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#02 Arquivo de tendências • Planejamento Rae,MP Ano 1 Marketing Vidaloka parte 2. pg3 Florindi. pg8 Transmedia Storytelling. pg10 Experiência Virtual. pg14 Editorial. pg2

hiperbólico #2

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Neste hiperbólico número 2, damos continuidade às reflexões sobre segmentação de públicos muito além da qualificação acadêmica, metódica e numérica dos institutos de pesquisa, analisando outras nuances da cultura “vidaloka” periférica das grandes cidades. Tais fatores são importantes para a avaliação das marcas que querem aproveitar o crescente potencial de consumo desse público. E já que estamos falando de culturas e inclusão ao mercado de consumo global, levantamos algumas características da recente influência indiana no mundo do design. Atravessando esse pensamento, abordamos ainda as estratégias de transmedia storytelling e de experiência virtual, expressões máximas desse caos ordenado cada vez mais presente no planejamento das marcas.

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· EDITORIAL Caos e progresso

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ndependente do romantismo que permeia os inflamados conceitos sobre comunicação e publicidade – a primeira como a verdadeira disciplina que norteia e avaliza as ações

da segunda –, importante não confundir seus distintos papéis. Se a comunicação tem o sublime desejo de conduzir as decisões humanas, o papel da publicidade pende mais para induzi-las. Decisões e pessoas. Se uma origina-se da necessidade básica da espécie em se relacionar, a outra tem natureza na sobrevivência da mesma em se realizar. Uma é inteligência, outra é instinto.

Por mais crítico que pareça, esse é um discurso de auto-afirmação. Estamos intimamente ligados ao capital para sobreviver, enquanto profissionais e enquanto gente. Aliás, nenhuma área é tão dependente assim dos recursos financeiros quanto a nossa, e isso é um fato que precisamos aceitar. Por que então não usar uma referência do mercado financeiro para validar esse pensamento?

Assim como Philip Kotler está para os marketeiros, Max Gunther está para os especuladores. Qualquer investidor, financista ou corretor saberá versar sobre alguma máxima compilada pelo autor suíço no seu livro Axiomas de Zurique. E inspirados exatamente por um de seus fundamentos que apresentamos o segundo número do hiperbólico. Se nos negócios que envolvem riscos, “até começar a parecer

ordem, o caos não é perigoso”, como não estender essa evidência à publicidade e à sua tendência de ser mutante?

Arriscando-nos por esses caminhos, damos continuidade às reflexões sobre segmentação de públicos muito além da qualificação acadêmica, metódica e numérica dos institutos de pesquisa, analisando outras nuances da cultura “vidaloka” periférica das grandes cidades. Tais fatores são importantes para a avaliação das marcas que querem aproveitar o crescente potencial de consumo desse público. E já que estamos falando de culturas e inclusão ao mercado de consumo global, levantamos algumas características da recente influência indiana no mundo do design. Atravessando esse pensamento, abordamos ainda as estratégias de transmedia storytelling e de experiência virtual, expressões máximas desse caos ordenado cada vez mais presente no planejamento das marcas.

Pelo fomento e pela sobrevivência, pelo instinto e pela inteligência, que essa contribuição possa conduzir decisões nesse novo cenário: o caos pelo progresso.

Edney Carpinteiro Diretor de Planejamento

Rae,MP Comunicação [email protected]

Os artigos da presente edição são assinados por Henrique dos Santos ([email protected]).

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segmentação do público-alvo em uma campanha é muito importante por impedir que um público abran-gente demais possa gerar dispersão e ruído na comu-

nicação empregada, exigindo dos profissionais de marketing definições de seu target segundo critérios geográficos, de-mográficos, psicográficos e comportamentais. Um estilo de vida reconhecido, mas pouco analisado em campanhas de marketing, é o da “cultura dos manos”, nas periferias das metrópoles. Obviamente, estes estilos de vida periféricos também variam muito de região para região, mas, assim como Atenas e Esparta na Grécia Clássica, estas São Paulo e Rio de Janeiro são icônicas nesta cultura do gueto, com certas diferenças muito tangíveis.

Na edição anterior, foram analisados o vestuário e o uso de joias e acessórios neste segmento de consumidor. Dando continuidade ao artigo, os aspectos analisados serão a ali-mentação, o valor dos automóveis e a participação no mundo virtual dos adeptos da Vidaloka.

3. Batendo uma Lára na Quebrada (Alimentação)

Para alimentação, não há marcas realmente ligadas à Vidalo-ka, e este estilo de vida passa a ser totalmente parte da baixa renda. Ou seja, marcas talibãs (ou marcas de guerrilha) são o dia-a-dia. De 20 a 70% mais baratos que marcas premium, os

produtos de marcas de guerrilha são a melhor opção dentro de uma realidade que se baseia na exibição de fartura na casa através das refeições.

Em festas familiares e entre amigos, churrasco e cerveja são fundamentais, embora pão com carne-louca e salgados como coxinhas e bolinhos de queijo também sejam praxe. Os chama-dos “refrigerecos” de marcas de guerrilha são a única opção no raciocínio volume x preço.

Para comer fora, bairros periféricos costumam ser repletos de trailers de hot dogs e “casas-lanchonetes” (imóveis residenci-ais onde o dono adapta a varanda para comportar um balcão e mesas). Da mesma forma que ocorre em cidades do interior, os lanches costumam ter o dobro ou até o triplo do tamanho de lanches comuns, por um preço menor. A marca Mc Favela, surgida na periferia de São Paulo, tornou-se famosa por seu plágio des-carado, mas também por seus enormes lanches.

Uma outra opção na periferia são os botecos, quase sempre acompanhados de um samba e uma pequena churrasqueira do

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lado de fora. Entre uma sinuca ou um dominó, os petiscos de botecos e a cerveja são a refeição básica.

4. Barca pros Rolê (Automóveis)

Talvez o bem mais precioso da Vidaloka seja o automóvel. Ele revela muito do estilo do indivíduo, não pelo modelo – uma vez que geralmente são mode-los já ultrapassados pelas novas tecnologi-as ou são carros po-

pulares, como Chevettes, Caravans, Diplomatas, Palios, Corsas e Celtas – e sim pelas modificações realizadas no veículo.

São três os pilares da modificação e personalização dos carros deste estilo de vida: visual, sistema de som e motorização. Com relação ao visual, adesivos que simulam a aparência de um carro de corrida ou padrões abstratos costumam ser colo-cados na lataria, sendo um sonho constante comprar rodas cromadas praticamente artesanais de tão bem trabalhadas. Suspensão rebaixada e Insulfim são quase unanimidade, en-quanto spoilers (asas e minissaias) e neon são itens de gosto pessoal.

O sistema de som é algo muito procurado, e compõe as primei-ras modificações quando o indivíduo da Vidaloka adquire o au-tomóvel. Para os interessados, subwoofers, tweeters e cornetas fazem parte da linguagem comum, e eles conversam sobre

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combinações de acessórios sonoros com a mesma desenvol-tura com que se discute futebol. E não apenas no carro, mas também em casa, o sistema de som precisa ser grande (ou seja, apresentar proporções maiores para parecer melhor) e potente.

Por fim, a motorização também é valorizada não pela veloci-dade ou potência, mas sim pelo barulho que faz (e isso tam-bém vale para o sistema de som). Um típico carro de um Vi-daloka apresenta motores turbinados que dão o “respiro” cada vez que o veículo tem sua marcha trocada.

Para quem não pode adquirir um automóvel e optam por mo-tos, a preferência pela Honda Biz ainda permanece sem expli-cação. Para o restante, uma BMX (bicicleta preparada para bicicross) é a opção final.

Clipes e filmes são as formas mais comuns de impactar o Vidaloka e influenciar seu consumo de itens de tuning. O pro-grama Yo!MTV, já mencionado, era o melhor canal publicitário por exibir nos clipes os veículos dos rappers. Os raps costu-mam conter em suas letras menções às marcas consumidas pelos Vidaloka e, inclusive, suas preferências de “tunagem” do automóvel (como na música "Carro de Malandro").

5. GTA na Goma, Samba ou Baile? (Entretenimento e Diver-sões)

As principais formas de diversão de um Vidaloka à noite, no âmbito musical, é sair para um baile funk (geralmente, em algum morro no Rio de Janeiro) ou então, tanto em RJ co-mo em SP, a um “samba” (boteco ou espaço aberto onde gru-pos da própria região se apresentam). No caso dos bailes funk cariocas, alguns deles são até mesmo “patrocinados” por al-guma facção criminosa e frequentados pelos integrantes do “movimento” (como chamam as atividades criminosas ligadas ao tráfico); sendo assim, bailes funk são extremamente arrisca-dos para quem possui contatos com facções de outras regiões.

Nas periferias, é comum a delimitação de terrenos baldios para as “peladas” de fim de semana, ou então como ponto de en-contro para todos os que desejam empinar pipas sem os fios elétricos como obstáculos. Além das peladas, a ida ao boteco aos fins de semana também é uma opção de diversão.

No meio eletrônico, um Vidaloka irá preferir três tipos de jogos (embora ainda jogue outros): corrida (Need For Speed: Under-ground é o preferido), futebol e ação (com uma predileção es-pecial por GTA: San Andreas). O jogo de luta Def Jam: Icon

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também é muito bem visto pelos Vida-loka, porque os personagens lutadores são todos rappers conhecidos (como Fat Joe, Ghostface Killah, Lil’Jon, Luda-cris, Method Man, Redman, Sean Paul, T.I., The Game e Young Jeezy). GTA: San Andreas é o preferido entre todos,

por dar aos Vidaloka a oportunidade de se tornarem os verda-deiros herois e mandantes da periferia.

6. Foto co’Oitão (Presença Digital)

A inclusão da Vidaloka no mundo digital se deu essencialmente através das fer-ramentas de comunicação. Na época em que os chats eram moda (entre 1995 e 1999), alguns poucos indiví-duos do estilo Vidaloka frequentavam as salas de bate-papo, sendo muitas

vezes considerados flamers (excessivos em termos de baixo calão e palavras ofensivas) em relação aos outros frequenta-dores. Desta forma, a maioria não-Vidaloka gerou um ambien-te pouco hospitaleiro aos Vidaloka.

A segunda fase da web social no Brasil (entre 1999 e 2004) foi através dos blogs e, principalmente no caso dos Vidaloka, dos fotologs. A tecnologia da fotografia digital (limitada às máquinas fotográficas, pois os celulares que continham câ-

meras ainda apresentavam baixíssima resolução) proporcionou às baixas camadas sociais uma forma muito mais acessível de fotografar sem precisar comprar filmes ou pagar a revelação; assim, os blogs e fotologs se tornaram o melhor meio de arma-zenamento. Não apenas isso, os blogs e fotologs abriram a Vidaloka ao mundo. Dezenas de blogs e fotologs de pessoas da periferia proliferaram, mostrando mais claramente a visão de mundo e o comportamento dos diversos estilos de vida das camadas baixas da sociedade.

Com o sucesso do MSN no início da década de 2000, os adep-tos da Vidaloka puderam sentir um ambiente hospitaleiro que não havia nos chats, pela possibilidade de selecionarem quem eles adicionariam ou deletariam de seus contatos. A revolução que a tecnologia dos IMs (instant messengers) provocou não teve repercussões particulares na baixa renda ou na Vidaloka; eles encontraram as mesmas oportunidades e desafios que os outros internautas viam.

Atualmente, a quarta fase (da Web 2.0) é marcada pelo Orkut, que obteve grande volume de cadastros brasileiros (chegando a ocupar 60% da população total do Orkut), inclusive dos Vidalo-ka, que viam lá um terreno substituto de seus blogs e fotologs, além de poderem se comunicar via scraps. Outra tendência veio com o YouTube, uma vez que vlogs não obtiveram sucesso no Brasil. A tecnologia dos celulares avançou de modo a permitir fotos e filmes com melhor resolução, que eram inseridos no álbum do perfil do Orkut ou inserido no YouTube.

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Para um Vidaloka, o poder vem do medo e do respeito que geram nas outras pessoas, então seu linguajar reflete a vio-lência, enquanto suas fotos quase sempre apresentam fisio-nomias sérias ou o famoso “sangue nos’óio”, o olhar amea-çador. Outra característica comum é a busca por posar com alguma arma, seja para defender sua facção ou o “movimen-to”, seja para apenas parecer ameaçador.

Uma marca venerada pelo estilo Vidaloka é, portanto, uma marca com grande potencial de lucro, pois se liga a um grupo social muito dependente da exposição do status através das marcas de suas roupas, acessórios, veículos e objetos eletrô-nicos. Porém, representam uma segmentação desafiadora para ações de marketing, uma vez que se comportam com algumas peculiaridades em seu consumo das mídias.

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· DESIGN Florindi

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esde quando foi definido como megatendência da mo-da na joalheria em 2007, o design chamado Florindi foi aumentando seu sucesso e acompanhando o cresci-

mento da influência indiana na cultura popular mundial. Tido como uma 4ª onda indianista nas artes e no design mundial (precedido pelo Orientalismo, Hindoo e o Neo-Esoterismo), o nome combina as palavras flor (de floral) e indi (de Índia). Reflexo da força desta nova onda é o lançamento da Vogue India, criada e desenvolvida exclusivamente para a cultura indiana.

A cultura pop viu, principalmente em 2008 e 2009, o forta-lecimento da cultura indiana, muito devido ao pertencimento da Índia aos BRIMCS (bloco econômico dos países emergen-tes, formado pelas siglas dos seguintes países: Brasil, Rússia, Índia, México, China e África do Sul), o que lhe garantiu uma ótima salvaguarda contra o andamento da economia mundial desde a segunda metade de 2008. Mesmo os meios de mas-sa se aproveitaram da ocasião para mostrar a cultura indiana – como se pôde ver o sucesso de bilheteria e vitórias no Prê-mio Oscar do filme Quem Quer Ser um Milionário?, ou mesmo a novela brasileira Caminho das Índias.

A dança indiana está crescendo cada vez mais em populari-dade, seguindo esta nova onda indianista. Academias e esco-las de dança que ensinam o naach (que significa “dança”, em hindu) no estilo Bollywood – um misto de dança folclórica

indiana e movimentos de dança do Ocidente – tornaram-se uma febre nos EUA (principalmente Los Angeles e Nova York) e Grã-Bretanha, onde é conhecido como Aeróbica Bollywood, masala bhangra ou naachercise.

Mesmo o vestuário inspirado no Florindi já é algo comum há alguns anos, embora termos como sari (vestido indiano feminino) e bindi (círculo colorido pequeno que fica entre as sobrancelhas) estejam che-gando agora ao conhecimento geral. Além do vestuário, temperos e bebidas indianas estão se tornando mais co-muns, como o próprio chai (uma es-pécie de chá de coloração escura, bebido na Índia com a naturalidade com que o brasileiro bebe café).

Entre as grandes indústrias automotivas, é impossível não ficar sabendo sobre o incrível sucesso da montadora Tata, princi-palmente com seu modelo Nano, tido como o carro mais barato

do mundo (em torno de 2.500 dólares). O lança-mento de um veículo nesta faixa de preço recebeu diversas críticas com rela-ção à massificação de um veículo a combustão com

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· DESIGN Florindi

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potencial de piorar ainda mais os níveis de emissão de gases poluentes no planeta, além de aumentar o trânsito nas cida-des. Mesmo assim, tornou-se um símbolo mundial do país. No Brasil, a montadora Tata Motors informou que este veículo será comercializado até 2010, com um design diferente das características indianas.

O artista norte-americano Carlos Ramos está expondo na Corey Helford Gallery, até setembro de 2009, a mostra India, em que ele imerge na cultura tradicional indi-ana e a retrata em belas figuras que lembram traços de desenhos animados de Walt Disney. Sua temática muito voltada às religi-ões tradicionalmente indianas (Hinduísmo, Zen-Budismo e Hare-

Krishna) lembra um antigo anime dos anos 90 chamado Shurato, que seguia o sucesso de Cavaleiros do Zodíaco – porém, em vez de influências greco-romanas, este anime se baseava na mitologia hindu.

Flores e texturas étnicas orientais são a chave dos padrões do Florindi, com imagens multicoloridas, mandalas inspiradas no Tibet e padrões se irradiando do centro para as extremidades. O amarelo quente vem como a nova cor, inclusive na moda de vestuário e joalheria. A temática deste design se sustenta com

imagens e grafia alegres e coloridas, influências principalmente da Índia, Indonésia e Rússia, romance, casualidade, informali-dade, padrões têxteis e uso de flores.

Enquanto a Índia se mantiver com a popularidade atual, é pro-vável que muito mais de cultura seja assimilada pelo resto do mundo, mesmo com seus costumes milenares e muitas vezes estranhos às culturas ocidentais. De qualquer forma, o mundo está dentro da 4ª onda indianista, e talvez demore um pouco para que deixemos de ouvir “Are Baba!” pelas ruas.

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· ESTRATÉGIA Transmedia Storytelling

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m outubro do ano passado, foi realizada a 2ª edição do iG Digital Day pelo portal iG, voltado a publicitários e anunciantes. Além de discussões sobre a nova era da

comunicação e suas tendências, um dos tópicos mais inte-ressantes foi sobre o Transmedia Storytelling, a técnica de convergência de diversas mídias e o chamado entretenimento multiplataforma" dentro de uma linha histórica, reforçando o conceito atual de Branded Content. Para Mark Warshaw, pre-sidente da agência expert em transmedia storytelling Flatwor-ld Entertaiment, o segredo é que marca, mídia e público este-jam em harmonia.

Segundo o digital ninja da Naked, Faris Yakob (http://blog.mikekarnj.com/?p=161), a indústria da comuni-cação tem tradicionalmente adotado um modelo em que um único pensamento permearia todas as outras mídias, de modo integrado e 360º. Mas agora, haveria uma narrativa não-linear da marca: diferentes canais contendo elementos diferentes criariam um mundo mais extenso para ela, de forma que os consumidores iriam juntar os pontos e construí-la juntos. E pensando assim, tudo é projetado para que se criem comuni-dades sobre a marca, assim como Matrix fez as pessoas se juntarem para compartilhar elementos da narrativa (a partir de três filmes, uma coletânea de curta-metragens em estilo ani-me, quadrinhos, romances e três games – um deles sendo um MMORPG), criando a incrível nova “religião” chamada Matrixismo (http://www.matrixism.org/).

Para ações transmídia, o grande valor está ligado à capacidade e à predisposição em compartilhar conhecimento, ou seja, a “moeda social” (social currency) é que é “comercializada” entre os consumidores e fãs da marca, enquanto se dedicam a trocar informações relevantes. Exemplos do uso da moeda social se dão nas comunidades de ARGs (Alternate Reality Games), nas quais há a necessidade dos participantes se ajudarem para resolver desafios, puzzles e descobrir elementos da história, e também na construção de wikis (ex: Lostpedia – http://www.lostpedia.com/wiki/Main_Page – para o ARG Lost Experience) para agregar em um único local todo o conheci-mento gerado a partir destas interações. Para o teórico Pierre Levy (http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_L%C3%A9vy), esta forma de participação dos consumidores geraria o que ele chama de “inteligência coletiva”, termo que se refere às novas

estruturas sociais que possibilitam uma produção e circulação de co-nhecimento em uma sociedade interconectada.

Muitas histórias transmídia são baseadas não apenas em persona-gens individuais ou tramas especí-ficas, mas sim em complexos mundos fictícios que podem sus-tentar múltiplos personagens inter-relacionados e suas histórias indi-viduais. Devido à complexidade e à

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oportunidade em desvendar inúmeras informações, todos os consumidores participantes são incentivados a compreender profundamente um mundo que se expande cada vez mais. Esta é uma forma de prazer muito diferente do que é geral-mente associado à maioria das narrativas tradicionalmente construídas, onde se espera terminar uma obra (seja uma peça de teatro, um filme ou um livro) sabendo tudo o que é necessário para a história ter sentido.

Diferentes mídias podem servir a uma variedade de funções, enriquecendo o cenário fictício. Por exemplo, a rede BBC usou radionovelas para manter a audi-ência interessada na série Doctor Who (http://pt.wikipedia.org/wiki/ Doctor_Who) durante quase uma década em que nenhum episódio novo da televisão foi produzido. Estas extensões midiáticas forne-cem também insights sobre os personagens e suas motivações (como, por exemplo, os sites das séries Dawson's Creek e Veronica Mars que reproduziam correspon-dências imaginárias ou diários de seus personagens principais) e podem revelar aspectos do mundo fictício (como a versão online do

Planeta Diário publicada semanalmente durante a série de qua-drinhos 52, reportando os eventos do universo DC neste perío-do), ou funcionar como ponte entre eventos mostrados em uma série de sequências (como a série animada A Guerra dos Clo-nes – que passou no canal Cartoon Network – e o filme anima-do A Guerra dos Clones – que foi aos cinemas. Ambos preen-chiam o lapso entre os filmes Star Wars II e III). A extensão midiática pode adicionar um grande senso de realismo à ficção como um todo: tanto os documentos falsos relacionados ao filme A Bruxa de Blair como os documentários e CD-ROMs

produzidos especialmente para dar veracidade ao filme Titanic enrique-ceram o cenário de cada filme e gerou maior expectativa por ambos os filmes. Um ótimo exemplo deste enriquecimento como preparação a um filme vem do site whysoserious (http://www.whysoserious.com/), li-gado ao filme O Cavaleiro das Tre-vas, continuação de Batman Begins – este site serviu na verdade como um portal de vários outros sites relativos ao filme (exatamente 45 sites!), cada um ligado a um aspec-to diferente do cenário de Batman: desde o recrutamento dos capangas do Coringa, passando pela principal

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pizzaria, uma comunidade cristã da cidade, a campanha polítia de Har-vey Dent, empresas privadas diferen-tes, e até dos Cidadãos por Batman.

O uso do Transmedia Storytelling pode expandir o potencial de mer-cado de uma marca ao criar dife-rentes “portas de entrada” para diferentes públicos-alvo. Por exem-plo, a Marvel Comics produz uma linha de quadrinhos voltada especi-ficamente para um público feminino (a HQ romântica Mary Jane Loves Spiderman) ou para leitores mais jovens ou mais velhos (como Mau-ricio de Souza fez ao criar a Turma da Mônica Jovem – http://www.turmadamonicajovem.com.br/turmadamonicajovem/). Mas o caso mais emblemático, e um ver-dadeiro case de sucesso em Transmedia Storytelling vem do já citado Mark Warshaw, para o seria-do de TV Heroes. Depois da série de TV, ainda foram criados quadri-nhos impressos e on-line, jogos para videogame, PC e celular, di-

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· ESTRATÉGIA Transmedia Storytelling

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versos sites fictícios (como da empresa Primatech Paper, do Hotel & Casino Corinthian, do livro Activating Evolution, da campanha política de Nathan Petrelli etc.), romances e graphic novels, programas especiais para TV (making of, vídeos ex-clusivos etc.) e CGC (conteúdo gerado por fãs) através do heroeswiki e do 9th Wonders. Em pouquíssimo tempo, os fãs se envolviam através das mais diversas mídias junto aos pro-dutores da série e a outros fãs, fortalecendo o programa e dando ao canal Universal Channel o 1º lugar entre os canais de TV por assinatura mais assistidos no Brasil nos anos de 2007 e 2008.

Uma campanha baseada em Transmedia Storytelling não ape-nas permite a disseminação de informação, mas também fornece novas funções e papéis que o consumidor pode as-sumir como parte de seu cotidiano. Esta possibilidade é espe-cialmente notada no lançamento de brinquedos de bonecos que encorajam as crianças a construírem suas próprias histórias ou RPGs (role playing ga-mes) que convidam os jogadores a imergirem no mundo fictício. Em Star Wars, o lançamen-to do boneco de Boba Fett gerou um interesse tão grande pelo personagem (que teve um ínfimo papel na primeira trilogia filmada) que pressionou George Lucas e autores do Uni-verso Expandido a darem maior relevância a este personagem. O próprio boneco do Super 15, da companhia Telefonica, permitiu às

crianças fixarem facilmente o código da operadora e ainda con-tribuiu para a criação de histórias que o valorizassem ainda mais. O personagem Hiro Nakamura, do seriado Heroes, teve uma aceitação tão positiva que gerou blogs e perfis em redes sociais (como MySpace e Facebook), e até mesmo um roman-ce impresso sobre seu caso com a garçonete Charlie.

A tendência do Transmedia Storytelling se fortalece a cada dia, uma vez que o consumidor se torna mais cético quanto à pro-paganda tradicional, exigindo abordagens mais criativas e en-volventes que simples anúncios na TV ou no meio impresso; novos comportamentos para o consumo de mídia se apresen-tam e poucas são as empresas que enxergam oportunidades em vincular suas marcas a histórias bem planejadas. Menos ainda são aquelas que abrem suas portas para o poderoso CGC e se tornam produto tanto da empresa como do consumidor. Marcas que adquiram esta capacidade estarão preparadas para as cada vez mais iminentes reviravoltas no consumo de mídia e ganharão ainda mais valor na mente do consumidor.

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ara quem acompanha as tendências da Comunicação e do Marketing, as estratégias online e digitais se tornam um vocabulário cotidiano, com as mais diversas formas

de se atingir o consumidor brotando a todo momento. Mes-mo assim, tais estratégias ainda não transmitem ao consumi-dor as sensações que a marca deseja projetar. A Internet, ao mesmo tempo em que é encarada como um novo rol de mí-dias (a maioria interativa), é também um ambiente virtual, um segundo mundo. No mundo físico, a marca se projeta através dos canais de comunicação e através de experiências de marca. A oportunidade é, portanto, criar a experiência de marca dentro do mundo virtual. Atualmente, poucas são as tentativas, e menos ainda são os resultados esperados de retorno em negócio.

Uma tentativa muito bem sucedida foi realizada pela Dodge do Japão, que criou um advergame na internet, com uma estru-tura nada convencional: seus gráficos são simples, muito pró-ximos de um Atari ou outros consoles antigos de 8 bits, com a cara de Super Mario Bros. A Dodge propôs um RPG interativo, que conta uma história através do envolvimento com a marca durante as dezenas de horas de jogo. O plot não poderia ser mais simples também: o personagem principal deve conquistar a mocinha Lucy através da compra de um Dodge para ela. Com a atual mania de inspirar-se em designs retrô, o advergame foi um sucesso no Japão, e soube transmitir com eficácia a sen-sação de querer e de possuir um Dodge.

A marca Sundown Motos projetou uma estrutura no Second Life com o objetivo de realizar o lança-mento exclusivo no metaverso (antes mesmo da vida real) do modelo Sundown 3 Rodas, utilizando o Second Life como plataforma de pesquisa e experimentação junto aos usuários. O projeto utilizou o meta-verso para testar a aceitação dos clientes com o novo produto, além de divulgar a marca por permitir que os usuários fizessem test-drives e circulassem livremente com motocicletas Sun-down pelo Second Life.

Os resultados repercutiram dentro e fora do Second Life, com mais de 50.000 visitas e 3.500 test-drives em 3 meses de a-ção, com mídia espontânea de peso divulgando esta ação, tan-to em mídia online especializada quanto em renomados veícu-los offline como grandes jornais e revistas, chegando a mais de 10.000 acessos ao vídeo de divulgação do projeto, postado no YouTube. Ao final, a motocicleta recebeu o nome de Sundown Solution e foi exposta no Salão Duas Rodas.

Outra ação completamente pioneira dentro do marketing virtual ocorreu com a parceria entre a Unilever e a Level Up! (empresa publisher do jogo multiplayer Ragnarok Online), no lançamento do novo desodorante Axe Dark Temptation. O produto foi inseri-do no jogo Ragnarok Online através do desenvolvimento de um

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item especial e também um evento dentro do jogo. A ação permite que os jogadores tenham uma forte interação com a marca Axe através do item exclusivo, a Essência de Axe, que poderá ser obtido no jogo. No final, os jogadores que conse-guirem acumular o maior número de itens serão premiados, com a expectativa de atingir 1 milhão de usuários únicos. Esta é a primeira vez em que um jogo eletrônico é utilizado para lançar um produto de consumo de massa, principalmente devido a seu cenário medieval-fantasy (estilo Senhor dos A-néis e World of Warcraft), e mesmo assim o desodorante foi introduzido em um ambiente inusitado, sem perder os valores de marca que pretendia transmitir.

O in-game product placement (inserção do produto dentro do contexto do jogo) é uma ótima estratégia, repleta de exem-plos. Os personagens descolados do game Devil May Cry usam calças da Diesel. No Tom Clancy’s Splinter Cell – Pan-dora Tomorrow, o personagem agente secreto usa um smart-phone p900 da Sony Ericsson para cumprir missões e o joga-dor vive a experiência virtual de usar o aparelho. No Worms 3D da SEGA, os personagens bebem Red Bull para dar pulos mais altos.

O potencial dos games para campanhas de marketing merece realmente a atenção das agências e anunciantes. De acordo com o estudo Global Entertainment and Media Outlook, orga-nizado pela PricewaterhouseCoopers, a indústria de games deve movimentar US$ 49 bilhões em 2011 e os investimentos

na publicidade on-line alcançarão US$ 73 bilhões no mesmo ano, o que demonstra que os jogos se tornarão, cada vez mais, um canal alternativo para campanhas focadas em resultado, com alto poder de interação e capacidade de mensuração. Em todo o mundo, as ações de mídia in-game vêm apresentando crescimento de 30% ao ano e devem chegar a US$ 2 bilhões em 2010, de acordo com pesquisa da eMarketer.

O in-game product placement é inovador aos olhos marquetei-ros, mas é muito mais antigo do que se ima-gina. Em vez de inse-rirem suas marcas em jogos já existentes ou em desenvolvimento, as marcas costuma-

vam elas próprias criar seus jogos (mesma situação do recente Dodge Quest). Na década de 80, a Johnson & Johnson lançou um game promocional para Atari chamado Tooth Protectors. Um jogo simples e fácil que consistia em proteger os dentes de uma boca usando produtos da Johnson. O jogo só podia ser pedido por carta para a empresa mediante uma participação em uma promoção vigente. Na mesma época, a marca de sucos em pó Kool-Aid lançou uma ação promocional onde era possí-vel recortar um cupom de uma revista em quadrinhos, enviar para o correio junto com embalagens do produto e receber em

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casa um cartucho exclusivo de videogame com a aventura do personagem Kool-Aid Man (uma jarra de suco com braços e pernas).

Porém, a forma mais inusitada e original, aconteceu em 1984, época da popularização dos computadores domésticos. A banda inglesa Thompson Twins, incrivelmente, inseriu um jogo dentro do disco de vinil, junto com as músicas. Quem comprasse o vinil e escutasse os “sons estranhos”, os códi-gos do jogo na verdade, deveria gravá-los em uma fita K-7 para que o computador pudesse rodar o jogo (num tempo imemorial, quando informações de computador eram armaze-nadas em disquetes e fitas K-7).

Uma das ações mais recentes foi criada pela North Kingdom em parceria com a BBH London para a marca Mentos: o di-vertido jogo Kissfight. O único personagem que se pode jogar é um rapaz paquerador e muito sortudo, que sempre acaba numa situação onde a única coisa possível a se fazer é beijar. Através de divertidos movimentos para tentar beijar a moci-nha, o heroi enche uma barrinha de “prazer do oponente”, determinando sua vitória. O Mentos entra no jogo como um item especial que permite ao heroi dar beijos muito mais re-frescantes e arrasadores, deste modo gerando uma experiên-cia virtual prática e divertida.

Por fim, uma das melhores ações (senão a melhor) foi feita pelo home center sueco Ikea. Aproveitando o desejo que os jogadores do jogo The Sims têm em simularem o mais real

possível suas vidas virtuais, a marca de mobiliários auxiliou na mais nova expansão do jogo, Sims 2 IKEA Home Stuff. Com seu propósito perfeitamente encaixado ao universo do game, a Ikea tornou-se um case a ser seguido por toda e qualquer mar-ca que deseje se inserir nos mundos virtuais.

Muitos anunciantes podem considerar este tipo de investimento publicitário caro, para um aparente baixo resultado. Para provar o contrário, a Nielsen conduziu nos Estados Unidos o estudo Consumers’ Experience With In-Game Content & Brand Impact of In-Game Advertising sobre este impacto da publicidade em jogos de videogame. Grande parte dos entrevistados (82%) não se sente incomodada pelas intervenções, pois considera os jogos tão divertidos com a exibição de marcas quanto se eles não a tivessem. Dentre os respondentes que asseguram se envolver mais com os jogos, 70% disse que os anúncios os fazem se sentir melhor em relação às marcas envolvidas. Há um aumento médio de 44% no recall dos anunciantes quando

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· PROMOÇÃO Experiência Virtual

Arquivo de Tendências · 17 · Planejamento Rae,MP

comparado com os níveis de lembranças anteriores à exposi-ção ao jogo. Além disso, houve uma melhora de 33% na as-sociação das marcas a valores positivos.

Há diversas oportunidades e formas de se proporcionar a experiência de uma marca ou produto nos mundos virtuais, mas eles devem ser muito bem pensados para não parecerem apenas “uma ação a mais”, sem real valor utilitário para bran-ding. Este ainda é um caminho novo e apenas através das tentativas será possível compreender a percepção dos avata-res com as marcas e produtos inseridos em seus mundos alternativos.

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“Até começar a parecer ordem,o caos não é perigoso”

Max Gunther

O projeto “hiperbólico” nasceu em 2007, por iniciativa do Departamento de Planejamento da Rae,MP, na forma de um dossiê digital emitido internamente para todos osprofissionais da agência, na tentativa de fomentar o ambiente de “inspirações”, tanto criativas quanto comerciais. O então “Relatório de Tendências” chegou naturalmenteao presente formato, dada a perspectiva de divulgar um trabalho de bastidores, porém fundamental para o sucesso das ações de comunicação. Hiperbólico é também um canal de comunicação entre planners, agências, empresas e todos os demais interessados em manter presente essa conexão com o futuro.Comente-o e compartilhe-o.