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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 002.023/2003-9 GRUPO II – CLASSE I – Primeira Câmara TC-002.023/2003-9 (com 3 volumes e 5 anexos) Natureza: Recurso de Reconsideração em Tomada de Contas Especial Recorrentes: Francisco Campos de Oliveira, Gilton Andrade Santos, Zenor Zambam e Mazam – Madeireira Zambam Ltda. Unidade: 11º Distrito Rodoviário Federal do extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO, A PRETEXTO DE DESAPROPRIAÇÃO CONSENSUAL, POR FAIXA DE PROPRIEDADE ATINGIDA PELA CONSTRUÇÃO DE RODOVIA. VALORES PRESCRITOS. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO E MULTA AOS EX-GESTORES E À EX-PROPRIETÁRIA. RECURSOS DE RECONSIDERAÇÃO. NEGADO CONHECIMENTO DE UM DELES. CONHECIMENTO DOS DEMAIS. PROVIMENTO DE UM DOS RECURSOS. NEGATIVA DE PROVIMENTO DOS OUTROS DOIS. EXCLUSÃO DO EX-PROPRIETÁRIO DA RELAÇÃO PROCESSUAL, ISENTANDO-O DO PAGAMENTO DO DÉBITO E DA MULTA, MANTIDOS PARA OS EX- GESTORES. Em razão do entendimento firmado por meio do Acórdão nº 1.180/2010-Plenário, quando este Tribunal deliberou a respeito de incidente de uniformização de jurisprudência, nos casos em que houve pagamento de indenização decorrente de desapropriação indireta e que não há provas para afastar a presunção de ocorrência de prescrição, somente incorre em ato irregularidade, respondendo pelo débito, solidariamente com os ex-gestores, o ex-proprietário que agiu de má-fé nos procedimentos de avaliação do valor do imóvel, ou fraudou a comprovação da titularidade. RELATÓRIO 1

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 002.023/2003-9

GRUPO II – CLASSE I – Primeira CâmaraTC-002.023/2003-9 (com 3 volumes e 5 anexos)Natureza: Recurso de Reconsideração em Tomada de Contas EspecialRecorrentes: Francisco Campos de Oliveira, Gilton Andrade Santos, Zenor Zambam e Mazam – Madeireira Zambam Ltda.Unidade: 11º Distrito Rodoviário Federal do extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER)

SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO, A PRETEXTO DE DESAPROPRIAÇÃO CONSENSUAL, POR FAIXA DE PROPRIEDADE ATINGIDA PELA CONSTRUÇÃO DE RODOVIA. VALORES PRESCRITOS. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO E MULTA AOS EX-GESTORES E À EX-PROPRIETÁRIA. RECURSOS DE RECONSIDERAÇÃO. NEGADO CONHECIMENTO DE UM DELES. CONHECIMENTO DOS DEMAIS. PROVIMENTO DE UM DOS RECURSOS. NEGATIVA DE PROVIMENTO DOS OUTROS DOIS. EXCLUSÃO DO EX-PROPRIETÁRIO DA RELAÇÃO PROCESSUAL, ISENTANDO-O DO PAGAMENTO DO DÉBITO E DA MULTA, MANTIDOS PARA OS EX-GESTORES.Em razão do entendimento firmado por meio do Acórdão nº 1.180/2010-Plenário, quando este Tribunal deliberou a respeito de incidente de uniformização de jurisprudência, nos casos em que houve pagamento de indenização decorrente de desapropriação indireta e que não há provas para afastar a presunção de ocorrência de prescrição, somente incorre em ato irregularidade, respondendo pelo débito, solidariamente com os ex-gestores, o ex-proprietário que agiu de má-fé nos procedimentos de avaliação do valor do imóvel, ou fraudou a comprovação da titularidade.

RELATÓRIO

Trata-se, nesta fase processual, de recursos de reconsideração interpostos por Francisco Campos de Oliveira, Gilton Andrade Santos e Zenor Zambam e pela sociedade empresária Mazam – Madeireira Zambam Ltda., contra o Acórdão nº 2.665/2007-1ª Câmara, mediante o qual este Tribunal decidiu, em processo de tomada de contas especial, julgar irregulares as contas e condenar os recorrentes ao pagamento do débito de R$ 190.051,64 (cento e noventa mil, cinquenta e um reais e sessenta e quatro centavos), além de aplicar-lhes, individualmente, a multa prevista no art. 57 da Lei n° 8.443/1992, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

2. Preenchidos os requisitos de admissibilidade (exceto em relação ao recurso interposto por Zenor Zambam), a Secretaria de Recursos (Serur) providenciou a instrução dos referidos recursos de reconsideração, declarando-se favorável ao provimento apenas do pleito da Madeireira Zambam Ltda., nos seguintes termos (fls. 45/59, anexo 3):

“HISTÓRICO2. Foi realizada auditoria no extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem

(DNER), na área de desapropriações. Na oportunidade, foi constatado que a autarquia promoveu diversas desapropriações no Estado de Mato Grosso, pagando, no período de 1995 a 2000, segundo

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apurado pela equipe de auditoria, valores de indenização acima do efetivamente devido, com o agravante de que os atos se deram sem a necessária observância das regras do processo expropriatório, estabelecidas no Decreto-Lei nº 3.365/1941 e na Lei nº 4.132/1962. Diante destas ocorrências, o Plenário proferiu, nos autos do TC-425.021/1998-2, a Decisão nº 850/2000, abaixo transcrita:

‘O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator e à vista do preceituado no artigo 47, da Lei nº 8.443/1992, DECIDE:

8.1. converter os presentes autos em Tomada de Contas Especial para, preliminarmente, promover a citação dos Srs. Maurício Hasenclever Borges (ex-Diretor-Geral do DNER); Rômulo Fontanelle Morbach (Procurador-Geral do DNER); e Gilton Andrade Santos (Procurador Chefe do 11º DRF/DNER);

8.1.1. solidariamente com os herdeiros e sucessores da Sra. Anamélia Adrien Corrêa da Costa e seu então procurador, o Advogado Francisco Rodrigues da Silva, para, no prazo de quinze dias, apresentarem defesa ou recolherem as quantias abaixo discriminadas, atualizadas monetariamente e acrescidas dos juros de mora devidos, calculados a partir das datas, a seguir especificadas, concernentes ao processo administrativo de ‘desapropriação consensual’ nº 20111.000183/92-4, tendo como beneficiária a própria Sra. Anamélia Adrien Corrêa da Costa, decorrentes das seguintes irregularidades: falta de embasamento legal para o pagamento administrativo, uma vez não mais configurada a situação prevista no art. 10, do Decreto-Lei nº 3.365/41 (decorridos mais de 5 anos do ato declaratório de utilidade pública); existir processo judicial em curso para a solução da lide, no qual o valor concedido pelo Juiz era de pouco mais de 10% do valor pleiteado pela autora (Processo nº 94.000.869-4, da Justiça Federal de Mato Grosso); a área do imóvel ter sido parcialmente desapropriada quando era dono o Sr. Hilton Corrêa da Costa, além de não ter sido observado determinados critérios de avaliação do imóvel, constantes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), em especial da NBR5676, que disciplina de forma objetiva, baseada em opiniões técnicas e judiciais, inclusive, a avaliação de imóveis urbano e rural, o que elevou, em princípio, o montante pago: (Alterado pela Decisão 1089/2000 - Ata 49 - Plenário. Exclusão da citação dos herdeiros. Citação da responsável e de seu procurador.)

Data – Valor (R$)26/12/1996 – 3.000.000,008/7/1997 – 1.000.000,00 14/8/1997 – 1.000.000,00 23/9/1997 – 804.823,06TOTAL: 5.804.823,068.1.2. solidariamente com o Sr. José da Conceição Coelho, e seu procurador, o Advogado

Francisco Rodrigues da Silva, para, no prazo de quinze dias, apresentarem defesa ou recolherem a quantia de R$ 2.597.391,63, (dois milhões, quinhentos e noventa e sete mil, trezentos e noventa e um reais e sessenta e três centavos), atualizada monetariamente e acrescida dos juros de mora devidos, calculados a partir de 7/9/1996, relativamente ao processo administrativo de ‘desapropriação consensual’ nº 51210.000.756/77, tendo como beneficiário o mencionado Sr. José da Conceição Coelho, em razão das seguintes irregularidades observadas no processo de pagamento de indenização, a título de desapropriação indireta: falta de embasamento legal para o pagamento administrativo, uma vez não mais configurada a situação prevista no art. 10, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (decorridos mais de 5 anos do ato declaratório de utilidade pública), além de não ter sido observado determinados critérios de avaliação do imóvel, constantes da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), em especial da NBR nº 5676 (Norma Brasileira Registrada), que disciplina de forma objetiva, baseada em opiniões técnicas e judiciais, inclusive, a avaliação de imóveis urbano e rural, o que elevou, em princípio, o montante pago;

8.2 determinar ao DNER:

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8.2.1. que se abstenha de fazer novos pagamentos extra-judiciais de indenizações por ato ilícito do DNER (esbulho de propriedade privada) ante a absoluta falta de amparo legal para tais pagamentos, no vigente ordenamento jurídico;

8.2.2. que informe ao Tribunal, no prazo de 45 dias, a regularização da situação dos imóveis de Antônio Altobelli e Marco Antônio Altobelli, de processo administrativo nº 201.11.000.669/84-3, providenciando a escritura e registro da área de 104,00 ha já paga pelo DNER e ainda não recebida, promovendo a abertura de tomada de contas especial caso não seja possível fazê-lo;

8.2.3 proceda a abertura de tomada de contas especial para fins de identificação dos responsáveis e quantificação dos danos causados aos cofres públicos, em razão do pagamento administrativo de indenização a título de ‘desapropriação consensual’, nos processos abaixo relacionados, em que o direito dos titulares dos imóveis já se encontrava prescrito, devendo os referidos processos serem submetidos à Secretaria Federal de Controle Interno antes de sua remessa a este Tribunal, a qual deverá ocorrer no prazo máximo de 45 dias;

Processo Parte interessada 201.11.002.453/87 Khalil Mikahil Malouf 51210.000.692/93 João Arcanjo Ribeiro 51210.000.687/93 João Arcanjo Ribeiro e Joseph Jaoudath Haraoui 51210.000.690/93 Joseph Jaoudath Haraoui 51210.000.056/93 Indústria Gráfica São José

8.2.4. observe no cálculo da indenização de avaliação de imóveis desapropriados a estrita observância do nível de rigor normal ou superior, conforme NBR 5676, baseado em dados objetivos, isto é, operações efetivamente realizadas no mercado e não em opiniões subjetivas, pessoais de corretores;

8.2.5. atente para a adequada defesa da autarquia em juízo, observando para tanto, o seguinte:

8.2.5.1 o artigo 1º, do Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que estabelece o prazo prescricional de cinco anos para todo e qualquer direito de ação contra a Fazenda Federal, seja qual for sua natureza ;

8.2.5.2 a adequada quantificação do valor da indenização, utilizando-se dos critérios do item 8.2.3 supra;

8.2.5.3 a fruição do prazo prescricional para fins de apossamento do imóvel, prazo este que não deve ser afetado por eventual ato posterior de declaração de utilidade pública para fim de desapropriação, porque já consolidada a desapropriação, embora indiretamente;

8.2.5.4 o histórico da rodovia e a efetiva titularidade do imóvel desapropriado;8.3. nos termos do art. 74, inciso IV e § 1º, da Constituição Federal, determinar à Secretaria

Federal de Controle Interno:8.3.1. que efetue a revisão de todos os pagamentos efetuados dentro do programa de

‘desapropriação consensual’ pelo 11º Distrito Rodoviário Federal de Mato Grosso, no período de 1995 até o corrente ano, solicitando ao DNER, nos casos em que for constatada a prescrição do direito do titular do imóvel, a abertura dos respectivos processos de tomadas de contas especiais pelos pagamentos indevidos, objetivando a quantificação dos valores pagos e identificação dos responsáveis e dos beneficiários desses pagamentos, após o que deverão ser-lhes submetidos para a emissão e certificados de auditoria a seu encargo, antes de sua remessa a este Tribunal, no prazo máximo de 60 dias;

8.3.2 para os fins previstos no subitem anterior, encaminhar ao referido órgão de controle interno, cópia de inteiro teor do relatório de auditoria produzido pela unidade técnica do Tribunal em Mato Grosso, bem assim do Relatório, Voto e Decisão aqui proferidos;

8.4. encaminhar cópia da presente Decisão, acompanhada do Relatório e Voto que fundamentam à Ordem dos Advogados do Brasil, ao Ministério Público Federal, à Advocacia Geral da União e, por fim, ao Ministro de Estado dos Transportes, para fins da supervisão ministerial.’

3. Em atendimento à decisão supra, o TC-425.021/1998-2 foi convertido em TCE, bem como foram instauradas outras 42 tomadas de contas especiais pelo inventariante do DNER, a partir da auditoria especial realizada pela Secretaria Federal de Controle Interno do Ministério da Fazenda,

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tendo como objetivo a análise dos processos de desapropriação consensual para fins rodoviários com indenizações pagas nos exercício de 1995 a 2000, no 11º Distrito Rodoviário/MT.

4. Até a presente data, nem todas as TCEs instauradas foram levadas a julgamento. Foram apresentados recursos contra as decisões proferidas nos autos das TCEs já julgadas, sendo que o TC-18.642/2003-8 já foi apreciado em sede recursal.

5. Não obstante, o Ministro Valmir Campelo observou que estavam sendo dispensados tratamentos distintos a processos com situações semelhantes. Assim, no bojo do TC-018.647/2003-4, o Ministro-Relator determinou a adoção de medidas tendentes a uniformizar o tratamento a ser conferido às TCEs em questão. Desta forma, os autos do citado processo foram encaminhados à Segecex para cumprimento da determinação, de modo a esclarecer a efetiva situação dos responsáveis arrolados nas TCEs instauradas a partir da Decisão nº 850/2000-TCU-Plenário. Entretanto, até a presente data não houve manifestação daquela Secretaria-Geral.

6. No que tange ao presente processo, refere-se a uma das TCEs instauradas pelo inventariante do extinto DNER e concluída pelo Ministério dos Transportes, tendo recebido certificado de irregularidade por parte do Controle Interno. No âmbito do TCU, os ora recorrentes foram devidamente citados; todos apresentaram alegações de defesa, que foram rejeitadas pelo Tribunal.

7. Da análise de todas as informações constante dos autos, o Tribunal, mediante o Acórdão nº 2.665/2007-TCU-1ª Câmara (fl. 519, volume 3), assim dispôs em essência:

‘9.1. rejeitar as alegações de defesa apresentadas pelos Srs. Gilton Andrade Santos, Francisco Campos de Oliveira e Mazan – Madeireira Zamban Ltda.;

9.2. com fulcro nos arts. 1º, inciso I; 16, inciso III, alíneas ‘b’ e ‘d’ e § 2º; e 19, caput, todos da Lei nº 8.443/1992, julgar as presentes contas irregulares e condenar os responsáveis Gilton Andrade Santos, Francisco Campos de Oliveira e Mazan – Madeireira Zamban Ltda., na pessoa do seu representante legal, Sr. Zenor Zamban, solidariamente, ao pagamento do débito de R$ 190.051,64 (cento e noventa mil, cinquenta e um reais e sessenta e quatro centavos), atualizado monetariamente e acrescido dos juros de mora, calculados a partir de 12/12/1996 até a efetiva quitação, na forma da legislação em vigor, fixando-lhes o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprovem perante este Tribunal o recolhimento da quantia aos cofres do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT, nos termos do art. 23, inciso III, alínea ‘a’, da Lei nº 8.443/1992 e do art. 216 do Regimento Interno do TCU;

9.3. aplicar, individualmente, aos responsáveis Gilton Andrade Santos, Francisco Campos de Oliveira e Mazan - Madeireira Zamban Ltda., a multa prevista no art. 57 da Lei n° 8.443/1992, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fixando-lhes o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprovem perante este Tribunal, nos termos do art. 23, inciso III, alínea ‘a’, da Lei nº 8.443/1992 e do art. 216 do Regimento Interno do TCU, o recolhimento das quantias aos cofres do Tesouro Nacional, atualizadas monetariamente a partir do dia seguinte ao do término do prazo estabelecido até a data do efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor;

9.4. autorizar, desde logo, a cobrança judicial das dívidas nos termos do art. 28, inciso II, da Lei n° 8.443/1992, caso não atendidas as notificações;

9.5. juntar às contas do exercício de 1996 (TC-008.135/1997-5) o inteiro teor desta deliberação;

9.6. levar ao conhecimento da Procuradoria da República no Estado do Mato Grosso o inteiro teor desta deliberação, conforme prevê o § 3° do art. 16 da Lei n° 8.443/1992;’

8. Inconformados, os Srs. Francisco Campos de Oliveira (fls. 2/40, anexo 3), Gilton Andrade Santos (fls. 2/8, anexo 4) e a empresa Mazam, juntamente com o Sr. Zenor Zambam (fls. 2/76, anexo 5), interpuseram os presentes recursos de reconsideração contra o acórdão acima transcrito.

ADMISSIBILIDADE

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9. Os exames de admissibilidade dos recursos de reconsideração interpostos pelos Srs. Francisco Campos de Oliveira (fl. 42, anexo 3) e Gilton Andrade Santos (fl. 9, anexo 4), foram realizados por esta Serur, que se manifestou pelo conhecimento dos recursos.

10. Em relação ao recurso interposto pela empresa Mazam e pelo Sr. Zenor Zambam (fls. 77/78, anexo 5), esta unidade técnica propôs que fosse conhecido o recurso de reconsideração interposto pela Mazam – Madeireira Zamban Ltda. e não o fosse o interposto pelo Sr. Zenor Zamban, por ausência de legitimidade e de interesse recursal. O Ministro-Relator Marcos Vinicios Vilaça acatou as propostas desta Secretaria (fl. 44, anexo 3).

MÉRITODo recurso de reconsideração interposto por Gilton Andrade SantosArgumento11. O recorrente informa que o fato de ter sido demitido nos termos da Lei nº 8.112/1990 não

invalida os argumentos de sua defesa, ainda que sejam os mesmos apresentados no PAD, pois relatam a pura verdade sobre os procedimentos adotados na Procuradoria Distrital.

12. Observa que se manifestou em processos que tratavam de indenizações e não de desapropriações.

13. O ex-Procurador do extinto DNER assevera que, ao declinar sobre as obrigações de outros funcionários, não o fez com a intenção de eximir-se de suas responsabilidades, mas com o intuito de demonstrar sua extensa vida profissional no órgão, pautada na honradez e labor sério no dia-a-dia, o que não condiz com a condenação que lhe foi imposta.

14. O recorrente esclarece que todos os seus atos na Chefia da Procuradoria Distrital foram balizados em legislação específica e que os procedimentos administrativos seguiram a tramitação legal, de acordo com os parâmetros estabelecidos no Programa Anual de Desapropriações, o qual englobava procedimentos expropriatórios antigos e não pagos. Afirma ainda que os processos eram encaminhados à Procuradoria Geral da entidade, com manifestação do Grupo de Perícias e Avaliações, que emitia parecer final sobre os cálculos e a documentação expropriatória, tudo na forma do Regimento Interno vigente à época e de acordo com o Conselho de Administração da Autarquia.

15. O Sr. Gilton Andrade Santos argumenta que não havia corrido o prazo prescricional, bem como o ato expropriatório ainda não havia caducado, haja vista a existência de procedimentos administrativos pendentes de pagamento, no âmbito da entidade, assim sendo, entende que o TCU não poderia ter contado o prazo da forma que fez.

16. O ex-Procurador alega que não pode ser responsabilizado pelo fato de ter emitido parecer meramente opinativo, o que não constitui emissão de ato administrativo, conforme decidido pelo STF. Para tanto, apresenta a decisão proferida nos autos do MS nº 24.973/DF.

17. O recorrente argumenta que não consta dos autos prova de que a estrada primitiva foi realmente a que atingiu a propriedade em vértice. Que tal informação está baseada em manchete de jornal e em uma oficiosa apostila de um senhor que não detém fé pública. Assegura ainda que, na própria apostila, há informação de que estrada sofreu várias alterações. O Sr. Gilton Santos afirma que, apesar disso, a comissão de auditoria não procurou checar as informações emitidas pelo auditor e pelo próprio recorrente, bem como não consultou os arquivos do extinto DNER. Pelo exposto, o responsável acredita que houve afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Além do mais, o recorrente argumenta que a Lei Orgânica do TCU, ao não admitir feitura de prova pericial nem depoimento de testemunha, prejudica as partes, indo de encontro à Constituição Federal, o que não pode ocorrer.

18. O recorrente aduz que não foi comprovada a má-fé em suas ações, ressaltando que o ônus da prova é de quem alega. Afirma que sempre agiu de acordo com os ditames da Administração Pública, além de não ter obtido nenhuma vantagem pecuniária ou favoritismo. Assim, para se tornar responsável solidário pelo pagamento efetuado a título de desapropriação, seria necessário comprovar sua intenção em fraudar a lei, porque sem má-fé ou dolo não se pode falar em

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responsabilidade solidária. Ao final, afirma que somente o ato consciente e desonesto do funcionário público pode gerar responsabilidade solidária. Além do mais, observa que não restou comprovado que sua evolução patrimonial decorreu de atividade ilícita.

Análise19. Cumpre observar que a defesa do recorrente foi analisada no bojo do processo de tomada

de contas especial, ainda que apresentando os mesmos argumentos oferecidos em sede de defesa no PAD. No entanto, naquele momento, não foi capaz de elidir as irregularidades detectadas pela equipe de auditoria no processo de ‘desapropriação consensual’.

20. Quanto à alegação de que o recorrente manifestou-se apenas em processos que tratavam de indenizações e não de desapropriações, não procede. Primeiro, porque o recorrente não faz prova do que alega; segundo, porque, na sua defesa, por diversas vezes, menciona sua atuação nos processos de desapropriação. Cabe ressaltar que tal argumento não tem relevância, haja vista o processo de desapropriação gerar o direito à indenização.

21. Também não merece prosperar o argumento de que a LO/TCU, bem como o RI/TCU, vão de encontro ao disposto na Carta Magna. Tais normas disciplinam e operacionalizam a aplicação dos referidos princípios nos processos aqui desenvolvidos. Dessa forma, há preservação da viabilidade do controle externo das despesas públicas, que também tem sede constitucional. Não se harmonizam com esse controle, cujo caráter é eminentemente administrativo, as formalidades do processo judicial, que poderiam gerar delongas que privariam sua atuação de qualquer eficácia.

22. Ademais, se não houvesse limitação, poderiam os responsáveis demandar, a todo e qualquer tempo, a produção de novas provas, de modo que os processos nunca seriam concluídos. Por isso, prefere-se, legitimamente, a produção de provas sob a forma escrita, sem a necessidade de convocação de testemunhas ou peritos, o que confere ao processo a necessária agilidade. Destaque-se ainda que a produção de provas periciais e testemunhais não advém da Constituição, mas decorre do Código de Processo Civil, cuja aplicabilidade aqui é subsidiária. Isso não impede que se apresentem laudos periciais.

23. Quanto à questão de responsabilização, suscitada pelo recorrente, cabe destacar que todos aqueles que, de alguma forma, contribuem para a ocorrência de dano devem ser considerados responsáveis quando sem sua ação o resultado não aconteceria. No que diz respeito às questões da responsabilidade solidária, deve-se considerar a legislação de forma combinada.

24. O artigo 265 do Código Civil vige nos seguintes termos: ‘Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes’.25. A seu turno, o § 2º do art. 16 da Lei n° 8.443/1992, encontra-se assim redigido:‘§ 2° Nas hipóteses do inciso III, alíneas ‘c’ e ‘d’ deste artigo, o Tribunal, ao julgar

irregulares as contas, fixará a responsabilidade solidária:a) do agente público que praticou o ato irregular, eb) do terceiro que, como contratante ou parte interessada na prática do mesmo ato, de

qualquer modo haja concorrido para o cometimento do dano apurado’.26. Assim, o Tribunal pode responsabilizar solidariamente aqueles que causarem prejuízo ao

erário. Cumpre destacar que, ao contrário do que apregoa o recorrente, não necessita o Tribunal demonstrar que o agente atuou com dolo ou má-fé para poder responsabilizá-lo solidariamente. Por tratar-se de responsabilidade subjetiva, basta que esteja presente o elemento culpa, existam a ação e o resultado danoso, além do nexo de causalidade entre os dois últimos.

27. No que tange à participação do recorrente no processo de desapropriação, conforme informado nos autos, o recorrente não emitiu parecer meramente opinativo, mas atuou de forma marcante no processo de desapropriação no âmbito do 11º Distrito Rodoviário Federal do extinto DNER, em Mato Grosso, tendo inclusive iniciado o processo de desapropriação e assinado a escritura de desapropriação (fls. 127/128, v.p.).

28. No que se refere à justificativa de que na entidade havia procedimentos administrativos pendentes de pagamento, o que teria interrompido o prazo prescricional, não há informação da

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existência de requerimento de indenização para empresa Mazam – Madeireira Zamban Ltda. até o ano de 1984, bem como só há notícia que o Programa de Desapropriação tenha começado em 1995.

29. É importante notar que o tema da interrupção da prescrição sofreu alteração com a edição do novo Código Civil. O art. 172, caput, do Código Civil de 1916 não limitava o número de vezes que a prescrição podia ser interrompida. O art. 202, caput, do Código Civil de 2002, por sua vez, passou a limitar essa possibilidade a uma única vez.

30. No caso sob análise, em que a prescrição regia-se pelos dispositivos do Código Civil de 1916, havia, por conseguinte, a possibilidade de interrupção da prescrição por mais de uma vez, na hipótese de ‘qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor’ (art. 172, inc. V), entre outras. Desta forma, a prescrição foi interrompida, pela primeira vez, em 1976, por força da portaria declaratória de utilidade pública (fl. 132, v.p.) e, novamente, em 1984, com o início do processo de desapropriação.

31. No entanto, o acórdão tem razão em apontar que, em 1984, quando foi aberto o processo que resultaria no pagamento em questão, a Portaria nº 36/DES, de 20/4/1976, já havia caducado, pois já eram decorridos cerca de 8 anos de sua expedição, nos termos do Decreto-Lei nº 3.365/1941, em sua redação original, vigente à época dos fatos:

‘Art. 10. A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Neste caso, somente decorrido um ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração.’

32. Sendo assim, a Portaria nº 36/DES não poderia ser utilizada como fundamento para o procedimento de desapropriação regulado pelos Decretos-Lei nºs 3.365/1941 (que trata das desapropriações em geral) e 512/1969 (que trata das desapropriações efetuadas pelo DNER). Ao fazê-lo, os dirigentes do DNER incidiram, portanto, em flagrante ilegalidade. Desta forma, no que se refere ao argumento de que agiu de acordo com a legislação específica, em especial no que tange às normas internas da autarquia, não pode prosperar, haja vista o recorrente ter atuado de forma contrária à lei. Se as normas internas divergiam da lei, não poderiam ser aplicadas.

33. Cumpre destacar que, no presente caso, por tratar-se de desapropriação indireta, pois as terras já estavam na posse mansa e pacífica da União, não era necessária a publicação da portaria de desapropriação.

34. Mas isso em nada se relaciona com o prazo de prescrição do direito à indenização da empresa Mazam – Madeireira Zamban Ltda. que, pelo menos até 2001, considerava-se vintenário. Esse entendimento foi, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça nos seguintes termos:

‘A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos’ (Súmula 119).35. Portanto, o prazo de prescrição do direito à indenização pela desapropriação indireta do

imóvel decorrente da implantação de rodovia federal pelo DNER era de vinte anos, nada tendo a ver com a decadência que atingiu a portaria de declaração de utilidade pública.

36. Assim, em 1996, quando foi realizado o pagamento, considerando que, somente no ano de 1972, a rodovia estava totalmente construída e que a prescrição foi interrompida em 1976, com a publicação da portaria de desapropriação, e, novamente, em 1984, com o início do processo de ‘desapropriação consensual’, não havia ocorrido a aquisição da propriedade pela União por meio de usucapião, nem a prescrição para que o proprietário das terras expropriadas ajuizasse ação de perdas e danos. Portanto, o pagamento era devido, pois não há dúvida que a União se apropriou de terra alheia, por conseguinte, não há falar em dano ao erário.

37. Dessa forma, deve ser afastado o débito imputado ao recorrente e mantida a multa que lhe foi imposta, alterando seu fundamento, ante a ausência de débito, devido a irregularidades apontadas nesta instrução e no item 5 da ementa do acórdão ora recorrido:

‘5. não há qualquer amparo legal ou regulamentar aos ex-servidores do extinto DNER para apurar e liquidar tais perdas e danos.’

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38. Isto porque o pagamento da indenização não poderia ter ocorrido por via administrativa, já que o Decreto-Lei nº 3.365/1941 determina que se dê por meio judicial:

‘Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação julgada procedente resolver-se-á em perdas e danos.’

39. Neste contexto, é esclarecedor trazer trechos do voto condutor do Acórdão nº 1.532/2007-TCU-Plenário, do qual o Ministro Marcos Vinicios Vilaça foi relator:

‘Em 1997, o 11º DRF, por deliberação administrativa, realizou pagamento, a título de indenização, em favor do espólio de Antônio Santos Renosto, ao qual pertencia a fazenda Sertãozinho, em Primavera do Leste/MT, cortada no passado distante por força da implantação da rodovia BR-070.

2. Não se põe em dúvida que uma fração de terra particular foi apoderada pelo poder público para a construção da estrada e que seria de justiça compensar financeiramente o proprietário pela perda de parte do seu patrimônio. Também é fato que o DNER não seguiu os procedimentos jurídicos para a desapropriação, que prevêem, como princípio, indenização prévia ao apossamento, conforme mandamento inserido no art. 150, § 22, da Constituição Federal de 1967, então vigente, atualmente repetido no art. 5º, inciso XXIV, da Constituição Federal de 1988.

3. Apura-se se a indenização ainda era exigível, em face dos institutos da prescrição e decadência, e se o 11º DRF agiu dentro dos limites normativos ao decidir a questão por si mesmo.

4. É conveniente, antes, lembrar, num resumo, o rito desapropriatório aplicável ao atendimento de obra pública, previsto no Decreto-Lei nº 3.365/1941. Como primeiro passo, a autoridade administrativa deve expedir o ato que declara de utilidade pública a propriedade privada. A seguir, a Administração tentará um acordo com o proprietário quanto ao valor da indenização, ou providenciará o pagamento pela via judicial, tudo no prazo de cinco anos de validade do ato declaratório do interesse público sobre o imóvel. Enquanto pendente o pagamento da indenização, a Administração poderá adentrar a propriedade em desapropriação, a fim de fazer inspeções, mas ainda não lhe será permitido despojar o seu proprietário.

5. Ocorre que nem sempre a administração agiu assim. No DNER, foi comum a abertura de rodovias por entre propriedades rurais, sem o prévio pagamento de indenização, nem mesmo a declaração formal de utilidade pública. A prática ficou conhecida como ‘desapropriação indireta’, nada obstante a inadequação da expressão, pois, embora consolidada pelo tempo a privação da propriedade, não o fora segundo o regime expropriatório legal.

6. Por causa disso, remanesceram inúmeros casos em que, tendo o poder público imitido na posse de propriedade privada já há muitos anos, permaneceu faltoso com o respectivo dever de indenização. Em contrapartida, os proprietários também se mantiveram passivos diante da situação, mas alguns resolveram depois buscar seus direitos, administrativa ou judicialmente.

7. Aqui está um desses casos. Não se sabe ao certo quando a construção da BR-070/MT alcançou a propriedade da família Renosto, mas é fato que foi bem antes de 29/12/1992, dia da protocolação do pedido de indenização junto ao 11º DRF.

8. A primeira pergunta que surge é se a propriedade já estava usucapida pela União, o que retiraria do proprietário o direito de fazer a cobrança indenizatória. Para tanto, haveriam de ter decorrido ao menos vinte anos da data em que a rodovia atingiu a propriedade até a reclamação perante o 11º DRF.

9. Há registro de que a BR-070/MT estava concluída em 1972, portanto vinte anos antes do pedido de indenização. Acontece que também existe informação de que a rodovia assumiu novo traçado em 1974 e de que os projetos finais são de 1982, conforme referido na portaria de declaração de utilidade pública da área em questão. Não se conhece a evolução do traçado da rodovia, o que impede a identificação segura do momento em que a BR-070/MT atravessou a fazenda ‘Sertãozinho’.

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10. Dessa maneira, não é possível produzir prova de que a faixa de terra tomada pela BR-070/MT tenha sido usucapida pela União. Como bem observado pela Secex/CE, por esse caminho não dá para dizer que o direito de indenização estava perdido.

11. Então, poderia ser apontada a prescrição quinquenal, instituída pelo Decreto nº 20.910/1932, para a cobrança de dívidas da União, ‘seja qual for a sua natureza’. Contudo, a despeito de outros julgados do TCU que compreenderam de modo diverso, está claro para mim que deve ser aplicado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, reiterado em centenas de julgamentos e até compendiado na Súmula nº 119, nestes termos: ‘A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos.’

(...)14. Com o intuito de mudar a jurisprudência e unificar os prazos prescricionais para a

cobrança de suas dívidas, o poder público fez incluir, por meio da Medida Provisória nº 1.774-22/1999, o parágrafo único no art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/1941, com o seguinte texto: ‘Extingue-se em cinco anos o direito de propor ação de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem como ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público.’

15. Idêntica redação constou da Medida Provisória nº 2.027-40/2000, que foi, nesse ponto, objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.260-1/DF, levada a juízo pela Ordem dos Advogados do Brasil, por considerá-lo violador do direito de propriedade, da proibição de confisco e dos princípios da moralidade e da razoabilidade.

16. Ao deferir liminar nessa ação, para suspender a eficácia do dispositivo quanto à expressão ‘ação de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem como’, o STF ponderou que, ‘de há muito, a jurisprudência desta Corte afirmou que a ação de desapropriação indireta tem caráter real e não pessoal, traduzindo-se numa verdadeira expropriação às avessas, tendo o direito à indenização que daí nasce o mesmo fundamento da garantia constitucional da justa indenização nos casos de desapropriação regular.’

17. Antes do julgamento de mérito da referida ADIN, o próprio poder público rendeu-se à evidente inclinação do STF, eliminando o trecho impugnado da subsequente Medida Provisória nº 2.109-49/2001, finalmente convalidada pela Medida Provisória nº 2.183-57/2001.

18. Fico inteiramente convencido, por conseguinte, de que não há razão para insistir em que o prazo prescricional para o requerimento de indenização por desapropriação indireta, a exemplo da presente, seja o quinquenal, até porque isto teria como efeito prático possibilitar à União, por conta de ato irregular seu, usucapir após exíguos cinco anos.

(...)20. Mesmo que o espaço de tempo havido entre a chegada da rodovia à propriedade e o pedido

de indenização fosse de mais de vinte anos, cumpre advertir que copiosa jurisprudência do STJ interpreta que qualquer ato do poder público pelo reconhecimento da desapropriação indireta, tal como é a decretação de expropriação, ocasiona a interrupção da prescrição vintenária (REsp 141978/PR, 118765/PR, 187336/PR):

‘ADMINISTRATIVO. CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRESCRIÇÃO.1. O ATO INEQUÍVOCO DE RECONHECIMENTO DE DOMÍNIO, COMO SE

CARACTERIZA O REPRESENTADO POR DECRETO EXPROPRIATÓRIO, É CAUSA CONTRIBUIDORA PARA A INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO PARA FINS DE AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. 2. TERRAS OCUPADAS E DEPOIS DESAPROPRIADAS NO ESTADO DO PARANÁ PARA ABERTURA DE RODOVIAS. 3. EXPEDIÇÃO DO DECRETO Nº 20.671, DE 20.07.70, DESAPROPRIANDO OS REFERIDOS IMÓVEIS. EFICÁCIA DE TER PROVOCADO A INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. 4. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS: RESP Nº 3656, REL. MIN. GARCIA VIEIRA, RSTJ, VOL. 13, PÁG. 405; RESP Nº 5.051-MS, REL. MIN. GERALDO SOBRAL, DJ DE 01.04.91; RESP Nº 6.578-0-PR, REL. MIN. MILTON LUIZ PEREIRA, DJ DE 09.05.94; RESP Nº 21.222-8/BA, 2ª T, REL. MIN. HELIO

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MOSIMANN, DJU DE 11.04.94; RESP Nº 63.706-6, REL. MIN. CESAR ASFOR, JULGADO EM 31.05.95; RESP Nº 4.010-SP, REL. MIN. AMÉRICO LUZ, DJ DE 31.08.92; RESP Nº 5.687-SP, REL. MIN. VICENTE CERNICCHIARO, DJU DE 26.11.90; RESP Nº 10206-SP REL. MIN. JOSÉ DE JESUS FILHO, DJ DE 23.09.91. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA AFASTAR A PRESCRIÇÃO.’

21. Conquanto o TCU, em alguns julgados, tenha acolhido a opinião de que o decreto declaratório de utilidade pública, quando expedido muito depois do apossamento da respectiva área pela administração, seria nulo, o que lhe excluiria o poder de parar a contagem da prescrição, está evidente que o STJ pensa de outro modo. Adicionalmente, é atentatório ao princípio da segurança jurídica querer tolher os efeitos desses atos benéficos aos cidadãos, contra os quais não há prova de má-fé, mais de vinte anos depois de terem sido expedidos.

(...)23. Resta analisar a tese de que o ato expropriatório estava caducado por ocasião do

pagamento da indenização, segundo o disposto no art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/41: ‘A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará.’

24. É óbvio que a regra não vale para a chamada desapropriação indireta, que não encontra amparo na lei e representa, antes de tudo, abuso de poder por parte do Estado.

25. Assim, a caducidade nela prevista presta-se às desapropriações feitas conforme o procedimento regular. Ou seja, se a administração, por mais de cinco anos, permanece inerte em iniciar a negociação sobre a indenização ou a sua discussão judicial, que consiste na primeira providência da desapropriação legal, é como se deixasse de ter interesse no imóvel declarado de utilidade pública.

26. Todavia, na desapropriação indireta, não é por não ter havido indenização que o imóvel perdeu a condição de útil ao domínio público. Afinal, independentemente da existência de um ato expropriatório, ou de se ter passado mais de cinco anos da sua edição, a utilidade pública é real e notória, já que o imóvel agora está tomado por uma obra da administração. Nessa linha, não é meramente porque o ato ultrapassou o quinquênio, num contexto de desapropriação indireta, que a indenização tornou-se incobrável. Isto apenas aconteceria com a prescrição vintenária anteriormente debatida.

27. Nos termos da proposta de imputação de débito aos responsáveis, formulada pela Secex/CE, um dos fundamentos, além da já descartada prescrição quinquenal do Decreto nº 20.910/1932, seria o de que eles causaram dano ao erário, haja vista que fizeram o pagamento da indenização em 1997, com base num ato expropriatório de 1982, que teria perdido a validade cinco anos mais tarde.

28. Entendo, sim, que houve irregularidade, mas não sob o prisma colocado pela unidade técnica. Na verdade, conforme mencionei, a indenização ainda era devida naquele momento, porquanto a faixa de terra foi indiscutivelmente apropriada pela União e a prescrição vintenária não havia se consumado. Porém, estava fechada a via administrativa para resolver a pendência, significando dizer que os responsáveis pelo 11º DRF praticaram atos e realizaram despesas que não lhes competiam.

29. Como disse, o art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/1941, que autoriza o pagamento administrativo de indenização, em consequência de acordo, só tem validade no âmbito da rotina expropriatória normal, e não quando há desapropriação indireta, que não é admitida pela legislação. Nem os arts. 14 a 19 do Decreto-Lei nº 512/1969, que fixam orientações especiais para desapropriações para fins rodoviários, cuidam de alguma espécie de indenização administrativa fora do rito ordinário. Enfim, a denominada desapropriação indireta é uma criação extralegal, cuja reparação, pelo vício de origem, não se soluciona no foro administrativo.

30. Àqueles prejudicados em sua propriedade pela desapropriação indireta, o meio de obter a justa indenização seria unicamente o judicial. Pedidos apresentados nesse sentido junto à

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administração deveriam ser sumariamente negados, visto que não há em nenhuma lei outorga de poder ao gestor público para sanar o problema.

31. Compreendo, desse modo, que o ex-chefe e o ex-procurador-chefe do 11º DRF praticaram atos de gestão ilegais e ilegítimos, quando o primeiro autorizou o pagamento da indenização, o segundo abonou a conformidade legal do procedimento e ambos assinaram a escritura pública de desapropriação de imóvel declarado de utilidade pública, relativamente ao trecho da fazenda ‘Sertãozinho’.

32. Tal usurpação de poder é motivo para o julgamento pela irregularidade das suas contas, na forma da alínea ‘b’ do inciso III do art. 16 da Lei nº 8.443/1992, bem como para a cominação da multa determinada pelo parágrafo único do art. 19 e pelo inciso I do art. 58 da mesma lei. Dada a gravidade da infração, aliada ao alto grau de responsabilidade dos envolvidos, que exerciam elevado posto na estrutura da administração pública, estipulo o valor da sanção individual em R$ 20.000,00, observado o limite definido pelo inciso I do art. 268 do Regimento Interno.

33. Penso, entretanto, que, nesta situação específica, não há maneira de imputar-lhes débito, porque, como visto, a indenização era devida e exigível, ainda que não na esfera administrativa. De toda sorte, foi paga e recebida a quitação pela área desapropriada, conforme registrado na escritura pública, não convindo, na ausência de elemento indicativo de superavaliação do preço desembolsado, fazer insubsistentes os atos, depois de já consolidados.

34. Assinalo que, apesar da circunstância de ter sido adotado um método de avaliação expedito, por meio de consultas a imobiliárias, não se pôde concluir pela ocorrência de pagamento excessivo.

35. Quanto à responsabilidade de Lucinda Franco Renosto, entendo que deva ser excluída, não só porque não há débito, mas também por outras razões, que consigno apenas para orientar futuros trabalhos da unidade técnica.

(...)37. Depois, se presente o débito, o que implicaria ter havido pagamento de dívida prescrita,

mesmo assim Lucinda não poderia ser responsabilizada. A prescrição impede o uso dos instrumentos jurídicos para a cobrança do crédito, mas não extingue a dívida nem o direito do credor. O pagamento transforma-se numa obrigação moral, não exigível por meio coercitivo. Contudo, se feito o pagamento, não se pode mais pedir a devolução do valor. Era o que dizia o art. 970 do Código Civil anterior, agora no art. 882 do atual: ‘Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.’

Do recurso de reconsideração interposto por Francisco Campos de OliveiraArgumento40. O recorrente argumenta que a Secretaria de Controle Externo no Mato Grosso seria a

unidade competente para instruir o feito, aduz que o fato de a instrução ter sido realizada pela Secex-SC impôs dificuldades que não conseguiu transpor, por falta de condições financeiras. Portanto, entende que o Tribunal deve arcar com o ônus por tal escolha.

41. O responsável alega que não pode ser responsabilizado por ter assinado a ordem bancária, pois a verba foi alocada em Brasília, com destino certo e não competia ao recorrente decidir a quem pagar. Assevera que somente tinha a responsabilidade de ordenar a operação com valor e destino específico. O recorrente esclarece que assinou a ordem de pagamento apenas porque o processo estava concluído e com o pagamento efetivado.

42. O Sr. Francisco Campos de Oliveira assegura que basta uma simples análise dos autos para perceber a dificuldade de desconfiar dos procedimentos adotados por seus superiores. Assim, somente tomou conhecimento das irregularidades ao serem noticiadas pela imprensa, pois a perfeita organização da quadrilha tornava impossível conhecer sua intenção em lesar o erário, principalmente porque as pessoas envolvidas na ação criminosa eram as responsáveis pela sustentação jurídica das desapropriações.

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43. O recorrente argumenta que não foi comprovada a má-fé em suas ações, ressaltando que o ônus da prova é de quem alega. Assim, para se tornar responsável solidário pelo pagamento efetuado a título de desapropriação, seria necessário comprovar sua intenção em fraudar a lei, porque sem má-fé ou dolo não se pode falar em responsabilidade solidária, visto que somente o ato consciente e desonesto do funcionário público pode gerar responsabilidade solidária. Neste contexto, informa que a Justiça Federal rejeitou a ação de improbidade administrativa ajuizada em desfavor do recorrente porque o MPF não demonstrou a má-fé nem a ocorrência de dolo com o objetivo de causar prejuízo ao erário ou mesmo beneficiar terceiros.

44. Por fim, afirma que sempre agiu de acordo com os ditames da Administração Pública, além de não ter obtido nenhuma vantagem pecuniária ou favoritismo. Ademais, observa que não há provas no sentido de sua evolução patrimonial ser decorrente de atividade ilícita.

Análise45. Ao Tribunal de Contas da União não se aplicam as regras de competência insertas no

Código de Processo Civil, pois sua Lei Orgânica contempla suas próprias normas processuais, sendo prevista somente a aplicação subsidiária do CPC.

46. Cumpre lembrar que o TCU é órgão único, com competência e jurisdição nacional, tendo sede no Distrito Federal. No entanto, a critério do Tribunal, podem haver unidades de sua Secretaria nos estados, conforme art. 85 da Lei nº 8.443/1992:

‘Art. 85. À Secretaria incumbe a prestação de apoio técnico e a execução dos serviços administrativos do Tribunal de Contas da União.

§ 1º A organização, atribuições e normas de funcionamento da Secretaria são as estabelecidas no Regimento Interno.

§ 2º O Tribunal poderá manter unidades integrantes de sua Secretaria nos estados federados.’47. Nesse contexto, cabe ao Tribunal decidir qual unidade técnica instruirá o processo, sendo

eleita aquela que apresentar melhor condições de fazê-lo, pois não há foro preestabelecido. 48. Quanto à alegação de que a escolha do Tribunal trouxe dificuldades ao recorrente, não

pode prosperar, pois poderia obter vista e cópias dos autos na Secex-MT ou Secex-MG, conforme informado no ofício citatório (fls. 317/318, v.1). Assim, independentemente da unidade que conduziu o processo, o recorrente poderia ter exercido seus direitos em seu domicílio. Portanto, não houve ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

49. Também não procede a alegação de que não havia como perceber a intenção da quadrilha em fraudar o erário, pois, ao ter acesso aos processos de desapropriação, era possível detectar todas as irregularidades que deles constavam. Ademais, cabe ao ordenador de despesas verificar a legalidade dos pagamentos a serem efetuados. Assim, mesmo que os recursos tivessem sido repassados ao 11º DRF com destinação marcada, competia ao ora recorrente aferir a conformidade dos pagamentos ordenados.

50. Em relação à boa-fé e responsabilidade solidária, os argumentos apresentados pelo recorrente são semelhantes aos oferecidos pelo Sr. Gilton Andrade Santos. Portanto, deve ser dispensado o mesmo exame supra.

51. Quanto à ação de improbidade administrativa não recebida pelo TRF, vale destacar que o motivo foi o fato de o MPF não conseguir demonstrar a ocorrência de dolo, essencial para a tipificação da conduta criminosa, diferentemente da obrigação administrativa de ressarcir o Estado, para a qual basta a ação culposa, conforme já analisado nesta instrução.

52. Além disso, ante a independência das instâncias, para que a decisão judicial reflita no âmbito administrativo é necessário que haja negativa de autoria ou a declaração da não existência do fato, o que não ocorreu no caso em tela.

53. No entanto, ainda que não acatadas as alegações recursais do recorrente, deve ser afastado o débito que lhe foi imputado, visto que o pagamento da indenização era devido, como já demonstrado.

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54. Todavia, deve ser mantida a multa imposta ao recorrente, visto que o ex-Chefe do 11º DRF e ordenador de despesas aprovou o pagamento administrativo do valor da indenização, além de assinar a escritura de desapropriação, sem que houvesse poderes para tanto, estando, assim, caracterizados atos de gestão ilegais e ilegítimos, merecendo, portanto, a mesma análise conferida ao recurso do Sr. Gilton Andrade Santos. Assim sendo, deve ser alterado o fundamento da multa.

Do recurso de reconsideração interposto por Mazam – Madeireira Zamban Ltda.Argumento55. A recorrente levanta a nulidade do acórdão recorrido porque, até a instauração do

TC-002.023/2003-9, já havia transcorrido mais de 5 anos desde o pagamento efetuado à madeireira. Logo, teria ocorrido o fenômeno da prescrição em desfavor a União, que tem o prazo quinquenal para buscar suas pretensões junto aos administrados.

56. A empresa Mazam afirma que, somente na década de 80, houve a construção da rodovia BR-174 e que por volta do ano de 1984 atingiu a propriedade da recorrente. Ademais, argumenta que a Portaria nº 73/1981 declarou a utilidade pública da área desapropriada, e não a Portaria nº 36/1976. Assim, quando do início do processo, não estava prescrito o direito à indenização, bem como a União não havia adquirido a área por usucapião, que exige um prazo de 20 anos.

57. No recurso, é alegado que a recorrente não pode ser considerada solidária pelo débito apurado, visto que, no direito brasileiro, a solidariedade não se presume, mas decorre da lei. Ademais, a recorrente assevera que tomou conhecimento do processo por meio do DNER, motivo pelo qual não buscou a via judicial, tendo em vista que, a partir da comunicação da autarquia ficou aguardando receber a indenização administrativamente, o que não configura má-fé.

58. Além disso, a empresa afirma que não agiu dolosamente, pois a indenização era devida e justa, na medida em que houve esbulho das suas terras e, caso não houvesse ocorrido o pagamento, estaria caracterizado o enriquecimento ilícito do Estado. Ainda quanto a este ponto, a recorrente observa que o caso em tela trata-se de desapropriação indireta. Portanto, perfaz regras próprias, quando o pagamento ocorre após a posse da terra, contrariando o mandamento constitucional da indenização justa e prévia.

59. A recorrente observa que, caso reste a tese de que o os atos de desapropriação foram viciados, estes podem ser convalidados, ou seja, repetidos sem vício, o que seria possível no caso em análise, tendo em vista que a indenização era devida, conforme a empresa acredita ter demonstrado.

Análise60. No que se refere à possibilidade de o TCU responsabilizar solidariamente o particular, a

alegação já foi analisada nesta instrução.61. Quanto à prescrição, a posição que vem sendo adotada por este Tribunal está resumida em

trecho da proposta de decisão apresentada pelo Relator, Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti, no processo TC-011.982/2002-0 (Acórdão nº 1.727/2003-TCU-1ª Câmara):

‘15. No âmbito deste Tribunal, em síntese, entendo deva-se aplicar o prazo prescricional de 10 (dez) anos, previsto no art. 205 do novo Código Civil, quando não houver, em 11/1/2003, o transcurso de mais da metade do prazo de 20 (vinte) anos estabelecido na lei revogada. Sendo caso de aplicação do prazo previsto no novo Código Civil, sua contagem dar-se-á por inteiro, a partir de 11/1/2003, data em que a referida norma entrou em vigor. Ao contrário, quando, em 11/1/2003, houver transcorrido mais da metade do prazo de 20 anos, a prescrição continua a correr nos moldes do Código Civil anterior.’

62. O pagamento em questão ocorreu em 12/12/1996. Portanto, em 11/1/2003, não havia transcorrido mais da metade do prazo de 20 anos. Logo, o TCU teria, a partir de 11/1/2003, 10 anos para iniciar o processo de Tomada de Contas Especial. Além do mais, o Decreto nº 20.910/1932, prevê prescrição de 5 anos para dívidas passivas da União ou ações contra a Fazenda Federal. Portanto, não se aplica ao caso em vértice.

63. No que tange à alegação de que a estrada foi construída na década de 80, o recorrente não traz provas robustas, suficientes para alterar o entendimento do TCU, que está baseado em

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informações de revistas do DNER, o então órgão oficial do governo para se manifestar acerca de rodovias. As provas oferecidas são documentos particulares confeccionadas a pedido do recorrente, o que as fragiliza.

64. No que diz respeito à solicitação de perícia com o fito de corroborar as provas, não pode ser realizada, ante a falta de previsão legal. A Lei nº 8.443/1992, que rege os processos no âmbito do TCU, não prevê a produção de prova pericial e testemunhal no curso dos processos da competência deste Tribunal. Em face disso, o seu Regimento Interno vedou essa possibilidade, ao admitir apenas provas escritas (art. 162). Assim, há a preservação da viabilidade do controle externo das despesas públicas, o que efetivamente não se coaduna com esse controle, cujo caráter é eminentemente administrativo. Sujeitar-se às mesmas formalidades do processo judicial poderia gerar delongas que privariam a atuação do Tribunal de qualquer eficácia.

65. Em relação a qual portaria declarou a utilidade pública do imóvel, é importante mencionar que o trecho indicado na Portaria nº 36/1976 compreende o intervalo designado na Portaria nº 73/1981 (fl. 58, v.p.). Logo, deve ser considerada a primeira, sendo inclusive esta a constar da escritura de desapropriação (fls. 126/130, v.p.).

66. Contudo, cumpre destacar que a data do esbulho, se em 1972 ou em 1984, torna-se irrelevante no presente caso, pois, nesta instrução, se defende que não havia corrido o prazo prescricional para o pagamento da indenização.

67. Assim, o pagamento realizado a Mazam – Madeireira Zamban Ltda., em dezembro de 1996, era devido, atendendo ao mandamento constitucional que prescreve a justa indenização em casos de desapropriação por utilidade pública (art. 5º, inc. XXIV), pois não havia ocorrido a prescrição aquisitiva em favor da União da área ocupada no imóvel do recorrente. De todo modo, mesmo que tivesse incidido a prescrição, isso não seria motivo suficiente para tornar indevido o pagamento, pois ‘não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita’ (Código Civil de 1916, art. 970).

68. É certo que, conforme o acórdão recorrido, em se tratando de desapropriação indireta, a indenização deveria ter sido buscada via judicial, mas o fato de o devedor, no caso a União, ter efetuado o pagamento devido, espontaneamente, por processo administrativo, não o faz irregular em relação ao credor. Esse pagamento, embora, em princípio, inválido, pode ser convalidado, pois não apresenta vício em sua substância, mas somente em elemento acessório, qual seja, a forma. É o que se denomina, na doutrina, ‘ato anulável’, ou seja, que poderia ser repetido validamente, caso expurgados os defeitos que o viciaram, por não serem essenciais.

69. Vale frisar que o processo de desapropriação consensual conduzido pelo DNER apresentou várias irregularidades que justificam a punição dos gestores responsáveis. Porém, segundo o que consta dos autos, as irregularidades observadas não contaram com a participação da recorrente, tendo resultado no pagamento de indenização correta e devida. Desta forma, a responsabilidade solidária da recorrente deve ser afastada, pois na medida em que não participou dos atos ilegais, com o fito de se beneficiar, não há fundamento para sua condenação.

70. Seguindo o mesmo entendimento, deve ser retirada a multa imposta à recorrente.PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO71. Pelo exposto, submetemos os autos à consideração superior propondo:a) não conhecer do recurso de reconsideração interposto por Zenor Zamban contra o Acórdão

nº 2.665/2007-TCU-1ª Câmara;b) conhecer do recurso de reconsideração interposto por e MAZAM – Madeireira Zamban

Ltda. contra o Acórdão nº 2.665/2007-TCU-1ª Câmara, com fulcro nos arts. 32, I, e 33 da Lei nº 8.443/1992; no mérito dar-lhe provimento;

c) conhecer dos recursos de reconsideração interpostos por Francisco Campos de Oliveira e Gilton Andrade Santos contra o Acórdão nº 2.665/2007-TCU-1ª Câmara, com fulcro nos arts. 32, I, e 33 da Lei nº 8.443/1992; no mérito, dar-lhes provimento parcial;

d) alterar os itens abaixo do acórdão recorrido de forma que passem a ter a seguinte redação:

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‘9.2. julgar irregulares as contas dos responsáveis Francisco Campos de Oliveira e Gilton Andrade Santos;

9.3. cominar aos responsáveis Francisco Campos de Oliveira e Gilton Andrade Santos, com fulcro no art. 58, incisos I, II e III, da Lei nº 8.443/1992, multa individual de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fixando-lhes o prazo de 15 (quinze) dias da notificação para que comprovem junto ao TCU o recolhimento do respectivo valor aos cofres do Tesouro Nacional, o qual deverá ser atualizado monetariamente, se pago após o vencimento;’

e) dar conhecimento aos recorrentes e à Procuradoria da República no Estado do Mato Grosso da decisão que vier a ser proferida.”

3. O Ministério Público concordou com a proposta da unidade técnica nos seguintes termos (fls. 60/63, anexo 3):

“Esta TCE diz respeito ao pagamento da indenização relativa à desapropriação de parte da área do imóvel denominado ‘Fazenda Oeste’, de propriedade da empresa Mazam – Madeireira Zamban Ltda., no valor de R$ 190.051,64.

Os responsáveis arrolados nos autos são o Sr. Gilton Andrade Santos, ex-Procurador do DNER, o Sr. Francisco Campos de Oliveira, ex-Chefe do 11º Distrito Rodoviário Federal do DNER em Mato Grosso, e a empresa Mazam, beneficiária do pagamento. Cabe observar que o processo de ‘desapropriação consensual’ foi iniciado pelo Sr. Gilton Santos (fl. 4, anexo 1), tendo ele mesmo assinado a escritura de desapropriação, juntamente com o Sr. Francisco de Oliveira (fls. 84/87, anexo 1), sendo que este também autorizou o pagamento em questão (fl. 124, v.p.).

O Tribunal, por meio do Acórdão nº 2.665/2007-1ª Câmara, julgou irregulares estas contas especiais e condenou solidariamente os responsáveis pelo débito, no mesmo montante do pagamento efetuado a título de desapropriação consensual, além de aplicar-lhes multas.

Inconformados, os responsáveis supra e o Sr. Zenor Zamban, proprietário da empresa Mazam, interpuseram os recursos de reconsideração ora em análise. Na preliminar de admissibilidade, a Secretaria de Recursos – Serur manifestou-se pelo não-conhecimento do recurso interposto pelo Sr. Zenor Zamban, por ausência de legitimidade e de interesse recursal, e pelo conhecimento dos demais (fl. 42, anexo 3). Quanto ao mérito, a proposta foi pelo provimento do recurso interposto pela empresa Mazam e pelo provimento parcial dos recursos interpostos por Francisco Campos de Oliveira e Gilton Andrade Santos.

Os principais argumentos da unidade técnica para afastar o débito são (itens 30, 36, 65/66 da instrução às fls. 50/51 e 57):

‘(...) No caso sob análise, em que a prescrição regia-se pelos dispositivos do Código Civil de 1916, havia, por conseguinte, a possibilidade de interrupção da prescrição por mais de uma vez, na hipótese de qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor (art. 172, inc. V), entre outras. Desta forma, a prescrição foi interrompida pela primeira vez em 1976, por força da portaria declaratória de utilidade pública (fl. 132, v.p.) e novamente em 1984, com o início do processo de desapropriação.

(...) em 1996, quando foi realizado o pagamento, considerando que somente no ano de 1972 a rodovia estava totalmente construída e que a prescrição foi interrompida em 1976, com a publicação da portaria de desapropriação, e novamente em 1984, com o início do processo de desapropriação consensual, não havia ocorrido a aquisição da propriedade pela União por meio de usucapião, nem a prescrição para que o proprietário das terras expropriadas ajuizasse ação de perdas e danos. Portanto, o pagamento era devido, pois não há dúvida de que a União se apropriou de terra alheia. Por conseguinte, não há falar em dano ao erário.

(...) o pagamento realizado à Mazam – Madeireira Zamban Ltda., em dezembro de 1996, era devido, atendendo ao mandamento constitucional que prescreve a justa indenização em casos de desapropriação por utilidade pública (art. 5º, inc. XXIV), pois não havia ocorrido a prescrição aquisitiva em favor da União da área ocupada no imóvel do recorrente. De todo modo, mesmo que

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tivesse incidido a prescrição, isso não seria motivo suficiente para tornar indevido o pagamento, pois não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita (Código Civil de 1916, art. 970).

É certo que, conforme o acórdão recorrido, em se tratando de desapropriação indireta, a indenização deveria ter sido buscada na via judicial, mas o fato de o devedor, no caso a União, ter efetuado o pagamento devido, espontaneamente, por processo administrativo, não o faz irregular em relação ao credor. Este pagamento, embora a princípio inválido, pode ser convalidado, pois não apresenta vício em sua substância, mas somente em elemento acessório, qual seja, a forma. É o que se denomina, na doutrina, ato anulável, ou seja, que poderia ser repetido validamente, caso expurgados os defeitos que o viciaram, por não serem essenciais.’

A manifestação da Serur para a manutenção da multa aplicada aos Srs. Gilton Andrade Santos e Francisco Campos de Oliveira funda-se nas diversas irregularidades verificadas nos autos, as quais os recorrentes não conseguiram afastar, principalmente no fato de o pagamento ter sido efetuado administrativamente, sem que houvesse amparo legal ou regulamentar para que os ex-servidores do DNER pudessem apurar e/ou liquidar as perdas e danos decorrentes do esbulho ocorrido nas terras da empresa Mazam.

Estando os autos nesta Procuradoria, a empresa Mazam apresentou memorial (anexo à contracapa), contendo, de forma resumida, os mesmos argumentos oferecidos em sede de recurso.

Este representante do Ministério Público, em face dos novos elementos constantes dos autos e revendo seu entendimento anterior, constante de sua primeira intervenção (fls. 498 e segs.), anui à proposta da unidade técnica.

IIO principal ponto a ser analisado neste processo, para decidir sobre a existência de débito, é

se o pagamento efetuado à empresa Mazam, a título de desapropriação consensual, era devido. É incontroverso nos autos que a União se apropriou de terras particulares para utilizá-las em

prol do interesse público, qual seja, a implantação de rodovia federal, sem que fosse seguido o rito legal de desapropriação. Tal situação caracteriza-se como desapropriação indireta, hipótese em que permanece a obrigação constitucional da justa indenização, mesmo que não seja prévia, pela propriedade afetada.

O Supremo Tribunal Federal exarou entendimento nesse sentido por ocasião do julgamento do RE/109853:

‘Enquanto o expropriado não perde o direito de propriedade por efeito do usucapião do expropriante, vale o princípio constitucional sobre o direito de propriedade e o direito a indenização, cabendo a ação de desapropriação indireta.’

É importante destacar que, conforme jurisprudência supra, na hipótese de desapropriação indireta, a via adequada para se buscar a referida indenização é a judicial, nos termos do art. 35 do Decreto-Lei nº 3.365/1941:

‘Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.’

No entanto, na situação ora examinada, a interessada deixou de promover a ação judicial, porque havia o processo administrativo em aberto visando ao legítimo pagamento. Cabe analisar se a inércia da madeireira levou à prescrição.

Inicialmente importa destacar que o prazo para ação de desapropriação indireta era de 20 anos, prazo este sumulado pelo STJ (Súmula 119).

No Código Civil de 1916, havia previsão de que a prescrição seria interrompida por qualquer ato inequívoco, mesmo quando extrajudicial, que importasse em reconhecimento do direito pelo devedor. Demais disso, não havia limitação quanto ao número de vezes que poderia ocorrer tal interrupção (art. 172). A previsão de que a interrupção da prescrição dar-se-ia uma única vez veio com a edição do Código Civil de 2002 (art. 202).

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O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que ato que declarava a utilidade pública do bem, ainda que posterior à posse, interrompia a prescrição, com fundamento no art. 172, inciso V, do Código Civil anterior, porque tal ato revelava ato inequívoco de reconhecimento, por parte da Administração Pública, do direito do expropriado (REsp. 664395/SP/2004, REsp. 767490/GO/2005, REsp. 518768/SC/2003, entre outros). Sendo assim, é forçoso reconhecer que as edições das Portarias 036/DES, de 20.4.1976 e 073/DES, de 13.7.1981, interromperam o prazo prescricional para que a interessada exigisse a indenização.

Segundo relatório de auditoria da Secretaria Federal de Controle Interno, em 1956, a rodovia BR-174 não estava implantada no trecho Pontes e Lacerda-Barracão Queimado (fls. 58/9, v.p.), no qual situa-se a área apossada; tem-se, assim, que, até a edição da Portaria 036/DES/1976, não havia ocorrido a prescrição. A partir deste fato voltou a correr o prazo prescricional, que foi novamente interrompido com a edição da Portaria 073/DES/1981. O fato de o DNER, em 1984, ter iniciado o processo de indenização também pode ser entendido como ato inequívoco de reconhecimento do direito, o que também teria interrompido a prescrição. Sendo assim, a interessada teria até o ano de 2004 para buscar, por meio de ação judicial, a justa indenização.

Além disso, cumpre lembrar que na vigência do Código Civil de 1916 a prescrição aquisitiva, por meio de usucapião, ocorria em 20 anos (art. 551), sendo que o prazo era interrompido pelas mesmas causas que interrompiam a prescrição (art. 553). Neste contexto, é oportuno destacar que, pelo que consta nos autos, não é possível assegurar em que data a União se apossou das terras particulares. Assim, ao considerar a pior hipótese para a interessada, a de que já em 1972 a BR-174 estaria totalmente implantada, e, atentando também para as interrupções que ocorreram, é seguro afirmar que, na data do pagamento da indenização, em 1996, a União ainda não tinha adquirido as terras por usucapião.

Pelo exposto, tem-se que, na oportunidade do pagamento administrativo, não havia ocorrido o fenômeno da prescrição.

Demais disso, ainda que tivesse ocorrido a prescrição, extintiva ou aquisitiva, não seria hipótese de devolução do montante pago à proprietária das terras apossadas pela União, tendo em vista que a prescrição, em que pese ser um benefício do devedor, não fulmina o direito subjetivo do credor, pois ainda persiste obrigação moral. Assim, uma vez paga a dívida prescrita não há que se buscar sua devolução, era o que dizia o art. 970 do Código Civil anterior, agora no art. 882 do atual: ‘não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível’.

Quanto ao fato de o pagamento ter ocorrido administrativamente, quando deveria ter-se dado pela via judicial, o Parquet concorda com a Serur, no sentido de que o ato viciado possa ser convalidado, visto que a indenização era justa e devida. Ademais, com a ocorrência do pagamento administrativo, a interessada ficou impossibilitada de buscar a via judicial para exigir a indenização, pois não tinha direito de recebê-la em duplicidade.

Assim, o Ministério Público concorda com a unidade técnica, no sentido de que deva ser afastado o débito imputado aos responsáveis, bem como a multa imposta à empresa Mazam – Madeireira Zamban Ltda.

Em relação às multas aplicadas aos demais responsáveis, o Ministério Público manifesta-se por sua manutenção, em concordância com a proposta da Serur, ressaltando que, em face do afastamento do débito, a multa aplicada deverá ter seu fundamento legal alterado para o artigo 58, II, da LOTCU.

No que se refere ao recurso interposto pelo Sr. Zenor Zamban, o Parquet especializado anui à proposta da Secretaria de Recursos pelo não conhecimento.”

É o relatório.

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VOTO

De início, registro que os recursos de reconsideração em exame referem-se a uma das tomadas de contas especiais que tiveram origem na Decisão nº 850/2000-Plenário, proferida no TC-425.021/1998-2. Naquela deliberação, este Tribunal determinou à Secretaria Federal de Controle Interno que efetuasse a revisão de indenizações pagas de 1995 a 2000, decorrentes de desapropriações no 11º Distrito Rodoviário Federal de Mato Grosso (DRF/MT), solicitando ao extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) a abertura de tomadas de contas especiais para quantificação dos danos e identificação dos responsáveis.

2. Assinalo também que, dos quatro recursos, três (interpostos por Francisco Campos de Oliveira, Gilton Andrade Santos e pela sociedade empresária Mazam – Madeireira Zambam Ltda) devem ser conhecidos, por preencherem os requisitos de admissibilidade estabelecidos nos arts. 32, parágrafo único, e 33 da Lei nº 8.443/1992. Com relação ao documento apresentado por Zenor Zambam, acolho o exame da Secretaria de Recursos (Serur), no sentido de não admiti-lo, por ausência de legitimidade e de interesse recursal, uma vez que o autor do referido documento não sofreu sucumbência própria decorrente do acórdão questionado.

3. Quanto ao mérito, a unidade técnica, cuja manifestação foi ratificada pelo Ministério Público, propõe que o débito não seja imputado aos responsáveis e que não deve haver aplicação de multa à Mazam – Madeireira Zambam Ltda.

4. A conclusão pela irregularidade das contas dos responsáveis ocorreu em virtude do pagamento ilegítimo de indenização prescrita a ex-proprietária de faixa de terreno onde foi construída parte da BR-070/MT, há aproximadamente quarenta anos.

5. Cabe ressaltar que a forma de desapropriação utilizada pelo extinto DNER para a construção da rodovia não seguiu a legislação vigente à época. Em síntese, o Decreto-lei nº 3.365/1941 estabelecia a necessidade da declaração de utilidade pública, por meio de decreto do Presidente da República, para que houvesse desapropriação por parte da União. Posteriormente, a indenização deveria ser efetivada mediante acordo ou judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducaria. Em afronta às normas aplicáveis, a autarquia, por diversas vezes, iniciava a construção de trecho da obra sem a prévia indenização tampouco a declaração de utilidade pública.

6. Em relação à imputação do débito e à aplicação de multa aos responsáveis, julgados recentes revelaram posicionamentos divergentes no âmbito deste Tribunal. Para dirimir as discordâncias, foi apreciado, neste ano, no curso do TC-018.652/2003-4, incidente de uniformização de jurisprudência suscitado pelo então Procurador-Geral em exercício do Ministério Público junto ao TCU, Paulo Soares Bugarin. Reproduzo, no que interessa para o deslinde deste processo, o Acórdão nº 1.180/2010-Plenário:

“9.2 firmar o seguinte entendimento quanto às tomadas de contas especiais instauradas por força da Decisão nº 850/2000-TCU-Plenário:

9.2.1 ex-proprietários de terras esbulhadas pela União, em processo de desapropriação indireta, podem ser indenizados por iniciativa da Administração, de ofício ou por provocação de terceiros, desde que respeitados os comandos constitucionais, os princípios jurídicos cabíveis e as regras aplicáveis;

9.2.2 caso o direito ao recebimento de indenização se realize por meio de processos administrativos de desapropriação indireta, e o valor da indenização devida seja consenso entre o ex-proprietário e a administração, não lhe são aplicáveis as regras da Lei nº 9.469/1997, que alterou a Lei nº 8.197/1991, pois não há litígio e não há a necessidade de renúncia de quaisquer direitos por parte da Administração para que se efetive a indenização;

9.2.3 o ex-proprietário responderá pelo débito, solidariamente com os ex-gestores, se restar comprovado que houve má-fé no procedimento de avaliação do valor do imóvel, ou em falsidade do título de propriedade ou de qualquer outro comprovante que suportou o pagamento da indenização;

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9.2.4 a ocorrência da prescrição vintenária, a teor da Súmula 119 do STJ, tem presunção juris tantum, admitindo-se prova em contrário por meio de documentação idônea, hipótese em que o ônus recairá sobre os interessados arrolados nos autos de tomada de contas especial;

9.2.5 nos casos em que tenha ocorrido a prescrição vintenária, tendo o proprietário esbulhado recebido a indenização de boa-fé, não cabe a repetição do indébito, em face do que prescreve o art. 882 do Código Civil, devendo responder pelos prejuízos apenas os agentes públicos que deram causa ao pagamento das dívidas prescritas;

9.2.6 a emissão de decreto ou de portaria declaratória de utilidade pública interrompe a contagem do prazo prescricional;”

7. Tendo sido esse entendimento firmado após diversos debates sobre a questão neste Tribunal, acredito não serem cabíveis nem necessárias novas observações de minha parte. Para situações como a verificada neste processo, firmou-se o entendimento que, em regra, somente os gestores são responsabilizados pela irregularidade. Excepcionalmente, se comprovada a má-fé do ex-proprietário, este responderá solidariamente pelo prejuízo causado.

8. Dessa forma, seguindo a decisão recente desta Corte, deve-se negar provimento aos recursos de autoria de Francisco Campos de Oliveira e Gilton Andrade Santos, mantendo a imputação do débito e a aplicação da multa.

9. Por outro lado, deve-se dar provimento ao recurso interposto pela Mazam – Madeireira Zambam Ltda., para excluí-la da relação processual, isentando-a do pagamento dos valores recebidos e da multa, uma vez que não há elementos nos autos que indiquem a conduta lesiva dolosa da ex-proprietária do terreno invadido, seja na avaliação do valor do imóvel, seja na comprovação da titularidade.

Diante do exposto, voto por que o Tribunal adote o acórdão que ora submeto à 1ª Câmara.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 13 de julho de 2010.

JOSÉ MÚCIO MONTEIRO Relator

ACÓRDÃO Nº 4209/2010 – TCU – 1ª Câmara

1. Processo nº TC-002.023/2003-9 (com 3 volumes e 5 anexos)2. Grupo II, Classe de Assunto I – Recurso de Reconsideração em tomada de contas especial 3. Unidade: 11º Distrito Rodoviário Federal do extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER)4. Recorrentes: Francisco Campos de Oliveira (CPF 011.296.276-91), Gilton Andrade Santos (CPF 074.168.816-68), Mazan – Madeireira Zamban Ltda. (CNPJ 03.787.595/0001-65) e Zenor Zamban (CPF 057.986.630-00).5. Relator: Ministro José Múcio Monteiro5.1. Relator da deliberação recorrida: Ministro Valmir Campelo

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6. Representante do Ministério Público: Procurador Júlio Marcelo de Oliveira7. Unidades Técnicas: Secex/SC e Serur8. Advogados constituídos nos autos: Maria Abadia Pereira de Souza Aguiar (OAB/MT 2.906), Carlos Roberto de Aguiar (OAB/MT 5.668), Ivan Corrêa Leite (OAB/MS 7.480), Clélio Chiesa (OAB/MS 5.660) e Claine Chiesa (OAB/MS 6.795)

9. Acórdão:VISTOS, relatados e discutidos estes autos que tratam, nesta fase processual, de recursos de

reconsideração interpostos por Francisco Campos de Oliveira, Gilton Andrade Santos, Zenor Zambam e pela sociedade empresária Mazam – Madeireira Zambam Ltda., contra o Acórdão nº 2.665/2007-1ª Câmara, mediante o qual este Tribunal decidiu, em processo de tomada de contas especial, julgar irregulares as contas e condenar os recorrentes ao pagamento do débito, além de aplicar-lhes, individualmente, multa prevista no art. 57 da Lei n° 8.443/1992.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 1ª Câmara, ante as razões expostas pelo Relator, com base nos arts. 32, parágrafo único, 33 e 48 da Lei nº 8.443/1992, em:

9.1 não conhecer do recurso de reconsideração de autoria de Zenor Zambam;9.2 conhecer do recurso de reconsideração interposto pela Mazam – Madeireira Zambam Ltda.

para, no mérito, dar-lhe provimento;9.3 conhecer dos recursos de reconsideração interpostos por Francisco Campos de Oliveira e

Gilton Andrade Santos para, no mérito negar-lhes provimento;9.4 alterar os subitens 9.1, 9.2 e 9.3 do Acórdão nº 2.665/2007-1ª Câmara, que passam a

apresentar a seguinte redação:“9.1 rejeitar as alegações de defesa apresentadas por Gilton Andrade Santos e Francisco

Campos de Oliveira;9.2 com fulcro nos arts. 1º, inciso I; 16, inciso III, alíneas ‘b’ e ‘d’ e § 2º; e 19, caput, todos da

Lei nº 8.443/1992, julgar as presentes contas irregulares e condenar os responsáveis Gilton Andrade Santos e Francisco Campos de Oliveira, solidariamente, ao pagamento do débito de R$ 190.051,64 (cento e noventa mil, cinquenta e um reais e sessenta e quatro centavos), atualizado monetariamente e acrescido dos juros de mora, calculados a partir de 12/12/1996 até a efetiva quitação, na forma da legislação em vigor, fixando-lhes o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprovem perante este Tribunal o recolhimento da quantia aos cofres do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT, nos termos do art. 23, inciso III, alínea ‘a’, da Lei nº 8.443/1992 e do art. 216 do Regimento Interno do TCU;

9.3 aplicar, individualmente, aos responsáveis Gilton Andrade Santos e Francisco Campos de Oliveira, a multa prevista no art. 57 da Lei n° 8.443/1992, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), fixando-lhes o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprovem perante este Tribunal, nos termos do art. 23, inciso III, alínea ‘a’, da Lei nº 8.443/1992 e do art. 216 do Regimento Interno do TCU, o recolhimento das quantias aos cofres do Tesouro Nacional, atualizadas monetariamente a partir do dia seguinte ao do término do prazo estabelecido até a data do efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor;”

9.5 excluir da relação processual a sociedade empresária Mazan – Madeireira Zamban Ltda.;9.6 dar ciência desta deliberação aos recorrentes.

10. Ata n° 24/2010 – 1ª Câmara.11. Data da Sessão: 13/7/2010 – Ordinária.12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-4209-24/10-1.13. Especificação do quorum:13.1. Ministros presentes: Valmir Campelo (Presidente), Walton Alencar Rodrigues e José Múcio Monteiro (Relator).

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13.2. Auditor convocado: Augusto Sherman Cavalcanti.13.3. Auditor presente: Marcos Bemquerer Costa.

(Assinado Eletronicamente)VALMIR CAMPELO

(Assinado Eletronicamente)JOSÉ MÚCIO MONTEIRO

Presidente Relator

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)SERGIO RICARDO COSTA CARIBÉ

Procurador

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