1
PAULO BARRADAS, presidente da Bluepharma, antiga unidade fabril da Bayer em Coimbra, investe na investigação de novos processos de produção de medicamentos, que, depois de patenteados, são vendidos a clientes espalhados pela Europa. Uma aposta que, a par com a viragem para os genéricos — destinados mais ao mercado nacional —, marcam o novo rumo da ex-fábrica da aspirina. Em mais um almoço promovido pelo EXPRESSO e pela ORDEM DOS ECONOMISTAS, o farmacêutico conta como foi parar à produção de remédios, depois de ter tido farmácias e de ter presidido a uma cooperativa de distribuição. ANA SOFIA SANTOS/ CHRISTIANA MARTINS E M 2001 impediu o fecho da unidade fabril da Bayer, em Coimbra, que com- prou em conjunto com ou- tros investidores, através da socie- dade Bluepharma. Para dar um no- vo rumo à «fábrica da aspirina» e substituir o cliente único e origi- nal, Paulo Barradas virou-se para os genéricos e para a inovação nos métodos de fa- brico de medica- mentos. EXPRESSO Como é que sur- ge a compra da fábrica da Bayer, em Coimbra, e a consequente cria- ção da Bluephar- ma? PAULO BARRA- DAS — Vou sem- pre tentando es- tragar mais um bocadinho a mi- nha vida. Ao ler o «Diário de Coimbra» vi um artigo que dava conta que a Bayer queria fechar a fábrica de Coimbra. Tam- bém reparei que eles punham a hi- pótese de vender, caso aparecesse alguém com um projecto viável. Constituí um grupo de cinco pes- soas — apenas uma veio da Bayer — e criámos a sociedade Bluephar- ma; passados quase nove meses, es- távamos a fazer a escritura pública da compra. Além disso, só me falta- va produzir remédios para fechar o ciclo do medicamento, uma vez que já tive farmácias e fui presiden- te da cooperativa de distribuição Farbeira. EXP. — Recorreram a capital de risco... P.B. — Sim, a PME Capital (ligada ao IAPMEI) tem 30% da Bluephar- ma. Precisávamos que o Estado português também desse a cara pe- lo projecto porque estávamos a ne- gociar a compra da «fábrica da aspi- rina» com uma multinacional. Hou- ve cerca de 120 intenções de com- pra. Mas já estamos a negociar a saí- da da PME Capital, o que deverá acontecer até ao final do ano. EXP. — Durante quanto tempo con- taram com o apoio da Bayer? P.B. — Durante 2001, a Bayer asse- gurou a produção a 100% e cus- teou todas as despesas fixas da fá- brica. No segundo ano só assegu- rou 90% e, no terceiro, 60%. Em 2004 devia ter saído, mas conse- guimos prolongar o contrato até Março deste ano, com 20% de produção vendida à Bayer. Neste momento já não produzimos aspi- rina. EXP. — Não tendo medicamentos próprios, como é que se prepararam para a saída do vosso único cliente? P.B. — Estabelecemos um projec- to em três áreas de negócio: pro- dução industrial para terceiros (fi- zemos um esforço enorme para encontrar novos clientes), sobre- tudo estrangeiros; investigação e desenvolvimento (I&D) de novos métodos de fabrico de medica- mentos; e produção de genéricos, em particular para o mercado na- cional. EXP. — Portanto, não investigam novas moléculas mas sim novos pro- cessos de produção de medicamen- tos? P.B. — Sim, o nosso projecto é in- dustrial. Mas também temos ino- vação em termos de produto, por- que surgiu a oportunidade de fa- zermos uma parceria com o Cen- tro de Neurociências de Coimbra e com a Associação de Investiga- ção Biomédica e Inovação em Luz e Imagem para criarmos um laboratório que utiliza bactérias que geram proteínas idênticas às que o organismo humano produz. O projecto chama-se X – Prot e ganhou o segundo prémio euro- peu de inovação regional (entre 700 a concurso), promovido pela Comissão Europeia. EXP. — Como vê o fim da comparti- cipação acrescida de 10% de que be- neficiavam os genéricos em relação aos restantes medicamentos? P.B. — Ainda não era o momento, porque o mercado dos genéricos não se faz em tão pouco tempo. Com a introdução dos genéricos há quatro anos, a indústria foi obri- gada a alterar a sua estratégia de mercado, que tinha sustentado nos medicamentos cópia. Somos um exemplo citado internacionalmen- te, porque conseguimos passar de uma quota de mercado de 0,13%, para 13%. O actual ministro da Saú- de está obcecado com a Associa- ção Nacional de Farmácias e tor- nou-se insensível ao que se passa na indústria farmacêutica nacional. EXP. — E o que acha da isenção da obrigatoriedade de reduzir em 6% o preço dos medicamentos comparti- cipados para os laboratórios que te- nham investido um mínimo de cinco milhões de euros em I&D, em 2004? P.B. — A portaria dizia que o país estava em crise e pedia à indústria farmacêutica para baixar os pre- ços. O que eu não percebo é por que razão só os preços dos medica- mentos comparticipados dimi- nuem. O Estado só olhou para o seu umbigo. Depois criou um regi- me de excepção que não incentiva o investimento em I&D. Cinco mi- lhões de euros é muito para alguns laboratórios e pouco para outros. Fazia mais sentido discriminar po- sitivamente através de uma percen- tagem que tivesse por referência o volume de negócios, por exemplo. O despacho não faz sentido ne- nhum. EXP. — Como classifica a actuação do ministro da Saúde, Correia de Campos? P.B. — Tem tido um discurso mui- to desastrado e uma actuação feita de «fait-divers», como, por exem- plo, a venda de medicamentos fora das farmácias. O sector da saúde pa- dece de problemas muito graves e essa medida não era prioritária. À NA PRATICAMENTE a totalidade da produção da Bluepharma são genéricos destinados a patologias cardíacas e do sistema nervoso central, além de antibióticos. Tem 1,7% de quota do mercado nacional destes remédios. Entre 2001 e 2003 facturou entre 3,2 e 3,7 milhões de euros. No ano passado ultrapassou os cinco milhões de euros e vai fechar 2005 com vendas de cerca de 7,5 milhões de euros. No momento em que fábrica da Bayer foi vendida, produzia 7,5 milhões de unidades (caixas finais) e a Bluepharma manteve o nível de produção graças à angariação de novos clientes (sobretudo estrangeiros) em feiras e eventos da especialidade. Cerca de 40% da facturação destinam-se à exportação, sobretudo para a Europa — fabrica, em regime de «outsourcing», os medicamentos com a marca de outros laboratórios. Tem um plano de investimento em I&D de 2,1 milhões de euros (de 2003 a 2006), cujo objectivo é desenvolver e patentear novas tecnologias para fabricar remédios. Com 110 trabalhadores (quase o dobro dos que «herdou» da Bayer), já tem um projecto para duplicar a capacidade da fábrica. Exportar inovação MESA MESA «O Estado só olhou para o umbigo» R EGIÕES FOTOGRAFIAS DE NUNO BOTELHO O sector da saúde padece de problemas muito graves O ministro da Saúde está obcecado com com a ANF Lactogal deixa Santarém A LACTOGAL abandonou definitivamente o projecto de instalação de uma nova unidade industrial em Santarém, a favor de Oliveira de Azeméis, que representa um investimento de 50 milhões de euros. Trata-se de um fábrica de queijos, com uma capacidade de produção de 10 mil toneladas por ano e que deverá criar cerca de 200 postos de trabalho. Ribatejo Empresas com capital de risco AS ASSOCIAÇÕES empresariais das regiões de Castelo Branco, Santarém, Leiria e Portalegre estão a preparar a constituição de um fundo de capital de risco, que deverá estar aos serviços dos empreendedores a partir de Abril do próximo ano. A verba inicial do fundo deverá ser entre 3 a 5 milhões de euros. «Trata-se de um projecto essencialmente virado para a criação de novas empresas», afirma João Fernando presidente da associação empresarial da região de Santarém (Nersant). Reconquista Convenção Empresarial do Centro A CONVENÇÃO Empresarial do Centro junta hoje , em Pombal, mais de mil empresários para «debater estratégias» para reforçar a competitividade e a inovação. Para a Câmara do Comércio e Indústria do Centro (CEC), entidade organizadora, «a região carece de um compromisso claro e alargado», que «sobreviva a ciclos políticos e eleitorais». e, por outro lado «extravase a esfera empresarial» envolvendo outros agentes regionais e o Governo. O Aveiro Paço de Santar premiado O PRODUTOR Paço de Santar — Vinhos do Dão S.A. foi o vencedor do prémio «O Grande Vinho do Dão», com a colheita de 2004, o galardão máximo atribuído pela Comissão Vitivinícola Regional do Dão (CVRD), no âmbito dos Prémios Vinhos do Dão 2005. A Voz de Trás-os-Montes 6 26 NOVEMBRO 2005

À NA «O Estado só olhou para o umbigo»

  • Upload
    others

  • View
    1

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: À NA «O Estado só olhou para o umbigo»

PAULO BARRADAS, presidente da Bluepharma,antiga unidade fabril da Bayer em Coimbra,

investe na investigação de novos processos deprodução de medicamentos, que, depois de

patenteados, são vendidos a clientes espalhadospela Europa. Uma aposta que, a par com a

viragem para os genéricos — destinados mais ao

mercado nacional —, marcam o novo rumoda ex-fábrica da aspirina. Em mais um almoçopromovido pelo EXPRESSO e pela ORDEM

DOS ECONOMISTAS, o farmacêutico contacomo foi parar à produção de remédios,depois de ter tido farmácias e de ter presididoa uma cooperativa de distribuição.

ANA SOFIA SANTOS/

CHRISTIANA MARTINS

EM 2001 impediu o fechoda unidade fabril da Bayer,em Coimbra, que com-prou em conjunto com ou-

tros investidores, através da socie-dade Bluepharma. Para dar um no-vo rumo à «fábrica da aspirina» esubstituir o cliente único e origi-nal, Paulo Barradas virou-se paraos genéricos e para a inovação nos

métodos de fa-brico de medica-mentos.EXPRESSO —Como é que sur-ge a compra dafábrica da Bayer,em Coimbra, e aconsequente cria-ção da Bluephar-ma?PAULO BARRA-DAS — Vou sem-pre tentando es-tragar mais umbocadinho a mi-nha vida. Ao ler

o «Diário de Coimbra» vi um artigoque dava conta que a Bayer queriafechar a fábrica de Coimbra. Tam-bém reparei que eles punham a hi-pótese de vender, caso aparecessealguém com um projecto viável.Constituí um grupo de cinco pes-soas — apenas uma veio da Bayer— e criámos a sociedade Bluephar-ma; passados quase nove meses, es-távamos a fazer a escritura públicada compra. Além disso, só me falta-va produzir remédios para fechar ociclo do medicamento, uma vezque já tive farmácias e fui presiden-te da cooperativa de distribuiçãoFarbeira.EXP. — Recorreram a capital derisco...P.B. — Sim, a PME Capital (ligadaao IAPMEI) tem 30% da Bluephar-ma. Precisávamos que o Estadoportuguês também desse a cara pe-lo projecto porque estávamos a ne-

gociar a compra da «fábrica da aspi-rina» com uma multinacional. Hou-ve cerca de 120 intenções de com-pra. Mas já estamos a negociar a saí-da da PME Capital, o que deveráacontecer até ao final do ano.EXP. — Durante quanto tempo con-taram com o apoio da Bayer?P.B. — Durante 2001, a Bayer asse-gurou a produção a 100% e cus-teou todas as despesas fixas da fá-brica. No segundo ano só assegu-rou 90% e, no terceiro, 60%. Em2004 devia ter saído, mas conse-guimos prolongar o contrato atéMarço deste ano, com 20% deprodução vendida à Bayer. Nestemomento já não produzimos aspi-rina.EXP. — Não tendo medicamentospróprios, como é que se prepararampara a saída do vosso único cliente?P.B. — Estabelecemos um projec-to em três áreas de negócio: pro-dução industrial para terceiros (fi-zemos um esforço enorme paraencontrar novos clientes), sobre-tudo estrangeiros; investigação edesenvolvimento (I&D) de novos

métodos de fabrico de medica-mentos; e produção de genéricos,em particular para o mercado na-cional.EXP. — Portanto, não investigamnovas moléculas mas sim novos pro-cessos de produção de medicamen-tos?P.B. — Sim, o nosso projecto é in-dustrial. Mas também temos ino-vação em termos de produto, por-que surgiu a oportunidade de fa-zermos uma parceria com o Cen-tro de Neurociências de Coimbrae com a Associação de Investiga-ção Biomédica e Inovação emLuz e Imagem para criarmos um

laboratório que utiliza bactériasque geram proteínas idênticas àsque o organismo humano produz.O projecto chama-se X – Prot eganhou o segundo prémio euro-peu de inovação regional (entre700 a concurso), promovido pelaComissão Europeia.EXP. — Como vê o fim da comparti-cipação acrescida de 10% de que be-neficiavam os genéricos em relaçãoaos restantes medicamentos?P.B. — Ainda não era o momento,porque o mercado dos genéricosnão se faz em tão pouco tempo.Com a introdução dos genéricoshá quatro anos, a indústria foi obri-gada a alterar a sua estratégia demercado, que tinha sustentado nosmedicamentos cópia. Somos umexemplo citado internacionalmen-te, porque conseguimos passar deuma quota de mercado de 0,13%,para 13%. O actual ministro da Saú-de está obcecado com a Associa-ção Nacional de Farmácias e tor-nou-se insensível ao que se passa naindústria farmacêutica nacional.EXP. — E o que acha da isenção daobrigatoriedade de reduzir em 6% opreço dos medicamentos comparti-cipados para os laboratórios que te-nham investido um mínimo de cincomilhões de euros em I&D, em2004?P.B. — A portaria dizia que o paísestava em crise e pedia à indústriafarmacêutica para baixar os pre-ços. O que eu não percebo é porque razão só os preços dos medica-mentos comparticipados dimi-nuem. O Estado só olhou para oseu umbigo. Depois criou um regi-me de excepção que não incentivao investimento em I&D. Cinco mi-lhões de euros é muito para algunslaboratórios e pouco para outros.Fazia mais sentido discriminar po-sitivamente através de uma percen-tagem que tivesse por referência ovolume de negócios, por exemplo.O despacho não faz sentido ne-nhum.EXP. — Como classifica a actuaçãodo ministro da Saúde, Correia deCampos?P.B. — Tem tido um discurso mui-to desastrado e uma actuação feitade «fait-divers», como, por exem-plo, a venda de medicamentos foradas farmácias. O sector da saúde pa-dece de problemas muito graves eessa medida não era prioritária.

À

NA

PRATICAMENTE a totalidade da produção da Bluepharma sãogenéricos destinados a patologias cardíacas e do sistemanervoso central, além de antibióticos. Tem 1,7% de quota domercado nacional destes remédios. Entre 2001 e 2003facturou entre 3,2 e 3,7 milhões de euros. No ano passadoultrapassou os cinco milhões de euros e vai fechar 2005 comvendas de cerca de 7,5 milhões de euros. No momento em quefábrica da Bayer foi vendida, produzia 7,5 milhões de unidades(caixas finais) e a Bluepharma manteve o nível de produçãograças à angariação de novos clientes (sobretudoestrangeiros) em feiras e eventos da especialidade. Cerca de40% da facturação destinam-se à exportação, sobretudo paraa Europa — fabrica, em regime de «outsourcing», osmedicamentos com a marca de outros laboratórios. Tem umplano de investimento em I&D de 2,1 milhões de euros (de2003 a 2006), cujo objectivo é desenvolver e patentear novastecnologias para fabricar remédios. Com 110 trabalhadores(quase o dobro dos que «herdou» da Bayer), já tem umprojecto para duplicar a capacidade da fábrica.

Exportar inovação

MESAMESA

«O Estado só olhou para o umbigo»

REGIÕES

FOTO

GR

AFI

AS

DE

NU

NO

BO

TELH

O

‘O sectorda saúdepadece deproblemasmuitograves ’

‘O ministroda Saúde estáobcecado comcom a ANF ’

Lactogal deixa SantarémA LACTOGAL abandonou definitivamente o projecto deinstalação de uma nova unidade industrial em Santarém, afavor de Oliveira de Azeméis, que representa uminvestimento de 50 milhões de euros. Trata-se de um fábricade queijos, com uma capacidade de produção de 10 miltoneladas por ano e que deverá criar cerca de 200 postos detrabalho.Ribatejo

Empresas com capital de riscoAS ASSOCIAÇÕES empresariais das regiões de CasteloBranco, Santarém, Leiria e Portalegre estão a preparar aconstituição de um fundo de capital de risco, que deverá estaraos serviços dos empreendedores a partir de Abril do próximoano. A verba inicial do fundo deverá ser entre 3 a 5 milhões deeuros. «Trata-se de um projecto essencialmente virado para acriação de novas empresas», afirma João Fernando presidenteda associação empresarial da região de Santarém (Nersant).Reconquista

Convenção Empresarial do CentroA CONVENÇÃO Empresarial do Centro junta hoje , emPombal, mais de mil empresários para «debater estratégias»para reforçar a competitividade e a inovação. Para a Câmarado Comércio e Indústria do Centro (CEC), entidadeorganizadora, «a região carece de um compromisso claro ealargado», que «sobreviva a ciclos políticos e eleitorais». e,por outro lado «extravase a esfera empresarial» envolvendooutros agentes regionais e o Governo.O Aveiro

Paço de Santar premiadoO PRODUTOR Paço de Santar — Vinhos do Dão S.A. foi ovencedor do prémio «O Grande Vinho do Dão», com a colheitade 2004, o galardão máximo atribuído pela ComissãoVitivinícola Regional do Dão (CVRD), no âmbito dos PrémiosVinhos do Dão 2005.A Voz de Trás-os-Montes

6 26 NOVEMBRO 2005