação de direitos.
Vainer (Op.cit.) ressalta outra relevante questão, concernente aos meios de
ressarcir ou reparar os danos sofridos pelos que vierem a ser reconhecidos como atingidos,
com o que se pode chamar de abordagem ou estratégia territorial patrimonialista. A
perspectiva e a ação do empreendedor, neste caso, são direcionadas para a aquisição do
domínio, isto é, da propriedade da área. Diz a tradição do direito brasileiro que sendo
reconhecido o interesse público do empreendimento, concede-se ao empreendedor o direito de
desapropriação.
A população nesta concepção é vista como um obstáculo a ser removido, de modo
a viabilizar o empreendimento. É evidente que esta abordagem apenas reconhecia como
atingidos os proprietários de terras. Conforme esse autor a perspectiva territorial-
patrimonialista era, quase sempre, indenizatória e para esta, não há propriamente impactos,
nem atingidos, menos ainda qualquer coisa que possa ser entendida como direitos dos
atingidos; o que há é o direito de propriedade e, nesse caso, um direito de propriedade
restringido pela “utilidade pública”.
Ainda hoje, entretanto, em várias circunstâncias, assiste-se à permanência das
concepções e estratégias territoriais-patrimonialistas, que buscam circunscrever o problema a
duas dimensões: o território atingido é concebido como sendo a área a ser inundada e a
população atingida é constituída pelos proprietários da área a ser inundada (VAINER, 2008).
Uma concepção colocada por Vainer (2008) é a concepção hídrica que identifica
atingido e inundado a qual circunscreve espacialmente os efeitos do empreendimento
estritamente à área a ser inundada. Para este autor, o atingido passa a ser entendido como
inundado e, portanto, como deslocado compulsório – ou, como é corrente na linguagem do
Banco Mundial, reassentado involuntário. Na verdade, a concepção hídrica não é senão uma
reformulação da concepção territorial-patrimonialista, uma vez que continua prevalecendo a
estratégia exclusiva de assumir o domínio da área a ser ocupada pelo projeto, e não a
responsabilidade social e ambiental do empreendedor.
41
3 PROCEDIMENTOS TÉCNICOS OPERACIONAIS
3.1 LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO
A partir da análise da temática foram elencados os principais eixos norteadores
teórico-metodológicos: dinâmica físico-natural em canais fluviais, aspectos sociais, ações de
instituições na implantação dos barramentos e do uso e ocupação da terra. As pesquisas
bibliográficas foram realizadas em instituições públicas como COGERH, SEMACE, DNOCS,
IDACE, Exército (40 BI), Secretarias Municipais (CRATEÚS), bem como em livros
específicos e artigos de referência nas principais revistas nacionais e internacionais no portal
de periódicos da CAPES.
Como parte do levantamento bibliográfico foi realizado todo o resgate histórico
de cada barramento analisado nesta pesquisa junto a COGERH e ao 40º Batalhão de
Infantaria.
3.2 LEVANTAMENTO DE DADOS GEOCARTOGRÁFICOS E DE SENSORIAMENTO
REMOTO
Para o mapeamento básico e na perspectiva de execução do trabalho no
atendimento aos objetivos propostos se realizou uma ampla pesquisa geocartográfica dividida
inicialmente em levantamento dos elementos da cartografia básica, cartografia temática,
dados de sensoriamento remoto. Posteriormente, no tratamento destes para alimentação do
banco de dados geográfico georreferenciado, montado para subsidiar esta pesquisa.
Esses dados foram coletados tanto em formato analógico (impresso) quanto digital
(vetoriais e matriciais), seguindo as regras de disponibilidade das respectivas fontes que se
encontram sistematizadas a seguir:
RADAMBRASIL, Folha Jaguaribe/Natal – SB. 24/25, 1981- Geologia;
Geomorfologia; Pedologia. Disponível em http://biblioteca.ibge.gov.br;
Mapas Planialtimétricos, FOLHA SB.24-V-C-III-Crateús. Escala 1:100.000,
SUDENE/DSG, 1984;
Mapas Planialtimétricos, FOLHA SB.24-V-C-VI-Novo Oriente. Escala 1:100.000,
SUDENE/DSG, 1984;
42
Arquivos Vetoriais e Mapas em PDF de Geologia e Recursos Minerais do Ceará, na escala
1:500.000. CPRM. Disponível em http://geobank.sa.cprm.gov.br/;
Imagem Geocover disponibilizada gratuitamente pelo sítio http://glcfapp.glcf.umd/ com
resolução espacial de 14,5m;
Imagens LandSat 5 sensor Thematic Mapper (TM), ano 2011, disponibilizadas em
http://www.dgi.inpe.br/ com resolução espacial de 30m nas bandas 1, 2, 3, 4, 5 e 7.
(Figura 2).
Imagens do Google Earth adquiridas gratuitamente online pelo sítio
http://google.com.br/intl/pt-BR/Earth/index.html/ em multi resolução espacial;
Dados SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission) baixadas gratuitamente em
http://www.dsr.inpe.br/topodata/ com precisão espacial de 30m.
Base vetorial em formato shapefile da divisão político-administrativa dos municípios do
Ceará publicados pela instituição pública IPECE, 2010;
Base vetorial em formato shapefile das rodovias cearenses da instituição pública
FUNCEME, 2011.
Base vetorial em formato shapefile dos Recursos hídricos disponibilizadas pela SRH-CE e
retificadas pelas imagens de satélites da base de dados;
Curvas de nível em formato vetorial de shapefile geradas a partir de dados SRTM e
conferidas a partir do levantamento de campo;
Base vetorial em formato shapefile das Unidades Geoambientais do estado do Ceará, de
acordo com SOUZA, (2005), publicada e disponibilizada pela FUNCEME;
43
Figura 2: Informações técnicas das imagens do satélite Landsat utilizadas na pesquisa
Fonte: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) - Catálogo de Imagens (2011).
Características e Informações Técnicas das Imagens de Satélites
Utilizadas como subsídio a Pesquisa
44
3.2.1 Procedimentos Operacionais
Após o levantamento cartográfico, foram executadas adequações como
transformação dos dados analógicos em digitais por meio de escaneamento, bem como o
georreferenciamento das imagens de satélites e a compatibilização dos datuns e sistemas de
projeções dos arquivos levantados ao sistema de referências do banco de dados da pesquisa,
que tem como base o Datum planimétrico South American 1969 – SAD 69 e o Sistema de
Projeção Universal Transversa de Mercator – UTM.
Esses procedimentos foram possibilitados a partir do geoprocessamento e das
funcionalidades de tratamento computacional dos dados espaciais pelo Sistema de Informação
Geográfica – SIG. Com essa finalidade, foram utilizados os SIGs ArcGis, Sistema de
Processamento de Informações Georreferenciadas – SPRING e QGIS. Todos suportados em
plataforma Windows. Em campo, foi utilizado aparelho de navegação GPS e-trex 10 da marca
Garmim, também para subsidiar os mapeamentos executados. A utilização desse tipo de
aparelho e a sua precisão foram importantes devido à compatibilidade da escala de execução
dos produtos cartográficos, consequentemente, da análise destes.
Destaca-se que a escala adotada para os mapeamentos propostos atendeu: as
escalas originais dos respectivos levantamentos elencados no tópico de levantamentos
geocartográficos e de dados de sensoriamento remoto, ou seja, para os mapas em que se
utilizou dados secundários. Já para os mapas que foram produzidos, a partir de levantamentos
primários notadamente o de uso e cobertura, como também na análise de toda a pesquisa se
adotou a escala de 1:100.000. No entanto, as publicações destes mapas seguiram na escala de
1:200.000. Isso ocorreu devido à grande extensão da área de estudo no eixo das paralelas que
exigiria um formato de folha maior que o A3 para sua impressão, dificultando assim o seu
manejo.
Os produtos cartográficos gerados a partir da metodologia, dos materiais e dos
procedimentos operacionais descritos foram sistematizados da seguinte forma:
Mapa Básico,
Mapa de Sistemas Ambientais,
Mapa de Localização da área de estudo,
Mapa de Localização das barragens,
Mapa com perfis topográficos,
Mapa de relevo sombreado com recursos hídricos,
45
Mapa de declividade,
Mapa hipsométrico,
Mapa de uso e cobertura do solo e Mapa prognóstico da área de inundação do futuro Lago
de Fronteira.
3.3 LEVANTAMENTOS DE CAMPO E ANÁLISES LABORATORIAIS
A partir dos objetivos da pesquisa foram realizadas visitas ao campo para o
reconhecimento da área, a demarcação dos pontos de monitoramento sazonal, o
monitoramento e a escolha das tipologias representativas para execução do mapa de uso e
cobertura e validação/correção dos mapeamentos, sobretudo, o de uso e cobertura do solo.
Identificou-se os barramentos construídos, Carnaubal e Flor do Campo (Figura 8),
local de implantação da barragem. Realizou-se contato com pessoas da comunidade do
entorno do barramento Flor do Campo, no município de Novo Oriente – CE. Também, foi
realizada uma conversa informal acerca da construção e do deslocamento da comunidade
atingida.
Para o monitoramento relacionado às alterações do canal foram estabelecidas
quatro seções, cujo acompanhamento foi feito em períodos pré e pós chuvas, totalizando duas
campanhas. A escolha das seções considerou características de áreas de montante e jusante
dos barramentos, estando assim distribuídas: (1) Jusante da barragem Flor do Campo; (2)
Montante da barragem Carnaubal; (3) Jusante da barragem Carnaubal; (4) Jusante da
barragem Lago de Fronteiras (a ser implantada). Nas referidas seções foram realizados perfis
transversais no canal do Rio Poti para efeito de acompanhamento da dinâmica do canal em
períodos sazonais (Figura 3). Em paralelo foram coletadas amostras de sedimentos para
caracterização e correlação posterior à dinâmica de fundo e margens. Além disso, seguiu-se
com a observação das formas de manejo da terra e dos principais tipos de cobertura.
Para realização dos perfis topográficos, utilizou-se de uma estação total
(TOPCON) do Laboratório de Geologia e Geomorfologia Costeira e Oceânica (LGCO) da
UECE para aferir medições. Posteriormente, de posse dos dados coletados, elaborou-se os
gráficos com a utilização do software Excel. Em cada perfil foram coletadas amostras das
margens esquerda, direita e do leito para análise granulométrica.
46
Figura 3: Espacialização dos perfis topográficos realizados
Fonte: Dados da pesquisa
Organizado por Martovania Monte e Gonçalves Júnior
As análises granulométricas dos sedimentos foram realizadas junto ao LGCO, que
deu apoio a esta pesquisa, tendo como base o princípio metodológico estabelecido por Suguio
(1973) que trata sobre a separação das partículas a partir do método de peneiramento úmido
(finos) e mecânico (grosseiro). A escala PHI utilizada, representa a distribuição
granulométrica, sendo que quanto mais positivo o valor, mais finos são os grãos até chegar a
categoria das argilas (valor 9) e quanto mais negativo o valor, mais grosseiro será o
sedimento. Os dados obtidos da análise das amostras foram organizados em gráficos,
utilizando-se o software Excel (Figura 4).
Por não ter havido precipitações significativas no período das observações, as
amostras de sedimentos foram coletadas apenas na primeira campanha, pois o tempo entre
estas não foi suficiente para promover alterações relevantes uma vez que o leito permaneceu
na maior parte do período seco, salvo durante aproximadamente 60 dias nos meses de julho e
Perfil 01
Perfil 03
Perfil 04
Perfil 02
47
agosto/2013, quando o fluxo permaneceu contínuo durante a abertura das comportas do açude
Flor do Campo em alguns trechos do canal.
Figura 4: Amostragem, vidrarias e equipamentos utilizados nas análises granulométricas [a)
Cadinho com amostras b) Balança de precisão. c) Estufa. d) Jogo de peneiras. e) Provetas para
pipetagem. f) Agitador de peneiras (Rot-up)].
Fotos: Martovania Monte (2013)
3.4 PERFIL SOCIOECONÔMICO DA POPULAÇÃO ATINGIDA E AÇÃO
INSTITUCIONAL
Os dados referentes à população atingida foram coletados em relatórios técnicos
do DNOCS, também por meio de visitas realizadas às localidades atingidas. Foram
consultados documentos do Comitê de Apoio aos Produtores do Lago Fronteiras e realizadas
entrevistas semiestruturadas com pessoas atingidas pela implantação das obras da barragem
Lago de Fronteiras.
Foi visitado o local onde será construída a barragem Lago de Fronteira e foram
realizados contatos com as comunidades: Poti, Cabaças, Ibiapaba, Curral Velho e Assis, as
quais serão atingidas pela construção do lago. Na localidade de Ibiapaba foi realizada uma
entrevista informal com a presidente do Comitê dos produtores do Lago de Fronteiras, a qual
fez uma explanação sobre o processo de implantação da barragem e da reação em relação à
obra, inclusive sobre o andamento até o momento, especificamente do que acontecia com as
comunidades envolvidas.
.
a b c
d e f
48
4 CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL
4.1 ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS
Para Mendonça (2009), a ação humana ganha de maneira lenta, mas cada vez mais
forte, importância na análise físico-geográfica, constituindo um fator dinamizador da
paisagem.
Veyret (1999, p. 6 apud Mendonça 2001) nos diz que a noção de meio ambiente
não recobre somente a natureza. Este termo designa também as relações de interdependência
que existem entre o homem, as sociedades e os componentes físicos bióticos do meio e
integra também seus aspectos econômicos, sociais e culturais.
A ação do homem sobre o meio se intensifica a cada dia, podendo ser destacada
em relação à dinâmica fluvial, principalmente, quando envolve grandes empreendimentos
como barramentos em rios semiáridos, os quais apresentam caráter intermitente, colocando a
necessidade de captação de águas para consumo humano e irrigação. Esta situação é
percebida no rio Poti. Em Novo Oriente, a sede municipal se encontra afastada da área da
planície, enquanto que, em Crateús, a sede municipal se insere totalmente nesta, bem como o
restante da área municipal, resultando numa análise diferenciada sobre os dois municípios.
Os aspectos socioeconômicos revelam as ações dos agentes sociais, o modo como
eles se manifestam e como produzem o espaço. Neste trabalho, trataremos principalmente dos
estudos demográficos e das condições de vida da população dos referidos municípios.
A estruturação do espaço em Crateús, até o início de 1996, era composta por oito
distritos: o distrito sede- Crateús e os distritos de Ibiapaba, Irapuá, Monte Nebo, Oiticica,
Poti, Santo Antônio e Tucuns. A Lei municipal nº 075/96 criou mais cinco distritos: Curral
Velho, Santana, Realejo, Lagoa das Pedras e Assis. Todos desmembrados dos antigos distritos
(IBGE, 2012). Os distritos de Curral Velho e Assis foram desmembrados do distrito de Poti.
Realejo resultou da divisão do distrito de Tucuns, tendo parte de sua divisa demarcada pelo
Riacho Boqueirão e Riacho da Pendência. Os distritos de Lagoa das Pedras e Santana tiveram
sua origem no distrito de Monte Nebo.
A população de Crateús, em 2010, correspondia a 72.812 habitantes, o que o
torna o maior município em termos de contingente populacional na bacia dos Sertões de
Crateús. Esta população alcançou um crescimento relativo de aproximadamente 2,7% na
última década, pois registrava 70.898 habitantes no ano 2000, segundo dados dos censos
demográficos do IBGE. Deste total 52.644 (72,30 %) residem na área urbana e 20.168 (27,70
49
%) residem na zona rural. A área do município corresponde a 2.985,143 km² e a densidade
demográfica é de 24,3hab/km².
A taxa de crescimento da população urbana é significativamente maior do que a
taxa de crescimento da população rural. Estes indicadores demográficos remetem o município
a uma situação que exige bastante cautela nas ações de planejamento, considerando que será
necessário um tratamento diferenciado para o meio urbano e para o rural, no que diz respeito
aos equipamentos sociais, econômicos, de prestação de serviços e de produção e distribuição
de bens, que atendam as distintas demandas da comunidade urbana e rural.
O menor crescimento da população rural do município se deve, principalmente, ao
processo migratório. A estiagem severa é um fator relevante a ser considerado no meio rural,
pois impõe a muitas comunidades o deslocamento em virtude de não conseguirem sua
inserção produtiva, tampouco, o atendimento de suas necessidades sociais básicas. Este fator
faz com que muitas pessoas deixem seus lugares de origem, em direção à sede do município,
em busca de melhores condições de vida e oportunidades de trabalho. Além disso, decorrem
ocupações desordenadas e aumento da pressão por atendimento em diversos serviços,
sobretudo, nos públicos.
Dessa forma, verifica-se que o contingente populacional de Crateús se concentra
notadamente nas áreas urbanas, razão pela qual exige uma demanda maior por recursos
hídricos nessas áreas e a necessidade de aprofundar as discussões e reflexões no estudo do
espaço urbano. Nesse contexto, o município é atendido por incentivos do PAC (Programa de
Aceleração de Crescimento) do Governo Federal, com recursos para a execução de projetos
de grandes barragens como Lago de Fronteiras, o qual tem como um dos objetivos: suprir a
escassez hídrica e evitar futuros colapsos no abastecimento pelos quais tem passado o
município e toda a região dos sertões de Crateús.
A população do município possui uma distribuição equivalente segundo o gênero,
com uma proporção de 48,77% de homens e 51,23% de mulheres. Aproximadamente 24,93%
da população é composta de crianças de 0-14 anos de idade, 65,04% possui entre 15 e 64 anos
e 10,02 % tem mais de 64 anos de idade, de acordo com dados do IBGE (2010).
A diminuição da taxa de fecundidade foi um comportamento percebido na
dinâmica populacional. Essa caiu de 2,7 em 2000 para 2,1 em 2010, atribuindo-se em parte ao
rápido crescimento urbano e às novas tecnologias, principalmente, as de comunicação que
contribuíram para a formação de novos valores em relação à composição familiar.
O Produto Interno Bruto do município se concentra nas atividades agropecuárias
com 6,34%, industriais 14,61% e de serviços 79,05% (IPECE, 2012).
50
Outras atividades também são desenvolvidas no município como, por exemplo, o
artesanato com a produção de bordados diversos, crochês, chapéus de palha, jarros de louça,
os quais são exemplos de peças produzidas à mão por famílias da Agricultura Familiar. A
maioria dos artesãos são mulheres, que entre uma ocupação e outra se dedicam a esta
atividade artesanal. Vale ressaltar que, em períodos de estiagem, o artesanato se torna fonte de
renda essencial da família, envolvendo homens e mulheres na produção, os quais veem neste
trabalho uma renda a mais no final do mês.
O abastecimento de água da sede do município, com índice de cobertura de
99,96%, é proveniente do reservatório Carnaubal que se localiza a aproximadamente 12
quilômetros da sede. A captação da água é feita desde o dia 26 de agosto do ano de 2013 até a
data do presente trabalho, quase que totalmente através da nova adutora de 300 mm de engate
rápido e complementada pela captação na barragem do Batalhão (Poti) que fica situada em
área de adensamento populacional (CAGECE, 2013).
Crateús possui uma rede de esgotamento sanitário com índice de cobertura de
73,52%, administrada pela CAGECE. Ela atende a vários bairros com estações de tratamento,
denominadas ETE (Estação de Tratamento de Esgoto), sendo dois do tipo lagoas em série, e
treze do tipo decanto digestor/filtro anaeróbio, estando uma desativada (Figura 5). O sistema
de coleta é por gravidade e todas as estações lançam seus efluentes no rio Poti.
Figura 5: Estações de Tratamento de Esgoto (ETE) no município de Crateús [Lagoa de
estabilização e decanto digestor]
Fotos: Jocélio Silva (2013).
Vale ressaltar que, embora o município possua um bom índice de cobertura de
esgotamento sanitário, este não reflete a realidade, pois de modo geral as estações do tipo
decanto digestores (ETE) não apresentam condições ideias de funcionamento e têm como
agravante receber efluentes da maior parte da rede sanitária, ficando as lagoas em série com
51
pequena participação. Assim, todos os efluentes que poderiam ter tratamento eficiente são
lançados diretamente no rio Poti que tem sido usado, na área urbana da cidade, como um
grande receptor para lançamentos de esgotos, de lixos e de efluentes. O alto grau de poluição
observado no rio Poti, portanto, o deixa incapaz de degradar estes contaminantes e restituir
seu equilíbrio natural, apresentando-se bastante eutrofizado (Figuras 3 e 4).
Figura 6: Leito do rio Poti eutrofizado
Foto: Martovania Monte (2013)
Figura 7: Lixo jogado no leito do rio.
Foto: Martovania Monte (2013)
Lixo
52
A complementação do abastecimento de água, sobretudo, nos distritos do
município se dá através de poços amazonas e poços comuns, muitas vezes, localizados às
margens do rio Poti. O esgotamento sanitário é feito através de fossas sépticas.
O município de Novo Oriente foi criado pela Lei nº 3855 de 10 de outubro de
1957 IBGE (2012). Este, até esta data, era distrito de Independência e a sua instalação se
efetivou em 15 de dezembro do mesmo ano. Possui, na sua estruturação espacial, os distritos
de Palestina, Emaús, Três Irmãos e São Raimundo. Situa-se na região Centro-oeste do Estado,
referenciado pelas coordenadas 5º 32’ 04’’ S e 40º 46’ 27’’ W, com altitude média de 333 m.
Seus municípios limítrofes são: ao norte, Crateús; ao sul, estado do Piauí, Quiterianopólis e
Independência; a leste, Independência e Crateús e a oeste o estado do Piauí. A distância em
linha reta à capital cearense é de 324 km.
A população de Novo Oriente correspondia a 27.453 habitantes em 2010. Deste
total 14.230 residindo na área urbana, gerando um grau de urbanização de aproximadamente
51,83%, e 13.223 (48,16%) na zona rural. O município alcançou um crescimento relativo de
aproximadamente 5% na última década, pois registrava 26.119 habitantes no ano 2000. Houve
uma redução na taxa de população rural que no ano 2000 era de 51,34% e reduziu para
48,17% em 2010 (IBGE, 2012).
Analisando os dados populacionais para o município, percebe-se que existe uma
diferença pequena entre a população na área rural e urbana, indicando que mesmo com a
prolongada estação seca, a população tem resistido e permanecido no campo. Portanto, não
havendo de forma significativa retração desta população.
Segundo o gênero, a população tem se distribuído de forma equivalente, com uma
proporção de 49,35% de homens e 50,65% de mulheres. Cerca de 26,73% são crianças na
faixa etária de 0-14 anos, 64,08% correspondem a idade de 15 a 64 anos e 9,19% são os que
estão acima de 64 anos, de acordo com os dados do censo demográfico de 2010 do IBGE.
O Produto Interno Bruto do município se concentra nas atividades agropecuárias
com 11,57%, industriais 16,50% e de serviços 71,94% (IPECE, 2012).
O abastecimento de água da sede do município com índice de cobertura de 83% é
proveniente do reservatório Flor do Campo. O esgotamento sanitário possui índice de
cobertura de 37,7%, administrado pela CAGECE e concentrado na zona urbana.
Após a análise individual dos dois municípios, é possível fazer algumas
comparações entre estes. Notaremos que se estes dados são tratados em percentual, os dois
municípios apresentam resultados pouco divergentes, a exemplo das atividades econômicas
53
em que se percebe apenas o setor de agropecuária com maior diferença (Figura 8 e 9), apesar
da grande disparidade no contingente populacional em números absolutos (Figura 7).
Figura 8: Distribuição percentual das atividades econômicas na cidade de Crateús
Fonte: CEARÁ (2012)
Figura 9: Distribuição percentual das atividades econômicas na cidade de Novo
Oriente.
Fonte: CEARÁ (2012)
No setor do saneamento básico, a análise percentual nos permite observar que
tanto no abastecimento d’água quanto no esgotamento sanitário, Crateús apresenta valores
mais satisfatórios no atendimento a sua população, conforme (Figura 10).
6,34%
14,61%
79,05%
Crateús
Agropecuária Indústria
Serviços
11,57%
16,50%
71,94%
Novo Oriente
Agropecuária Indústria
Serviços
54
Figura 10: Percentual de atendimento do saneamento básico nos municípios de
Crateús e Novo Oriente.
Fonte: CEARÁ (2012)
4.2 COMPONENTES GEOMBIENTAIS NO CONTEXTO DA BACIA DOS SERTÕES DE
CRATEÚS
A caracterização dos componentes físico-ambientais que integram a bacia dos
Sertões de Crateús foi realizada partindo de uma análise de seus elementos tendo em vista a
observância de dados unitemáticos para compor a descrição integrada dos mesmos.
Souza (2000) coloca que no território cearense as influências estruturais se
manifestam através de ocorrências de relevos próprios dos núcleos cratônicos e das bacias
sedimentares paleomesozóicas e que as litologias interferem através da exposição de fácies
diferentes de dissecação e de formas derivadas do trabalho seletivo dos processos
morfodinâmicos (Mapa 2). Neste contexto, a bacia dos Sertões de Crateús está inserida em
terrenos do embasamento cristalino, com rochas pré-cambrianas não diferenciadas,
caracterizadas por rochas migmatizadas do tipo gnaisse, xisto e quartzito, com intrusões de
granito e pegmatito, e xenólitos de anfibólito (DNOCS, 2011).
A compartimentação do relevo cearense segundo Souza (2000) decorre,
eminentemente, de eventos naturais do período pleistocênico e engloba compartimentos
bastante diferenciados, tratando-se da prevalência de superfícies rebaixadas do sertão
recobertas por caatinga, compreendendo extensas depressões periféricas de bordos de bacias
sedimentares em contato com rochas do escudo cristalino. Dentre estes compartimentos,
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Abastecimento por Açude Esgotamento Sanitário
Crateús Novo Oriente
0
50.000
100.000
População
55
merecem destaque na área o planalto da Ibiapaba, a depressão sertaneja, a planície fluvial do
rio Poti e áreas de inundação sazonal.
O clima predominante na região é o semiárido, caracterizado pela existência de
uma estação chuvosa de menor duração e outra seca mais prolongada. Tais características, ao
lado da acentuada irregularidade do ritmo das chuvas no tempo e no espaço, singularizam o
regime pluviométrico da região, trazendo fortes interferências no regime hidrológico dos
cursos d’água. Apresenta pluviometria média anual de 697 mm, concentrada no primeiro
semestre. A temperatura média anual oscila entre 23,9 e 29,0 º C, com o período
setembro/dezembro apresentando as mais altas temperaturas do ano (IPECE, 2012).
A rede hidrográfica tem destaque para a sub-bacia do rio Poti que é formada pelo
rio homônimo e pelo seu afluente Macambira, cuja confluência só se dá no Piauí logo após a
fronteira entre os Estados. Os principais afluentes do rio Poti são: pela margem direita, o
riacho do Meio, que decorre da junção dos riachos Independência e Jucá, o riacho do Mato e o
rio Jatobá; pela margem esquerda, o riacho do boqueirão, riachos do Desterro e Três Irmãos.
A maioria dos rios e riachos da bacia têm suas nascentes no semiárido e quase sempre
apresentam caráter de intermitência e cheias excepcionais. À semelhança dos seus tributários,
o rio Poti é um rio que depende das chuvas e, portanto, suas águas evoluem conforme o
desenrolar da estação chuvosa, como costumeiramente ocorre com os rios de regiões
semiáridas (Mapa 2).
Em termos dos recursos hídricos subterrâneos, o aquífero cristalino apresenta
baixo potencial hidrogeológico e qualidade da água bastante salobra, em virtude dos elevados
teores de sais. Ocorrem, ainda, com alguma representatividade o aquífero Serra Grande,
associado a área da Chapada da Ibiapaba, o qual apresenta potencial hidrogeológico elevado e
água de boa qualidade, sendo sua exploração dificultada pela profundidade do nível estático.
O aquífero aluvial, por sua vez, encontra-se associado às várzeas dos principais cursos d'água
da região, apresentando potencial hidrogeológico elevado e água de boa qualidade, sendo
intensivamente explorado pela população ribeirinha (PDDU, 2001 – Crateús).
De acordo com Souza (2000), a distribuição espacial dos solos do Ceará apresenta
estreita relação com a compartimentação geomorfológica do Estado. Como o embasamento
cristalino predomina na região, em geral os solos apresentam características marcantes de serem
pouco profundos e pedregosos, embora férteis e com boa capacidade de retenção de água. As
aluviões possuem os melhores níveis de fertilidade (ÁRIDAS, 1995). Os solos predominantes
e com representatividade na área são os neossolos, latossolos vermelho-amarelo, luvissolos e
os planossolos solódicos que, em geral, têm seu uso para agricultura familiar e pecuária. A
56
vegetação é xerófita da caatinga na forma arbustiva aberta, o carrasco, a floresta caducifólia
espinhosa e floresta subcaducifólia tropical pluvial (IPECE, 2012).
O conhecimento e estudo dos sistemas naturais permitem ao homem o
entendimento dos ambientes e compõem a base da planificação do desenvolvimento que visa
a criar melhores condições e bem estar para os mesmos (Souza, 2000). Dentre os sistemas
ambientais caracterizados por Souza (1979) com ênfase nos estudos de natureza
geomorfológica, a bacia dos Sertões de Crateús se apresenta compartimentada da seguinte
forma: Planalto da Ibiapaba (rebordo úmido e reverso seco), Depressão Sertaneja (Sertões de
Crateús), Depressão Periférica da Ibiapaba e Planície Fluvial do rio Poti, como unidades mais
representativas; e Cristas Residuais e Depressões Sertanejas Meridional, do Sertão Central e
do Acaraú-Coreaú como unidades menos representativas. Neste trabalho, dar-se-á ênfase às
unidades mais representativas da bacia em análise (Mapa 3).
O Planalto da Ibiapaba abrange toda a porção ocidental do Ceará nos limites com o
estado do Piauí. Dispõe-se de sul para norte através de um escapamento contínuo abrupto e
bastante festonado, somente rompido na área de superimposição do rio Poti. De maneira
generalizada, a escarpa é bastante festonada desde a “percée" do Poti em direção norte. Isso
decorre do trabalho de erosão remontante proporcionado pela drenagem obsequente que
demanda coletores subsequentes na depressão periférica. O front tem declive variável entre
25º a 30º que evidencia forte ruptura topográfica com as depressões circunjacentes (Mapa 4).
Prepondera a classe dos solos podzólicos vermelho-amarelo com características
dominantes de muito profundo a moderadamente profundo, com textura arenosa,
excessivamente drenados, suscetível à erosão, com fertilidade natural média e baixa retenção
de umidade que limita seu uso. É uma área de intenso uso agrícola com remanescentes
isolados da mata pluvionebular com evidencias de degradação dos recursos vegetais que tem
levado a um esgotamento do potencial edáfico (SOUZA, 2000).
Segundo Souza (1979) as altitudes médias do planalto da Ibiapaba estão em torno
de 750m (Mapa 4) observando que, tanto de norte para sul como de leste para oeste, as
condições ecológicas são substancialmente diferenciadas. Nos setores setentrionais os efeitos
das chuvas orográficas são mais evidentes tanto no front como no reverso imediato.
Transposto o obstáculo topográfico cessam os efeitos das chuvas. A partir deste fenômeno,
passa-se da faixa úmida recoberta pela mata perenifólia para a região do carrasco, na qual a
semiaridez é o principal fator condicionador ao lado de latossolos, regossolos e areias
quartzosas que acobertam todo o planalto em território cearense. De norte para sul,
sobremaneira após o boqueirão formado pelo rio Poti, a caatinga ocupa a quase totalidade do
57
espaço, refletindo assim na queda substancial das precipitações e no aumento progressivo das
deficiências hídricas.
A Depressão Sertaneja está intimamente relacionada à planície fluvial do rio Poti,
sobretudo quando analisada sob o aspecto da cobertura vegetal e do uso, compreendendo, em
termos de extensão geográfica, a unidade geoambiental de maior representatividade nos
sertões de Crateús, atingindo cotas altimétricas em torno de 300 m. Representa uma superfície
embutida entre planaltos cristalinos e/ou sedimentares com níveis altimétricos variáveis entre
100 e 300 m (Mapa 5). As condições climáticas de semiaridez são mais evidentes na
depressão sertaneja com índices pluviométricos que não chegam a ultrapassar 800 mm
(SOUZA, 2003).
Na depressão sertaneja a morfogênese é caracterizada principalmente pelos
condicionantes climáticos e são marcadas pela primazia de topografia plana ou levemente
ondulada e submetida durante a maior parte do ano às deficiências hídricas. A dinâmica
morfogenética da depressão sertaneja está estritamente correlacionada com os condicionantes
climáticos e com o caráter caducifólio do revestimento florístico que pouco contribui para
deter os efeitos das enxurradas. Assim, por ocasião da estação chuvosa, o material superficial
vai sendo removido pela ação do escoamento, resultando em menor profundidade dos solos
com a ocorrência de solos pedregosos, afetando diretamente a atividade agrícola (SOUZA,
1979, 2000).
A vegetação de caatinga é preponderante na depressão sertaneja e recobre quase
sua totalidade com um padrão fisionômico predominante arbustivo aberto, expressando de
forma clara as condições semiáridas com seu ambiente natural limitado, refletindo
diretamente no seu recobrimento florístico que se caracteriza pela perda das folhas no período
seco. A vegetação evidencia ainda as influências múltiplas sobre a dinâmica do ambiente,
interferindo na ação dos processos morfoclimáticos, na pluviosidade, temperaturas do solo e
do ar, refletindo na umidade e no trabalho que é exercido pelos agentes modeladores da
superfície (SOUZA, 2000).
A depressão sertaneja segundo Souza (2000) possui vulnerabilidade alta às secas
em função do pequeno potencial hídrico, que é deficitário durante quase todo o ano e do
estado atual de conservação dos solos e da vegetação, onde estão mais evidentes os efeitos da
degradação.
62
As Planícies Fluviais se caracterizam como áreas planas de acumulação fluvial
sujeitas a inundações periódicas que bordejam a calha dos rios e são representações típicas de
formas de deposição fluvial. Transversalmente, nas planícies podem ser observados setores
homogêneos e claramente identificáveis como: (1) a vazante, que compreende o talvegue e o
leito menor do rio podendo ser submetidos a cheias periódicas; e a (2) várzea, que
compreende a maior parte da planície fluvial, podendo alcançar mais de 10 km (SOUZA,
1979). Planícies Fluviais constituem os ambientes de formação e evolução mais recentes
dentre as unidades apresentadas juntamente com as planícies lacustres. No entanto, estão
dispostas em conformidade com os rios e são elaboradas pela deposição fluvial, segundo o
escoamento, a competência energética e as características do regime hidrológico da bacia em
consonância com os demais fatores ambientais.
Souza (Op. cit.) menciona que as planícies acompanham longitudinalmente os
maiores coletores de drenagem da bacia hidrográfica e tendem a assumir maiores larguras nos
baixos vales. Em geral são rios com nascentes situadas nos maciços residuais que drenam, em
grande parte, terrenos do embasamento cristalino. Nestas áreas, em direção de montante, as
planícies têm larguras inexpressivas. Para jusante, nos baixos cursos, a faixa de deposição é
ampliada por diminuição do gradiente fluvial.
Segundo Oliveira (2006), nas áreas de planície e nas áreas de inundações
sazonais, desenvolvem-se solos aluviais, associados aos Vertissolos e Planossolos. São solos
normalmente profundos, mal drenados, textura indiscriminada e fertilidade natural média a
alta. Ressalta a autora que essas planícies são dotadas de melhores condições de recursos
naturais, diversificam a paisagem sertaneja por possuírem solos mais férteis e água em
superfície. Por isso, mostram-se densamente povoadas e possibilitam o uso intenso pela
agricultura.
Oliveira (Op. cit.) destaca que as planícies, por suas potencialidades, apresentam
uma estrutura fundiária marcada pelo predomínio de pequenas propriedades dispostas
perpendicularmente aos rios e onde se prática uma agricultura de subsistência,
fundamentalmente para a sobrevivência do agricultor, mesmo durante as estiagens
prolongadas ou durante os anos recorrentes de seca.
Para Souza (2000), as planícies fluviais denunciam evidências resultante de uma
evolução recente da paisagem. A montante, onde o entalhe é mais efetivo, evidencia-se o
trabalho da ação hidráulica e da corrosão fluvial. Assim, nos médios cursos, o material é
detritíco, constituído de areia grosseira em mistura com seixos arestados. Para jusante, o
material mais fino de natureza areno-argilosa passa a ter primazia. Ainda segundo esse autor,
63
pela natureza dos sedimentos de fundo das calhas fluviais se percebe uma estreita relação
entre o atual regime dos rios e as respectivas competências.
Souza (Op. cit.) ressalta que embora as planícies tenham pouca representação
espacial, por suas potencialidades naturais, constituem ambientes de exceção nas depressões
sertanejas semiáridas. São áreas preferenciais para lavouras irrigadas em função das boas
condições morfopedológicas, favoráveis ao agroextrativismo, com limitações periódicas.
As áreas de Inundação Sazonal são as que possuem sedimentos quaternários
coluviais e lagunares areno-argilosos, variando de moderadamente a mal selecionados. Áreas
de acumulação de sedimentos areno-argilosos bordejam lagoas e áreas aplainadas que estão
sujeitas a inundações periódicas (planícies de acumulação) que originam lagoas fluviais,
freática ou mista em áreas que são precariamente incorporadas à rede de drenagem, limitadas
ao período chuvoso, com exceção dos grandes açudes (Figura 11). Os solos característicos são
as associações de Neossolos Flúvicos e Planossolos. Originalmente, recobertos por vegetação
ciliar, os usos geralmente são a pesca, extrativismo vegetal e mineral, agropecuária,
dessedentação animal, represamentos, lazer (Gonçalves Junior, 2012).
Figura 11: Modelo esquemático de uma área fluvial e respectiva planície de
inundação
Fonte: Adaptado de PRESS et al. (2008)
O Rio Poti, que possui grande representatividade no sertão cearense, é o principal
coletor de drenagem da bacia dos Sertões de Crateús. Nasce na serra dos Cariris Novos, na
divisa dos estados do Ceará e Piauí, próximo ao distrito de Santa Maria, do Município de
64
Quiterianopólis-Ce, em cotas aproximadas de 800 m (Figura 12). Desenvolve
aproximadamente 192,5 km de extensão em território cearense e tem como principal afluente
o rio Macambira. Em grande parte, o rio faz seu curso no sentido sul-norte e logo após a
cidade de Crateús, inclina-se na direção sudoeste-noroeste, para, em seguida, seguir no
sentido leste–oeste, recebendo inúmeros tributários menores (CEARÁ, 1998).
No percurso desenvolve um canyon que inicia no distrito de Oiticica, município
de Crateús (Figura 13) e segue para o Estado do Piauí através dele, passando no município de
Castelo do Piauí após cortar a cuesta da Ibiapaba. E o reverso da cuesta é entalhado pela
drenagem consequente que flui na direção do eixo da bacia, confluindo com o rio Parnaíba,
destacando-se a área de superimposição do rio Poti, que ao escavar a parte central da cuesta,
proporcionou a abertura de uma garganta epigênica sobretudo, em condições paleoclimáticas
úmidas do quaternário nas quais o rio, com maior gradiente de energia, adquiriu poder de
entalhe para seccionar a estrutura rochosa do front da cuesta (SANTOS E SOUZA, 2012).
O canyon é visto como um aspecto geomorfológico relevante para a região de
Crateús, sobretudo pela beleza cênica proporcionada e preservação, a qual é mantida
principalmente pelas limitações naturais nas forma de uso e ocupação. Transposta a serra, o
rio Poti até as proximidades da cidade de Castelo do Piauí, corta terrenos rochosos e apresenta
pouca largura. A partir de então desenvolve um curso sinuoso até atingir a cidade de Teresina
no estado do Piauí e desembocar no rio Parnaíba (MMA, 2006).
Figura 12: Nascente do rio Poti, município de Quiterianopólis
Foto: Martovania Monte (2012)
65
Figura 13: Início do Canyon do rio Poti, município de Crateús
Fotos: Martovania Monte (2012).
A oferta hídrica da bacia dos Sertões de Crateús engloba 10 (dez) reservatórios,
05 (cinco) destes não se enquadram como reservas interanuais uma vez que não possuem
capacidade acima de 10 milhões de m³ conforme classificação dada pela CEARÁ (2005).
Dessa forma, dada a ocorrência prolongada de anos secos consecutivos, estes reservatórios
não se capacitam a atender à necessidade hídrica.
Os 10 (dez) barramentos estão assim distribuídos em seus cursos d’água: 04
(quatro) barrados pelo rio Poti que são: do Poti (Batalhão) e Carnaubal em Crateús; barragem
Colina em Quiterianopólis; barragem Flor do Campo em Novo Oriente. Para os cursos d’água
a seguir, um barramento em cada riacho: Riacho Santa Cruz, barragem Barra Velha em
Independência; Riacho Carrapateiras, barragem do Realejo, Crateús; Rio Jaburu, barragem
Jaburu II em Independência; Riacho Cassimiro, barragem Sucesso em Tamboril; Rio Acarape,
barragem São José III em Ipaporanga; Rio Cupim, barragem Cupim, Independência
(COGERH, 2012) (Quadro 1).
66
Quadro 1 - Açudes Gerenciados Pela COGERH na Bacia dos Sertões de Crateús
AÇUDE MUNICÍPIO RIO/RIACHO
BARRADO
CAPACIDADE
(milhões de m³) CONCLUSÃO
Barragem São José III Ipaporanga Acarape 7,96 -
Barragem do Batalhão Crateús Poti 1,6 1959
Barragem Cupim Independência Cupim 4,5 1970
Barragem do Realejo Crateús Carrapateiras 31,55 1980
Jaburu II Independência Jaburu 116 1984
Barragem Sucesso Tamboril Cassimiro 10 1988
Carnaubal Crateús Poti 87,69 1990
Colina Quiterianopólis Poti 3,25 1998
Flor do Campo Novo Oriente Poti 111,3 1999
Barra Velha Independência Santa Cruz 99,5 1999
Fonte: COGERH (2012).
Para entender os efeitos na dinâmica fluvial deste rio semiárido, tomamos para
análise os barramentos: Flor do Campo que teve sua conclusão no ano de 1999; Carnaubal em
1990; do Batalhão em 1959 e Lago de Fronteira que é o último a ser construído e se encontra
em fase de implantação. Todos estão compreendidos entre os municípios de Novo Oriente e
Crateús, os quais pela proximidade imprimem características comuns ao sistema ambiental
dos Sertões de Crateús (Figura 14).
67
Figura 14: Espacialização das barragens em estudo.
Organizado por Martovania Monte e Gonçalves Júnior
68
5 OS BARRAMENTOS NO SEMIÁRIDO NORDESTINO
Rebouças (1997) destaca que as secas de 1825, 1827 e 1830 marcaram o início da
açudagem no Nordeste semiárido como fonte de água para abastecimento humano e animal
durante tais períodos. Em 1831, a Regência Trina autorizou a abertura de fontes artesianas
profundas. Em 1856, foi criada a Comissão Científica de Exploração, chefiada pelo barão de
Capanema. Dentre as suas recomendações destacam-se: “a abertura de um canal ligando o rio
São Francisco ao rio Jaguaribe, a construção de 30 açudes, a abertura de fontes artesianas
profundas e a melhoria dos meios de transporte”. Os açudes foram sendo construídos com
base em feições topográficas e/ou influências políticas locais.
A política de açudagem no Nordeste esteve intrinsecamente interligada aos
sucessivos anos de estio. A menção aos barramentos remonta ao início da colonização
brasileira que segundo Molle (1994, p.14),
“... a história do açude no Nordeste é tão antiga como a história de sua colonização
pelos portugueses. Na realidade, o próprio nome açude – derivado da palavra árabe
as-sadd (barragem) comprova a origem ainda mais remota, se nos debruçarmos
sobre a história do homem e de suas técnicas”.
Molee (1994) relata que a grande seca de 1877-79, durante a qual teriam morrido
mais de 500.000 pessoas na Província do Ceará e nas vizinhanças, foi a causa de um doloroso
despertar após 30 anos de chuvas relativamente regulares e constituiu um marco importante
na história da açudagem pública no Nordeste, pois motivou e provocou intensos debates que
deviam resultar em propostas que vigoram até os dias de hoje.
Em outubro de 1877, em sessões memoráveis do Instituto Politécnico, sob a
presidência do Conde D'Eu, foram sugeridos e debatidos diversos formas para enfrentar a
seca, sendo aprovada a seguinte proposta apresentada por ele: "construir, quanto antes, no
interior da Província do Ceará e nas outras assoladas pela seca, represas nos rios e açudes nas
localidades que para tais fins fossem mais apropriadas ao abastecimento d'agua” (MOLLE,
1994).
Os planos governamentais como proposta de combate às secas no sertão
nordestino vinham desde o século XVIII, mas foi principalmente do século XX que os
organismos estatais foram sendo criados como:
69
• A Inspetoria de Obras Contras as Secas (IOCS): foi criado em 1909, e passou a
ser chamado Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS) em 1919, no governo do
Presidente Epitácio Pessoa, quando são construídas as grandes represas, mas com pequeno
potencial de irrigação;
• Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS): com a seca de
1932, o governo chama a atenção para o combate à seca com a chamada “solução hídrica”.
Em 1945 o IFOCS passa a ser denominada Departamento Nacional de Obras Contra as Secas;
• Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF): é criada em 1945, com a
função de gerar e distribuir energia para o norte / nordeste;
• Companhia do Vale do São Francisco (CVSF): a atual Companhia de
Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) foi fundada em
1948;
• Banco do Nordeste Brasileiro (BNB): é criado em 1952, como banco de
fomento;
• Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE): criada em
1959, com propostas inicialmente reformistas, pois trazia os ideais de Celso Furtado.
Ao longo dos últimos 100 anos, o governo federal, principalmente através do
DNOCS, atuou de forma desordenada em relação a uma implantação de uma infraestrutura
hídrica que atendesse às diferentes demandas, sobretudo o abastecimento humano, uma vez
que o incremento de tais obras só se dava em períodos mais agudos de escassez hídrica,
denotando ação somente diante da calamidade pública. A oferta de água aumentou em ritmo
lento comparado com o aumento da demanda, como consequência, a cada nova seca, as
populações eram fortemente atingidas, incrementando-se o êxodo rural e aumentando o
problema social nas áreas urbanas (MIR, 1994).
A construção do açude do Cedro, que remonta ao século XIX, foi a primeira e
grandiosa concretização do investimento público em grandes barragens. Este foi projetado e
construído pela Comissão de Açudes e Irrigação, barrando o rio Sitiá, com bacia hidrográfica
de 210 km², afogando a maior extensão de terras irrigáveis do vale do Jaguaribe e quase nada
foi investido no capital humano (ARAÚJO, 1982).
Até o final da década de 1980, com a incerteza das chuvas, o baixo potencial de
águas subterrâneas por conta dos terrenos cristalinos condicionaram os Governos Federal e
Estadual do Nordeste semiárido e em particular o do Ceará, a iniciarem a implantação de uma
infraestrutura hídrica, assentada em açudes de pequeno, médio e grande porte, de forma a
ocupar todos os locais com potencialidades indicadas e ordenar a política de controle de
70
mananciais para incremento da oferta de água, no tempo e no espaço, com vistas ao
atendimento da crescente demanda populacional (MIR, 1994).
A escassez de água acompanha também boa parte da História do Ceará, marcada
pela construção de açudes e barragens para armazenar água a fim de atender às demandas nos
períodos de falta de chuva. A intervenção do Estado neste setor vem de longa data, tendo
acontecido de forma diferenciada nas diversas fases de sua história (MONTE, 2005).
Souza Filho (2001) coloca que a ação institucional do Estado do Ceará em relação
a escassez de água pode ser caracterizada em quatro grandes fases: voluntarista, DNOCS,
SUDENE/DNOCS e estadual; sendo que as três primeiras tiveram como ator principal: a
União. O autor menciona ainda que esta quarta fase, tendo por ator principal o governo
estadual, significou também a construção de uma estrutura organizacional nas instituições do
Estado. Esta ação institucional tem levado o Ceará a ser apontado como modelo de
modernização hídrica, baseado na racionalidade técnica, a ser seguido por outros estados
brasileiros.
O acentuado número de barramentos no Estado do Ceará é reflexo das
particularidades atribuídas às condições climáticas (precipitações irregulares e concentradas) e
geológicas (embasamento cristalino) que interferem no alto poder de escoamento das águas e,
portanto, reduzindo a capacidade de acumulação hídrica, e também do modelo vigente da
política de açudagem (CAVALCANTE, 2012).
O Estado conta aproximadamente com 3500 açudes com mais de 5ha com
capacidade total de acumulação aproximada de 18 bilhões de m³ (COGERH, 2012).
Considerando entre barramentos de pequeno, médio e grande porte é possível que exista em
torno de 17.500 açudes no Ceará (CEARÁ, 2009).
Ressaltando suas necessidades dentro desta política de açudagem na área em
estudo, destacam-se os seguintes barramentos do rio Poti, objeto de estudo da pesquisa:
barragem do rio Poti (Batalhão); barragem Carnaubal; barragem Flor do Campo; barragem
Lago de Fronteiras .
71
5.1 OS BARRAMENTOS DO RIO POTI
5.1.1 Barragem do rio Poti (Batalhão)
A barragem do rio Poti (Batalhão) está localizada no município de Crateús, estado
do Ceará, aproximadamente a 360 km de Fortaleza, Ela barra o rio Poti, um dos mais
importantes da bacia dos sertões de Crateús e, situa próximo do perímetro urbano.
Teve na primeira etapa da sua construção (1955 a 1959) a finalidade de ser um
reservatório para atender a demanda do quarto batalhão de engenharia e construção (4º BEC)
instalado na época no município de Crateús, pois o município, na ocasião, era abastecido com
poços artesianos.
A segunda etapa aconteceu dez anos depois, de 1965 a 1969, sendo ampliada sua
capacidade para atender a demanda crescente da população do município de Crateús que não
podia mais ser suprida com o abastecimento de poços. Desta forma, não teria mais uso
exclusivo para abastecimento do batalhão.
Foi projetada e construída pelo 4º Batalhão de Engenharia e Construção (4º BEC),
com a participação direta da tropa que servia ao exército e também pela sociedade civil. Sua
construção ficou a cargo dos engenheiros do 4º BEC. Seu projeto básico e ficha técnica não
se encontram mais em Crateús uma vez que este referido batalhão se mudou para a cidade de
Barreiras na Bahia, segundo informações do comandante do quadragésimo batalhão de
Infantaria (40ºBI). Em visita local, observou-se que esta não possui sangradouro e, quando
enche, suas águas transbordam lavando a parede. Este modelo fez com que ela retivesse
bastante sedimentos em curto prazo. Fato que a levou ao assoreamento, comprometendo a
dinâmica fluvial do rio, fazendo-o buscar novas formas de equilíbrio.
Segundo o relato de uma pessoa que trabalhou na construção, a altura inicial
prevista para a barragem era 8m. Atualmente, está com aproximadamente 3m.
A barragem do batalhão hoje tem a finalidade de captar água do açude Carnaubal
e levar para a estação elevatória de tratamento da CAGECE. A água que chega vem pela
vazão regularizada deste açude que, atualmente, abastece o município de Crateús.
Há dois anos a COGERH vem fazendo monitoramento das águas que chegam a
esta barragem. Nesta foram instaladas réguas limnimétricas e são feitas as medições pela
referida companhia. (COGERH, 2012) (Figura 15).
72
Figura 15: Barragem do Poti (Batalhão)
Fotos: Martovania Monte (2012).
5.1.2 Barragem Carnaubal
A barragem Carnaubal se localiza no município de Crateús, próximo à localidade
de Carnaubal. Ela barra o rio Poti e permite a formação de um reservatório com capacidade de
acumulação de 87,60 hm³, constituindo-se numa fonte de recursos hídricos para atender à
necessidade de água da região, sobretudo, à população da sede do município de Crateús.
A área correspondente ao Açude Carnaubal foi desapropriada e totaliza 2.322,69
ha. As desapropriações envolveram 52 (cinquenta e duas) propriedades. Os desapropriados
receberam suas indenizações conforme estabelecido no Plano de Operação e Manutenção do
Sistema de Água Bruta do Estado do Ceará (POM, 2008).
As obras do açude Carnaubal foram concluídas em 1990, de acordo com dados
obtidos na Secretaria de Recursos Hídricos (SRH). Atualmente, a operação e a manutenção do
empreendimento ficam a cargo da COGERH. Esta mantém um agente local denominado
Agente de Guarda e Inspeção de Reservatório (AGIR), responsável pelos serviços de
zeladoria, operação de algumas estruturas hidromecânicas e aferição de alguns dispositivos de
medição, tais como réguas limnimétricas.
As principais estruturas componentes da barragem Carnaubal compreendem um
conjunto de obras, constituídas basicamente por um maciço de terra homogêneo de 760 m de
extensão, coroamento na cota 304,00 m, com altura máxima de 18,40m e largura de 6,00m. O
73
sangradouro, localizado na ombreira direita da barragem, é do tipo canal escavado em rocha
com soleira “mista” com 200,00m de largura, sendo 64,55m de cordão de fixação e 135,45m
de muro vertedouro. Está fixado na cota 300,00m com lâmina máxima de sangria de 2,10m
(Quadro 2).
A barragem do açude carnaubal possuía um perímetro irrigado do açude até o
distrito de Graça, no município de Crateús. Este se encontra desativado. Os irrigantes ficaram
sem os suprimentos de equipamentos suficientes e acanhamento produtivo para continuidade
do perímetro, ficando somente as bombas de inspeção e, posteriormente, sem o recurso água.
Devido à intensificação do período de estiagem (2013), o volume de água do
açude se encontra muito baixo, levando o município a fazer racionamento. Em ações
governamentais através da COGERH, planejava-se levar água do açude Flor do Campo,
através do canal do rio Poti, até a barragem Carnaubal que estava àquela época (maio/2013) já
entrando em seu volume morto (Figura 16).
O período da quadra chuvosa que poderia trazer água para a região dos Sertões de
Crateús terminou sem acontecer. Consequentemente, a falta de recarga no açude Carnaubal
colocou os municípios de Novo Oriente e Crateús em disputa pela água existente no açude
Flor do Campo, único na região que ainda possuía reserva hídrica. Os anos seguidos de seca
comprometeram a reserva do Carnaubal e a solução vista pelas autoridades locais como a
mais viável, foi a abertura das comportas do açude Flor do Campo para o açude Carnaubal. A
água seguiria para Crateús pelo leito seco do rio Poti que corta toda a região.
Em Novo Oriente, a população se posicionou contra tal medida. A preocupação
foi se o açude ficaria seco, caso as comportas fossem abertas. O comitê de moradores se
reuniu para impedir a liberação da água de qualquer modo. A situação de conflito perdurou
por dias. Depois de muitas discussões entre as partes envolvidas, as comportas foram
liberadas e a água seguiu pelo leito do rio Poti até o açude Carnaubal, de lá para a sede do
município através de uma adutora.
Para economizar água, outras ações foram implementadas no período pela
Cagece, como a não execução de novas ligações e a suspensão do fornecimento de água
tratada que tem como destino a construção civil de imóveis.
A situação ainda permanece critica. Após dois anos de estiagem no Estado, a
Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME) alerta para a
possibilidade da Seca de 2013 ser estendida para 2014. A instituição emitiu um prognóstico
oficial para a quadra chuvosa no Ceará e o panorama não é positivo. A previsão é de que nos
próximos três meses (fevereiro, março, abril) tenhamos 40% de probabilidade que as chuvas
74
fiquem abaixo da média, 35% de chance de termos chuva em torno da média e 25% de
probabilidade de precipitações acima da média.
Os Sertões de Crateús têm sido a região cearense mais atingida pela escassez das
chuvas, já sendo considerada a maior estiagem observada nestes últimos anos, ocasionando
perdas severas, sobretudo na agricultura e pecuária, principais atividades locais. Pecuaristas
sofrem para alimentar seus animais e agricultores lamentam a ínfima safra e aguardam com
esperança as chuvas para retomarem sua produção.
Quadro 2 - Ficha Técnica da Barragem Carnaubal – Crateús/Ce
BARRAGEM CARNAUBAL
Município Crateús
Sistema Sertões de Crateús
Rio/Riacho Barrado Rio Poti
Bacia Hidrográfica (Km2) 2090,54
Capacidade (m3) 87.690.000
Vazão Regularizada (m3/s) 0,7
Comprimento do Coroamento (m) 760,0
Largura do Coroamento (m) 6,0
Altura Máxima (m) 18,35
Cota (m) 304,0
Fonte: COGERH (2012)
Figura 16: Barragem Carnaubal com visão da adutora (2013).
Fotos: Martovania Monte (ANO 2013).
75
5.1.3 Barragem Flor do Campo
A barragem Flor do Campo também barra o rio Poti e se localiza no município de
Novo Oriente, próximo à localidade de Almas, aproximadamente a 390 km de Fortaleza.
As obras da barragem Flor do Campo tiveram início em abril de 1998 e foram
concluídas em agosto de 1999. A execução da barragem esteve a cargo da Construtora R.
Furlani. A supervisão dos trabalhos foi feita pela Consultora VBA conforme estabelecido no
Plano de Operação e Manutenção do Sistema de Água Bruta do Estado do Ceará (POM,
2008).
Atualmente, a operação e manutenção do empreendimento ficam a cargo da
COGERH. Esta mantém um agente local (AGIR), responsável pelos serviços de zeladoria,
operação de algumas estruturas hidromecânicas e aferição de alguns dispositivos de medição,
tais como réguas limnimétricas.
A barragem Flor do Campo possui um reservatório com capacidade de
acumulação de 111,30 hm³, constituindo-se em uma fonte de recursos hídricos para atender à
necessidade de água da região, sobretudo à população de Novo Oriente, e permitir o
desenvolvimento de atividades associadas ao turismo, á piscicultura, à irrigação e ao
aproveitamento agrícola das vazantes nas margens do lago (Figura 17).
Esta barragem compreende um conjunto de obras constituído, basicamente, por
um maciço de terra compactada, denominado principal, com 697,0 m de extensão, 21,14 m de
altura máxima, coroamento na cota 355,40 m e dois pequenos diques auxiliares, situados às
margens esquerda e direita do rio Poti, projetados para promover o fechamento de depressões
existentes em áreas próximas às ombreiras. O canal vertedouro possui 80,00 m de largura e
está situado na margem direita (com soleira fixada na cota 351,00m). Nele foram construídos
dois muros de contenção lateral e um muro vertedor tipo Creager. A Tomada D'água é do tipo
galeria em concreto, com conduto de 700 mm de diâmetro e controle de saída à jusante
(Quadro 3).
A área correspondente ao Açude Flor do Campo foi desapropriada. Ela totaliza
3.883,38 hectares. As desapropriações envolveram 141 (cento e quarenta e uma)
propriedades. Os proprietários receberam suas indenizações. Após os pagamentos
indenizatórios, as áreas desapropriadas foram unificadas em nome do estado do Ceará (POM,
2008).
A desapropriação do entorno da barragem resultou na construção da agrovila que
por definição são "minicidades" projetadas para abrigar e fornecer infraestrutura básica aos
76
reassentados, como: sistema de abastecimento de água, energia elétrica, escola e associação
de moradores ou Instituição Sócio-Comunitária das Agrovilas (Isca). É um sistema de
reassentamento urbano utilizado pela SRH desde 1996. O público-alvo das agrovilas são as
famílias que não possuem terras a serem desapropriadas, mas residem e trabalham na região -
são os chamados "moradores" (Figura 18)
Em 2013, o açude Flor do Campo teve seu volume de água bastante reduzido com
a intensificação do período da estiagem. Até maio de 2013 possui apenas 20% da sua
capacidade.
Figura 17: Barragem do açude Flor do Campo
Foto: Martovania Monte (2012)
77
Figura 18: Agrovila gerada com a desapropriação para a construção da barragem.
Fotos: Martovania Monte. 2012
Quadro 3 - Ficha Técnica Barragem Flor do Campo – Novo Oriente/Ce.
BARRAGEM FLOR DO CAMPO
Município Novo Oriente
Sistema Sertões de Crateús
Rio/Riacho Barrado Rio Poti
Bacia Hidrográfica (km2) 647,8
Capacidade (m3) 111.300.000
Vazão Regularizada (m3/s) 0,38
Comprimento do Coroamento (m) 697,0
Largura do Coroamento (m) 6,0
Altura Máxima (m) 21,14
Cota (m) 355,4
FONTE: COGERH (2012)
5.1.4 Barragem Lago de Fronteiras
Antes do anúncio oficial da construção desta barragem, ela foi estudada em anos
anteriores no âmbito de vários projetos e estudos. Primeiro, tem-se o Estudo de Viabilidade
do Eixo de Integração da Ibiapaba, elaborado entre 1999 e 2000 pelo Consórcio Montgomery
78
Watson/Engesoft para a SRH/BIRD. Nesse estudo, o açude foi identificado e escolhido como
parte das obras prioritárias para o atendimento das demandas de irrigação e humanas da
região de Crateús e dos municípios vizinhos. O açude resultante acumularia próximo de 1
bilhão de metros cúbicos de água (DNOCS, 2011).
Posteriormente, dando sequência aos estudos do barramento, o DNOCS contratou
em 2002 o Projeto Básico e o EIA /RIMA da barragem, estando ela nesse estudo
dimensionada com 744 milhões de m3.
Conflitos posteriores com o Estado do Piauí, por causa do projeto da Barragem
Castelo, no canal do rio Poti, a jusante do Lago de Fronteiras levou a ANA – Agência
Nacional de Águas - a fazer a mediação entre os dois estados e emitir a Resolução Conjunta
Nº 547, em 5 de dezembro de 2006, na qual o açude Lago de Fronteiras fica limitado ao
volume máximo de 490 milhões de metros cúbicos, devendo fornecer a vazão garantida de
500 l/s para o estado do Piauí. Os estudos hidrológicos do açude Fronteiras objetivaram o
dimensionamento de suas estruturas hidráulicas, do sangradouro e da tomada d’água, visto
que seu volume máximo está limitado pela resolução da ANA supracitada (DNOCS, 2011).
Desse modo, a barragem Lago de Fronteiras deverá acumular, de acordo com o
seu projeto básico, aproximadamente 490 milhões de metros cúbicos de água. A Construção
da barragem Lago de Fronteiras abrangerá a planície fluvial do rio Poti nas imediações do
distrito de Ibiapaba (Figura 19). A área da bacia hidráulica é de 81,04 km², altura de 36,5m
(Quadro 4). (DNOCS, 2011).
Ela terá como finalidades o controle de enchentes, o reforço do abastecimento
d’água da sede do município de Crateús e a irrigação, objetivando garantir o desenvolvimento
da região por meio de projetos de irrigações, o abastecimento humano, o incremento da
agricultura irrigada em 6.000 ha, incremento da piscicultura e perenização do rio Poti,
beneficiando cerca de 80.000 habitantes. Será o sexto maior reservatório de água do Ceará,
cujo valor de R$ 300 milhões está garantido pelo Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC 2). (DNOCS, 2011).
Destacando a implantação da barragem Lago de Fronteiras como mais uma forma
de uso intenso da planície, representando para os Sertões de Crateús, uma nova perspectiva de
estabilidade hídrica. Esta vem sendo vista como uma grande obra de captação de recurso
hídrico, estando colocada como de extrema importância para a região. A obra irá se colocar
entre as maiores do Estado. Entretanto, como toda obra trará alterações positivas e negativas,
de ordem natural e social, sobretudo na área que ficará submersa pelo espelho d’água.
79
As alterações no meio natural serão perceptíveis tão logo inicie a construção, com
o desvio do curso natural do rio, causando alterações na dinâmica do ambiente fluvial.
Alterações no comportamento do fluxo, na velocidade a montante e a jusante, no aumento do
espelho d’água e nas profundidades são algumas das principais e mais perceptíveis com a
construção de uma obra de engenharia em um curso d’água.
Os impactos sociais gerados decorrem da retirada das comunidades que ficarão
submersas. Distritos e alguns aglomerados urbanos irão ser atingidos de forma geral ou
parcial pelo lago. As pessoas serão reassentadas, deixando para trás, sua história de vida, o
sentimento de pertencimento daquele lugar e muitas incertezas em relação ao futuro.
Quadro 4 - Ficha Técnica da Barragem Lago de Fronteiras – Crateús/Ce
BARRAGEM LAGO DE FRONTEIRAS
Município Crateús
Sistema Sertões de Crateús
Rio/Riacho Barrado Rio Poti
Área da Bacia Hidrográfica Controlada (km2) 5.869,00
Capacidade (m3) 488.18 0
Vazão Regularizada (m3/s) 0,5
Comprimento do Coroamento (m) 880,00
Largura do Coroamento (m) 8,0
Altura Máxima (m) 39,5
Cota (m) 269,50
Fonte: (DNOCS, 2011)
Figura 19: Local de implantação da barragem Lago de Fronteiras.
Fotos: Martovania Monte (ANO 2012).
80
6 DINÂMICA FLUVIAL X USO E OCUPAÇÃO NA PLANÍCIE DO RIO POTI
6.1 ANÁLISE CLIMATO-HIDROLÓGICA
A compreensão climática e hidrológica da planície fluvial do rio Poti não foge às
habituais e predominantes condições semiáridas de boa parte do território cearense e de uma
parcela bem representativa da região Nordeste do Brasil. A caracterização hidrológica do
semiárido tem relação direta com o ritmo climático. As secas são caracterizadas tanto pela
ausência e escassez quanto pela alta variabilidade espacial e temporal das chuvas. Por isso,
também obedecendo a certa ciclicidade, têm sido frequentes os sucessivos anos de secas que
assolam a região.
Considerando essas condições, partiu-se para a análise climato-hidrológica
realizada a partir de dados de chuva obtidos junto a FUNCEME e de vazão obtidos junto à
COGERH. Para a análise de chuva foram utilizadas 04 (quatro) estações pluviométricas de
acordo com a distribuição dos postos: Crateús, Novo Oriente, Independência e Tamboril
(Figura 20).
Os dados das séries históricas de precipitação compreenderam os anos de 1974 a
2013 fazendo a correlação com os dados de vazões dos anos 1987 a 2012 que foram obtidos
junto à COGERH para os açudes Carnaubal e Flor do campo.
A caracterização pluviométrica da planície fluvial do rio Poti (área de estudo) foi
realizada com base numa série histórica de 39 anos (FUNCEME, 2014), a partir de quatro
postos pluviométricos distribuídos na área da bacia, cuja escolha considerou a afluência do
canal. A média anual foi de 675,2 mm, variando de 177,5 mm.ano-¹ a 1465,7 mm.ano-¹
(Figura 21). Na série histórica constam registros de precipitações acima de 1000mm.ano-¹ nos
anos de 1974, 1985, 1989 e 2008, proporcionando anos de chuvas excepcionais. Tais
excepcionalidades são atribuídas ao fenômeno conhecido como “La Ninã”, o qual se
caracteriza por um esfriamento anormal nas águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical.
(OLIVEIRA, 2001)
Também foram observados anos com médias anuais inferiores a 500mm.ano-¹,
sendo que nos anos de 1980, 1992, 1993, 1998, 2012 e 2013 a precipitação foi inferior a
400mm.ano-¹, representando anos de seca mais rigorosa na bacia. Tal rigor se atribui ao
fenômeno “El Niño”, que é a combinação entre o aquecimento anormal do Oceano Pacífico
Tropical, conjugado com o enfraquecimento dos ventos alísios (que sopram de leste para
oeste) na região equatorial. (OLIVEIRA, 2001). Alguns dos impactos de La Niña tendem a
81
ser opostos aos de “El Niño”, mas nem sempre uma região afetada pelo “El Niño” apresenta
impactos significativos no tempo e clima devido à La Niña.
Figura 20: Espacialização dos postos pluviométricos utilizados na pesquisa.
Fonte: FUNCEME; INPE (2013).
Organização: Martovania Monte e Gonçalves Júnior.
Figura 21: Distribuição Pluviométrica anual 1974-2012 [Valor total dado pela média
dos postos utlilizados].
Fonte: FUNCEME (2014).
Organização: Martovânia Monte.
1244,3
1465,7
1125,6
0
200
400
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800
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1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
2004
2006
2008
2010
2012
Pre
cip
itaç
ão
An
ual
(m
m)
Total Anual 1974 - 2012
82
O período de maior concentração pluviométrica ocorre nos meses de janeiro a
maio, tendo registro de precipitações de até mais de 500 mm.mês-¹, o que pode ocasionar
mudanças significativas no canal em curtos espaços de tempo. No restante do ano costuma
não ter precipitações significativas, característica marcante do regime de chuvas do semiárido
e em particular do estado do Ceará, onde as chuvas se apresentam concentradas e mal
distribuídas, caracterizando o regime hidrológico intermitente dos canais fluviais do
semiárido.
Para explicar a concentração e distribuição irregular das chuvas, podemos
observar a Figura 22 na qual é possível notar picos de precipitações diárias acima de 100 mm
em anos de chuvas excepcionais. Do mesmo modo, também é possível perceber que os
intervalos mais baixos denotam precipitação zero em parte de todos os anos.
Figura 22: Precipitação diária obtida pela média dos postos analisados.
Fonte: FUNCEME (2014).
Organização: Martovania Monte
Altas precipitações no início do período chuvoso, apresentam pouco rendimento
para áreas de captação, sendo mais interessante após a saturação dos canais fluviais pela
absorção de água das primeiras chuvas, pois estes, a princípio, apresentam larga capacitação
de absorção pelos seus leitos que estão secos durante um período relativamente extenso do
ano.
Ao observar as correlações entre chuva e vazão, evidencia-se alguns aspectos
interessantes na discussão da dinâmica semiárida. Considerando as vazões liberadas do açude
Carnaubal, média de 300 l/s, tendo registro máximo de quase 500 l/s no dia 30 de novembro
de 1999, observamos que as maiores vazões ocorrem nos períodos de precipitação mínima e
as menores vazões acontecem nos períodos de maior precipitação (Figura 23).
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3/2
013P
reci
pit
açã
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iári
a (m
m)
83
A escassez hídrica evidenciada nos anos de 2012 e 2013 levou o Açude Carnaubal
a um colapso no abastecimento da sede municipal (70 mil habitantes), uma vez que este açude
está voltado principalmente para suprir o abastecimento humano e a irrigação (em pequena
escala). Assim, com a vazão media diária de aproximadamente 83 l/s em 2012 e a falta de
recarga em 2013, no segundo semestre (2013) houve a necessidade de recorrer ao açude Flor
do Campo através da transposição de suas águas para o açude Carnaubal via canal do rio Poti
como medida emergencial adotada pela COGERH, fato que gerou insatisfação da população
de Novo Oriente.
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30
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10
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29
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/20
12
30
/09
/20
12
Vaz
ão L
ibe
rad
a (l
/s)
Açude Carnaubal
Vazão Diária (l/s) Precipitação diária (mm)
Figura 23: Vazões liberadas pelo açude Carnaubal com as respectivas precipitações do
mesmo período (2007–2012).
Fonte: COGERH e FUNCEME (2014).
Organização: Martovania Monte.
Observando o hidrograma de vazões médias diárias com as respectivas
precipitações do açude Flor do Campo, notamos que a vazão média ficou em 120 l/s, tendo
registro máximo de quase 400 l/s no dia 23 de abril de 2009. Comparando as vazões com as
precipitações se evidencia novamente que as maiores vazões ocorrem nos períodos de
precipitação mínima. Também, percebe-se a presença de diversos períodos com vazão inferior
a 100 l/s, incluindo alguns períodos com vazão zero o que o mantém com uma reserva
estratégica para período de maior escassez hídrica (Figura 24). Vale destacar que este açude
abastece um contingente populacional da ordem de 1/3 daquele àquele atendido pelo açude
Carnaubal. Notamos também que, sua vazão para àquele acontece costumeiramente durante o
período chuvoso para ajudar a manter a cota do Carnaubal em valores que atendam a sua
84
demanda. Assim durante o colapso no abastecimento de Crateús, o açude Flor do Campo
tinha reserva suficiente para atender as duas sedes municipais até a nova quadra chuvosa.
Comparando os gráficos de vazão dos dois açudes (Figuras 23 e 24), percebe-se
que o açude Carnaubal apresenta vazões com maior frequência e maiores valores do que
aqueles mostrados para o açude Flor do Campo. Este açude tendo capacidade de acumulação
maior, funciona como uma reserva de segurança para o Carnaubal, mesmo também
atendendo ao abastecimento humano, essa estratégia administrativa é possível de ser
realizada..
Desta forma, nota-se que o açude Carnaubal apresenta um padrão de vazões
liberadas mais definidas espacial e temporalmente, mostrando maior regularidade, dada a
necessidade permanente de abastecimento da sede municipal de Crateús. Já o açude Flor do
Campo apresenta valores médios de liberação abaixo de 300 l/s, tendo intervalos
consideráveis de vazões zero que coincidem com as quadras chuvosas, ou seja, períodos que
também o Carnaubal recebe recarga (Figuras 19 e 20).
Figura 24: Vazões liberadas pelo açude Flor do Campo com as respectivas precipitações
do mesmo período (2007–2012).
Fonte: COGERH e FUNCEME (2014).
Observando o hidrograma de afluência e precipitação dos açudes Flor do Campo e
Carnaubal (Figura 25) se nota que a média anual de afluência do açude Flor do Campo é de
60,60 hm³ e a do Carnaubal é de 40,60hm³, sendo menor no Carnaubal, uma vez que este se
situa a jusante daquele, portanto é, em parte, seu dependente quanto a sua recarga. Nota-se
que a maior afluência do Flor do Campo aconteceu em 1999, ano de sua inauguração, e com
0,0
20,0
40,0
60,0
80,0
100,0
120,00
100
200
300
400
500
600
23
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12
23
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/20
12
Vaz
ão L
ibe
rad
a (l
/s)
Açude Flor do Campo
Vazão diária (l/s) Precipitação diária (mm)
85
precipitações acima de 800mm.ano-¹. Por essa razão a afluência do Carnaubal aparece
diminuta.
Note que no ano 2002, registra-se um pico de afluência maior para o açude Flor
do Campo (172,3 hm³). É possível que este fato seja dado pelas diferentes áreas de recarga
(precipitações) que alimentam os respectivos reservatórios, ou seja, como o regime de
precipitações de Independência e Novo Oriente, em geral, é maior que o de Crateús, o
abastecimento do Flor do Campo também acompanha este regime. Isso explica o pico de
afluência observado no ano de 2002 para o açude Flor do Campo. Outro fato que deve ser
levado em consideração é a proximidade deste com o planalto da Ibiapaba, de onde também
provém um de seus afluentes.
Em 2004 e 2008, anos de precipitações excepcionais, o açude Flor do Campo teve
afluência de 90,43 hm³ e 118,34hm³ respectivamente. Para o açude Carnaubal, a afluência
registrada foi de 110,95 em 2004 e 105,5 em 2008. Percebe-se que os dois açudes tiveram
afluências aproximadas nesse período, sendo que o açude Carnaubal registrou sua maior
afluência no ano de 2008 com 105,5hm³, ano de chuvas excepcionais. Comparando as
afluências e relacionando-as às precipitações, observa-se na Figura 25 que estas a partir do
ano de 2003 possuem relativa semelhança com pequena variação para mais no açude
Carnaubal. Fato este atribuído às contribuições recebidas de afluentes localizados próximo à
sua bacia hidráulica. Tal semelhança indica que a área de abrangência correspondente aos
açudes na bacia dos Sertões de Crateús teve uniformidade no regime de precipitação neste
período.
Figura 25: Volume afluente para os açudes Flor do Campo e Carnaubal x Precipitação
anual.
Fonte: COGERH e FUNCEME (2014).
0,0
200,0
400,0
600,0
800,0
1000,0
1200,0
0
50
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150
200
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300
1999
2000
2001
2002
2003
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2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Vo
lum
e A
flu
ente
hm
³
Precipitação Anual (mm) Flor do Campo Carnaubal
86
No contexto geral o entendimento climático e, por conseguinte, o hidrológico da
planície fluvial do rio Poti se insere nas condições semiáridas trazendo uma dependência do
ritmo das estações de seca e de chuvas, o que torna seus cursos d’água intermitentes e
sazonais.
Para Ab’Saber, (1974, 1985), os climas dos sertões do nordeste seco formam uma
região semiárida de posição marcadamente azonal de expressão regional onde o inverno é
seco, quase sem chuva e o verão é chuvoso, assim, predomina a irregularidade nas
precipitações, as quais condicionam o regime hidrológico. Em consequência, principalmente,
das precipitações em conjunto com as condições geoambientais, configuram-se as
características do escoamento de superfície responsáveis pela disponibilidade hídrica da área.
A análise climato-hidrológica da planície do rio Poti oferece uma macro visão dos
aspectos climáticos considerando a influência destes sobre as águas de superfície, que por sua
vez estão concentradas em grandes reservatórios artificiais. Além disso, os reservatórios
quando da sua implantação e uso, vão influenciando o modo de vida das populações situadas
na área alagada e seu entorno.
Essa irregularidade pluviométrica, constatada nas séries históricas analisadas para
a área de estudo, tem marcado ao longo do tempo, um povo esperançoso no tocante ao modo
de vida, ao uso da terra e a utilização dos recursos naturais.
Para Nascimento, (2006, p. 167) o reconhecimento dos processos naturais que
sofrem influência do clima é indispensável para a compreensão de que a vida humana é
ajustada às condições atmosféricas e climáticas. Ao fazer um comparativo com os reflexos
sociais marcados nessas áreas secas, Souza (2003, p.150) coloca que o “caráter irregular e
imprevisível do semiárido é fator condicionante da vulnerabilidade da economia regional e,
sobretudo, da economia rural”.
6.2 DINÂMICA DO CANAL X ANÁLISE DOS SEDIMENTOS
Os rios apresentam padrões de comportamento diversos devido suas
caracteristicas morfo-hidraúlicas. Identificar esses padrões pode ser o passo inicial para
avaliar a estabilidade do rio e constatar as alterações que poderão ocorrer.
Christofoletti (1981) argumenta que a forma do canal reflete o ajuste aos débitos
fluindo através de uma determinada seção transversal. Levando-se em conta que o canal em
rio aluviais é resultante da ação exercida pelo fluxo sobre os materiais rochosos componentes
dos leitos e das margens, pode-se afirmar que suas dimensões serão controladas pelo
87
equilíbrio das forças erosivas de entalhamento e pelos processos agradacionais que depositam
material no leito e em suas margens.
A morfologia dos canais é bastante variável visto que a geometria sofre
influências, não só do fluxo como também do transporte e da estabilidade das margens
ocasionados pela retenção e liberação de água e pelo sedimento no interior do fluxo, alterando
tamanho e forma do rio (CUNHA, 2008).
Na área estudada foram analisados perfis transversais do rio Poti. Entretanto,
poucas alterações foram identificadas haja vista que os anos analisados (2012-2013) fizeram
parte de um período de escassez hídrica no Ceará.
Para além das análises de perfilagem topográfica do canal, também foram
coletadas amostras de sedimentos já citadas anteriormente. Tais amostras compuseram parte
das análises quanto às características do canal, ajudando na discussão dos resultados. Os
períodos de coletas foram janeiro e novembro/2013, teoricamente chuvoso e de estio
respectivamente. Em paralelo às análises da morfologia do canal (pouco perceptíveis devido
às precipitações abaixo das normais) foram realizadas análises quanto aos diversos usos da
planície fluvial e sua respectiva influência na morfologia do canal.
O mapa 6 do perfil longitudinal apresenta as características dos perfis transversais,
espacializados na área estudada, bem como algumas informações relativas ao canal em termos
longitudinais.
No perfil (1), à jusante do açude Flor do Campo, situado no distrito de Santa
Maria, a capacidade aproximada do canal foi de 158,683m², com largura de 122m e
profundidade média de 1,3m, observou-se nos período analisados (janeiro/2013 e
novembro/2013) a presença de matacões na calha do rio, decorrente dos baixos índices de
declividade e fluxo lento promovido pela proximidade de uma passagem molhada. Para as
características do rio Poti no município de Novo Oriente, o canal é considerado raso e largo.
Observando a Figura 26 percebe-se, ao longo do perfil, redução na profundidade
do leito da ordem de 0,5m, fato que pode estar atribuído às escavações mecânicas realizadas
entre as duas campanhas, já que no período não existiram precipitações significativas. Tais
escavações se deram em razão da necessidade de melhorar a eficiência na transposição de
água do açude Flor do Campo para o Carnaubal, em virtude do colapso de abastecimento
porque passava o município de Crateús naquele período. Com as escavações, uma expressiva
quantidade de sedimentos foi mobilizada, ocasionando a sua suspensão que foram sendo
transportados e depositados ao longo do canal (Figura 26).
89
Ainda com relação ao perfil (1), de acordo com as análises granulométricas
realizadas, margens e fundo do canal mostraram predominância de areia lamosa com cascalho
esparso (Figura 26), com vegetação marginal bastante alterada. Nota-se que os materiais que
compõem margens e leito são semelhantes, indicando a possibilidade das margens estarem
fornecendo material para a calha do rio.
Esta seção transversal foi realizada paralela e próxima, a jusante, a de uma
passagem molhada que serve a comunidade de Santa Maria, o que favorece o acúmulo de
materiais e proporcionando área úmida suficiente para criação de pastagem (suíno e gado),
muitas vezes, dentro do próprio leito fluvial. (Figura 27).
Figura 26: Perfis transversais da estação (1) (a) para os meses de janeiro e novembro/2013.
Ccomposição granulométrica das margens esquerda e direita (b). [ME: Margem Esquerda;
MD: Margem Direita; LS: Leito Seco]. Fonte: Dados da Pesquisa.
Figura 27: Pecuária extensiva no leito do rio - Perfil (1)
Foto: Martovania Monte (ANO 2013).
0
1
2
3
4
5
0 50 100
(1) Jusante For do campo
jan/13
nov/13
Cota
R
ela
tiva
(m
)
Distância (m)
0102030405060708090100
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0,5 1
1,5 2
2,5 3
3,5 4
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5,5 6
6,5 7
7,5 8
8,5 9
Acu
mu
lad
a
Escala Phi
ME MD LS
(1) Jusante Flor do Campo
a b
90
No perfil (2), à montante do açude Carnaubal, já situado no município de Crateús
(localidade de Santo Antônio dos Azevedos) com canal de largura aproximada de 80m,
capacidade de 241,491 m² e profundidade média de 3m. Observou-se que o canal do rio se
encontra bem encaixado, com leito seco que apresenta declividade mais acentuada e nitidez
maior de profundidade, evidenciando o talvegue do rio (Figura 28).
De acordo com as análises realizadas, margens e fundo do canal evidenciaram
predominância de areia lamosa com cascalho e maior quantidade de areia fina a muito fina,
vegetação marginal espaçada e alterada. Os materiais das margens direita e esquerda denotam
bastante semelhança (Figura 28) e diferenciamento do material do leito, indicando que o fluxo
fluvial pode não estar carreando material das margens para a calha.
A comunidade de Santo Antônio dos Azevedos, no período chuvoso, utiliza-se da
área úmida do perfil para atividade agrícola. As margens são, ocasionalmente, utilizadas
como pastagens, conforme observado durante coleta de dados no período seco (Figura 29)
Neste perfil, o leito do rio teve fluxo em sua calha durante os meses de julho e
agosto por conta da transposição das águas do açude Flor do Campo para o Carnaubal, cuja
operação foi encerrada após 60 dias. A previsão do escritório local da COGERH é que tenha
sido transferido em torno de 4 milhões de metros cúbicos do açude Flor do Campo para o
açude Carnaubal, em um percurso de 45 km pelo leito do rio Poti (Figura 29).
Figura 28: Perfis transversais da estação (2) (a) para os meses de janeiro e novembro/2013.
Composição granulométrica das margens esquerda e direita a montante do açude
Carnaubal.(b) [ME: Margem Esquerda; MD: Margem Direita; LS: Leito Seco].
FONTE: Dados da pesquisa.
0
1
2
3
4
5
0 20 40 60 80
Co
ta R
ela
tiva (
m)
Distância (m)
(2) Montante Carnaubal
jan/13
nov/13
0102030405060708090100
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-0,5 0
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4,5 5
5,5 6
6,5 7
7,5 8
8,5 9
Acu
mu
lad
a
Escala Phi
ME MD LS
(2) Montante Carnaubal
a b
91
Figura 29: Trecho da calha usado para a transposição do açude Flor do Campo ao açude
Carnaubal - Perfil (2) [Leito seco e leito com passagem do fluxo]
Fotos: Martovania Monte (2012; 2013).
O perfil (3) à jusante do açude Carnaubal, situado bem próximo à área da
barragem, mostrou largura aproximada de 115 m, capacidade de 114,519 m² e profundidade
média de 1 m. Mostra perfil raso com leito parcialmente seco e muito alterado pela presença
de passagem molhada e pequeno escoamento (Figura 30). Apresenta banco de areia não
natural, possivelmente preparado pela população ribeirinha para uso em construção civil.
De acordo com as análises realizadas, margens e fundo do canal mostraram
predominância de areia lamosa com cascalho esparso e vegetação marginal. Os materiais que
compõem as margens e leito são diferenciados, observando-se pouca diferença entre as
margens esquerda e direita em quase todo o perfil. Já o leito apresentou características
granulométricas para areia média a fina, mantendo em determinado trecho semelhança com a
margem esquerda, indicando que esta pode estar alimentando o leito do rio (Figura 30).
Figura 30: Perfis transversais da estação (3) (a) para os meses de janeiro e novembro/2013.
Composição granulométrica das margens esquerda e direita a jusante do açude Carnaubal
[ME: Margem Esquerda; MD: Margem Direita; LS: Leito Seco].
Fonte: Dados da pesquisa.
0102030405060708090100
-1,5 -1
-0,5 0
0,5 1
1,5 2
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5,5 6
6,5 7
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8,5 9
Acu
mu
lad
a
Escala Phi
ME MD LS
(3) Jusante Carnaubal
0
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1
2
2
0 20 40 60 80 100 120
Co
ta R
ela
tiva (
m)
Distância (m)
(3) Jusante Carnaubal
jan/13nov/13
92
Fazendo análise comparativa dos dois períodos, observamos que as alterações
determinadas neste intervalo são pouco significativas. É comum o uso da área úmida do leito
para o desenvolvimento de atividades agropecuárias pela comunidade local.
O perfil (4), a jusante do local de implantação da barragem Lago de Fronteiras,
localizado no distrito de Ibiapaba, possui capacidade do canal da ordem de 700,815 m²,
largura aproximada de 256 m e profundidade de 2,73 m. Este perfil tem um caráter singular,
pois servirá para efeito comparativo com análises posteriores à construção do barramento. O
perfil se apresenta relativamente extenso, com leito seco bastante arenoso, no contexto geral,
bem encaixado, com margens bem definidas e pouca vegetação marginal (Figura 31).
De acordo com as análises realizadas, as margens apresentaram predominância de
areia lamosa com cascalho esparso e com fundo do canal bastante arenoso (Figura 31), com
pouca evidência de vegetação marginal. Os materiais que compõem as margens e o leito são
diferenciados, observando-se pouca diferença entre margens esquerda e direita. A
predominância de areia fina no leito pode denotar pouca relação entre este e suas margens.
Figura 31: Perfis transversais da estação (4). (a) para os meses de janeiro e novembro/2013.
Composição granulométrica das margens esquerda e direita a jusante Lago de Fronteiras.
[ME: Margem Esquerda; MD: Margem Direita; LS: Leito Seco].
Fonte: Dados da pesquisa
Observa-se que este perfil está situado dentro da área urbana do distrito de
Ibiapaba. Ele é de uso diverso pela comunidade. Observando o efeito dos barramentos ao
longo do perfil longitudinal do rio Poti com seus cortes transversais, percebe-se que as
barragens Carnaubal (concluída no ano de 1990) e Flor do Campo (concluída em 1999)
contribuíram para as alterações de usos e respectivas mudanças no canal deste rio, alterando o
regime de fluxo, principalmente, no que se refere à elevação das mínimas, já que se trata de
0
2
4
6
8
10
0 50 100 150 200 250
Co
ta R
ela
tiva (
m)
Distância (m)
(4) Jusante Lago de Fronteiras
jan/13nov/13
0
20
40
60
80
100
-1,5 -1
-0,5 0
0,5 1
1,5 2
2,5 3
3,5 4
4,5 5
5,5 6
6,5 7
7,5 8
8,5 9
Acu
mu
lada
Escala Phi ME MD LS
(4) Jusante Lago de Fronteiras
a b
93
uma área de extrema carência de água. Ao mesmo tempo, veio auxiliar na minimização das
enchentes, característica também marcante na região.
A quantidade de sedimentos transportados em rios intermitentes, geralmente,
acontece no período chuvoso. Carvalho (1994) menciona que, para muitos cursos d’água, a
quantidade da carga sólida durante o período chuvoso representa uma média de 70 a 90% de
todo o ano hidrológico. Entretanto, em estudos realizados por Cavalcante (2001, 2012), no
Ceará essa realidade mostra que praticamente 100% da carga transportada ocorre no período
de chuva, levando essas áreas a sofrerem alterações ainda maiores. Não obstante, as análises
da pesquisa aconteceram em anos com precipitações bem abaixo da média, desfavorecendo
evidências que comprovariam tal fato.
6.3 DINÂMICA DE MARGENS X USO E OCUPAÇÃO
O ambiente semiárido congrega uma série de limitações às formas de uso devido à
baixa e irregular pluviometria que influencia diretamente a qualidade de vida. A partir de
Souza (2003), compreende-se que essa condição não é um fato isolado. Segundo este autor,
no Nordeste, a semiaridez sempre foi fator determinante da vulnerabilidade econômica,
sobretudo, nos sertões. Na perspectiva integrada, os reflexos dessas limitações financeiras
recaem sobre as condições sociais e, consequentemente, impõem restrições, ao modo de vida
dos sertanejos no que se refere às formas de uso dos recursos naturais.
No geral, é possível perceber que nas áreas de planície fluvial, o uso e a ocupação
ocorrem de forma mais intensa. Isso se ocorre devido ao maior potencial das condições de
solo, da disponibilidade de água e, consequentemente, das melhores condições edafológicas
da área. A dinâmica fluvial, mesmo limitada ao período da quadra chuvosa, que na área
ocorre de maneira não muito rigorosa de fevereiro a abril, exerce função preponderante na
manutenção dessas melhores condições devido ao carreamento de sedimentos como matéria
orgânica, silte e argila e consequente renovação do potencial como a fertilidade das várzeas.
Dessa forma, o sertanejo “desce para as áreas baixas” para as “crôas” e intensifica
o uso. De forma que as planícies fluviais sofrem elevada pressão. Este é o caso da área em
questão, sertões de Crateús. Esse uso, muitas vezes, excede a capacidade de suporte do
sistema ambiental e reflete de forma negativa na conservação ambiental.
Na planície fluvial do rio Poti, diversas ações antropogênicas que sinalizam a
intensificação de um processo de degradação vêm ocasionando, dentre outros problemas, o
assoreamento de trechos do rio. É notória a utilização das margens para agricultura e pecuária
94
extensiva que, em geral, se configuram como práticas arcaicas e desprovidas de um controle
sistematizado. Na área urbana, o problema continua. Este está mais voltado para a ocupação
irregular dessas margens (Mapa 7). São perceptíveis também fontes de poluição pontuais
através do lançamento de esgoto não tratado no leito, bem como, disposição irregular de
resíduos sólidos. Vale salientar que no perímetro urbano esse esgoto chega, em parte do
período do ano, a denotar uma certa perenidade no rio devido ao acúmulo de águas servidas
(Figura 32).
Figura 32: Perenização do rio na área urbana por acúmulo de águas servidas
Foto: Martovania Monte (2013)
Analisando a área, compartimentou-se algumas classes de usos e cobertura,
conforme descrito na metodologia (Mapa 7). A Mata Ciliar, correspondente a 9,39% da área
da planície, exercendo um papel fundamental na proteção dos rios, atuando como barreira
natural aos desmoronamentos de margens. Suas raízes atuam para deixar o solo mais firme, de
forma que a sua remoção pode ocasionar processos erosivos nas margens dos rios e
intensificar processos de assoreamento, resultando no alargamento dos canais e na
consequente diminuição da profundidade. Na área, ela se apresenta bastante descaracterizada,
pois a cada 10 m² da planície recobre o equivalente a menos do que 1m² (Mapa 7).
Nas áreas das margens se denota a ocorrência da prática de brocagem2 que elimina
a vegetação. Por conseguinte, desprotege o solo, favorecendo o processo de erosão laminar,
linear e por efeito splash. Tais efeitos refletem diretamente no carreamento de sedimentos
2 Brocagem é a prática de cortar e queimar, no local de corte, a vegetação para usar o terreno “limpo” para
plantio.
95
dessas margens, assoreando os canais. De acordo, com as medições, observações e
levantamentos de perfis ao longo do leito do rio Poti, a sedimentação ocorre tanto pelo fluxo
hídrico de montante, sobretudo nas cheias, quanto pelas margens que estão desprotegidas.
Fatos constatados na análise dos sedimentos coletados nos perfis (Figuras 26, 28, 30 e 31).
Um fato relevante em relação à mata ciliar que se encontra descaracterizada, mas
com uma proeminência no mapeamento de uso e cobertura é a presença de espécies que são
originárias de outras regiões ou biomas - as plantas invasoras. A disseminação destas espécies
invasoras leva a homogeneização dos ambientes, com a destruição de características
peculiares que a biodiversidade local proporciona e a alteração nas propriedades ecológicas
essenciais (MMA, 2009).
No geral, tais espécies se adaptam e proliferam muito bem ao novo ambiente,
competindo com as espécies nativas por nutrientes, luz solar e mesmo por espaço físico.
Exemplo disso é a unha do diabo (Cryptostegia grandiflora), nativa da ilha de Madagascar, na
África, espécie que prolifera nas margens do rio Poti ocupando o lugar da vegetação nativa,
descaracterizando a proteção ao corpo hídrico conferida pelas matas ciliares (Figura 33). É
notório que a disseminação da Cryptostegia grandiflora avança tanto pelo sufocamento das
espécies nativas quanto pelo processo sucessional devido à retirada (desmatamento) da
vegetação ciliar característica da área.
As práticas agrícolas, que segundo a tipologia de uso no mapa 7, representam
19,45% da área da planície, mostram-se como uma das atividades mais impactante do ponto
de vista ambiental, porém com significativa relevância econômica para a população local.
Tais atividades são realizadas, na sua maioria, com a derrubada e a queima da vegetação,
deixando o solo exposto.
Figura 33: Mata ciliar descaracterizada com planta invasora [Planta invasora substituindo
vegetação nativa e invasora unha do diabo (Cryptostegia grandiflor)
Fotos: Martovania Monte (2013)
Unha do
diabo
97
No sistema de “plantio no toco3”, os instrumentos são bastante rudimentares,
como: machado, foice e enxada. Estes, em geral, desprendem muito esforço e alcançam
poucos resultados de produção. Por isso, realiza-se a queima com a justificativa de que esta
diminui o trabalho de capina e a produção de grãos para o primeiro ano aumenta. As
queimadas ocorrem de maneira sistemática. A prática maior na área acontece nos meses de
setembro a dezembro, pois ainda podem ser consideradas como uma das principais formas de
preparo do solo para o plantio e a formação de pastagem, favorecendo a ampliação da área de
solo exposto (Mapa 7).
Outra questão é que estas áreas, quando abandonadas, têm um tempo de descanso
insuficiente para a recuperação da vegetação secundária. Isto agrava ainda mais nos
minifúndios que, sem opção de mudança de áreas de plantio, acabam por terem menos tempo
de descanso do solo ou mesmo nenhum, só desistindo destas quando estão em processo de
degradação acentuado. Com esse tipo de manejo, o aumento das áreas de solo exposto é
inevitável, constituindo na atualidade cerca de 4,53% do total da planície estudada.
Em relação à pecuária, ela também incrementa fatores de desequilíbrio, pois o
criatório é feito, predominantemente, de forma extensiva, com pastoreio em quase toda a
extensão da planície. Para as áreas onde será desenvolvido novo cultivo após a colheita, os
animais são postos dentro dos roçados no intuito de comerem os restos de culturas. Em geral,
são deixados nestes locais até se fartarem. Durante esse período, o pisoteio causa a
compactação dos solos destas áreas, favorecendo, principalmente, a erosão laminar dada a
redução dos processos de infiltração. Com a retirada quase total dos restolhos de cultura no
período de estiagem, o solo fica desnudo, caracterizando também solo exposto.
Nas áreas não cercadas, inclusive no leito seco (observado com frequência na
estiagem), animais circulam livremente e o deixam bastante remexido. De acordo com o mapa
de uso e cobertura (Mapa 7), na região não existe uma área específica para a criação de
animais (pecuária). Segundo o IBGE as criações são de bovinos, asininos e equinos, as quais
se adaptam bem à forma extensiva de criação, circulando livremente por essas tipologias de
uso e cobertura. No período seco, essa andança é maior devido à procura por alimento se
intensificar (Figura 34).
3 Plantio no Toco: Plantio rudimentar na terra brocada e não aradada.
98
Figura 34: Pecuária extensiva no leito seco (Perfil 2)
Foto: Martovania Monte (2013).
A vegetação de carrasco ocorre na área de forma pontual e diluída por entre a
caatinga, muitas vezes, com características desta. Apresenta-se como uma vegetação de porte
médio, mas também bastante descaracterizada. Algumas das espécies que compõem este tipo
de vegetação são: Aroeira (Schinus terebenthifolius), Pereiro branco (aspidosperma
pyrifolium), Camará (Moquina polymorpha), Pau-d’árco-roxo (Handroanthus impetiginosus),
Embiratanha (Pseudobombax marginatum), Maria preta (Cordia verbenaceae).
A vegetação de Caatinga apresenta tipologia arbustiva aberta e arbustiva densa,
correspondendo respectivamente 39,73% e 9,39% da área da planície. A arbustiva aberta
equivale à maior porção de cobertura vegetal identificada, enquanto a arbustiva densa é
representada por pequenas manchas que se desenvolvem, em geral, sobre solos rasos e
pedregosos. A catingueira (Caesalpinia pyramidalis Tul.), as juremas (Mimosa spp.) e os
marmeleiros (Croton spp.) são as plantas mais abundantes na área, juntamente com a
amburana (Amburana cearensis), umbu (Spondias tuberosa), macambira (Bromelia
auriculata), mandacaru (Cerus jamacaru) e juazeiro (Zyziphus juazeiro). A Caatinga continua
passando por um extenso processo de alteração e degradação ambiental provocado pelo uso
insustentável dos seus recursos naturais. Isto está levando à rápida perda de espécies nativas
motivada pelos problemas da prática irregular da agricultura para o fornecimento energético
local.
As famílias, sobretudo as da zona rural, que necessitam usar os recursos naturais
locais para sobreviver, buscam nas plantas da caatinga: remédios, alimentos de animais
99
domésticos, combustível, produtos para comercialização e geração de renda. Portanto,
proteger e utilizar a caatinga de forma sustentável se faz necessário, pois ela se torna
fundamental para manter a vida das comunidades locais. Destaca-se que este é um bioma
exclusivamente brasileiro, o principal da região Nordeste que possui grande
representatividade no território cearense.
A capoeira, ocupando 13,66% da área em estudo, é vista como área de
crescimento espontâneo e irregular da vegetação proveniente do processo sucessional. Surge,
principalmente, a partir do abandono da área utilizada intensamente com o desenvolvimento
de atividades como a agricultura e a pecuária, assumindo um papel central na agricultura
itinerante e na pecuária extensiva.
Nas áreas de vazante se faz a prática da lavoura nas margens do rio à medida que
o nível da água baixa, quando se aproveita não só a umidade da terra, mas também o limo
fertilizante que fica depositado com o recuo das águas e serve à população ribeirinha para a
prática de culturas temporárias como: milho, feijão, batata doce, jerimum, bem como de
forrageiras como o capim aquático de corte, em função da variação do fluxo de água nos
períodos “chuvosos e de estio”.
Na agricultura de sequeiro são utilizadas como culturas o plantio de milho, fava e
feijão. Também, existe uma pequena produção de forragem cultivada de sequeiro e de capim
elefante, além da produção de fruteiras como a manga, plantas medicinais e hortaliças, estas
últimas basicamente para consumo das famílias (IBGE, 2006).
Nos 1,17% da planície em estudo que são ocupados pela área urbana foram
identificadas, a sede municipal de Crateús, as sedes distritais que estão na área da planície e as
áreas urbanas isoladas. Compreendem áreas de uso intensivo, estruturadas por edificações e
sistema viário. São áreas de maior adensamento populacional que, por conseguinte,
demandam os maiores aportes de recursos hídricos.
Nota-se uso intenso da planície com a construção de barramentos, tais como os
açudes Flor do Campo, Carnaubal e barragem do Poti (Batalhão). Estes recursos hídricos
representam 9,39% da planície estudada. Apesar de constituírem reservas hídricas
importantes, há escassez hídrica, pois os anos de secas recorrentes e a crescente demanda
populacional podem ocasionar, como em Crateús no ano de 2013, colapso no abastecimento
hídrico.
A planície em estudo corresponde a uma área total de 254,4km². Para a construção
do lago foi estabelecido nos estudos de engenharia do projeto da barragem (DNOCS, 2011),
uma área total de 142,5 km² com cota máxima de 268m. Para a cota de 265m o espelho
100
d’água corresponderá a uma área de 72,5km². Nesta situação, ficarão contidos, na área em
estudo, respectivamente, 79,2 km² ou 67,3 km² nas cotas máxima e mínima (Mapa 08).
Sobrepondo o atual mapa de uso e cobertura, da área estudada, no mapa de
prognóstico da área de inundação do futuro Lago de Fronteira (mapa 08), observa-se que a
planície do rio Poti terá uma redução da ordem de 79,2km² em sua área de uso, considerando
a cota máxima estabelecida no projeto de implantação ou, redução de 67,3km² na cota
mínima. Nesta sobreposição é possível, através das tipologias de uso e cobertura identificadas,
perceber o grau de comprometimento que este lago trará para a região, principalmente,
considerando o aspecto natural e socioeconômico da área.
No quadro 5 é destacado o percentual das classes de uso e cobertura atingidas com
a implantação da barragem Lago Fronteira em relação ao total da área em estudo da planície
do rio Poti. A tipologia mais afetada pela submersão no lago e que, portanto, desaparecerá, é a
mata ciliar e a própria planície, considerando aqui seu leito maior e menor.
Em curto prazo, levando em conta o aspecto econômico, a perda mais destacada
está centrada na agricultura e na capoeira. A agricultura pela submersão das terras em
melhores condições edafológicas e a capoeira pela perda de espaço físico para a pecuária
extensiva.
Em se tratando da cobertura vegetal, existirá uma perda significativa da caatinga
arbustiva aberta, levando a perdas relevantes, causando prejuízos à fauna e flora com provável
perda de espécies nativas. A caatinga arbórea arbustiva que se apresenta como pequenas
manchas distribuídas por toda a planície, porém com maior concentração na área do lago, terá
redução considerável acarretando os mesmos prejuízos citados.
102
Quadro 5 - Percentual atingido com a implantação da barragem Lago de Fronteira em relação
ao total da planície do rio Poti em estudo.
FONTE: Dados da Pesquisa. Elaborada pela autora
Tomando-se uma área de abrangência mais ampliada dos perfis realizados no
canal do rio Poti (Mapa 6), auxiliado pelo mapa de uso e cobertura, é possível realizar
algumas observações.
No perfil a jusante do açude Flor do Campo, onde encontramos pequenas
aglomerações urbanas, há ocorrência de mata ciliar em pequena escala, o que deixa as
margens desprotegidas e susceptíveis à erosão. Ocorre também a caatinga arbustiva aberta,
agricultura e pecuária, bem ativas, capoeira e pequena extensão de solo exposto.
O perfil a montante do Carnaubal, com três comunidades próximas. Embora o
entorno da estação apresente mata ciliar também bastante descaracterizada, agricultura bem
acentuada, capoeira e evidência de solo exposto, ficou evidente que o canal apresenta melhor
definição haja vista maior continuidade de fluxo.
No perfil a jusante do açude Carnaubal, que possui três comunidades próximas e
está localizado no início de um trecho do rio o qual foi perenizado levando água até a
barragem do Poti, encontramos a mata ciliar mais preservada em relação aos outros. Em
consequência disso, suas margens se encontram melhor definidas. Há presença acentuada da
PERCENTUAL ATINGIDO COM A IMPLANTAÇÃO DA BARRAGEM LAGO
FRONTEIRA EM RELAÇÃO AO TOTAL DA PLANÍCIE DO RIO POTI EM ESTUDO
(ÁREA EM km2)
COTA 265m COTA 268m DIFERENÇA
TIPOLOGIA DE USO
E OCUPAÇÃO
ÁREA
TOTAL
NA
PLANÍCIE
ÁREA QUE
SERÁ
ATINGIDA
PELO LAGO
%
ÁREA QUE
SERÁ
ATINGIDA
PELO LAGO
%
ÁREA
ENTRE
COTAS
%
Área Urbana 2,8 0,09 3,2 0,13 4,6 0,04 1,4
Solo Exposto 11,5 3,15 27,3 3,4 29,5 0,25 2,2
Capoeira 34,8 8,55 24,5 10,33 29,6 1,78 5,1
Agricultura 49,5 11,03 22,2 13,01 26,3 1,98 4,1
Mata Ciliar
Descaracterizada 23,9 10,29 43 13,04 54,5 2,75 11,5
Caatinga Arbustiva
Aberta 101,2 31,08 30,7 35,78 35,3 4,7 4,6
Caatinga Arbustiva
Densa 6,8 1,86 27,2 2,04 30 0,18 2,8
Recursos Hídricos 23,9 1,28 5,35 1,47 6,1 0,19 0,75
Total 254,4 67,33 26,5 79,2 31,1 11,87 4,6
103
caatinga arbustiva aberta, acompanhada de capoeira e pequeno desenvolvimento de atividade
agrícola. Por outro lado, ao analisar esta estação onde as evidências de uso agrícola são
menores em relação a cobertura de caatinga, capoeira e mata ciliar, o perfil se mostrou mais
descaracterizado. Isso ocorre devido a mudança de funcionalidade do canal, passando esse a
servir como estrada. A parte restante do leito entre a parte ocupada pela estrada e as margens,
é apropriada pela vegetação, causando dubiedade na análise, a qual somente o trabalho de
campo pode esclarecer.
O perfil a jusante do Lago de Fronteira (ainda não construído). Esta área
apresenta boa cobertura vegetal, com caatinga arbustiva aberta e densa, mata ciliar em bom
estado de preservação e margens também preservadas, embora com agricultura e pecuária
também sendo desenvolvidas em menor escala. Neste, o perfil mostrou-se bastante encaixado
e definido, características que possivelmente estão atreladas a usos menores.
No quadro 6 (dados fundiário dos municípios de Crateús e Novo Oriente), o censo
agropecuário de 2006 do IBGE registra o número de estabelecimentos, áreas e utilização das
terras das famílias contabilizadas na agricultura familiar e na agricultura não familiar.
Fazendo um comparativo entre os dados se vê de forma nítida a concentração de terras onde
observamos o total das respectivas áreas em confronto ao número de estabelecimentos para
agricultura familiar e não familiar.
Quadro 6 - Estabelecimentos rurais (Er) para agricultura familiar e não familiar
Fonte: IBGE/Censo Agropecuário 2006 (Adaptado)
Ainda observando os dados do anuário estatístico de 2011, constata-se a
distribuição por área dos imóveis rurais e área com registro legal para o município de Crateús:
Grande propriedade 55.292 ha com 21 imóveis, a média propriedade 60.553 ha com 115
imóveis, pequena propriedade 70.621 ha com 487 imóveis, também do minifúndio 32.628 ha
Municípios
Pesquisados
Agricultura
Familiar
Agricultura
Não Familiar TOTAIS
Nº de
(Er)
Área
(ha)
Área(ha)/
(Er)
Nº de
(Er)
Área
(ha)
Área(ha)/
(Er)
Nº de
(Er)
Área
(ha)
Crateús 4509 67943 15,07 372 76923 206,78 4881 144866
Novo
Oriente 3350 31132 9,29 259 17684 68,28 3609 48816
TOTAIS 7859 99075 - 631 94607 - 8490 193682
104
com 1.032 imóveis. Para Novo Oriente se tem a grande propriedade com 5.120 ha com 3
imóveis, média propriedade 25.697 ha com 47 imóveis, pequena propriedade 27.408 ha com
207 imóveis e minifúndio 21.860 ha com 766 imóveis.
Percebe-se de forma clara que a ocupação de terras da área se ajusta ao mesmo
padrão de concentração da posse da terra, característica intrínseca da estrutura fundiária
brasileira.
Em relação aos dados de assentamento nos municípios inseridos na planície estão
assim colocados: no município Crateús são 18 Assentamentos, 07 financiados pelo INCRA,
04 pela Ação F. São José, 04 pelo Crédito da Terra e 03 pelo Banco da Terra e um total de
607 famílias assentadas; no município Novo Oriente é 01 Assentamento financiado pelo
Banco da Terra e um total de 55 famílias assentadas (PDRS, 2010).
Observando as intervenções humanas, principalmente açudes construídos, como
Carnaubal, Flor do Campo e Lago de Fronteiras (em fase de implantação) além dos outros
usos da planície, percebe-se uma crescente demanda pelos recursos naturais disponíveis.
Atrelado a isso, observa-se a retirada de sedimentos, a realização de desmatamentos,
sobretudo da mata ciliar, a compactação de várzeas pela pecuária extensiva, tornando tais
áreas potenciais à erosão e ao assoreamento, causando alterações de forma significativa na
dinâmica do canal.
Naturalmente, tais alterações tendem a levar os ambientes naturais a buscar novas
formas de equilíbrio, o que poderá comprometer de certa forma a utilização de uma área que
se destaca pelo seu potencial edafológico frente às condições de semiaridez da região.
Considerando a implantação dos barramentos, ainda que seja afetada a dinâmica
fluvial, esta, via de regra, ainda se coloca como a opção mais viável de captação de água para
atenuar a escassez hídrica na região. Ressalte que o que se questiona não é o modelo proposto
de solução hidráulica, mas a forma como ela é implantada, quando desconsidera fatores
relevantes à condição humana, vidas que a priori deveriam ser as beneficiadas.
105
7 A AÇÃO INSTITUCIONAL E OS ATINGIDOS PELA IMPLANTAÇÃO DA
BARRAGEM LAGO DE FRONTEIRAS NA PLANÍCIE FLUVIAL DO RIO POTI NO
MUNICÍPIO DE CRATEÚS
A Política das Águas no Ceará, prevista no artigo 326 da Constituição Estadual,
foi disciplinada pela Lei Estadual de Recursos Hídricos Nº 11.996, de 24 de julho de 1996 e
tem como objetivos: assegurar o desenvolvimento sustentado compatível com a oferta de
água; assegurar a oferta de água em quantidade e qualidade para as gerações atuais e futuras;
planejar e gerenciar, de forma integrada, descentralizada e participativa, o uso múltiplo,
controle, conservação, proteção e preservação dos Recursos Hídricos (MONTE, 2005).
A adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento é um dos
princípios fundamentais do gerenciamento dos recursos hídricos. O Estado do Ceará foi
dividido em 12 bacias hidrográficas – Coreaú, Litoral, Curu, Metropolitana, Baixo Jaguaribe,
Sertões de Crateús, Serra da Ibiapaba, Acaraú, Banabuiú, Médio Jaguaribe, Alto Jaguaribe e
Salgado (COGERH, 2012).
Em função da prática secular de se construir açudes como solução para o
problema da seca que perpassa toda a História do Ceará, hoje o Estado possui
aproximadamente 149 açudes monitorados pela COGERH e conta com uma capacidade
máxima de armazenamento de água da ordem de 18 bilhões de m3 (COGERH, 2012).
Em virtude das recorrentes secas pelo as quais tem passado o Estado do Ceará,
notadamente, na região dos Sertões de Crateús, que tem sido duramente atingida com índices
pluviométricos abaixo da média. Não tendo por consequência a capacidade de pôr recargas
em seus açudes, a construção de barragens tem sido proposta não só como medida
emergencial, mas como meio para propiciar segurança hídrica para a região.
A barragem Lago de Fronteiras, em Crateús, é uma obra do Governo Federal a
qual teve o seu projeto de construção incluído no Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC) – II. O anúncio oficial foi feito pelo então Presidente da República, Luís Inácio Lula da
Silva, no dia 29 de março de 2010. O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas
(DNOCS) é o responsável pela sua implantação e a obra será construída barrando o rio Poti.
106
7.1 OS ATINGIDOS PELA BARRAGEM LAGO DE FRONTEIRAS
7.1.1 Perfil socioeconômico das famílias atingidas pela implantação da barragem
Tabela 1 - População por faixa etária das famílias atingidas pela implantação da Barragem
Lago de Fronteiras.
Localidade Pessoas
FAIXA ETÁRIA
0-14 15-64 De 65 a mais
Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba
(zona rural) 721 193 28,64 449 28,33 79 28,21
Curral Velho 739 206 30,56 451 28,45 82 29,29
Poti 862 220 32,64 550 34,70 92 32,86
Assis 217 55 8,16 135 8,52 27 9,64
TOTAL 2539 674 100 1585 100 280 100
26,55 62,43 11,03
FONTE: DNOCS (2011)
A maioria da população atingida se concentra na faixa etária de 15 a 64 anos, com
mais de 62% das pessoas; é nesta faixa etária que se encontra a população em idade produtiva
e reprodutiva. O percentual de idosos, considerando-se a população acima de 65 anos, é de
11%, enquanto mais de ¼ da população é composta de crianças e adolescentes até 14 anos
(TABELA 1). Estes dados são um indicativo do potencial humano produtivo e reprodutivo
das localidades, no caso de permanência nos seus locais de origem, o que não é o caso da
localidade de Poti, que terá a população totalmente atingida. Poti é quem detém o maior
quantitativo de população em todas as faixas etárias, com 32,64% na faixa de 0 a 14 anos,
34,70% na faixa de 15 a 64 anos e 32,86% com 65 ou mais anos.
107
Tabela 2 - Grau de escolaridade das famílias atingidas pela implantação da Barragem Lago de
Fronteiras.
Localidade Pessoas
Grau de escolaridade
Analfabetos Sabe ler e
escrever
Ensino
Fundamental Ensino Médio
Nº % Nº % Nº % Nº %
Distrito de
Ibiapaba (zona
rural)
721 256 33,86 390 26,62 36 23,68 39 23,49
Curral Velho 739 212 28,04 465 31,74 30 19,74 32 19,28
Poti 862 225 29,76 485 33,11 73 48,03 79 47,59
Assis 217 63 8,33 125 8,53 13 8,55 16 9,64
TOTAL 2539 756 100,00 1465 100,00 152 100,00 166 100,00
29,78% 57,70% 5,99% 6,54
FONTE: DNOCS (2011)
Pela análise dos dados (TABELA 2), é possível constatar que a grande maioria
dos atingidos, considerando todas as localidades, é analfabeta ou apenas sabe ler e escrever,
correspondendo a 87,48%. Isto pode ser considerado um reflexo direto da falta de
oportunidades educativas de várias décadas, que afetou principalmente as gerações mais
velhas em que, normalmente se encontra a maior parcela de analfabetos formais. Um
percentual muito pequeno tem o ensino fundamental e médio, cerca de 5,99 e 6,54%
respectivamente, refletindo o fato de que as gerações mais novas estarem sendo afetadas por
insuficiência de escolaridade.
Uma consideração interessante pode ser feita a esse respeito, no sentido de que
uma base escolar muito precária, traduzida na baixa capacitação, pode ser indicativo de
pobreza de uma família ou de uma localidade, pois são bem conhecidos os efeitos benéficos
da educação. Eles se estendem à esfera da cidadania e a uma participação política mais
consequente, o que resultaria numa relação capital/trabalho mais igual. Além disso, a ausência
de oportunidades de acesso à educação pode se refletir em moradias em condições precárias,
menos saneamento básico e mais doenças.
108
Tabela 3 - Ocupação das famílias atingidas pela implantação da Barragem Lago de Fronteiras.
Localidade
Pessoas
que
trabalham
Grupo de ocupação das pessoas que trabalham em atividades
que podem gerar renda
Agropecuária Serviços (públicos
x privados) Indústria
Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba
(zona rural)
152 17,57 19 15,57 0 0,00
Curral Velho 277 32,02 52 42,62 0 0,00
Poti 353 40,81 46 37,70 0 0,00
Assis 83 9,60 5 4,10 0 0,00
TOTAL 987 865 100,00 122 100,00 0 0,00
87,64% 12,36% 0,0%
FONTE: DNOCS (2011)
Tabela 4 - Relações de trabalho das famílias atingidas pela implantação da Barragem Lago de
Fronteiras.
Localidade
Pessoas
que
trabalham
Relação de trabalho
Proprietário
(autônomo)
Assalariado Diarista / trabalho
por empreitada
Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba (zona
rural)
64 26,02 61 28,77 170 32,14
Curral Velho 54 21,95 30 14,15 189 35,73
Poti 85 34,55 114 53,77 138 26,09
Assis 43 17,48 7 3,30 32 6,05
TOTAL 987 246 100,00 212 100,00 529 100,00
24,92% 21,48% 53,60%
FONTE: DNOCS (2011)
Das pessoas que trabalham em atividades que podem gerar renda, a maioria está
ocupada em atividades ligadas à agricultura, percentual que representa quase 90% das
pessoas, conforme indica a Tabela 4. Destes, um percentual de 53,60% trabalha como
diaristas ou por empreitada e outros 21,48% se declararam assalariados, conforme a Tabela 5.
Isto conjuga com o verificado com boa parte dos que têm trabalhado ligado à agricultura.
Estes trabalham em propriedades dos outros, denotando a falta de acesso à terra. Cerca de
25% se declararam proprietários e estes devem ser os que legalmente podem receber
indenização pela propriedade da terra.
109
De acordo com Brumer e Aristimunho (1995, citados por MONTE, 1999), a terra
de um modo geral, possui uma dimensão real e uma dimensão simbólica. A dimensão real se
refere às suas possibilidades como moradia e meio de obtenção da subsistência. A dimensão
simbólica diz respeito à sua capacidade de atribuição de um destino (origem, vida e morte),
determinação da identidade do indivíduo e à sua relação com a natureza. Este é um fator que
não pode ser desconsiderado quando se está lidando com a remoção de famílias por parte do
Estado.
A propriedade da terra, segundo os autores citados, significa segurança para os
agricultores. Graças a ela, o produtor que plantar, pode esperar colher e se beneficiar com
frutos do seu trabalho. Além disso, ele pode investir na melhoria de sua qualidade, pois está
conservando ou aumentando o seu patrimônio, visando garantir a sua sobrevivência e a da
próxima geração. A propriedade jurídica da terra assume um valor expressivo em muitas
sociedades capitalistas, pois é a propriedade da terra que permite ao agricultor ter acesso aos
créditos governamentais. É também por meio da propriedade da terra, que o agricultor tenta
assegurar uma condição específica que o diferencia do trabalhador assalariado, dependente da
grande propriedade, conforme Wanderley (1995, citado por MONTE, 1999).
7.1.2 Relações de moradia das famílias atingidas pela implantação da barragem
Tabela 5 - Local de residência das famílias atingidas pela implantação da Barragem Lago de
Fronteiras.
Localidade Famílias
Residência anterior
Sempre /próximo
ao local atual
Em outra área do
município
Em outro
município
Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba (zona
rural) 224 145 32,22 61 27,73 18 37,50
Curral Velho 192 127 28,22 52 23,64 13 27,08
Poti 243 155 34,44 80 36,36 8 16,67
Assis 59 23 5,11 27 12,27 9 18,75
TOTAL 718 450 100,00 220 100,00 48 100,00
62,67% 30,64% 6,69%
FONTE: DNOCS (2011).
110
Verifica-se pela Tabela 5 que mais da metade das famílias, cerca de 63%%
sempre moraram próximas ao seu local de residência atual. Conjugando-se com as
informações da Tabela 6, as quais indicam que quase metade das famílias já moram no local
há mais de 10 anos, o que é um indicativo de que estas pessoas devem ter desenvolvido forte
laços com o local; alia-se ao fato de que 73,82% declararam morar em imóvel próprio,
conforme demonstra a Tabela 7.
Trazendo-se para o contexto das famílias rurais atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras, o que FREYRE (1979, p.13, citado por MONTE, 1999)
escreveu a respeito do ideal de quase todo brasileiro, que é – “ter casa – casa própria: mesmo
que seja o que às vezes por modéstia se define como um mucambinho”, pode dizer muito a
respeito da situação vivida por essas famílias, passando por um processo de perder o que
Freyre coloca: a análise e a compreensão do homem, dar-se-ia desta forma, considerando a
sua “existência concreta” e “para isso ciência, memória, intuição, poesia” confluem nessa
busca de compreensão de um tipo de homem, através de sua casa e do desdobramento da casa
em experiência num espaço maior.
Tabela 6 - Tempo de residência no local das famílias atingidas pela implantação da Barragem
Lago de Fronteiras.
Localidade Famílias
Tempo de residência no local
Menos de 1 ano 1-5 anos 5-10 anos Mais de 10 anos
Nº % Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba (zona
rural) 227 26 49,06 58 32,22 45 34,62 98 27,61
Curral Velho 190 11 20,75 47 26,11 34 26,15 98 27,61
Poti 242 14 26,42 63 35,00 36 27,69 129 36,34
Assis 59 2 3,77 12 6,67 15 11,54 30 8,45
TOTAL 718 53 100,00 180 100,00 130 100,00 355 100,00
7,38% 25,07% 18,11% 49,44%
FONTE: DNOCS (2011)
111
Tabela 7 - Condições de acesso à moradia das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.
Localidade
Total
de
famílias
Condições de acesso ao imóvel
Próprio Cedido Alugado
Nº % Nº % Nº %
Distrito de Ibiapaba (zona rural) 198 153 28,87 43 23,63 2 33,33
Curral Velho 196 163 30,75 33 18,13 0 0,00
Poti 245 180 33,96 61 33,52 4 66,67
Assis 79 34 6,42 45 24,73 0 0,00
TOTAL 718 530 100,00 182 100,00 6 100,00
73,82% 25,35% 0,84%
FONTE: DNOCS (2011)
Tabela 8 - Acesso à energia elétrica e abastecimento d’água das famílias atingidas pela
implantação da Barragem Lago de Fronteiras.
Localidade
Famílias
Energia elétrica
Famílias
Abastecimento d’água
Sim Não Rede pública/
poço ou chafariz
Rio ou outra
fonte natural
Nº % Nº % Nº % Nº %
Distrito de
Ibiapaba
(zona rural)
199 194 27,71 5 27,78 191 146 26,07 45 28,48
Curral Velho 198 194 27,71 4 22,22 198 163 29,11 35 22,15
Poti 260 253 36,14 7 38,89 264 223 39,82 41 25,95
Assis 61 59 8,43 2 11,11 65 28 5,00 37 23,42
TOTAL 718
700 100,00 18 100,00 718
560 100,00 158 100,00
97,49% 2,51% 77,99% 22,01%
FONTE: DNOCS (2011)
Verifica-se pela Tabela 8, que a quase totalidade das famílias têm acesso à energia
elétrica, um serviço quase que é universalizado, provavelmente em função de políticas
públicas voltadas para este fim, como é o caso do Programa Luz para Todos. Cerca de 78%
têm acesso à rede pública/ poço ou chafariz para abastecimento d’água.
112
Tabela 9 - Acesso à saneamento básico por parte das famílias atingidas pela implantação da
Barragem Lago de Fronteiras.
Localidade
Saneamento Básico
Esgoto Destino do lixo
Famílias
Rede
pública Fossa séptica A céu aberto
Famílias
Coleta
pública A céu aberto
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Distrito de
Ibiapaba (zona
rural)
199 0 0,00 89 20,99 110 37,41 197 0 0,00 197 27,44
Curral Velho 198 0 0,00 141 33,25 57 19,39 198 0 0,00 198 27,58
Poti 262 0 0,00 171 40,33 91 30,95 264 0 0,00 264 36,77
Assis 59 0 0,00 23 5,42 36 12,24 59 0 0,00 59 8,22
TOTAL 718
0 0,00 424 100,00 294 100,00 718 0 0,00 718 100,00
0 59,05% 40,95% 0% 100%
FONTE: DNOCS (2011)
A oferta de saneamento básico, como condição de acesso de serviços de saúde é um
direito mínimo universal do cidadão. É fundamental que ele seja universalizado, sobretudo,
numa sociedade tão extremamente diferenciada como a nossa, principalmente nas áreas rurais
de regiões pobres do Brasil, como é o caso das famílias atingidas pela implantação da
barragem Lago de Fronteiras. Com relação a nível de saneamento, considerou-se para efeitos
deste trabalho, o destino dos dejetos e o destino dado ao lixo domiciliar. Neste respeito nota-
se que, não existe rede pública nem de esgoto, nem coleta de lixo, o que é comum no meio
rural, embora mais da metade, cerca de 59,05% utilize fossa séptica, conforme Tabela 9. A
totalidade das famílias coloca o lixo a céu aberto, também de acordo com a Tabela 9.
7.2 AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS ESTABELECIDAS NO PROCESSO DE
IMPLANTAÇÃO DA BARRAGEM.
7.2.1 Comitê de Apoio aos Produtores do Lago Fronteiras
Para a comunidade ao entorno da barragem foi criado o Comitê de Apoio aos
Produtores do Lago Fronteiras, composto de 24 membros que irão acompanhar e fiscalizar as
obras do açude junto ao DNOCS. Além de apoiar as famílias de produtores situadas na área
da obra, estes irão também debater e fiscalizar os processos de implantação do Lago de
Fronteiras em todos os seus aspectos, bem como do uso que se farão do respectivo lago.
113
O referido Comitê tem acompanhado as ações implementadas e as orientações
dadas pelo órgão responsável pela obra com realizações de reuniões para a socialização das
informações e tomada de decisões acerca da proposta inclusa no projeto da barragem para o
reassentamento. As comunidades atingidas que farão o deslocamento compulsório são: Zona
rural do distrito de Ibiapaba com 199 famílias; Curral Velho com 197, Poti será 100%
atingido com 262 famílias; Assis com 60 famílias. Somados a estes se deve mencionar os
equipamentos sociais de cada um destes distritos como: cartórios, postos de saúde, escolas,
igrejas e praças, dentre outros.
De acordo com a presidente da Associação Comunitária de Ibiapaba, o Comitê de
Apoio aos Produtores do Lago Fronteiras:
[...] É uma iniciativa pioneira... nós somos o primeiro grupo formado para dar esse
apoio e acompanhamento aos proprietários de terras que serão desapropriadas no
Estado e foi uma iniciativa da própria comunidade dos distritos de Ibiapaba, Poti,
Assis e Curral Velho”
7.2.2 Percepção dos atingidos em relação às ações institucionais
Em visitas a estas comunidades e em conversas conjuntas com os moradores, se
obteve-se depoimentos que relataram sua compreensão acerca das informações dadas pelos
agentes institucionais sobre a barragem Lago de Fronteiras, conforme segue:
Morador relatou
[...] já tivemos visitas com os técnicos da barragem, a primeira vez que eles vieram,
já faz três anos ou mais, disseram que a barragem ia ser feita e as nossas casas iriam
ficar muito perto da barragem, por isso a gente ia sair daqui e mediram nossas casas,
na outra vez que voltaram fizeram outras medições das casas e do terreno e disseram
que todo o nosso distrito do Poti ia ser inundado, nós íamos para outro local que não
souberam dizer qual era.
O relacionamento entre os diretores do DNOCS e nós tem sido satisfatório,
encaminhamos várias solicitações de esclarecimentos, convites a prestarem estes
esclarecimentos em reuniões aqui no Crateús, e fomos atendidos no que se refere a
informações. Acompanhando o relacionamento com os atingidos, observamos o
interesse dos diretores em esclarecer todo o processo de implantação do Projeto
Lago Fronteira aos impactados. Ocorre porém, que os atingidos têm necessidades
individuais e pressa em solucionar os problemas de saberem quanto vai valer sua
propriedade no caso do proprietário, ou sua bem feitoria, pressa para receber a
indenização, pressa pela Publicação do Edital de desapropriação, e esse processo é
lento.
Segundo os depoimentos, existe atualmente apenas uma equipe de revisão de
cadastro trabalhando. Denota-se que o trabalho desta equipe depende do trabalho das outras
comissões, a exemplo desapropriação e reassentamento. Estas só podem trabalhar a partir da
114
publicação dos editais, feita a partir da conclusão do trabalho do cadastro. Desta forma, o
Cadastro é responsável pela agilidade ou lentidão do processo.
Quando solicitados pelo Comitê de apoio ao Produtores do Lago Fronteiras
agilidade nas publicações dos Editais, houve a promessa de que será duplicada a equipe, a
qual será formada pelo pessoal da empresa que ganhou a licitação para fiscalizar a execução
da implantação do Lago; no que se refere às indenizações judiciais, os expropriados disseram
terem sidos bem atendidos.
Em 2012 houve uma reunião no Poti para discutir entre os moradores um local
para serem reassentados. Na ocasião, foi consenso entre os presentes à reunião que seria
melhor seriam que fossem reassentados na Lagoa da Moça, uma chapada próxima à Santa
Felícia, Pau Ferro. Assim, por meio do Comitê de Apoio aos Produtores do Lago Fronteira,
foi encaminhada esta opção ao Diretor Geral do DNOCS.
Em 12 de fevereiro de 2014, em reunião no Poti com equipes de Reassentamento,
Cadastro e Desapropriação, a representante do DNOCS perguntou aos presentes se já haviam
pensado onde gostariam de serem reassentados. Responderam que queriam ir para a Lagoa da
Moça. Entretanto, segundo os depoimentos, nota-se que há pessoas que não têm a percepção
de que este questionamento diz respeito a vida deles.
Outro atingido relatou:
[...] Quando eles voltaram para fazer outras medições, falaram que não fizessem
reformas nas casas, mas já tinha encostado o material e agora? Vamos esperar
quantos anos mais? As coisas do Governo demoram e ai o que a gente faz? Vamos
ser indenizados ou vamos para outro local ou não sairemos daqui como muitos
querem, pois a notícia dessa barragem já falam há mais de 10 anos.... e tem aqui
também pessoas que são morador, não é dono da casa, vive aqui há muitos anos
plantando e cuidando de terras para sobreviver [...]
Uma atingida relata que:
[...] Aguardo com esperança a construção do Lago de Fronteiras, não quero mais
morar aqui nas Cabaças, o pessoal do DNOCS já veio aqui e mediram, mediram...e
disseram para esperar. Fiquei viúva e meu marido é quem tomava de conta das terras
e do gado, eu quero receber a indenização como eles dizem e morar em Crateús, vou
tentar viver minha vidinha por lá...acho que a barragem vai ser bom para o povo
daqui... Eu ainda não vendi a propriedade por que é difícil, quem vai comprar
sabendo que vão construir a barragem aqui? [...]
O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) já iniciou o
processo indenizatório das áreas que serão atingidas pela construção da barragem
Fronteiras no município de Crateús. O DNOCS está indenizando a área onde será construído
o eixo de barramento do rio, na qual estão situadas 29 propriedades, no total de 2.200
115
hectares. Para a construção de toda a barragem, está prevista a indenização de 42 mil hectares,
estando já empenhada, inicialmente, a quantia de R$ 11 milhões. Em Crateús já se encontra
instalada a Comissão de Desapropriação que funciona com escritório no centro da cidade
O jornal “Diário do Nordeste” de 21 de dezembro de 2012, sob o título “Lançado
edital de obras da Barragem Fronteiras” traz a expectativa que a barragem será iniciada
brevemente:
O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) licita a barragem
Fronteiras, que será construída neste município. O edital para licitação da empresa
que vai construir a barragem foi lançado no dia 12 último. A informação é do
próprio órgão.
A barragem é aguardada pela população de Crateús e região. Com o abastecimento
de água e irrigação de 6 mil hectares, será beneficiada uma população de 80 mil
pessoas no município, promovendo a redenção hídrica de uma das regiões mais
secas do Estado. Será a sexta maior barragem do Ceará.
Moradores, técnicos e autoridades municipais são taxativos quanto à necessidade e
importância da construção do Lago de Fronteiras. A expectativa é que a barragem
transforme o perfil econômico do município, promovendo desenvolvimento
sustentável de uma região que sofre com as consequências da falta de água e de
reservatórios de grande porte. Piscicultura e fruticultura serão possíveis quando a
barragem adquirir volume de água, cujos resultados serão sentidos diretamente no
crescimento da agricultura familiar na região do rio Poti.
Na construção das grandes barragens e no caso específico a do Lago de
Fronteiras, o volume d´água acumulado para os longos períodos de estiagem na região
certamente causará grandes impactos no contexto socioambiental. Alterações no rio em vários
aspectos cujas variações na distribuição espacial e temporal nos regimes de fluxo estão entre
as principais, propriedades rurais, benfeitorias, flora, fauna e, principalmente, as pessoas
atingidas pelo lago formado a partir do barramento, são os principais elementos impactados.
Vainer (2008) coloca que as comunidades afetadas pela construção do lago se
veem obrigadas a aceitar ou acatar a implementação desses projetos mesmo tendo seu espaço
de vivência, sua moradia construída ao longo de várias gerações, sendo modificado por
agentes institucionais, sem que possa exercer qualquer poder de interferência destes,
desconstruindo as já estabelecidas construções históricas, sociais e naturais do seu meio.
Nestas modificações, diversas intervenções são feitas, geralmente, levando em consideração
prioritariamente as necessidades para efetivação da instauração das barragens.
116
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados da pesquisa demonstraram que de fato as áreas semiáridas possuem
dinamismo peculiar que necessitam de maior investigação, principalmente em áreas ainda tão
carentes de informações.
Os levantamentos ligados ao resgate histórico mostraram que com o adensamento
populacional dos municípios inseridos na área de estudo, o aumento da pecuária e das
atividades agrícolas, a demanda hídrica foi aumentada a ponto de paliativos do tipo escavação
de poços, construção de cacimbões e de açudes particulares não serem mais suficientes.
Houve intervenção governamental e o exercito, através do 4º BEC instalado em Crateús na
época, construiu o açude Poti (barragem do batalhão) para o dessedentamento da sede
municipal.
A partir de então, o Governo Estadual assumiu as ações de açudagem. Este, a fim
de minimizar os efeitos das secas e favorecer a permanência do homem no campo, reduzindo
o êxodo rural, construiu os açudes Carnaubal e Flor do Campo, implantando em cada um
deles perímetros de irrigação, atualmente com pouca atividade.
No momento, o Governo Federal realiza os trabalhos iniciais para a construção de
um novo barramento: o açude Lago de Fronteiras, com a finalidade promover o controle de
enchentes, o reforço de abastecimento da sede do município de Crateús, o incremento da
piscicultura, a perenização de parte do rio Poti e o desenvolvimento regional por meio de
projetos de irrigação.
A análise climato-hidrológica se mostrou importante no entendimento da
dinâmica hídrica do sistema fluvial, cooperando para o entendimento dos usos e respectivos
impactos. Nesta, constatou-se a necessidade da acumulação artificial por meio de açudes, em
razão da baixa e irregular distribuição pluviométrica (675 mm.ano-1
) concentrada nos meses
de janeiro a maio, bem como da predominância de terrenos cristalinos que favorecem o
escoamento. Por outro lado, os barramentos se mostram importantes na contenção de cheias
que podem ocorrer em anos de chuvas excepcionais, quando é possível observar índices
pluviométricos diários acima de 100 mm.
As vazões analisadas para os barramentos em foco mostraram que elas se
distribuem conforme aporte recebido. O açude Carnaubal teve um padrão de vazões liberadas
mais definidas espacial e temporalmente, mostrando maior regularidade, com médias de
300l/s dada a necessidade permanente de abastecimento da sede municipal de Crateús. Já o
açude Flor do Campo apresenta valores médios de liberação de 120 l/s, tendo intervalos
117
consideráveis de vazões zero que coincidem com as quadras chuvosas, ou seja, períodos em
que também o Carnaubal recebe recarga.
Embora os barramentos propiciem o atendimento à escassez hídrica de uma região
cada dia mais populosa, mesmo gerando transtornos e sofrimentos a uma parte dessa
população, é para ela, a região e o restante da população, um benefício bem-vindo e esperado.
Entretanto, tão importante quanto implantar novos barramentos é administrar e gerenciar
aqueles já instalados de modo a impedir ou minimizar efeitos naturais causados pelo tempo de
uso, tipo assoreamentos, que neutralizem os objetivos propostos na sua implantação.
Um aspecto relevante na gestão dos recursos hídricos consiste em equilibrar a
vazão de acordo com o volume acumulado no período chuvoso conciliando com a
necessidade dos usos, não deixando que o barramento alcance sua cota mínima, entrando em
colapso. Tal colapso ocorreu na barragem Carnaubal em 2013, o que gerou conflitos entre
municípios pertencentes à bacia estudada. Desse modo, fica evidente a necessidade da
continuidade das observações para verificações mais detalhadas em anos chuvosos.
Em razão da alta variabilidade pluviométrica em áreas semiáridas, os canais se
alteram com facilidade. Por essa razão, a preservação de margens é de extrema importância na
sua manutenção. Resultados das análises dos perfis transversais, acompanhados na área,
mostraram poucas modificações no período estudado, devido à escassez pluviométrica
registrada no seu intercurso. Isto caracteriza o regime hidrológico e condiciona a
morfodinâmica atual. Porém, alterações de grande monta foram observadas nas formas de
usos.
Os sedimentos coletados deixaram evidente, nas análises granulométricas
realizadas, um material com muito cascalho e areia lamosa, mostrando pouco poder de entalhe
e transporte realizado. Quando observados materiais de margem e fundo, foi possível perceber
que o leito pode estar alimentando as margens, pois mostraram semelhança nos materiais que
os compõem, o que pode ser ocasionado pela falta da proteção dada pela mata ciliar.
As análises de usos da terra, realizadas através de imageamento, indicaram que o
rio Poti se encontra com grande parte de suas margens comprometidas devido à retirada da
mata ciliar. Os usos estão associados principalmente às diversas atividades desenvolvidas,
sobretudo a agricultura e a pecuária que é praticada desconsiderando aspectos importantes da
dinâmica fluvial. Em razão de tais usos, é comum observar alterações constantes no canal.
Fato este que favorece o assoreamento do leito, assim como o descaso para com a planície.
Notadamente, o leito fluvial onde é visível e de conhecimento público o seu uso para o
lançamento de efluentes da área urbana.
118
Observando o que foi projetado com a implantação do barramento em execução,
se levarmos em conta apenas o aspecto ambiental, pelo fato da planície, no trecho estudado,
sofrer uma redução de 31,13% ou 26,45%, dependendo da cota, conclui-se que esta passará a
ter uma área de uso inferior em mais de ¼ da atual com prejuízos consideráveis a fauna e a
flora. As perdas serão acentuadas no tocante aos usos como a agricultura e a capoeira que
terão redução respectivamente de 26,3% e 29,6%, na cota máxima e 22,2% e 24,5%, na cota
mínima. Também é relevante a perda da cobertura vegetal, da ordem de até 65,3%
compreendendo a caatinga arbustiva densa e aberta, podendo afetar de forma significativa o
ambiente. Tudo isso conduzirá a planície para busca de novas formas de equilíbrio no sistema
fluvial e ambiental, pois outras áreas de uso serão advindas dentro dessa perspectiva que irá se
instalar, mediante cotas pré-estabelecidas de cobertura, pelo lago.
Justifica-se a construção do barramento Lago de Fronteiras somente quando se
leva em conta a carência hídrica para uso humano, existente na região e a falta de opções que
gerem esse atendimento, inclusive com projeções para o futuro, considerando sua
sustentabilidade para uso das novas gerações que ocuparão a região. Teoricamente a
minimização dos prejuízos será obtida através do gerenciamento e da atenção que os órgãos
de governo estadual e federal se comprometem a ter com a região em pauta, em especial em
relação às famílias atingidas pela implantação da barragem.
Ressalta-se que estas famílias, na atualidade, são assistidas pelo Comitê de Apoio
aos Produtores do Lago de Fronteiras, iniciativa pioneira, que irá acompanhar e fiscalizar as
obras junto ao DNOCS. O comitê, além de apoiar as famílias atingidas, debater e fiscalizar os
processos de implantação, bem como o uso que se farão do respectivo lago, realiza reuniões
para a socialização das informações e tomada de decisões acerca das propostas de
indenização, atingidos parcialmente e dos reassentamentos. Entretanto, em meio a todo esse
“progresso” verifica-se que as comunidades atingidas se veem obrigadas a aceitar e acatar a
efetivação desse projeto, mesmo que para aqueles que necessitam de reassentamento
signifique perder seu espaço de vivência, desconstruindo suas relações históricas, sociais e
naturais com o meio.
Considerando todos os fatos, o que é possível concluir que a utilização
indiscriminada de toda a planície de forma não sustentável põe a região em risco. Com o
quadro fortemente impactado e a par da forte pressão exercida pela população sobre o
vulnerável potencial de recursos naturais da área, os problemas são sensivelmente agravados
durante os períodos de secas recorrentes. Esse quadro assume proporções progressivamente
119
mais graves onde é maior a degradação ambiental e mais nítidos são os efeitos do uso intenso
observado.
Entretanto, esta situação não é definitiva. A aplicação das leis existentes para as
áreas de APP, referentes a rios perenes e intermitentes, acompanhadas do rigor legal na sua
execução, gerariam um início de reversão na situação atual. Alterações que nem são de tão
grande monta podem ser assumidas pelas instituições governamentais e implementadas por
estas, com ações que envolvam educação ambiental e práticas agricultáveis sustentáveis e
assimiláveis pela população ribeirinha, que, uma vez esclarecida sobre os benefícios possíveis
de usufruir e que, dispondo de alternativas as quais preservem o ambiente que lhes
proporciona o meio de sobrevivência e a moradia, certamente colaborará, buscando
adequações concernentes à semiaridez e à melhoria da qualidade de vida.
120
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