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Novos gerentes: formação, seleção e avaliação Flavio Farah* RESUMO Este texto é um resumo do estudo principal. Introdução Gerentes e novos gerentes Gerentes. Em qualquer empresa, gerente é um indivíduo que dirige o trabalho de outras pessoas e que, portanto, é responsável pelo trabalho dessas pessoas. A missão de todos os gerentes, em qual- quer tipo de organização e em todos os níveis dentro de uma organização, é manter um ambiente no qual grupos de indivíduos possam cumprir tarefas e objetivos pré-estabelecidos. Gerentes eficazes favorecem o alcance de resultados por parte de sua equipe. Em contraste, maus gestores podem cus- tar caro para suas organizações. Gerentes de primeiro nível. Na hierarquia das empresas, uma das categorias gerenciais é a dos ge- rentes de primeiro nível, que são os gestores de nível hierárquico mais baixo na organização. Esses gerentes supervisionam apenas funcionários não gerentes eles não dirigem o trabalho de outros gerentes. É comum os gerentes de primeiro nível serem chamados de supervisores, mas também po- dem possuir outros títulos, tais como coordenador, encarregado, chefe de seção, chefe de setor, líder de turma, líder de produção ou líder de projeto. Uma das necessidades básicas de qualquer empresa é dispor de gerentes de primeiro nível compe- tentes. Os supervisores competentes na gestão de pessoas influenciam os subordinados no sentido de: a) melhor desempenho; b) mais comprometimento; c) menor tendência a deixar a organização. Em contraste, supervisores incompetentes provocam aumento no índice de rotatividade. Transição. O ingresso de um funcionário não gerente na carreira gerencial não é uma promoção, mas sim, uma mudança de carreira, pois a maior parte das competências que o funcionário já possui pouco o ajudarão no exercício da gerência. Quando um funcionário passa a ocupar o posto de ge- rente de primeiro nível, ele precisa realizar uma mudança extremamente crítica: abandonar a execu- ção para, imediatamente, assumir a gestão, ou seja, em vez de executar tarefas, ele deve passar a to- mar providências para que o trabalho seja feito pela equipe. Para um profissional não-gerente, acos- tumado a realizar atividades técnicas, essa é uma mudança drástica e muito difícil porque implica assumir, a curtíssimo prazo, uma nova identidade profissional, com tarefas e responsabilidades radi- calmente diferentes daquelas exercidas no antigo cargo técnico. Isto significa deixar de ver-se como executante para enxergar-se como gestor. Além da mudança de identidade, a transição exige, tam- bém em curto prazo, uma quantidade enorme de aprendizagem por parte do indivíduo. Em tais con- dições, os requisitos da transição grande mudança e grande aprendizagem obrigam o profissio- nal a transformar-se profundamente. Conclusão. Conclui-se, pois, que, quando se pensa em preparar gestores, a prioridade deve recair sobre os gerentes de primeiro nível. Primeiro, em razão de sua importância para as empresas; se- gundo, por um aspecto específico da ascenção a esse nível que é a mudança drástica representada pelo ingresso na carreira gerencial; terceiro, pela exigência de uma grande quantidade de aprendiza- gem por parte dos candidatos à gerência; quarto, porque gestores de primeiro nível mal escolhidos e mal formados se transformarão em maus executivos, caso cheguem a essa posição.

Novos gerentes: formação, seleção e avaliação

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Novos gerentes: formação, seleção e avaliação Flavio Farah*

RESUMO

Este texto é um resumo do estudo principal.

Introdução – Gerentes e novos gerentes

Gerentes. Em qualquer empresa, gerente é um indivíduo que dirige o trabalho de outras pessoas e

que, portanto, é responsável pelo trabalho dessas pessoas. A missão de todos os gerentes, em qual-

quer tipo de organização e em todos os níveis dentro de uma organização, é manter um ambiente no

qual grupos de indivíduos possam cumprir tarefas e objetivos pré-estabelecidos. Gerentes eficazes

favorecem o alcance de resultados por parte de sua equipe. Em contraste, maus gestores podem cus-

tar caro para suas organizações.

Gerentes de primeiro nível. Na hierarquia das empresas, uma das categorias gerenciais é a dos ge-

rentes de primeiro nível, que são os gestores de nível hierárquico mais baixo na organização. Esses

gerentes supervisionam apenas funcionários não gerentes – eles não dirigem o trabalho de outros

gerentes. É comum os gerentes de primeiro nível serem chamados de supervisores, mas também po-

dem possuir outros títulos, tais como coordenador, encarregado, chefe de seção, chefe de setor, líder

de turma, líder de produção ou líder de projeto.

Uma das necessidades básicas de qualquer empresa é dispor de gerentes de primeiro nível compe-

tentes. Os supervisores competentes na gestão de pessoas influenciam os subordinados no sentido

de: a) melhor desempenho; b) mais comprometimento; c) menor tendência a deixar a organização.

Em contraste, supervisores incompetentes provocam aumento no índice de rotatividade.

Transição. O ingresso de um funcionário não gerente na carreira gerencial não é uma promoção,

mas sim, uma mudança de carreira, pois a maior parte das competências que o funcionário já possui

pouco o ajudarão no exercício da gerência. Quando um funcionário passa a ocupar o posto de ge-

rente de primeiro nível, ele precisa realizar uma mudança extremamente crítica: abandonar a execu-

ção para, imediatamente, assumir a gestão, ou seja, em vez de executar tarefas, ele deve passar a to-

mar providências para que o trabalho seja feito pela equipe. Para um profissional não-gerente, acos-

tumado a realizar atividades técnicas, essa é uma mudança drástica e muito difícil porque implica

assumir, a curtíssimo prazo, uma nova identidade profissional, com tarefas e responsabilidades radi-

calmente diferentes daquelas exercidas no antigo cargo técnico. Isto significa deixar de ver-se como

executante para enxergar-se como gestor. Além da mudança de identidade, a transição exige, tam-

bém em curto prazo, uma quantidade enorme de aprendizagem por parte do indivíduo. Em tais con-

dições, os requisitos da transição – grande mudança e grande aprendizagem – obrigam o profissio-

nal a transformar-se profundamente.

Conclusão. Conclui-se, pois, que, quando se pensa em preparar gestores, a prioridade deve recair

sobre os gerentes de primeiro nível. Primeiro, em razão de sua importância para as empresas; se-

gundo, por um aspecto específico da ascenção a esse nível que é a mudança drástica representada

pelo ingresso na carreira gerencial; terceiro, pela exigência de uma grande quantidade de aprendiza-

gem por parte dos candidatos à gerência; quarto, porque gestores de primeiro nível mal escolhidos e

mal formados se transformarão em maus executivos, caso cheguem a essa posição.

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Situação atual

Seleção

Problemas. Embora os processos de seleção de gerentes de primeiro nível variem de empresa para

empresa, eles possuem alguns problemas que se repetem. Por exemplo, é comum que os novos ge-

rentes ingressem na carreira gerencial por indicação do superior direto, o que compromete a eficácia

da escolha em razão do despreparo do superior. Outro problema frequente é estabelecer que apenas

os funcionários de melhor desempenho podem participar do processo. Uma terceira dificuldade é

que os candidatos aceitam a promoção à gerência pelas razões erradas.

Sigilo. Outra questão relativa ao processo de seleção de novos gerentes é o dilema sigilo transpa-

rência. O primeiro aspecto do sigilo refere-se à decisão de se informar a um profissional que ele es-

tá sendo cogitado para ingresso na carreira gerencial. O segundo aspecto é a existência das seguin-

tes normas rígidas: a) as opiniões emitidas nas reuniões dos Comitês de Carreira são confidenciais;

b) a comunicação de uma decisão (promoção, transferência etc.) é feita sem apresentar as justificati-

vas que a fundamentaram e sem que os descontentes tenham o direito de contestar a decisão.

Favorecimento de trainees. Costuma-se favorecer os trainees em relação aos outros funcionários.

Os programas de trainees destinam-se a selecionar candidatos recém-formados que serão treinados

para ocupar posições gerenciais. Como consequência, os funcionários da casa – em particular os ex-

estagiários que foram efetivados – tendem a ser discriminados, recebendo menos atenção e tendo

menos oportunidades de ingresso na carreira gerencial do que os trainees recém-contratados. Esse

pode ser um erro custoso: a empresa pode estar desprezando técnicos de bom potencial gerencial.

Formação

Apesar da importância da gerência de primeiro nível para as empresas, da dificuldade de transição

para a carreira gerencial e da necessidade de os candidatos a gerente adquirirem grandes volumes de

conhecimentos e habilidades, profissionais jovens têm assumido cargos de supervisão sem preparo

adequado. Um dos possíveis motivos para a falta de qualificação dos novos gerentes são as defi-

ciências da grade curricular dos cursos de Administração, que não fornecem a seus alunos as com-

petências gerenciais necessárias. Se os bacharéis em Administração concluem o curso sem ter ad-

quirido as competências de que precisam para ingressar na carreira gerencial, então é pouco prová-

vel que os graduados em outros cursos superiores possuam essas competências e menos provável

ainda que os não graduados as possuam.

Avaliação

Para decidir quem deve ser promovido à carreira gerencial, muitas empresas utilizam Comitês de

Carreira e avaliam seus talentos segundo duas dimensões: desempenho e potencial. O próprio pro-

cesso avaliativo, porém, constitui outra fonte de problemas, que precisam ser examinados.

Avaliação de desempenho. A primeira questão que se coloca é se faz sentido avaliar o desempenho

de um candidato a ingresso na carreira gerencial. Considerando-se que desempenho de um profis-

sional é o conjunto dos resultados e comportamentos apresentados por ele, parece não fazer sentido

avaliar os resultados exibidos por um técnico porque, como tal, sua missão é executar atividades pa-

ra obter resultados, ao passo que, como gerente, ele deverá fazer com que sua equipe execute as ati-

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vidades necessárias à geração dos resultados previstos. No tocante a comportamentos, se o profis-

sional for deficiente em quaisquer aspectos dessa área, essas deficiências poderão ser supridas me-

diante treinamento adequado. A questão, portanto, não é se o profissional possui uma dada compe-

tência, mas se tem capacidade para adquiri-la, ou seja, se tem potencial.

Conclui-se, pois, que parece ser inútil avaliar o desempenho passado de um candidato a ingresso na

carreira gerencial. A esse respeito, um equívoco comum é promover um profissional à gerência co-

mo prêmio por seu bom desempenho como técnico. A promoção a um cargo gerencial, todavia, não

deve ser encarada como prêmio. Quem deve ser promovido a gerente é aquele que tem potencial pa-

ra sê-lo, independentemente de seu desempenho como técnico, pela simples razão de que o poten-

cial e as competências requeridas de um gerente são diferentes dos exigidos do técnico. Outra razão

é que o profissional que tem bom desempenho como técnico pode não ter interesse na gerência, sen-

do contraproducente forçar ou induzir qualquer funcionário a aceitar a carreira gerencial.

Avaliação de potencial. Quando se trata de avaliar o potencial, a questão torna-se mais grave: as

empresas têm realizado a avaliação de potencial de candidatos à gerência por meio de instrumentos

que não se baseiam em uma definição desse construto ou que se baseiam em conceitos equivocados.

Falta a tais instrumentos, portanto, um requisito essencial: a validade de construto.* Em tais condi-

ções, a avaliação de potencial dos gerentes e candidatos à gerência tende a produzir informações

não confiáveis para a tomada de decisão.

Situação típica

Temos, portanto, a seguinte situação típica: em dado momento, um profissional é surpreendido pela

informação de que vai ser promovido a gerente. Ele agradece a promoção, aceitando-a tacitamente,

mas sem desejá-la, sem saber ao certo se a deseja ou desejando-a pelas razões erradas. Ele ingressa

na carreira gerencial sem ter formação como gerente e sem saber o que significa ser gestor, pois

nunca pôde conhecer as realidades da carreira gerencial. Mesmo quando está certo de que não dese-

ja ser gerente ou não tem certeza do que quer, o profissional aceita a promoção provavelmente por-

que supõe que recusá-la seria uma ofensa ou por acreditar que, se recusá-la, ficará mal visto pela

empresa e prejudicará seu futuro na organização.

Desempenho

O resultado da seleção e formação inadequadas é que a maioria dos novos gerentes falham, provo-

cando deficiências de desempenho e aumento de rotatividade em toda a equipe. Mais grave: é fre-

quente que os profissionais se vejam forçados a ingressar na carreira gerencial ou que nela ingres-

sem voluntariamente e depois se arrependam da decisão.

Conclusão

Conclui-se, pois, que o processo de seleção de novos gerentes possui várias deficiências que com-

prometem fortemente sua eficácia.

* Validade de construto é um conceito da Psicometria.

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Proposta

Para evitar as deficiências apontadas anteriormente e aumentar a probabilidade de se elegerem bons

candidatos à gerência, é necessário: 1º) elaborar e implantar um programa de formação de novos ge-

rentes; 2º) corrigir as deficiências da avaliação de potencial; 3º) elaborar e implantar um processo

mais eficaz de seleção de novos gerentes.

Formação. O conteudo ideal de um curso de formação de supervisores é composto pelas competên-

cias que um supervisor precisa possuir. Essa relação de competências denomina-se PC – Perfil de

Competências – do supervisor. Para se elaborar o PC do supervisor, é conveniente tomar como pon-

to de partida a DC – Descrição de Cargo – ideal do cargo de supervisor, que é uma relação de tare-

fas, deveres e responsabilidades ideais do cargo. De posse da DC ideal, pode-se elaborar a relação

das competências necessárias para realizar as respectivas atividades, relação essa que constituirá o

PC do supervisor. O PC representa o conteudo ideal de um curso de formação de novos gerentes.

Avaliação de potencial. É preciso adotar um conceito psicológico de potencial e, para medi-lo, es-

colher instrumentos coerentes com a definição.

Seleção. Propõe-se um novo processo interno composto das seguintes etapas:

Etapa 1 – Inscrição dos candidatos

Etapa 2 – Palestra

Etapa 3 – Vivência

Etapa 4 – Avaliação de potencial 1

Etapa 5 – Avaliação de potencial 2

Etapa 6 – Avaliação de potencial 3

Etapa 7 – Formação

Etapa 8 – Treinamento prático e desenvolvimento

Etapa 9 – Promoção provisória

Regras do processo seletivo. Os candidatos serão avaliados nas etapas de 4 a 9. Na etapa 1 haverá

apenas uma verificação de cumprimento dos pré-requisitos para inscrição. Nas etapas 2 e 3 não ha-

verá avaliação. Os candidatos poderão desistir em qualquer etapa, inclusive durante a etapa 9. A de-

sistência deverá ser formalizada por escrito pelo candidato e não precisará ser justificada. Será con-

siderado desistente o candidato que não comparecer para cumprir uma etapa. Os candidatos aprova-

dos em uma das etapas de 4 a 7 passarão à etapa seguinte. Os candidatos aprovados na etapa 8 serão

classificados como habilitados para ingresso na carreira gerencial. Os candidatos que desistirem,

bem como os reprovados em uma das etapas de 4 a 8, serão excluidos do processo e continuarão em

suas funções atuais. Quando surgir uma vaga de gerente de primeiro nível, será escolhido um dos

habilitados, o qual assumirá o posto em caráter provisório e passará por um período de experiência

(etapa 9). Se for aprovado na experiência, a promoção será tornada definitiva; caso contrário, retor-

nará ao cargo anterior.

* Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário, Especialista em Ética e autor do livro Ética na Gestão de Pessoas. Contato: [email protected]