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1 MINISTÉRIO DA DEFESA EXÉRCITO BRASILEIRO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DO EXÉRCITO CENTRO DE CAPACITAÇÃO FÍSICA DO EXÉRCITO E FORTALEZA DE SÃO JOÃO (Centro Marechal Newton de Andrade Cavalcanti) PARECER CUIDADOS DURANTE FORMATURAS/CERIMÔNIAS MILITARES 1. FUNDAMENTAÇÃO Em formaturas e cerimônias, é comum observar militares que são acometidos de mal súbito e são retirados de forma, algumas vezes já desacordados. Esta situação ainda pode ser agravada por condições climáticas extremas e/ou quando a tropa está transportando equipamento individual (capacete, armamento, fardo aberto e de combate) e aparatos militares especiais (DQBN, GLO, Caatinga). Como qualquer outro sistema mecânico, o corpo humano pode estar estável ou instável, sendo capaz de suportar uma taxa limitada de sobrecarga física interna e/ou externa com características agudas ou crônicas (BRIDGER, 2003). O ato de ficar em pé e parado, conhecida tecnicamente por posição “quasi-estática” ou “ortostatismo”, pode causar alterações fisiológicas prejudiciais ao organismo e/ou agravar patologias. Com a permanência em pé durante muito tempo, a ação da gravidade faz com que uma parte do sangue se concentre nos vasos sanguíneos dos membros inferiores. Esse acúmulo reduz a quantidade de sangue que retorna ao coração (retorno venoso) e, como consequência, o volume de sangue disponível para ser bombeado (volume de ejeção). Tal alteração leva a uma diminuição da pressão arterial e, em contrapartida, o organismo responde aumentando o ritmo das contrações do coração (frequência cardíaca), bem como a contração dos vasos sanguíneos, visando normalizar a pressão arterial. Quando estas reações compensatórias falham ou são lentas, verifica-se a hipotensão ortostática ou postural. Essa situação não caracteriza uma doença específica

CUIDADOS DURANTE FORMATURAS/CERIMÔNIAS MILITARES

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MINISTÉRIO DA DEFESA

EXÉRCITO BRASILEIRO

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DO EXÉRCITO

CENTRO DE CAPACITAÇÃO FÍSICA DO EXÉRCITO E FORTALEZA DE

SÃO JOÃO

(Centro Marechal Newton de Andrade Cavalcanti)

PARECER – CUIDADOS DURANTE FORMATURAS/CERIMÔNIAS

MILITARES

1. FUNDAMENTAÇÃO

Em formaturas e cerimônias, é comum observar militares que são acometidos de

mal súbito e são retirados de forma, algumas vezes já desacordados. Esta situação ainda

pode ser agravada por condições climáticas extremas e/ou quando a tropa está

transportando equipamento individual (capacete, armamento, fardo aberto e de

combate) e aparatos militares especiais (DQBN, GLO, Caatinga).

Como qualquer outro sistema mecânico, o corpo humano pode estar estável ou

instável, sendo capaz de suportar uma taxa limitada de sobrecarga física interna e/ou

externa com características agudas ou crônicas (BRIDGER, 2003). O ato de ficar em pé

e parado, conhecida tecnicamente por posição “quasi-estática” ou “ortostatismo”, pode

causar alterações fisiológicas prejudiciais ao organismo e/ou agravar patologias.

Com a permanência em pé durante muito tempo, a ação da gravidade faz com

que uma parte do sangue se concentre nos vasos sanguíneos dos membros inferiores.

Esse acúmulo reduz a quantidade de sangue que retorna ao coração (retorno venoso) e,

como consequência, o volume de sangue disponível para ser bombeado (volume de

ejeção). Tal alteração leva a uma diminuição da pressão arterial e, em contrapartida, o

organismo responde aumentando o ritmo das contrações do coração (frequência

cardíaca), bem como a contração dos vasos sanguíneos, visando normalizar a pressão

arterial.

Quando estas reações compensatórias falham ou são lentas, verifica-se a

hipotensão ortostática ou postural. Essa situação não caracteriza uma doença específica

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mas, sim, a incapacidade de regular a pressão arterial rapidamente (ASSAR, 2003). Tal

hipotensão provoca uma diminuição do fluxo sanguíneo ao cérebro e o consequente

desmaio.

Cabe ressaltar que uma das principais causas de desmaio por permanecer em

posição ortostática é a síncope vasovagal, que se caracteriza por uma diminuição no

aporte de sangue ao cérebro, pela abrupta diminuição na frequência cardíaca e na

pressão arterial devido à ativação incorreta do nervo vago, no sistema parassimpático.

Esse tipo de desmaio (síncope) pode ocorrer em qualquer idade, mas normalmente

acomete mais aos indivíduos jovens e sem outras doenças. A síncope vasovagal é

normalmente precedida de sintomas como suores frios, palidez e visão em túnel

(MEDOW, 2008).

Outro fator que contribui para o mal estar durante formaturas prolongadas é o

calor. O corpo humano busca regular a temperatura interna, por meio de ajustes, como o

aumento do fluxo sanguíneo para a pele e da taxa de suor, para permitir a dissipação de

calor para o ambiente circundante, por meio da evaporação e da convecção,

principalmente. Entretanto, esses ajustes termorregulatórios aumentam o estresse

fisiológico e podem levar à desidratação (RACINAIS, 2012). Quanto à troca de calor,

deve ser levado em consideração que, para a termorregulação ser efetiva, deve

equilibrar a interação entre a superfície da pele, a roupa e o ar ambiente. Assim, o papel

da roupa, como uma barreira interativa, afeta muito o equilíbrio térmico (GOLDMAN,

2001). No caso dos militares, o uso de equipamento e do fardamento, muitas vezes de

emprego especial cuja composição dificulta ainda mais a transferência de calor,

prejudica muito essa troca, adicionando carga térmica, pois impede a dissipação do

calor metabólico gerado e aumenta a taxa metabólica de transportar o peso adicional

(POTTER, 2015). Assim, as formaturas militares prolongadas no calor, ainda mais

quando a tropa está equipada, favorecem a ocorrência de insolação e outras doenças

relacionadas ao calor, já que o estresse térmico pode não ser compensado (POTTER,

2017).

Outra possível consequência da permanência prolongada na posição de pé é o

surgimento de varizes, que são veias dilatadas que perderam a capacidade de fazer o

sangue retornar para o coração de maneira eficiente. Essa insuficiência é causada

usualmente por alterações nas paredes e dos vasos e deficiência nas válvulas venosas,

responsáveis por direcionar o sangue na direção correta. As condições patológicas

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intrínsecas e os fatores ambientais extrínsecos se combinam para produzir um amplo

espectro para a ocorrência de varizes. Dentre outros fatores que contribuem para essa

ocorrência, destacam-se a hereditariedade, a obesidade, o sexo feminino e o tempo de

permanência em pé (AZMA, 2015).

O surgimento das varizes, na maioria das vezes, se deve a elevadas pressões

venosas superficiais, mas algumas pessoas têm uma fraqueza inata das paredes das veias e

podem desenvolver varizes mesmo na ausência de altas pressões venosas. Assim, a

hereditariedade é importante na determinação da susceptibilidade à falha valvular primária,

mas os fatores genéticos específicos responsáveis pelas varizes ainda não foram

completamente elucidados. Da mesma forma, o segmento feminino é mais propenso a essa

patologia, contribuindo para isso o uso de anticoncepcionais. Por outro lado, a postura em

pé durante muito tempo leva ao aumento da pressão hidrostática, o que pode causar

distensão venosa crônica e incompetência valvular secundária no sistema venoso

superficial, facilitando, assim, o aparecimento de varizes (AZMA, 2015).

Outro problema em adotar a postura de pé por muito tempo é o inchaço localizado

nas pernas, tornozelos e pés. Essa alteração é causada pela dificuldade do sistema

circulatório em desempenhar a sua função. O sangue não circula pelas veias de maneira

adequada, deixando as pernas mais grossas e doloridas.

A coluna vertebral também pode ser afetada, em longo prazo, pela permanência

excessiva na posição em pé e imóvel, com o aparecimento de deformidades pela

sobrecarga nas estruturas vertebrais, antecipação de lesões discais e até artrose da

coluna, o que ainda pode ser agravado em caso de formaturas com equipamento e

armamento pesados (HOOGENDOORN, 2000), particularmente se o militar apresenta,

simultaneamente, pouca resistência muscular na região do tronco e baixo

condicionamento aeróbio (TAANILA, 2012).

A prevalência de dor nas costas na população em geral é muito alta, estima-se

que de 60 a 90% da população apresente, durante a vida, algum incidente de lombalgia

(MOSHE, 2005). Na população militar a prevalência de lombalgia é ainda 70% maior,

sendo uma das principais causas de afastamento do serviço (BERRY, 2017). Alguns

estudos recentes consideram que a permanência por tempo excessivo na posição de pé e

estática pode contribuir para as crises e sugerem, para evitar sintomas

musculoesqueléticos e dor nas costas, que a permanência na posição em pé, sem carga,

não seja maior do que 40min (COENEN, 2017).

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O transporte de carga ainda pode causar outras lesões, como a lesão do plexo

braquial, causada pela tração desse plexo pela alça da mochila (fardo de combate). Os

membros superiores são inervados por esse plexo, formado por ramos anteriores dos

quatro nervos espinhais cervicais inferiores (C5,C6,C7,C8) e do primeiro torácico (T1),

situando-se no pescoço e na axila (NETTER, 2000). Durante o transporte por tempo

prolongado da mochila, com cargas mais elevadas, a alça da mochila pode comprimir e,

com isso, comprometer as fibras nervosas, tendo por consequência posturas

compensatórias na região da cintura escapular e dos membros superiores, podendo

causar perda sensitiva e de controle muscular no braço, mão ou pulso, impedindo a

realização e o controle do movimento muscular de forma correta (KNAPIK, 2016).

Além da lesão do plexo braquial, a sobrecarga externa causada pelo transporte

de cargas, como o fardo de combate, pode agravar os demais problemas apresentados

acima, já que, além do maior esforço em virtude do peso adicionado, provoca a

realização de discretos movimentos para alterar a postura e redistribuir a pressão nas

articulações entre os membros inferiores e os pés (DUARTE, 2000).

2. ESTUDOS REALIZADOS PELO IPCFEx

Visando avaliar a condição do militar brasileiro, quando sujeito a exposição

prolongada à posição ortostática, o Instituto de Pesquisa da Capacitação Física do Exército

(IPCFEX) realizou um trabalho experimental envolvendo variáveis estabilométricas

(equilíbrio e coordenação muscular) durante uma formatura simulada em laboratório. Os

militares voluntários permaneceram na posição em pé, simulando a situação de formatura,

uniformizados, mas sem carga (mochila e equipamento) aproximadamente por 30 minutos,

sobre uma plataforma estabilométrica. Observou-se aumento significativo nas compensações

posturais a cada 5-6 minutos de tempo em posição “quasi-estática”. Os ajustes posturais,

resultantes do desconforto de permanecer na posição de imobilidade, podem ser indicadores

de aumento da carga mecânica interna, que pode levar a ajustes fisiológicos, os quais, se

falharem, podem levar a uma síncope.

O IPCFEx também realizou, no 57º BI Mtz – Regimento Escola de Infantaria, outro

trabalho com simulação de formatura equipado (fardo aberto e fardo de combate), com a

mochila pesando 15 Kg. Foram aplicados dois protocolos, P1 e P2. Em ambos os protocolos

os militares ficaram em posição de descansar, em uma formatura de 33 minutos, com

comandos de “sentido” e “descansar” a cada 5 minutos e foram submetidos à leitura de um

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texto durante a formatura. Porém, em P2, aos 16 minutos foi comandado 5 minutos de “a

vontade”, onde os militares retiraram a mochila, colocando-a a frente do corpo. Foram

orientados, também, a permanecer na posição de “relaxar posição tipo 1” (Figura 1) ou

“relaxar posição tipo 2” (Figura 2).

Figura 1 – Relaxar posição Tipo 1 Figura 2 – Relaxar posição Tipo 2

Foram avaliadas as seguintes variáveis: percentual de saturação de oxigênio

(%SaO2), frequência cardíaca máxima (FC Max), percepção de conforto, percepção

subjetiva de esforço (PSE - escala omni-res) e perímetro da panturrilha.

As variáveis %SaO2, FC Max, percepção de conforto e PSE não apresentaram

diferenças significativas entre os dois protocolos. Entretanto, em ambos os protocolos,

observou-se um aumento da FC Max ao longo do tempo em forma. O comportamento do

%SaO2 foi constante em ambos os protocolos. Embora não tenha sido encontrada diferença

estatística significativa, os valores finais da percepção de conforto e PSE foram menores em

P2 (protocolo com relaxar posição).

O achado mais relevante foi o aumento no perímetro da panturrilha ao longo do

tempo em forma. Houve diferença estatística significativa entre o perímetro da panturrilha

em P1 e P2, no minuto 33 da formatura, com menor perímetro em P2. Assim, relaxar a

posição retirando a mochila durante a formatura parece exercer um efeito protetor ao edema

na panturrilha, facilitando o retorno do sangue ao coração e podendo ajudar a prevenir a

hipotensão ortostática.

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Outra informação relevante levantada nesse estudo foi a percepção dos participantes

em relação à compreensão do texto que foi lido. Aproximadamente 92% dos voluntários

afirmaram que compreenderam melhor o texto que foi lido após o comando de “à vontade”.

3. MEDIDAS PREVENTIVAS

Baseado na revisão de literatura e nos estudos conduzidos pelo IPCFEx, podem

ser destacadas algumas medidas preventivas, a seguir apresentadas, que, caso adotadas,

podem contribuir para reduzir os efeitos prejudiciais do tempo prolongado na posição

de pé.

a. Inicialmente, cabe ressaltar que para diminuir o risco de surgimento ou

agravamento das lesões supracitadas é imprescindível que o militar se mantenha com

um peso corporal adequado e realize o TFM regularmente, conforme o previsto no

manual EB20-MC-10.350. O treinamento neuromuscular assume um papel ainda mais

importante, uma vez que a musculatura fortalecida, em especial da panturrilha, que é o

“coração” da perna, contribui para facilitar que o sangue retorne ao coração (retorno

venoso), evitando que o sangue se detenha nas veias das pernas e na parte inferior do

corpo e, como consequência, aumente o volume de sangue disponível para ser

bombeado (volume de ejeção). Tal adaptação fisiológica é fundamental para o militar, já

que a diminuição do retorno venoso e a consequente diminuição da pressão arterial que

ocorre quando se adota a posição ortostática exige aumento da frequência cardíaca e

uma vasoconstrição para normalizar a pressão arterial. Porém, se essas reações

compensatórias falham ou são lentas, verifica-se a hipotensão ortostática ou postural.

Tal hipotensão provoca uma diminuição do fluxo sanguíneo ao cérebro e o consequente

desmaio, como mencionado na fundamentação.

b. Além disso, é fundamental para o militar, tendo em vista a sua atividade

laboral com transporte de cargas e a permanência por períodos prolongados em forma,

reforçar a musculatura que circunda nosso centro de gravidade (a região próxima ao

umbigo), chamada de “core”, basicamente formada pelos músculos abdominais, da

região lombar, pelve e quadril. O fortalecimento dessa musculatura visa manter o

alinhamento postural e o equilíbrio postural dinâmico durante as atividades que

envolvam movimentos multidimensionais, favorecer a base de suporte do corpo e

prevenir lesões na coluna e/ou nas extremidades superiores e inferiores do corpo. Para o

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fortalecimento do “core” pode ser seguido o caderno de instrução de Transporte de

Carga Individual, cujo anexo “Pentágono” propõe um método neuromuscular para ser

executado como treinamento complementar à sessão de TFM. Este caderno de instrução

encontra-se no sítio do IPCFEx (http://www.ipcfex.eb.mil.br/cadernos-de-instrucao) e

nos sítios dos Portais de Doutrina do DECEx (https://doutrina.ensino.eb.br) e do COTer

(https://www.cdoutex.eb.mil.br).

c. Visando evitar desgaste desnecessário à tropa, sugere-se que, durante a

formatura, a tropa não seja mantida em posição imóvel por mais de 5 minutos, já que,

conforme estudo do IPCFEx, após esse tempo há um aumento significativo nas

compensações posturais. Assim, recomenda-se não manter a tropa imóvel por mais de 5

minutos antes da chegada da autoridade, comandar “sentido e descansar” a cada 5

minutos de formatura visando aliviar o desconforto e evitar lesões e ,ainda, comandar

“À VONTADE” no momento das leituras ou locuções. Caso a formatura seja com

mochila, sugere-se, ainda, que seja dado o comando de “DESEQUIPAR” antes de “À

VONTADE”, visando facilitar o retorno venoso e diminuir a pressão nas articulações,

membros inferiores e pés, ajudando a prevenir as alterações fisiológicas indesejadas

provocadas pela permanência prolongada na posição ortostática, além de trazer

benefícios na parte cognitiva (compreensão de texto), conforme trabalho do IPCFEx.

d. Nesse sentido, visando padronizar procedimentos, sugere-se que seja incluída

nos movimentos de ordem unida uma nova posição, intermediária entre o

“DESCANSAR” e o “À VONTADE”. Nessa nova posição, que neste documento

passaremos a tratar como “À VONTADE 2” (figura 2), a tropa manterá as mesmas

condições de atenção e silêncio previstas no “DESCANSAR”, sem o rigor em

imobilidade, e adotará uma posição menos estressante e mais confortável, do ponto de

vista anatômico, que permitirá movimentos discretos que não afetarão a marcialidade da

formatura. Como exemplo de êxito dessa medida, citamos que a Academia Militar das

Agulhas Negras adotava, em um passado recente, procedimento similar, quando o

Cadete trajava os uniformes que fazem uso da Barretina.

e. Baseado na conclusão da revisão sistemática apresentada na fundamentação,

que encontrou associação entre a permanência na posição em pé, por períodos

superiores a 40 minutos, com desenvolvimento de sintomas musculoesqueléticos nas

regiões lombares e membros inferiores, sugere-se que as formaturas não ultrapassem

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esse limite de tempo e que, sempre que possível, deixe a tropa em “À VONTADE 2”

(Figura 2).

No tocante à duração, cabe-se destacar que, do ponto de vista da aprendizagem,

autores acreditam que a capacidade de manutenção da atenção e do foco durante uma

exposição decai de acordo com a sua duração, estimando que o tempo máximo que essa

atenção é sustentada é de, no máximo, entre 10 a 20 minutos, de acordo com fatores

intrínsecos e extrínsecos. Assim, deve-se, também, atentar para que sejam evitadas as

exposições prolongadas, com discursos e leituras diversas, principalmente com a tropa

imóvel. Neste sentido, uma revisão na legislação que regula nosso cerimonial seria bem-

vinda, visando agilizá-lo. Como exemplo de evento que merece revisão, podemos citar

as formaturas de passagem de comando e as de passagem de militar para a reserva.

Nessas ocasiões, por conta do tamanho dos elogios e dos demais textos que são lidos,

chega-se a uma culminação da atenção e do foco da tropa e da assistência, que

normalmente coincide com aquele de os militares começarem a passar mal em forma.

Ajustes no tamanho do texto, a leitura de extratos, fazê-la durante a cerimônia de

inauguração do retrato do comandante, por exemplo, poderia atenuar tais problemas.

f. Recomenda-se investir no entendimento dos comandantes, em todos os

níveis, e quebrar alguns preconceitos. Um desses entendimentos é o de que formaturas

com duração excessiva causam danos à tropa e não melhoram a sua operacionalidade.

Pelo contrário, contribuem para minar a autoestima da tropa e comprometem a longo

prazo a disponibilidade dos subordinados para as atividades realmente operacionais.

Outro entendimento trata do uso de equipamentos militares (mochilas, capacetes,

coletes, armamentos) e vestimentas especiais (DQBN, GLO, Caatinga) em formaturas

não relacionadas a uma situação de apronto operacional ou de ordem de marcha, ou

seja, somente com fins demonstrativos. Além do desgaste do material, que não foi

projetado para esse tipo de atividade, trazemos como consequências o desgaste físico do

homem, de sua autoestima e, se essas atividades forem combinadas com duração,

umidade e calor excessivos, encontramos os ingredientes ideais para uma formatura

com péssima marcialidade, com militares passando mal e acabando por transmitir uma

imagem negativa da higidez e operacionalidade da tropa.

g. Além da preocupação com a tropa em forma, aspectos externos a essa devem

ser considerados. Por exemplo, as equipes de saúde devem estar posicionadas para o

pronto atendimento e atentas para intervir com rapidez, mas com a discrição necessária

para não chamarem mais atenção do que a tropa em forma e sem virem a servir de

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“estímulo” para que os militares apresentem desconfortos durante a formatura. Nesse

sentido, por conta da preservação sanitária do militar que venha a sentir desconforto

durante uma formatura, recomenda-se que esse seja submetido a uma observação de, no

mínimo, 24 horas em enfermaria da OM, devidamente assistido por pessoal de saúde,

com vistas a acompanhar sua recuperação e avaliar se é o caso o acompanhamento em

unidade hospitalar (conforme a gravidade, de acordo com os incisos III e IV do Art 269

do RISG).

Também merece ser considerada a situação da assistência das solenidades e

formaturas. Com o aumento da expectativa de vida de nossa população militar, cada vez

mais a audiência é composta por pessoas mais idosas, principalmente militares da

reserva, o que torna prudente reservar cadeiras para o público e disponibilizar água

antes e durante as formaturas. Cabe destacar que esses militares mais antigos querem

acompanhar os militares da ativa e relutam em aceitar a se sentar.

Assim, como forma de não constranger os inativos mais antigos presentes e ao

mesmo tempo criar condições para que não passem mal nas solenidades, sugere-se que

nas ocasiões menos marciais da formatura (alusivos, palavras, citações, leituras,

cumprimentos), coordenado com o comando de “À VONTADE 2” para a tropa, as

autoridades da ativa presente devam se sentar, servindo de estímulo e exemplo para os

militares mais idosos que também virão a se sentar.

h. Por fim, recomenda-se, também, que os militares realizem uma preparação

para o evento, adotando, entre outras, as seguintes medidas individuais:

1) Não participar das formaturas em jejum (tampouco com ingestão de excesso de

alimentos).

2) Fazer uso de meias de compressão medicinal elástica (compressão entre 20 e 30

mmHg) quando o militar já apresentar algumas alterações vasculares, possuir histórico

familiar e/ou fazer uso de anticoncepcionais.

3) Manter a taxa hídrica adequada, principalmente se já há histórico de hipotensão

postural, utilizando como referência o previsto no cartão de hidratação do programa de

prevenção à rabdomiólise do EB, disponível no Portal de Doutrina do DECEx e no sítio do

IPCFEx.

4) Adotar hábitos alimentares saudáveis e realizar o TFM com regularidade.

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4. CONCLUSÃO

A formatura/cerimônia militar se confunde com a rotina castrense. De acordo com o

Manual de Campanha C 22-5 ORDEM UNIDA, é uma atividade relevante, por se

caracterizar por padrões coletivos de uniformidade, sincronização e garbo militar. Deve ser

considerada como um significativo esforço para demonstrar a própria disciplina militar, isto

é, a situação de ordem e obediência que se estabelece voluntariamente entre militares, em

vista da necessidade de eficiência na guerra.

Na formatura desenvolvemos e demonstramos o sentimento de coesão, de

obediência, de energia e de marcialidade como fatores preponderantes na formação do

soldado. Nela, ainda, encontramos uma excelente oportunidade para o exercício da ação de

comando – reforçando a confiança da tropa no comandante e vice-versa.

Dessa forma, como atividade meio para o desenvolvimento de todos esses atributos

coletivos e individuais, o comandante militar deve estar atento para que seu uso respeite a

essência e o espírito de sua criação, e que esse fundamental instrumento para a formação

militar não seja desvirtuado, trazendo como consequências a obtenção de resultados inversos

daqueles acima transcritos de nosso Manual de ORDEM UNIDA.

Assim, por ser uma atividade que, caso mal planejada e conduzida, pode vir a gerar

ou agravar lesões músculo-esqueléticas e vasculares, comprometendo a saúde e a

operacionalidade da tropa, coube ao Centro de Capacitação Física do Exército e ao Instituto

de Pesquisa da Capacitação Física do Exército apresentar este Parecer, com a finalidade de

propor medidas que, reforçando os aspectos marciais que a tropa deve exercitar, previna os

malefícios para a saúde e a operacionalidade, quando tal ferramenta é usada de forma

incorreta.

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