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 EDUCAÇÃO NÃO FORMAL AO LONGO DA VIDA: SERÁ UMA NECESSIDADE? FEDERIZZI, Roberta Bassani – UPF – [email protected] GELAIN, Denise – UPF – [email protected] Eixo: Educação e Arte / n.16 Agência Financiadora : não cont ou com fi nanciamento RESUMO Durante nossa vida, surgem muitas oportunidades para adquirirmos conhecimentos e são elas que verdadeiramente viabilizam o desenvolvimento de todo o potencial humano. O  presente estudo tenta mostrar as variações dos termos relativos à educação, ou seja, educação formal, não formal e informal. Normalmente se percebe uma evidência à educação formal, sendo ela contemplada com um espaço próprio, a escola, com currículos e  professores pré-determinados, e um sistema organizacional geral regido por um órgão educacional superior. A educação informal é aquela que acontece durante toda a vida e em todos os espaços da sociedade, na família, nos jornais, meios de comunicação, Internet, entre outros. Já a educação não formal, aquela que dá base às reflexões deste estudo, é aquela que pode acontecer nos espaços mais inusitados, nos mais diversos segmentos da sociedade, sem a mesma formalidade da educação escolar, mas prima por um aprendizado, tem uma intencionalidade e um planejamento prévio. As diferenças entre elas está no seu sistema de regras. Exemplificando uma das possibilidades de educação não formal durante a vida, trazemos nestas reflexões a experiência do Coral Muni cipal Alegria Franciscana, da cidade de Marau, Rio Grande do Sul. Grupo este formado por vinte e cinco componentes, das mais diversas faixas etárias, escolaridade e profissão. Existindo há vinte e cinco anos, o grupo apresenta um repertório bem variado de canções, mas tem a essência do seu trabalho voltado à pesquisa e propagação da música folclórica italiana. Palavras-chave: Educação, educação formal, educação não formal, educação informal, grupo coral de adultos.

01 49 36 Educacao Nao Formal Ao Longo Da Vida Sera Uma Necessidade

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  • EDUCAO NO FORMAL AO LONGO DA VIDA: SER UMA NECESSIDADE?

    FEDERIZZI, Roberta Bassani UPF [email protected], Denise UPF [email protected]

    Eixo: Educao e Arte / n.16 Agncia Financiadora: no contou com financiamento

    RESUMO Durante nossa vida, surgem muitas oportunidades para adquirirmos conhecimentos e

    so elas que verdadeiramente viabilizam o desenvolvimento de todo o potencial humano. O presente estudo tenta mostrar as variaes dos termos relativos educao, ou seja, educao formal, no formal e informal. Normalmente se percebe uma evidncia educao formal, sendo ela contemplada com um espao prprio, a escola, com currculos e professores pr-determinados, e um sistema organizacional geral regido por um rgo educacional superior. A educao informal aquela que acontece durante toda a vida e em todos os espaos da sociedade, na famlia, nos jornais, meios de comunicao, Internet, entre outros. J a educao no formal, aquela que d base s reflexes deste estudo, aquela que pode acontecer nos espaos mais inusitados, nos mais diversos segmentos da sociedade, sem a mesma formalidade da educao escolar, mas prima por um aprendizado, tem uma intencionalidade e um planejamento prvio. As diferenas entre elas est no seu sistema de regras. Exemplificando uma das possibilidades de educao no formal durante a vida, trazemos nestas reflexes a experincia do Coral Municipal Alegria Franciscana, da cidade de Marau, Rio Grande do Sul. Grupo este formado por vinte e cinco componentes, das mais diversas faixas etrias, escolaridade e profisso. Existindo h vinte e cinco anos, o grupo apresenta um repertrio bem variado de canes, mas tem a essncia do seu trabalho voltado pesquisa e propagao da msica folclrica italiana.

    Palavras-chave: Educao, educao formal, educao no formal, educao informal, grupo coral de adultos.

  • 2INTRODUO O tema deste trabalho abrange reflexes quanto necessidade de colocarmos em

    prtica o que h muito tempo encontra-se em livros e diz respeito aos estudos de diversos pensadores que enfatizam mudanas drsticas, porm, contundentes e urgentes quanto a mudanas de paradigmas, propostas educacionais e teorias relacionadas ressignificao de valores. Questiona-se neste contexto esta realidade, pois no se pode ignorar ou negar estas faces e seus significados para a vida, principalmente porque estamos vivendo tudo isso e necessitamos encontrar o sentido primeiro da nossa passagem por este mundo, do contrrio estaremos em permanente crise existencial1.

    As ltimas duas dcadas de nosso sculo vm registrando um estado de profunda crise mundial. uma crise complexa, multidimensional, cuja as facetas afetam todos os aspectos de nossa vida - a sade e o modo de vida, a qualidade do meio ambiente e das relaes sociais, da economia, tecnologia e poltica. uma crise de escala e premncia sem precedentes em toda a histria da humanidade. Pela primeira vez, temos que nos defrontar com a real ameaa de extino da raa humana e de toda a vida no planeta. (CAPRA, 1982, p. 19).

    Partindo desse entendimento pode-se, em meio a esta crise de percepo, vislumbrar um momento extremamente adequado para algumas reflexes e, quem sabe, mudanas na percepo da realidade. Atravs da necessidade de uma convergncia dos diferentes modos de pensar e sentir, interconectada a uma transformao pessoal e social, atravs da retomada da prpria identidade. Ferguson (1997) diz que viver e no apenas levar a vida, essencial quando se busca a integridade [...]. Para esta autora, viver significa usufruir tudo que esta proporciona, incluindo os dissabores e frustraes. envolver-se e, a partir da, tornar-se o protagonista da prpria histria. Viver prestar ateno e perceber as verdadeiras necessidades humanas, no ter medo da aventura da auto-descoberta, encharcar-se de experincias e vivncias intensas, at porque, ser que teremos a oportunidade de viver amanh?

    1. EDUCAO PARA TODA A VIDA Nesta reflexo, no se pode negar a importncia da educao na construo do

    conhecimento. As exigncias dos novos tempos tendem a promover nos sujeitos uma busca 1 O nvel existencial o nvel do organismo total, caracterizado por um senso de identidade que envolve uma conscincia do sistema corpo/mente como um todo integrado.

  • 3de vrias alternativas na tentativa de acompanhar o avano da tecnologia e da informao. O trao mais original da educao desse sculo o deslocamento de enfoque do individual para o social, para o poltico e para o ideolgico (GADOTTI, 2000).

    Percebe-se cada vez mais que a educao no se d somente dentro dos ptios escolares e que tambm devido a sua diversidade passa a ser comentada por diferentes formas, o que leva a mais de uma nomenclatura. Conforme Gohn uma ampliao do conceito de educao que no se restringe mais aos processos de ensino-aprendizagem no interior de unidades escolares formais, transpondo os muros da escola para os espaos da casa, do trabalho, do lazer, do associativismo, etc. (1999, p.07). Assim, a educao pode apresentar uma variedade de sistemas como formal, no formal e informal e entre eles pode ocorrer uma inter-relao e tambm uma ampliao.

    Educao formal aquela desenvolvida nas instituies escolares, com estruturao, um planejamento, uma execuo e com um sistema de avaliao, sendo ligada a um rgo superior e por ele legislada, no Brasil o Ministrio da Educao. Para o seu funcionamento, ela necessita de um local especfico, pessoas formadas especialmente para este fim e de uma organizao curricular. Gohn salienta: A educao escolar formal, oficial desenvolvida nas escolas, ministradas por entidades pblicas ou privadas, abordada como uma das formas de educao (1999, p.08). Bernet completa: A educao formal compreende o sistema educativo altamente institucionalizado, cronologicamente graduado e hierarquicamente estruturado que se estende desde os primeiros anos da escola primria, at os ltimos anos da universidade (1998, p.19). Padilha ressalva: Trata-se de uma educao continuamente influenciada por valores que se sedimentam em tradies e so transmitidos de uma gerao para outra (2007, p.89).

    Por educao informal se entende todo o conhecimento adquirido junto famlia, no convvio com a sociedade, clubes, teatros, leitura de jornais e revistas, entre outros. um processo que dura toda a vida e no qual as pessoas acumulam conhecimentos e habilidades mediante das experincias cotidianas e as suas relaes com o meio ambiente. Afonso explica que a educao informal, ocorre nos espaos de possibilidades educativas no decurso da vida dos indivduos, como a famlia, tendo, portanto, carter permanente (apud GOHN, 1999, p.100). Padilha complementa a definio: Contribui para essa educao

  • 4informal, na sociedade contempornea, a presena massiva dos meios de comunicao. (2007, p.92)

    J a educao no formal pode acontecer fora das escolas, em grupos da sociedade civil, de movimentos sociais, de organizaes no governamentais e vrias agrupaes que atuam sem fins lucrativos. Ela mais flexvel, verstil e dinmica que a educao formal, no tem a mesma carga de formalidade que a educao escolar e procura facilitar que determinadas classes e grupos possam ter um aprendizado, independente de idade, condio social, sexo, religio, entre outros, mas ela tem uma intencionalidade e um planejamento prvios. Corroborando com a idia, Gohn enfatiza que

    Os espaos onde se desenvolvem ou se exercitam as atividades da educao no formal so mltiplos, a saber: no bairro-associao, nas organizaes que estruturam e coordenam os movimentos sociais, nas igrejas, nos sindicatos e nos partidos polticos, nas ONGs, nos espaos culturais e nas prprias escolas, nos espaos interativos dessas com a comunidade educativa. (GOHN,1999, p. 101)

    Bernet comenta sobre as trs formas de educao: O que formal, no formal, ou informal, , ou bem a metodologia, o procedimento educativo, ou bem o agente, a instituio, ou o marco que em cada caso situa o processo de educar-se (1998, p.23).

    No final dos anos 60, a educao formal passava por uma crise, havia uma necessidade de satisfazer a demanda social da educao, pois a escola no servia mais como o nico recurso para atender as expectativas da aprendizagem. Assim a International Conference on World Crisis in Education, que aconteceu em 1967 na cidade de Williamsburg, Virginia (EUA), elaborou um documento direcionado ao setor de educao da UNESCO, onde a partir deste encontro o termo no formal passou a ser mencionado. Segundo Bernet, este documento dava uma nfase especial necessidade do desenvolvimento de meios educativos diferentes aos convencionais provenientes das escolas. Assim com as denominaes de educao informal ou no formal se pretendia ampliar o heterogneo processo educativo no escolar, situados a margem do sistema do ensino regular. Sempre demonstrando a inteno e propsitos dos objetivos expressamente educativos e de aprendizagem (BERNET, 1998, p.18).

    A educao no formal pode ser analisada como aquela que rompe os procedimentos habituais que caracterizam a escola, ou seja, a educao formal. No se quer dizer que a

  • 5educao formal e a no formal se distinguem por serem de carter escolar ou no, se no a sua incluso ou excluso de um sistema educativo regrado (BERNET, 1998, p.28). E Gohn complementa:

    A educao no-formal tem outros atributos: ela no , organizada por sries/ idade/contedos; atua sobre aspectos subjetivos do grupo; trabalha e forma a cultura poltica de um grupo. Desenvolve laos de pertencimento. Ajuda na construo da identidade coletiva do grupo (este um dos grandes destaques da educao no-formal na atualidade); ela pode colaborar para o desenvolvimento da auto-estima e do empowerment do grupo, criando o que alguns analistas denominam, o capital social de um grupo. Fundamenta-se no critrio da solidariedade e identificao de interesses comuns e parte do processo de construo da cidadania coletiva e pblica do grupo (GOHN, 2006, p.12).

    No Brasil, a educao no formal no teve importncia para educadores e polticas

    pblicas at os anos 80, pois a escola institucionalizada promovia a educao formal, voltada s exigncias do sistema educacional vigente. Gohn afirma que:

    At os anos 80, a educao no formal foi um campo de menor importncia no Brasil... Em alguns momentos, algumas luzes foram lanadas sobre a educao no formal, mas ela era vista com uma extenso da educao formal, desenvolvida, em espaos exteriores s unidades escolares. Tratavam-se de programas ou campanhas de alfabetizao de adultos cujos objetivos transcendiam a mera aquisio da compreenso da leitura e da escrita e se inscreviam no universo da participao sociopoltica das camadas populares, objetivando integr-las no contexto urbano-industrial (GOHN,1999, p.91).

    As crescentes e aceleradas mudanas na economia, na sociedade e no mundo do

    trabalho, nos anos 90, resultou na necessidade da aprendizagem de novas habilidades, dando grande importncia aos valores culturais. Assim, as atividades extra-escolares passaram a ter uma maior relevncia. Gohn salienta que:

    A educao no formal designa um processo com cinco campos ou dimenses, que correspondem a suas reas de abrangncia. O primeiro envolve a aprendizagem poltica dos direitos dos indivduos, enquanto cidados. O segundo, a capacitao dos indivduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e desenvolvimento das potencialidades. O terceiro, prticas de aprendizagem com objetivos comunitrios, voltadas para a soluo de problemas coletivos. O quarto a escolarizao formal escolar, em formas e espaos diferenciados, com uma forma de ensinar organizada pelo prprio grupo ou comunidade. E o quinto, a educao desenvolvida na e pela mdia, em especial a eletrnica (GOHN,1999, p.98).

  • 6Em referncia ao quinto item, Moacir Gadotti escrevendo sobre a questo da educao formal/no formal comenta que:

    As novas tecnologias da informao criaram novos espaos do conhecimento.Agora, alm da escola, tambm a empresa, o espao domiciliar e o espao social tornaram-se educativos. Cada dia mais pessoas estudam em casa, podendo, de l, acessar o ciberespao da formao e da aprendizagem a distncia, buscar fora das escolas a informao disponvel nas redes de computadores interligados, servios que respondem s suas demandas pessoais de conhecimento. Por outro lado, a sociedade civil (ONGs, associaes, sindicatos, igrejas...) est se fortalecendo, no apenas como espao de trabalho, mas tambm como espao de difuso e de reconstruo de conhecimentos e de formao continuada (GADOTTI,2005, p. 08).

    As oportunidades ao longo da vida so as que oportunizam esses conhecimentos e

    que verdadeiramente viabilizam o desenvolvimento de todo o potencial humano. Mas o que , na prtica, desenvolver potenciais? O relatrio Jacques Delors, da Unesco, trouxe uma contribuio significativa ao propor quatro e no apenas duas formas de potencializar os seres humanos.

    [...] a educao deve organizar-se em torno de quatro aprendizagens fundamentais que, ao longo de toda a vida, sero de algum modo para cada indivduo, os pilares do conhecimento: aprender a conhecer, isto adquirir os instrumentos de compreenso; aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas; finalmente aprender a ser, via essencial que integra as trs precedentes [...] ( DELORS, 1999, p. 90).

    Para este autor, somos um processo continuum e integrado, necessitamos de todos os aspectos para potencializarmos as nossas capacidades e habilidades ao longo de toda a vida. Tendo em vista que educao ao longo da vida remete a idia de construo contnua e fundamental no sentido de conscincia de si prprio e do mundo.

    O conceito de educao ao longo da vida a chave que abre as portas do sculo XXI. Ultrapassa a distino tradicional entre educao inicial e educao permanente. Aproxima-se de um outro conceito proposto com freqncia: o da sociedade educativa, onde tudo pode ser ocasio para aprender e desenvolver os prprios talentos. (DELORS, 1999, p.117).

    A reflexo proposta pelo autor desperta formas mais humanas, conectadas, fraternas

    e holsticas de interagir com o todo do qual fazemos parte, propondo a humanizao e a

  • 7idia de unidade no novo paradigma que emerge, visualizando conceitos e mtodos alm do cientificismo rumo percepo existencial. Assim, educar e educar-se ao longo da vida significa aproveitar todas as oportunidades e manifestaes oferecidas pela sociedade, no sentido de buscar a centralidade do ser. Centralidade que envolve o comprometimento com o todo.

    Para Ferguson, [...] a mudana para o paradigma de valores se reflete na transformao de padres de trabalho, escolha da carreira, consumo... nos estilos de vida em evoluo que se beneficiam da sinergia, da diviso, da troca, da cooperao e da criatividade [...] (1997, p. 307).

    esse sentido de unicidade, de permanncia, de conexo que a educao ao longo da vida enfatiza, no desintegrando, desprezando e inutilizando teorias e sim, propondo a complementaridade entre os fundamentos tericos e o desenvolvimento da percepo, e do espao interior. Essa conscincia de totalidade, de unicidade, faz com que nos aproximemo-nos da prpria essncia, voltando dessa forma para casa, para o verdadeiro propsito da existncia humana, ressignificando valores e assim vivendo com mais plenitude, conscincia e sentido para com os prprios atos.

    Para Delors, a maior parte dos valores como integrao, respeito, compreenso, indispensveis ao sculo XXI, esto h muito tempo, inscritos nas tradies culturais milenares das grandes civilizaes.

    [...] foi a educao que lanou pontes entre culturas orientais e ocidentais. Quando o oriente e o ocidente forem capazes de aprender um com o outro para proveito mtuo, e quando cada um adotar o que o outro tem de melhor -combinando, por exemplo, a iniciativa individual e o esprito de equipe, a competitividade e a solidariedade, as competncias tcnicas e as qualidades morais - ento os valores universais que invocamos havero de se impor, pouco a pouco, e o advento de uma tica global provocar uma profunda reanimao de todas as culturas, e contribuir profundamente para a educao da humanidade. (DELORS,1999, p. 265-266).

    Rossetto, corrobora com a citao:

    Educao, um fenmeno prprio dos seres humanos... o processo de produo de bens teis para satisfazer s necessidades humanas ou no mbito intelectual, como idias, conceitos, valores, smbolos, hbitos e atitudes. Tais elementos dizem respeito identificao dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivduos (ROSSETTO, 2005, p.188).

  • 8De um modo geral, percebe-se a interligao da educao com questes culturais. Tentando formatar uma idia sobre cultura, podemos dizer que ela um conjunto de conhecimentos tericos e prticos que se aprende e se transmite pelos mais diversos grupos, e isto, ao longo da histria. Cultura criao, sendo assim constantemente renovada pelos homens e suas agrupaes. A cultura um fator de humanizao e ela confere um sentido vida dos seres humanos, pois o homem s se torna homem porque vive no seio de um grupo cultural.

    O ser humano socivel por natureza, sendo assim um dos aspectos mais importantes o agrupamento, sendo este normalmente regido por condies de deveres e direitos. As vivncias grupais favorecem o surgimento de muitos grupos com finalidades e afinidades em comum. A prtica musical, o canto, a escuta, a atividade, a criatividade levam pessoas a uma educao coletiva, voltada aos valores expostos e propostos dentro de um universo cultural, que possibilita atribuir significado, ao mesmo tempo em que estabelece um sentido para sua existncia (SEKEFF, 2002, p.119). E Padilha com eloqente clareza afirma que

    A educao acontece durante toda a vida: na infncia, na pr-adolescncia, na adolescncia, na idade adulta e na velhice. Estamos sempre aprendendo e ensinando, educando e nos educando. Dependendo de como entendermos cada uma dessas dimenses e de como organizamos os processos formativos, com maior ou menor interao entre elas, teremos processos e resultados educacionais diferenciados (PADILHA,2007, p. 94.).

    O ser humano adulto passa por etapas, cada uma com suas prprias caractersticas

    em termos de mudanas fsicas, de trabalho, de escolaridade, da passagem da famlia paterna para a sua prpria famlia, bem como suas fases de vida, entre o adulto jovem e o adulto velho. Cada momento carrega um significado, o qual sempre vem acompanhado de um sentimento, que, pela cultura, arte, msica, entre outras expresses, apresenta um despertar, inclusive da percepo. Corroborando essa idia Torres afirma:

    Num processo de interao social necessrio que cada um aja e interaja, perceba a si mesmo e aos outros, faa o seu dilogo visando a sntese e sempre continue neste processo de crescimento. A percepo minha e do grupo ser indispensvel para um processo de amadurecimento e de relaes inter-pessoais sadias (TORRES, 2002, p.118).

  • 9Hoje vale tudo para aprender. Isso vai alm da reciclagem e da atualizao de conhecimentos e muito mais alm da assimilao de conhecimentos. A sociedade do conhecimento uma sociedade de mltiplas oportunidades de aprendizagem. As conseqncias para a escola, para o professor e para a educao em geral so enormes. essencial saber comunicar-se, saber pesquisar, ter raciocnio lgico, saber organizar o seu prprio trabalho, ter disciplina para o trabalho, ser independente e autnomo, saber articular o conhecimento com a prtica, ser aprendiz autnomo e a distncia (GADOTTI, 2005).

    2. EDUCAO NO FORMAL: CORAL ALEGRIA FRANCISCANA Exemplificando uma forma de educao no formal ao longo da vida, trazemos para

    este estudo, a experincia do Coral Municipal Alegria Franciscana da cidade de Marau, no Rio Grande do Sul.

    Mantido pela administrao municipal, o Coral Municipal Franciscana Alegria faz parte da Associao Marauense de Cultura Italiana. O grupo, que canta a quatro vozes tenores e baixos nas vozes masculinas e sopranos e contraltos nas vozes femininas conta hoje com vinte e cinco integrantes e faz em torno de trinta apresentaes por ano, nos mais diversos eventos da cidade de Marau, na regio Norte do Rio Grande do Sul, nos estados da regio Sul e tambm com duas participaes fora do Brasil, uma na Itlia e outra na Argentina.

    O repertrio musical do grupo bem variado, contando com msicas gachas, religiosas, populares e folclricas brasileiras, mas na cultura italiana, especialmente nas canes folclricas, onde se concentra o maior trabalho e envolvimento do grupo, nas questes da pesquisa e propagao das msicas trazidas pelos nossos antepassados. No ano de 2007 foi o homenageado pela administrao municipal de Marau, durante a XIX Semana Italiana de Marau, em comemorao aos seus 25 anos.

    Participou e participa de diversos festivais de corais, tendo recebido em muitos deles o prmio de primeiro lugar. Um dos encontros mais expressivos para o grupo foi de fazer parte de um concerto de Natal junto Orquestra Sinfnica de Porto Alegre (OSPA). H dezenove anos, componentes do grupo apresentam um programa semanal de rdio, todo comentado em dialeto vneto, e seguidamente o coro se apresenta usando as falas e canes dialetais da regio norte da Itlia o Vneto.

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    Assim, atravs do canto, a aprendizagem em grupo demonstra uma vivncia de novas experincias, acima de tudo uma experincia sensorial, promovida por novas formas de sentir, pensar e tambm de ouvir, ver e viver.

    Aprendemos com o corpo todo, pois nosso corpo sente e sensvel, e o conhecimento est vinculado condio de existncia, o processo educativo incorporado e variedade destes saberes resulta na sua educao. A experincia de vida provoca nos homens um conhecimento comum, chamado de senso comum, e este mostra uma forma de concepo do mundo, da histria e da cultura dos homens. Todo conhecimento tem a sua importncia, e relevncia, independendo de que forma ele adquirido.

    A educao no mbito escolar, ou seja, a formal; a educao na famlia e sociedade, denominada de educao informal e a educao promovida entre grupos ou por propsitos nicos, entre vrios motivos, leva educao no formal, movimentam nos sujeitos suas potencialidades, seus desejos de aprimoramento e de aquisio de novos conhecimentos. No aprendizado de fundamental importncia as conexes entre cincia/arte e a afetividade, assim uma educao somente ter valor e sentido quando vinculada s questes da sensibilidade. Grandes potencialidades esto contidas na arte e nas suas formas de expresso.

    A msica sempre se firmou como uma linguagem. viva voz ou com o acompanhamento de instrumentos, entoada a solo ou em grupo, refora as suas potencialidades de ser geradora de comunicao e de conhecimento. Articulando sons e organizando vocbulos e palavras, o homem foi dando significados e formatando sua linguagem. Em sua memria armazena os conhecimentos, os transforma, reforma e recria e os libera nas formas orais e tambm musicais. Tedesco afirma:

    A linguagem um elemento fundamental na organizao da memria, o elemento fundante da identificao social da memria individual... por isso que os limites da linguagem denotam os limites do mundo, da compreenso e expresso dos indivduos. Atravs da linguagem possvel estabelecer relaes com o mundo, possvel comunicar experincias, fundar tradies comuns, subjetivar experincias, intercambiar e se apropriar de smbolos e de memrias coletivas (TEDESCO,2004, p.154 e 157).

    Nossa existncia est atrelada linguagem, nossas vivncias mentais e culturais,

    associadas natureza, pois nos servimos dela, a linguagem, sendo um instrumento para as relaes conosco mesmo e com os outros, onde nosso ntimo se une ao psquico e ao

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    mundo. A msica por ser expressiva tambm comunica, faz com que o sujeito a sinta e a experimente, educa os sentidos, perpasse o corpo e a alma. O homem d sentido quilo que lhe relevante, e a educao esttica valoriza experincias individuais, reforando o vnculo com os sentimentos, com a tica, com a cognio e com o respeito natureza.

    Para Granja a msica uma linguagem que atinge nosso corpo diretamente antes de qualquer reflexo e, por essa razo, costumamos nos entregar a ela passivamente. Por outro lado, a msica tambm tem a capacidade de provocar nossos pensamentos e sentimentos, levando o ouvinte a apreciar sua beleza esttica e a compreender seu significado (2006, p.69).

    Povos dos mais diversos espaos do planeta manifestaram-se atravs de diversas expresses artsticas: dana, poesia, msica, pintura, escultura, artesanato. No possvel criar ou revelar a criatividade sem estar envolvido emocionalmente com a arte. Os povos atravs de suas caractersticas evolutivas, do uso de novos espaos, domnio de novos territrios, entre outros aspectos, aculturaram-se, formando uma dimenso de arte, em especial a msica, por ser uma expresso de aproximao entre etnias e da perpetuao de diversas expresses artsticas.

    Com sua linguagem universal, a msica revela seus objetivos de promotora de cultura e de conhecimentos, portadora de aspectos peculiares de cada povo, de seu tempo histrico e de seus traos tnicos. Ao produzir um som e lhe impor um ritmo, o homem promove um fenmeno comum a todos os povos e culturas, a sua arte.

    O Brasil, por sua vasta extenso territorial, e por ser um pas novo, somente quinhentos e sete anos (de histria), oportunizou a entrada e permanncia de muitos imigrantes. Ao adentrar em nossas terras, cada etnia trouxe seus sonhos e desejos, suas aspiraes de desenvolvimento patrimonial e sua bagagem cultural: a lngua, os costumes, hbitos, a culinria, a arte, a msica.

    De maneira no formal, grupos das mais diversas idades buscam um conhecimento musical, tanto instrumental quanto vocal, e, muitas vezes, de forma autodidata. Agremiaes so formadas com propostas comuns, objetivando levar um conhecimento de muitas trocas. Por vezes, o resultado destes encontros faz surgir bandas e corais, que iniciam de forma amadora e muitos deles acabam voltando este oficio para o campo profissional.

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    Sabe-se que o ser humano no somente razo, mas tambm est envolto de smbolos e de poesia. A memria tem o papel de sustentar o sentido de uma identidade, podendo ser coletiva ou no. A histria conta momentos da vida de cada um, a singularidade de um grupo, de uma sociedade, de um espao fsico. A msica um fator importante de demonstrao da convivncia grupal e da aglutinao de manifestaes culturais, na tentativa de se manterem vivas algumas das manifestaes de cada grupo e, por vezes, de cada etnia. Conforme Rossetto,

    A experincia social e a convivncia com o meio so fatores determinantes para os processos e representaes que produzem a percepo prpria, gerando lembranas das relaes formais e informais na comunicao lingstica e cultural, convergindo na busca da identidade que essencial ao ser humano (ROSSETTO, 2005, p.204).

    Partilhar da memria e etnia promover a manuteno da cultura de um povo.

    tentar preservar aspectos do conhecimento que acabou sendo deixado de lado, at mesmo esquecido, pelo tipo de vida, cada vez mais mecanizada em que est inserido o homem do presente.

    Lembrar histrias de famlia, msicas da infncia ou procedentes de uma etnia, e de eventos da sua cidade, sempre demonstra uma tentativa de perpetuar s novas geraes a histria de cada um, que acaba sendo muito rica, quando compartilhada e difundida coletivamente. Tedesco e Rossetto complementam esta idia.

    O papel da memria coletiva sustentar em nvel cognitivo e simblico o sentido de identidade coletiva.A memria coletiva pode assumir uma veste mais ou menos institucionalizada, objetivando-se em prticas especificas, em lugares de cultos ou em coisas/objetos significativos, mas a origem e a sua reproduo situam-se ao nvel das prticas comunicativas, sua funo principal favorecer a coeso do grupo social e garantir sua identidade (TEDESCO e ROSSETTO, 2007, p.96).

    ALGUMAS CONSIDERAES Percebemos que sujeitos adultos procuram novas motivaes em sua vida e muitas

    delas podem ser adquiridas atravs da educao e suas diversas possibilidades, sendo que a educao no formal pode acontecer ao longo da vida de cada sujeito e no somente nas escolas ou instituies formais. Adultos carregam uma bagagem de vida, uma histria, uma memria dos seus atos e fatos e quando estes saberes passam a ser compartilhados, tendem

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    a resultar num aprendizado coletivo, na criao de laos de amizade, de realizaes grupais, e no auxlio das conquistas de realizao pessoal e do aumento da auto-estima.

    Educar-se ao longo da vida gera a perspectiva dos sujeitos perceberem-se pessoas com inmeras possibilidades e de poder promover trocas de conhecimentos, que resultam numa aprendizagem rica e diversificada. Assim podemos afirmar que a educao, seja formal, no formal ou informal, deve sempre ter a notoriedade e relevncia e ser promovida durante toda a vida do sujeito, pois alm de ser uma necessidade, um direito.

    Arte e cultura promovem um conhecimento, assim como a msica representa um forte componente na percepo de que a arte pode ser vista como uma grande possibilitadora de ressignificao de valores, tanto culturais quanto educacionais.

    REFERNCIAS

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