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ESCOLA PÚBLICA DE LÍNGUAS E ESTADO: CONFLITOS ENTRE ESFERAS QUE NÃO FALAM A MESMA LÍNGUA

Gleiton Malta Magalhães*

RESUMO: Esta pesquisa, classificada como um estudo de caso, voltou seu olhar para uma escola pública de idiomas situada na capital do país. Seu objetivo foi desvelar os possíveis percalços encontrados pela gestão escolar deste tipo específico de instituição no processo de planejamento junto à gestão educacional, ou seja, a Secretaria de educação do Distrito Federal. Concluiu-se que, apesar da qualidade de ensino mantida na Instituição, esta sofre com as incongruências e ruídos advindos da gestão educacional que, quase sempre, ignora as teorias e as práticas referentes ao ensino e à aprendizagem/aquisição de línguas.

ABSTRACT: This research is classified as a case study, he returned his gaze to a public school of languages located in the capital. His goal was to reveal the possible pitfalls encountered by school management of this specific type of institution in the planning process with the educational administration, or the Secretary of Education in the District. It was concluded that, despite the quality of education maintained in the institution, it suffers from the inconsistency and noise coming from the educational administration which almost always ignores the theories and practices related to teaching and learning / foreign language acquisition.

PALAVRAS-CHAVE: Ensino de línguas, Gestão escolar e educacional, políticas públicas.

KEYWORDS: language teaching, school management, public policy.

INTRODUÇÃO: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENSINO DE LÍNGUAS

O grande reto para muitos países, dentre eles o Brasil, é a busca por um sistema educativo que leve à “diminuição das discriminações” (CURY, 2008, p. 7). Nesse sentido, o acesso ao ensino, à aprendizagem e à aquisição de uma língua estrangeira (LE) deveria ser um direito de todos.

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Levando em consideração que “a discussão sobre políticas e gestão da educação tem sido objeto de vários estudos e pesquisas no cenário nacional e internacional” (DOURADO, 2007, p. 922), é relevante um estudo sistemático sobre os percalços encontrados durante o processo de gestão escolar de uma instituição de ensino (IE) pública voltada para o ensino de línguas.

É este estudo que apresentaremos neste artigo. Ele abrange desde os problemas enfrentados pelos gestores desse tipo específico de IE até os conflitos existentes entre as gestões educacional e escolar. Abrange, ainda, como a ausência de uma política pública ou mesmo sua manutenção interfere na forma com a qual a sociedade vê e interpreta a aprendizagem de uma LE no Brasil.

Esta pesquisa, de cunho qualitativo, teve como base um Centro Interescolar de Línguas (CIL) do Distrito Federal (DF). Devido à especificidade da IE a ser analisada, o contexto de pesquisa será visto a partir de duas óticas, a saber: i)No contexto específico de um CIL do DF com especificidades de funcionamento de uma escola com taxonomia diferenciada das demais; e ii) No contexto do organograma da Secretaria da Educação do DF (SEDF) e de suas orientações.

Esta separação conceitual do contexto de pesquisa busca oferecer um melhor entendimento sobre a prática diária do CIL (contexto 1), que é, por um lado, uma escola diferenciada da maioria das IEs da rede pública do DF e, por outro, como esta IE é tratada pelos órgãos que elaboram as políticas públicas (ou deixam de elaborar) para este centro.

O Objetivo central da pesquisa foi identificar possíveis conflitos entre as gestões escolar e educacional além da(s) influencia(s) que estes possíveis conflitos exercem sobre o ensino de línguas neste tipo de IE pública. Como objetivos específicos, demonstraremos como as ações dentro da IE são afetadas pelo planejamento macro, ou seja, da gestão educacional (SEDF). Realizaremos, ainda, uma breve panorâmica sobre a história da educação e do ensino de línguas no Brasil e as conseqüências atuais desta história.

I – METODOLOGIA: MAIS PERGUNTAS QUE REPOSTAS

Como a proposta desta pesquisa está ligada ao estudo de uma escola de tipologia diferente, ou seja, com atendimento específico e diferenciado das demais escolas da rede regular de ensino, classificamos este estudo como um estudo de caso.

Segundo Yin (2005, p. 32), o estudo de caso é uma investigação empírica que busca investigar um fenômeno dentro de seu contexto real. Podem ser realizados estudos de casos únicos e/ou múltiplos. A escolha desta prática metodológica se deu entre outros

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motivos, porque o CIL faz parte de uma “rede” de escolas que possuem características próprias e únicas dentro do contexto das mais de 640 escolas da rede pública de ensino do DF, formando, assim, uma unidade social. O estilo informal e a linguagem mais acessível que outras linguagens científicas (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p.20), também foi um dos critérios para a opção por esta prática metodológica.

Assim, para alcançarmos nossos objetivos, propomos o uso de três diferentes instrumentos de coleta de dados: o questionário, a observação direta e o estudo documental. Os questionários foram aplicados para os professores, para a equipe gestora do CIL e para o conselho escolar (CE), com vistas a descobrir se há planejamento e qual a relação existente entre os participantes de pesquisa e o planejamento do CIL.

A análise documental teve como objetivo revelar como a SEDF percebe e insere (ou exclui) o CIL em seu planejamento. Neste sentido, foram analisados o Regimento Interno das Instituições de Ensino da Rede Pública do DF (2006) e a Estratégia de Matrícula (2008 e 2009). Paralelamente, analisamos também o Projeto Político-pedagógico (PPP) do CIL, buscando convergências e divergências entre os documentos.

Com os três instrumentos de coleta de dados, esperamos trazer à tona as percepções, os procedimentos e crenças dos envolvidos no processo de planejamento da IE, além dos percalços encontrados em meio a este processo.

Um dos pontos primordiais desta pesquisa está no que se refere à triangulação dos dados coletados. A triangulação visa à confrontação dos dados com o intuito de se buscar a maior fidedignidade possível nas informações coletadas e, consequentemente, nas possíveis respostas às perguntas de pesquisa.

II – O CONTEXTO DA PESQUISA

O contexto escolhido para a realização da pesquisa é um Centro Interescolar de Línguas do DF (CIL). Esta IE foi escolhida devido a sua tipologia diferenciada, ou seja, um centro interescolar público especializado no ensino de línguas estrangeiras.

Os CIL são escolas públicas da SEDF que têm por finalidade precípua o ensino de LE aos alunos da rede pública de ensino do DF em regime de intercomplementaridade. São um total de 8 escolas, atendendo a uma faixa de aproximadamente 10% dos alunos da rede pública. Este estudo se refere aos procedimentos de 1(um) destes 8 Centros de Línguas. Por ser uma escola especializada no ensino de LE, oferece aos seus alunos metodologia e estrutura específicas para o ensino-aprendizagem de LE. Nos últimos anos vem sendo campo de pesquisa para investigadores da área de Linguística Aplicada (LA).

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A escola contava em 2009 com 30 (trinta) professores regentes e aproximadamente 3.000 alunosi. É uma escola inclusiva e atende a vários alunos portadores de diferentes tipos de deficiência, sendo referência no atendimento a deficientes visuais.Os alunos são classificados de acordo com o seu egresso e o CIL os atende de acordo com a seguinte prioridade:

I) alunos oriundos das Instituições Educacionais tributárias;II) alunos da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal;III) ex-tributários;IV) comunidade. (Art. 217. Regimento Escolar das Instituições Educacionais da Rede Pública de Ensino do DF, 2006)

Outro ponto que diferencia a IE das escolas de ensino regular é o fato de ela ampliar o conteúdo proposto pelo currículo básico da SEDF e trabalhá-lo, de forma geral, sob uma abordagem comunicativa (ALMEIDA FILHO, 2005), explorando as quatro destrezas básicas da língua meta (L-meta): falar, ouvir, ler e escrever em contextos comunicativos.

O CIL adota o regime semestral e os alunos estão distribuídos em ciclos, que por sua vez estão divididos em níveis. Cada nível tem a duração de um semestre letivo como o demonstrado no quadro a seguir:

Ciclos Níveis DuraçãoJUVENIL J1, J2 1anoBÁSICO B1, B2, B3, B4, B5 2 anos e meioINTERMEDIÁRIO I1, I2, I3, I4, 2 anosAVANÇADO A1, A2, A3 1 ano e meio

Fonte: Regimento Escolar das Instituições Educacionais da Rede Pública de Ensino do DF, 2006

Vale destacar que desde 2010, foi criado outro ciclo nos CILs chama de Específico (E). Com duração de três anos, o ciclo E visa atender os alunos do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos. Também dividido em semestres, este ciclo vai do E1 ao E6.Cada um dos ciclos tem objetivos e procedimentos específicos que visam uma aprendizagem significativa para o aluno e um desenvolvimento gradativo das quatro destrezas da L-meta, até chegar à uma proficiência de nível avançado, ou seja, de relativo domínio da L-meta. Como participantes da pesquisa foram escolhidos membros da Equipe Gestora (EG), docentes e membros do Conselho Escolar (CE).

III – O CONTEXTO HISTÓRICO: O HOJE É RESULTADO DO ONTEM EM DIREÇÃO AO AMANHÃ.

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Buscando uma análise através da história da educação no Brasil, observamos em diversos momentos, a hegemonia de uma abordagem autoritária e controladora em detrimento da participação nos contextos de formulação de políticas públicas para a educação. Consequentemente, tal abordagem influenciou e influencia o planejamento no âmbito educacional e escolar, no qual, geralmente, o segundo sucumbe ao primeiro.

Analisando nosso contexto histórico, percebe-se que já no século XVI, a instrução era imposta pelos jesuítas que obrigavam os nativos a abdicar de sua cultura, de sua língua e de seu saber para entrar no mundo dos “letrados” portugueses que ora chegavam. Segundo Ribeiro (1993, p. 17), no período de 1534 a 1536, o rei de Portugal cria no Brasil um Governo Geral, devido à dificuldade de se administrar as quatorze Capitanias Hereditárias, era o “primeiro representante do poder público na Colônia”. Entre as diretrizes básicas do regimento estava a que pregava a conversão dos indígenas ao catolicismo por meio da catequese e da instrução (RIBEIRO, 1993, p. 18). Este modelo de sistema educacional primava pela subordinação da colônia e pela aculturação dos indígenas para que Portugal pudesse se estabelecer no Brasil.

Com a chegada e estabelecimento da coroa portuguesa no Rio de Janeiro em 1808 e com a abertura dos portos em fase mais desenvolvida, necessitou-se a criação de um sistema educacional que possibilitasse a formação de pessoal para atividades diversificadas, geralmente ligadas ao comércio, assim nascia o ensino técnico, no qual as línguas começavam a ganhar evidência.

A constituição do império em seu artigo 250 pregava entre outros que “Haverá no império escolas primárias em cada termo, ginásios em cada comarca, e universidades nos mais apropriados locais” (SILVA, 1969 apud RIBEIRO, 1993, p. 45) e, no texto constitucional outorgado, em seu artigo 179, trata a educação da seguinte forma:

“A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império (...) pela instrução primária gratuita a todos os cidadãos e pela criação de Colégios e Universidades onde serão ensinados os elementos das ciências, belas artes e artes.” (ALMEIDA & BARRETO, 1967 apud RIBEIRO, 1993, p. 45)

Com estas colocações, nota-se que o atual modelo de sistema educativo, é fruto de um caminhar longínquo e fragmentado. Desde a época do império, por diversos motivos como: interesses dos jesuítas, em um primeiro momento, interesse da coroa portuguesa e da burguesia em outro, não houve uma continuidade das ações de um ou de outro “sistema” educativo. Esta descontinuidade nas políticas educacionais resultou em uma cultura de se romper para reiniciar ou, simplesmente, mudar taxonomia e conceitos adjacentes em detrimento do amadurecimento de ideias e, consequentemente, de projetos que visam à melhoria do sistema educativo.

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Para Akkari (2001), há quatro períodos importantes na constituição das redes de ensino no Brasil, como dispomos no quadro a seguir:

1934-1962 1962-1964 1964 1980Luta entre católicos e leigos sobre as orientações políticas do sistema educativo. Este movimento culminou com a edição da !ª Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1962

Período marcado por diversas lutas sociais. Contribuição do pedagogo Paulo Freire com a corrente construtivista.

Período sob o comando do regime militar que, entre outros, imprimiu uma abordagem tecnicista, voltada para a racionalidade, eficiência e produtividade.

Início progressivo da democracia culminando na nova LDB de 1996.

Fonte: Elaboração própria a partir de Akkari (2001).

Este quadro vai de encontro ao pensamento de Dourado (2007, p. 922) que coloca o contexto sociocultural como mediador do processo educativo, juntamente “com as condições em que se efetiva o ensino-aprendizagem” (idem). O autor também dispõe sobre a descontinuidade de um processo de efetivação de um sistema educativo:

A constituição e a trajetória histórica das políticas educacionais no Brasil, em especial os processos de organização e gestão da educação básica nacional, têm sido marcadas hegemonicamente pela lógica da descontinuidade, por carência de planejamento de longo prazo que evidenciasse políticas de Estado em detrimento de políticas conjunturais de governo. Tal dinâmica tem favorecido ações sem a devida articulação com os sistemas de ensino, destacando-se, particularmente, gestão e organização, formação inicial e continuada, estrutura curricular, processos de participação. (DOURADO, 2007, pp. 926-927)

Segundo Vieira (2009), é somente após a independência que o país passou a conviver com uma legislação concebida na recém “libertada” colônia. A característica marcante desse período foram as diversas reformas implementadas pelo governo central. Vale salientar que desde a época do império, sofremos com a síndrome do centralismo, é como se a grande massa nunca fosse capaz de debater sobre seus próprios destinos na área educacional, pela falta de uma competência teóricaii (ALMEIDA FILHO, 2005) que fundamente as políticas emanadas no seio do povo.

Em 1946 já se previa na carta magna a elaboração de uma lei de diretrizes e bases da educação (LDB) que só vingou em 1961, sendo revista em 1971 e substituída pela Constituição Federal (CF) de 1988 e, finalmente, pela LDB de 1996 (lei 9.394/96). Todas estas mudanças e reformas, segundo Vieira (2009), são fruto do contexto sócio-econômico vivido pelo mundo e pelo Brasil, que culminou numa abertura fomentada pela atmosfera de democracia instalada após o fim da ditadura militar.

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Apesar dos avanços, esta trajetória de implementação e reforma da educação básica brasileira ainda era administrada pela lógica da “descontinuidade” (DOURADO, 2007, P. 925), ou seja, pela falta de planejamento com vistas a “políticas de Estado em detrimento das políticas conjunturais de governo” (op. cit). Este tipo de abordagem, segundo o autor, resulta em uma gestão centralizada e de pouca eficácia pedagógica, consequentemente, a gestão educacional se torna “excludente e seletiva” (op. cit.). Esta fala é perfeitamente aplicável ao ensino de línguas.

A nova legislação (C.F., 1988 e LDB, 1996) traz avanços e maior organicidade para o sistema educativo brasileiro que se dividiu em educação básica e educação superior (LDB, art. 21), cuja gestão se expressa por meio dos sistemas de ensino federal, estaduais e municipais sob um regime de colaboração (VIEIRA, 2009, p 42). Esta malha organizacional se estabelece a partir da dicotomia gestão educacional e gestão escolar, ou seja, “o espaço das ações dos governos” no caso da primeira; e o espaço de abrangências das IEs no caso da segunda.

Como podemos averiguar nesta breve panorâmica sobre as políticas e a gestão da educação no Brasil, a atual conjuntura é resultado de anos de uma visão centralizadora e excludente. A distância entre os escritos legais, que se encontram no patamar do ideal, e a práxis nos diferentes rincões do país, representa o imenso abismo que há entre o que tem que ser feito e o que se pode fazer. Temos, então, assim representada nossa linha do tempo:

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1822 – Constituição do império. Educação nacional com gradação escolar e melhor distribuição no território.

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1934-1962 - Luta entre católicos e leigos sobre as orientações políticas do sistema educativo. LDB de 1962

Os índios são julgados incapazes para a instrução e passam a ser somente catequizados

1962-1964 - Período marcado por diversas lutas sociais. Contribuição do pedagogo Paulo Freire

1964 - Período sob o comando do regime militar que, entre outros, imprimiu uma abordagem tecnicista, voltada para a racionalidade, eficiência e produtividade.

1980 - Início progressivo da democracia culminando na nova LDB de 1996. Década em que os CIL se expandiram no DF

Gestão democrática. Aplicação da legislação

A coroa portuguesa disponibilizava subsídios para a construção de colégios para a formação de sacerdotes

1808 – Coroa portuguesa no Brasil. Mais atenção para a instrução, porém ainda elitista.

1530 - Companhia de Jesus – Instrução e catequização dos

índios

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Fonte: Elaboração própria

Com este gráfico, propomos uma ilustração do caminho oscilante percorrido pela educação, consequentemente pelas gestões educacional e escolar, até os dias de hoje, representados pela gestão democrática da educação, prevista na LDB de 1996 e que, segundo Vieira (2009, p. 45) representa um desafio no que concerne à operacionalização da(s) política(s) de educação e do cotidiano das IEs. Vale ressaltar que, apesar do conceito de gestão democrática já ser contemplado na cf. de 1988 e reafirmado na lei 9.394/96, um longo caminho tortuoso foi percorrido, está sendo e ainda será rumo a sua efetivação prática.

IV – O CONTEXTO HISTÓRICO DO ENSINO DE LÍNGUAS

Com relação ao ensino de línguas no Brasil, observamos que a partir dos anos 30, período governado pelo então presidente Getúlio Vargas, o sistema educativo brasileiro começou a se estabelecer como tal, ou seja; seriado, laico, com presença obrigatória, entre outros. As línguas adotadas para estudo eram o inglês, o francês e o alemão. Pela primeira vez era instituído, via decreto (Decreto nº 20.833 de 21 de dezembro de 1931), um método de ensino, no caso, o método direto. Foi a reforma Francisco de Campos que estabeleceu a criação da faculdade de Filosofia para a formação de professores para o então 2º grau, destacando-se, neste sentido, a Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade de São Paulo criada em 1934.

No entanto, foi a reforma Capanema uma das que mais contribuíram para o ensino no Brasil. Naquela época, estipulou-se como línguas estrangeiras a serem estudadas como disciplinas obrigatórias: o latim, o francês e o inglês, no chamado ginásio; e o francês, o inglês e o espanhol no colegial (Chagas, 1957). Foi neste período que as línguas (modernas e clássicas) obtiveram maior prestígio, tanto legalmente quanto na prática, já que abarcavam 35 horas semanais da grade horária das disciplinas, ou seja, “16,9% do currículo” (HELB, http://www.helb.org.br/).

Já as leis de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 e 1971, ignoram as LEs e não as incluem entre as disciplinas obrigatórias, rompendo assim com uma política que lhe conferia importância ao ensino de línguas. Mais uma vez nos vemos afetados pelo estigma da descontinuidade. Tal decisão contribuiu com a má gestão do ensino de línguas, o que por sua vez, fez proliferar os cursos livres de idiomas, já que as políticas públicas voltadas para o referido ensino eram parcas e inconsistentes.

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Embora na ditadura o ambiente não fosse propício para a inovação, muitos intelectuais brasileiros traziam para o Brasil os conhecimentos adquiridos fora do país. Neste período iniciou-se a criação de associações de professores de línguas para discutir novas (ou velhas) formas de ensinar LE.

Atualmente a matriz curricular Língua Estrangeira Moderna (LEM) não goza de prestígio dentro do currículo do ensino básico, mesmo sendo considerada obrigatória. Cabe à comunidade a escolha de qual língua quer estudar, podendo as IEs oferecerem outra LE como optativa. O fato é que não há nenhuma consulta pública para averiguar qual a língua a comunidade quer estudar como obrigatória, o que acarreta, na grande maioria das vezes, na “escolha” imposta do inglês como LE a ser estudada.

A língua espanhola ganhou força com a criação do Mercosul e após a promulgação da lei 11.161/05, que torna a oferta do idioma obrigatória no ensino médio. Por outro lado, nenhuma política fundamentada em teorias de gestão e ensino de línguas foi efetivada para a inserção do espanhol nas escolas de ensino médio, o que vem acarretando em problemas de cunho estrutural, pedagógico, social e político.

Com este breve quadro histórico, pode-se inferir o porquê da dificuldade de se estabelecer um processo de efetiva participação nos momentos decisórios das escolas e que a educação brasileira esta marcada pelo estigma da descontinuidade que, consequentemente, também afeta o ensino de línguas oferecido pelo Estado brasileiro.

V – O QUE OS DADOS REVELAM.

Os questionários foram aplicados para três grupos distintos: a equipe de direção da escola, o conselho escolar e um grupo de professores de línguas escolhidos aleatoriamente. Como o CIL não é uma escola regular, além de possuir um regime semestral, há uma alta rotatividade de alunos que entram, concluem e/ou abandonam o curso por razões diversas. No momento da aplicação do questionário o seguimento pais não foi representado, pois os membros do conselho pais de alunos o deixaram de ser, devido ao cancelamento, ao abandono ou término do curso pelos filhos.

No grupo da direção houve a ausência de dois participantes. O primeiro afastado para tratamento de saúde. O outro participante seria o chefe de secretaria, no entanto, a IE em questão se encontrava sem o referido profissional e o diretor na ocasião respondia pela secretaria da escola. No grupo de professores, foram escolhidos aleatoriamente 10 professores independentemente da LE que lecionavam. Dos 10, 03 não devolveram o questionário. Salientamos que todos os docentes são concursados e formados para as línguas que ensinam.

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Analisando os questionários aplicados ao conselho escolar, à equipe gestora e aos professores, em todos houve uma resposta positiva quanto à existência de um planejamento específico para o ensino de línguas e pela importância desta especificidade ser respeitada, tanto por quem coordena, ou seja, a equipe gestora, quanto por quem pensa as políticas públicas, o Estado. Ensinar LE não é o mesmo que ensinar matemática, ou mesmo português, por isso, requer formação, ambiente e coordenação, o que implica em um planejamento diferenciado de uma escola regular, o que, segundo os dados, não é respeitado pela gestão educacional, ou seja, a SEDF.

Outro ponto importante está na participação efetiva da comunidade escolar. Embora a escola seja uma IE respeitada pela comunidade, esta não participa ativamente da vida escolar, o que acarreta em uma possível omissão de demanda. Tal afirmação se comprova com a quantidade de pais e responsáveis que procuram a escola semestralmente para matricular seus filhos e não conseguem vagas. Paradoxalmente, uma vez com a vaga garantida, pouco contribuem para a manutenção e para o melhoramento da qualidade do ensino oferecido na IE. Prova disso é a quase ausência de participação de pais no conselho escolar e nas reuniões de pais e responsáveis.

Este quadro de ausência, ou omissão, também se dá quando analisamos as respostas do corpo docente da escola que, embora bem preparado com relação à metodologia de ensino de LE, ignora as questões políticas que afetam a classe docente e, principalmente, o processo de ensino, de aprendizagem e de aquisição de LE. Esta omissão contribui sobremaneira com a falta de políticas públicas adequadas voltadas para o ensino de LE e com a criação de políticas equivocadas. Esta passividade docente, que se restringe a discutir somente no claustro, muitas vezes sem o conhecimento adequado de gestão e da própria carreira, cria uma voz apática que não ecoa para além das fronteiras da sala dos professores ou das conversas informais “de corredor”, ocasionando em mal entendidos e geralmente discórdias dentro da própria IE.

Este tipo de comportamento presente em muitas IEs do país tem consequência duplicada no caso de uma escola pública de línguas que, no caso do DF, quase sempre está sujeita a uma fiscalização preconceituosa e sem parâmetro por parte do Estado, que a julga, muitas vezes, desnecessária, já que todos os alunos possuem a matéria LEM em suas escolas de origem. Esta crença, em parte, é explicada pelo fato de até 2010 não haver nenhum membro que tenha conhecimento técnico específico sobre ensino, aprendizagem e aquisição de LE na equipe de gestão educacional. Esta lacuna parece ter sido corrigida com a criação do Núcleo dos Centros Interescolares de Línguas (NCIL) da Gerência de Escolas de Natureza Especial da SEDF.

A falta de participação, efetiva e competentemente teórico-prática, enseja na falta de sentimento de pertencimento, levando-nos a reportarmos à ótica taylorista, na qual nem o processo nem o produto são compartilhados. Esta sensação de enraizamento e de

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construção mútua e autoconstrução, de sentir-se parte de um projeto, ainda está muito relacionada à função pedagógica da escola, o que também leva a um distanciamento entre os docentes e os assuntos extra-pedagógicos.

Com relação ao Projeto Político-pedagógico (PPP), quando perguntados se participavam de sua elaboração, muitos professores responderam positivamente. Contraditoriamente, quatro dos sete professores respondentes disseram nunca ter lido o PPP. Isso se dá por uma desmotivação causada por uma situação histórica que, segundo Silva (2009), historicamente o planejamento foi burocratizado e assumiu uma função de controle do trabalho alheio. Esta característica irradiou do âmbito dos sistemas de ensino e reverberou nas gestões escolares, ou seja, as escolas. A ótica taylorista, origem do planejamento, que tinha como principais características o controle do processo de produção e a produção em si, dificultaram a disseminação de processos participativos, o trabalho coletivo e o compromisso social “requeridos pela perspectiva da gestão democrática da educação” (SILVA, 2009, p. 01). Essa abordagem com forte viés neoliberal também veio a influenciar a forma como algumas gestões vêem e lidam com educação no Brasil.

Quando passamos à análise documental, os conflitos entre as gestões (educacional e escolar) são mais nítidos. Analisamos dois dos principais documentos que norteiam a vida das escolas: O Regimento Escolar das Instituições de Ensino da Rede Pública do DF, datado de 2006 e a Estratégia de Matrícula de 2009. O Regimento Escolar (2006) traz as regras para o funcionamento das escolas públicas do DF, bem como “regulamenta a organização didático-administrativa” (REGIMENTO ESCOLAR, 2006, p. 11) dessas escolas. Já a estratégia de matrícula, documento anual, prevê como será efetivada tanto a matrícula quanto a distribuição dos alunos dentro do sistema público de ensino. Em cada um desses documentos, há seções destinadas aos CIL. Estas seções foram o principal objeto desta análise documental.

No Regimento Escolar (RE), os CIL estão catalogados dentro do título IV, da intercomplementaridade, capítulo I (REGIMENTO ESCOLAR, 2006, p. 61). Na Estratégia de matrícula (2009), os CIL se enquadram na seção “outros atendimentos” (ESTRATÉGIA DE MATRÍCULA, 2009, p. 16). A seguir, contraporemos partes dos dois documentos cuja redação é conflitante, o que acarreta ruídos de comunicação entre a gestão escolar e a gestão educacional. Todos os textos dos quadros propostos estão na íntegra.

Regimento Escolar (RE) Estratégia de Matrícula (EM)Art. 216 item II. Oferecer, excepcionalmente à comunidade, o componente curricular LEM.Art. 217. O critério de prioridade de atendimento dos CILs é o seguinte: I – alunos oriundos das instituições educacionais

Item C18 – Não haverá matriculas novas nos Centros Interescolares de língua (CIL), no ano letivo de 2009, para alunos procedentes da comunidade, ficando vedada a oferta de vagas nos 1º e 2 º semestres do 2009.

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tributárias; II – alunos da rede pública ensino do DF; III – ex-tributários; IV - comunidade.Art. 218. Os CILs atendem a comunidade, de acordo com o percentual estabelecido na estratégia de matrícula.

Item 4.4.2 – É PROIBIDA a ABERTURA de turmas e o INGRESSO, em turmas já formadas, de alunos procedentes da comunidade nos níveis básico, intermediário e avançado em todos os Centros Interescolares de língua (CIL).

Fonte: Elaboração do autor.

Neste caso, vale ressaltar que as duas últimas EM (2007 e 2008) também proibiam a entrada de novos alunos provenientes da comunidade, desrespeitando, assim, os arts. 217 e 218 do RE. Deste fato inferimos a intenção da gestão educacional de acabar com o atendimento aos alunos da comunidade, mesmo havendo vagas remanescentes, como ocorreu nos anos de 2007, 2008 e 2009, em alguns CIL. Nota-se, ainda, que a proibição em letras garrafais, delibera um procedimento possivelmente divergente entre a gestão educacional e a gestão escolar do CIL que, segundo as observações, desejam atender à toda e qualquer demanda da população.

Regimento Escolar (RE) Estratégia de Matrícula (EM)Art. 243 – o trancamento de matrícula deve ser requerido á Direção do CIL, [...] exceto para aluno oriundo de instituição educacional tributária.

Item C14 – o aluno proveniente da comunidade que proceder ao trancamento de matrícula perde o direito a vaga.

Fonte: Elaboração do autor.

Novamente nos deparamos com disparidades no que concerne, principalmente, ao atendimento dos alunos oriundos da comunidade. Enquanto o RE prevê o direito a trancamento de matrícula, exceto para os alunos tributários, a EM veta o referido direito. Na EM, percebemos frequentemente a tendência à proibição e à mera catalogação dos alunos atendidos pelo CIL.

Regimento Escolar (RE) Estratégia de Matrícula (EM)Art. 217. O critério de prioridade de atendimento dos CILs é o seguinte: I – alunos oriundos das instituições educacionais tributárias; II – alunos da rede pública ensino do DF; III – ex-tributários; IV - comunidade.Parágrafo único. Os alunos ex-tributários não serão considerados alunos da comunidade [...]

Item C7 – aluno da rede Pública de Ensino é aquele matriculado em vaga em instituição educacional da Rede Pública de ensino não-tributária.Item C10 – aluno ex-tributário é aquele que concluiu o ensino fundamental em instituição educacional tributária e encontra-se matriculado, no ano letivo de 2009, no Ensino Médio, em instituição educacional da Rede Pública de ensino não-tributária.Item C12 – aluno da comunidade é aquele que não se encontra matriculado em instituição educacional da Rede Pública de ensino.

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Fonte: Elaboração do autor.

Com relação à definição das tipologias de alunos atendidos pelos CILs, o RE não traz nenhuma definição embora, em alguns momentos, faça citação à referida tipologia. A EM define os alunos quase sempre levando em consideração a possibilidade de saída deste aluno do CIL. O aluno do ensino médio de escola tributária iii, por exemplo, fica sem classificação, pois a EM não contempla o Ensino Médio como tributário. De certa forma, esta maneira simplória de definir as classes de alunos está revestida pela insígnia da exclusão, ou seja, dos parâmetros que impossibilitam a estada deste aluno no CIL.

Observemos, ainda, que o RE, embora não defina nenhuma classe de aluno, deixa claro em seu artigo 217, parágrafo único, que “o aluno ex-tributário não será considerado aluno da comunidade”, numa alusão clara a um possível percentual de vagas destinado aos alunos da comunidade ignorado pela EM.

Toda essa falta de clareza nas políticas advindas de cima para baixo se converte em percalços substanciais para a gestão escolar do CIL, já que a equipe gestora é obrigada a sair do campo pedagógico para ir ao campo administrativo para resolver disparidades que não foram provocadas pela gestão escolar. Os dados também corroboram com o exposto por Akkari que diz que nosso sistema é “um sistema educativo fragmentado, organizado em redes disparates, dificilmente comparáveis entre si” (AKKARI, 2001, p. 166).Desta forma, concluímos que as disparidades encontradas nos documentos influenciam negativamente o planejamento do CIL, já que a falta de definições claras e, inclusive equivocadas, em alguns casos, chegam a prejudicar o planejamento de todo um ano de trabalho, em virtude do desconhecimento sobre que público o CIL realmente irá atender. Diante dos dados, nos deparamos com um desconhecimento acerca de tudo o que concerne o ensino de LE por parte da gestão educacional. A criação de projetos e uma visão padronizada de escola causam transtornos aos gestores, aos professores e à comunidade escolar dessas escolas públicas de línguas. Elas, as escolas, se vêem não raras as vezes, em situações nas quais têm que abdicar de suas metodologias específicas para cumprir com regras criadas por uma gestão educacional que quase nada sabe sobre ensino, aprendizagem e aquisição de LE.

VI – CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

Analisando os dados coletados por meio dos questionários, da observação e da análise documental, podemos, finalmente, tecer algumas considerações. No âmbito da SEDF, notamos uma falta de competência teórica no que concerne ao funcionamento dos CIL, seus procedimentos, além de uma abordagem claramente excludente, a partir da qual o CIL ora é visto como escola, ora é visto como “apêndice” de outra escola. Esta forma de

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ver e perceber o CIL está refletida nas incongruências dos textos da EM e do RE. Esta preocupação com a forma com a qual o CIL é percebido está registrada no PPP da escola: “este Centro não pode e não deve ser visto tão simplesmente como um “apêndice” da escola tributária, visto que cumpre com todas as prerrogativas da legislação vigente no que diz respeito à formação do cidadão” (2009, p. 14).

É importante salientar que a construção do PPP leva em consideração um arcabouço teórico que abrange a área de gestão educacional e escolar, além das teorias advindas da Pedagogia e da Linguística Aplicada, características não encontradas nos documentos advindos da gestão educacional que regem o funcionamento da escola.

Apesar do cunho teórico, o PPP traz fortes traços da filosofia de trabalho empregada, na prática, no CIL. Desta maneira, o PPP acaba refletindo uma prática efetiva, reafirmando-a e avalizando-a e sua gestão é tarefa coletiva do corpo docente, liderado pelo gestor (Cury, 2008, p. 11) e, por isso mesmo, deve refletir os anseios da comunidade escolar, sem perder de vista a busca por um padrão de qualidade no ensino oferecido, outro princípio constitucional da educação nacional.

É perceptível no PPP e na práxis da IE em questão, uma divisão muito nítida entre o planejamento materializado nos planos de trabalho, tanto das línguas ensinadas (inglês, francês e espanhol), e os projetos que compõem cada plano. Desta forma cada projeto está contido nos planos, que estão contidos no planejamento. Percebe-se, também, uma filosofia metodológica apoiada na corrente comunicativa no âmbito do ensino de LE.

Todos estes traços fazem que o CIL possua uma filosofia de trabalho e uma “identidade” bem delimitada e de base forte, dando ao aluno, segundo os PCNs “[...] a oportunidade de aprender outra(s) Língua(s) Estrangeira(s), à sua livre escolha [...]. Tais Centros, criados ao final da década de 80, “em muitas ocasiões têm apresentado resultados altamente satisfatórios” (PCN, 2002, p.149). Vale ressaltar que, no caso do CIL, devido à demanda, nem sempre é possível a efetivação do processo de livre escolha da língua a ser estudada, porém, na maioria dos casos, os alunos estudam a língua que desejam.

Neste sentido, o CIL possui um PPP que norteia o trabalho administrativo-político-pedagógico da instituição. Possui planos de “curso” (um para cada língua) com objetivos por etapas de aprendizagem (ciclo/nível) e um syllabus norteador para cada nível e professor. Por fim, possui projetos que auxiliam na operacionalização dos planos e consequentemente do planejamento exposto no PPP.

Apesar de tantas especificidades e de tantas adversidades que jogam contra a participação, o CIL tem conseguido atrair alguns pais e parte da comunidade para o seio da escola por meio de projetos e de sua metodologia que tem, não raras as vezes, uma

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receptividade muito positiva por parte dos pais e dos alunos que passam a entender a importância de uma Língua Estrangeira para a soberania do futuro cidadão. Portanto, os princípios da gestão democrática se fazem presente na tentativa da escola em trazer a comunidade para seu interior, pela “necessidade de construir e desenvolver os princípios de convivência e de gestão democrática na escola” (BARRETO, 2009, p. 2).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante este processo de pesquisa muitos questionamentos nos vieram à tona. No papel de gestor, ficou nítida a necessidade iminente de se democratizar os procedimentos dentro das escolas e que estas se fortalecem à medida que a sociedade as abraça e as vê como parte integrante desta sociedade. Por outro lado, uma instituição de ensino como o CIL, não pode ser tratada como as outras IEs de ensino regular. Devem-se levar em consideração as diferenças de atendimento e as semelhanças não admitindo que as igualdades descaracterizem a instituição.

A oferta de uma educação de qualidade não depende somente da equipe de direção, do professor, do pai, do Estado, enfim, depende da congruência das ações de todos estes segmentos. Depende, ainda, da harmonia entre a gestão educacional e a gestão escolar, que haja um processo de escuta mútuo entre as gestões, para que os conflitos que trazem tantos prejuízos, principalmente à escola, sejam minimizados.

Também percebemos o quão é importante que a comunidade escolar seja informada acerca de seus direitos, para que de posse de informações pertinentes, possam participar ativamente da vida escolar de seus filhos, desmistificando assim o mito da “autoridade pedagógica” (BARRETO, 2009, p. 1), que por algum tempo vinculou-se a concepção de que os professores das escolas públicas optavam por manter distância dos pais e da comunidade circundante, pois tinham a crença de que a participação efetiva de outros segmentos da sociedade dentro do planejamento escolar colocaria em risco a “autoridade pedagógica” dos professores (idem). A divulgação de direitos e a conscientização de toda a comunidade escolar ensejam em força motriz para tornar visíveis as demandas da comunidade e assim gerar políticas públicas que reflitam os anseios da comunidade.

Apesar da falta de participação dos pais, dos ruídos de comunicação existentes entre as gestões escolar e educacional, da falta de perspectiva da sociedade com relação à educação pública e da quase exclusão do sistema de ensino (ressalte-se que o CIL quase nunca é incluído nos programas de governo), esta IE ainda goza de prestigio junto à sociedade que, todos os anos, busca nessa IE, a possibilidade de crescimento pessoal e profissional por meio do estudo efetivo de uma LE, o que segundo os PCNs, não é possível no ensino regular:

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Fatores como o reduzido número de horas reservado ao estudo das línguas estrangeiras e a carência de professores com formação lingüística e pedagógica, por exemplo, foram os responsáveis pela não aplicação efetiva dos textos legais. Assim, em lugar de capacitar o aluno a falar, ler e escrever em um novo idioma, as aulas de Língua Estrangeiras Modernas nas escolas de nível médio, acabaram por assumir uma feição monótona e repetitiva que, muitas vezes, chega a desmotivar professores e alunos, ao mesmo tempo em que deixa de valorizar conteúdos relevantes à formação dos estudantes, (PCN, 2002, p. 150).

A criação de um ambiente de aprendizagem, que dê ao aluno e ao professor a oportunidade de exercer sua cidadania e efetivamente ensinar e aprender/adquirir uma LE, é a prova de que com organização (planejamento) e com participação, o que parece impossível se torna viável.

Concluindo, faz-se urgente a necessidade de se conscientizar tanto as autoridades quanto professores, pais e alunos que a “democratização do ensino supõe o princípio da igualdade, mas junto com o seu complemento indispensável, o princípio da diversidade”, (LIBÂNEO, 1994, p. 39). A educação tem por finalidade precípua contribuir com a formação do cidadão, reforçando a sua capacidade crítica, a sua curiosidade e a sua insubmissão (FREIRE, 1996, p. 26). O resultado de políticas públicas equivocadas, “elaboradas a toque de caixa”, contribuem ainda mais com a desvalorização do sistema de ensino de LE e contribui com a formação de verdadeiros cartéis de cursos livres de idiomas, nos quais a porta de entrada está aberta para aqueles que pagam para estar ali, ou seja, uma minoria da população brasileira.

Democratizar o ensino de línguas, diminuir os conflitos entre Estado (Secretarias de educação, Ministério da Educação) e IEs (escolas de ensino básico, universidades, escolas públicas de línguas, etc) e, admitir o equívoco que é o ensino de línguas na rede pública no Brasil é o primeiro passo para se corrigir uma falha que a anos se arrasta e que nenhuma política de Estado foi criada para sanar o problema. Neste sentido, ou seja, com relação ao ensino de línguas, o Estado precisa ouvir os apelos e as sugestões advindas da sociedade, seja ela acadêmica ou não.

A quase ausência de políticas públicas adequadas para o ensino de línguas no Brasil contribui com a proliferação de cursos particulares, com o surgimento de “convênios” que nada têm a ver com educação, e muito mais com finanças e não democratizam nem melhoram a qualidade do ensino de LE, aumentando a lacuna entre quem pode (financeiramente) estudar uma língua e quem não pode.

Este cenário, lamentavelmente, é perfeito para diminuir ainda mais a possibilidade de acesso a uma formação em nível superior e em nível de pós-graduação; consequentemente, influencia diretamente na formação da classe acadêmica impedindo

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que muitos alcancem este patamar de instrução e, finalmente, aumenta a distancia entre pobres e ricos, “favorecendo os favorecidos e desfavorecendo os desfavorecidos” (ANDRÉ, 1999, p. 16).

REFERÊNCIAS

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http://moodle3.mec.gov.br/unb/file.php/1/gestores/direito/pdf/jamilcury.pdf. Acesso em: 18/02/2009.DOURADO, L. F. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: limites e perspectivas. In: Educação e Sociedade, Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 921-946, out. 2007. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br, Acesso em 27/03/09.

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i Dados gentilmente cedidos pela secretaria da IE.

ii Termo usado pelo autor na área da Linguística Aplicada (LA) que representa os conhecimentos teóricos basilares da profissão de professor dde LE. Neste trabalho, atribuímos ao termo a ideia de conhecimento científico/técnico sobre gestão (educacional e escolar) e ensino e aprendizagem de LE.iii Escola tributária eram as escolas que ganhavam o direito de terem seus alunos estudando LE no CIL. Consequentemente a escola não ofereceria esta matriz curricular. No ano de 2010, após várias reuniões entre os gestores dos CIL e a SEDF, a tributariedade foi abolida, minimizando o problema referente ao tratamento equânime.

(*) Professor do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução da Universidade de Brasília (UnB) e doutorando em Estudos Linguísticos pela Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)